paixões e sujeito na semiótica - fiorim
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Revista Eutomia Ano I N 02 (58-67)
Jos Luiz Fiorin, Semitica e Paixo
Entrevista a Cristina Sampaio
Professor Fiorin fala, nesta entrevista, sobre o seu interesse pelo estudo
das paixes e os desafios e impasses da Semitica na contemporaneidade,
evidenciando a inquietude de um pesquisador vibrante no auge de sua
maturidade intelectual.
Jos Luiz Fiorin, um dos nomes mais respeitados da Lingstica contempornea
brasileira, Livre-Docente e Professor Associado do Departamento de Lingstica da
Universidade de So Paulo onde exerceu atividades de ensino-pesquisa por mais de
vinte anos. Tem Doutorado pela Universidade de So Paulo (1983) e Ps-Doutorado
pela cole des Hautes tudes en Sciences Sociales (Paris) (1983-1984) e pela
Universidade de Bucareste (1991-1992). autor e co-autor de vrios livros,
destacando-se, entre outros: As astcias da enunciao. As categorias de pessoa, espao e
tempo. (So Paulo: tica, 1996); Lies de texto: leitura e redao. (So Paulo: tica, 1996);
O regime de 1964: discurso e ideologia (So Paulo: Atual, 1988); A Semitica Discursiva.
(In: LARA, Glucia Muniz Proena; MACHADO, Ida Lcia; EMEDIATO, Wander.
(Org.). Anlises do discurso hoje. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008); Semitica e
poltica. (In: BARROS, Diana Luz Pessoa de; FIORIN, Jos Luiz. (Org.). A fabricao
dos sentidos: estudos em homenagem a Izidoro Blikstein. So Paulo: Humanitas,
2008); . Semitica e ensino da leitura. (In: Iara Rosa Farias. (Org.). Trans-formar a
educao. 1a. ed. Rio de Janeiro: Faculdade de Educao da UFRJ, 2006, v. 1). Seu
livro mais recente, Em busca do sentido (So Paulo: Editora Contexto, 2008), como o
prprio autor descreve, uma coletnea de artigos escritos em diversas pocas de
sua vida acadmica que evidenciam a inquietude de um pesquisador vibrante no
auge de sua maturidade intelectual. Na entrevista concedida EUTOMIA, com
exclusividade, o autor vai falar sobre o seu interesse pelo estudo das paixes que
resultou na publicao de dois artigos: Paixes, Afetos, Emoes e Sentimentos
O
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(Cadernos de Semitica Aplicada, vol. 5: 2007) e Semitica das Paixes: o
Ressentimento (Alfa, So Paulo, 51 (1): 2007) , sobre a insero da paixo na Teoria
Semitica, a escolha do ambiente universitrio para focalizar seu estudo das paixes,
sua vivncia universitria, questes acerca do sujeito, para a Semitica, e os desafios
e impasses da Semitica na atualidade.
Pergunta: Professor Fiorin, como que surgiu este seu interesse pelo estudo das
paixes ?
Resposta: Bom, meu interesse pelo estudo das paixes surgiu quando a Semitica
resolveu estabelecer um lugar terico para as paixes, porque, inicialmente, a
Semitica comeou uma concepo narrativa em que havia uma troca de objeto e,
portanto, ela se interessou pelo aspecto pragmtico da narrativa, pelas aes. Mais
tarde ela se interessou pelo estudo da manipulao e da sano e, portanto, a j
comeavam a entrar as condies do sujeito para manipular e ser manipulado.
Depois ento ela comea a se interessar por aquilo que ela vai chamar de os estados de
alma do sujeito. Ao ampliar o seu escopo de anlise, vai-se verificar que h
determinados textos nos quais no se tem propriamente troca de objeto. O que se tem,
na verdade, so paixes que determinam o desenvolvimento narrativo. Por exemplo:
a questo do cime no Otelo, de Shakespeare, e todo o trabalho de inocular o cime
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em Otelo e depois qual o papel que o cime exerce no desenvolvimento da ao. Ou
ento, em inmeras narrativas que tratam do avarento, como por exemplo, em
Anedota pecuniria, de Machado: como a avareza vai fazendo mover a narrativa.
