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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
SIMONI GOMES
O CUMPRIMENTO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE NO BRASIL:
uma análise da realidade do sistema prisional em Santa Catarina
Tijucas
2010
SIMONI GOMES
O CUMPRIMENTO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE NO BRASIL:
uma análise da realidade do sistema prisional em Santa Catarina
Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas. Orientador: Prof. MSc. Alexandre Botelho
Tijucas
2010
SIMONI GOMES
O CUMPRIMENTO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE NO BRASIL:
uma análise da realidade do sistema prisional em Santa Catarina
Esta Monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em Direito e
aprovada pelo Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus Tijucas.
Área de Concentração/Linha de Pesquisa: Direito Público/Direito Processual Penal
Tijucas, 6 de dezembro de 2010.
Prof. MSc Alexandre Botelho Orientador
Prof. MSc. Marcos Alberto Carvalho de Freitas Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica
A minha amada mãe, Sueli Reis Gomes, pelo amor irrestrito, pela
dedicação, pelo companheirismo e, principalmente, por ter me
ensinado a lutar pelos meus ideais.
Ao meu pai, Alcides Gomes, pelo amor incondicional e por ter me
instruído a viver com honra, dignidade e humildade.
Ao meu namorado, Diogo Silva Félix, grande incentivador, presente
nos momentos em que mais precisei.
A vocês dedico este trabalho.
A Deus, fonte suprema de todo saber, que me deu o dom da inteligência.
Aos meus pais, Alcides e Sueli, pela confiança que depositaram em mim, pelo incentivo e
compreensão. Torcendo sempre pelas minhas conquistas, sem os quais com toda certeza eu
não chegaria até aqui.
Ao meu irmão, Anderson, pelos momentos compartilhados de alegrias e tristezas.
Ao meu namorado, Diogo, anjo que Deus colocou em minha vida, pelo amor, carinho,
compreensão e paciência durante esta jornada.
Ao orientador, Prof. MSc Alexandre Botelho, pela orientação segura no decorrer da pesquisa,
atenção dispensada e o conhecimento compartilhado. De quem sempre lembrarei como
exemplo de mestre.
Aos Professores do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, campus Tijucas, que
muito contribuíram para a minha formação jurídica.
A inestimável compreensão dos funcionários do Fórum da Comarca de Tijucas - SC, em
especial a Balnei Beal Fröhlich, que me ensinou as lições da vida, do direito e da amizade.
Aos colegas de classe, pelos momentos que passamos juntos e pelas experiências trocadas, em
especial, as amigas, Karen, Gabriela, Fabrini, Cristiane e Luciana, pela parceria nesses cinco
anos.
Aos que colaboraram com críticas e sugestões para a realização deste trabalho.
A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização desta pesquisa.
Para romper com essa monstruosa opção, para afastar a insensibilidade, é preciso, em primeiro lugar, tentar compreender o significado da privação da liberdade. É preciso conduzir nosso olhar, nossa imaginação, nossos sentimentos, para dentro dos muros das prisões, esforçando-nos por imaginar a infinita dor das pessoas que sofrem a pena, esforçando-nos para deixar de lado a indiferença, os preconceitos e as abstratas ideias que privilegiam a “ordem”, a “segurança”, a “defesa da sociedade”, ideias que, esquecendo-se da igualdade originária entre todos os indivíduos, dividem-se entre “cidadãos de bem” e “criminosos”, nefastas ideias que fazem acreditar na ilusão cruel de que para ter tranquilidade e segurança seria necessário colocar mais e mais pessoas atrás de grades e muros.
Maria Lucia Karam
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí –
UNIVALI, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca
do mesmo.
Tijucas, 6 de dezembro de 2010.
Simoni Gomes Graduanda
RESUMO
Esta monografia possui como tema o cumprimento das penas privativas de liberdade no Brasil e a realidade do sistema prisional em Santa Catarina, especialmente no que diz respeito a sua estrutura e adequação ao cumprimento das normas jurídicas que regem a execução penal. Destaca-se que a importância do mencionado tema reside na necessidade de evidenciar a real situação do cumprimento das penas privativas de liberdade nos estabelecimentos catarinenses em virtude da falta de estrutura existente, contrapondo-se ao disposto na Lei de Execuções Penais (LEP). A pesquisa examina se a realidade prisional catarinense propicia efetividade aos comandos contidos na LEP. Para responder esta questão foram consideradas as seguintes hipóteses: a) os estabelecimentos prisionais no Estado de Santa Catarina possuem estrutura para o cumprimento dos dispositivos elencados na LEP?; b) a execução da pena privativa de liberdade no Estado dá-se segundo os preceitos da LEP? Com o intuito de responder as proposições elencadas a presente pesquisa foi estrutura em três capítulos, em um primeiro momento far-se-á uma abordagem histórica, destacando a origem da pena e seus deslocamentos históricos, adentrando nos estabelecimentos de cumprimento. Após abordar-se-á a execução das penas privativas de liberdade, para ao final, dedicar-se ao efetivo cumprimento das penas privativas no Estado de Santa Catarina. A análise do cumprimento das penas privativas de liberdade é relevante por expandir a área de conhecimento das pessoas em relação à falência do atual sistema penitenciário, pois esta discussão não deve ser sonegada, visto que este tema reflete diretamente na qualidade da sociedade. Palavras-chave: Pena; Estabelecimentos; Cumprimento.
ABSTRACT
This monograph has as its theme the completion of custodial sentences in Brazil and the reality of the prison system in Santa Catarina, especially as regards their structure and suitability to fulfill the legal rules governing the enforcement of criminal law. It is noteworthy that the importance of that theme is the need to highlight the real situation of compliance with custodial establishments in Santa Catarina, given the lack of existing structure, opposing the provisions in the Law of Penal Execution (LEP). The research examines the reality of prison life Catarina effectiveness provides the commands contained in the LEP. To answer this question we considered the following assumptions: a) prisons in the state of Santa Catarina have a structure for compliance with the provisions listed in the LEP? B) the execution of sentence of imprisonment in the state takes place according to the precepts of LEP? In order to answer the propositions listed in this survey was structured in three chapters, at first far will be a historical approach, emphasizing the origin of his pen and historical shifts, entering the establishments for compliance. After approaching will be the execution of custodial sentences to the end to devote himself to the effective enforcement of sentences in the State of Santa Catarina. The analysis of the completion of custodial sentences is important for expanding the area of knowledge of people in connection with the bankruptcy of the current prison system, for this discussion should not be withheld, since this issue is directly reflected in the quality of society. Keyword: Penalty; Institute; Compliance.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Quantidade de unidades prisionais no Estado de Santa Catarina Tabela 2 – Número de vagas oferecidas no Estado Tabela 3 – Número de presos recolhidos nos estabelecimentos do Estado Tabela 4 – Quantidade de presos por faixa etária Tabela 5 – Quantidade de presos por etnia Tabela 6 – Quantidade de presos por grau de instrução
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
a.C art. arts. atual. caput CRFB/88 CP CTN ed. Ed. in verbis LEP Min. MSc. n. nov. out. p. PEC Prof. RDD Rel. rev. set. UNIVALI v. §
Antes de Cristo Artigo Artigos Atualizada Cabeça Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 Código Penal Código Tributário Nacional Edição Editora Nestas palavras Lei de Execução Penal Ministro Mestre Número Novembro Outubro Página Processo de Execução Criminal Professor Regime Disciplinar Diferenciado Relator Revista Setembro Universidade do Vale do Itajaí Volume Parágrafo
LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS
Lista de categorias1 que a autora considera estratégicas à compreensão do seu trabalho,
com seus respectivos conceitos operacionais2.
Cadeia Pública Também conhecidas como Unidades Prisionais Avançadas, são estabelecimentos penais destinados ao recolhimento de pessoas presas em caráter provisório3.
Casa de Albergado São estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas presas que cumprem pena privativa de liberdade em regime aberto e da pena de limitação de fins de semana4.
Centro de Observação São estabelecimentos penais de regime fechado e de segurança máxima, onde devem ser realizados os exames gerais e criminológico, cujos resultados serão encaminhados às Comissões Técnicas de Classificação, as quais indicarão o tipo de estabelecimento e o tratamento adequado para cada pessoa detida5.
Colônia Agrícola ou Industrial São estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas presas que cumprem pena em regime semiaberto. Nestes estabelecimentos, o apenado será alojado em compartimentos coletivos e terá direito ao trabalho remunerado, com remissão de pena6.
Cumprimento Ato de executar a pena imposta ao réu7.
Execução Penal É a fase da persecução penal que tem por fim propiciar a satisfação efetiva e concreta da pretensão de punir o Estado, agora denominada pretensão executória, tendo em vista uma 1 Denomina-se “categoria” a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. 8. ed. Florianópolis: OAB Editora, 2003, p. 31. 2 Denomina-se “Conceito Operacional” a definição ou sentindo estabelecido para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas ao longo do trabalho. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito, p. 43. 3 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização). Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2008, p. 42. 4 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 44. 5 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 44. 6 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 43. 77 DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. 2. ed. rev. atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 1187.
sentença judicial transitada em julgado, proferida mediante o devido processo legal, a qual impõe uma sanção penal ao autor de um fato típico e ilícito8.
Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Estabelecimentos penais destinados a abrigar pessoas submetidas à medida de segurança. Destina-se à internação de inimputáveis e semi-inimputáveis, quando sentenciados por medida de segurança9.
Pena É a sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cujas finalidades são aplicar a retribuição punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade10.
Pena Privativa de liberdade É a que restringe, com maior ou menor intensidade, a liberdade do condenado, consistente em permanecer em algum estabelecimento prisional, por um determinado tempo, tudo na conformidade do regime imposto11.
Penitenciária [...] são estabelecimentos penais destinados ao recolhimento de pessoas presas com condenação à pena privativa de liberdade em regime fechado12.
Presídio É o local em que os presos aguardam julgamento, ou esperam vaga na penitenciária, até que possam ser transferidos13.
Unidade Prisional Avançada São estabelecimentos penais destinados ao recolhimento de pessoas presas em caráter provisório14.
8 CAPEZ, Fernando. Execução penal. 10 ed. São Paulo: Ed. Damásio de Jesus, 2004, p. 18-19. 9 KLOCH, Henrique. O Sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 44. 10 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 19. 11 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva. 1999, p. 234. 12 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 43. 13 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 42. 14 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 42.
SUMÁRIO
RESUMO ................................................................................................................................... 5
ABSTRACT ............................................................................................................................... 6
LISTA DE TABELAS .............................................................................................................. 7
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS .............................................................................. 8
LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS .............................. 9
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 13
2 PRESSUPOSTOS HISTÓRICOS ...................................................................................... 17
2.1 ORIGEM DA PENA E SEUS DESLOCAMENTOS HISTÓRICOS ................................ 17
2.1.1 Vingança privada ............................................................................................................. 20
2.1.2 Vingança divina ............................................................................................................... 23
2.1.3 Vingança pública ............................................................................................................. 25
2.1.4 Período humanitário ......................................................................................................... 26
2.2 ORIGEM DOS SISTEMAS PENITENCIÁRIOS .............................................................. 28
2.2.1 O sistema panóptico ......................................................................................................... 29
2.2.2 O sistema pensilvânico ou celular ................................................................................... 31
2.2.3 O sistema auburniano....................................................................................................... 33
2.2.4 O sistema progressivo ...................................................................................................... 35
2.2.4.1 O sistema montesinos ................................................................................................... 37
2.2.4.2 O sistema progressivo inglês ........................................................................................ 38
2.2.4.3 O sistema progressivo irlandês ..................................................................................... 39
2.3 ESPÉCIES DE PENAS ...................................................................................................... 40
2.3.1 Penas restritivas de direitos.............................................................................................. 41
2.3.2 Pena de multa ................................................................................................................... 43
2.3.3 Pena privativa de liberdade .............................................................................................. 46
2.3.3.1 Prisão simples ............................................................................................................... 49
2.3.3.2 Detenção ....................................................................................................................... 50
2.3.3.3 Reclusão ........................................................................................................................ 51
3 DA EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE ................................. 53
3.1 PROCESSO DE EXECUÇÃO CRIMINAL ...................................................................... 53
3.1.1 Início da execução da pena .............................................................................................. 55
3.1.1.1 Execução provisória ...................................................................................................... 56
3.1.1.2 Execução definitiva ....................................................................................................... 58
3.1.2 Princípios do direito penal executivo............................................................................... 59
3.1.2.1 Princípio da legalidade .................................................................................................. 61
3.1.2.2 Princípio da igualdade .................................................................................................. 62
3.1.2.3 Princípio da jurisdicionalidade ..................................................................................... 63
3.1.2.4 Princípio do duplo grau de jurisdição ........................................................................... 64
3.1.2.5 Princípio do contraditório ............................................................................................. 65
3.1.2.6 Princípio da humanização da pena ................................................................................ 66
3.1.2.7 Princípio da proporcionalidade ..................................................................................... 67
3.1.2.8 Princípio da individualização da pena .......................................................................... 68
3.2 REGIMES DE CUMPRIMENTO ...................................................................................... 69
3.2.1 Regime fechado ............................................................................................................... 70
3.2.2 Regime semiaberto .......................................................................................................... 73
3.2.3 Regime aberto .................................................................................................................. 75
3.2.4 Regime especial ............................................................................................................... 77
3.2.5 Regime disciplinar diferenciado ...................................................................................... 79
3.3 BENEFÍCIOS ..................................................................................................................... 80
3.3.1 Progressão de regime ....................................................................................................... 80
3.3.1.1 Progressão por salto ...................................................................................................... 85
3.3.2 Autorizações de saídas ..................................................................................................... 86
3.3.2.1 Saída especial ................................................................................................................ 87
3.3.2.2. Saída temporária .......................................................................................................... 87
3.3.3. Livramento condicional .................................................................................................. 89
3.3.4. Remição .......................................................................................................................... 92
3.4. TRABALHO ...................................................................................................................... 94
3.4.1 Trabalho interno ............................................................................................................... 95
3.4.2 Trabalho externo .............................................................................................................. 96
3.5. REGRESSÃO DE REGIME ............................................................................................. 97
4 DO CUMPRIMENTO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE NO BRASIL E A REALIDADE DO SISTEMA PRISIONAL EM SANTA CATARINA ......................... 99
4.1 PREVISÃO LEGAL ........................................................................................................... 99
4.1.1 Arquitetura prisional ...................................................................................................... 101
4.1.2 Separação dos presos ..................................................................................................... 103
4.1.3 Estabelecimentos para mulheres e maiores de 60 anos de idade ................................... 105
4.1.4 Capacidade das prisões .................................................................................................. 106
4.1.5 Execução da pena em outro Estado ............................................................................... 107
4.1.6 Competência para a remoção ......................................................................................... 108
4.2 ESTABELECIMENTOS PENAIS ................................................................................... 109
4.2.1 Penitenciária................................................................................................................... 110
4.2.2 Colônia agrícola e industrial .......................................................................................... 112
4.2.3 Casa de albergado .......................................................................................................... 114
4.2.4 Centro de observação ..................................................................................................... 116
4.2.5 Hospital de custódia e tratamento psiquiátrico .............................................................. 117
4.2.6 Cadeia pública................................................................................................................ 118
4.3 ANÁLISE DAS UNIDADES PRISIONAIS NO ESTADO DE SANTA CATARINA .. 120
4.3.1 Estabelecimentos prisionais ........................................................................................... 121
4.3.2 Estrutura ......................................................................................................................... 123
4.3.3 Superlotação................................................................................................................... 127
4.3.4 Reincidência................................................................................................................... 128
4.3.5 Ressocialização .............................................................................................................. 129
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 133
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 138
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por objeto15 abordar o cumprimento das penas privativas de
liberdade no Brasil e a realidade do sistema prisional no Estado de Santa Catarina,
especialmente no que diz respeito a sua estrutura e adequação ao cumprimento das normas
jurídicas que regem a execução penal.
A importância deste tema reside na necessidade de demonstrar a real situação do
cumprimento das penas privativas de liberdade no Estado de Santa Catarina em virtude da
falta de estrutura oferecida, contrapondo-se ao disposto na Lei de Execuções Penais
Ressalte-se que, além de ser requisito imprescindível à conclusão do curso de Direito
na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, o presente relatório monográfico também vem
colaborar para o conhecimento de um tema que, apesar de não poder ser tratado como
novidade no campo jurídico, na dimensão social-prática ainda pode ser tratado como elemento
novo e repleto de nuances a serem destacadas pelos intérpretes jurídicos.
O presente tema, na atualidade, está a exigir uma série de estudos de forma a permitir
um planejamento e adequação aos mandamentos legais, diante da situação deplorável em que
se encontram as penas no Brasil, bem como no Estado de Santa Catarina, eis que são muitos
os problemas enfrentados no decorrer do cumprimento da pena, em virtude, principalmente,
da falta de unidades prisionais adequadas.
A escolha do tema é fruto do interesse pessoal da pesquisadora, tendo em vista o
estágio realizado na Unidade Criminal da 2ª Vara da Comarca de Tijucas/SC, sob um
contanto permanente com os processos de execuções criminais, vivenciando a prática da falta
de estrutura no cumprimento das penas, assim como para instigar novas contribuições para
estes direitos na compreensão dos fenômenos jurídico-políticos, especialmente no âmbito de
atuação do Direito Público e Processual Penal.
15 Nesta Introdução cumpre-se o previsto em PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 170-181.
14
Em vista do parâmetro delineado, constitui-se como objetivo geral deste trabalho
compreender e analisar o cumprimento das penas privativas de liberdade no Estado de Santa
Catarina.
O objetivo institucional da presente Monografia é a obtenção do Título de Bacharel
em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas,
campus de Tijucas.
Como objetivo específico, pretende-se abordar os pressupostos históricos, a execução
da penas privativas de liberdade e uma análise da efetividade dos estabelecimentos prisionais
no Estado de Santa Catarina, principalmente no que tange à capacidade e a população
carcerária.
A análise do objeto do presente estudo incidirá sobre as diretrizes teóricas propostas
por Julio Fabbrini Mirabete, na obra Execução penal: comentários à Lei 7.210, de 11-7-1984
e, Sídio Rosa de Mesquita Junior, na obra Manual de execução penal: teoria e prática. Este
será, pois, o marco teórico que norteará a reflexão a ser realizada sobre o tema escolhido.
Não é o propósito deste trabalho elencar o entendimento jurisprudencial, acerca do
tema, tampouco analisar as peculiaridades de cada um dos estabelecimentos existentes no
Estado de Santa Catarina. Por certo não se estabelecerá um ponto final na discussão acerca da
adequação desse tipo de estabelecimento no cumprimento de seus objetivos. Pretende-se, tão-
somente, aclarar o pensamento existente sobre o tema, circunscrevendo-o às unidades
prisionais existentes e em construção neste Estado.
Para o desenvolvimento da presente pesquisa foram formulados os seguintes
questionamentos:
a) Os estabelecimentos prisionais no Estado de Santa Catarina possuem estrutura para o
cumprimento dos dispositivos elencados na LEP?
b) A execução da pena privativa de liberdade no Estado dá-se segundo os preceitos da LEP?
Já as hipóteses consideradas foram as seguintes:
a) Os estabelecimentos prisionais no Estado de Santa Catarina não possuem estrutura para o
cumprimento dos dispositivos elencados na LEP;
15
b) Os estabelecimentos prisionais no Estado de Santa Catarina possuem estrutura para o
cumprimento dos dispositivos elencados na LEP;
c) A execução (cumprimento) das penas privativas de liberdade não obedece aos parâmetros
delineados na LEP;
d) A execução (cumprimento) das penas privativas de liberdade ocorre em estreita
observância aos dispositivos contidos na LEP.
Finalmente, buscou-se nortear as hipóteses formuladas com as seguintes variáveis:
a) Produção legislativa que viesse a alterar os comandos normativos da execução penal;
b) Estabelecimento de orientação jurisprudencial no sentido de alterar substancialmente as
regras de cumprimento da execução penal.
O relatório final da pesquisa foi estruturado em três capítulos, podendo-se, inclusive,
delineá-los como três molduras distintas, mas conexas: a primeira, atinente aos deslocamentos
históricos; a segunda, a execução das penas privativas de liberdade; e, por derradeiro, o
cumprimento das penas privativas de liberdade no Estado de Santa Catarina.
Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na fase de investigação foi utilizado
o método indutivo, e, o relatório dos resultados expresso na presente monografia é composto
na base lógica dedutiva16, já que se parte de uma formulação geral do problema, buscando-se
posições científicas que os sustentem ou neguem, para que, ao final, seja apontada a
prevalência, ou não, das hipóteses elencadas.
Nas diversas fases da pesquisa, foram acionadas as técnicas do referente, da categoria,
do conceito operacional e da pesquisa bibliográfica17.
Os acordos semânticos que procuram resguardar a linha lógica do relatório da pesquisa
e respectivas categorias, por opção metodológica, estão apresentados na Lista de Categorias e
seus Conceitos Operacionais, muito embora algumas delas tenham seus conceitos mais
aprofundados no corpo da pesquisa.
16 Sobre os “Métodos” e “Técnicas” nas diversas fases da pesquisa científica, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 99-125. 17 Quanto às “Técnicas” mencionadas, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 61-71, 31- 41, 45- 58, e 99-125, nesta ordem.
16
A estrutura metodológica e as técnicas aplicadas nesta monografia estão em
conformidade com o padrão normativo da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)
e com as regras apresentadas no Caderno de Ensino: formação continuada, Ano 2, número 4;
assim como nas obras de Cezar Luiz Pasold, Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas
úteis ao pesquisador do Direito e Valdir Francisco Colzani, Guia para redação do trabalho
científico.
A presente monografia se encerra com as Considerações Finais, nas quais são
apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos
estudos e das reflexões sobre o cumprimento das penas privativas de liberdade no Brasil e a
realidade do sistema prisional em Santa Catarina.
Com este itinerário, espera-se alcançar o intuito que ensejou a preferência por este
estudo analisar em que condições dá-se o cumprimento das penas privativas de liberdade no
sistema carcerário catarinense.
2 PRESSUPOSTOS HISTÓRICOS
Para analisar a atual situação do cumprimento das penas privativas de liberdade no
Brasil e a realidade do sistema prisional no Estado de Santa Catarina, torna-se necessário
ponderar a função e a efetividade do sistema prisional, para tanto esta análise histórica busca
encadear o ser humano submetido à pena privativa de liberdade ao sistema carcerário.
Hoje não se pode mais dissociar o problema prisional, com suas tradicionais carências,
dos demais problemas sociais. Humanizar as unidades prisionais é também ter nelas um
ambiente equilibrado no qual as relações humanas de trabalho, saúde, educação, lazer e
desenvolvimento pessoal possam cooperar com a sociedade que se encontra fora das grades.
Igualmente, antes de aclarar sobre o cumprimento das penas privativas de liberdade,
faz-se necessário abordar sua origem e deslocamentos históricos, a fim de adentrar na efetiva
aplicação da execução penal.
2.1 ORIGEM DA PENA E SEUS DESLOCAMENTOS HISTÓRICOS
Noção preliminar será necessária, principalmente no que se refere à pena e aos seus
estabelecimentos de cumprimento, uma vez que o Direito Penal executivo tem por escopo as
normas relativas à execução da sanção penal imposta.
Para uma compreensão adequada ao tema faz-se necessário conceituar o que vem a ser
pena. Nesse sentido, ensina Capez:
Pena é a sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cujas finalidades são aplicar a retribuição punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade18.
Assim sendo, a pena é uma sanção penal imposta pelo Estado, a qual surgiu como
forma de punir o condenado em processo judicial criminal, bem como expor à coletividade
18 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 19 [grafia conforme original].
18
qual a implicação caso venha a praticar a aludida ação, visto que, desde os primórdios, sempre
esteve adjunta ao castigo, como ainda é vista pela sociedade nos dias atuais.
Segundo Oliveira, a etimologia19 do termo pena é originária do latim poena, com
derivação do grego poine, que significa dor, castigo, punição, expiação, penitência,
sofrimento, trabalho, fadiga, submissão, vingança e recompensa20.
Extrai-se dos ensinamentos de Kloch: “A etiologia21 da aplicação da pena se alcança
por meio da preocupação em vingar, reparar e manter a sociedade organizada, mesmo que
para isso a crueldade e atos desumanos tivessem de servir de exemplo”22.
A pena, em sua origem, era baseada no revide à agressão sofrida, não havendo
qualquer preocupação quanto à proporcionalidade e, tampouco, com a justiça23.
Assevera Capez, que “A finalidade da pena é punir o autor de uma infração penal. A
pena é a retribuição do mal injusto, praticado pelo criminoso, pelo mal justo previsto no
ordenamento jurídico”24.
Com o passar do tempo, o Direito Penal proporcionou mais variadas respostas com
vistas a combater e solucionar a criminalidade. Esses recursos são chamados teorias da pena,
as quais serão tratadas sucintamente a seguir.
A teoria absoluta ou retributiva está pautada na doutrina da retribuição; em direção
oposta encontra-se a teoria relativa ou preventiva, que se subdivide em duas (doutrina da
prevenção geral e prevenção especial); por fim, tem-se a teoria mista ou unificadora, que
agrupa ambas as teorias supracitadas25.
19 Denomina-se “etimologia” o estudo da origem e formação das palavras de determinada língua. Cf. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio básico da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988, p. 280. 20 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. 3. ed. rev. Florianópolis: Ed. UFSC, 2003, p. 24. 21 Denomina-se “etiologia” o estudo sobre a origem das coisas. Cf. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio básico da língua portuguesa, p. 280. 22 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 16. 23 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 20. 24 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 19. 25 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 81.
19
Deste modo, na teoria absoluta ou retributiva a aplicação da pena tem como única
colocação a compensação da culpa, havendo dessa forma uma desordem entre direito e moral.
Isso porque ela caracteriza agressão à dignidade humana e por distinto fluxo a satisfação à
generalidade em detrimento do sujeito.
Nesse sentido, leciona Costa Junior:
A retribuição implica a personalidade da pena, só devendo atingir o autor do crime; a proporcionalidade da pena, com o mal praticado; a sua determinação prévia, e a sua inderrogabilidade, devendo, pois, ser necessariamente cumprida pelo réu26.
Por outro lado, a sanção penal possui uma finalidade preventiva, desta forma é
aplicada no sentido de evitar a prática de novas infrações, tentando intimidar a sociedade, bem
como o autor do delito27.
Extrai-se dos ensinamentos de Damásio de Jesus, que a prevenção é geral ou especial:
Na prevenção geral o fim intimidativo da pena dirige-se a todos os destinatários da norma penal, visando a impedir que os membros da sociedade pratiquem crimes. Na prevenção especial a pena visa o autor do delito, retirando-o do meio social, impedindo-o de delinqüir e procurando corrigi-lo28.
Por fim, assevera Bittencourt que as teorias unificadoras aceitam a retribuição e o
princípio da culpabilidade como critérios limitadores da intervenção da pena como sanção
jurídico-penal. A pena não pode, pois, ir além da responsabilidade decorrente do fato
praticado29.
Exaltam-se ainda os ensinamentos do autor de que “é quase unânime, no mundo da
ciência do Direito Penal, a afirmação de que a pena justifica-se por sua necessidade”. Desta
forma, a pena pode ser compreendida como um modo de repressão imposta pelo poder
público à infração de algum preceito normativo30.
26 COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito penal objetivo: comentários atualizados. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006, p.81. 27 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 19. 28 DAMÁSIO DE JESUS, Evangelista. Direito penal: parte geral. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 519 [grafia conforme original]. 29 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 143. 30 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 81.
20
A exigência do homem fez surgir as instituições penais, pela necessidade de um
ordenamento coercivo que afiançasse a paz e a tranquilidade no modo de viver em
coletividade. Sendo, por isso, um imperativo do próprio relacionamento entre os indivíduos31.
Ademais, pondera Kloch:
Até o fim do século XVIII, a execução da pena era um espetáculo público, nos quais os condenados eram submetidos a sofrimentos corporais, muitas vezes com consumação de crueldade, com o intuito de exemplificar a comunidade, brandindo o medo como objetivo a inibir a desordem32.
Igualmente, o homem apresenta como um dos instintos fundamentais a conservação
individual, na qual cada ato que venha a ofendê-lo, ou magoá-lo, surge uma defesa como
reação. Assim sendo, o ser humano, primitivamente, não atuava com o princípio da razão,
mas se impulsionava por reações advindas dos sentimentos33.
Surgem assim as primeiras vinganças utilizadas como forma de inibir atitudes
contrárias aos interesses do indivíduo. Motivo pelo qual se fará uma abordagem das três
formas de vinganças defensivas, período subdivido em três fases: vingança privada, vingança
divina e vingança pública.
2.1.1 Vingança privada
Inicia-se o estudo desse item a partir da base mais primitiva do ser humano, na qual a
punição tem aspecto de mera reação instintiva contra tudo que pudesse representar uma
intimidação à sobrevivência individual ou do grupo34.
Assim ensina Falconi:
Desde o amanhecer da humanidade, o homem tende a reagir contra qualquer forma de agressão. Essa reação de defesa é coisa nata da pessoa humana. Se tentarmos colocar o dedo nos olhos de uma criança de 30 dias, ela se defenderá fechando-os instintivamente, e assim por diante35.
31 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 16. 32 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 16. 33 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 24. 34 MIRABETTE, Julio Fabrinni. Manual de direito penal. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 36. 35 FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal. 3. ed. rev. ampl. São Paulo: Ícone, 2002, p. 33.
21
Nos primórdios da civilização, a concepção da pena revolvia em torno da prevalência
da lei do mais forte, assim sendo, a vingança não suportava um sistema prisional com o
recolhimento do infrator e, sim, uma execução imediata. Fase esta, na qual a pena passava da
pessoa do infrator, atingindo sua família e até mesmo sua tribo36.
Nesta fase, a reação à agressão era a regra, uma vez que ocorria a reação da vítima,
dos parentes e até do seu grupo social, sem que houvesse a proporcionalidade entre a ofensa e
o revide37.
Observa-se que a pena não obedecia ao princípio da proporcionalidade na sua
aplicação vingativa, estendendo-se invariavelmente à família do acusado. Conforme os
ensinamentos de Noronha, “[...] o revide não guardava proporção com a ofensa, sucedendo-
se, por isso, lutas acirradas entre grupos e famílias, que, assim, se iam debilitando,
enfraquecendo e extinguindo”38.
Nesse sentido, vale-se da lição de Falconi:
Não havia proporcionalidade entre a conduta criminosa e a retorsão desencadeada. Assim, uma bofetada poderia ter como revide um homicídio, ou a morte de um filho representar a morte do chefe da família do agressor, que nada teve a ver com a conduta criminosa anterior39.
Na hipótese do criminoso pertencer à mesma tribo da vítima, a sanção penal visava
condená-lo à perda da paz ou banimento do membro, assim como guerras grupais, sendo que
advinda esta decisão o condenado perdia a proteção do grupo ao qual pertencia40.
Portanto, no período da vingança privada, qualquer pessoa que se achava ofendida por
outrem poderia providenciar a retribuição pelo mal ocasionado, mesmo sem a
proporcionalidade.
Nesta fase, a pena era concebida apenas como meio para satisfação de algum
indivíduo. No entendimento de Kloch, “a vingança era aproveitada como forma de reprimir o
36 LEAL, João José. Direito penal geral. Florianópolis: Ed. OAB/SC, 2004, p. 66-67. 37 MIRABETTE, Julio Fabrinni. Manual de direito penal, p. 36. 38 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal, p. 20. 39 FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, p. 33. 40 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Introdução ao estudo do direito penal. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 14.
22
mal; embora dentro de uma brutalidade inigualável, era instrumento utilizado para coibir
desvios de condutas sociais” 41.
Em face dessa incipiente capacidade de entender as coisas e os fenômenos que o
cercava, o homem primitivo deixava-se levar por influências sobrenaturais que somente
concebia pela magia e superstição42.
Igualmente, a vingança privada foi limitada pela composição e pela Lei de Talião, que
representou a primeira tentativa de restringir a punição. Mesquita Junior enfatiza:
Enunciada pela conhecidíssima expressão “olho por olho, dente por dente”, a Lei de Talião contribuiu significativamente para a humanização da pena, pois representou a limitação da pena a ser aplicada ao infrator, ou seja, a sanção deveria corresponder ao dano causado43.
Deste modo, Talião foi a primeira lei na conquista pela proporcionalidade do revide.
Assim sendo, a vingança perdeu sua arbitrariedade, surgindo como um instrumento
moderador da pena.
Prossegue Falconi ao destacar que “[...] se considerar a desproporcionalidade existente
na época, chega-se à conclusão de que o ‘Talião’ serviu de freio contra os excessos, os abusos
nas retorsões”44.
Posteriormente surgiu a composição, através da qual o ofensor comprava sua liberdade
com dinheiro, armas ou gado. Iniciando-se assim a substituição da pena voltada à integridade
física do condenado por uma forma de indenização pelo mal praticado45.
Neste norte, extrai-se da doutrina de Falconi:
Iniciava-se a substituição da pena aflitiva contra a integridade física do condenado por uma forma qualquer de indenização. Essa indenização poderia ser uma retribuição pecuniária ou mesmo a prestação de serviços
41 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 17-18. 42 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 18. 43 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 54. 44 FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, p. 35. 45 FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, p. 37.
23
pelo criminoso à família do ofendido. Modernamente falamos em pena pecuniária46.
Com a composição o delinquente poderia comprar a impunidade do ofendido ou de
seus parentes com dinheiro, armas, gado ou utensílios. Então, não havia sofrimento físico ou
pessoal, mas uma reparação material proporcionalmente correspondente ao dano. O
sentimento e a vingança impulsionavam a justiça e motivavam que ela fosse realizada47.
De todo modo, o período da vingança privada, conhecido como sentimental, foi
marcado pelo anseio de justiça provocado pelos povos, por meio das mais diversas formas de
punir48.
2.1.2 Vingança divina
Após a vingança privada, a pena passou a ter caráter reparatório, em face da definição
religiosa do ato ofensivo, surgindo desta forma as prisões. Nesta fase, inicia-se um poder de
união social apto a constituir condutas sob pena de castigos. Para Kloch, o caráter religioso do
ato insultuoso destinava-se não só a abrandar a fúria divina, mas também restabelecer o status
quo ante àquela sociedade49.
No mesmo sentido, destaca Noronha:
Já existe um poder social capaz de impor aos homens normas de conduta e castigo. O princípio que domina a repressão é a satisfação da divindade, ofendida pelo crime. Pune-se com rigor, antes com notória crueldade, pois o castigo deve estar em relação com a grandeza do deus ofendido50.
A punição na fase da vingança divina não possuía diferente objetivo senão a de aplacar
a afronta aos deuses e recuperar o espírito do delinquente. Ademais, a religião influenciava
decisivamente na vida dos povos antigos, sendo a sanção penal determinada pelo órgão
sacerdotal.
46 FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, p. 37. 47 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 27. 48 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 27. 49 KLOCH, Henrique. O Sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 18 50 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal, p. 21.
24
Prosseguindo nessa linha de raciocínio, assenta Farias Junior:
[...] determinados povos da antiguidade cultivavam a crença de que a violação da boa convivência ofendia a divindade e que sua cólera fazia recair a desgraça sobre todos, todavia, se houvesse uma reação, uma vingança contra o ofensor, equivalente a ofensa a divindade depunha a sua ira, voltava a ser propícia e a dispensar de novo a sua proteção a todos51.
Para Cernicchiaro, “o período da vingança divina se caracteriza pela circunstância da
justiça penal ser realizada para satisfazer ao desejo da autoridade divina, interessada em punir
o criminoso, ao mesmo tempo, autor do pecado”52.
Na fase da vingança divina a religião confundia-se com o direito, sendo que as leis em
eficácia originavam-se dos princípios religiosos e morais, na qual qualquer infração dessas
regras implicava a perda de direitos, se não da vida. Tais princípios eram típicos do Código de
Manú (Índia), também sendo adotados na Babilônia (Código de Hamurábi), no Egito (Cinco
Livros), na China (Livro das Cinco Penas), na Pérsia (Avesta) e pelo povo de Israel
(Pentateuco)53.
Aludida fase caracterizava-se pela brutalidade, conforme preceitua Kloch:
Neste período, recorria-se a pena capital, às penas corporais, como as mutilações, açoites e humilhações públicas. A prisão era uma espécie de suplício, onde confissões arrancadas à base de torturas eram freqüentes, com o intuito de justificar o castigo e purificar a alma54.
Assim, Kloch entende que “até o final do século XVI a prisão serviu somente de
contenção e guarda de réus, para preservá-los fisicamente, até o momento de serem julgados
ou executados”55.
Destaca-se que a origem das penitenciárias deu-se neste período – término da Idade
Média, visto que a Igreja aplicava a prisão como forma de impor penitência, castigo e
punição.
51 FARIAS JUNIOR, João. Manual de criminologia. 2. ed. Curitiba: Juruá, 1993, p. 23-24. 52 CERNICCHIARO, Luiz Vicente. Estrutura do direito penal. São Paulo: Sugestões Literárias, 1972, p. 14. 53 MIRABETTE, Julio Fabrinni. Manual de direito penal, p. 36. 54 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 20 [grafia conforme original]. 55 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 19-20.
25
Não obstante isso, a Igreja foi responsável por inúmeras atrocidades contra a
humanidade, submetendo o criminoso às penas mais repugnantes, fato este que assinalou a
fase da vingança divina56.
2.1.3 Vingança pública
Devido ao fato da sociedade apresentar-se de forma organizada, surge uma nova fase
denominada vingança pública, caracterizada pelo poder do Estado, especialmente pelo poder
político.
A propósito deste assunto, relevante a lição de Kloch:
No período da vingança pública, já com o desenvolvimento da civilização e a idéia do Estado, as penas passaram a ser ordenadas pelas legislações e aplicadas pelos órgãos governamentais. A pena deixa de ser uma vingança privada ou divina, para ser uma vingança da sociedade. Neste período o crime ou a infração abandonou a relação direta com a imposição religiosa57.
Diante de tal panorama, a pena perdeu sua índole sacra para converter-se em uma
sanção imposta em nome de uma autoridade pública, representativa dos interesses da
coletividade.
Ademais, ensina Oliveira que “as leis já não podiam ser aceitas como simples
costumes sagrados, reveladas e sancionadas pelos deuses, misturadas com os regulamentos
litúrgicos, nos antigos códigos dos templos”58.
Assim, segundo Falconi, este período de aplicação do Direito Penal antigo, visava
garantir a integridade e a autoridade dos soberanos e príncipes. No entendimento da época,
quanto mais forte e cruel fosse a pena aplicada, melhor e mais eficiente seria a emenda do
criminoso59.
Contudo, em que pese as ponderações acima mencionadas, a punição mantinha-se
cruel, tal qual na vingança divina. Neste período, a sociedade conheceu a pena de morte, que
não resguardava o infrator e, tampouco, seus parentes e demais membros da tribo.
56 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 38. 57 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 20-21. 58 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 35. 59 FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, p. 34.
26
Ressalta-se que, segundo os ensinamentos de Farias Junior, a vingança pública se
generalizou com o uso de juízes e tribunais, objetivando conter a criminalidade. Contudo, por
mais aterrorizadores que fossem os castigos e os suplícios aplicados aos delinquentes, por
mais ostensiva que tenha sido a pretensa exemplaridade das execuções das penas corporais e
inflamantes, nunca houve eficaz efeito inibitório, nem frenador da criminalidade60.
No período da vingança pública, já com o desenvolvimento da civilização e a ideia de
Estado, as penas passaram a ser aplicadas pelos órgãos governamentais. O poder de punir
partiu das mãos de terceiros e passou a ser monopólio do Estado.
Nesse sentido, enfatiza Oliveira que fortalecida a autoridade pública, torna-se intenso
o Estado com competência para sobrepor-se à vontade individual avocando para si o exercício
da pena, extraindo da mão do ofendido e da vítima, bem como de sua família, referida
titularidade61.
Portanto, analisados os períodos de consternação nos quais eram aplicadas as punições
de maneira tão intransigente, passa-se a adentrar no processo de humanização da pena,
momento caracterizado por uma evolução para os direitos humanos, objeto de análise do
próximo contexto.
2.1.4 Período humanitário
Nesta fase a pena passa a ser baseada na culpa e na reprovação social, assumindo um
caráter de retribuição ética, intimidativo e regenerador. Este período pode ser encarado como
um protesto à crueldade62.
