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LILIANY FONTES LOURES
AVALIAÇÃO DA PERCEPÇÃO DO ESTIGMA RELACIONADO À PARTICIPAÇÃO E
AO SUPORTE SOCIAL EM INDIVÍDUOS COM HANSENÍASE NA ZONA DA MATA
MINEIRA
Orientadora: Cláudia Helena Cerqueira Mármora
Juiz de Fora
2015
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LILIANY FONTES LOURES
AVALIAÇÃO DA PERCEPÇÃO DO ESTIGMA RELACIONADO À PARTICIPAÇÃO E
AO SUPORTE SOCIAL EM INDIVÍDUOS COM HANSENÍASE NA ZONA DA MATA
MINEIRA
Dissertação de mestrado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Psicologia como requisito
parcial à obtenção do título de Mestre em Psicologia
por LILIANY FONTES LOURES.
Orientadora: Profa. Dra. Cláudia Helena Cerqueira
Mármora
Juiz de Fora
2015
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iv
AGRADECIMENTOS
Se essa página foi escrita é porque eu consegui. Não foi fácil chegar até aqui, passei
por um longo caminho, desde o processo seletivo, passando pela aprovação até a conclusão
do Mestrado em Psicologia. Nada foi fácil, nem impossível.
Agradeço,
À Deus por sempre iluminar todos os meus dias, guiando sempre minhas escolhas.
À minha família, principalmente os mais próximos, mas nem menos os mais
distantes.
Aos meus pais Cid e Fátima por compreenderem as ausências nos finais de semana e
sempre me apoiarem.
Ao meu irmão Robson e minha cunhada Ana Cláudia por compartilharem suas
experiências de vida e apoio neste momento.
Ao meu marido André Rinco por ser meu companheiro diário e por entender os dias
prolongados na frente do computador.
À minha grande amiga Cláudia Mármora, que além de orientadora, sempre me
apoiou e acreditou em mim. Foram longas conversas sobre tudo e também sobre a
dissertação.
Aos amigos do HU, por me substituírem nas minhas faltas justificadas.
Aos professores e convidados do PPGPSI pelos novos ensinamentos na área da
psicologia; ao Francisco Delgado pelo auxílio na análise estatística; e aos membros da banca
Nádia Duppre e Jubel Barreto pelo apoio e contribuição para a realização desta pesquisa.
Aos antigos amigos que confiaram em mim e às novas amizades que surgiram nesta
caminhada, principalmente de Carolina, Vanessa, Natália e Natatcha. Esses momentos foram
preciosos e me fizeram compreender melhor as aulas de psicologia.
Aos profissionais das unidades de referência por facilitarem o meu trabalho e aos
usuários por me aceitarem e dividirem suas experiências e percepções sobre a hanseníase.
Com vocês, divido a alegria desta experiência .
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v
Aos meus pais Cid e Fátima, por me
ensinarem a sempre buscar algo a mais.
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vi
SUMÁRIO
RESUMO ..............................................................................................................................viii
ABSTRACT ...........................................................................................................................ix
LISTA DE SIGLAS............................................................................................................. x
LISTA DE TABELAS ........................................................................................................ xi
LISTA DE FIGURAS ....................................................................................................... xii
CAPÍTULO 1: APRESENTAÇÃO .................................................................................. 13
CAPÍTULO 2: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ............................................................16
2.1 Processo Histórico da Lepra/ Hanseníase e Tratamento ............................................. 16
2.2 A Hanseníase de Hoje ............................................................................................... 19
2.2.1 Classificação e formas clínicas. ....................................................................... 19
2.2.2 Tratamento. ..................................................................................................... 22
2.2.3 Reações hansênicas. ........................................................................................ 23
2.2.4 Epidemiologia. ................................................................................................ 23
2.3 A Hanseníase na Zona da Mata Mineira .................................................................... 25
2.4 Representação Social da Hanseníase ......................................................................... 26
2.5 Repercussões Sociais ................................................................................................ 31
2.5.1 Estigma. .......................................................................................................... 32
2.5.2 Isolamento Social. ........................................................................................... 35
2.5.3 Suporte Social. ................................................................................................ 37
CAPÍTULO 3: OBJETIVOS ............................................................................................ 39
CAPÍTULO 4: MÉTODO................................................................................................. 40
4.1 Delineamento da Pesquisa......................................................................................... 40
4.2 Composição da Amostra ........................................................................................... 40
4.3 Etapas da Pesquisa .................................................................................................... 41
4.4 Instrumentos Utilizados ............................................................................................ 42
4.5 Análise dos Dados .................................................................................................... 43
4.6 Aspectos Éticos ........................................................................................................ 45
CAPÍTULO 5: RESULTADOS ........................................................................................ 47
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vii
5.1 Caracterização do perfil da amostra .......................................................................... 47
5.2 Categorias de análise (entrevistas)............................................................................. 51
5.3 Escalas ...................................................................................................................... 52
CAPÍTULO 6: DISCUSSÃO ............................................................................................ 59
CAPÍTULO 7: CONCLUSÃO ......................................................................................... 75
REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 76
APÊNDICES E ANEXOS ................................................................................................... 91
APÊNDICE A - Roteiro de caracterização do perfil da amostra ...................................... 91
APÊNDICE B – Roteiro da entrevista semi-estruturada .................................................. 92
APÊNDICE C – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) ......................... 93
APÊNDICE D – Unidades de análise temáticas e categorias para análise de conteúdo .... 95
ANEXO A – Escala de Participação ............................................................................. 114
ANEXO B – Escala para Avaliação do Suporte Social para Pessoas Vivendo com
HIV/AIDS .................................................................................................................... 117
ANEXO C – Parecer do Comitê de Ética - UFJF .......................................................... 121
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viii
RESUMO
Introdução: Os portadores de hanseníase vivenciam situações de preconceito que,
juntamente com o estigma e a discriminação, culminam para o isolamento social e a restrição
dos relacionamentos sociais. Objetivo: Avaliar a percepção do estigma nos indivíduos com
hanseníase e relacioná-la com o grau de restrição de participação e o suporte social. Método:
Estudo transversal através de entrevistas semiestruturadas e escalas de Participação e de
Avaliação do Suporte Social em 20 usuários em tratamento para hanseníase, no primeiro
semestre de 2014, na Zona da Mata Mineira. Resultados: Destaca-se o desconhecimento
sobre a doença e o seu encobrimento por parte dos portadores de hanseníase. Esses não
vivenciaram situações de discriminação, mas acreditam que pessoas com hanseníase são
discriminadas. O suporte social esteve presente e não houve restrição de participação. Houve
a associação entre reação negativa frente ao diagnóstico com restrição grave de participação
social e presença do suporte social, e entre a ausência do suporte social com a sua
insatisfação. Conclusões: O encobrimento da doença e a presença do suporte social foram
considerados como fatores de proteção. Abordagens quanto às repercussões psicológicas
devido o encobrimento da doença são necessárias em estudos futuros.
Palavras-chave: hanseníase, estigma, apoio social, participação social.
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ix
ABSTRACT
Introduction: People with leprosy experience situations of prejudice which, together with
the stigma and discrimination, culminate in social isolation and the restriction of social
relationships. Objective: To evaluate the perception of stigma in individuals with leprosy and
relate it to the degree of restriction of participation and social support. Methods: Cross-
sectional study using semi-structured interviews and scales of Participation and Evaluation of
Social Support in 20 users in treatment for leprosy in the first half of 2014, in the Zona da
Mata Mineira. Results: Highlights the lack of knowledge about the disease and its cover-up
by persons suffering from leprosy. They did not experience situations of discrimination, but
believe that people with leprosy are discriminated. Social support was present and there was
no restriction of participation. There was an association between negative reaction to the
diagnosis with severe restriction of social participation and presence of social support, and
between lack of social support with their dissatisfaction. Conclusions: The cover-up of
disease and the presence of social support were considered as protective factors. Approaches
to psychological repercussions due the cover-up of disease are needed in future studies.
Keywords: leprosy, stigma, social support, social participation.
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x
LISTA DE SIGLAS
APA American Psychological Association
CIF Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde
DATASUS Departamento de Informática do SUS
DCE Departamento de Clínica Especializada
HD Hanseníase Dimorfa
HI Hanseníase Indeterminada
HT Hanseníase Tuberculóide
HU Hospital Universitário
HV Hanseníase Virchowiana
MEC Ministério da Educação
MH Morbus Hansen
Morhan Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase
MS Ministério da Saúde
OMS Organização Mundial de Saúde
PQT poliquimioterápico ou poliquimioterapia
SPSS Statistical Package for Social Sciences
SUS Sistema Único de Saúde
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UFJF Universidade Federal de Juiz de Fora
WHO World Health Organization
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xi
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Microrregião de origem ...................................................................................... 48
Tabela 2. Dados sociodemográficos I ................................................................................ 48
Tabela 3. Dados sociodemográficos II ............................................................................... 49
Tabela 4. Saúde geral ......................................................................................................... 49
Tabela 5. Perfil clínico e epidemiológico .......................................................................... 50
Tabela 6. Unidades de análises temáticas e categorias para análise de conteúdo .............. 52
Tabela 7. Análise descritiva da Escala de Participação ...................................................... 53
Tabela 8. Análise descritiva da Escala de Avaliação do Suporte Social ............................ 53
Tabela 9. Frequência da Disponibilidade do Suporte Instrumental ................................... 54
Tabela 10. Frequência da Satisfação do Suporte Instrumental .......................................... 54
Tabela 11. Frequência da Disponibilidade do Suporte Emocional .................................... 54
Tabela 12. Frequência da Satisfação do Suporte Emocional ............................................. 55
Tabela 13. Frequência das fontes do suporte instrumental e emocional mencionadas ...... 55
Tabela 14. Comparação entre as subescalas do Suporte Social ......................................... 56
Tabela 15. Descrição da rede neural .................................................................................. 58
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xii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Interações entre os componentes da Classificação Internacional de
Funcionalidade........................................................................................................................ 32
Figura 2. Rede neural das relações entre as categorias da análise de conteúdo com os
resultados das escalas ............................................................................................................. 57
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CAPÍTULO 1: APRESENTAÇÃO
A hanseníase é ainda caracterizada como um dos maiores problemas de saúde
pública e o Brasil ainda não conseguiu erradicá-la. Atingir a meta de erradicação não significa
eliminar a doença da vida das pessoas, pois elas ainda estão marcadas pelo seu processo
histórico. Esta patologia possui referências em algumas passagens bíblicas (Bíblia, 1996). Era
caracterizada como uma doença mutiladora, uma doença ainda sem tratamento e sem cura,
que deixava como sequelas, mutilações físicas, sendo seu portador denominado de “impuro”.