Bom, a partir desse lugar terico, eu me interessei pelo estudo das paixes. E eu,
ento, entendia que a paixo era um elemento importante do discurso e um elemento
que no tinha encontrado um lugar terico e que, portanto, era preciso trabalhar com
ele.
Pergunta: Mas como voc define, exatamente, a paixo para a Semitica?
Resposta: Digamos que para a Semitica a paixo estudada uma paixo de papel. A
Semitica diz o seguinte: que a paixo uma dimenso importante do discurso e o
sujeito da enunciao sempre um sujeito apaixonado. A paixo , para a Semitica,
um arranjo de elementos lingsticos, dado que uma paixo de papel, uma paixo
representada. Ela um arranjo de modalidades, que so moduladas. Por exemplo, o
que a curiosidade? um querer-saber intenso. Ento existe toda uma teoria das
modalidades para configurar esses arranjos, que so lexicalizados como paixes.
Essas paixes so moduladas. Alm disso, tem-se o aspecto e o tempo envolvidos
nesse arranjo lingstico das paixes. Por exemplo, eu tenho paixes incoativas ou
momentneas, como a ira, ou ento paixes durativas, como o rancor, que alguma
coisa que dura no tempo, que envolve uma durao temporal. Eu tenho paixes
voltadas para o passado e paixes voltadas para o futuro. Por exemplo, o remorso
uma paixo voltada para o passado: eu s posso ter remorso daquilo que eu fiz. Mas
o medo uma paixo voltada para o futuro: eu s posso ter medo do que vai
acontecer. Ento, a paixo uma configurao de elementos lingsticos. A paixo
o efeito de sentido gerado pelo arranjo desses elementos lingsticos. Para a
Semitica a paixo pode aparecer de duas maneiras diferentes. Ela pode aparecer
mencionada no texto como um lexema, como, por exemplo, quando se diz que uma
personagem ficou colrica. Ento temos a meno do lexema clera. Da a anlise tem
de ser uma anlise desse lexema no interior de uma dada cultura para verificar a
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configurao da paixo. Ou ento se pode representar a paixo numa narrativa,
como, por exemplo, no romance Um copo de clera, de Raduan Nassar, em que se
narra essa paixo. Ou ento o cime, como em Dom Casmurro. O leitor vai vendo o
cime de Bentinho aparecer e como ele interfere na maneira como a personagem v
Capitu. Isso representado no romance. Alm disso, a paixo tem de ser vista de
duas maneiras diferentes. Ou no enunciado, e a ela dita ou representada, ou na
enunciao e a ela cria o tom do texto. Quando se toma, por exemplo, um poema
como o Navio Negreiro, de Castro Alves, percebemos que o poeta estava animado
por uma ira, chamada ira condoreira, diante da situao do Brasil da escravido.
Como isto se manifesta? Pode-se verificar que todo o tom grandiloqente, a
quantidade de acentos, as pausas, a quantidade de reticncias, a quantidade de
pontos de exclamao, depois as apstrofes, tudo isso cria um tom indignado:
Auriverde pendo de minha terra,/ Que a brisa do Brasil beija e balana,/
Estandarte que a luz do sol encerra,/ E as promessas divinas da esperana... Tu, que
da liberdade aps a guerra,/ Foste hasteado dos heris na lana,/ Antes te
houvessem roto na batalha/ Que servires a um povo de mortalha! E termina com
Andrada! arranca esse pendo dos ares!/ Colombo! fecha a porta dos teus mares!
Existe um tom indignado na enunciao. So esses elementos que a Semitica estuda
no componente passional. preciso considerar que esta dimenso passional, esta
dimenso patmica do discurso uma dimenso sempre presente no discurso,
mesmo que o que esteja presente seja a indiferena. A paixo est sempre presente no
discurso.
Pergunta: Por que o Professor escolheu o ambiente universitrio para focalizar o
estudo da paixo?