Ademais, expõe Bitencourt:
As leis em vigor inspiravam-se em idéias e procedimentos de excessiva crueldade, prodigalizando os castigos corporais e a pena capital. O Direito era um instrumento gerador de privilégios, o que permitia aos juízes, dentro do mais desmedido arbítrio, julgar os homens de acordo com a sua condição social. Inclusive os criminalistas mais famosos da época defendiam em suas
60 FARIAS JUNIOR, João. Manual de criminologia, p. 6. 61 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 36. 62 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 24.
27
obras procedimentos e instituições que respondiam à dureza de um rigoroso sistema repressivo63.
A elite intelectual – constituída de juristas, magistrados, parlamentares, filósofos,
legisladores e técnicos de Direito – em meados do século XVIII, inicia um protesto com
críticas severas e contundentes ao sistema penal vigente, propondo moderação e
proporcionalidade na aplicação das penas64.
Não obstante isso, o homem começou a desenvolver uma consciência crítica
relacionada à fundamentação do direito de punir e à legalidade das penas.
As correntes iluministas no período humanitário do Direito Penal alcançaram seu
apogeu com a Revolução Francesa, cujos principais representantes foram Voltaire,
Montesquieu e Rousseau. Movimento que pregou a reforma das leis, da administração da
justiça penal, buscando a reforma do sistema punitivo65.
Nota-se que este período foi marcado pela atuação de pensadores que contestavam as
idéias absolutistas. Os escritos dos pensadores da época foram relevantes para o humanismo,
visto que constituíram o seu alicerce.
Outrossim, consolida-se uma corrente de pensamento contrário à crueldade e aos
absurdos que se cometiam em nome do direito penal absolutista. É neste momento que o
homem moderno toma consciência crítica do problema penal, tratando-o como um problema
filosófico, político e jurídico66.
Os reformadores não queriam somente abrandar as penas, fazendo com que
desaparecessem os castigos degradantes, mas atacavam também as injustiças arraigadas à
obscuridade da lei67.
Uma das obras mais conhecidas deste período histórico foi Dei dellitti e delle pene,
escrito por Cesare Bonesana, o Marquês de Beccaria, publicado no ano de 1764. Beccaria
63 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 38 [grafia conforme original]. 64 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 42. 65 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 38. 66 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 42. 67 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 36.
28
reivindicou que o direito penal fosse correto, exigindo-se leis precisas e claras, dispensando
desta maneira a interpretação arbitrária por parte dos juízes68.
A propósito leciona Beccaria:
Entre as penalidades e no modo de aplicá-las proporcionalmente aos delitos, é necessário, portanto, escolher os meios que devem provocar no espírito público a impressão mais eficaz e mais durável e, igualmente, menos cruel no corpo do culpado69.
Oliveira faz interessante relato a respeito:
[...] o novo Direito deveria deslocar-se da vingança suprema do soberano e estender-se à defesa da sociedade, abandonar seu caráter retributivo e caracterizar-se pela intimidação, atenuação da punição, codificação nítida dos crimes e sanções e formar um consenso a respeito da necessidade da prevenção do delito, pois o passado não retorna, mas o futuro será certo e, é para ele que o castigo deve ter função exemplar70.
Esse caráter humanizador permitiu a visão da pena como instrumento de
ressocialização do condenado, inserindo a ideia na sociedade de que educar o delinquente é
mais fácil do que puni-lo, visando assim organizar o sistema repressivo71.
Por fim, após a análise das vinganças defensivas e do período humanitário, torna-se
necessário adentrar no aspecto físico do cumprimento das penas, por tal motivo o próximo
item abordará os sistemas penitenciários e seus deslocamentos históricos.
2.2 ORIGEM DOS SISTEMAS PENITENCIÁRIOS
Com os deslocamentos históricos na aplicação das penas surge a necessidade de
organizar o seu cumprimento, assim a prisão deixa de ser um depósito de seres humanos e
passa a ser um aparelho, aplicado como instrumento de segurança, com o objetivo de punir,
res(socializar) e re(educar) o condenado72.
68 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 143. 69 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martin Claret, 2002, p. 49. 70 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 45. 71 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 24. 72 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 25.
29
Com a nova modalidade punitiva advinda da Revolução Francesa tornou-se necessária
a construção de sistemas penitenciários a fim de efetivamente realizar o cumprimento das
reprimendas impostas pelo Estado.
Estes estabelecimentos não são apenas um antecedente importante dos primeiros
sistemas penitenciários, como também marcam o nascimento da pena privativa de liberdade,
superando a utilização da prisão como simples meio de custódia73.
Não obstante isso, no início do século XIX, a pena passou a ter uma função social e a
procura pelos direitos humanos fez com que as penitenciárias servissem para a recuperação
dos condenados.
Assim sendo, acompanhando o seu deslocamento histórico, os próximos itens passarão
a abordar os sistemas penitenciários, quais sejam: panóptico, pensilvânico ou celular,
auburniano e progressivo.
2.2.1 O sistema panóptico
O sistema Panóptico era um tipo de prisão celular, de forma radial, no qual uma
pessoa poderia avistar todos os ângulos dos prisioneiros, sem que estes soubessem que
estavam sendo vigiados74.
Este sistema surgiu no século XIX com Jeremy Bentham, caracterizado pela forma
radial, possuía uma torre no centro e um só vigilante, sendo que pelo efeito central da referida
torre poderia ser visualizado todos os movimentos no interior das celas. O aludido sistema
caracterizava-se por ser menos cruel para a época75.
Oportunos são os ensinamentos de Bentham:
Antes de ver o plano, tenha, em palavras, uma idéia geral dele. O edifício é circular. Os apartamentos dos prisioneiros ocupam a circunferência. Você pode chamá-los, se quiser, de celas. Essas celas são separadas entre si e os prisioneiros, dessa forma, impedidos de qualquer comunicação entre eles, por partições, na forma de raios que saem da circunferência em direção ao centro, estendendo-se por tantos pés quantos forem necessários para se obter uma cela maior. O apartamento do inspetor ocupa o centro; você pode
73 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p.125. 74 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 53. 75 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 165.
30
chamá-lo de alojamento do inspetor. Será conveniente, na maioria dos casos, se não em todos, ter-se-á uma área ou um espaço vazio em toda volta, entre esse centro e essa circunferência. Você pode chamá-lo de, se quiser, de área intermediária ou anular. Cerca do equivalente da largura de uma passagem que vai do exterior do edifício ao alojamento76.
No sistema panóptico a visibilidade funcionava como uma armadilha, conforme se
extrai da descrição de Foucault:
O Panóptico de Bentham é a figura arquitetural dessa composição. O princípio é conhecido: na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre; esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra, que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar. Pelo efeito de contraluz, pode-se perceber da torre, recortando-se exatamente sobre a claridade, as pequenas silhuetas cativas nas celas da periferia. Tantas jaulas, tantos pequenos teatros, em que cada ator está sozinho, perfeitamente individualizado e constantemente visível. O dispositivo panóptico organiza unidades especiais que permitem ver sem parar e reconhecer imediatamente. Em suma, o princípio da masmorra é invertido; ou antes, de suas três funções – trancar, privar de luz e esconder – só se conserva a primeira e suprimem-se as outras duas. A plena luz e o olhar de um vigia captam melhor que a sombra, que finalmente protegia. A visibilidade é uma armadilha77.
Desta forma, as autoridades passaram a acreditar que as pessoas se tornariam virtuosas
somente pelo simples fato de serem observadas. Característica que é peculiar do aludido
sistema. Conforme leciona Oliveira:
O panótico78 não significava somente uma nova arquitetura de um edifício, de celas individuais, voltadas para o centro do pavilhão, janelas com grades na parede externa, com uma torre de supervisão no centro, da qual o guarda tinha fácil visão de todo o seu interior. Mas, pretendia guardar os prisioneiros com maior segurança e economia, sob o efeito de um reforma moral, de boa conduta e de educação79.
Destaca-se que o modelo panóptico não se baseava apenas na arquitetura carcerária,
Bentham sustentava que o recolhimento ideal deveria basear-se no oferecimento de trabalho
aos detentos. 76 BENTHAM, Jeremy. O panóptico. Belo Horizonte: Autêntica, 2000, p. 18 [grafia conforme original]. 77 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão, p.165-166. 78 A autora utiliza a grafia “panótico”, todavia se faz necessário registrar que a grafia correta desta palavra é “panóptico”. 79 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 53-54.
31
Nesse contexto, assevera Bentham:
Para que ele possa examiná-los melhor, eu os coloco em quatro categorias. Na primeira, coloco aqueles que já possuem algum ofício capaz de ser exercido com vantagem na prisão; na segunda, aqueles treinados em ofícios que, embora não sejam capazes em si mesmos de serem exercidos dentro de um espaço tão limitado, tornam mais fácil, contudo, pela similaridade de sua operação, a aprendizagem de ofícios que podem aí ser exercidos; na terceira categoria, eu colocaria aqueles que foram de fato treinados em algum ofício, mas em ramos que não cabem nos que acabei de mencionar, tais como, por exemplo, carregadores em grela, transportadores de carvão, jardineiros e agricultores. Na última, eu colocaria homens regularmente treinados na profissão de roubo e outros que nunca foram treinados em qualquer tipo de ocupação80.
O sistema em análise apresentava o poder como elemento centralizador, que assim
enfatiza Foucault: “Daí o efeito mais importante do Panóptico: induzir no detento um estado
consciente de visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder”81.
Com fundamento nesse sistema, surgem três outros importantes sistemas prisionais no
cenário do direito penitenciário, definindo assim, a forma de execução da pena, quais sejam:
sistema pensilvânico ou celular, auburniano e progressivo, próximos contextos de análise.
2.2.2 O sistema pensilvânico ou celular
O sistema pensilvânico foi caracterizado como o mais rigoroso dos sistemas
penitenciários, aplicado inicialmente na Pensilvânia, Filadélfia - Estados Unidos, propiciava a
exibição do prisioneiro a estranhos como impressionante exemplo que contribuía para afastá-
los do mau caminho82.
Diante de tal panorama, ensina Kloch:
O Sistema Pensilvânico, também conhecido como prisão celular, teve sua origem no ano de 1681, período em que foi instituída na Pensilvânia, Filadélfia, como a prisão revolucionária para a época. Este sistema prisional norte-americano ganhou destaque e reconhecimento, quando foi construído o complexo prisional conhecido como Walnut Street Jail, em 1776. Por isso,
80 BENTHAM, Jeremy. O panóptico, p. 35. 81 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão, p.166. 82 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 55.
32
afirma-se que esta foi a primeira prisão a implantar um sistema prisional reconhecido como humanitário83.
Este sistema, no entendimento de Oliveira, “[...] impunha o isolamento absoluto e
constante, sem trabalho ou visita, devendo ser estimulado unicamente pela leitura da bíblia”84.
No mesmo sentido, enfatiza Bitencourt:
As características essenciais desta forma de purgar a pena fundamentam-se no isolamento celular dos intervalos, a obrigação estrita do silêncio, a meditação e a oração. Este sistema de vigilância reduzia drasticamente os gastos com vigilância, e a segregação individual impedia a possibilidade de introduzir uma organização do tipo industrial nas prisões85.
Todavia, a maneira com que se buscava disciplinar os delinquentes não era singular,
conforme os ensinamentos de Bitencourt:
Não se aplicou, contudo, o sistema celular completo; impõe-se o isolamento em celas individuais somente aos mais perigosos, os outros foram mantidos em celas comuns; a estes, por sua vez, era permitido trabalhar conjuntamente durante o dia. Aplicou-se a rigorosa lei do silêncio86.
Com a utilização deste método, buscava-se o remorso, o arrependimento, a meditação,
a busca da paz interior, através dos incentivos a leitura da bíblia, destinando-se ao controle
psicológico do encarcerado, com o intuito de fazer com que o mesmo não enlouquecesse87.
Por outro lado, conforme enfatiza Kloch:
Posteriormente, o sistema prisional da Pensilvânia previa celas individuais somente durante a noite, pois o trabalho e as refeições eram comunitários. Mas o silêncio ainda era aplicado como regra fundamental. Neste sistema os apenados somente poderiam falar com os carcereiros, quando autorizados88.
83 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 27. 84 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 55. 85 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: parte geral. 5. ed. rev. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 126-127. 86 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 126. 87 CARDOSO, Franciele Silva. Penas e medidas alternativas: análise da efetividade de sua aplicação. São Paulo: Método, 2004, p. 30. 88 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 28.
33
Ainda conforme Oliveira: “o sistema Pensilvânico foi muito criticado, porque, além de
ser extremamente severo, impedia a ressocialização do condenado. Contra ele insurgiram
Ferri e Roeder, ponderando pela necessidade de vigorar um regime mais humano e dentro dos
limites e objetivos da pena”89.
Segundo Kloch, este sistema, na prática, não alcançou o objetivo almejado, ou seja, o
isolamento apenas contribuía para que os detentos atingissem a loucura, bem como tentassem
o suicídio. Além de demostrar, poucos anos após sua implantação, sérios problemas no
tocante a ordem administrativa, visto que além das contra-indicações provocadas pelo
isolamento dos apenados, houve um excesso de egressos, prejudicando a aplicação da pena
individualmente90.
Por fim, o sistema pensilvânico ou celular caracterizou-se por apresentar um alto
índice de suicídios, visto que sua estrutura possui um aspecto desumano, o que acarretava tão-
só a desestruturação psicológica dos condenados, motivo pelo qual passou a existir um novo
modelo de sistema penitenciário, o sistema auburniano.
2.2.3 O sistema auburniano
O sistema auburniano se originou com base no sistema pensilvânico, mas ostentou um
regime de comunidade durante o dia e no período noturno manteve o isolamento. Outrossim,
adotou além do trabalho comum, a regra do silencio absoluto. Para Kloch este sistema
procurou aperfeiçoar a forma de aplicação da pena, com o intuito de aproveitar o trabalho do
apenado, visto que ao mesmo tempo em que laborava era penitenciado91.
Segundo os ensinamentos de Bitencourt “uma das razões que levaram ao surgimento
do sistema auburniano foi a necessidade e o desejo de superar as limitações e os defeitos do
regime celular”92.
89 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 57. 90 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 28. 91 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 29. 92 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: parte geral, p.127.
34
Conforme delineado acima, enfatiza Kloch:
O sistema prisional Auburniano foi instituído na cidade de Auburn, em Nova York, nos Estados Unidos da América, entre 1816 a 1840, com o intuito de resolver o problema enfrentado na prisão celular, pois já não havia espaço para impor o isolamento, além do resultado não ser o desejado pelas organizações internacionais dos direitos do homem. Neste sistema reinstalou-se a disciplina, impedia-se a fuga, buscava-se a reabilitação do delinqüente. Para isso, os prisioneiros eram isolados durante a noite, dormiam em celas separadas e trabalhavam durante o dia em conjunto com os demais prisioneiros93.
O objetivo deste sistema, além da mão-de-obra carcerária, visto que os detentos
laboravam, era evitar a prática de suicídio. Assim sendo, a grande inovação do aludido
sistema foi à introdução das oficinas, na qual os detentos se submetiam a rigorosas jornadas
de trabalho94.
Por outro lado, destaca Oliveira, “O Sistema de Auburn, – silent system – adota, além
do trabalho em comum, a regra do silêncio absoluto. Os detentos não podiam falar entre si,
somente com os guardas, com licença prévia e em voz alta”95.
Muakad relata as características da primeira unidade. Nas seguintes palavras:
Começou a funcionar em uma ala de 80 celas da penitenciária de Auburn, dirigida por Elam Lynds, mais tarde diretor da penitenciária Sing-Sing, homem inteligente, mas muito rígido, que considerava os presos psicologicamente defeituosos, chamando-os de “selvagens, covardes e incorrigíveis”96.
Dessa forma, aspectos negativos também foram encontrados nesse sistema, isso
porque se aplicava o rigoroso regime disciplinar, segundo o qual a nova instituição
necessitava de regras a fim de organizar a vida coletiva. Para Bitencourt:
Tradicionalmente se criticou, no sistema auburniano, a aplicação de castigos cruéis e excessivos. Esses castigos refletem a exacerbação do desejo de impor um controle estrito, uma obediência irreflexiva. No entanto,
93 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 29 [grafia conforme original]. 94 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: parte geral, p.128. 95 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: parte geral, p.129. 96 MUAKAD, Irene batista. Pena privativa de liberdade. São Paulo: Atlas, 1996, p. 45.
35
consideravam justificável esse castigo porque acreditava que propiciara a recuperação do delinqüente97.
Neste diapasão expõe Kloch: “observa-se que tanto o Sistema Filadélfico, como o
Sistema Auburniano, baseiam-se numa rígida disciplina e na submissão completa do ser
humano, quando da execução da pena”98.
Ademais, nota-se claramente que os sistemas penitenciários pensilvânico e auburniano
não permitiam qualquer progressão no cumprimento da pena, mantendo como foco o
pensamento e a análise do detento, fundando-se basicamente na reflexão por parte do
mesmo99.
2.2.4 O sistema progressivo
A ideia de um sistema penitenciário progressivo surgiu no final do século XIX,
contudo só foi utilizado com maior frequência depois da eclosão da Primeira Guerra
Mundial100.
Segundo os ensinamentos de Kloch o sistema foi utilizado “somente no século XIX,
quando surgiram as penas privativas de liberdade, que, por si só, impunham modificações
drásticas nos sistemas prisionais para comportar a execução da pena”101.
O que desencadeou o surgimento deste sistema foi a necessidade da adaptação da
reprimenda ao conceito de individualidade, ou seja, o objeto passou a ser a possibilidade de
recuperação individual102.
O sistema progressivo apresentava características distintas dos demais, visto que nele
o detento divide em períodos sua condenação, sendo que, em cada um deles, o preso passaria
97 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: parte geral, p. 129 [grafia conforme original]. 98 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 30. 99 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: parte geral, p.130. 100 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 31. 101 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 31. 102 CANCELLI, Elizabeth. Pensando a Prisão. Revista de estudos criminais. n. 8. Porto Alegre: Notadez, 2003, p. 117.
36
– conforme seu comportamento no interior do estabelecimento – a obter benefícios e
privilégios no cumprimento de sua reprimenda103.
Neste sentido enfatiza Bitencourt:
A essência deste regime consiste em distribuir o tempo de duração da condenação em períodos, ampliando-se em cada um os privilégios que o recluso pode desfrutar de acordo com sua boa conduta e o aproveitamento demonstrado do tratamento reformador. Outro aspecto importante é o fato de possibilitar ao recluso reincorporar-se á sociedade antes do término da condenação104.
O mencionado sistema baseava-se em dois princípios: estimular o recluso a
comportar-se corretamente, visto que para a obtenção de benefícios é necessário um bom
comportamento carcerário; e a reforma moral do preso, buscando o retorno a vida em
sociedade. Para alcançar tais objetivos o sistema adotava o recolhimento celular e o
trabalho105.
Deste modo, expõe Kloch:
O sistema progressivo foi constituído em etapas. Era composto pelas etapas de progressão de regime, iniciava pela: reclusão celular diurna e noturna; reclusão celular noturna e trabalho diurno, preservando-se a incomunicabilidade; período, denominado como “intermediário”, no qual o preso trabalhava no exterior do estabelecimento prisional e; liberdade condicional, onde o apenado era libertado sob determinadas condições até atingir a liberdade definitivamente106.
Foi desencadeando um avanço considerável, visto que diferentemente do que se
buscava nos sistemas pensilvânivo e filadélfico, o sistema progressivo tentou priorizar as
necessidades dos reclusos, diminuindo consideravelmente a forma rigorosa no cumprimento
das penas privativas de liberdade107.
103 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: parte geral, p. 131. 104 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: parte geral, p. 131. 105 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 83. 106 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 32. 107 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 33.
37
Neste sentido sinaliza Bitencourt:
Os sistemas progressivos, em seus diversos matizes, procuram corresponder ao inato desejo de liberdade dos reclusos, estimulando-lhes a emulação que haverá de conduzi-los à liberdade. Exatamente aí está a grande diferença com os sistemas pensilvânico e auburniano, que somente pretendiam disciplinar o regime interior das prisões e eventual correção dos reclusos no transcurso de tempo prefixado na sentença108.
