promotoria de justiÇa da comarca de crixÁs · fornecia combustível à prefeitura de crixás/go....
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE
CRIXÁS/GO
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO GOIÁS, por meio de seu
representante legal ao final assinado, vem a presença de Vossa Excelência, com
fulcro nos artigos 37, § 4º, e 129, inciso III, da Constituição Federal; na Lei Federal
n. 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa); e no art. 2º, inciso II, 3º, 5º caput,
todos, da Lei Federal n. 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPOSIÇÃO DE SANÇÕES POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
em face de:
BRAULIO APARECIDO PEREIRA DOS SANTOS, brasileiro, solteiro,
auxiliar de escritório, portador do RG nº 3657548 – 2ª via SPTC/GO, natural de
Crixás/GO, filho de Estevam Pereira dos Santos, nascido em 05/08/1979, residente
na Rua 01, nº 13, Setor Vila Nova, Crixás/GO;
FLAMARION DURAES RODRIGUES, brasileiro, amasiado, pecuarista,
portador do RG nº 3162490-1791850 SSP/GO, natural de Crixás/GO, nascido em
25/10/1971, filho de Colemar da Silva Duraes e Ana Rodrigues Duraes, residente na
Rua 16, Qd. 16, Lt. 12, nº 244, Setor Vila Nova, Crixás/GO;
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
PAULO HENRIQUE RODRIGUES, brasileiro, casado, ajudante de pintor,
portador do RG nº 3181493 – 2º Via, natural de Rubiataba/GO, nascido em
03/08/1975, filho de Paulo Rodrigues Tarao e de Leni Maria Gonçalves Rodrigues,
residente na Alameda Rio Vermelho, nº 77, Centro, Crixás/GO;
OSVALDO CANDIDO DA SILVA, brasileiro, casado, frentista, portador
do RG nº 3313313-4325346 SSP/GO, natural de Formoso/GO, nascido em
20/02/1966, filho de Manoel Candido da Silva e de Hilda Ribeiro de Souza, residente
na Rua 2016, Qd. 39, Lt. 08, Setor Novo Horizonte, Crixás/GO;
MORAIS FERREIRA DE BARROS, brasileiro, casado, frentista, portador
do RG nº 2564797 SSP/GO, natural de Crixás/GO, nascido em 15/09/1968, filho de
Manoel Ferreira de Barros e de Maria das Dores Barros, residente na Rua D, Qd.
29, Lt. 04, casa 91, Setor Vila São João, Crixás/GO; e
DIVINO CARLOS DE SOUZA, brasileiro, casado, frentista, portador do
RG nº 2910459 SSP/GO, natural de Itapaci/GO, nascido em 11/11/1967, filho de
Rosalvo de Souza Costa e de Tereza Estevão da Costa, residente na Rua 13, Qd. L,
Lt. 20, Setor Morada do Sol, Crixás/GO
pelos seguintes fundamentos fáticos e jurídicos:
I – DOS FATOS
A Promotoria de Justiça de Crixás recebeu, em 01/03/2004,
representação da Câmara Municipal de Vereadores de Crixás/GO, no qual os
vereadores Altaíde Caetano Lacerda, Carlos Antonio Maciel e Willian Xavier
Machado informaram que existia o boato de que servidores do alto escalão da
Administração Pública do Município de Crixás, conseguiram em conluio desviar
vários litros de combustível do estabelecimento “Posto Bandeirante”, nesta cidade.
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
Os vereadores representantes, concomitantemente levaram a notícia à
Delegacia de Repressão Contra os Crimes da Administração Pública.
No dia 02/03/2004 o Ministério Público instaurou, através da portaria nº
01/2004 o inquérito civil anexo, com a finalidade de investigar as noticias trazidas a
conhecimento.
Requisitadas informações acerca do ocorrido, o Sr. Preito Municipal
encaminhou o procedimento administrativo instaurado na prefeitura municipal de
Crixás, que culminou na demissão do servidor público Bráulio Aparecido Pereira dos
Santos (fls. 12/90 dos autos anexos).
Verificou-se existir um esquema para a prática de atos lesivos ao
patrimônio público e que beneficiariam ilicitamente o então servidor público, ora réu,
Bráulio Aparecido Pereira dos Santos e os litisconsortes Flamarion Duraes
Rodrigues, Paulo Henrique Rodrigues, Osvaldo Candido da Silva, Morais Ferreira de
Barros e Divino Carlos de Souza, estes frentistas do Posto Bandeirantes, que
fornecia combustível à Prefeitura de Crixás/GO.
