recensão quando eu for
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FICHA DE LEITURA
QUANDO EU FOR GRANDE, QUERO IR À PRIMAVERA
de José Pacheco
2009
SETÚBAL
Ilda Pereira
Referência bibliográfica:
Autor: PACHECO, JoséTítulo: Quando eu for grande quero ir à PrimaveraLocal de edição: PortoEditora: Profedições – 2ª ediçãoData de edição e páginas: 2001. p. 15 – 19
Tema e assunto:
Pressupõe-se que o conto constitua um apontamento, pessoal e profissional, de José
Pacheco, o seu autor, passado com o próprio, na Escola da Ponte, onde é Professor.
Baseado numa linguagem corrente, mas metafórica, José Pacheco faz uma análise
crítica, não só do momento sócio-político do regime da altura, como da corrente
pedagógica que orientava a prática de uma docência que se estava a desvanecer nos seus
ideais, sem deixar de apontar outros princípios por onde, por certo, iriam passar –
obrigatoriamente – os destinos daquela Escola.
Resumo:
José Pacheco inicia o conto apresentando-se como um Professor imaturo, dependente da
sua inexperiência, que aceitara o desafio de uma prática pedagógica sob influência do
MEM, grupo de professores que defendia e praticava uma pedagogia de vanguarda que,
ao tempo, lembraria uma certa clandestinidade militante. Baseado e influenciado por
Freinet – pedagogia que se baseia essencialmente nos utensílios e nas técnicas, pois são
estes elementos que modificam todos o ambiente e dinâmica da sala de aula, surgindo,
portanto, como uma nova concepção de escola –, rapidamente verificou a dificuldade
em o seguir, tendo em conta o peso de uma realidade escolar de outros tempos e de
outras concepções educativas. Apresenta-se-lhe uma turma numerosa devidamente
enquadrada numa linha tradicionalista de ensino, cujos alunos eram considerados tábuas
rasas que fraseavam um sem número de saberes decorados – tabuadas “cantadas”,
estações de caminho-de-ferro bem “encaixadas”, e etc. –, sem sentido e sem interesse,
sendo evidente as marcas de uma pedagogia conservadora e não preparada para os
novos valores que emergiam.
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Ao “texto livre” sugerido pelo novo Professor, os alunos continuavam teimosamente a
chamar “redacção” e o tema preferido e sempre escolhido continuava a ser “A
Primavera”, ainda que o Outono já desse os seus ares de graça e o Natal já se
vislumbrasse no horizonte. O texto apresentava a marca de um protótipo que se
caracterizava em frases feitas, transmitidas de forma automatizada, e que evidenciava
uma pedagogia sem criatividade e sem graça, que não se pretendia ultrapassar porque,
segundo a linha de pensamento que imperava: a pedagogia é a arte de ensinar tudo a
todos como se fossem um só.
Mas algo começava a ser diferente, a modificação fazia-se sentir nos rituais até então
estabelecidos. Todas as manhãs, as carteiras perdiam o aspecto alinhado em direcção ao
quadro, da aula da tarde, e adquiriam a formação em grupo, alguns textos livres eram
seleccionados para o jornal, que ia no seu terceiro número, e que estes jornais se
vendiam e que o dinheiro apurado era utilizado na compra de material necessário ao
trabalho diário na sala e que novos utensílios podiam ser utilizados e construídos pelos
alunos. O professor apresentava propostas e sugestões e a turma passou a ser a
assembleia de alunos a quem se pedia tomadas de posição… algo estava realmente a
mudar!