Resposta: A voc est se referindo ao meu texto sobre o ressentimento? Bom, na
verdade h muito tempo eu queria escrever um texto acerca de uma certa
mesquinharia que eu vejo no ambiente universitrio. Mas eu no queria escrever um
texto panfletrio. Queria fazer um texto cientfico. Ento eu escolhi as paixes. Esse
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texto um acerto de contas meu com uma certa mesquinharia que no precisava
haver no ambiente universitrio, de onde s vezes eu acho que esto ausentes a
amizade, a colaborao, o afeto, mas est presente mesmo, na verdade, uma certa
mesquinharia, uma certa competio, uma certa inveja, um certo disse que disse.
No s no Brasil, em todas as universidades do mundo por que passei eu notei isso
e voc tambm deve ter notado pelas diversas universidades do mundo pelas quais
passou. Ento era o meu acerto de contas, mas eu no queria que ele tivesse uma
conotao panfletria, eu queria que ele tivesse uma dimenso cientfica.
Pergunta: Do ponto de vista da Semitica, de que forma os afetos e os ressentimentos
podem ser retrabalhados no ambiente universitrio? Ainda h esperana?
Resposta: Sabe que eu no sei se h esperana no. Ns precisaramos retrabalhar
isso e impregnar o ambiente universitrio de paixes positivas. O que ns tnhamos
de infundir em nossos alunos era a curiosidade, ns tnhamos de infundir no aluno
esse desejo do conhecimento. E infundir no aluno essa idia de que, quando eu
questiono uma coisa, eu no estou colocando em xeque a pessoa, mas questionando
uma idia. E de que o conflito, a discordncia, so inerentes ao fazer universitrio,
mas ao mesmo tempo isso pode ser feito com profundo respeito pessoa. Mas eu
temo que as novas configuraes do trabalho acadmico, com obrigaes cada vez
mais massacrantes de uma produtividade que s vezes sufocante... Eu temo que
isso v fazer com que, cada vez mais, os alunos sejam um atrapalho, pela necessidade
de produzir, de demarcar terreno, etc. Isso vai produzir cada vez mais ressentimento.
Acho que isso mostra que a paixo no uma coisa da natureza humana, ela at
pode ser, digamos assim, mas ela adquire uma configurao muito especial em cada
formao social. E no atual estgio de desenvolvimento do capitalismo, eu acho que
ns vamos ter cada vez mais ressentimento e no menos.
Pergunta: Em seu artigo Paixes, afetos, emoes e sentimentos, voc fala sobre a
questo do sujeito. O que o sujeito para a Semitica?
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Resposta: O sujeito para a Semitica no um sujeito real, fonte psicolgica do
discurso. Ele um efeito do discurso. Ele uma imagem do sujeito da enunciao.
Ele uma imagem construda pelo prprio discurso. E nisso a Semitica herdeira
de uma tradio longa, ela no inventou isso. H outras teorias atuais que, de alguma
maneira, falam nisso. Mas, digamos, ela herdeira de uma coisa antiga, que a
retrica de Aristteles. Quando Aristteles vai falar no thos, ele diz: o thos uma
prova do discurso porque ns tendemos a acreditar mais nas pessoas honestas do
que nas pessoas desonestas. E a ele diz uma coisa curiosa: preciso que a
honestidade do orador no seja uma preveno prvia sobre o seu carter, mas seja o
resultado do que ele diz. Ento, exatamente isso: o efeito de honestidade criado
pela forma como o sujeito argumenta. dentro dessa tradio que a Semitica se
coloca, pensando o seguinte: claro, existe um sujeito real, mas eu no tenho acesso a
ele, eu no posso entrar no seu interior, no seu psiquismo, para saber quem ele.
Portanto, no me interessa esse sujeito real. O que me interessa o sujeito criado
como efeito do discurso. isso o que para a Semitica o sujeito.
Pergunta: Qual a importncia do interesse da Semitica pela competncia modal do
sujeito?
Resposta: A Semitica sempre pensa que a narrativa conta como o sujeito age, e esse
sujeito age porque ele tem uma competncia para agir. Ele sabe fazer, ele pode fazer,
etc. Ora, essa competncia modal tem um componente pragmtico e um componente
passional. E, portanto, a competncia modal extremamente interessante porque ela
no estuda uma ao desencarnada dos sujeitos, mas ela estuda quais as condies
que levam o sujeito a fazer alguma coisa.