Partes importantes do contexto histórico desta doença no Brasil serão destacadas a
seguir e no decorrer do trabalho. O Ministério da Educação e Saúde, em 1923, adotou um
modelo de controle da hanseníase em nível nacional, denominado “modelo tripé”. Este
modelo constituía de três instituições que se complementavam: o leprosário, o dispensário e o
preventório. Cada uma delas agia diretamente na cadeia epidemiológica da doença, no
leprosário ficava o infectado; no dispensário estavam os comunicantes, as pessoas que
conviviam com os doentes; e no preventório os filhos dos infectados (Lei n. 2416, de 31 de
dezembro de 1929, 1929).
Nos leprosários, os doentes ficavam separados da comunidade, e todas as ações eram
controladas pelo chefe do hospital. Estes eram construídos afastados das cidades e eram
considerados como uma minicidade, com igreja, escola, salão de baile e jogos. Desta forma,
ao ser internado e separado de sua família, o doente constituía outro vínculo familiar e afetivo
com os demais internos, e com o passar do tempo, o leprosário tornava-se sua principal
referência. Desta maneira, toda relação social existente antes da internação, sendo os laços
familiares, sociais e comunitários eram desfeitos quase que completamente. Vale ressaltar que
este isolamento era regido por lei e deveria ser cumprido em todo território nacional (Maciel,
Oliveira, & Gallo, 2010).
Todo esse processo histórico permanece ainda no contexto atual da doença. Desta
forma, a hanseníase tem que ser enfrentada de uma forma mais abrangente, não se
restringindo apenas aos aspectos biológicos, mas enfatizando o contexto social, econômico,
cultural, político e psicológico das pessoas por ela atingidas.
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Comecei a entender todos estes aspectos quando conheci e me aproximei destas
pessoas. Essas pessoas fizeram e ainda fazem parte da minha história enquanto fisioterapeuta
no Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora. Comecei minhas
atividades no Serviço de Fisioterapia do Hospital Universitário como estagiária da Faculdade
de Fisioterapia da UFJF; em 2008, retornei ao Serviço de Fisioterapia como fisioterapeuta
formada e assumi a supervisão do “Estágio Supervisionado em Atenção Secundária I”, dando
assistência aos acadêmicos do 9º e 10º período da Faculdade de Fisioterapia da UFJF em seus
atendimentos no estágio; e em 2010, me tornei preceptora do eixo específico da Fisioterapia
do “Programa de Residência Multiprofissional em Saúde do Adulto com Ênfase nas Doenças
Crônico-Degenerativas” do Hospital Universitário/ UFJF. Este programa foi criado e
implantado pelo Ministério da Educação (MEC) em 2009, no qual está inserido o
Ambulatório de Hanseníase do Hospital Universitário/UFJF.
Através desta vivência, percebi que o estigma e a consequente restrição de
participação social são relevantes na vida das pessoas portadoras de hanseníase. Lendo
trabalhos sobre o tema, vi a presença deste estigma ao se trabalhar com esta doença de origem
bíblica. Pelo contato com as pessoas descobri que muitas não conhecem a hanseníase, apenas
fazem referência à lepra.
Com a minha inserção no curso de mestrado do Programa de Pós Graduação em
Psicologia da Universidade Federal de Juiz de Fora, na linha de Processos Psicossociais em
Saúde, em 2013, vi a chance de fazer algo a mais para essas pessoas. Estudar o estigma
presente nesta doença e disseminar o que é realmente a hanseníase hoje, sem preconceito.
Destaco que as palavras-chave utilizadas neste estudo foram “hanseníase”,
“estigma”, “participação social” e “apoio social”. Destaco, também, que o Programa de
Psicologia segue o estilo editorial desenvolvido pela American Psychological Association
(APA)1.
No capítulo 2, apresento a fundamentação teórica para o desenvolvimento deste
trabalho. Consta neste capítulo uma descrição do processo histórico da hanseníase, no qual
ainda há a denominação de lepra, as formas de tratamento utilizadas neste período até o
surgimento da poliquimioterapia, e as legislações que foram formuladas que abrangem esse
tema. Há, também, as classificações e as formas clínicas da hanseníase que são usadas
atualmente, o tratamento atual, as reações hansênicas e a epidemiologia no Brasil. Para
1 A 6ª edição do Manual de Publicações da American Psychological Association (APA) pode ser encontrada
através do site http://www.apastyle.org/index.aspx
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contextualizar a pesquisa, são trazidas informações sobre a situação da hanseníase na Zona da
Mata Mineira e os centros de referência nesta região. Enfatizo a representação social
relacionada à hanseníase e descrevo as repercussões sociais da hanseníase que serão
abordadas nesta pesquisa, o estigma, o isolamento social e o suporte social.
Os objetivos do trabalho estão descritos no capítulo 3 e a caracterização deste estudo
está descrita no capítulo 4. No capítulo 5, são exemplificados os resultados e no capítulo 6
apresento a discussão desses resultados com outras publicações relevantes sobre o assunto.
Finalizando, no capítulo 7, há a conclusão desta pesquisa de mestrado.
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CAPÍTULO 2: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 Processo Histórico da Lepra/ Hanseníase e Tratamento
A lepra, conhecida como hanseníase no Brasil, é uma doença infectocontagiosa,
crônica e de evolução lenta que acomete normalmente homens e mulheres adultos, causada
por uma bactéria, o Mycobacterium leprae ou chamado bacilo de Hansen. A doença se
manifesta por meio de sinais e sintomas dermatoneurológicos como lesões de pele e de nervos
periféricos, principalmente nos olhos, nas mãos e nos pés (Brasil, 2010; Ministério da Saúde,
1960).
Há indícios de que a lepra foi trazida para o Brasil pelos colonizadores portugueses e
espanhóis, pois não havia incidência desta na população indígena (Ministério da Saúde,
1960). Assim, durante o período colonial, a lepra que se inseriu pelo litoral, aos poucos, foi se
alastrando e disseminando por todo território nacional. Sem o poder público tomar
conhecimento sobre a endemia que estava acontecendo, alguns estados construíram asilos,
enfermarias e hospitais para os leprosos, já iniciando um processo de isolamento desses
doentes, pois não havia tratamento adequado para tal patologia.
Toda esta situação se manteve e, apenas em 1904, foi introduzida a política de
notificação compulsória para a lepra (Decreto n. 5.156, de 8 de março de 1904, 1904).
Durante a década de 1920 o governo iniciou suas ações em relação à hanseníase. Foi criado o
Departamento Nacional de Saúde Pública, do qual surgiu a Inspetoria de Profilaxia da Lepra e
das Doenças Venéreas, este sendo o primeiro órgão federal destinado ao combate da endemia;
e a notificação compulsória se fortaleceu ainda mais (Ministério da Saúde, 1960; Santos,
2003).
Devido a grande endemia e o receio de que esses doentes contaminassem toda a
população, em 1923 foi determinado por lei o isolamento compulsório para os leprosos. Em
alguns lugares, caso os doentes não se apresentassem de forma voluntária, eles sofriam
denúncias e eram capturados pela polícia sanitária para serem internados (Decreto n. 16.300,
de 31 de dezembro de 1923, 1923). Neste período, foi feita a reforma dos serviços de saúde
pública e fundados vários outros leprosários.
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Cabe lembrar que até este momento, o tratamento realizado era à base de óleo de
chaulmoogra, era o único medicamento existente para o combate à hanseníase, sendo
considerado a grande esperança de cura para os doentes (Maciel et al., 2010; Santos, Souza, &
Siani, 2008). Porém, existiam grandes controvérsias entre os médicos sobre sua eficácia neste
tratamento e várias pesquisas foram realizadas, que juntamente com a intensificação das
técnicas de produção sintética de substâncias químicas e de moléculas, levaram ao surgimento
neste contexto das sulfonas (Santos et al., 2008). Em 1940, a sulfona foi considerada como a
primeira forma de quimioterapia efetiva para o tratamento da hanseníase (Maciel, Oliveira,
Gallo, & Damasco, 2003; Talhari & Neves, 1997).
O governo, na tentativa ainda de combater a endemia causada pela lepra, em 1935,
aprovou o Plano Nacional de Combate à Lepra, fortalecendo as estruturas já formadas pelos
leprosários, dispensários e preventórios. Houve uma nova reforma na saúde pública federal,
em 1941, criando o Serviço Nacional de Lepra para manter este propósito de controle da
doença (Maciel et al., 2003; Rodrigues (1967), citado por Opromolla & Laurenti, 2011).