Autorizado a ler os textos sobre a Primavera, em vez de serem os alunos como era
habitual, o Professor leu-os um a um, pedindo no fim de cada leitura a identificação do
seu autor. Após a primeira leitura, mais de vinte braços se levantaram lançando a
confusão na sala. Com a segunda, repete-se a situação, mas aos poucos as crianças
percebem o que isso significa – a mensagem tinha sido compreendida – e aceitam
facilmente que novas regras fossem adoptadas na escrita de outros textos. Regras
propostas pelo novo Professor, que aceitava que se mantivesse o tema da Primavera já
que era o preferido dos alunos, mas não poderiam utilizar as frases habituais como “eu
gosto muito da Primavera, as andorinhas fazem os ninhos…”
Não foi fácil pensar numa mudança, na construção de textos diferentes. Inseguros,
hesitantes, inicialmente perdidos, os miúdos lá foram escrevendo, cada qual o seu texto
e cada um segundo o seu ritmo. No final, o Professor voltou à leitura dos textos, um a
um e, no final de cada um, perguntava quem o houvera escrito. E dessa vez,
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contrariamente à primeira, a cada pergunta apenas um bracito, seguro, firme, consciente,
se levantara.
Opinião do utilizador:
Esta obra foi de consulta fácil e de compreensão acessível. Não reconheço limitações ou
defeitos da obra. Considero-a simples mas com riqueza de mensagem. Achei-a interessante e
penso que poderá servir como matéria de referência a todos os profissionais da educação que
se deparem com situações de “igual índole”, ou seja, conservadoras, desactualizadas e que
careçam de mudança. Pode ser tida como uma pequena história de grande valor, pois ela
espelha uma resistência à mudança, num contexto escolar, e a forma fascinante como este
Professor conseguiu transmitir às suas crianças uma mensagem tão clara, assumindo desta
forma o seu papel de agente de mudança, precursor da inovação pedagógica.
Reflexão pessoal sobre a temática
À emoção deste professor associa-se a imagem de um triunfo, a conquista de uma
pequena grande batalha que assinala o início de um novo caminho, o caminho da
mudança, da aceitação de uma nova era na história do ensino; o perspectivar de uma
pedagogia mais promissora, direccionada para uma acção educativa que visa o
desenvolvimento das capacidades dos seus alunos, estimulando a sua autonomia e
criatividade.
Durante a minha infância, também aos actuais “textos livres” se chamavam “redacções”
e muitas foram as que eu fiz, desde a 1ª até à 4ª Classe. Mas os temas propostos eram,
aceitavelmente, bem mais diversificados. Contudo, o tipo de docência praticada pelo
conservadorismo educativo aqui referido – que é retratado de forma a evidenciar as
incongruências que enfermavam a vida do ensino da altura –, era, em muitos aspectos,
idêntico aquele que eu vivenciei: as carteiras todas alinhadas religiosamente em
direcção ao quadro, o cantarolar do B mais A, igual a BA, os raciocínios matemáticos
que se prendiam quase exclusivamente a uma tabuada bem decorada e pouco explicada,
pois a preocupação central era a memorização e a repetição dos conceitos… as minhas
vivências escolares muito pouco tiveram de interacção, de experimentação e de
momentos lúdicos.
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Felizmente, os modelos e métodos de ensino empregues foram repensados, surgindo
a necessidade de uma nova conceptualização daquilo que é e se pretende, globalmente,
do ensino e da aprendizagem… e os tempos mudaram, surgindo uma nova visão sobre
as metodologias educativas em oposição à tradicional prática pedagógica constituída
pela submissão, calcada no centralismo do adulto e na transmissão passiva de
conteúdos. Desta forma, somos desafiados a considerar o ensino (e consequentemente, o
processo educativo realizado na escola/ JI) como uma construção pessoal, levada a cabo
pelas várias descobertas e atribuições de significado em um processo dinâmico de
construção e desconstrução.
Estas novas práticas pedagógicas são cada vez mais visíveis nos vários contextos
educativos. Facilmente nos apercebemos disso ao observarmos os inúmeros trabalhos
que são realizados em contexto escolar pelos alunos, tendo em vista uma dinâmica de
interacção, de experimentação, não deixando de ser, por isso, também de
responsabilização. No decorrer do Ano Lectivo, é comum observar a preocupação do
Corpo Docente em levar os seus alunos a visitas de estudo, onde podem observar de
forma activa e interactiva a origem de conhecimentos adquiridos na sala de aula, tal
como a promoção de dinâmicas de grupo, e muito importante, a aposta na relação
educativa que se estabelece, no sentido de potencializar e optimizar todo o processo de
ensino-aprendizagem.
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