Consta que Bráulio era servidor comissionado da Prefeitura Municipal de
Crixás/GO e exercia desde o ano de 2000 o cargo de Chefe de Divisões de
Compras. Em setembro do ano de 2003, juntamente com Flamarion, Bráulio
arquitetou um plano para utilizar requisições de abastecimento da Prefeitura
Municipal para sacar dinheiro do caixa do Posto Bandeirantes, sendo o valor
angariado de forma criminosa. A intenção era a obtenção de vantagem ilícita em
desfavor da municipalidade de Crixás/GO, que arcaria com o pagamento.
Para dar início aos atos ímprobos, Bráulio subtraiu dois blocos de
requisições da Prefeitura Municipal, cada um contendo 50 (cinqüenta) folhas.
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
De posse dos blocos, Bráulio falsificava as assinaturas dos servidores
municipais Graciliano José Barbosa e João Guilherme Nunes, responsáveis pelas
autorizações de abastecimento dos veículos pertencentes ao município. Esta
conclusão é possível pela análise do laudo de exame pericial grafotécnico, realizado
pela Polícia Civil (fls. 421/478 dos autos anexos) que determina que “as assinaturas
questionadas, lançadas no espaço destinado a assinatura do Secretário de
Governo e Administração, foram produzidas pelo mesmo punho que grafou os
padrões em nome de Bráulio Aparecido Pereira dos Santos”.
Por sua vez, o réu Flamarion colaborou com as falsificações perpetradas,
eis que como funcionário do Posto Bandeirantes fornecia a Bráulio cópias de
requisições originais assinadas pelos servidores públicos responsáveis e com
atribuição, de modo que Bráulio pudesse falsificar as assinaturas.
De posse das requisições subtraídas e com as assinaturas falsificadas,
Bráulio entregava as requisições para Flamarion que completava seu
preenchimento, quando as requisições já não lhe eram entregues totalmente
preenchidas.
O valor constante nas requisições era convertido em dinheiro em espécie
e dividido entre Bráulio e os demais réus, todos frentistas do Posto Bandeirantes.
O esquema de enriquecimento ilícito gerou a vantagem de R$ 19.182,40
(dezenove mil, cento e oitenta e dois reais e quarenta centavos) aos réus, conforme
se verifica da soma das requisições originais juntadas aos autos de inquérito civil
público às fls. 74/86 e planilha descriminada de fls. 89/90.
As datas das apresentações das requisições evidenciam que os atos de
imoralidade se deram desde o dia 02 de setembro de 2003 até o dia 22 de
novembro de 2003.
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
Ouvido nesta Promotoria de Justiça, o réu Bráulio Aparecido Pereira dos
Santos confessou a prática dos atos, afirmando que “começou a trabalhar na
Prefeitura Municipal de Crixás, por volta do mês de Março de 2000 ocupando o
cargo comissionado de Chefe de Divisões de Compras; Que ficou neste cargo até a
data da exoneração; Que no final de Setembro de 2003 o Flamarion, frentista do
Posto Bandeirantes, localizado nesta cidade, procurou o declarante se o mesmo
tinha facilidade para conseguir notas de requisição de combustível, tendo o
declarante respondido que sim; Que o declarante esclarece que tinha em blocos em
branco de requisição de combustível da Prefeitura de Crixás, mas que não foram
utilizadas rodas as folhas, sendo que cada bloco tinha 50 folhas; Que o declarante
não sabe dizer quantas folhas de requisição foram utilizadas por ele e pelos
frentistas do Posto Bandeirantes; Que no começo de Ourubro de 2003 o Flamarion
procurou novamente o declarante indagando do mesmo se tinha intenção de ganhar
um dinheiro fácil; Que a partir desta data o declarante entregou algumas folhas em
branco de requisição de combustível ao Flamarion, sendo que o declarante não
sabe dizer se eram preenchidas pelo Flamarion, Paulo Henrique ou Osvaldo, todos
frentistas do Posto Bandeirantes; (...) Que enquanto trabalhava na Prefeitura de
Crixás sabe informar que o combustível, referente as requisições falsificadas, ainda
não tinha sido quitado pelo erário municipal; Que não sabe como era o
procedimento utilizado pelos frentistas do Posto Bandeirantes para o preenchimento
das requisições, mas que recebeu três parcelas de um mil e poucos reais pela sua
participação; Que ressarsiu (sic) o proprietário do Posto bandeirantes dos prejuízos,
no tocante a sua participação, repassando-lhe um lote de sua propriedade situado
na Rua do Comercio avaliado em aproximadamente oito a dez mil reais; Que
informa que todo procedimento de falsificação de requisições de combustível durou
cerca de três meses aproximadamente, ou seja de Setembro a Dezembro de 2003;
(...) Que o Flamarion entregou ao declarante xerox de requisição original assinada
pelo Graciliano, fato que facilitou a falsificação da assinatura do mesmo;(...)” (fls.
96/98 dos autos anexos).