Devido a alguns acontecimentos na década de 1950, como a disponibilização dos
medicamentos em grande escala para tratamento ambulatorial dos doentes de lepra e a VII
Conferência Internacional de Lepra, em Tóquio, que procurava estabelecer uma convivência
menos separatista e mais preocupada com as questões sociais dos doentes e da doença,
culminou com o fim da internação compulsória e o fechamento dos leprosários. Em 1956 foi
instituída a Campanha Nacional contra a Lepra com intuito de desmonte da estrutura do
leprosário, sendo que este fechamento foi garantido por lei em 1962 (Maciel et al., 2010;
Avelleria & Nery (1998), citado por L. A. de C. Santos, Faria, & Menezes, 2008). No fim
deste sistema de controle, haviam sido construídos, até 1960, 36 leprosários, 102 dispensários
e 31 preventórios em todo território do Brasil (Ministério da Saúde, 1960).
Tardiamente, durante a década de 1970, inicia-se a chamada “Era da hanseníase”. O
reforço do tratamento quimioterápico ambulatorial, o combate ao preconceito, o início do
tratamento de prevenção de incapacidade e a preservação da unidade familiar, formam os
princípios da portaria que regulamentou as normas sobre a Política de Controle da
Hanseníase, criada pelo Ministério da Saúde (Maciel et al., 2010; Portaria no. 165/BSB de 14
de maio de 1976, 1976).
Porém, foi durante a década de 1980 que três fatos importantes marcaram o processo
histórico da hanseníase no Brasil (Maciel et al., 2003). A recomendação da poliquimioterapia,
tratamento específico e preconizado pela Organização Mundial de Saúde, permitiu a
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reorganização dos tratamentos dos doentes; a criação do Movimento de Reintegração das
Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), que inicialmente foi criado para garantir os
direitos dos doentes que moravam nos leprosários devido ao período de isolamento, e
atualmente ainda permanece em atuação na defesa dos hansenianos; e por último, a primeira
campanha publicitária sobre a hanseníase em grande mídia para consolidar o neologismo
“hanseníase”.
A transição do nome lepra para hanseníase, com o objetivo de reintegrar socialmente
o doente e diminuir o estigma presente nos termos “lepra” e “leproso”, surgiu com a iniciativa
de Abraão Rotberg, um proeminente hansenologista brasileiro da época, e mais tardiamente
obtendo adesão do Morhan e de outros setores (Maciel et al., 2010; Rotberg, 1969).
Tornando-se oficial apenas, em 1995, com a divulgação da Lei nº 9010 (1995).
A mudança de cenário de reclusão dos indivíduos consolidou-se a partir da 8ª
Conferência Nacional de Saúde, em 1986, quando alguns leprosários foram transformados em
hospitais gerais e abrigos para servir como auxílio aos doentes que foram internados e suas
famílias, e centros de pesquisas (Jornal do Morhan n.39, 2004; Maciel et al., 2010). A luta
para o combate à hanseníase se manteve constante, e em 1991, durante a 44ª Conferência
Mundial da Saúde, com base nos resultados favoráveis obtidos com a implantação da
poliquimioterapia, os países comprometem-se a eliminar a hanseníase como problema de
saúde pública até o ano 2000, para menos de 1 caso a cada 10.000 habitantes. Como o Brasil
não alcançou esta meta, este prazo foi postergado para 2005. Em 2003, o Programa de
Controle da Hanseníase do Ministério da Saúde assume todas as ações e estratégias em
relação ao controle da hanseníase (Biblioteca Virtual em Saúde Hanseníase, 2013).
Com a percepção do preconceito sobre a hanseníase, o Morhan, em 2007, apresenta
um vídeo com a participação de pessoas importantes da mídia como Ney Matogrosso e
Solange Couto, procurando abordar a desestigmatização e formas de tratamento da doença
(Biblioteca Virtual em Saúde Hanseníase, 2013). Posteriormente, ainda em 2007, com a
tentativa do governo em se desculpar pelo modelo de tratamento praticado junto aos doentes
de lepra, que estiveram isolados compulsoriamente, este concedeu uma indenização
financeira. Esta foi uma retratação oficial do governo devido à política segregacionista
utilizada no passado e o reconhecimento da agressividade e autoritarismo da época (Lei n.
11520, de 18 de setembro de 2007, 2007; Maciel et al., 2010).
Mantendo a tentativa de erradicação da doença, em 2009, a Organização Mundial de
Saúde (OMS) fixou metas para o controle de número de casos da hanseníase no país
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(Biblioteca Virtual em Saúde Hanseníase, 2013). O Ministério da Saúde (MS) divulgou o
Plano Integrado de Ações Estratégicas – Plano de ação 2011-2015, com o compromisso de
eliminar a hanseníase como problema de saúde pública até 2015 e erradicá-la. Segundo os
últimos dados de 2013 do MS, o Brasil registrou uma taxa de prevalência de 1,42 por 10.000
habitantes. Ressalta-se que estas taxas se diferenciam de acordo com as diferentes regiões do
país, sendo algumas já erradicadas e outras não (Brasil, 2014a).
Atualmente, ainda há grandes esforços na tentativa de ampliar o conhecimento sobre
a hanseníase entre a população. Entre estes, destaca-se o papel do Movimento Social do
Morhan, que atua com a missão de “possibilitar que a hanseníase seja compreendida na
sociedade como uma doença normal, com tratamento e cura, eliminando assim o preconceito
e estigma em torno da doença” (“Morhan”, [s.d.]).
A partir do conhecimento do processo histórico em torno da hanseníase, torna-se
fácil compreender o modo como estes indivíduos, os que foram isolados compulsoriamente
no passado, vivem atualmente, e como os novos doentes de hanseníase, de hoje em dia, ficam
à sombra dessas lembranças.
2.2 A Hanseníase de Hoje
2.2.1 Classificação e formas clínicas.
Uma característica do bacilo de Hansen é a sua alta infectividade, ou seja, é capaz de
infectar um grande número de pessoas, porém com uma baixa patogenicidade, ou seja, poucos
adoecem. Devido ao seu poder de transmissão, esta doença é de notificação compulsória e
investigação obrigatória. O aparecimento da doença e suas manifestações clínicas dependem
da resposta do sistema imunológico frente ao bacilo, ocorrendo, às vezes, longos períodos de
incubação, este podendo ser em média de dois a sete anos (Brasil, 2010).
As manifestações clínicas da doença são variáveis quanto à imunogenicidade do
bacilo e quanto ao sistema imunológico do indivíduo, sendo que as principais manifestações
são as relacionadas ao comprometimento neurológico periférico. Caracterizando sua
exposição por meio de sinais e sintomas dermatoneurológicos como lesões de pele e de
nervos periféricos, apresentando na maioria das vezes, acometimento nos olhos, nas mãos e
nos pés. Esta manifestação na pele se apresenta com diminuição ou ausência de sensibilidade
ou lesões dormentes, devido o acometimento dos ramos periféricos do sistema nervoso, este
também, podendo ser local de processo inflamatório desencadeando as neurites. Ressalta-se
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que este comprometimento neurológico periférico é o responsável pelo alto grau incapacitante
desta doença, podendo provocar incapacidades físicas, que podem evoluir para deformidades
(Brasil, 2010).
Uma das classificações das formas clínicas da hanseníase existentes é a classificação
de Madri, definida no VI Congresso Internacional de Leprologia, em 1953 (Ministério da
Saúde, 1960) e é a classificação utilizada pelos Centros de Referência estudados nesta
pesquisa. Esta classificação se baseia nas manifestações clínicas da doença e a divide em
quatro formas: indeterminada, tuberculóide, dimorfa e virchowiana.
A hanseníase indeterminada (MHI ou HI) é
denominada forma inicial, incipiente ou incaracterística, é a fase de começo do
MH. Caracteriza-se por uma ou várias manchas, mais claras que a pele normal (manchas hipocrômicas). Essas lesões são planas, não fazem relevo na superfície
da pele e as bordas, na maioria das vezes, são imprecisas. [...] pode manifestar-se
apenas por áreas com distúrbios da sensibilidade, sem alteração da cor da pele. Na maioria das vezes, a única sensibilidade alterada é a térmica (teste com águas fria e
quente); a sensibilidade dolorosa (teste da picada com agulha) pode estar normal ou
pouco alterada e a sensibilidade tátil está preservada. [...] Nesta forma, ainda não
há espessamento nervoso e, portanto, as deformações nunca estão presentes. (Talhari & Neves, 1997, p. 5).
A hanseníase tuberculóide (MHT ou HT)
surge a partir do MHI não tratado, nos pacientes com boa resistência. [...] A
presença, na superfície da mancha, de pequeninos “caroços” (pápulas ou
tubérculos) sugere a evolução de HI para HT. [...] O número de lesões, é geralmente pequeno e de distribuição assimétrica. [...] Troncos nervosos podem ser
envolvidos e, em geral, este comprometimento é intenso, podendo haver necrose
caseosa do nervo (“pseudo-abcesso de nervo”) e incapacidades. As manifestações neurais podem ocorrer isoladamente, sem a presença de lesões cutâneas. A essas
formas clínicas denominam-se “formas neuríticas puras”. [...] Na HT verifica-se
alteração da sensibilidade térmica, dolorosa e, nas lesões mais antigas, também a tátil. Há queda de pelos, e a sudorese está diminuída ou ausente. (Talhari & Neves,
1997, p. 8–10, grifo do autor).
