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Proposta de Prestação de Serviços FGV Projetos Nº xxx/xx
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Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Parecer TécnicoA Base de Incidência da Contribuição para o PIS / PASEP e da COFINS e o ICMS
10 de abril de 2008
ÍNDICE
I - A AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE Nº 18 1
II - O ALCANCE DO ART. 3º, § 2º, I, DA LEI 9.718/98 2
III - A RECEITA BRUTA E O FATURAMENTO 3
IV - REGIMES DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA 5
V - A APURAÇÃO DOS TRIBUTOS 5
VI - EFEITOS DA INTERCONEXÃO ENTRE ICMS E PIS/COFINS 7
VII - EFEITOS NA CADEIA DE COMERCIALIZAÇÃO 8
VIII - O ART. 166 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL 11
IX - O DUPLO ÔNUS ATRIBUÍDO À UNIÃO 12
X - O DIREITO À COMPENSAÇÃO E O TRÂNSITO EM JULGADO 13
XI - ALÍQUOTA ZERO. ALÍQUOTA ESPECÍFICA 14
XII - CONCLUSÃO 16
1
I - A AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE Nº 18
1. O Poder Executivo submeteu à apreciação do Supremo Tribunal Federal a
ADC 18, na qual requer o reconhecimento da constitucionalidade do inciso I do §
2º do art. 3º da Lei 9.718, de 1998.
2. O citado dispositivo relaciona itens que podem ser excluídos da receita bruta
na determinação da base de cálculo das contribuições para o PIS/PASEP e a
COFINS, ao seguinte teor:
"Art. 3º O faturamento a que se refere o artigo anterior corresponde à receita bruta da pessoa jurídica. .......................................................................................................................... § 2º Para fins de determinação da base de cálculo das contribuições a que se refere o art. 2º, excluem-se da receita bruta: I - as vendas canceladas, os descontos incondicionais concedidos, o Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI e o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, quando cobrado pelo vendedor dos bens ou prestador dos serviços na condição de substituto tributário; .........................................................................................................................”
3. A existência de relevantes controvérsias judiciais sobre a aplicação do referido
dispositivo legal foi a razão determinante do encaminhamento do ADC 18,
especialmente em relação à matéria sob julgamento no RE 240.785, em que se
discute a constitucionalidade da incidência das contribuições PIS/COFINS sobre o
valor correspondente ao ICMS.
2
II - O ALCANCE DO ART. 3º, § 2º, I, DA LEI 9.718/98
4. Por fazer referência a exclusões, o art. 3º, § 2º, I, da Lei 9.718/98, é um
dispositivo auto-condicionado, no sentido de que os itens nele enumerados
somente poderão ser deduzidos da receita bruta se nela previamente incluídos.
Quanto à finalidade, é um comando de ajustamento da base de cálculo a um
particular conceito de receita bruta definido pelo legislador.
5. A menção ao ICMS, na hipótese em que o contribuinte tem a condição de
substituto tributário, traduz o fato de que essa parcela do imposto não pertence à
operação em que seu valor é lançado, posto tratar-se de um regime tributário de
antecipação de cobrança.
6. A citação ao IPI, presente também na Lei Complementar 70, de 1991, mas
ausente nas leis 10.637, de 2002 (PIS não-cumulativo), e 10.833, de 2003
(COFINS não-cumulativa), é meramente expletiva, dirigida tão-somente aos
contribuintes que, por erro ou desconhecimento, houverem adicionado o imposto à
receita bruta.
7. É verdade que o IPI, assim como o ICMS e as contribuição para o PIS e a
COFINS, também é cobrado do adquirente da mercadoria, mas, diferentemente
desses tributos, segue apartado, a latere do faturamento, sem integrá-lo, mesmo
que a ele adicionado.
8. O conceito de receita bruta, equivalente ao de faturamento para fins tributários,
abrange ICMS, PIS e COFINS, mas não o IPI, cujo valor não constitui nem receita
nem despesa (é o único tributo sobre vendas que, contabilmente, é controlado por
meio de contas patrimoniais).