Assim, torna-se necessário abordar os diferentes sistemas progressivos, sendo eles: o
sistema de montesinos, o sistema inglês e o irlandês.
2.2.4.1 O sistema montesinos
O sistema montesinos foi idealizado por Manoel Montesinos e Mollina, no qual se
aplicava o tratamento penal humanitário, sendo que este concretizou suas ideias a partir de
1834, quando foi nomeado diretor do presídio de San Agustín, em Valência, onde mandou
escrever no frontispício daquela prisão: “Aqui penetra el hombre, el delito queda a la
puerta”109.
Segundo ensina Oliveira:
O sistema espanhol de Montesinos enfatiza o sentido regenerador da pena. Criou uma forma de trabalho remunerado para o preso não ser explorado e suprimiu os castigos corporais. Sua funcionalidade era comparada a de um estabelecimento de segurança mínima, em que, surpreendentemente, eram baixos os números de evasões110.
Neste norte, expõe Bitencourt:
Em 1835, o Coronel Manuel Montesinos e Mollina foi nomeado “governador” do presídio de Valência. Possuía qualidades pessoais adequadas para alcançar uma eficiente e humanitária direção de um centro penal. Entre suas qualidades mais marcantes encontram-se sua poderosa força de vontade e sua capacidade para influir eficazmente no espírito dos reclusos111.
Um dos aspectos mais importantes da obra prática de Montesinos refere-se à seriedade
que deu as afinidades com os detentos, visto que, fundada em sentimento de confiança e 108 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. p. 132. 109 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 59. 110 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 59. 111 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 133.
38
estímulo, procurou-se construir uma definida segurança. A ação penitenciária de Montesinos
projeta suas raízes em um sentimento, evidenciando assim atitudes abertas, que desta forma
estimulavam a reforma moral do recluso112.
Portanto, o sistema de montesinos propiciou uma estabilização entre a autoridade e a
ressocialização, delineando a correção do recluso.
2.2.4.2 O sistema progressivo inglês
O sistema progressivo inglês ou mark system foi desenvolvido pelo capitão Alexander
Maconochie, no ano de 1840, na Ilha de Norfolk, na Austrália, conforme os ensinamentos de
Oliveira, como seguem:
Alexander Maconochie introduziu uma grande inovação no sistema penitenciário, conhecido por “Mark System”, ou seja, sistema de vales. Segundo esse sistema, a duração da pena não era determinada exclusivamente pela sentença condenatória, mas dependia da boa conduta do preso, de seu trabalho produzido e da gravidade do delito. O condenado recebia marcas ou vales quando seu comportamento era positivo e os perdia quando não se comportava bem113.
Assim sendo, é possível alegar que a constância da pena baseava-se em três requisitos:
conjugação entre a gravidade do delito, o aproveitamento do trabalho e o comportamento do
apenado.
Extrai-se, ainda, dos ensinamentos de Oliveira:
Esse sistema, que nasceu na Austrália, foi aplicado nas prisões da Inglaterra, por isso ficou conhecido como sistema progressivo inglês. O tempo de duração da pena era cumprido em três períodos: a) período de prova, com isolamento celular completo, do tipo pensilvânico; b) período com isolamento celular noturno e trabalho comum durante o dia, com rigoroso silêncio, do tipo auburniano; c) período da comunidade, com benefício da liberdade condicional114.
O sistema em análise consistia em medir a duração da reprimenda através do trabalho
e boa conduta do apenado. Contudo, apesar do aludido sistema ser adequado e ter obtido
112 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas alternativas, p. 89-90. 113 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 60. 114 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 59-60.
39
grande difusão por toda a Europa, foi posteriormente substituído pelo sistema irlandês, que
será objeto de análise do próximo item115.
2.2.4.3 O sistema progressivo irlandês
O sistema progressivo irlandês apresentava a mesma ideologia e os mesmos
fundamentos do sistema inglês, no entanto possuía uma única diferença, a inserção de uma
fase intermediária, entre o período em que o apenado laborava e o momento em que se
beneficiava com a liberdade condicional116.
Segundo Oliveira:
Em 1853, o sistema de vales foi adotado na Irlanda, por Walter Crofton, que acrescentou-lhe mais um novo período, o período de preparação para as prisões intermediárias, com suave regime de vigilância, sem uniforme, com permissão para conversar, sair até uma certa distância, trabalho externo no campo, objetivando o preparo do condenado para o retorno à vida, na sociedade117.
Desta forma, o preso no período intermediário laborava ao ar livre, em prisões
especiais, preferencialmente agrícolas. Outra característica deste sistema reside no fato do
apenado não usar uniforme e não mais sofrer castigos corporais. Assim sendo, os mesmos
podiam se comunicar e ainda dispunham de parte da remuneração advinda de seu trabalho118.
Segundo Bitencourt o regime irlandês era composto de quatro fases: a reclusão celular
diurna e noturna; a reclusão celular noturna e o trabalho diurno em comum; o período
intermediário – assim definido por Crofton – no qual os presos trabalhavam ao ar livre, com o
intuito de se familiarizar com a sociedade e, por fim, a liberdade condicional, com as mesmas
características do sistema inglês119.
Assevera Oliveira que:
O sistema progressivo irlandês foi adotado no Código Penal brasileiro, excluindo o uso de marcas ou vales. No primeiro período, o prisioneiro fica
115 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas alternativas, p. 84. 116 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res (socialização), p. 32. 117 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 61. 118 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 61. 119 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: parte geral, p.134-135.
40
sujeito à observação, durante o máximo de três meses; no segundo período, é submetido ao trabalho comum, mantido o isolamento noturno; no terceiro período, o preso é encaminhado para um estabelecimento semi-aberto ou colônia agrícola e, no quarto período, recebe a concessão da liberdade condicional120.
Devido às características que possuía o aludido sistema, alcançou grande repercussão e
foi adotado em inúmeros países, visto que além de fazer com que o apenado ostentasse um
bom comportamento no interior do estabelecimento prisional, proporcionava o trabalho e a
ressocialização121.
Outrossim, expostos os sistemas penitenciários de cumprimento das penas, passar-se-á
a analisar as espécies de penas presentes no ordenamento jurídico brasileiro, partindo da
premissa que o presente estudo encontra-se envolto às penas privativas de liberdade.
2.3 ESPÉCIES DE PENAS
O Direito penal brasileiro prevê três espécies de penas: privativa de liberdade,
restritiva de direito e multa. Como delineado, dispõe o artigo 32 do Código Penal:
Art. 32. As penas são: I – privativa de liberdade; II – restritivas de direitos; III – de multa122.
Por outro lado a CRFB/88 enumerou as seguintes penas: privação ou restrição da
liberdade; perda de bens; multa; prestação social alternativa e suspensão ou interdição de
direitos.
Igualmente, o artigo 5º, XLVII da CRFB/88 arrazoa como garantia constitucional
irrevogável (cláusula pétrea) que não haverá penas de morte (salvo em caso de guerra
declarada), de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis.
Por oportuno, torna-se necessário explanar sobre cada uma das penas previstas no
ordenamento penal brasileiro, porquanto se encontra presente no contexto do presente estudo.
Todavia, far-se-á uma sucinta abordagem sobre as penas de multa e restritivas de direitos,
120 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 61 [grafia conforme original]. 121 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas, p. 88. 122 BRASIL. Código Penal (1940). Decreto-lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em 20 set. 2010.
41
visto que a presente pesquisa busca ponderar o cumprimento das penas privativas de
liberdade.
2.3.1 Penas restritivas de direitos
As penas restritivas de direitos são penas autônomas no ordenamento jurídico, sendo,
por conseguinte, inadmissível sua cumulação com a pena privativa de liberdade. São elas:
prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviços à comunidade ou a
entidades públicas, limitação de fim de semana e interdição temporária de direitos123.
Igualmente, a tendência do direito penal moderno é a eliminação da pena privativa de
liberdade de breve duração, por não atender satisfatoriamente à finalidade reeducativa da
pena, devido ao pernicioso convívio com criminosos mais perigosos. Dessa forma, a pena
restritiva de direitos foi um dos mecanismos criados para substituí-la. Aliás, é facilmente
explicável o incitamento da doutrina à disseminação dessa pena, isso porque tem por
fundamento primordial a ausência de periculosidade do condenado, revelando ainda uma
eficiente função reeducativa, além de reduzir a despesa econômica do Estado124.
Nessa linha de raciocínio é assente Almeida de que:
A ineficiência da pena privativa de liberdade, como meio de recuperação de criminosos, gerou o aparecimento de outras modalidades de punição penal visando a que o indivíduo possa ser castigado sem que precise necessariamente ter a sua liberdade totalmente restringida125.
As alternativas penais são elementos de que se ampara o legislador, visando prevenir
que ao autor de uma infração penal venha a ser aplicada medida ou pena privativa de
liberdade. As penas alternativas são de natureza criminal, pertencentes ao gênero das
alternativas penais126.
123 ESTEFAM, André. Direito penal 1: parte geral. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 182. 124 BARROS, Flavio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral. 5. ed. v. 1. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 468. 125 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p. 117. 126 DAMÁSIO DE JESUS, Evangelista. Direito penal: parte geral, p. 529.
42
Tece oportuna consideração Rosa:
Toda pena não deixa de ser, em última análise, uma restrição a direitos do condenado. Todo condenado, ao sofrer uma lesão em seu patrimônio jurídico, e, por conseguinte, é restringido em seus direitos. São chamadas, entretanto, “penas restritivas de direitos” aquelas que importam em incapacidades jurídicas parciais ou na imposição de deveres que, em última análise, significam “restrições” ao uso e gozo da ampla liberdade a que todos temos direito127.
Cabe ressaltar que, no entendimento de Bitencourt, a denominação penas “restritivas
de direitos” não foi a mais apropriada, pois, de todas as modalidades de sanções sob a citada
rubrica, somente uma refere-se especificamente à “restrição de direitos”. As outras –
prestação pecuniária e perda de bens e valores – são de natureza pecuniária; prestação de
serviços à comunidade e limitação de fim de semana referem-se mais especificamente à
restrição da liberdade do apenado128.
Ainda, no entendimento do autor:
Ao adotar as penas restritivas de direitos, as quais dependem em grande parte da autodisciplina e do senso de responsabilidade do sentenciado, era indispensável dotá-las de coercibilidade. E, para isso, nada melhor do que a previsão da possibilidade de convertê-las em pena privativa de liberdade [...]. A finalidade da conversão, em outras palavras, é garantir o êxito das penas alternativas – preventivamente – com a ameaça da pena privativa de liberdade e – repressivamente – com a efetiva conversão no caso concreto. Essa possibilidade de conversão não deixa de ser, a exemplo dos “regimes penais de cumprimento de pena”, uma forma de regressão, própria do sistema progressivo129.
A possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por uma restritiva de
direitos, porém, é limitada, sendo aplicada apenas aos casos previstos no artigo 44 do Código
Penal, que dispõe o seguinte:
Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II - o réu não for reincidente em crime doloso; III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do
127 ROSA, Antonio José Miguel Feu. Execução penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 329. 128 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 475. 129 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 512.
43
condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente130.
Explanado sobre as penas restritivas de direitos, torna-se necessário adentrar na pena
de multa, outro alicerce sustentado como instrumento de política criminal em busca do
abrandamento punitivo em relação a determinados delitos.
2.3.2 Pena de multa
Ao lado das penas restritivas de direitos, a multa encerra o leque de penas alternativas
do direito brasileiro. Possui, entretanto, um traço característico fundamental, pois se trata da
única pena alternativa que não admite conversão em pena privativa de liberdade131.
Extrai-se dos ensinamentos de Rosa que:
Sua origem é muito antiga, remontando aos tempos primitivos, quando os delinqüentes eram obrigados a pagar, a título de castigo, uma reparação pela sua falta, consistindo na entrega de cabeças de gado, ovelhas, pedras preciosas e outros valores à família da vítima ou ao Príncipe ou ao Chefe da cidade ou do Estado132.
A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na
sentença e computada em dias-multa. Deverá ser, de no mínimo, 10 (dez) e, no máximo, 360
(trezentos e sessenta) dias-multa, servindo de fator determinante para sua fixação as
circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, tal como ocorre com a pena-base133.
Na aplicação da pena de multa impõe-se ao condenado o pagamento ao fundo
penitenciário de quantia fixada pelo juiz na sentença condenatória. Dessa forma, o réu não é
retirado das suas ocupações, tampouco de seu convívio familiar.
Mesquita Junior faz interessante relato a respeito:
A pena pecuniária é a modalidade mais branda da pena. Depois vem a pena restritiva de direito e, ao final, a pena privativa de liberdade, como modalidade mais severa de sanção. A pena pecuniária é autônoma e substitutiva da pena privativa de liberdade, ou seja, pode ser aplicada
130 BRASIL. Código Penal (1940). Decreto-lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em 20 set. 2010. 131 ESTEFAM, André. Direito penal 1: parte geral, p. 208. 132 ROSA, Antonio José Miguel Feu. Execução penal, p. 379 [grafia conforme original]. 133 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p.141.
44
isoladamente quando prevista como única sanção aplicável ao crime. Também a pena privativa de liberdade que não seja superior a 6 meses poderá ser substituída pela multa134.
Almeida aduz que “ao aplicar a pena de multa, deve o juiz observar principalmente a
situação econômica do réu para evitar que a sua fixação seja insignificante perante o abastado,
ou, por outro lado, torne inviável o seu cumprimento pelo menos aquinhoado”135.
Este critério de dia-multa permite a individualização na aplicação deste tipo de pena,
já que o juiz tem a liberdade de levar em consideração o grau de culpabilidade do infrator e
sua capacidade patrimonial136.
Nesse sentido posiciona-se Barros:
O conceito de situação econômica é mais amplo que rendimentos, porquanto compreende também o patrimônio e o nível de vida do réu. À míngua de informações nos autos do processo, impõe-se a fixação do valor mínimo. Caso o réu empobreça no curso da ação penal, o magistrado levará em conta a situação econômica ao tempo da sentença, porque de nada adiantaria a fixação de um valor inexeqüível. Em contrapartida, se vier a enriquecer, entra em cena o princípio da anterioridade, prevalecendo a situação econômica ao tempo do crime137.
Marcão discorre com propriedade sobre as vantagens e desvantagens sobre a aludida
pena. Quanto aos fatores positivos, destaca-se, principalmente, a não retirada do condenado
de seu convívio familiar e sua permanência no trabalho, situação que evita o desajuste social e
não o corrompe, porquanto evita o contato deletério com a prisão. Por outro lado, dentre os
aspectos negativos, verifica-se que a pena de multa constitui-se em fonte de enriquecimento
do Estado à custa do crime, sendo raramente executada, visto que a grande maioria dos
condenados é pobre e insolvente. Ademais, a mesma apresenta um sentido aflitivo desigual,
por nada representar para quem tem muito economicamente e atingir demais quem tem pouco,
alcançando diretamente os familiares e dependentes do condenado138.
Portanto, inicialmente caso o condenado não efetuasse o pagamento da aludida pena, a
mesma seria convertida em pena privativa de liberdade. Entretanto, com advento de alteração
134 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p.310. 135 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p.143. 136 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p.143. 137 BARROS, Flavio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral, p. 485-486 [grafia conforme original]. 138 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 290.
45
legislativa, por meio da Lei 9.268/1996, referida conversão deixou de ser admitida, conforme
assinala Mesquita Junior:
A pena de multa podia ser convertida em pena privativa de liberdade, hipótese que já não mais subsiste no ordenamento jurídico pátrio, pois a Lei n.º 9.268/1996 alterou o Código Penal, preceituando que a pena de multa é considerada dívida de valor para com a Fazenda Pública, o que poderá ensejar a inscrição do nome do condenado no rol de devedores da Fazenda Nacional (dívida ativa)139.
Na mesma linha de raciocínio, Marcão observa que em sua redação antiga, permitia o
art. 51 do CP que em caso de não pagamento injustificado a multa fosse convertida em pena
privativa de liberdade na mesma proporção. Ocorre, entretanto, que a Lei n.º 9.268, de 1º de
abril de 1996, deu nova redação ao art. supracitado, revogando a possibilidade de tal
conversão. Desde então o que se vê é a falência da pena de multa, que perdeu todo e qualquer
caráter retributivo e preventivo140.
Em consequência disso, pelo fato de não raras às vezes a multa ser fixada no patamar
mínimo, seu valor é irrisório, acarretando um desinteresse da fazenda Pública em executar
aludida dívida, levando a prescrição do crédito tributário, que ocorre em 5 (cinco) anos,
conforme a regra da Lei 6.830/80.
Assim, preceitua o art. 173 do Código Tributário Nacional (CTN):
Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado; II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado141.
Dessa forma, verifica-se que, na prática, ou pelo valor irrisório da dívida ativa, ou pela
extinção do crédito tributário, em face da prescrição, a pena de multa tornou-se uma pena
simbólica, que, infelizmente, não é efetivamente cumprida.
139 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p.312. 140 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 299-300. 141 BRASIL. Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm>. Acesso em: 06. nov. 2010.
46
Assim sendo, elencadas as penas alternativas do ordenamento jurídico, passar-se-á a
abordar as penas privativas de liberdade e suas espécies, objeto do presente estudo.
2.3.3 Pena privativa de liberdade
No entendimento de Almeida, “a pena privativa de liberdade é aquela que restringe a
liberdade individual do indivíduo, mediante clausura, durante o período determinado no
provimento judicial”142.
Consoante reza Leal, “refletindo o pensamento político-jurídico contemporâneo, o CP
coloca a pena privativa de liberdade no centro do nosso sistema punitivo. É a sanção prevista
para todos os crimes e para a grande maioria das contravenções penais”143.
A propósito, são oportunas as palavras de Barros:
Pena privativa de liberdade é a que restringe o direito de ir e vir do condenado, infligindo-lhe um determinado tipo de prisão. Não é correto chamar as penas privativas de liberdade de penas corporais, porque esta denominação amolda-se melhor às penas de açoite ou flagelo, proibidas pelo ordenamento pátrio144.
O artigo 33 do Código Penal dispõe sobre o modo de cumprimento das penas
privativas de liberdade, veja-se:
Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. § 1º - Considera-se: a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média; b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar; c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado. § 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado; b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-
142 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p.111. 143 LEAL, João José. Direito penal geral, p. 397. 144 BARROS, Flavio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral, p. 445.
47
aberto; c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto. § 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código. § 4o O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais145.
Definem-se as penas privativas de liberdade como penas que consistem em retirar de
circulação aquele que vive a margem da lei, deixando-o sobre responsabilidade e tutela do
Estado através do sistema carcerário146.
Nessa linha de raciocínio assevera Greco:
A pena privativa de liberdade vem prevista no preceito secundário de cada tipo penal incriminador, servindo à sua individualização, que permitirá a aferição da proporcionalidade entre a sanção que é cominada em comparação com o bem jurídico por ele protegido147.
Nesse contexto, o condenado é retirado da sociedade em que vive, do convívio
familiar e recolhido em uma unidade penitenciária, na qual será constantemente vigiado e, por
conseguinte, terá sua vida imposta a novas regras.
No tocante ao tema, Falconi ensina que:
As penas privativas de liberdade atingem o destinatário quase como o atingiam as penas corporais em tempos idos. Não há um só doutrinador que, em que pesem os esforços desenvolvidos, tenha podido defendê-las com um mínimo de credibilidade. [...] Não é menos verdade que as penas privativas de liberdade chegaram como chegou o talião, com animus de minimizar os rigores de um tempo passado. Mas, ainda que assim seja não nos é permitido tolerar que as coisas sigam como estão: caóticas148.
Na percepção de Falconi, a pena privativa de liberdade fere diretamente a liberdade do
preso, afastando-o do convívio social por certo período e restringindo seus direitos por algum
tempo149.
145 BRASIL. Código Penal (1940). Decreto-lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em 20 set. 2010. 146 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p. 111. 147 GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009, p. 497. 148 FALCONI, Romeu. Sistema presidial: reinserção social? São Paulo: Ícone, 1998, p. 49. 149 FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, p. 253.
48
Teles assevera que não será possível jamais educar alguém, nem conscientizar quem
quer que seja da indigência e importância de respeitar os bens jurídicos alheios, por meio da
pena de prisão. Em outras palavras, é impossível ensinar alguém a viver em liberdade,
privando-o dela150.