A hanseníase virchowiana (MHV ou HV)
representa na maioria das vezes, a evolução da HI não tratada, em pacientes sem
resistência ao bacilo de Hansen. Aos poucos, sem tratamento, as manchas tornam-
se eritematosas, ferruginosas e infiltradas; as bordas ficam imprecisas, perdendo-se os limites da pele normal. Com o tempo surgirão pápulas, nódulos, tubérculos e
infiltrações em placa. [...] Na HV é frequente o comprometimento da mucosa nasal,
dando sintomas parecidos com a gripe: nariz “entupido”, voz “fanhosa”, coriza e, às vezes, epistaxe (sangramento nasal) [...] Os troncos nervosos ficam espessados e
dolorosos; ocorrem, também, dores articulares, adenopatias generalizadas
(ínguas)... (Talhari & Neves, 1997, p. 20, 23, 26).
A hanseníase dimorfa (MHD ou HD)
surge em indivíduos portadores de HI com resistência superior aos portadores de HV e inferior aos portadores de HT. Esses pacientes podem apresentar, ao mesmo
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21
tempo, características do HT, em algumas áreas e, em outras, aspectos clássicos de HV. (Talhari & Neves, 1997, p. 34).
Para fins terapêuticos, para o tratamento com o poliquimoterápico (PQT), a OMS
recomenda a classificação entre hanseníase paucibacilar (classificação indeterminada e
tuberculóide) e multibacilar (classificação dimorfa e virchowiana) (Talhari & Neves, 1997).
Esta classificação operacional é baseada pelo número de lesões cutâneas apresentadas pelos
indivíduos, nos casos com até cinco lesões são classificados como paucibacilares, e os com
mais de cinco lesões são multibacilares. Os paucibacilares apresentam uma melhor resposta
imunológica ao bacilo, possuindo uma baixa carga bacilar, sendo questionável o poder de
infectar outras pessoas; porém os multibacilares apresentam uma resposta imunológica pouco
eficaz, possuindo uma carga bacilar alta, sendo importante fonte de transmissão e manutenção
da cadeia epidemiológica da doença (Brasil, 2010).
Em relação ao poder de transmissão do bacilo, pode-se acrescentar o trabalho
prospectivo realizado na província de Cebu, nas Filipinas (Doull, Guinto, Rodriguez, &
Brancroft, 1942), onde os autores mostraram que o risco de contágio de casos lepromatosos
(multibacilares) foi oito vezes maior quando comparados às pessoas não expostas à
hanseníase em seu domicílio, enquanto que os casos tuberculóides (paucibacilares), o risco foi
duas vezes maior do que para aqueles não expostos. Caracterizando, desta forma, que ambos
os tipos de hanseníase oferecem risco de contágio para as outras pessoas na comunidade.
A baciloscopia é um procedimento complementar utilizado para auxiliar nesta
classificação. Este exame é
a pesquisa de bacilos, com finalidade diagnóstica ou para acompanhar o tratamento, faz-se através da coleta de material nos lóbulos auriculares, cotovelos e
duas áreas infiltradas, de qualquer parte do corpo. [...] Os exames baciloscópicos
serão realizados uma única vez, no momento do diagnóstico. (Talhari & Neves,
1997, p. 105).
O resultado da baciloscopia positivo classifica o caso em multibacilar,
independentemente do número de lesões presentes; porém o resultado negativo não exclui o
diagnóstico da doença. Este exame é solicitado pelo médico responsável nas situações de
dúvida quanto à classificação operacional para a instituição da poliquimioterapia, em caso de
diagnóstico diferencial com outras doenças dermatoneurológicas e em casos de suspeita de
recidiva (Brasil, 2010).
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2.2.2 Tratamento.
O tratamento específico da hanseníase, indicado pelo Ministério da Saúde, é o
poliquimioterápico (PQT) padronizado pela OMS, devendo ser realizado nas unidades de
saúde. A poliquimioterapia é constituída pelo conjunto dos seguintes medicamentos:
rifampicina, dapsona e clofazimina, com administração associada. Essa associação evita a
resistência medicamentosa do bacilo que ocorre com frequência quando se utiliza apenas um
medicamento, impossibilitando a cura da doença (Brasil, 2002).
Sua administração é feita com base em um esquema-padrão, de acordo com a
classificação operacional em paucibacilar ou multibacilar. A informação sobre a classificação
da doença é fundamental para se selecionar o esquema de tratamento adequado a cada caso.
Para os paucibalicares é utilizada uma combinação de rifampicina e dapsona,
acondicionados numa cartela de duração de um mês, o tratamento tem a duração de seis doses
mensais supervisionadas de rifampicina, e o critério para alta corresponde a seis doses
supervisionadas em até nove meses. Para os multibacilares é utilizada uma combinação de
rifampicina, dapsona e clofazimina, acondicionados também em uma cartela para o espaço de
tempo de um mês, o tratamento tem duração de doze doses mensais supervisionadas de
rifampicina, e o critério de alta corresponde a doze doses supervisionadas em até dezoito
meses. Ambas as cartelas contêm a dose supervisionada, que deve ser administrada na
unidade de saúde, e doses diárias para o indivíduo realizar em seu domicílio, retornando
mensalmente na unidade de saúde para receber a próxima cartela (Brasil, 2002).
Doses diferenciadas são estabelecidas para crianças, grávidas, tratamento associado
com tuberculose e AIDS, e outros casos. Alta por cura é dada após a administração do número
de doses preconizadas por cada esquema terapêutico.
O tratamento do indivíduo com hanseníase é essencial para curá-lo e interromper a
cadeia de transmissão da doença, sendo, portanto, estratégico para o controle da endemia e
sua eliminação enquanto problema de saúde pública. O tratamento é considerado completo
quando compreende o tratamento quimioterápico específico proposto pela OMS, a
poliquimioterapia; o acompanhamento para identificar e tratar as possíveis intercorrências e
complicações da doença; e a prevenção e tratamento das incapacidades físicas quando
presentes (Brasil, 2002).
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2.2.3 Reações hansênicas.
Os estados reacionais ou reações hansênicas são as reações do sistema imunológico
do indivíduo frente ao bacilo. Eles se caracterizam como episódios inflamatórios agudos e
subagudos, que podem acometer tanto os casos paucibacilares quanto os multibacilares.
Podem ocorrer, principalmente, durante os primeiros meses do tratamento com o
poliquimioterápico, mas podem ocorrer antes e após o tratamento, mesmo após a cura da
doença (Brasil, 2002).
Para o Ministério da Saúde (Brasil, 2002), a reação hansênica é a principal causa de
lesões dos nervos periféricos e de incapacidades desencadeadas pela hanseníase. Por isso, é
essencial que seu diagnóstico seja feito precocemente, visando prevenir essas incapacidades.
As reações hansênicas podem ser classificadas como reação tipo 1, ou reação reversa, e
reação tipo 2, ou eritema nodoso hansênico (ENH).
A reação tipo 1 é caracterizada como um quadro clínico que apresenta novas lesões
dermatológicas, infiltração, alterações de cor e edema nas lesões antigas, bem como dor ou
espessamento dos nervos, as neurites. A reação tipo 2 se manifesta principalmente pelo
eritema nodoso hansênico (ENH), este se caracteriza por apresentar nódulos vermelhos e
dolorosos, febre, dores articulares, dor e espessamento nos nervos e mal-estar generalizado.
Neste caso, as lesões antigas permanecem sem alteração (Brasil, 2002).
Estas reações podem ser desencadeadas por diversos fatores, entre eles, a gestação,
as infecções concorrentes, o stress físico ou psicológico. O indivíduo em reação será avaliado
pelo médico responsável e deve ser tratado com medicação específica para cada caso, visando
principalmente à redução dos sintomas clínicos e também à prevenção de incapacidades.
Frequentemente, esta medicação é composta por corticosteroides, prednisona e talidomida
(Brasil, 2002).
2.2.4 Epidemiologia.
Segundo a OMS, em seu último boletim epidemiológico com dados referentes ao ano
de 2013, o Brasil foi considerado o segundo país no mundo em números de casos de
hanseníase, atrás apenas da Índia. A Indonésia ocupa o terceiro lugar (World Health
Organization, 2014).
O indicador para avaliar a endemia no país era a taxa de prevalência, ou seja, o
número de casos registrados para tratamento no início de cada ano. Porém com a redução do
período de tratamento e a inserção do tratamento poliquimioterápico para a hanseníase, no
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início da década de 1980, houve uma queda brusca nesta taxa em diversos países. Assim,
devido à diferença na duração do tratamento, à desproporção entre o tempo de tratamento dos
casos paucibacilares e multibacilares, à diferença nos programas entre os países, a
comparação pela taxa de prevalência se tornou uma prática complicada. Então, atualmente,
está sendo enfatizada a taxa de detecção dos casos, esta seria uma taxa mais adequada para
avaliar a transmissão recente e as circunstancias epidemiológicas atuais. Uma queda desta
taxa está sendo observada na maioria dos países, refletindo a melhora tanto das condições
socioeconômicas quanto da efetividade dos programas para controle da hanseníase (World
Health Organization, 2012).
A importância da taxa de prevalência, justificando ainda sua utilização, é a
mensuração para avaliar a erradicação da doença. Para tal é necessário alcançar o valor menor
que um caso por 10.000 habitantes. Destaca-se que o Brasil alcançou em 2013, com referência
aos dados do MS (Brasil, 2014a) o coeficiente de prevalência de 1,42 por 10.000 habitantes.
Ressalta-se que esta taxa vem decrescendo e que o Brasil renovou o compromisso de alcançar
a meta de erradicação da hanseníase até 2015, esta meta tem sido prorrogada há alguns anos.