9. Cite-se, a propósito, o livro-referência sobre a matéria, da FIPECAFI-USP,
"Manual de Contabilidade das Sociedades por Ações", ed. Atlas, 2007, p.364:
3
"Os impostos incidentes sobre vendas devem ser deduzidos da receita bruta de vendas. A receita bruta deve ser registrada pelos valores totais, incluindo os impostos sobre ela incidentes (exceto, como já mencionado, o Imposto sobre Produtos Industrializados), os quais são assim registrados em contas devedoras, apresentados como redução das vendas brutas na Demonstração do Resultado do Exercício." (destacamos)
10. Descabe, pois, considerar a exclusão do IPI, prevista nas citadas leis, como
sendo um dispositivo que possa ser conceitualmente equivalente à pretendida
exclusão do ICMS. Observe-se, como citado anteriormente, que mesmo não
prevista na lei tributária das contribuições não-cumulativas, a exclusão do IPI foi
explicitada pelo administrador tributário (art. 5º, parágrafo único, IV, da Instrução
Normativa 594, de 2005).
11. Ora, alguém poderá dizer que a citada Instrução Normativa invadiu a reserva
de lei, redefinindo a base de cálculo das contribuições não-cumulativas?
Absolutamente, o administrador tributário, no caso, simplesmente reconheceu o
direito de o contribuinte corrigir, via exclusão, um anterior erro de fato, a inclusão
do IPI na receita bruta.
III - A RECEITA BRUTA E O FATURAMENTO
12. É importante assinalar que o conceito de receita bruta é originário da
contabilidade, de onde foi trazido para a legislação tributária do imposto de renda.
13. O termo "faturamento", por sua vez, foi introduzido na legislação tributária pelo
art. 195, I da Constituição Federal de 1988. Até então, em sentido técnico, era uma
expressão sem peso conceitual, pois inexistente inclusive na legislação comercial e
em contabilidade.
14. Essa indeterminação levou o legislador tributário a buscar uma "âncora
conceitual" para delimitar a abrangência do termo, de modo a viabilizar seu emprego
4
como base de cálculo tributária. A âncora escolhida foi o conceito de "receita bruta",
consagrado havia décadas no imposto de renda.
15. Receita bruta e faturamento identificaram-se, então, como o conceito definidor da
base de cálculo da contribuição social prevista no art. 195, I, da CF/88, instituída em
1991 sob a denominação de COFINS.
16. Posteriormente, a Lei 9.718, em 1998, unificou as bases de incidência da
COFINS e da contribuição para o PIS/PASEP.
17. Destaque-se que as leis instituidoras das contribuições ao PIS e COFINS não
dispuseram sobre a inclusão do ICMS em sua base de cálculo. A lei do ICMS é
que determinou a sua inserção no faturamento e este, por dicção constitucional e
legal, é também a base de cálculo do PIS/COFINS.
18. Na verdade, a matéria questionada no RE 240.785 não é exatamente a
"inclusão" do ICMS, mas sim a sua "não-exclusão" da base de cálculo das
contribuições PIS/COFINS, posto que inexistente na legislação das contribuições
dispositivo que determine tal inclusão.
19. Por fim, não é demais lembrar que o STF, no julgamento do RE 212.209,
decidiu que o ICMS integra a sua própria base de cálculo, o que significa dizer que
o ICMS foi reconhecido pelo tribunal como sendo parte integrante do faturamento.
20. Se o STF agora decidir que o ICMS não integra a base de incidência do
PIS/COFINS, terá decidido, ipso facto, que o ICMS não integra o faturamento.
21. Ou seja, das duas decisões, resultaria então que um mesmo conceito,
"faturamento", contém ICMS para calcular o ICMS mas não contém ICMS para
calcular PIS e COFINS.
5
IV - REGIMES DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA
22. É importante ter presente que a expressão “as contribuições PIS/COFINS
incidentes sobre o ICMS” deve ser entendida tão somente como uma figura de
linguagem, em que o fator de uma multiplicação está substituído pelo respectivo
produto. Na verdade, o sentido da expressão é que a base de cálculo das
contribuições PIS/COFINS abrange todos os elementos integrantes da receita bruta,
inclusive aqueles que, eventualmente, têm a mesma expressão financeira dos outros
tributos nela incidentes.