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
O réu Flamarion Duraes Rodrigues, por sua vez, afirmou em Promotoria
de Justiça que: “(...) o funcionário municipal Bráulio era quem repassava as
requisições para o declarante e para o Paulo Henrique , Osvaldo, Divino, Morais,
Mauri; que esclarece o depoente que o Bráulio já repassava as requisições
assinadas, cabendo ao declarante o preenchimento restante; Que reafirma o
declarante que somente o Bráulio repassava as notas falsificadas ao declarante;
Que esclarece o declarante que no início em que começou a receber as notas
falsificadas do Bráulio não sabia que as mesmas eram falsificadas, não sabendo
precisar a data exata; Que desde o início o Bráulio repartia na metade os valores
constantes nas requisições, sendo que 50% ficava com o Bráulio e o restante era
repartido entre os frentistas do Posto Bandeirantes acima mencionados (...)”. (fls.
101/103 dos autos anexos).
O frentista Osvaldo Cândido da Silva, ouvido às fls. 108 nesta Promotoria
de Justiça também confirmou a participação e explicou como ocorria o procedimento
ilícito que objetivava o enriquecimento ilícito. Afirmou que o réu Bráulio ao chegar ao
posto colocava um pouco de combustível em seu veículo e o restante do valor de
combustível constante na requisição era convertido em valores e repartidos em
partes iguais entre ele, Flamarion, Paulo Henrique e Bráulio. Disse que os valores
convertidos em espécie eram referentes ao caixa do dia, que ficava na posse dos
frentistas em decorrência do abastecimento do veículos de particulares.
Igualmente o fato é confessado por Paulo Henrique Rodrigues (que
prestou depoimento em Promotoria de Justiça, conforme termo de fls. 110) e Divino
Carlos de Souza (interrogatório prestado em Juízo na ação penal em trâmite neste
foro sob o nº 19/2006 – fls. 498 dos autos anexos).
Morais Ferreira de Barros negou o fato quando questionado em Delegacia
de Polícia. Não foi localizado para ser citado na ação penal que tramita contra si no
Juízo de Crixás, conforme documento de fls. 489, verso, portanto não foi interrogado
judicialmente, até o momento.
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
Contudo, o réu Flamarion afirmou tanto em Promotoria de Justiça, às fls.
101/103 dos autos de inquérito civil, quanto em Juízo, em seu interrogatório judicial
de fls. 495/497 destes autos que Morais teve participação nos atos ímprobos
ocorridos.
Ressalta-se que assim que constatada a fraude, a municipalidade
suspendeu o pagamento das requisições do posto, sendo que os valores
provenientes das requisições falsificadas não foram suportados pelo erário público
municipal, conforme se denota do depoimento prestado pelo Sr. Prefeito Municipal
em Delegacia de Polícia às fls. 334/335, ofício de fls. 87, informando o Sr. Orlando
Marques Lessa, proprietário do posto lesado, da suspensão no pagamento das
requisições e declarações de fls. 104, prestadas pelo proprietário do Posto
Bandeirantes (todos os documentos dos autos de inquérito civil anexos).
Não obstante, é evidente a lesão os princípios da administração pública,
de modo que violados os deverem de honestidade, legalidade e lealdade às
instituições.
II – DO DIREITO
II.1 DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
A Ação Civil Pública, ex vi do disposto no artigo 1º da Lei n.º 7.347/85,
como fator de mobilização social, é a via processual adequada para impedir a
ocorrência ou reprimir danos ao patrimônio público, meio ambiente, ao consumidor,
a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico,
protegendo, assim, os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos da
sociedade, sendo que, diante de sua magnitude e excelência, mereceu assento
constitucional, como se extrai do art. 129, inciso III da Constituição da República
Federativa brasileira.
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
A ação civil pública protege interesses não só de ordem patrimonial como,
também, de ordem moral e cívica. O seu objetivo não é apenas restabelecer a
legalidade, mas também punir ou reprimir a imoralidade administrativa a par de ver
observados os princípios gerais da administração.
Não restam dúvidas de que o patrimônio público é um interesse de
dimensão difusa, o que autoriza sua tutela processual por intermédio da ação civil
pública. Nesse diapasão, caracteriza-se a tutela do patrimônio público, inclusive na
dimensão da moralidade administrativa, como um interesse metaindividual de
natureza difusa, sendo o Ministério Público parte legítima para aforar ação de
improbidade com a finalidade de punir os agentes ímprobos que violam os princípios
da Administração Pública.
Neste sentido, tem-se que a Carta Magna confere esta atribuição ao
Parquet:
“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos”.
Em consonância com essa orientação, a Lei Orgânica do Ministério
Público – Lei federal n.º 8.625/93 – assim estatui:
“Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e
Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:
IV – promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio
ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e
individuais indisponíveis e homogêneos;
b) para a anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio
público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas
administrações indiretas ou fundacionais ou de entidades privadas de que
participem.”