Nesse sentido expõe Karam:
Para romper com essa monstruosa opção, para afastar a insensibilidade, é preciso, em primeiro lugar, tentar compreender o significado da privação da liberdade. É preciso conduzir nosso olhar, nossa imaginação, nossos sentimentos, para dentro dos muros das prisões, esforçando-nos por imaginar a infinita dor das pessoas que sofrem a pena, esforçando-nos para deixar de lado a indiferença, os preconceitos e as abstratas ideias que privilegiam a “ordem”, a “segurança”, a “defesa da sociedade”, ideias que, esquecendo-se da igualdade originária entre todos os indivíduos, dividem-se entre “cidadãos de bem” e “criminosos”, nefastas ideias que fazem acreditar na ilusão cruel de que para ter tranquilidade e segurança seria necessário colocar mais e mais pessoas atrás de grades e muros151.
As críticas que em todo os países se tem feito à pena privativa de liberdade baseiam-se
em fatos de crescente importância social, tais como o tipo de tratamento penal freqüentemente
inadequado e quase sempre pernicioso, a inutilidade dos métodos até agora empregados no
tratamento de delinquentes habituais e multireincidentes, os elevados custos de construção e
manutenção dos estabelecimentos penais, as consequências maléficas para os infratores
primários, ocasionais ou responsáveis por delitos de pequena significação, sujeitos, na
intimidade do cárcere, a crueldades, corrupção e perda da aptidão para o trabalho152.
Assim, abordada a pena privativa de liberdade, que consiste no recolhimento do
condenado em estabelecimento prisional, com as ressalvas de suas tradicionais carências,
analisar-se-á as três espécies de penas privativas de liberdade adotadas pelo ordenamento
jurídico brasileiro: prisão simples, detenção e reclusão.
150 TELES, Ney Moura. Direito penal, p. 37. 151 KARAM, Maria Lucia. A violenta, danosa e dolorosa realização do poder punitivo: considerações sobre a pena. In:MATTOS, Virgílio de. (Org.). Desconstrução das práticas jurídicas. Belo Horizonte: CRESS/CRP-M, 2010, p. 11-25. 152 KUEHNE, Maurício. Teoria e prática da aplicação da pena. Curitiba: Juruá, 2006, p. 23.
49
2.3.3.1 Prisão simples
Extrai-se dos ensinamentos de Mesquita Junior que “a pena privativa de liberdade
pode ser especificada em reclusão, detenção ou prisão simples. [...] a prisão simples é
aplicável ao crime anão da doutrina italiana, que é a contravenção penal”153.
Como já se adiantou, entre as penas privativas de liberdade existe a prisão simples,
aquela que ocorre na prática das contravenções penais. Assim, respectiva pena deve ser
cumprida sem rigor penitenciário, em estabelecimento especial ou seção especial de prisão
comum, em regime semiaberto ou aberto, conforme preceitua o art 6.º da Lei das
Contravenções Penais (Lei 3.688/41).
Já no entendimento de Silva:
A prisão simples é destinada ao cumprimento de pena em infrações contravencionais, e deve ser cumprida, unicamente, em regime aberto, especialmente porque, no caso do seu cumprimento em regime fechado ou semi-aberto, haveria desproporção face à modalidade de conduta infracional praticada pelo agente, que é, dentre todas, a que menor gravidade possui154.
A referida pena é exclusiva das contravenções penais e apresenta as seguintes
características: é cumprida sem rigor penitenciário; só admite seu cumprimento nos regimes
aberto e semiaberto; o condenado deve ficar separado daqueles que cumprem pena de
reclusão ou detenção; o trabalho é facultativo para penas de até 15 (quinze) dias155.
No entanto, extrai-se dos ensinamentos de Almeida:
As políticas criminal e penitenciária implementadas em nosso país – excelente em sua pauta legislativa, mas ineficaz em suas ações – não tem permitido que se cumpra a finalidade prevista na Lei de Contravenções Penais, pois nem sempre o Estado dispõe de estabelecimento apropriado para abrigar pessoas condenadas exclusivamente à pena de prisão simples, levando, com isso, a que se recolha o contraventor, em igualdade de condições, com os apenados por crimes comuns, no mesmo presídio156.
153 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p.226. 154 SILVA, Jorge Vicente. Manual da sentença penal condenatória. Curitiba: Juruá, 2003, p 368. 155 ESTEFAM, André. Direito penal 1: parte geral, p. 182. 156 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p.111-112.
50
Feitas essas breves considerações acerca da prisão simples, far-se-á no próximo item
da pesquisa uma análise concisa da detenção, outra espécie de pena privativa de liberdade,
elucidando suas peculiaridades e estabelecendo a distinção da reclusão.
2.3.3.2 Detenção
A detenção é uma pena destinada ao regime semiaberto ou aberto, salvo se houver
carecimento de transferência para o regime mais rigoroso, por cumprimento insatisfatório
durante a pena privativa de liberdade, o que desvirtuará ao regime fechado através da
regressão157.
Extrai-se dos ensinamentos de Dotti:
As modalidades da pena privativa de liberdade são a reclusão e a detenção. Tal dicotomia assenta uma base ontológica posto traduzir situações distintas quanto à gravidade do delito e às suas circunstâncias de forma a possibilitar um tratamento diferenciador não somente em atenção ao dogma do fato como também à luz do dogma do autor158.
Destarte, a diferença entre reclusão e detenção consiste nos regimes de cumprimento
da pena privativa de liberdade, visto que enquanto o regime de reclusão possibilita o
cumprimento da pena nos três regimes – fechado, semiaberto e aberto –, na detenção a pena
será cumprida nos dois regimes menos severos.
Assim sendo, a detenção caracteriza-se por ser uma pena mais leve e ter seu regime de
cumprimento iniciado em regime semiaberto ou aberto, salvo necessidade de transferência a
regime fechado. Pode-se verificar, aqui, que existe diferença substancial entre a reclusão e
detenção159.
Todavia, extrai-se dos ensinamentos de Leal:
A nosso ver, nenhum desses casos justifica a divisão legal da pena privativa de liberdade, adotada por nosso CP. Com a Reforma Penal de 1984, o legislador perdeu a oportunidade de proceder à unificação, numa só espécie, da pena privativa de liberdade, que poderia ser denominada de detenção ou simplesmente prisão, conforme entende a doutrina contemporânea e vem
157 LEAL, João José. Direito penal geral, p. 397. 158 DOTTI, René Ariel. Bases alternativas para o sistema de penas. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 355. 159 OLIVEIRA, Álvaro Borges de. Dosimetria da pena: teoria e prática. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010, p. 30.
51
sendo adotado por legislações recentes. Com isto, o sistema estaria sendo simplificado, eliminando-se uma distinção apenas formal e completamente inútil160.
Explanado sobre a pena de detenção, bem como sua distinção das demais, abordar-se-á
no item seguinte a pena de reclusão.
2.3.3.3 Reclusão
A pena de reclusão, conforme preceitua o artigo 33, caput, primeira parte, do Código
Penal, pode ser cumprida em regime fechado, semiaberto e aberto.
Sustenta Teles que:
A única diferença que se pode afirmar entre as penas de reclusão e detenção é que a primeira deve ser mais grave, mais severa, executada de modo mais rígido, pelo menos a princípio. Nada mais que isso. Na prática do sistema punitivo brasileiro, todavia, não há diferenças entre as duas penas, uma vez que tanto as penas reclusivas quanto as detentivas são, em sua grande maioria, executadas nos mesmos estabelecimentos e sob as mesmas condições e regras161.
No mesmo sentido, Costa Junior leciona que a única diferença entre a reclusão e a
detenção dá-se no regime de cumprimento da pena:
[...] em matéria de execução de pena, procurou-se distinguir a reclusão da detenção: a reclusão principiará por ser cumprida em regime fechado, enquanto a detenção, como regra, iniciará sua execução com o regime semi-aberto. Como se vê, a diversificação entre ambas consistirá em não haver na detenção o regime fechado. Como, porém, a lei admite a possibilidade de o detento, se necessário, vir a ser transferido para o regime fechado, nem mesmo essa diferença subsiste entre as espécies162.
Consoante reza Greco, o Código Penal prevê duas penas privativas de liberdade –
reclusão e detenção – sobre as quais incidem uma série de implicações de direito penal e de
processo penal, tais como [...] a possibilidade de concessão de fiança pela autoridade
policial163.
160 LEAL, João José. Direito penal geral, p. 398. 161 TELES, Ney Moura. Direito penal: parte geral. São Paulo: Atlas, 2004, v. 1, p. 338 162 COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito penal objetivo: comentários atualizados, p. 85. 163 GRECO, Rogério. Curso de direito penal, p. 497.
52
Extrai-se dos ensinamentos de Bitencourt:
As diferenças existem – e são muitas –, ao contrário do que se afirma, mas localizam-se fundamentalmente nas conseqüências, diretas ou indiretas, de uma e outras espécies de pena privativa de liberdade. Eliminaram-se, como isolamento inicial na reclusão; direito de escolher o trabalho obrigatório, na detenção; separação física entre reclusos e detentos; impossibilidade de sursis em crimes punidos com reclusão etc. Contudo, as conseqüências que decorrem de umas e outras espécies de sanção privativa de liberdade são inconfundíveis164.
Destarte, de acordo com o artigo 323, I, do Código de Processo Penal, não será
concedida fiança para os crimes punidos com reclusão em que a pena mínima cominada for
superior a 2 (dois) anos.
Neste ponto, cabíveis os ensinamentos de Bitencourt:
Em realidade, no conjunto, permanecem profundas diferenças entre reclusão e detenção. A começar pelo fato de que somente os chamados crimes mais graves são puníveis com reclusão, reservando-se a detenção para os delitos de menor gravidade. Como conseqüência natural do anteriormente afirmado, a pena de reclusão pode iniciar o seu cumprimento em regime fechado, o mais rigoroso de nosso sistema penal, algo que jamais poderá ocorrer com a pena de detenção165.
De todo modo, já elucidado sobre as penas privativas de liberdade, passar-se-á no
próximo capítulo a esclarecer sobre a execução das acenadas penas, visto ser o foco da
presente pesquisa.
164 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 446 [grafia conforme original]. 165 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 446.
3 DA EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE
No capítulo anterior fez-se uma abordagem histórica sobre a pena e os sistemas
punitivos adotados pela humanidade no transcorrer da história. Dessa forma, torna-se
necessário, neste momento, abordar a execução das penas privativas de liberdade para, enfim,
adentrar especificamente em seu cumprimento no Estado de Santa Catarina, foco da presente
pesquisa.
Assim, almeja-se verificar a execução das penas privativas no Estado, para averiguar
se esta alcança o objetivo almejado pela legislação vigente. Destarte, esta análise será feita
com o intuito de levantar as afrontas ao direito da personalidade e integridade dos apenados
segregados, cumulados com o crescente índice de criminalidade e reincidência.
Para tanto, torna-se imprescindível acompanhar os ditames processuais que contornam
o cumprimento das penas privativas, buscando assim concatenar a teoria e a prática
processual.
3.1 PROCESSO DE EXECUÇÃO CRIMINAL
Antes de adentrar nos aspectos peculiares do processo de execução criminal julga-se
necessário abordar o conceito de processo.
Nesse sentido, segundo Capez, “o processo é o meio pelo qual o Estado procede à
composição da lide, aplicando o direito ao caso concreto e dirimindo os conflitos de interesse.
A jurisdição é, portanto, a função; o processo, o instrumento de sua atuação”166.
Assevera Bonfim, que o processo judicial é o meio, determinado por normas jurídicas,
através do qual o Estado exercerá seu poder de jurisdição. Sendo que uma vez constituído, o
processo passa a ser o único meio pelo qual determinado aspecto do poder estatal será
desempenhado167.
166 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 13. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 13. 167 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 4.
54
Todavia, a ideia de processo confunde-se com procedimento, conforme ensina
Tourinho Filho:
Ao conjunto de atos processuais que se sucedem, de forma coordenada, com a finalidade de resolver, jurisdicionalmente, o litígio, denomina-se processo. Mas, sob esse aspecto, isto é, coordenação e ordem dos atos processuais, fala-se, tecnicamente, em procedimento168.
Nesse sentido, assegura Nucci:
Enquanto o processo é uma seqüência de atos, vinculados entre si, tendentes a alcançar a finalidade de propiciar ao juiz a aplicação da lei ao caso concreto, o procedimento é o modo pelo qual se desenvolve o processo, no seu aspecto interno169.
Desta forma, o processo é o conjunto de atos que se vinculam, de forma coordenada,
predispostos a propiciar a finalidade, ou seja, a aplicação da lei ao caso concreto170.
Ademais, extrai-se dos ensinamentos de Avena que o processo penal é o instrumento
destinado à realização do poder punitivo do Estado e cujo desenvolvimento será gerido por
um conjunto de normas, preceitos e princípios que compõem o direito processual171.
O processo de execução criminal trata-se do processo penal, em que se faz amparar o
comando contido na sentença condenatória penal, impondo-se, efetivamente, a pena privativa
de liberdade, a pena restritiva de direitos ou a pecuniária172.
Deste modo, cabem os ensinamentos de Borges da Rosa, segundo o qual “a execução
penal é o conjunto de atos judiciais por meio dos quais se faz efetiva a sentença”173.
Destarte, passar-se-á a abordar o início da execução penal, que se dá através da
sentença penal condenatória.
168 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 656. 169 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 5. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 674 [grafia conforme original]. 170 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 674. 171 AVENA, Norberto Claúdio Pâncaro. Processo penal: esquematizado. São Paulo: Método, 2009, p. 2. 172 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1002. 173 BORGES DA ROSA, Inocêncio. Comentários ao Código de Processo Penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982, p. 788.
55
3.1.1 Início da execução da pena
A execução da pena inicia-se com a expedição da guia de recolhimento, que, como
regra, é expedida com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Assim sendo,
não se fala em execução da pena em processo que houve absolvição do réu.
Tece oportuna consideração Nucci:
Trata-se da fase do processo penal, em que se faz valer o comando contido na sentença condenatória penal, impondo-se, efetivamente, a pena privativa de liberdade, a pena restritiva de direitos ou a pecuniária. Não há necessidade de nova citação – salvo, quanto à execução da pena de multa –, tendo em vista que o condenado já tem ciência da ação penal contra ele ajuizada, bem como intimado da sentença condenatória, quando pôde exercer o seu direito ao duplo grau de jurisdição174.
Deste modo, dispõe o artigo 105 da Lei 7.210 (LEP):
Art. 105. Como regra a execução penal tem início após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, impondo pena privativa de liberdade, se o réu estiver preso ou vier a ser preso, expedindo o juiz da condenação a guia de recolhimento175.
Assim sendo, transitada em julgado a sentença condenatória será expedida a guia de
recolhimento a fim de que o apenado possa dar efetivamente o cumprimento da pena a ele
irrogada. Com as cópias necessárias do processo de origem e a guia de recolhimento será
autuado um novo processo, o qual recebe o nome de processo de execução criminal,
conhecido pela sigla “PEC”.
Conforme expõe a LEP, em seu artigo 106:
Art. 106. A guia de recolhimento extraída pelo escrivão, que a rubricará em todas as folhas e a assinará com o juiz, será remetida à autoridade administrativa incumbida da execução e conterá: I – o nome do condenado; II – a sua qualificação civil e o número do registro geral no órgão oficial de identificação; III – o inteiro teor da denúncia e da sentença condenatória, bem como certidão do trânsito em julgado; IV – a informação sobre os antecedentes e o grau de instrução; V – a data da terminação da pena;
174 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1002. 175 BRASIL. Lei 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/ L7210.htm>. Acesso em: 10 set. 2010.
56
VI – outras peças do processo reputadas indispensáveis ao adequado tratamento penitenciário176.
Assevera Nogueira que o processo de execução criminal objetiva a aplicação da pena,
tendo em vista a sentença penal condenatória. Dessa forma, o processo de execução criminal
inicia-se com o trânsito em julgado da mesma.
Extrai-se dos ensinamentos de Beneti que “o processo de execução penal não é mera
fase do processo penal de conhecimento, mas, ao contrário, é novo processo, que se constitui
para a praticização do título executório”177.
No art. 2º, parágrafo único, da LEP encontra-se expresso que sua aplicação estende-se
ao preso provisório, em que pese à existência de posicionamento contrário no que tange à
execução provisória da pena. Deste modo, o próximo contexto abordará os ditames da
execução penal provisória.
3.1.1.1 Execução provisória
A viabilidade do processo de execução provisória somente está presente quando a
sentença transitou em julgado para o Ministério Público, visto que, dessa forma, há um teto
máximo para a aplicação da sanção penal178.
Extrai-se dos ensinamentos de Mesquita Junior:
Imagine-se que determinado réu, em uma comarca que não disponha do Juízo da Execução, condenado em primeiro grau de jurisdição à pena restritiva de direito, especificada em prestação de serviços à comunidade, recorra de sua condenação, pleiteando absolvição, mas, visando abreviar o prazo de sua reabilitação, requeira a execução provisória de sua pena, pois é possível que ocorra o improvimento de seu recurso. Nesse caso, a fim de evitar a confusão processual, o Juiz deve formar um processo de execução provisória, com as peças essências para tal, decidindo em separado do processo principal, pois este será remetido para o Tribunal179.
176 BRASIL. Lei 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/ L7210.htm>. Acesso em: 10 set. 2010. 177 BENETI, Sidnei Agostinho. Execução penal. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 48. 178 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1035. 179 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 221-222.
57
Dessa forma, a execução provisória há de ser admitida em favor do apenado, visto
que, havendo sentença condenatória com recurso exclusivo deste, cabível é o deferimento de
benefícios, desde que presentes os requisitos para tanto.
Ademais, ensina Nucci:
Atualmente, permite-se a denominada execução provisória da pena. Pode o condenado à pena privativa de liberdade, desde que esteja preso cautelarmente, executá-la provisoriamente, em especial quando pretende a progressão de regime pleiteando a passagem do fechado para o semi-aberto180.
Marcão preleciona que a execução provisória reclama, sempre, a existência de
sentença penal condenatória ou de absolvição imprópria, sem trânsito em julgado definitivo.
Assim, não havendo recurso do Ministério Público ou do querelante, restando unicamente o
da defesa, a execução pode ser cumprida em caráter provisório181.
Contudo, há argumentos contrários a execução provisória da pena, sentido no qual
enfatiza Nucci:
Como argumento contrário à execução provisória da pena, invoca-se o princípio constitucional da presunção da inocência. Se o réu é inocente até que a decisão condenatória se torne definitiva, não seria possível fazê-lo cumprir antecipadamente a pena182.
Assim sendo, não poderia haver a antecipação do cumprimento da reprimenda imposta
ao apenado, visto que este poderia clamar a presunção de inocência, partindo da premissa que
sua condenação não transitou em julgado. Tendo em vista que o réu é inocente até o trânsito
em julgado da sentença penal condenatória183.
Destaca-se a previsão expressa da execução provisória da pena na LEP, como segue:
Art. 2º A jurisdição penal dos juízes ou tribunais da justiça ordinária, em todo o Território Nacional, será exercida, no processo de execução, na conformidade desta Lei e do Código de Processo Penal. Parágrafo único. Esta lei aplicar-se-á igualmente ao preso provisório e ao condenado pela Justiça Eleitoral ou Militar, quando recolhido a estabelecimento sujeito à jurisdição ordinária.
180 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1035. 181 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 38. 182 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1036. 183 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 222.
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Nesse sentido, expõe Mirabete:
Com fundamento no art. 2º, parágrafo único, da Lei de Execução Penal, que manda aplicá-la ao preso provisório, passou-se a entender, com razão, que nada impede que se providencie a execução provisória da sentença na pendência de recurso do acusado, quando transitada em julgado a decisão condenatória para a acusação184.
Destarte, os direitos e garantias cabíveis aos apenados servem como pressupostos de
proteção, e não para prejudicá-los, fato que ocorreria caso não fosse autuada a execução penal
provisória, que possui como escopo garantir a indisponibilidade do direito à liberdade.