Pergunta: De que forma o sujeito realizador modalizado pelo querer, pelo dever,
pelo saber e pelo poder e como tais modalidades incidem sobre o fazer?
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Resposta: Bom, um sujeito s faz, quando ele quer ou deve fazer, quando ele sabe e
quando ele pode fazer. Sem essa competncia modal ele no pode agir. Agora veja: o
que interessante no dizer isso mecanicamente, comear a estabelecer tipologias
de sujeitos realizadores. Por exemplo, eu posso ter um sujeito modalizado pelo dever,
mas que no quer fazer, coagido a fazer. Posso ter um sujeito do querer, que quer
alguma coisa, mas no deve. Por exemplo, o sujeito que afronta o sistema e as
normas sociais. Ento eu posso comear a estabelecer uma tipologia dos sujeitos. Na
verdade, quando eu digo o sujeito quer, deve, pode, sabe fazer, eu estou pensando
tambm que, ao lado disso, eu tenho o sujeito que no sabe fazer, o sujeito que pode no
fazer, o sujeito que no pode no fazer, o sujeito que no sabe no fazer, o sujeito que no
deve no fazer, o sujeito que deve no fazer, o sujeito que no deve fazer, porque eu posso
negar as modalidades, negando o modalizador, o modalizado ou ambos. Ento, por
exemplo, eu tenho o dever fazer. Eu posso negar o modalizador: ele no deve fazer. Ou
ento eu posso negar o modalizado, o fazer: ele deve no fazer determinada coisa, o que
diferente de no deve fazer. Posso negar o modalizador e o modalizado: no deve no
fazer, e assim sucessivamente. Eu tenho um jogo de modalidades que vai criando
uma tipologia do sujeito. Por exemplo, o sujeito veleitrio, aquele que quer, mas no
deve, mas ele quer, ele insiste. Ou ento, por exemplo, o sujeito teimoso. O que o
sujeito teimoso? aquele que quanto menos pode mais quer. aquele que no pode
fazer alguma coisa, mas quer fazla e tenta, tenta. Isso o que ns chamamos de
teimoso. Ento vai-se criando nesse jogo de modalidades uma tipologia do sujeito.
Pergunta: Voc afirma em seu texto Semitica das paixes: o ressentimento que o
sujeito de estado permite estudar textos narrativos fundados sobre um processo de
construo ou de transformao do ser do sujeito e no apenas do seu fazer. Voc
pode falar um pouco mais sobre isso?
Resposta: Veja, no comeo a Semitica se preocupava muito com o fazer do sujeito.
Ela comea com as teorias da ao, estudando os contos populares, analisando a
trajetria dos heris, dos viles nesses contos: o prncipe que liberta a princesa, o
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drago que rapta a princesa, o rei que manda o heri salvar a princesa. Depois
amplia seu escopo para a totalidade de textos que trabalham com o fazer. Por
exemplo, um texto que descreve o enriquecimento de um sujeito e todas as aes que
ele realizou. S que chega num determinado momento, principalmente no que eu
chamo, com muitas aspas, a grande literatura, em que h textos que no operam
sobre o fazer do sujeito, mas sobre transformaes do ser do sujeito. Exemplo: Otelo
mata Desdmona, mas o problema da pea de Shakespeare no esse, o problema a
transformao de Otelo de um ser no ciumento para um ser ciumento, de um ser
no desconfiado para um ser desconfiado. Isso a transformao do sujeito. E eu
tenho inmeros textos que tratam exatamente desse tipo de transformao. Se eu
tomo, por exemplo, o romance O Leopardo, de Tomasi di Lampedusa, que deu um
belo filme de Visconti, verifico que nele no so as aes que tm importncia. O que
importante a afirmao do prncipe de Salina: preciso que tudo mude para que
tudo permanea no mesmo lugar. Ou seja, o que importa este movimento de
resistncia da aristocracia mudana, a no mudana do ser do aristocrata, isso
que o elemento central da obra.