A Lei nº 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis nos casos de
prática de atos de improbidade administrativa estabelece a legitimidade ativa do Mi-
nistério Público:
“Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Mi-
nistério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de 30 (trinta) dias da efe-
tivação da medida cautelar”.
A remansosa jurisprudência da Corte Superior Federal culminou com a
edição da Súmula 329, assim redigida: “O Ministério Público tem legitimidade para
propor ação civil pública em defesa do patrimônio público”.
Patente, portanto, que o Ministério Público é parte legítima para aforar
ação civil pública em defesa do patrimônio público e da moralidade administrativa.
II.2 DA LEGITIMIDADE PASSIVA
Inicialmente cabe registrar que todos os demandados ocupam de forma
legítima o pólo passivo desta ação.
O réu Bráulio Aparecido Pereira dos Santos, ao tempo da ação dolosa,
praticada com o intuito de enriquecer-se ilicitamente, era servidor público municipal,
ocupante do cargo em comissão de Chefe de Divisões de Compras.
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
A Lei nº 8.429/92 no caput de seu artigo 1º dispõe que “os atos de
improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a
administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada
ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja
concorrido ou concorra com mais de 50% (cinqüenta por cento) do patrimônio ou da
receita anual, serão punidos na forma desta Lei”. (destaque nosso).
Por seu turno, o artigo 2º da mesma Lei determina:
“Art. 2º Reputa-se agente público, para os efeitos desta Lei, todo aquele
que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição,
nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou
vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo
anterior”. (grifo nosso).
Portanto, indiscutível que Bráulio Aparecido Pereira dos Santos tenha
legitimidade para estar no pólo passivo da presente ação de improbidade
administrativa.
Outra banda, os réus Flamarion Duraes Rodrigues, Paulo Henrique
Rodrigues, Osvaldo Candido da Silva, Morais Ferreira de Barros e Divino Carlos de
Souza, frentistas do Posto Bandeirante quando da ocorrência dos fatos narrados
nesta ação, mesmo não se inserindo na classificação legal de agente público, são
passíveis de sofrer as sanções da Lei nº 8.429/92, por expressa disposição desta
lei que disciplina:
“Art. 3º As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele
que mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática de ato de
improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta”.
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
Assim, considerando-se que Flamarion Duraes Rodrigues, Paulo
Henrique Rodrigues, Osvaldo Candido da Silva, Morais Ferreira de Barros e Divino
Carlos de Souza concorreram para a prática de ato de improbidade, ainda que este
não causou dano ao erário municipal eis que o pagamento das requisições
falsificadas foi cancelado, estão também sujeitos às sanções da Lei nº 8.429/92.
Colaciona-se o entendimento jurisprudencial uníssono sobre a
legitimidade de terceiro:
TRF1 - AÇÃO CAUTELAR DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL. REQUISIÇÃO DE DOCUMENTOS. RECUSA JUSTIFICADA DO BANCO
DO BRASIL. MÁ-FÉ DESCARACTERIZADA. ILEGITIMIDADE PARA FIGURAR NO
PÓLO PASSIVO DA CAUTELAR.
I - Legitimados passivos da ação civil por ato de improbidade são todos aqueles que tenham concorrido para a prática da conduta ímproba. Nesse sentido, devem ser submetidos a julgamento não só os agentes públicos que tenham violado o patrimônio público, mas também aqueles que tenham induzido ou concorrido para a prática do ato de improbidade ou dele tenham auferido qualquer benefício (art. 3º da Lei nº 8.429/92).
II - A má-fé é premissa do ato ilegal e ímprobo. A ilegalidade só adquire o
status de improbidade administrativa quando a conduta antijurídica fere os princípios
constitucionais da Administração Pública, ou quando há proveito patrimonial obtido
com a conduta ímproba.
III - No caso presente, independentemente do acerto ou não da posição
adotada pelo Banco do Brasil, a recusa por escrito e justificada afasta a má-fé e,
conseqüentemente, descaracteriza a legitimidade do agravante para figurar no pólo
passivo da ação cautelar.
IV - Agravo de instrumento provido.
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
(Agravo de Instrumento nº 2003.01.00.030849-4/DF, 3ª Turma do TRF da
1ª Região, Rel. Cândido Ribeiro, Rel. Convocado José Magno Linhares Moraes. j.
08.08.2006, unânime, DJU 06.10.2006).
TRF1 - PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-
PREFEITO. AGENTE PÚBLICO. LEI DE IMPROBIDADE. APLICABILIDADE A
AGENTES PÚBLICOS E TERCEIROS.