Portanto, o que difere a execução provisória da execução definitiva da pena é que esta
se caracteriza pelo trânsito em julgado da sentença condenatória, a qual não cabe mais
recurso. Enquanto que na execução provisória encontra-se pendente o trânsito para alguma
das partes. Assim sendo, passa-se a elencar no próximo item as peculiaridades da execução
definitiva da pena.
3.1.1.2 Execução definitiva
Diferentemente da execução provisória, a execução definitiva caracteriza-se pelo
trânsito em julgado da sentença penal condenatória tanto para a acusação, como para a defesa.
Extrai-se dos ensinamentos de Mesquita Junior:
A seqüência para a execução das penas é a cronológica, ou seja, executa-se primeiro aquela que transitou em julgado antes. O trânsito em julgado a ser considerado é o trânsito em julgado final, tendo em vista que não existe tutela antecipada em matéria penal. Com efeito, a sentença condenatória só será título executivo pronto e acabado quando transitar definitivamente em julgado (trânsito em julgado para a acusação e para a defesa)185.
Ainda, segundo o mesmo autor, o que concede força executiva a sentença penal
condenatória é o trânsito em julgado da mesma. Conforme se depreende pelo seguinte texto:
É a autoridade da coisa julgada, decorrente do trânsito em julgado da sentença condenatória que concede força executiva ao título. Assim, caso esteja ocorrendo uma execução provisória e sobrevenha condenação
184 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 295. 185 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 217 [grafia conforme original].
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definitiva decorrente de outro fato, em processo distinto, será executada antes esta condenação definitiva186.
Assim, quando já em trâmite o processo de execução criminal provisório, conhecido
como “PEC provisório”, no juízo de execução, e a sentença condenatória transitar em julgado
definitivamente, retifica-se a guia de recolhimento tornando-se o “PEC definitivo”187.
Segundo Mirabete, a guia de recolhimento apresenta três funções:
Em primeiro lugar, constitui-se em medida de garantia individual, pois somente ela possibilita a execução de uma pena privativa de liberdade. Em segundo, é o instrumento do título executório constituído pela sentença condenatória transitada em julgado, não permitindo que na execução se extravase a punição além dos limites fixados pela decisão. Por fim, é também um documento que orienta a individualização da pena, já que deve fornecer elementos sobre os antecedentes e o grau de instrução do condenado, o relato do fato criminoso e outros dados reputados indispensáveis ao adequado tratamento penitenciário188.
Deste modo, considerando que o processo de execução criminal possui o escopo de
propiciar a satisfação efetiva e concreta da pretensão de punir do Estado, por meio da
sentença penal condenatória, deverá obedecer aos princípios que a norteia, desta forma o
contíguo elemento abordará os princípios da execução penal.
3.1.2 Princípios do direito penal executivo
A priori, com o escopo de abordar os princípios do direito penal executivo, torna-se
imprescindível conceituar e compreender o significado do termo princípio.
Nesse sentido, expõe Feitoza, “podemos, inicialmente e didaticamente, dizer que
princípios de direito são normas de caráter geral, que se constituem de diretrizes do
ordenamento jurídico”189.
186 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 218. 187 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 295. 188 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 302. 189 FEITOZA, Denilson. Direito processual penal: teoria, crítica e práxis. 5. ed. rev. e atual. Niterói: Impetus, 2008, p. 113.
60
Enfatiza Nucci que “[...] princípio jurídico quer dizer um postulado que se irradia por
todo o sistema de normas, fornecendo um padrão de interpretação, integração, conhecimento e
aplicação do direito positivo, estabelecendo uma meta maior a seguir”190.
Sobre o tema, assegura Sirvinskas:
Os princípios servem para facilitar o estudo e análise de certos fundamentos estanques do direito. Servem, em outras palavras, para balizar o procedimento do legislador, do magistrado e do operador de direito. [...] em outras palavras, é o valor fundamental de uma questão jurídica. É um ponto indiscutível e aceito pela sociedade191.
Ainda no entendimento do autor, “os princípios são extraídos do ordenamento
jurídico. A doutrina, contudo, arrola uma multiplicidade de concepções de princípios. Para
alguns, eles têm força normativa, para outros, são meras regras de pensamento”192.
Deste modo, o princípio é um enunciado normativo, visto que proporciona força de
norma na aplicação ao direito. Em distintas palavras é o valor essencial de uma demanda
jurídica.
Para Capez, os princípios gerais do direito são postulados universais que se fundam
em premissas éticas extraídas do material legislativo. São axiomas fundamentais ou
generalíssimos, que adjudicam fisionomia, unidade e validade a todo um sistema jurídico193.
Conforme os ensinamentos de Mirabete, no processo de execução evidentemente
vigem as garantias concedidas a todo o processo penal, entre os quais o contraditório, o uso
dos meios de prova garantidos em geral, a presença do juiz natural, a publicidade [...]194.
Extrai-se dos ensinamentos de Goulart:
Portanto, o direito da execução penal, como disciplina autônoma, é, igualmente, informado por princípios que são verdades fundantes do sistema que compreende. Tais princípios, no âmbito do direito da execução penal, são proposições de valor geral, que operam como condicionantes e
190 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 80. 191 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Introdução ao estudo do direito penal, p. 90. 192 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Introdução ao estudo do direito penal, p. 91. 193 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal, p. 71. 194 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 35.
61
orientadores de sua compreensão, especialmente, no que respeita à sua aplicação195.
Assim, os princípios do direito penal executivo atuam no sentido de iluminar suas
bases ou fundamentos, e por igual, orientam sua aplicação no sentido de sua compreensão.
Desta forma, abordar-se-á os aludidos princípios.
3.1.2.1 Princípio da legalidade
O princípio da legalidade é aquele que avaliza a execução da pena de maneira
antevista em lei e regulamentos. Destarte, importa na reserva legal das regras sobre as
modalidades de execução das penas e medidas de segurança196.
Segundo Dotti: “a grande missão de garantia proposta pelo Direito Penal, através da
inserção do princípio da legalidade quanto à descrição taxativa das condutas puníveis e das
respectivas sanções, deve ser completada no itinerário da execução”197.
Este princípio consiste em se demarcar com nitidez o alcance da sentença, assim como
a reserva dos direitos do apenado não atingidos pela decisão198.
Assim sendo, ensina Mesquita Junior que “o princípio da legalidade norteia a
execução penal em todos os seus momentos, dirigindo-se a todas as autoridades que
participam da mesma, seja ela administrativa ou judicial”199.
Nesse diapasão, aduz Kloch:
O Estado-Penal tem função de manter a ordem social, por isso deve agir como poder disciplinador na busca do fim social a que se destina, ou seja, a paz. Seja por intermédio de leis, de condenações, prisões, ou outras formas de reprimir a criminalidade, deve agir dentro do princípio da legalidade200.
195 GOULART, José Eduardo. Princípios informadores do direito da execução penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 85-86. 196 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 35. 197 DOTTI, René Ariel. Bases alternativas para o sistema de penas, p. 463. 198 DOTTI, René Ariel. Bases alternativas para o sistema de penas, p. 463. 199 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 24. 200 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 54.
62
Ademais, este princípio é um dos instrumentos judiciais de controle da atuação do
Estado no estabelecimento de normas incriminadoras, assim como na sujeição e execução das
penas.
Andreucci explana que:
Através desse princípio, nullum crimen, nulla poena sine lege, ninguém pode ser punido se não existir uma lei que considere o fato praticado como crime. Esse princípio também é chamado princípio da reserva legal, pois que a definição dos crimes e das respectivas penas deve ser dada apenas e exclusivamente por lei, excluindo qualquer outra fonte legislativa201.
Igualmente, este princípio busca em sede da execução penal demarcar com rigidez o
alcance da sentença penal condenatória, assim como a reserva de direitos do apenado não
atingidos pela mesma.
Extrai-se dos ensinamentos de Mirabete, que o princípio da legalidade domina o corpo
e o espírito das leis, de maneira a impedir que a execução da pena apresente excessos ou
desvios que prejudiquem o apenado202.
Por conseguinte, segundo o princípio da legalidade nenhum fato pode ser considerado
crime, tampouco uma pena pode ser aplicada sem que antes tenham sido instituídos em lei o
tipo delitivo e a pena respectiva.
3.1.2.2 Princípio da igualdade
O princípio da igualdade consiste no tratamento igualitário aos apenados,
independentemente do sexo, cor, raça, trabalho e credo religioso, pois todos gozam dos
mesmos direitos.
Igualmente, a CRFB/88 enfatiza em seu art. 3º, IV:
Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...]
201 ANDREUCCI, Ricardo Antonio. Curso de direito penal: parte geral de acordo com a lei 9.714 de 25-11-1998. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 1999, p. 15. 202 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários a Lei 7.210, de 11-7-1984, p. 30.
63
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação203.
Para Gomes, o que se pretende com o princípio da igualdade é vedar as diferenciações
arbitrárias no tratamento aos apenados, assim como as discriminações absurdas204.
Conforme dispõe o artigo 5º, caput, da CRFB/88:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes205.
Segundo Mesquita Junior, “hoje, não resta nenhuma dúvida de que o preceito
constitucional, no sentido de que todos são iguais perante a lei, dirige-se ao legislador e ao
aplicador da lei”206.
De igual forma o autor ressalva que a isonomia é relativa, à medida que os desiguais
não podem auferir o mesmo tratamento durante a execução da pena. Decorrendo desse foco o
princípio da individualização da pena, que será analisado em momento oportuno207.
3.1.2.3 Princípio da jurisdicionalidade
A participação do juiz na execução da pena não decorre unicamente do princípio da
proteção judiciária, consagrado expressamente no texto constitucional. A lei determina a
aplicação dos princípios como conseqüência lógica da interação existente entre o direito de
execução das penas e demais ramos do ordenamento jurídico208.
203 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 10 set. 2010. 204 GOMES, Luiz Flavio. Penas e medidas alternativas à prisão: doutrina e jurisprudência. 2. ed. rev. atual. e. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 67. 205 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 10 set. 2010. 206 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 25. 207 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 25. 208 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 26.
64
Enfatiza Mirabete:
A intervenção do juiz na execução da pena, aliás, não é novidade na história do Direito. Mesmo quando a prisão era somente cautelar, legislações atribuíam ao juiz o dever de visitar as prisões e tomar determinadas providências. Essa intervenção, porém, era de ordem fiscalizadora, ou seja, administrativa. Na evolução dos estudos principalmente da Ciência Penitenciária, contudo, começou-se a pensar que a intervenção do juiz devia abranger atos jurisdicionais, pelo menos com relação a certos institutos, que viriam a ser conhecidos como “incidentes da execução ”209.
Deste modo, a atividade de execução não é meramente administrativa, é, na realidade,
atividade jurisdicional210.
3.1.2.4 Princípio do duplo grau de jurisdição
O princípio do duplo grau de jurisdição caracteriza-se por permitir ao acusado que seu
processo seja analisado por uma segunda instância, ou seja, caso o juiz singular atente algum
equívoco, o colegiado poderá reformar a sentença.
Nesse sentido ensina Sirvinskas:
Trata-se de uma garantia processual e tem por escopo exercer um controle do poder jurisdicional. Todo juiz é suscetível de cometimento de erro. Por tal razão, o acusado tem o direito de ver seu processo julgado por um órgão colegiado e mais experiente. Esse princípio decorre do princípio da inocência e da garantia do devido processo legal211.
Ademais, enfatiza Avena que “o duplo grau de jurisdição tem sido utilizado
largamente como fundamento para a sustentação de inconstitucionalidade de dispositivos
incorporados à legislação processual comum ou especial”212.
Para Capez, “todas as decisões de conteúdo jurisdicional, que concedam ou restrinjam
um direito do sentenciado, submetem-se a recurso para a instância superior”213.
209 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários a Lei 7.210, de 11-7-1984, p. 31. 210 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 26. 211 SIRVINSKAS, Luis Paulo. Introdução ao estudo do direito penal, p. 146. 212 AVENA, Norberto Cláudio Pâncaro. Processo penal: esquematizado, p. 25. 213 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 23.
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Assim sendo, o princípio do duplo grau de jurisdição constitui-se na possibilidade da
sentença ser reavaliada por um órgão superior, podendo ser reformada ou mantida, a fim de
impedir um possível desacerto, ou talvez injustiça.
Assevera Bonfim:
Princípio segundo o qual as decisões podem ser revistas por órgãos jurisdicionais de grau superior, por meio da interposição de recursos. Abrange tanto as questões de fato quanto as questões de direito, alcançado as sentenças e as decisões interlocutórias214.
Ainda expõe o autor que, “o princípio não encontra previsão expressa na Constituição.
Parte da doutrina sustenta que a Constituição Federal, quando organizou o Poder Judiciário
em instâncias, consagrou esse princípio implicitamente”215.
Por conseguinte, o mencionado princípio constitui-se meio necessário para garantir a
maior certeza às decisões tomadas pelo juiz singular.
3.1.2.5 Princípio do contraditório
O princípio do contraditório encontra-se expresso no texto constitucional, devendo ser
observado em todos os processos judiciais e administrativos, permitindo a ambas as partes à
paridade de armas.
Assim, preceitua a CRFB/88:
Art. 5. [...] LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes216.
Segundo os ensinamentos de Tourinho Filho, o princípio do contraditório traduz a
ideia de que a defesa tem o direito de se manifestar, pronunciar-se sobre todos os atos e
manifestações elencados ao processo217.
214 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal, p. 58. 215 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal, p. 58. 216 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 10 set. 2010. 217 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal, p. 21.
66
Este princípio abrange o direito de contrariar a acusação, o direito de acompanhar a
produção de provas, de falar depois da acusação. Assim sendo, não há como dissociar o
princípio do contraditório do princípio da ampla defesa218.
Desta forma, enfatiza Capez que “as partes envolvidas na relação jurídica processual
devem ter ciência de todos os atos e decisões, e oportunidade de se manifestarem previamente
a respeito”219.
Igualmente, segundo Mesquita Junior:
Muitas sanções administrativas poderão ser aplicadas pela autoridade, desde que instaurado processo administrativo. Neste, mister é a necessidade de assegurar-se o contraditório, permitindo-se ao acusado a produção das provas necessárias para sua defesa220.
Percebe-se, portanto, que o princípio supracitado é uma garantia constitucional que
assegura a ampla defesa do apenado, proporcionando-lhe o exercício pleno de seu direito de
defesa.
3.1.2.6 Princípio da humanização da pena
Este princípio caracteriza-se por afiançar os diretos humanos pertinentes ao apenado,
fazendo com que este não seja mal tratado no decorrer de sua reprimenda.
Extrai-se dos ensinamentos de Mesquita Junior que “pelo princípio da humanização da
pena, a execução penal deve obedecer aos parâmetros modernos de humanidade, consagrados
internacionalmente, mantendo-se a dignidade humana do condenado”221.
O princípio da humanização da pena assevera que o apenado carrega consigo sua
ínsita dignidade, portanto a pena deve ser humana, de modo a não infringir sofrimento
desnecessário.
218 SIRVINSKAS, Luis Paulo. Introdução ao estudo do direito penal, p. 143. 219 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 23. 220 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p.27. 221 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 29.
67
Nesse sentido, expõe Gomes:
A humanização constitui certamente uma das características fundamentais das penas e da política penal nos últimos três séculos. Estamos longe ainda de alcançar o sistema ideal, é dizer, um sistema penal e penitenciário totalmente humanizado, mas é inegável o progresso obtido222.
O princípio da humanização da pena encontra-se elencado na CRFB/88 em seu artigo
5º, XLVII:
Art. 5. [...] XLVII – não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis.
O princípio da humanização da pena é uma das consequências naturais do Estado
Democrático de Direito, fundamentado no respeito à dignidade do apenado.
Cabem os ensinamentos de Prado:
A idéia de humanização das penas criminais tem sido uma reivindicação constante no perpassar evolutivo do Direito Penal. Das penas de morte e corporais, passa-se, de modo progressivo, às penas privativas de liberdade e destas às penas alternativas. Em um Estado de Direito democrático veda-se a criação, a aplicação ou a execução de pena, bem como de qualquer outra medida que atentar contra a dignidade humana223.
Ainda no entendimento do autor, “apresenta-se como uma diretriz garantidora de
ordem material e restritiva da lei penal, verdadeira salvaguarda da dignidade pessoal,
relacionando-se de forma estreita com os princípios da culpabilidade e da igualdade”224.
3.1.2.7 Princípio da proporcionalidade
O princípio da proporcionalidade pode ser caracterizado como um dos mais
importantes mecanismos de proteção eficaz da liberdade na ordem constitucional nos dias
222 GOMES, Luiz Flavio. Penas e medidas alternativas à prisão: doutrina e jurisprudência, p. 70. 223 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 82 [grafia conforme original]. 224 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte geral, p. 82.
68
atuais, sendo nominado por alguns autores como o princípio da racionalidade, buscando,
dessa forma, o proporcional.
Ademais expõe Bonfim:
Doutrinariamente, discute-se também a natureza jurídica do princípio da proporcionalidade, ou seja, sua validade como verdadeiro “princípio”, no sentido de ser uma norma-princípio de necessária aplicação. Aduz-se, contudo, não ser apenas um “princípio”, tal como estes são tradicionalmente concebidos, mas um princípio mais importante, um “princípio dos princípios”, ou um “superprincípio”, porque, enquanto todos os demais princípios jurídicos são relativos (não absolutos) e admitem flexibilizações ou balanço de valores, o princípio da proporcionalidade é um método interpretativo e de aplicação do direito para a solução do conflito de princípios – metáfora da colisão de princípios – e do balanço dos valores em oposição, não se flexibilizando, configurando-se assim em um princípio absoluto225.
Mesquita Junior assevera que “com efeito, até mesmo para os adeptos das teorias
absolutas, para quem a pena é concebida unicamente em seu aspecto retributivo, a expressão
máxima de justiça reside na lei de talião, ou seja, ‘olho por olho, dente por dente’ [...]”226.
Por fim, adiante analisar-se-á o último princípio elencado, qual seja: princípio da
individualização da pena, presente no decorrer do cumprimento da pena.
3.1.2.8 Princípio da individualização da pena
O princípio da individualização da pena pressupõe que a sua imposição e cumprimento
devem ser individualizados de acordo com a culpabilidade e as características do apenado.
O princípio da individualização corresponde à aplicação da pena na exata medida da
personalidade do delinquente. Igualmente, o juiz deverá fixar a pena dentro dos limites
estabelecidos pelo tipo penal e determinar a forma de sua execução227.
225 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal, p. 60. 226 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 30. 227 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Introdução ao estudo do direito, p. 125.
69
Assim sendo, no cumprimento das penas, o apenado deve ser submetido a tratamentos
diferenciados de acordo com a natureza do delito, o sexo e a idade do apenado. Dessa forma,
a pena deve ser aplicada e cumprida isoladamente, ante as características de cada um228.
Assevera Prado, que o princípio da individualização da pena obriga o julgador a fixar
à pena, conforme a cominação legal (espécie e quantidade) e a determinar a forma de sua
execução229.
Desta forma, dispõe a CRFB/88 em seu artigo 5º, XLVI:
Art. 5. [...] XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos.
O princípio da individualização da pena caracteriza, portanto, os direitos e garantias
fundamentais de cada apenado. Dessa forma, tanto na aplicação da pena, quanto na sua
execução, deve-se levar em consideração a sanção mais justa e equilibrada a cada apenado.
Por conseguinte, aclarado sobre os princípios que norteiam o processo de execução
penal, assim como elencadas as peculiaridades da execução provisória e definitiva, passar-se-
á no contíguo elemento a elucidar os regimes de cumprimento das penas privativas de
liberdade.
3.2 REGIMES DE CUMPRIMENTO
Os regimes de cumprimento das penas privativas de liberdade são subdividos em
regime fechado, semiaberto ou aberto. Contudo, o artigo 37 do CP prevê o regime especial,
destinado às mulheres. Não obstante, a LEP antevê o Regime Disciplinar Diferenciado
(RDD), não representando este a criação de um novo regime, mas uma sanção disciplinar.
228 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 10 set. 2010. 229 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte geral, p. 81-82.
70
Com o intuito de elucidar sobre a classificação dos regimes de cumprimento de pena,
Bitencourt leciona que:
A Lei n.º 7.209/84 manteve a classificação dos regimes de cumprimento de pena instituído pela lei n.º 6.416-77. Abandonou, contudo, a periculosidade como fator determinante para a adoção deste ou daquele regime, como fazia aquele diploma legal. Agora, os regimes são determinados fundamentalmente pela espécie e quantidade da pena e pela reincidência, aliadas ao mérito do condenado, num autêntico sistema progressivo230.