Em nível mundial, esta taxa de erradicação foi alcançada no ano de 2000, ou seja, o
objetivo de eliminação da hanseníase já foi alcançado como metal global. Em 2005, a maioria
dos países havia alcançado esta meta, exceto cinco países, entre eles o Brasil. Porém, segundo
dados atuais da OMS, 14 países estão sendo considerados endêmicos, revelando uma
dificuldade em manter o controle de eliminação sobre a hanseníase (World Health
Organization, 2006, 2014).
Outro indicador utilizado é a taxa de incidência, avaliada pelo número de casos
detectados por 100.000 habitantes. Este coeficiente de detecção de casos novos está
relacionado à incidência real de casos e da agilidade dos diagnósticos nos serviços de saúde
(Brasil, 2008b). O último dado referente ao Brasil foi o apresentado em 2013, registrando um
coeficiente de 15,44 por 100.000 habitantes (Brasil, 2014b), este sendo considerado como um
valor “alto” segundo parâmetros do MS (Brasil, 2009). Destaca-se que esses valores estão
apresentando uma tendência decrescente, de acordo com os registros dos valores dos anos
anteriores (Brasil, 2014b). Em relação ao valor global, a taxa atual de casos novos apresentada
foi de 3,81 por 100.000 habitantes, sendo perceptível uma redução quando comparado aos
anos anteriores em todas as regiões do mundo (World Health Organization, 2014).
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2.3 A Hanseníase na Zona da Mata Mineira
A região da Zona da Mata Mineira é uma região de destaque entre as doze
mesorregiões do estado de Minas Gerais, constituída por 142 municípios agrupados em sete
microrregiões, entre estas está localizada a microrregião de Juiz de Fora. Esta é dividida em
33 municípios (Wikipédia, 2014).
A Zona da Mata Mineira possui duas unidades de referência para o tratamento da
hanseníase, ambas localizadas no município de Juiz de Fora - MG, o Hospital Universitário da
Universidade Federal de Juiz de Fora e o Departamento de Clínicas Especializadas (DCE) -
Pam-Marechal - Setor de Dermatologia da Prefeitura de Juiz de Fora. Nestes dois centros de
referência, são atendidos os usuários da Zona da Mata, porém a Superintendência Regional de
Saúde de Juiz de Fora, apenas disponibiliza dados dos casos de usuários cadastrados na
microrregião de Juiz de Fora. De acordo com estes dados, cedidos pela Superintendência, o
número de casos novos diagnosticados com hanseníase vem reduzindo desde o ano de 2011.
Em 2004, o Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora foi
habilitado como Centro de Referência da Zona da Mata Mineira pela Secretaria Estadual de
Saúde de Minas Gerais, atendendo aos usuários do Sistema Único de Saúde de Juiz de Fora e
região (UFJF, [s.d.]). Porém, o trabalho com a hanseníase havia sido ampliado um ano antes,
em 2003, através do Projeto de Extensão “Atenção interdisciplinar aos pacientes em controle
da hanseníase: uma proposta de educação em saúde”, sob a coordenação do Serviço Social do
HU/UFJF (Alves, Oliveira, Mármora, & Campos, 2013).
A equipe de profissionais que atuam neste centro de referência foi capacitada e
certificada pela Secretaria Estadual de Dermatologia Sanitária, em 2004, em Belo Horizonte,
quanto ao combate, controle e intervenção na doença. Em 2010, foi inserido o Programa de
Residência Multiprofissional em Saúde do Adulto do Hospital Universitário da UFJF, com as
áreas de Educação Física, Enfermagem, Farmácia/ Análises Clínicas, Fisioterapia, Nutrição,
Psicologia e Serviço Social, ampliando a qualificação assistencial e formativa do grupo
(Alves et al., 2013). Este grupo desenvolve atividades mensais de grupos de educação em
saúde junto aos referidos usuários, seus familiares e/ ou acompanhantes, com o intuito de
propiciar a troca de informações e vivências entre os participantes, auxiliar na adesão e
participação efetiva no tratamento, e desenvolver técnicas de enfrentamento face às
implicações clínicas e psicossociais associadas à doença. Além de atividades práticas nas
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salas de espera, campanhas socioeducativas, há a atuação importante do grupo fisioterapêutico
frente ao tratamento e prevenção de sequelas da doença.
Em trabalhos realizados juntamente com o Setor de Dermatologia da Prefeitura de
Juiz de Fora, foi possível perceber mudanças importantes, em Juiz de Fora, depois de 1987
devido à inserção da poliquimioterapia na cidade para o tratamento da hanseníase.
Consequentemente a esta intervenção, houve uma redução do tempo no tratamento dos casos,
tanto multibacilares quanto paucibacilares (Soares et al., 2000; Teixeira et al., 2010). Outra
característica importante é que embora o MS promova ações para que ocorra a
descentralização no tratamento da hanseníase, no município de Juiz de Fora as ações
continuam sendo centralizadas devido à dificuldade técnica para o treinamento dos
profissionais (Freitas et al., 2010).
Em maio de 2013, aconteceu o Seminário Estadual de Monitoramento e Avaliação de
Hanseníase, na cidade de Belo Horizonte, com a presença de diversas instituições, entre elas
os centros de referência de Juiz de Fora. Este evento teve o objetivo de divulgar e discutir os
dados epidemiológicos, refletir sobre estratégias de melhoria no controle da endemia, e na
atualização dos profissionais de saúde. Neste seminário foi discutida também a evolução das
taxas de detecção de hanseníase em menores de 15 anos, o que evidencia que a doença não
está totalmente controlada. Este fato mostra que a hanseníase está entre as doenças
negligenciadas e ainda se apresenta como um desafio para saúde pública do país, sendo
necessária a capacitação dos profissionais na área para a identificação dos casos novos mais
precocemente, para que se possam ter chances de cura sem sequelas (Vieira, 2013).
Em relação à situação epidemiológica, neste seminário (Vieira, 2013), foi colocada
que a situação no estado de Minas Gerais vem se apresentando com diminuição das taxas de
detecção, sendo alcançada em 2012 a taxa de 7,37 por 100.000 habitantes, mesmo que esta
distribuição não seja uniforme no estado. As áreas que são destacadas pela concentração de
casos são a divisa com o Espírito Santo e Sul da Bahia, a divisa entre Goiás e Distrito Federal,
e alguns focos isolados no centro do Estado. Uma possível explicação para estas áreas é o
elevado grau de migração com grande circulação de pessoas, além das condições
socioeconômicas.
2.4 Representação Social da Hanseníase
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A forma como o indivíduo percebe a hanseníase está relacionado à forma como o
próprio indivíduo compreende qualquer doença. Laplantine, em seu livro Antropologia da
Doença (2010), realiza um estudo comparativo entre os diferentes modelos etiológico-
terapêuticos pelos quais a doença e a saúde são representadas. Destaca que em nossa
sociedade há praticamente uma exclusividade no modelo da etiologia científica da Medicina
Contemporânea, não deixando a etiologia subjetiva, a social, a do próprio doente exercer sua
influência. Há uma dificuldade em admitir que a doença passa-se como um fenômeno social,
sendo um processo de todos.
Laplantine (2010) insere que a doença precisa ser percebida, também, do ponto de
vista da subjetividade do doente, a interpretação que ele tem de sua própria experiência de
estar doente. Desta forma, destacam-se a representação da doença pelo doente e pelo médico,
suscetível às influências sociais, históricas e culturais. Construindo assim, um modelo de
conhecimento amplo de doença com diversos pontos de vistas.
Passando para o contexto deste trabalho, as influências históricas e culturais da
hanseníase são atravessadas, aqui no Brasil, pela transição do nome lepra para hanseníase.
Esta alteração teve início na década de 70 com o hansenologista Abraão Rotberg e foi
sugerida com o objetivo de reintegrar socialmente o doente e diminuir o estigma presente nos
termos “lepra” e “leproso”. Porém, esta transição de nomes ainda não se concretizou. Pode-se
perceber que a relação de sinais, sintomas e tratamento entre os termos hanseníase e lepra é
visto de forma diferente por muitas pessoas. Isto se deve ao pouco investimento nos meios
midiáticos e sociais para a divulgação ampla da nova terminologia; talvez, também, pelo
interesse da sociedade em ocultá-la. O termo hanseníase faz parte de uma modernização do
senso comum, ancorada na representação tradicional da lepra (Oliveira, Mendes, Tardin,
Cunha, & Arruda, 2003).
A hanseníase sofre influência das construções culturais do contexto social onde ela
emerge como problema de saúde. A transição do nome favoreceu a constituição de novas
construções culturais sobre a doença, pois o propósito desta mudança foi retirar a lepra,
carregada de um caráter estigmatizante, para inserir a hanseníase, uma doença sem estigma e
com cura. Porém esse jogo semântico não conseguiu eliminar a lepra da concepção popular
nem o estigma associado a ela (Lira, Catrib, Nations, & Lira, 2005).
Em um trabalho no município de Campinas com doentes de hanseníase, Queiroz e
Carrasco (Queiroz & Carrasco, 1995) relatam que 50% dos entrevistados não reconhecem que
hanseníase e lepra são a mesma doença ou acham que são estágios diferentes da mesma
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doença, sendo a lepra um estágio mais grave. Lira e colaboradores (2005) apontam que a
diferença dos sinais apresentados atualmente pela hanseníase faz o indivíduo duvidar
realmente se as duas doenças são a mesma. Levando ao questionamento de seu diagnóstico e
à competência dos serviços de saúde, subestimando o rigor no cumprimento dos esquemas
terapêuticos recomendados e ao possível abandono do tratamento.