1. O art. 3º, da Lei nº 8.429/92 admite a possibilidade de incidência desse diploma legal àquele que, "(...) mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta", circunstância essa que retira a fundamentação jurídica de postulação relativa à absolvição de apelante com base na assertiva de não ser ele funcionário público.
2. Como o julgamento da Reclamação nº 2.138-6/DF ainda não restou
concluído, fica obstaculizada a sua aplicação ao caso presente, mormente quando,
pelo menos até o presente momento, tem sido reconhecida a competência do MM.
Juízo em primeiro grau de jurisdição para processar e julgar ação de improbidade,
independentemente da natureza do agente público que integra a relação processual.
3. Vislumbra-se, na forma em que demonstrado na v. sentença apelada e
no parecer do d. Ministério Público Federal, a teor dos fatos ali descritos, a
ocorrência de fundamento jurídico a ensejar a aplicação aos ora apelantes das
sanções previstas na Lei de Improbidade, o que leva, em conseqüência, à
manutenção da v. sentença apelada.
4. Sentença mantida.
5. Apelação a que se nega provimento.
(Apelação Cível nº 2006.42.00.000124-5/RR, 4ª Turma do TRF da 1ª
Região, Rel. I'talo Fioravanti Sabo Mendes. j. 03.10.2006, unânime, DJU
13.11.2006).
TRF1 - ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. CONTRATO ADMINISTRATIVO. COMPRAS. INEXECUÇÃO
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
PARCIAL. PARTICULAR. LEI Nº 8.429/1992, ART. 3º. ENTREGA DE
MERCADORIA. SIMULAÇÃO. INEXISTÊNCIA.
1. O contrato administrativo obriga a Administração e o particular, por isso
que a fiel execução das cláusulas contratuais "reflete o fiel cumprimento de tudo o
que foi avençado, e tal conduta é que deve se seguir ao ajuste, sobretudo porque é
de todos conhecido o postulado do pacta sunt servanda" (Cf. José dos Santos
Carvalho Filho, in Manual de Direito Administrativo, Editora Lumen Juris, 15ª edição,
2006, p. 176).
2. A inexecução parcial do contrato, consubstanciada na ausência do
depósito da garantia da execução pelo particular, bem como no pagamento
antecipado, pela Administração, do valor total pactuado, caracterizam atos de
improbidade administrativa. O extraneus que concorre ou se beneficia da prática do ato ilícito sujeita-se, nos exatos termos do art. 3º da Lei nº 8.429/1992, às sanções cominadas ao ímprobo.
3. A aplicação das graves sanções impostas pelo legislador ao acusado
da prática de ato de improbidade administrativa não pode estar fundada em frágeis
ilações. Ao revés, deve ter suporte em prova robusta e irrefutável, o que não se
verifica em relação à empresa que comprovou ter efetuado a entrega da mercadoria
adquirida pelo Município, cuja administração não teria se desincumbido do encargo
de distribuir os alimentos à população.
4. Improvimento da apelação de Dario Furtado Veloso e parcial
provimento da apelação de Eduardo Barbosa de Souza e Alvorada Comércio
Transportes e Importação e Exportação Ltda.
(Apelação Cível nº 2002.39.01.000341-0/PA, 3ª Turma do TRF da 1ª
Região, Rel. Olindo Menezes, Rel. Convocado Jamil Rosa de Jesus Oliveira. j.
06.11.2006, DJU 24.11.2006).
TRF1 - PROCESSO CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
RECEBIMENTO DA INICIAL. VIA ELEITA ADEQUADA. LEGITIMIDADE PASSIVA
DE TERCEIRO. REJEIÇÃO DA PETIÇÃO INICIAL. NÃO CABIMENTO.
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
1. As disposições da lei de improbidade administrativa "(...) são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta" (art. 3º da Lei nº 8.429/92).
2. Somente deverá ser rejeitada a petição inicial quando o julgador se
convencer de plano, da inexistência do ato de improbidade, da improcedência da
ação ou da inadequação da via eleita, a teor do que prescreve o art. 17, § 8º, da Lei
nº 8.429/92, o que não é o caso dos autos.
3. Agravo de instrumento ao qual se nega provimento. Agravo regimental
prejudicado.
(Agravo de Instrumento nº 2005.01.00.004876-5/DF, 4ª Turma do TRF da
1ª Região, Rel. Des. Fed. I'talo Fioravanti Sabo Mendes. j. 14.11.2005, unânime, DJ
12.12.2005).
TJMG - AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
CARACTERIZAÇÃO. INDENIZAÇÃO. DANO. PROVA. EXISTÊNCIA. EMPRESA
BENEFICIÁRIA. RESPONSABILIDADE. EXISTÊNCIA.
1. Os agentes públicos, ao deixarem de observar as formalidades legais
de processo licitatório, devem responder pelos danos correspondentes. Existente a
prova efetiva do dano material decorrente do ato ilícito praticado pelos réus, pela
falta de processo licitatório regular, pode-se falar na responsabilidade civil
correspondente.