23. Mas base de cálculo é base de cálculo e imposto é imposto. São conceitos
específicos, que não se interpenetram, não podem e não devem ser confundidos.
Evidentemente a expressão não está errada em si mesma, mas só deve ser
interpretada como fazendo parte de uma metonímia, não pode ser lida ao pé da
letra.
24. O próprio comando do art. 13 da Lei Complementar nº 87, de 1996, que dispõe
sobre a base de cálculo do ICMS, também deve ser entendido num contexto
retórico, pois novamente, numa interpretação literal, é inescapável concluir que não
há como calcular um imposto se, previamente, for necessário adicioná-lo a sua
própria base de cálculo.
25. Um exemplo de operação mercantil será ilustrativo para a compreensão desses
pontos, especialmente para comparar o cálculo dos tributos sob a legislação em
vigor com a que decorreria de eventual decisão modificadora.
V - A APURAÇÃO DOS TRIBUTOS
26. Para simplificar, vamos supor que a alíquota do ICMS seja 20% e a alíquota
conjunta das contribuições PIS e COFINS seja 10%. No contexto de um
6
faturamento, vamos introduzir também a variável do desconto da respectiva
duplicata, que o banco executa ao custo de 3%.
27. O comerciante envolvido nessa operação, portanto, sabe, a priori, que terá de
praticar um preço de venda do qual 33% estão previamente comprometidos (20%
com o ICMS, 10% com as contribuições PIS/COFINS e 3% com o desconto
bancário). Ou seja, um comprometimento total de 33%. Ele sabe, portanto, que irá
dispor apenas dos restantes 67% do preço (100 menos 33).
28. Vamos supor, também para simplificar, que o comerciante tenha calculado em
R$ 67,00 o valor necessário para cobrir seus custos, despesas e lucro, em relação à
mercadoria objeto do nosso exemplo.
29. Por uma simples regra de três (se R$ 67,00 corresponde a 67%, então "x"
corresponderá a 100%), é encontrado o preço de venda, igual a R$ 100,00.
30. Faturada a venda e descontada a duplicata, ingressa no caixa da empresa o
faturamento líquido de R$ 97,00 (R$ 100,00 menos o desconto bancário de R$
3,00). O comerciante vai então segregar 20% do preço total para o ICMS (R$ 20,00)
e 10% para PIS/COFINS (R$ 10,00). Ao final, terá o saldo de R$ 67,00 que se
programou receber, para atender seus custos, despesas e lucro.
31. De pronto, observa-se, os tributos incidiram sobre o preço total da operação,
inclusive sobre o valor do desconto que sequer ingressou no caixa da empresa. A
base de cálculo de cada um dos três tributos é uma só, o valor total da operação de
venda, R$ 100,00, que será lançado como receita bruta, quando da escrituração
contábil.
32. Temos aqui três pontos a destacar. O primeiro é o fato de que a base de
incidência tributária, desde que legalmente estabelecida, não se condiciona sequer à
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circunstância de o respectivo valor não ingressar no caixa da empresa. É o que
ocorre com o desconto bancário.
33. Segundo, tal como acima demonstrado o ICMS e as contribuições PIS/COFINS
são calculados cada um de per si, sem incidências recíprocas ou reflexas. Há
somente um sentido retórico ao se dizer que o PIS/COFINS incide sobre o ICMS.
34. Terceiro, destaque-se que o ICMS e o PIS/COFINS, sob o vigente regime de
apuração, são parcelas do preço da operação cujas expressões relativas são
representadas por suas próprias alíquotas: em nosso exemplo, o ICMS é 20% e o
PIS/COFINS 10% do preço da operação. Esta é, portanto, a forma de incidência
tributária mais harmônica e mais conforme à Constituição Federal para o
atendimento ao disposto no § 5º do art. 150: “A lei determinará medidas para que os
consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre
mercadorias e serviços”.