Como o principal órgão acometido pela hanseníase é a pele, podem-se acrescentar as
contribuições de Didier Anzieu (1988) para este trabalho. Psicanalista que discorre em seu
livro “O Eu-pele” sobre o paralelismo psiquismo e pele, recorda que a pele e o sistema
nervoso têm a mesma origem embrionária, o ectoderma. A pele pode ser compreendida como
um órgão de relação, de fronteira entre o mundo interno e o externo, entre o eu e o outro. As
manifestações da pele não podem ser disfarçadas, assim as lesões de uma doença fazem uma
marca física, e consequentemente, uma marca psíquica, tomando o indivíduo em sua
totalidade psicossomática (Dias, Rubin, Dias, & Gauer, 2007). Anzieu (1988) trata a pele
como um “envelope psíquico” e uma lesão na pele tornaria o indivíduo exposto, vulnerável
aos outros.
Lira e colaboradores (2005) evidenciaram que a hanseníase é representada como um
problema que gera sofrimento social, centrada na cronicidade e no estigma. Deste modo,
outro ponto merecedor de destaque é a influência social acerca da interpretação da hanseníase
pelo indivíduo, surgindo de forma importante a representação social.
Tem-se que a representação social é o conhecimento prático que auxilia na
construção social da nossa realidade. Toda representação social é a representação de alguém
ou de alguma coisa, não sendo o real, nem o ideal, nem o subjetivo do objeto ou o objetivo do
sujeito, ela é a relação entre o mundo e as coisas. É o processo de elaboração cognitiva e
simbólica que estabelece os comportamentos das pessoas (Sêga, 2000). Em relação ao nosso
tema de estudo, nos casos de relações entre grupos, a representação social tende a fixar uma
imagem do outro dentro de um status, transformando as diferenças sociais em diferenças de
ser. Desta forma, os preconceitos e os estereótipos são dificilmente enfraquecidos, sendo
necessário o tempo e novos conhecimentos para serem enraizados.
Segundo Moscovici (2012) as representações sociais possuem duas funções. Em
primeiro lugar, elas convencionalizam os objetos, pessoas e acontecimentos, posteriormente
os categorizam e os colocam em um modelo de determinado tipo, distinto e partilhado por um
grupo de pessoas.
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O autor (Moscovici, 2012) aponta que cada experiência é influenciada por uma
realidade predeterminada por convenções, que liga cada parte a um todo e coloca cada pessoa
em uma categoria distinta. Ninguém está livre dos efeitos de condicionamentos anteriores que
lhe são impostos por suas representações, linguagem ou cultura. Nossos pensamentos são
organizados de acordo com um sistema que já está condicionado por nossas representações e
por nossa cultura.
Através de esforços, pode ser possível escapar de algumas convenções impostas por
nossas percepções e pensamentos, porém não se pode libertar sempre de todas estas
convenções, nem eliminar todos os preconceitos. O ideal é reconhecer que as representações
constituem um tipo de realidade (Moscovici, 2012).
Ainda segundo Moscovici (2012), a segunda função das representações sociais é que
estas são prescritivas, ou seja, elas são impostas por uma força irresistível. Essa força é uma
combinação entre uma estrutura presente e uma tradição que determina o que deve ser
pensado.
Assim, essas representações são partilhadas, penetram e influenciam o pensamento
de cada pessoa, elas não são pensadas. São o produto de uma sequência de elaborações e
mudanças que ocorrem com o passar do tempo e são levadas por sucessivas gerações. Elas
refletem um conhecimento anterior e quebram as amarras de uma informação presente. As
experiências e ideias passadas não estão mortas, elas continuam ativas, mudam e infiltram nas
experiências e ideias atuais. Neste aspecto, o passado é mais real que o presente. O poder das
representações está no sucesso com que elas controlam a realidade atual através do passado e
da continuidade que isso persiste. Uma vez difundido e aceito o conteúdo, ele se constitui
em uma parte integrante do próprio indivíduo, da maneira de julgar e de se relacionar com os
outros, define a posição na hierarquia social e os próprios valores (Moscovici, 2012).
Devido à autonomia e à pressão que as representações sociais exercem, elas se
tornam realidades inquestionáveis que devem ser confrontadas. O peso de sua história,
costume e conteúdo cumulativo confronta a nova realidade como se fosse um objeto material.
Talvez seja uma resistência ainda maior, pois o invisível é mais difícil de ser superado do que
é visível (Moscovici, 2012). Possivelmente, este aspecto justifica a dificuldade em tentar
difundir o conhecimento “atual” em relação à hanseníase, inserir uma nova representação.
Queiroz (1995) aponta que a representação social da hanseníase está relacionada ao
confinamento e aos leprosários que existiam para o tratamento da lepra. Confirmando que a
lepra sustenta esta representação (Romero-Salazar, Parra, Moya-Hernández, Rujano, & Salas,
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1995). Em um estudo de Silveira e Silva (2006) sobre as representações sociais na hanseníase,
foi observado que a surpresa, o medo e a ansiedade são reações compreensíveis à medida que
se reflete a rede de significados associados à doença, como gravidade, sequelas e tratamento,
todos configurando com a representação de uma doença grave e mutiladora. Esta
representação está sempre associada a uma imagem social negativa gerada pela hanseníase,
relacionado ao passado, vinculado ao estigma, passado pelos avós, pais e assim em diante.
Embora se apresente hoje como uma doença com tratamento e cura, onde as pessoas
portadoras de hanseníase podem não mostrar marcas ou sequelas, há uma uniformidade de
comportamento dos outros. A representação social iguala todos os indivíduos, e isto é o que
importa para uma situação de estigma (Romero-Salazar et al., 1995).
Depois que as representações são criadas, elas tornam-se independentes, circulam
pela sociedade, se encontram, se atraem e se repelem e dão oportunidade ao nascimento de
novas representações, enquanto velhas representações morrem. São compartilhadas por todos
e reforçadas pela tradição, constitui-se uma realidade social sui generis. Quanto mais sua
origem é esquecida, mais forte ela se torna; passando de ideal, para matéria. Destaca-se que
quanto menos se pensa sobre as representações, quanto menos se conscientiza sobre elas,
maiores são suas influências sobre as pessoas (Moscovici, 2012).
Este fato torna a representação muito dinâmica, criando uma imagem-crença em
relação à hanseníase. Faz com que os indivíduos assumam uma compreensão como realidade,
Laplantine destaca:
é o encontro de uma experiência individual e de modelos sociais num modo de apreensão particular do real: o da imagem-crença, que, contrariamente ao conceito
e à teoria que é sua racionalização secundária, sempre tem uma tonalidade afetiva e
uma carga irracional. Trata-se de um saber que os indivíduos de uma dada sociedade ou de um grupo social elaboram acerca de um segmento de sua
existência ou de toda sua existência. É uma interpretação que se organiza em
relação estreita com o social e que se torna, para aqueles que a ela aderem, a própria realidade. (Laplantine, 2001, p. 242).
A dinâmica das relações pode ser definida como uma dinâmica da familiarização,
onde os objetos, pessoas e acontecimentos são percebidos e compreendidos em relação a
prévios encontros e paradigmas. Significa aceitar e compreender o que é familiar, estar
acostumado a isso e construir um hábito; porém neste mesmo raciocínio, pode-se avaliar o
que está de fora como o incomum, anormal, ou seja, o que é não é familiar. As representações
se estabelecem no universo consensual, elas restauram a consciência coletiva e a formaliza,
explicando os objetos e acontecimentos de uma maneira tal que se tornam acessíveis a
qualquer um (Moscovici, 2012).
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Desta forma, as representações sociais ao redor da hanseníase criam uma realidade
gerando grandes repercussões sociais.
2.5 Repercussões Sociais
Para abordar a hanseníase como tema de pesquisa, não se pode esquecer que ela é
uma doença que apresenta como seu maior problema, o âmbito social. Segundo Queiroz
(1995), ela está inevitavelmente impregnada de fatores sociais e culturais.
Em entrevistas realizadas com portadores de hanseníase (Abedi, Javadi, & Naji,
2013), foi possível perceber que todos descreveram que passaram por experiências e
sentimentos negativos e sofreram estigma social. Eles têm medo de serem rejeitados pelas
outras pessoas e de serem expulsos do trabalho, assim como, de serem percebidos como
pessoas diferentes. Estas situações se apresentam como obstáculos para uma integração ou
reinserção social e produtiva destas pessoas. Segundo Lira e colaboradores (2005), os
problemas de vida trazidos pela hanseníase, como o desespero, o sofrimento social, a
desmoralização e a perda de esperança no futuro são assuntos que também dizem respeito à
Saúde Pública.
Dentro destes aspectos das repercussões sociais, pode-se introduzir o conhecimento
gerado pela Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF). Este
sistema de classificação integra a Família de Classificações Internacionais formuladas pela
Organização Mundial de Saúde (WHO, 2002). A CIF padroniza e estrutura a descrição de
saúde e os estados relacionados à saúde, identificando as limitações que uma pessoa pode
apresentar em sua vida diária, tendo em vista as funções dos órgaos ou sistema e as estruturas
do corpo, assim como as limitações de atividades e da participação social no ambiente em que
a pessoa vive. Dentre os componentes do contexto de saúde estão a funcionalidade (funções e
estruturas do corpo, atividades e participação), a incapacidade (deficiência, limitação da
atividade, restrição de participação) e os fatores pessoais e ambientais (Brasil, 2008c; WHO,
2002).
Em relação ao critério de incapacidade gerada pela hanseníase, como exemplo citado
no material relacionado à CIF (WHO, 2002), está definida a deficiência pela perda de
sensibilidade nas extremidades, a limitação de atividade está delimitada pela dificuldade para
apanhar objetos, e a restrição de participação está destacada pelo estigma que leva ao
desemprego.