2. Prevendo o art. 3º, da Lei nº . 8.429/92, a responsabilidade de terceiro como beneficiário do ato de improbidade administrativa, a sua condenação é imperativo legal.
3. Recurso provido.
(Apelação Cível nº 1.0024.93.010467-4/001, 2ª Câmara Cível do TJMG,
Belo Horizonte, Rel. Nilson Reis. j. 10.05.2005, unânime, Publ. 03.06.2005).
II.3 DOS ATOS DE IMPROBIDADE QUE ATENTAM CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (art. 11, da Lei n. 8.429/92)
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, § 4º, dispõe:
“Art. 37. A administração pública, direta, indireta ou fundacional, de
qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade,
eficiência e, também, ao seguinte:
§ 4º. Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos
direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade e o ressarcimento ao
erário, na forma e gradação prevista em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.
Com o escopo de conferir densidade normativa ao indigitado preceito
constitucional, foi editada a Lei n.º 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis
aos agentes públicos, nos casos de improbidade no exercício de mandato, cargo,
emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional.
O referido diploma normativo contempla, basicamente, três
categorias de atos de improbidade administrativa, a saber: em seu artigo 9º,
os atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito do
agente ou de terceiros; em seu artigo 10, os atos de improbidade
administrativa que causam prejuízo ao erário; e no artigo 11, os atos de
improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração
pública.
No caso sob análise verifica-se que o ato praticado pelos réus não
causou prejuízo ao erário, em que pese ter sido este o escopo de suas condutas.
Conforme antes exposto, os valores provenientes das requisições
falsificadas não foram suportados pelo erário público municipal, pois o Prefeito
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
Municipal, ao tomar conhecimento da ação estelionatária que a Prefeitura de Crixás
viria a sofrer, determinou a suspensão do pagamento do combustível.
O prejuízo foi suportado parcialmente pelo Posto Bandeirantes. Conforme
declarações de Orlando Marques Lessa (fls. 104 dos autos de ICP), os réus Bráulio,
Paulo Henrique e Osvaldo arcaram com parte do prejuízo.
Assim sendo, os réus também não obtiveram enriquecimento ilícito de
valores públicos.
Contudo, verifica-se que a ação dos réus foi marcada pela violação dos
princípios da legalidade e da moralidade. O requerido Bráulio tinha o dever de, como
agente público, atuar de forma honesta, proba e leal à instituição pública da qual
pertencia aos quadros. Os demais réus, concorrendo para o ato, também
respondem pelo ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios
da administração pública. Portanto, flagrante a violação aos artigos 4º e 11 da Lei de
Improbidade Administrativa.
“Art. 4º Os agente públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados
a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhes são afetos”.
“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra
princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres
de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e
notadamente:
omissis”.
Importante enfatizar que não existe a necessidade de enriquecimento de
econômico ou prejuízo ao erário, para a configuração do ato de improbidade
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
administrativa que atenta contra princípio da administração púbica. Não se pode
olvidar que o princípio da moralidade administrativa é tutelado genericamente.
Aliás, a própria Lei de Improbidade Administrativa, em seu inciso I, do art.
21, estabelece que a aplicação das sanções previstas na Lei independe de efetiva
comprovação de dano ao patrimônio público que, muitas vezes, será presumido.
“Art. 21. A aplicação das sanções previstas nesta Lei independe:
I – da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público”.
A orientação jurisprudencial também se alinha neste horizonte:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
DESPESAS DE VIAGEM. PRESTAÇÃO DE CONTAS. IRREGULARIDADE. LESÃO
A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. ELEMENTO SUBJETIVO. DANO AO ERÁRIO.
COMPROVAÇÃO. DESNECESSIDADE. (...). 1. A lesão a princípios administrativos contida no art. 11 da Lei nº 8.429/92 não exige dolo ou culpa na conduta do agente nem prova da lesão ao erário público. Basta a simples ilicitude ou imoralidade administrativa para restar configurado o ato de improbidade. Precedente da Turma. 2. (..). 3. Segundo o art. 11 da Lei 8.429/92,
constitui ato de improbidade que atenta contra os princípios da Administração
Pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade,
imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, notadamente a prática de ato
que visa fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto na regra de
competência (inciso I), (...). (STJ. Recurso Especial nº 880662/MG (2006/0170488-
9). Rel. Min. Castro Meira. Decisão Unânime, DJ 01.03.2007).
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
LESÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. ELEMENTO SUBJETIVO.