VI - EFEITOS DA INTERCONEXÃO ENTRE ICMS E PIS/COFINS
35. Malgrado esses pontos, e apenas para fins de avaliação, vamos supor que o
STF venha a decidir que o ICMS deva ser excluído da base de cálculo das
contribuições PIS e COFINS e que tal decisão tenha efeitos retroativos, alcançando,
portanto a operação do nosso exemplo.
36. Nessa hipótese, a base de cálculo das contribuições seria R$ 80,00 (obtida de
R$ 100,00 menos o valor do ICMS, R$ 20,00); o valor do PIS/COFINS, neste caso,
seria R$ 8,00 (10% de R$ 80,00).
37. O primeiro efeito prático que podemos extrair dessa decisão é quanto ao preço
da operação, que passou a ser R$ 98,00 (soma de 67 + 3 + 20 + 8).
38. Em conseqüência, a pergunta: o ICMS ainda terá por base de incidência o antigo
preço? Destaque-se que a apuração do imposto não está em julgamento, ele
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continuará calculado sobre o preço da operação que, no caso, foi judicialmente
modificado para R$ 98,00. Ora, parece razoável concluir que, se o preço da
operação passou a R$ 98,00, o ICMS não deve incidir sobre R$ 100,00, que tornou-
se um valor legalmente inexistente.
39. Resulta então um novo valor para o ICMS, de R$ 19,60 (20% de R$ 98,00), e
com isso um novo valor da operação, que não é mais R$ 98,00, mas R$ 97,60 (de
67 + 3 + 19,60 + 8). É imediato concluir que tornou-se necessário recalcular as
contribuições PIS/COFINS sobre esse novo preço.
40. Nesse ponto devemos admitir que a apuração dos tributos sobre bases de
cálculo parciais não pode ser encaminhado por uma regra de três simples, como
feito sob a legislação em vigor: será necessário, agora, introduzir um algoritmo de
cálculo um pouco mais elaborado.
41. Vamos considerar aplicado esse algoritmo, que nos fornece como resultado um
valor da operação igual a R$ 97,22, do qual obtemos o ICMS (= R$ 19,44) e
PIS/COFINS (= R$ 7,78). A adição desses tributos ao desconto de R$ 3,00 mais a
parte do comerciante (R$ 67,00) nos remete ao citado total de R$ 97,22.
42. Conclusão: em relação ao nosso exemplo, uma hipotética decisão do STF no
sentido de excluir o ICMS da base das contribuições PIS/COFINS teria o efeito de
reduzir as citadas contribuições em 22% (de R$ 10,00 para R$ 7,78) e um efeito de
segunda ordem de reduzir o ICMS em 3% (de R$ 20,00 para R$ 19,44).
VII - EFEITOS NA CADEIA DE COMERCIALIZAÇÃO
43. Vamos agora estender nosso exemplo para outras etapas da cadeia de
comercialização, na qual as contribuições PIS/COFINS têm incidência não-
cumulativa, mantida a alíquota conjunta em 10%.
9
44. Vamos supor que a empresa comercial de nosso exemplo, a partir de agora
denominada empresa A, seja do setor extrativo, e tenha vendido matérias-primas
por R$ 100,00.
45. Uma empresa B, industrial, adquire a matéria-prima de A, industrializa e revende
o produto a uma empresa comercial C, que, por sua vez, o revende ao consumidor
final, D.
46. Para simplificar, vamos desconsiderar os efeitos reflexos sobre o ICMS, de modo
que o valor das contribuições PIS/COFINS “incidentes sobre o ICMS”, na empresa
A, será igual, como visto, a R$ 2,00. A empresa B, com o mesmo processo de
cálculo de A, apura um preço de R$ 200,00 e PIS/COFINS sobre ICMS de R$ 4,00.
A empresa C, finalmente, apura um preço de R$ 300,00 e PIS/COFINS sobre ICMS
de R$ 6,00. A empresa A, por hipótese, não desconta créditos das contribuições, o
que torna completa a cadeia econômica do exemplo.