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Baseando nos compontes da CIF, o material do MS (Brasil, 2008c) exemplifica a
hanseníase (Figura 1).
Figura 1: Interações entre os componentes da Classificação Internacional de Funcionalidade
(Brasil, 2008c, p. 94)
Entre as repercussões sociais ligadas à hanseníase, esta pesquisa de mestrado teve
como foco o estigma, o isolamento social e o suporte social.
2.5.1 Estigma.
Para compreender melhor o conceito de estigma, é preciso entender primeiramente a
sua descrição inicial. Goffman (2012) é um dos primeiros autores que traz esta definição, ao
descrever o termo estigma quando se refere aos sinais corporais que algumas pessoas
apresentavam para evidenciar alguma coisa extraordinária ou má sobre o status moral delas.
Descreve três tipos de estigma,
em primeiro lugar, há as abominações do corpo – as várias deformidades físicas. Em segundo, as culpas de caráter individual, percebidas como vontade fraca,
paixões tirânicas ou não naturais, crenças falsas e rígidas, desonestidade, sendo
essas inferidas a partir de relatos conhecidos de, por exemplo, distúrbio mental,
prisão, vício, alcoolismo, homossexualismo, desemprego, tentativas de suicídio e comportamento político radical. Finalmente, há os estigmas tribais de raça, nação e
religião, que podem ser transmitidos através de linhagem e contaminar por igual
todos os membros de uma família. (Goffman, 2012, p. 14).
Em todas estas situações, há um indivíduo que poderia ser facilmente recebido em
uma relação social, porém ele apresenta um atributo que se pode impor à atenção e afastar os
outros, impedindo a atenção a seus outros atributos (Goffman, 2012).
Link e Phelan fazem uma ampliação ao conceito original de estigma, proposto por
Goffman, para um contexto social. A literatura atual mostra o conceito de estigma não apenas
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33
dependente de uma característica indesejável de um indivíduo ou de um grupo, mas
construída por um contexto social ao qual este indivíduo e este grupo pertencem
(Sermrittirong & Van Brakel, 2014).
Segundo Link e Phelan (2001), para que o estigma ocorra é necessário ter a interação
entre cinco componentes: a rotulação, a associação com um estereótipo, a discriminação e a
perda de status, todos estes associados a um jogo de poder. Em relação às consequências do
estigma para as pessoas estigmatizadas, o principal impacto é a internalização do estigma,
caracterizando o estigma internalizado ou o autoestigma. A internalização do estigma
acontece quando o indivíduo torna-se consciente dos estereótipos negativos que as outras
pessoas endossam (consciência dos estereótipos), concorda pessoalmente com esses
estereótipos (concordância com estereótipos) e, os aplica a si mesmos (Corrigan, Watson, &
Barr, 2006).
Atualmente, o termo estigma vem sendo utilizado de maneira semelhante ao original,
porém com a diferenciação de dois tipos de estigma, o estigma público e o estigma
internalizado (Corrigan & Wassel, 2008).
Através destas considerações realizadas, pode-se perceber que o estigma é de fato um
acontecimento presente nos indivíduos com hanseníase. Rafferty (2005) o define como um
fenômeno real na vida dessas pessoas, afetando suas dimensões física, psicológica, social e
econômica.
Em um trabalho realizado por Opala e Boillot (1996), o estigma foi identificado sob
três aspectos: relacionado à doença em si, à pessoa com hanseníase e ao estigma bíblico.
Interessante destacar que este último tipo de estigma não diminui a despeito do tratamento e
cura da doença. Através de relatos de experiências de indivíduos com hanseníase, foi possível
perceber o estigma dentro deles mesmos. O desconhecimento acerca da doença gera um
grande pânico, trazendo sentimentos de medo, vergonha, culpa, tristeza, constrangimento,
exclusão social, rejeição e raiva (Baialardi, 2007; Eidt, 2004).
Para Bailardi (2007) todos estes sentimentos estão internalizados no psiquismo dos
hansênicos. Percepções de estigma e de discriminação causam esses sentimentos de vergonha,
que consequentemente podem causar o isolamento desses indivíduos, devido à perpetuação do
estereótipo de que a hanseníase é algo vergonhoso que precisa ser escondido (Arole,
Premkumar, Arole, Maury, & Saunderson, 2002).
Por meio dessas percepções pode-se compreender então, que apesar dos avanços no
tratamento e controle da hanseníase nos últimos anos, algumas características não sofreram
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modificações, como o estigma existente nos portadores de hanseníase, simbolizado pela
imagem e representação da lepra (Garcia, 2001).
Weiss (2008) caracteriza o estigma e a discriminação como forças poderosas que
afetam a vida das pessoas portadoras de condições de saúde estigmatizadas. Em um estudo
com indivíduos afetados pela hanseníase na Indonésia (Van Brakel et al., 2012) com objetivo
de avaliar a extensão das incapacidades e seus determinantes nesta população, mostrou que
atitudes estigmatizantes relacionadas à vergonha são as formas de problemas mais
predominantes, seguidas pela dificuldade de se casar, problemas no casamento e problemas
para encontrar um emprego.
O livro “Notas sobre a manipulação da identidade deteriorada” escrito por Goffman
(2012) pontua especificamente a questão dos “contatos mistos”, ou seja, os momentos que os
estigmatizados e os, ditos, normais estão presentes em uma mesma “situação social”.
Entretanto, os estigmatizados podem esquematizar as suas vidas de forma a evitar o contato
com os outros, se isolando. Consequentemente tornam-se desconfiados, deprimidos, hostis,
ansiosos e confusos. Nestes momentos sociais, o estigmatizado nunca saberá em qual
categoria será colocado pelo o outro, sempre se sentirá inseguro.
Um indivíduo que tenta encobrir seu atributo leva uma vida dupla. Quando o fato
aconteceu no passado, ele ficará preocupado não tanto com as fontes originais, mas mais com
as pessoas que podem retransmitir a informação. Quando o fato está no presente momento, ele
deve prevenir-se contra a informação transmitida e para não ser pego em flagrante. Este
indivíduo aprende os lugares aos quais pode frequentar. Há uma divisão do mundo em lugares
(públicos, proibidos e retirados), esta divisão estabelece o preço que se paga pela revelação ou
pelo ocultamento, e o significado que tem o fato do estigma ser conhecido ou não. O mundo e
o indivíduo estão divididos pela sua identidade social (Goffman, 2012).
Goffman (2012) acrescenta que este encobrimento traz consequências ao individuo,
este que se encobre tem necessidades não previstas que o obrigam a dar uma informação ou
ter que dar explicações a mais. Esse indivíduo sofre um “aprofundamento de pressões”, pois
está sujeito à pressão para elaborar mentiras para evitar uma revelação. Essas técnicas
adaptativas podem ferir sentimentos e dar lugar a desentendimentos por parte das outras
pessoas. Seus esforços para esconder certas incapacidades o levam a revelar outras ou a dar a
impressão de fazê-lo. O que pode acontecer também é que aquele que se encobre está sempre
sujeito a ouvir o que os outros “realmente” pensam sobre o tipo de pessoa ao grupo que ele
pertence. Sempre corre o risco de ser desmascarado, passando por situações embaraçosas.
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O fenômeno do encobrimento sempre levantou questões referentes ao estado
psíquico da pessoa que se encobre. Primeiro, supõe-se que ela deva pagar um alto preço
psicológico, um nível muito alto de ansiedade, por viver uma vida que pode entrar em colapso
a qualquer momento. Mas, estudos com estas pessoas mostram que nem sempre há esta
ansiedade e que, neste ponto, as concepções tradicionais sobre a natureza humana podem
enganar seriamente. Segundo, a pessoa que se encobre estará dividida entre duas lealdades:
uma, se sentirá alienada em seu novo “grupo” porque não se identifica de maneira completa, e
outra, se sentirá desleal e desprezível por não poder responder observações feitas por
membros da categoria a qual pertence e se encobre. Terceiro, a pessoa que se encobre deverá
estar atenta a aspectos da situação social que outras pessoas tratam como rotineiros. É
necessário um controle de tempo especial, é a prática de “viver atado a uma corda” por meio
da qual a pessoa permanece próxima ao lugar onde pode retocar seu disfarce ou abandoná-lo
momentaneamente (Goffman, 2012).
Goffman (2012) também descreve técnicas de controle da informação, como as
estratégias para o encobrimento para manipular uma informação. Das quais temos as
estratégias de esconder ou eliminar signos que se tornem símbolos de estigma – ocultamento
de símbolos de estigma; apresentar os signos de seu estigma como signos de outro atributo
que seja um estigma menos significativo; manusear os riscos, dividindo o mundo em um
grande grupo ao qual ele não diz nada e um pequeno grupo ao qual ele diz tudo e sobre o qual
ele se apoia, exibindo uma máscara para as pessoas de maior perigo – esta é uma estratégia
amplamente empregada. Essa estratégia é a de manipulação e é recomendada frequentemente
pelos médicos, em especial, quando são os primeiros a informar ao indivíduo sobre seu
estigma. Cita-se no livro o próprio exemplo estudado que é a hanseníase – lepra, o qual se
sugere que o novo segredo fique entre os médicos, o paciente e os familiares mais próximos;
os médicos propõem esse tipo de discrição para garantir uma continuação da cooperação do
paciente.
A estratégia de manter relações distantes assegura que não ocorra a possibilidade do
indivíduo ser revelado. Porém, ao manter esta distância física, o indivíduo pode restringir sua
própria vida social.