COMPROVAÇÃO. DESNECESSIDADE. 1. A lesão a princípios administrativos
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
contida no art. 11 da Lei nº 8.429/92 não exige dolo ou culpa na conduta do agente, nem prova da lesão ao Erário Público. Basta a simples ilicitude ou imoralidade administrativa para restar configurado o ato de improbidade. 2.
Recurso especial improvido. (STJ. Recurso Especial nº 826678/GO (2006/0031998-
7). Decisão Unânime, DJ 23.10.2006).
“ausência de dano ao erário público não obsta a aplicação das sanções previstas na Lei nº 8.429/92. Inteligência do art. 21. O enriquecimento ilícito a que se refere a Lei é a obtenção de vantagem econômica através da atividade administrativa antijurídica." (STJ – RESP 439280 – RS – 1ª T. – Rel.
Min. Luiz Fux – DJU 16.06.2003 – p. 00265).
TJMG - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MINISTÉRIO PÚBLICO -
LEGITIMIDADE - APLICAÇÃO DAS SANÇÕES DA LEI 8429/92 -
INDEPENDENTEMENTE DE DANO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO -
INOCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS -
RECURSOS IMPROVIDOS.
"O possível dano ao Erário afeta o interesse coletivo, legitimando o Ministério
Público para promover o inquérito civil e, posteriormente, se for o caso, ação civil
pública objetivando a defesa do patrimônio público"; "As condutas de todos os
apelantes foram igualmente decisivas na realização ilícito ocorrido; daí,
merecedores de idêntica sanção"; "O art. 21, inciso, I da Lei nº 8429/92 estatui que a aplicação das sanções previstas independe da efetiva ocorrência de dano ao Patrimônio Público"; "A pena foi aplicada dentro dos parâmetros
disciplinadores da dosimetria estabelecida pelo art. 12 da Lei de Improbidade
Administrativa e perfeitamente compatível com a extensão do dano causado ao
patrimônio e moralidade pública, não havendo assim, nenhuma violação aos
princípios constitucionais". (Apelação Cível nº 1.0267.04.911440-3/001, 7ª Câmara
Cível do TJMG, Francisco Sá, Rel. Alvim Soares. j. 26.04.2005, unânime, Publ.
01.06.2005).
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
A violação à moralidade administrativa, através de ação ou omissão, com
a consequente violação aos deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e
lealdade às instituições enseja a imposição das sanções político-administrativas
previstas na Lei nº 8.429/92.
Segundo Hely Lopes Meirelles o princípio da moralidade administrativa
tem o seguinte conteúdo, verbis:
“A moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de
validade de todo o ato da Administração Pública (CF, art. 37, caput). Não se trata -
diz Hauriou, o sistematizador de tal conceito - da moral comum, mas sim de uma
moral jurídica, entendida como o ‘conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina
interior da Administração. Desenvolvendo sua doutrina, explica o mesmo autor que
o agente administrativo, como ser humano dotado de capacidade de atuar, deve,
necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, não
poderá desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir
somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente,
o oportuno e o inoportuno, mas também entre o honesto e o desonesto. Por
considerações de Direito e de moral, o ato administrativo não terá que obedecer
somente à lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem
tudo que é legal é honesto, conforme já proclamavam os romanos: ‘nom omne quod
licet honestum est’’. A moral comum, remata Hauriou, é imposta ao homem para sua
conduta externa, a moral administrativa é imposta ao agente público para sua
conduta interna, segundo as exigências da instituição a que serve e a finalidade de
sua ação: o bem comum.
[...]
O inegável é que a moralidade administrativa integra o Direito como
elemento indissociável na sua aplicação e na sua finalidade, erigindo-se em fator de
legalidade. Daí porque o TJSP decidiu, com inegável acerto, que ‘o controle
jurisdicional se restringe ao exame da legalidade do ato administrativo; mas por
legalidade ou legitimidade se entende não só a conformação do ato com a lei, como
também com a moral administrativa e com o interesse coletivo” (destaque nosso)
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
(Malheiros Editores, 1993, 19a. ed., págs. 83/83 e 85)
Oportunas as lições de Alexandre Rosa e Affonso Ghizzo Neto:
“Moralidade fica jungida à maneira de se proceder no trato da coisa
pública, avivada nas práticas administrativas. Houriou, citado por Lúcia Valle
Figueiredo, em 1927 já afirmava: ‘Quanto à moralidade administrativa, sua
existência provém de tudo que possui uma conduta prática, forçosamente da
distinção do bem e do mal. Como a administração tem uma conduta, ela pratica esta
distinção ao mesmo tempo que aquela do justo e injusto, do lícito e do ilícito, do
honorável e do desonorável, do conveniente e do incoveniente. A moralidade
administrativa é freqüentemente mais exigente que a legalidade’.” (Improbidade
Administrativa e Lei de Responsabilidade Fiscal – Conexões Necessárias –Editora
Habitus – 2001)
Sobre o princípio da moralidade, Maria Sylvia Zanella Di Pietro ensina-
nos:
“[...] sempre que em matéria administrativa se verificar que o
comportamento da Administração ou do administrado que com ela se relaciona
juridicamente, embora em consonância com a lei, ofende a moral, os bons costumes,
as regras de boa administração, os princípios de justiça e de eqüidade, a idéia comum
de honestidade, estará havendo ofensa ao princípio da moralidade administrativa.”