47. Primeira pergunta: quanto o Governo Federal arrecadou?
48. Sendo um tributo não-cumulativo, em uma cadeia econômica completa, a
resposta é imediata: o Governo arrecadou R$ 6,00, montante pago pelo consumidor
final (D).
49. Esse mesmo valor pode também ser encontrado pela soma dos valores
recolhidos pelas três empresas:
a) A recolheu R$ 2,00, o total de seu débito, pois não tem créditos;
b) B recolheu R$ 2,00, o saldo de um débito de R$ 4,00 contra um crédito de R$
2,00;
c) C recolheu R$ 2,00, o saldo de um débito de R$ 6,00 contra um crédito de R$
4,00.
10
50. A soma dos recolhimentos das quatro empresas intervenientes é R$ 6,00.
51. Segunda pergunta: qual o ônus tributário suportado por A, B e C?
a) A empresa A recolheu R$ 2,00, exatamente o valor que cobrou de B. Seu
ônus tributário, portanto, foi igual a zero;
b) A empresa B pagou R$ 2,00 para A, embutido no preço dos insumos que dela
adquiriu, e recolheu mais R$ 2,00, um ônus total de R$ 4,00, exatamente o valor
que cobrou de C. Seu ônus tributário, portanto, também foi zero;
c) A empresa C pagou R$ 4,00 para B, embutido no preço do produto que dela
adquiriu, tendo recolhido R$ 2,00, um ônus total de R$ 6,00, exatamente o valor
que cobrou de D. Seu ônus tributário, portanto, também foi zero.
52. Primeira conclusão: nenhuma das empresas intervenientes foi onerada pela
incidência das contribuições PIS e COFINS sobre o ICMS. Em conseqüência, se
alguma delas obtiver qualquer restituição, seja em espécie ou sob a forma de
compensação, será um benefício indevido, um enriquecimento sem causa.
53. Terceira pergunta: no estrito termo da expressão “exclusão do ICMS da base
de incidência das contribuições”, quanto será restituído a essas quatro empresas?
54. Cada empresa receberá o valor do PIS/COFINS que incidiu sobre o ICMS
contido no respectivo faturamento. É exatamente a isso que conduz o voto do
Relator. Significa, então, que A receberá R$ 2,00, B receberá R$ 4,00 e C
receberá R$ 6,00. No conjunto, as três empresas receberão R$ 12,00.
55. Segunda conclusão: se for observado, estritamente, o ponto de visto exposto no
voto apresentado no RE 240.785, a União, que arrecadou R$ 6,00, por força da
decisão judicial será compelida a devolver R$ 12,00.
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56. Se assim ocorrer, será algo como o milagre da multiplicação dos créditos. Não
é de admirar a ansiedade dos contribuintes na expectativa da decisão do STF.
57. E a que se deve esse descasamento de valores? Essencialmente ao fato de o
direito de crédito haver sido reconhecido em regime cumulativo, o único existente
ao tempo da propositura da ação que deu origem ao RE 240.785. Hoje, não é
possível ignorar o regime não-cumulativo da COFINS, exigido das grandes
empresas, responsável por mais de 80% da arrecadação das contribuições.
58. Não é demais observar que o absurdo de arrecadar R$ 6,00 e devolver R$
12,00 ocorrerá somente para as empresas sujeitas ao regime não-cumulativo e
em caso de efeito retroativo da decisão judicial.
59. Esse fato recomenda, portanto, que no caso de eventual decisão favorável aos
contribuintes, ela seja proferida com vigência pro futuro e somente para as
empresas sujeitas à cobrança cumulativa das contribuições.
VIII - O ART. 166 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL
60. Outro ponto a destacar, este em relação a qualquer regime de cobrança das
contribuições, é quanto ao fato de que, para ter reconhecido o direito ao crédito,
cada empresa deverá demonstrar que incluiu no seu faturamento o valor do ICMS.
Pois é evidente que, se não comprovar tal inclusão, não terá o que pedir em
restituição.