Pergunta: Professor, quais so os grandes desafios e impasses da Semitica na
atualidade?
F: Eu diria o seguinte: como a Semitica uma teoria sempre em construo, ela tem
sempre grandes desafios. Eu diria que o primeiro desafio importante dar conta dos
novos objetos textuais que as novas tecnologias da informao esto colocando para
ns. Veja, no verdade que a Internet criou textos cujos sentidos se manifestam por
linguagens diferentes: visual, verbal, sonora no verbal tudo ao mesmo tempo.
Porque o cinema j faz isso. S que a Internet levou estas textualizaes a um tal
nvel de presena e de organizao das substncias de manifestao que elas colocam
novos desafios para ns. Ento um desafio da Semitica hoje estabelecer, com
bastante preciso, as relaes entre expresso e contedo, verificar como o sentido se
manifesta nas diferentes mdias, etc. Segundo: a Semitica tem um outro desafio
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importante, que conseguir o mesmo nvel de sofisticao descritiva da semitica
verbal para as semiticas no verbais. Ento, por exemplo, hoje ns falamos, a partir
de Benveniste, no aparelho formal da enunciao. O aparelho formal de enunciao
na linguagem verbal muito bem descrito, porque desde os gregos ns sabemos o
que pessoa, o espao, o tempo. Agora, qual o aparelho formal da enunciao da
pintura, do cinema...? Ns sabemos algumas coisas como, por exemplo, quando h o
escurecimento da tela, que o que se chama de fade-out, introduz-se um flashback ,
para presentificar o passado. Mas ser que ns conhecemos todos os recursos
enunciativos visuais? Ento este um outro desafio importante para a Semitica. E
teoricamente eu acho que a Semitica tem um desafio maior, no qual ela vem
trabalhando, com o desenvolvimento da chamada Semitica Tensiva: a
incorporao da continuidade na teoria. Pois veja, a Semitica aparece no perodo
estruturalista e, como qualquer teoria estruturalista, ela se fundamenta no
descontnuo: o fonema, por exemplo, descontnuo, categrico. So categricos,
por exemplo, os traos fnicos, como oclusivo e constritivo. O estruturalismo
primeiro quase no trabalhou com a transio, quase no trabalhou com a
continuidade. Agora com os problemas colocados pelas teorias ps-estruturalistas
ns temos o trabalho de incorporar na teoria exatamente o contnuo, todos os
fenmenos do contnuo. Como o primeiro estruturalismo se funda no descontnuo,
ele trabalhou mal com fenmenos contnuos, como, por exemplo, a entoao.
Exemplifiquemos uma questo do contnuo no texto: o ritmo do texto. Por que um
texto parece apressado ou parece lento? Esse um problema do contnuo, dentre
dezenas, centenas de problemas do contnuo que existem. Ento nisso a Semitica
vai se afastar um pouco de certas matrizes que esto na sua base e vai se aproximar
da retrica. Trata-se de uma retorizao da Semitica, que ela est comeando a fazer
com o que se chama Semitica Tensiva. E os impasses foram exatamente dados pelas
suas bases iniciais. Esse o movimento que ela tem de fazer, como toda teoria,
porque o discurso da cincia um discurso em perptua construo sem o que vira
dogmtico e o dogma prprio do discurso religioso e no do discurso cientfico.
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Entrevista a Cristina Sampaio
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C: O Professor, para finalizar, gostaria ainda de fazer alguma considerao?
F: Sim, eu gostaria de fazer uma considerao. Bakhtin distinguiu a Lingstica da
Translingstica. A Lingstica trata das significaes, que so dadas por relaes
internas, enquanto o sentido, que do domnio da Translingstica, dado pelas
relaes dialgicas. A Semitica uma teoria que est no nvel da anlise lingstica.
E preciso usar a anlise lingstica para fazer uma anlise translingstica.
preciso colocar a anlise lingstica numa perspectiva dialgica, que pertence a um
outro nvel de anlise, o do sentido.
C: Esta uma tarefa que o Professor est tomando para si?
F: Eu estou pensando nisso, agora sempre duro fazer um trabalho assim, no ?
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