(Direito Administrativo, Editora Atlas, 5ª edição, 1995, pág. 71)
Pelas lições transcritas, nota-se que o princípio da moralidade deve mesclar
a moralidade jurídica, extraída do conjunto de regras internas da Administração, com a
moralidade comum. O princípio da moralidade determina à Administração Pública o
respeito aos padrões de ética e de honestidade, ditados tanto pela moral jurídica,
interna da própria Administração, como pelo senso de moralidade pública comum, ou
seja, os standards comportamentais que a sociedade deseja, correspondentes ao
anseio popular de ética na Administração para o atingimento do bem comum.
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
Desse modo, verifica-se que as condutas dos requeridos,
incontestavelmente configuram atos de improbidade administrativa que atentam
contra os princípios da administração pública (LIA, art. 11).
II. 3 DAS SANÇÕES DECORRENTES DA PRÁTICA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
A Constituição Federal ao consagrar o princípio da probidade
administrativa e a Lei n. 8.429/92 ao tipificar as condutas consideradas como
ímprobas, não poderia deixar de cominar sanções para a prática dos atos de
improbidade administrativa.
O parágrafo quarto, do art. 37, da Constituição Federal prevê as
seguintes sanções, verbis:
“Art. 37 [...]
§ 4º - Os atos de improbidade administrativa, importarão a suspensão dos
direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e
ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação
penal cabível".
Já a Lei nº 8.429/92, prevê em seu art. 12, inciso III, as seguintes penas
para os agentes que praticarem ato de improbidade administrativa que atentem
contra princípios da administração pública, verbis:
“Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas,
previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade
sujeito às seguintes cominações:
III – no hipótese do artigo 11, ressarcimento integral do dano, se houver,
perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de 3 (três) a 5 (cinco)
anos, pagamento de multa civil até 100 (cem) vezes o valor da remuneração
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por
intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 3 (três)
anos.”
No presente caso, contudo, tem-se que Bráulio Aparecido Pereira dos
Santos já foi demitido em processo administrativo disciplinar instaurado no âmbito
da Prefeitura Municipal, de modo que incabível aplicação de sanção de perda da
função pública, assim como inaplicável esta sanção aos demais réus que não são
agentes públicos.
Não há, ainda, dano a ser reparado, pois o erário público municipal não
restou atingido.
Todavia, as demais sanções são totalmente pertinentes. Devem ser
aplicadas de forma proporcional às condutas atentatórias aos princípios
constitucionais por parte dos réus e são necessárias no sentido de se implementar a
moralidade administrativa na administração do município de Crixás.
III – DOS PEDIDOS
Diante de tudo que foi exposto, o Ministério Público, requer:
a) a autuação da presente petição inicial e dos autos de inquérito civil
público instaurado pela portaria nº 01/2004;
b) a notificação dos réus para apresentarem suas manifestações
preliminares, nos termo do artigo 17, § 7º, da LIA;
c) seja recebida a inicial, procedendo-se a citação dos requeridos para
comporem o pólo passivo da relação jurídico-processual, dando-lhes oportunidade
para, se quiserem, apresentar resposta, no prazo legal, sob pena de revelia;
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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRIXÁS
d) a notificação do município de Crixás para tomar conhecimento do
aforamento desta ação e especialmente para os fins do disposto no artigo 17, §º 3º
da LIA;
e) a produção de todas as provas necessárias à demonstração do
alegado, dentre elas o depoimento pessoal dos requeridos, oitiva de testemunhas
cujo rol será oportunamente apresentado, além de prova pericial e juntada de novos
documentos que se fizerem necessários;
f) seja julgada procedente a presente Ação Civil Pública, impondo-se aos
requeridos as sanções previstas no artigo 12, inciso III da Lei n. 8.429/92, no que
couber, observando-se o item II.3 desta ação;
g) a condenação dos réus ao pagamento das custas processuais;
h) seja oficiado o Tribunal Superior Eleitoral, para a efetivação da
suspensão dos direitos políticos dos demandados, e o Banco Central, para que este
comunique às instituições financeiras oficiais a proibição de contratar com o poder
público e de receber incentivos e benefícios fiscais ou creditícios;
Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), para os fins legais.
Crixás, 30 de abril de 2008.
WALTER TIYOZO LINZMAYER OTSUKAPromotor de Justiça
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