61. Mas, no exato momento em que fizer essa comprovação terá demonstrado
também, ipso facto, que transferiu ao adquirente da mercadoria o valor das
contribuições cobrado sobre o ICMS. Ora, o art. 166 do CTN, em pleno vigor, dispõe
que:
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"A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro, somente será feita a quem prove haver assumido referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la".
62. Além do CTN o próprio STF, na Súmula 456, de primorosa clareza e
objetividade, assim dispôs:
"Cabe a restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido por decisão, que o contribuinte "de jure" não recuperou do contribuinte "de facto" o "quantum" respectivo."
63. Isso significa que A, B e C, para comprovar a existência do direito, têm de
demonstrar que "faturaram o ICMS" e, em conseqüência, sobre ele incidiram as
contribuições PIS/COFINS. É condição indissociável, sine qua non.
64. Mas, demonstrada dessa forma a existência do direito, estará comprovado que o
contribuinte de jure recuperou do contribuinte de facto o quantum respectivo. Ou
seja, deixou de existir o direito.
IX - O DUPLO ÔNUS ATRIBUÍDO À UNIÃO
65. Ainda sob a hipótese de decisão favorável aos contribuintes, com eficácia
retroativa, deve se atentar para o fato de que o valor a ser restituído foi utilizado
como crédito pela empresa da etapa subseqüente.
66. Quando A, por exemplo, receber do governo os R$ 2,00 a que teria direito pela
decisão judicial, o que acontecerá com B, que aproveitou como crédito esses
mesmos R$ 2,00?
67. Observe-se que a União terá restituído a A o seu pagamento e reconhecido a B
o seu direito de crédito, ambos referentes a um mesmo valor. Um despropósito, para
dizer o mínimo. Mas, não há qualquer dúvida, o direito de B nasceu do fato de A
13
haver se debitado dos R$ 2,00. Se não houvesse o débito de A, B não poderia se
creditar. É o que está na lei, a já citada 10.833, de 2003.
68. Mas, ao se creditar, B também cumpriu a lei, a seu tempo, e o seu creditamento
é um ato jurídico perfeito, inalcançável por lei ou decisão judicial posterior. É o que
preceitua o art. 146 do Código Tributário Nacional.1 Restará à União o dever de
restituir e a obrigação de reconhecer o direito de crédito sobre um mesmo valor?
X - O DIREITO À COMPENSAÇÃO E O TRÂNSITO EM JULGADO
69. As pessoas jurídicas industriais e comerciais de mercadorias e algumas
prestadoras de serviços são contribuintes do PIS/COFINS e do ICMS. São
centenas de milhares de contribuintes, diretamente interessados na matéria ora
sob judice.
70. Ao demandar em ação judicial a exclusão do ICMS da base de cálculo do
PIS/COFINS os contribuintes têm dois objetivos: obter o reconhecimento de que
tal incidência deu origem a um indébito tributário e poder compensar esse indébito
contra débitos próprios, referentes a tributos administrados pela Receita Federal,
vencidos ou vincendos.
71. Proferida a decisão pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da matéria
objeto do citado Recurso 240.785, o trânsito em julgado das ações que
demandam a exclusão do ICMS da base de cálculo da COFINS tornar-se-á
privativo do STF. Em conseqüência, caberá recurso à União contra eventuais
decisões favoráveis aos contribuintes proferidas por qualquer outro tribunal.
72. É importante, destacar, no caso, quanto ao direito à compensação, o disposto
no art. 170-A do CTN:
1 Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento, somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução.
14
"É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial".
73. Ou seja, enquanto o julgamento do STF não se efetivar, as decisões judiciais
singulares e as dos demais tribunais superiores favoráveis aos contribuintes, que
têm autorizado a compensação, poderão ser objeto de autuação pela Receita
Federal, com base no citado art. 170-A, pois não terá havido o trânsito em julgado
da decisão.
74. Por outro lado, se o STF decidir por julgamentos in casu, de controle difuso de
constitucionalidade, em que as decisões alcançam somente as partes diretamente
interessadas, e se vier a decidir favoravelmente aos contribuintes, provavelmente
haverá um significativo volume de demandas ao Poder Judiciário.