O regime será especificado na sentença, observando-se, além das circunstâncias
judiciais, conforme preceitua o artigo 59 do Código Penal, o total das penas aplicadas. Dessa
forma, o condenado a pena superior a 8 (oito) anos iniciará o cumprimento da pena,
obrigatoriamente no regime fechado. Igualmente, aquele que sofre condenação superior a 4
(quatro) anos e igual ou inferior a 8 (oito) anos, não poderá iniciar o cumprimento no regime
aberto, assim sendo, ou será no regime semiaberto ou fechado, cabendo ao magistrado
analisar qual o regime adequados aos objetivos do direito penal231.
Nos próximos contextos serão abordados os regimes de cumprimento de pena
isoladamente, iniciando-se pelo regime fechado.
3.2.1 Regime fechado
O regime fechado é aquele em que o condenado fica completamente isolado do meio
social e privado da liberdade física de locomoção, por meio de seu recolhimento em
estabelecimento prisional de segurança máxima ou média232.
Com o escopo de aclarar sobre as características e pressupostos do regime fechado,
Almeida leciona que:
Fechado é o regime cuja execução da pena privativa de liberdade se verifica em estabelecimento de segurança máxima ou média. Destina-se o regime fechado ao réu condenado à pena de reclusão superior a 8 (oito) anos, mesmo que não seja reincidente. Aplica-se também esse regime ao réu reincidente, punido com reclusão, qualquer que seja a duração da pena233.
230 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 447. 231 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 226 232 SILVA, Jorge Vicente. Execução penal. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2006, p. 39. 233 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p. 157.
71
Ainda extrai-se dos ensinamentos do autor que:
Possui esse regime prisional as seguintes regras: a) submissão do condenado, no início do cumprimento da pena, a exame criminológico de classificação para individualização da execução; b) sujeição do condenado a trabalho no período diurno e a isolamento durante o repouso noturno; c) apuração das aptidões obreiras ou ocupações anteriores do condenado, compatíveis com a execução da pena para fins de sujeição a trabalho interno; d) admissibilidade do trabalho externo, em serviços e obras públicas234.
Outrossim, o artigo 34 do Código Penal preceitua as regras do cumprimento da pena
no regime fechado, quais sejam:
Art. 34. O condenado será submetido, no início do cumprimento da pena, a exame criminológico de classificação para individualização da execução. § 1º - O condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante o repouso noturno. § 2º - O trabalho será em comum dentro do estabelecimento, na conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado, desde que compatíveis com a execução da pena. § 3º - O trabalho externo é admissível, no regime fechado, em serviços ou obras públicas.
Dessa forma, o cumprimento da pena no regime fechado caracteriza-se pelo
retraimento total do apenado no período noturno, havendo maior controle e vigilância sobre o
mesmo235.
O trabalho durante o cumprimento da reprimenda é um direito de todo condenado.
Nesses termos, Mesquita Junior aduz que:
[...] o trabalho é um direito do preso. Todavia, nos estabelecimentos prisionais em que se encontram os condenados cumprindo pena em regime fechado, poucos são, em termos processuais, aqueles que efetivamente estão classificados para o trabalho236.
Ainda leciona o autor que o referido regime caracteriza-se por propiciar ao condenado
o desempenho de duas atividades: o trabalho e o estudo. Nas seguintes palavras:
O tratamento penitenciário ganha relevo no estudo de cada um dos regimes, visto que é em cada um deles que verificaremos contextualmente a forma que deve ser desenvolvido o tratamento. Existindo um efetivo programa de
234 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p. 157. 235 TELES, Ney Moura. Direito penal, p. 51. 236 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 228.
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tratamento, o regime fechado será estabelecido com o preenchimento das horas dos condenados com atividades produtivas, a saber: trabalho e estudo237.
O acenado regime deve ser cumprido em penitenciárias afastadas de centros urbanos,
alojando-se o condenado em cela individual, com uma área mínima de 6 (seis) metros
quadrados, que conterá dormitório, sanitário e lavatório238.
Nesse diapasão preceitua o art. 88 da LEP:
Art. 88. O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório. Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular: a) salubridade do ambiente pela concorrência de fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana; b) área mínima de 6,00m² (seis metros quadrados)239.
Bitencourt leciona que, perante a situação crítica dos estabelecimentos prisionais, os
requisitos elencados para o aludido regime, muitas vezes, se não em todas, não são
cumpridos:
No regime fechado o condenado cumpre a pena em penitenciária e estará obrigado ao trabalho em comum dentro do estabelecimento penitenciário, na conformidade de suas aptidões ou ocupações anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena. Nesse regime o condenado fica sujeito ao isolamento durante o repouso noturno (art. 34, §1º do CP), porém, na prática, esse isolamento noturno, com os requisitos exigidos para a cela individual (art. 88 da LEP), não passa de elaboração dos diplomas legais. Com a superlotação carcerária constatada em todos os estabelecimentos penitenciários, jamais será possível o isolamento dos reclusos durante o repouso noturno. Quem cumpre pena em regime fechado não tem direito a freqüentar cursos, quer de instrução, quer profissionalizantes. E o trabalho externo só é possível (ou admissível) em obras ou serviços públicos, desde que o condenado tenha cumprido, pelo menos, um sexto da pena240.
Constata-se que, embora a teoria tenha previsto todo o tratamento adequado para cada
regime carcerário com suas peculiaridades, a prática impossibilita a concretização e
individualização deste tratamento.
237 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 228 238 TELES, Ney Moura. Direito penal, p. 51. 239 BRASIL. Lei 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/ L7210.htm>. Acesso em: 10 set. 2010. 240 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 448 [grafia conforme original].
73
Barros leciona que:
Vale a pena ainda destacar que, no regime fechado, o condenado será obrigatoriamente submetido, no início do cumprimento da pena, a exame criminológico de classificação para individualização da execução (CP, art. 34). Esse exame, que no regime semi-aberto é facultativo (parágrafo único do art. 8º da LEP), é realizado pela Comissão Técnica de Classificação de cada presídio e só pode ser feito após o trânsito em julgado da sentença. Não se realiza esse exame quando a sentença impõe regime aberto ou pena restritiva de direitos241.
Todavia, o cumprimento da pena em regime fechado requer inúmeras precauções da
administração prisional, conforme aduz Rosa: “o primeiro dever da administração é manter o
recluso na prisão e impedir sua evasão. Nos estabelecimentos fechados, esse resultado é
obtido com a ajuda de meios materiais: muros, barreiras, grades, etc.”242.
Explanado sobre o regime fechado, no contíguo elemento aclarar-se-á sobre o regime
semiaberto, caracterizado por ser o regime intermediário entre o mais gravoso, regime
fechado, e o mais brando, regime aberto.
3.2.2 Regime semiaberto
A execução da pena nesse regime baseia-se principalmente na autodisciplina
permitindo que o apenado cumpra a pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento
similar, caracterizada pela inexistência de grades. Tendo em vista a personalidade merecedora
da locomoção de liberdade243.
Bitencourt leciona que no regime semiaberto há uma mudança no tratamento para com
os condenados, visto que este regime apresenta condições mais brandas. In verbis:
No regime semi-aberto não há previsão para o isolamento durante o repouso noturno. Nesse regime, o condenado terá direito de freqüentar cursos profissionalizantes, de instrução de 2º grau ou superior. Também ficará sujeito ao trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou em estabelecimento similar. Aqui, no regime semi-aberto o trabalho externo é admissível, inclusive na iniciativa privada, ao contrário do que ocorre no regime fechado244.
241 BARROS, Flavio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral, p. 451. 242 ROSA, Antonio José Miguel Feu. Execução penal, p. 288. 243 TELES, Ney Moura. Direito penal, p. 52. 244 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 448 [grafia conforme original].
74
O Código Penal dispõe que o regime de cumprimento é especificado segundo o
montante de pena privativa aplicada. Desse modo, aduz Almeida:
Semi-aberto é o regime cuja execução da pena privativa de liberdade se verifica em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. Destina-se o regime semi-aberto ao réu não reincidente condenado à pena de reclusão superior a 4 (quatro) anos e não excedente a 8 (oito) anos245.
As regras do cumprimento da pena no regime semiaberto encontram-se enumeradas no
artigo 35 do CP, quais sejam:
Art. 35. Aplica-se a norma do art. 34 deste Código, caput, ao condenado que inicie o cumprimento da pena em regime semi-aberto. § 1º - O condenado fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. § 2º - O trabalho externo é admissível, bem como a freqüência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior246.
Costa Junior ensina que “aplicando-se ao regime semi-aberto a norma contida na
cabeça do dispositivo precedente, são válidas as considerações tecidas a respeito. Entretanto,
o exame criminológico de classificação não é obrigatório, mas facultativo”247.
Assim, o regime semiaberto possibilita que o apenado possa sair durante o dia para
trabalhar, frequentar cursos, bem como exercer atividade autorizada, retornando no período
noturno ao cárcere; este regime caracteriza-se por ser a transição entre os regimes fechado e
aberto, deste modo, estima a reinserção social do apenado.
Recorre-se, por oportuno, mais uma vez a expressiva ligação de Almeida:
Possui esse regime prisional as seguintes regras; a) submissão do condenado, no início do cumprimento da pena, a exame criminológico de classificação para individualização da execução; b) sujeição do condenado a trabalho em comum no período diurno em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar; c) apuração das aptidões obreiras ou ocupações anteriores do condenado, compatíveis com a execução da pena para fins de sujeição ao trabalho; d) admissibilidade do trabalho externo, bem como freqüencia a
245 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p. 161 [grafia conforme original]. 246 BRASIL. Código Penal (1940). Decreto-lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em 20 set. 2010. 247 COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito penal objetivo: comentários atualizados, p. 88 [grafia conforme original].
75
cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior248.
Cabe ressaltar que, segundo os ensinamentos de Costa Junior:
No regime semi-aberto, o trabalho poderá ser desenvolvido no próprio estabelecimento prisional ou fora dele, sem nenhuma restrição de serviço ou local. Ademais, o trabalho externo realizar-se-á com fiscalização e precaução menos rigorosas249.
Destarte, no regime semiaberto o apenado poderá obter autorização para sair do
estabelecimento prisional temporariamente, sem qualquer vigilância direta, para visitar a
família, bem como participar de atividades que lhe proporcionem condições que auxiliem a
sua reinserção social.
O citado regime caracteriza-se pela sutileza da vigilância, visto que se baseia no senso
de responsabilidade do apenado. Desta forma, o condenado cumpre a pena sem ficar
submetido às regras rigorosas do regime penitenciário.
3.2.3 Regime aberto
Bitencourt assevera que “o regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de
responsabilidade do apenado. O condenado só permanecerá recolhido (em casa de albergado
ou em estabelecimento adequado) durante o repouso noturno e nos dias de folga”250.
Assim, preceitua o CP em seu artigo 36:
Art. 36. O regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado. § 1º - O condenado deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, freqüentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga. § 2º - O condenado será transferido do regime aberto, se praticar fato definido como crime doloso, se frustrar os fins da execução ou se, podendo, não pagar a multa cumulativamente aplicada251.
248 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p. 162 [grafia conforme original]. 249 COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito penal objetivo: comentários atualizados, p. 88-89 [grafia conforme original]. 250 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 449. 251 BRASIL. Código Penal (1940). Decreto-lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em 20 set. 2010.
76
Seu cumprimento dá-se em casas de albergados, separadas dos estabelecimentos
penais, como presídios e penitenciárias, é um prédio de alojamento coletivo e sua
característica peculiar é a ausência de obstáculos físicos contra a fuga.
Cabem os ensinamentos de Bitencourt, no sentido de que “o maior mérito do regime
aberto é manter o condenado em contato com a sua família e com a sociedade, permitindo que
o mesmo leve uma vida útil e prestante”252.
Almeida aduz que:
Destina-se o regime aberto ao réu não reincidente condenado à pena de reclusão igual ou inferior a 4 (quatro) anos. Aplica-se também esse regime prisional ao réu não reincidente condenado à pena de detenção igual ou inferior a 4 (quatro) anos, bem como ao réu reincidente condenado à pena de detenção de no máximo 4 (quatro) anos253.
Na sequência de seus ensinamentos, Almeida assevera que:
Possui esse regime prisional as seguintes regras: a) permissão de trabalho ao condenado, fora do estabelecimento e sem vigilância, bem como frequencia a curso ou exercício de outra atividade autorizada; b) permanência do condenado no albergue ou instituição de cumprimento da pena durante o período noturno e nos dias de folga; c) transferência do condenado para regime prisional mais rigoroso em caso de prática de crime doloso[...]254.
Insere-se oportuna observação de Muakad, “na execução da pena em regime aberto, a
privação da liberdade é cumprida à noite, nos fins de semana e nos dias de folga na casa do
albergado ou prisão albergue, como preferem alguns”255.
Ainda no entendimento da autora:
O citado regime supõe uma determinada evolução da personalidade do recluso que permita confiar em sua faculdade de autodomínio e uma sincronização com o meio social onde está instalado, para que não ocorram rejeições e para que haja um bom funcionamento256.
252 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 449. 253 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p. 162. 254 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p. 162-163. 255 MUAKAD, Irene batista. Pena privativa de liberdade, p. 67. 256 MUAKAD, Irene batista. Pena privativa de liberdade, p. 67.
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Destaca-se que diante da falta de estabelecimentos adequados ao cumprimento da pena
em regime aberto, os apenados são agraciados com a prisão domiciliar. Embora, o art. 117 da
LEP frise quais os requisitos necessários ao deferimento de prisão domiciliar:
Art. 107. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de: I - condenado maior de 70 (setenta) anos; II - condenado acometido de doença grave; III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; IV - condenada gestante.
Nesse contexto, aduz Andreuci que na inexistência de casa de albergado, tem-se
admitido, excepcionalmente, a concessão de prisão albergue domiciliar, embora em
desrespeito às disposições da LEP, supracitadas257.
Nesse contexto, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
RÉU CONDENADO AO REGIME ABERTO - INEXISTÊNCIA DE CASA DO ALBERGADO NA COMARCA - DEFERIMENTO, EXCEPCIONAL, DA PRISÃO DOMICILIAR. RECURSO IMPROVIDO. 1. SE O ESTADO, DURANTE ANOS A FIO, PERMANECE INERTE E NÃO CONSTRÓI A CHAMADA “CASA DO ALBERGADO”, PARA O CUMPRIMENTO DA PRISÃO NO REGIME ABERTO, NÃO É JUSTO QUE O CONDENADO NESSA CONDIÇÃO SEJA TRANCAFIADO NUMA PRISÃO COMUM, EM CONTATO COM DELINQÜENTES DE TODA A SORTE. 2. IMPÕE-SE, ASSIM, EXCEPCIONALMENTE, CONCEDER-LHE A PRISÃO DOMICILIAR, ENQUANTO INEXISTENTE O LOCAL APROPRIADO. 3. RECURSO IMPROVIDO258.
Portanto, diante da falta de estrutura para o cumprimento das penas privativas de
liberdade no regime aberto, os juízes permitem que os apenados cumpram a pena em prisão
domiciliar, tendo em vista que os mesmo não podem ser prejudicados pela inércia do Estado.
Outrossim, passa-se a tratar do regime especial.
3.2.4 Regime especial
Extrai-se dos ensinamentos de Leal, que a ideia de um estabelecimento penitenciário
de caráter misto, no qual homens e mulheres sejam agrupados em comum parece, ainda hoje,
impraticável. A promiscuidade sexual ficaria difícil de ser controlada e isto poderia 257 ANDREUCI, Ricardo Antonio. Execução penal, p. 66. 258 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 129869. Rel. Min. Anselmo Santiago, sexta turma, julgado em: 10/02/1998. Brasília-DF. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc. jsp?tipo_visualizacao=RESUMO&processo=129869&b=ACOR#>. Acesso em 30 out. 2010.
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comprometer a disciplina prisional. Daí a divisão clássica dos estabelecimentos prisionais em
masculinos e femininos. Diante disso, a mulher condenada a cumprir pena privativa de
liberdade será recolhida a estabelecimento próprio, separado do masculino259.
Assevera Almeida que:
Especial é o regime adotado para cumprimento de pena restritiva de liberdade por pessoas do sexo feminino ou de idade provecta (art. 82, §1º, LEP). A Constituição Federal determina o cumprimento da pena em estabelecimentos distintos de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado (art. 5º, XLVIII) e, assegura às presidiárias condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação (art.5º, L)260.
Neste diapasão, Costa Junior ensina que as mulheres devem cumprir a pena em
estabelecimentos próprios, uma vez que suas condições diversas, seja de natureza fisiológica
ou psicológica, impõem a especialidade do regime. Somente assim poderão ser observados os
deveres inerentes à sua condição pessoal, como determina a norma261.
O mesmo autor aduz que:
Tudo o mais que não lhe for peculiar à condição personalíssima da presidiária, enquanto mulher, a ela se aplica. Impõem-se os mesmos direitos e deveres: o trabalho durante o dia e o isolamento noturno em regime fechado; ou ainda o trabalho externo em obras públicas, nesse mesmo regime; o direito à freqüencia a cursos profissionalizantes ou de instrução de segundo grau ou superior, no regime semi-aberto; a progressão ou a regressão no cumprimento da pena; segundo o mérito ou demérito da conduta carcerária262.
Por derradeiro, Almeida preleciona que “respeitadas as peculiaridades da condição
pessoal da mulher, são a elas também aplicáveis todas as regras atinentes aos demais regimes
aqui estudados”263.
259 LEAL, João José. Direito penal geral, p. 409. 260 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p. 163-164. 261 COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito penal objetivo: comentários atualizados, p. 90. 262 COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito penal objetivo: comentários atualizados, p. 90 [grafia conforme original]. 263 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sentença penal: doutrina, jurisprudência e prática, p.164.
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3.2.5 Regime disciplinar diferenciado
O regime disciplinar diferenciado (RDD) é modalidade de sanção disciplinar,
consoante reza o artigo 53, V, da LEP e as hipóteses em que se faz cabível o regime estão
reguladas no artigo 52 da lei.
O acenado regime é diferenciado pelas seguintes características: a) duração máxima de
360 (trezentos e sessenta) dias, sem prejuízo de repetição de sanção por nova falta grave de
mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada; b) recolhimento em cela
individual; c) visitas semanais de duas pessoas, sem contar crianças, com duração de horas; d)
direito de saída da cela para banho de sol por duas horas diárias264.
Nesse contexto, assevera Bitencourt:
Pela nova redação do art. 52 da LEP, atribuída pela Lei n.º 10.792/2003, o regime disciplinar diferenciado poderá ser aplicado, sem prejuízo da sanção correspondente à falta grave, nas seguintes situações: 1ª) prática de fato previsto como crime doloso que ocasione subversão da ordem ou disciplina internas (art. 52, caput); 2ª) apresente alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade (§1º); 3ª) quando houver fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando265.
O RDD nada mais é do que um regime de disciplina carcerária especial, que apresenta
como característica peculiar um maior grau de isolamento do apenado com o mundo exterior.
Trata-se, pois, de uma medida emergencial que visa transformar o caos do sistema
penitenciário, para, ao menos em relação aos presos mais perigosos, ou sob aos quais recaiam
fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações
criminosas, quadrilha ou bando, impondo-lhes um verdadeiro regime de segurança máxima266.
Portanto, abordados os regimes carcerários de cumprimento das penas privativas de
liberdade, adentrar-se-á nos benefícios proporcionados aos apenados durante o seu efetivo
cumprimento.
264 MARCÃO, Renato. Curso de Execução penal, p. 74. 265 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 449. 266 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 74-75.
80
3.3 BENEFÍCIOS
A execução penal como atividade complexa que se desenvolve em ambos os planos
jurisdicional e administrativo, cuja finalidade é a ressocialização do condenado, visa à
reinserção social do mesmo, para isso, adota políticas de benefícios concedidos com o escopo
de reintegrar o apenado à sociedade.
A legislação ordinária e constitucional preveem alguns tipos de benefícios a serem
concedidos aos apenados com pena privativa de liberdade, os quais não consistem uma
faculdade do Estado, mas, sim, um dever, face aos fins visados com a privação da liberdade.