2.5.2 Isolamento Social.
Oliveira e Romanelli (1998) referem que quando o indivíduo apresenta os sinais
físicos da doença, esta se torna visível aos outros, fazendo com que a aparência provoque um
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impacto negativo, levando estas pessoas a um processo de autorrejeição. Consequentemente,
elas se escondem para não dar explicações aos outros, representando, assim, reações de
autoestigmatização (Baialardi, 2007; Oliveira & Romanelli, 1998). Caracterizando também
esta atitude como uma autodefesa.
O MS trata estas incapacidades e deformidades físicas como uma causa de estigma e
isolamento que os indivíduos com hanseníase sofrem. Em um estudo piloto para validar um
conjunto de instrumentos para mensuração do estigma em hansenianos na Índia (Rensen,
Bandyopadhyay, Gopal, & Van Brakel, 2011), foram observadas diferenças significativas nos
resultados das escalas entre as pessoas com hanseníase que apresentavam e as que não
apresentavam sinais visíveis da doença, mostrando que este é um fator que pode agravar os
sintomas do estigma e isolamento.
Neste aspecto referente à visibilidade do estigma, Goffman (2012) diferencia dois
tipos de pessoas, uma é a pessoa desacreditada, nesta o estigma se apresenta visivelmente, a
outra é a pessoa desacreditável, nesta o estigma está invisível e não se percebe diferença dos
outros. Assim, coloca-se que a pessoa desacreditada passa por restrições frente à aceitação
social na vida cotidiana, e a pessoa desacreditável pode fazer a manipulação da informação
sobre sua pessoa. Como visto anteriormente, a visibilidade ou não dos sinais da hanseníase
pode afetar os indivíduos de maneiras diferentes (Rensen et al., 2011).
Assim, para se evitar uma situação desagradável, o indivíduo pode esconder seu
estigma, sendo que algumas vezes, este estigma pode ser invisível e conhecido apenas pela
pessoa que o possui. Netas situações de encobrimento, mesmo quando alguém mantém
segredo de sua condição, há uma confissão mútua com as pessoas íntimas. Que,
consequentemente, pode levar a pessoa a admitir sua situação ou sentir-se culpado por não
fazê-lo (Goffman, 2012).
Este isolamento se reflete na redução de participação social das pessoas com
hanseníase (Nicholls et al., 2005). Estas implicações sociais são percebidas também em
regiões não endêmicas, como neste trabalho realizado na Holanda, o qual mostra que os sinais
visíveis da doença formam um obstáculo importante à participação social destas pessoas
(Groot, Van Brakel, & de Vries, 2011). Os autores perceberam que a exclusão, o autoestigma
e a restrição de participação fazem parte da realidade cotidiana de muitos indivíduos que já
foram curados.
Em um trabalho na Indonésia com pessoas afetadas pela hanseníase (Van Brakel et
al., 2012), foi aplicada a Escala de Participação para mensurar o grau de restrição de
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participação desta população. Além disto, os autores verificaram que a participação está
significativamente relacionada à idade, nível de escolaridade, números de lesões, nível de
atividade e estigma, não havendo influência com o gênero. Eles perceberam que o maior nível
de escolaridade se caracteriza como um efeito protetor para a participação.
Em resumo, a vida de uma pessoa estigmatizada é fatigante, pois propõe que ela é
igual a qualquer outra pessoa e que ela não o é. Essa contradição constitui a sua sorte e seu
destino. O individuo estigmatizado vive dentro de uma arena de argumentos e discussões
referentes ao que ele deveria pensar de si mesmo, ou seja, à identidade de seu eu. Sendo
empurrado em várias direções por profissionais que falam o que deveria fazer e pensar
(Goffman, 2012).
2.5.3 Suporte Social.
Gonçalves e colaboradores (2011) realizaram um levantamento de todas as
publicações científicas brasileiras nos últimos 20 anos (1987-2007) que abordavam o suporte
social. Realizaram uma busca aos trabalhos que apresentavam entre as palavras chaves os
termos “apoio social”, “suporte social” e “rede social”. Esses autores apontam um
crescimento de estudos brasileiros que avaliam o apoio social em diversas situações, entre
elas, as que se relacionam a alguma doença, crise desenvolvimental e vulnerabilidade física
e/ou social, revelando, desta forma, a importância deste tema de estudo nesses contextos e
destacando a promoção à saúde. Entretanto, os autores observaram que não há uma clareza na
descrição dos aspectos conceituais do apoio social, e que a maioria dos estudos apresentam os
termos relacionados ao apoio social, já citados anteriormente, como sinônimos (Gonçalves et
al., 2011).
Neste trabalho, o termo suporte social foi utilizado devido a sua utilização na escala
aplicada nesta pesquisa. Uma das primeiras conceituações sobre o suporte social referencia-se
à “informação que leva o indivíduo a acreditar que ele é cuidado, amado, estimado e que
pertence a uma rede social com obrigações mútuas” (Cobb, 1976, p. 300).
O suporte social é apontado por estudiosos de diversas áreas do conhecimento como
um fator capaz de proteger e promover a saúde, sendo também relacionado à capacidade das
pessoas lidarem com situações difíceis (Siqueira, 2008). Seidl e Tróccoli (2006) apontam que
a disponibilidade e a satisfação com o apoio social auxiliam as pessoas portadoras de doenças
crônicas. Assim como as pessoas soropositivas, os portadores de hanseníase vivenciam
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situações de preconceito, e juntamente com o estigma e a discriminação, culminam para o
isolamento social e a restrição dos relacionamentos sociais.
Entre os benefícios do suporte social, pode-se correlacioná-lo à aderência no
tratamento medicamentoso (DiMatteo, 2004) e associá-lo à autoestima e ao aumento do
otimismo, o que consequentemente, influencia na redução dos casos de depressão (Symister
& Friend, 2003). Assim, pode-se perceber a importância do apoio social para o doente ao lidar
com sua doença e da necessidade deste (Casaes, 2007).
Em relação à hanseníase, pode-se pensar que a presença deste suporte auxiliaria na
redução do medo de rejeição e do isolamento social. O apoio dos familiares, amigos e
profissionais de saúde ajudaria na recuperação do doente e em sua reintegração social
(Casaes, 2007). Em entrevistas realizadas com pacientes portadores de hanseníase em Santa
Catarina, foi possível observar que quando estes pacientes recebiam apoio da unidade básica
de saúde e eram orientados, passavam a ver a sua patologia com mais naturalidade,
enfrentando melhor sua situação (Silveira & Silva, 2006).
Goffman (2012) também destaca a importância dada às pessoas íntimas, as quais não
apenas ajudam a pessoa estigmatizada em sua manipulação, mas também fazem a função de
servir como um círculo protetor. Este círculo faz a pessoa estigmatizada pensar que é mais
amplamente aceita como uma pessoa normal do que ocorre na realidade. É interessante
observar também a ajuda mútua entre os que compartilham o mesmo estigma particular, onde
se torna evidente o fato de que os que podem ser mais ameaçadores são aqueles que podem
dar maior assistência.
Em relação às fontes do suporte social, estas podem ser diversas, entre elas, o
parceiro, os familiares, os amigos, as pessoas de instituições religiosas e os profissionais de
saúde. Destas, pode-se destacar a última para uma categoria de suporte formal (Seidl &
Tróccoli, 2006). Pensando em todo contexto social e cultural associado à hanseníase,
compreende-se que este suporte social é essencial para o processo de diagnóstico, manutenção
do tratamento, cura e reinserção dos indivíduos com hanseníase.
A partir do conhecimento teórico de todos estes aspectos, destaca-se a relevância
deste tema devido à grande inserção da hanseníase no contexto brasileiro e em especial, na
Zona da Mata Mineira. Assim, tem-se o intuito de conhecer essa população, a sua percepção
do estigma frente à doença e a repercussão que a hanseníase está causando em suas vidas.
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CAPÍTULO 3: OBJETIVOS
O objetivo do presente trabalho foi avaliar a percepção do estigma nos indivíduos
com hanseníase na Zona da Mata Mineira e relacioná-la com o grau de restrição de
participação e o suporte social.
Objetivo específico
a) Caracterizar o perfil social, clínico e epidemiológico destes indivíduos.
b) Avaliar o grau de restrição de participação, e a disponibilidade e a satisfação do
suporte social recebida por estes indivíduos.
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CAPÍTULO 4: MÉTODO
4.1 Delineamento da Pesquisa
O estudo apresenta um desenho transversal, de caráter exploratório com abordagem
quanti-qualitativa. As pesquisas qualitativa e quantitativa apresentam diferenças e
semelhanças em certos pontos. A pesquisa quantitativa atua em níveis da realidade onde os
dados se apresentam aos sentidos, enquanto a pesquisa qualitativa trabalha com os sentidos
particulares e os significados coletivos, os valores, as crenças, as representações. De modo
semelhante entre elas, pode-se destacar que mesmo que de naturezas diferentes quanto ao
ponto de vista metodológico, ambas as formas de pesquisas buscam compreender e interpretar
o fenômeno pesquisado (Denzin & Lincoln, 2006).
Alguns autores defendem que estes dois paradigmas – qualitativo e quantitativo,
partilham o fato de ambos estudarem os fenômenos reais, com processos sociais e de ambos
atribuírem sentido aos seus dados. Esses dois métodos se inter-relacionam, os investigadores
estão inseridos em uma mesma comunidade sendo afetados por atitudes, valores e crenças, e
que nunca existirá a separação entre fatos e valores. A utilização desses dois métodos
simultaneamente em uma pesquisa acrescenta “olhares” para um mesmo fenômeno, tornando-
se uma vantagem, pois se obtém mais informações diferentes ao estudo (Duarte, 2009).
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