75. Isso porque os julgados de recursos extraordinários são de efeitos apenas
difusos, incidentalmente produzidos, de validade exclusivamente inter partes. Não
alcançam quem não tenha participado da lide onde foi proferida a declaração de
inconstitucionalidade.
XI - ALÍQUOTA ZERO. ALÍQUOTA ESPECÍFICA
76. Há produtos cuja receita da operação de venda pode estar sujeita à alíquota
zero das contribuições ao PIS/COFINS e à não-incidência do ICMS. Dezenas de
milhares de contribuintes praticam operações de venda de produtos sob essas
condições tributárias.
77. O exemplo mais notório certamente é o dos combustíveis, a gasolina em
especial. A cobrança do PIS/COFINS é concentrada na refinaria, a distribuidora e
os postos de combustíveis têm alíquota zero. O próprio álcool anidro, adicionado à
gasolina na distribuidora, também está sujeito ao PIS/COFINS na refinaria, por
15
onde sequer transita. O ICMS também é cobrado somente na refinaria, em regime
de substituição tributária.
78. O comerciante varejista, ao vender a gasolina ao consumidor final, de um
ponto de vista estritamente jurídico, não fatura PIS/COFINS nem ICMS. Quanto às
contribuições, a alíquota é zero; quanto ao imposto, é um não-contribuinte. De um
ponto de vista econômico, porém, é inegável que os postos revendem a gasolina
com forte conteúdo de ICMS e PIS/COFINS.
79. É inevitável prever que somente em relação a esse produto serão mais de 30
mil contribuintes a procurar seus "direitos", até por questão de isonomia. Mas
haverá esse direito? E se houver, como calcular o montante da COFINS incidente
sobre o ICMS de quem não apurou nem pagou nem um nem outra? E com base
em qual lei esses cálculos serão feitos?
80. Aproveitando esse exemplo, cite-se também o caso dos produtos sujeitos a
alíquotas específicas das contribuições ao PIS e a COFINS, forma de incidência
prevista na alínea b, III, § 2º, art. 149 da Constituição Federal.
81. Como é sabido, no regime de apuração por alíquotas específicas não há
incidência sobre valor, as contribuições sendo cobradas por meio de uma alíquota
expressa em Reais por unidade de medida. No caso da gasolina, em Reais por
milheiro de litros.
82. Neste caso (gasolina), além da indefinição quanto aos distribuidores e postos
de venda ao consumidor, o próprio contribuinte legalmente designado, a refinaria,
que faz o recolhimento das contribuições, poderá alegar que no seu faturamento
ocorreu a incidência das contribuições PIS/COFINS sobre o ICMS?
16
83. Certamente não, pois a base de incidência da alíquota específica é um
quantitativo de litros, não o seu valor. Neste caso, então, os produtos sob o regime
de apuração por alíquota específica estarão excluídos da decisão judicial?
XII - CONCLUSÃO
84. Há muitas e ponderáveis razões, como se vê, para o Supremo Tribunal
Federal não modificar a profusa e pacífica jurisprudência que referenda a
incidência das contribuições PIS/COFINS sobre o ICMS e, dessa forma, preservar
a legislação de regência que vige desde sempre em relação a essa matéria.
85. As barreiras conceituais, legais e administrativas que se antepõem a uma
eventual decisão que o tribunal venha a tomar a favor dos contribuintes, inclusive
com eficácia pro futuro e mesmo que somente aos contribuintes do regime de
apuração cumulativa, foram brevemente abordadas nos tópicos precedentes
86. Consideramos que são pontos relevantes para a manutenção da jurisprudência
estabelecida para a matéria.
Este é meu parecer.
Rio de Janeiro, 10 de abril de 2008
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José Antônio Schontag
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Currículo José Antônio Schontag
Auditor Fiscal da Receita Federal – 1970-2002
Assessoria Técnica ao Secretário da Receita Federal – 1986-2002
Coordenador de Estudos e Pesquisas do Setor de Tributação da
Fundação Getúlio Vargas – desde 2002
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