3.3.1 Progressão de regime
A progressão de regime consiste na possibilidade conferida ao apenado de
transferência ao regime de cumprimento de pena menos rigoroso, desde que atendidos os
requisitos legais.
Extrai-se do conhecimento de Greco:
O § 2º do art. 33 do Código Penal determina que as penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado. A progressão é um misto de tempo mínimo de cumprimento de pena (critério subjetivo) com o mérito do condenado (critério subjetivo). A progressão é uma medida de política criminal que serve de estímulo ao condenado durante o cumprimento de sua pena. A possibilidade de ir galgando regimes menos rigorosos faz com que os condenados tenham a esperança de retorno paulatino ao convívio social267.
Para um conhecimento mais abrangente, no que tange ao sistema progressivo de
cumprimento das penas privativas de liberdade, Bitencourt assevera que:
A Reforma Penal, adotou, como se constata, um sistema progressivo de cumprimento de pena, que possibilita ao próprio condenado, através de seu procedimento, de sua conduta carcerária, direcionar o ritmo de cumprimento de sua sentença. Possibilita ao condenado ir conquistando paulatinamente a sua liberdade, ainda durante o cumprimento da pena, de tal maneira que a pena a ser cumprida não será sempre e necessariamente a pena aplicada. A partir do regime fechado, fase mais severa do cumprimento da pena,
267 GRECO, Rogério. Curso de direito penal, p. 512.
81
possibilita o Código a conquista progressiva de parcelas da liberdade suprimida268.
Marcão explica que o sistema progressivo adotado pela LEP determina a mudança de
regime, passando o condenado do mais severo para o menos severo, falando-se então em
progressão de regime. Ocorrendo a ordem inversa, tem-se a regressão, matéria que será
ponderada posteriormente269.
Capez, no mesmo sentido, ensina que “a alteração da situação fática existente ao
tempo da condenação faz com que o juízo da execução promova as necessárias adaptações a
fim de adequar a decisão à nova realidade”270.
Nesse diapasão, Mesquita Junior sustenta que:
Os requisitos para concessão do benefício da progressão de regimes serão objetivos (expressamente constantes da lei, sem análise de aspectos subjetivos) e subjetivos (aspectos relativos ao mérito do condenado, os quais indicam provável adaptação do condenado ao regime menos rigoroso; tais aspectos se relacionam com as condições pessoais do condenado, sempre de caráter subjetivo)271.
Assim, observa-se que a decisão do juiz do processo é provisória e, a partir do regime
fechado, capacita-se a transferência do sentenciado para o regime semiaberto e,
posteriormente, ao regime aberto, desde que preenchidos os requisitos legais.
Mesquita Junior leciona quanto ao cálculo para a obtenção do mencionado benefício:
Para a concessão de todos os benefícios, o requisito objetivo que estará presente é o tempo. O cálculo do requisito temporal é simples, mas envolve certo trabalho matemático, visto que exige a realização da operação de divisão. Imagine-se que Tício foi condenado a 5 anos e 6 meses de reclusão, iniciando o cumprimento de sua pena em 1º-1-1999. Para ser progredido de regime, ele precisará cumprir 1/6 da pena, ou seja, dividiremos o total da pena por “6”, obtendo 11 meses de reclusão. Assim, somando 11 meses a 1º-1-1999, a data que Tício poderá ser progredido de regime será 1º-12-1999272.
Não obstante isso, no exemplo acima não foi considerado a eventual remição.
Portanto, caso o apenado do aludido exemplo tenha laborado porquanto esteve recolhido na 268 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, p. 454-455 [grafia conforme original]. 269 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 115-116. 270 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 365. 271 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 233. 272 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p.233.
82
unidade prisional, terá direito ao benefício da remição da pena, que será posteriormente
elucidada.
Igualmente, preceitua o art. 112, caput, da LEP que a pena privativa de liberdade será
executada em forma progressiva, com a transferência para o regime menos rigoroso, a ser
determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime
anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado por atestado emitido pelo
diretor do estabelecimento273.
Consoante a Súmula 717 do Supremo Tribunal Federal: “Nada impede a progressão de
regime de execução da pena, fixada em sentença não transitada em julgado, o fato de o réu se
encontrar em prisão especial”274.
Os únicos delitos que não contemplavam a progressão de regime eram os elencados
como crimes hediondos, previstos na Lei 8.072/90, visto que os citados crimes eram
cumpridos integralmente no regime fechado. Contudo, com advento da Lei 11.164/07 a
progressão de regime para os crimes hediondos foi permitida, com fração de cumprimento da
pena diferenciada. Nesse contexto, Oliveira leciona:
A ressalva que se fazia ao sistema progressivo era a Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/90), segundo a qual os autores daqueles delitos deveriam cumprir a pena privativa de liberdade no regime integralmente fechado. Porém, com o advento da Lei n.º 11.464/07, possibilitou-se o cumprimento da pena privativa de liberdade em sistema progressivo, contudo, com frações diferenciadas275.
Assim, a progressão de regime prisional, desde que satisfeitos os requisitos legais, é
um direito subjetivo do sentenciado. Devem coexistir os requisitos objetivo (cumprimento de
1/6, na generalidade dos crimes; 2/5, se primário, ou 3/5, se reincidente, em se tratando de
crimes hediondos ou assemelhados, por força do disposto na Lei 11.464, de 28- 3- 2007) e
subjetivo (boa conduta carcerária, comprovada por atestado firmado por diretor do
estabelecimento; portanto, mérito à progressão). Não basta, entretanto, para conseguir a
273 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 159. 274 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 161. 275 OLIVEIRA, Álvaro Borges de. Dosimetria da pena: teoria e prática, p. 29.
83
progressão de regime, a satisfação de um dos requisitos acima elencados, necessita-se o
cumprimento de ambos276.
Cabe ressaltar que, segundo os ensinamentos de Costa Junior:
Os conceitos de mérito e demérito são fluidos e profundamente impregnados de subjetivismo. A fim de possibilitar a valoração mais concreta da personalidade do presidiário e de seu posicionamento diante de uma possível ressocialização, a Lei de Execução Penal (Lei n.º 7.210/84) criou a Comissão Técnica de Classificação, em seu art. 7º. Ela é presidida pelo diretor do estabelecimento penitenciário e integrada, no mínimo, por dois chefes de serviço, um psicológico e um assistente social277.
Portanto, bom comportamento carcerário é a conduta daquele que se põe de forma
ajustada aos regramentos de disciplina do estabelecimento prisional, cooperando para o
convívio no referido estabelecimento de cumprimento de pena.
Contudo, vale-se da lição de Andreuci:
O atestado é uma forma de comprovar a boa conduta do condenado. Caso ele se comporte de maneira adequada, terá mérito e estará subjetivamente pronto para receber eventual benefício. E, para tanto, não há mais a exigência de exame criminológico e de parecer da Comissão Técnica de Classificação para a progressão de regime, como ocorria antes da Lei n. 10.792/03, que deu nova redação ao art. 112 da LEP. Nada impede, entretanto, que o juiz da execução, se julgar necessário, determine a submissão do condenado a exame criminológico, como forma de aferir se ele reúne condições de ingressar em regime mais brando278.
Nesse diapasão assevera Mesquita Junior que “um condenado indisciplinado, que
pratica várias faltas graves, mesmo que obtenha resultado favorável no exame criminológico,
pode ter o seu pedido de progressão indeferido, em face da indisciplina”279.
Outrossim, Marcão leciona que:
A prática de falta grave revela absoluta ausência de mérito e interrompe o lapso temporal para a progressão de regime prisional, afetando o requisito objetivo. Cometida a falta grave pelo condenado no curso do cumprimento
276 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 116. 277 COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito penal objetivo: comentários atualizados, p. 85. 278 ANDREUCI, Ricardo Antonio. Execução penal, p. 76. 279 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 250.
84
da pena privativa de liberdade, inicia-se a partir de tal data a nova contagem da fração de um sexto da pena como requisito objetivo da progressão280.
Desse modo, o primeiro passo para que o apenado seja agraciado com a progressão de
regime é o cumprimento do tempo exigido pela lei. Em seguida, analisa-se o mérito do
condenado, mediante o seu bom comportamento carcerário, comprovado por meio de um
relatório carcerário, expedido pelo estabelecimento prisional. A decisão do juízo da execução
será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor,
conforme preceitua o §1º do art. 112 da LEP281.
Oportuno é o exemplo de Greco:
[...] tendo o condenado a doze anos de reclusão, cumpridos dois anos, foi-lhe concedida a progressão, uma vez que estamos partindo do princípio, em todos os casos, de que a condição subjetiva estava preenchida, ou seja, havia mérito do condenado para tanto. Agora, suponhamos que o condenado, após a sua progressão, já esteja cumprindo sua pena em regime semi-aberto. A partir de quando terá direito a uma nova progressão para o regime aberto? O cálculo relativo à sexta parte da pena cumprida deverá ser feito sobre o total da condenação ou sobre o tempo que resta a cumprir? Se fosse sobre o total da condenação, somente após dois anos é que o condenado poderia ingressar no regime aberto. Entendemos não ser essa a melhor interpretação da legislação penal. O período de dois anos, que foi considerado para efeito de progressão de regime, já é tido como tempo de pena efetivamente cumprida. Os futuros cálculos, portanto, somente poderão ser realizados sobre o tempo restante a cumprir, ou seja, dez anos. Assim, calculando-se um sexto sobre dez anos, chegaríamos à conclusão de que o condenado, depois de um ano e oito meses já teria direito a uma nova progressão282.
Veja-se o escólio de Andreuci, não obstante haja posições em sentido contrário, é
majoritário o entendimento de que, para a segunda progressão, a fração de 1/6 (um sexto)
deve ser calculada sobre o remanescente da pena. Isso porque a pena já cumprida é
considerada pena extinta283.
Salienta-se, por oportuno, que não poderá ocorrer a progressão por saltos, assim
conhecida no âmbito jurídico, objeto de análise do próximo contexto.
280 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 168. 281 GRECO, Rogério. Curso de direito penal, p. 512. 282 GRECO, Rogério. Curso de direito penal, p. 513. 283 ANDREUCI, Ricardo Antonio. Execução penal. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 75.
85
3.3.1.1 Progressão por salto
Conforme já explanado, o caráter progressivo do sistema, consistente na transferência
do regime mais rigoroso para o imediatamente menos rigoroso, veda, por raciocínio lógico, a
progressão “por saltos”, ou seja, a passagem direta do regime fechado para o aberto. Contudo,
se não houver vaga no regime semiaberto, o condenado poderá ficar no regime fechado,
pleiteando posteriormente a passagem direta para o regime aberto284.
Nesse sentido assevera Greco:
Ressalte-se que a progressão também não poderá ser realizada por “saltos”, ou seja, deverá sempre obedecer ao regime legal imediatamente seguinte ao qual o condenado vem cumprindo sua pena. Assim, não há possibilidade de, por exemplo, progredir-se diretamente do regime fechado para o regime aberto, deixando-se de lado o regime semi-aberto285.
Assim, o condenado que cumpre pena no regime fechado não pode progredir
diretamente para o regime aberto. Para obter a progressão deverá antes cumprir um sexto de
sua pena no regime semiaberto, e demonstrar à satisfação de seu mérito, preenchendo assim
os requisitos objetivo e subjetivo.
Oportunas são as palavras de Capez:
Não é permitida pela LEP, a qual exige o cumprimento de 1/6 da pena no regime anterior. Por essa razão a lei vigente torna obrigatória a passagem pelo regime intermediário (semi-aberto). Na Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal, afirma-se claramente que “se o condenado estiver no regime fechado não poderá ser transferido diretamente para o regime aberto”. Só há um caso em que a jurisprudência admite a progressão de regime com salto: quando o condenado já cumpriu 1/6 da pena no regime fechado, não consegue a passagem para o semi-aberto por falta de vaga, permanece mais 1/6 no fechado e acaba por cumprir esse 1/6 pela segunda vez. Nesse caso, entende-se que, ao cumprir o segundo 1/6 no fechado, embora tivesse de fato nesse regime, juridicamente se encontrava no semi-aberto, não se podendo alegar que houve, verdadeiramente, um salto286.
284 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral. P. 456. 285 GRECO, Rogério. Curso de direito penal, p. 513 [grafia conforme original]. 286 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral, p. 371 [grafia conforme original].
86
Nessa mesma linha de raciocínio aduz Marcão que “o condenado que cumpre pena no
regime fechado não pode progredir diretamente para o regime aberto. Para obter a progressão,
deverá, antes, cumprir um sexto de sua pena no regime semiaberto”287.
Na mesma trilha, assegura Andreuci, que não pode o condenado que cumpre pena em
regime fechado, progredir diretamente para o regime aberto e, tampouco, pode o condenado
que cumpre pena em regime semiaberto passar diretamente para a completa liberdade288.
Portanto, abordado quanto à progressão de regime, passar-se-á a explanar sobre as
autorizações de saída, outro benefício concedido aos apenados no transcorrer do cumprimento
da reprimenda.
3.3.2 Autorizações de saídas
As autorizações de saídas constituem gênero do qual são espécies a permissão de
saída, elencada nos arts. 120 e 121; e a saída temporária, disposta nos arts.122 a 125 da LEP.
Extrai-se dos ensinamentos de Marcão:
Integram o rol dos direitos dos presos e têm por escopo permitir àquele que se encontra sob o cumprimento de pena privativa de liberdade o restabelecimento gradual do contato com seus familiares fora do ambiente carcerário e o mundo exterior, com atividades que interessam à (re)estruturação de sua formação moral, ética e profissional, com mecanismos aptos a viabilizar sua (re)integração social289.
Mirabete bem explica a diferença entre permissão de saída e saída temporária.
Conforme se depreende pelo contíguo trecho:
As autorizações de saída encontram-se na categoria normal de direitos dos presos, mas constituem ora aspectos de assistência em favor de todos os presidiários, ora etapa na progressão em favor dos condenados que satisfaçam a determinados requisitos e condições. Na primeira hipótese, estão as permissões de saída, que se fundam em razões humanas (arts. 120 e 121) e na segunda as saídas temporárias, referentes à progressividade na concessão de maiores favores para incentivar melhor relacionamento do preso com o exterior (arts. 122 a 125)290.
287 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 167. 288 ANDREUCI, Ricardo Antonio. Execução penal, p. 78. 289 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 201. 290 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 504.
87
As permissões de saída das unidades prisionais requerem o preenchimento de alguns
requisitos dispostos na LEP, os quais serão abordados nos próximos itens.
3.3.2.1 Saída especial
As saídas especiais serão consentidas em ocasiões extraordinárias, as quais devem
ocorrer com escolta se o condenado estiver cumprindo pena no regime fechado ou semiaberto.
Conforme aduz Marcão:
A permissão de saída, regulada nos arts. 120 e 121 da Lei de Execução Penal, funda-se basicamente em razões humanitárias e tem por finalidade permitir aos condenados que cumprem pena em regime fechado ou semiaberto e aos presos provisórios sair do estabelecimento, mediante escolta, em caso de falecimento ou doença grave do cônjuge, companheira ou companheiro, ascendente, descendente, irmão ou irmã, ou em caso de necessidade de tratamento médico291.
Outrossim, quem cumpre pena no regime fechado ou semiaberto, ou até mesmo
provisoriamente, poderá obter permissão para sair da unidade prisional, mediante escolta,
quando falecer ou estiver gravemente enfermo, o cônjuge, companheiro(a), ascendente,
descendente ou irmão, bem como para tratamento médico. Essa permissão será concedida
pelo diretor do estabelecimento penitenciário e o sentenciado ausentar-se-á pelo tempo
necessário para cumprir a finalidade da saída292.
3.3.2.2. Saída temporária
Inicialmente, assevera Mirabete que “as saídas temporárias servem para estimular o
preso a observar boa conduta e, sobretudo, para fazer-lhe adquirir um sentido mais profundo
de sua própria responsabilidade, influindo favoravelmente sobre sua psicologia”293.
Igualmente, extrai-se dos ensinamentos de Leal:
A saída temporária do estabelecimento também é admissível para que o condenado possa visitar, periodicamente e sem vigilância direta, sua família (art. 122, I da LEP). O benefício tem por finalidade preservar o elo de união entre o preso e seus parentes próximos, pois é evidente que a família ainda
291 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 202. 292 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1041. 293 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 507.
88
representa um importante fator de condicionamento às regras de conduta estabelecidas pelo Estado e, principalmente, pelo grupo social294.
Nesse sentido, aduz Mirabete que: “a saída temporária consiste na liberdade do preso
para visitar a família, freqüentar cursos profissionalizantes, de segundo grau ou superior e
participar de atividades que concorram para o retorno ao convívio social”295.
Assim, preceitua o artigo 122 da LEP:
Art. 122. Os condenados que cumprem pena em regime semi-aberto poderão obter autorização para saída temporária do estabelecimento, sem vigilância direta, nos seguintes casos: I - visita à família; II - freqüência a curso supletivo profissionalizante, bem como de instrução do segundo grau ou superior, na comarca do Juízo da Execução; III - participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social 296.
A concessão do aludido benefício dependerá do preenchimento de requisitos objetivo
e subjetivo. Os primeiros são: estar no regime semiaberto, demonstrar a existência de motivo
ensejador do pedido e tempo de pena cumprido. Por outro lado, o requisito subjetivo é o
mérito297.
Nucci enumera os requisitos para o condenado obter a concessão da saída temporária.
Quais sejam:
Quanto à saída temporária, depende de autorização do juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a administração penitenciária, respeitados os seguintes requisitos: comportamento adequado; cumprimento mínimo de um sexto da pena, se o condenado for primário, e um quarto, se reincidente; compatibilidade do benefício com os objetivos da pena (art. 123, LEP)298.
Salienta-se que o apenado poderá obter até cinco autorizações de saída temporária a
cada ano, não podendo, cada uma delas, exceder a sete dias. Igualmente, a concessão das
saídas deve ser precedida da análise dos requisitos legais. Nesse sentido, aduz Marcão:
294 LEAL, João José. Direito penal geral, p. 405-406. 295 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 507 [grafia conforme original]. 296 BRASIL. Lei 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/ L7210.htm>. Acesso em: 10 set. 2010. 297 MESQUITA JUNIOR, Sídio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 258. 298 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1041.
89
É condenável a conduta do juízo das execuções criminais que de uma única vez, em uma só decisão, já defere o benefício de saída temporária por mais de uma vez ao longo do ano, sem se preocupar com a apreciação do mérito do preso ao tempo de cada saída. É evidente que o encarcerado poderá apresentar comportamento adequado (art. 123, I, da LEP) ao tempo da apreciação de um primeiro pedido e não contar com o mesmo requisito em tempo futuro299.
Destarte, a autorização abrange prazo não superior a sete dias, podendo ser renovada
por mais quatro vezes ao ano. Caso a saída se destine a realização do curso profissionalizante,
de segundo grau ou superior, terá o tempo necessário para o cumprimento das atividades
discentes300.
Extrai-se dos ensinamentos de Marcão que o aludido benefício será automaticamente
revogado quando o condenado praticar fato novo definido como crime doloso, for punido por
falta grave, desatender as condições impostas na autorização ou revelar baixo grau de
aproveitamento do curso301.
Destaca-se uma inovação no cumprimento das penas privativas de liberdade, no que se
refere às saídas temporárias, visto que a Lei 12.258, publicada no dia 16/06/2010, autoriza o
monitoramente dos presos beneficiados com saída temporária e prisão domiciliar, por meio da
utilização de pulseiras ou tornozeleiras eletrônicas.
Segundo dados fornecidos pelo Departamento de Administração Prisional (DEAP), no
dia 18/10/2010, cinco reclusos do Presídio Regional de Itajaí-SC, receberam as primeiras
tornozeleiras eletrônicas, que serviram de monitoramento enquanto usufruíam do benefício de
saída temporária302.
3.3.3. Livramento condicional
É a concessão de liberdade antecipada ao condenado após o cumprimento de parte da
pena, mediante determinadas condições fixadas pelo juiz, desde que o condenado preencha
certos requisitos, conforme preceitua o art. 83 do CP:
299 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 209. 300 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1041. 301 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 209. 302 BRASIL. Departamento de Administração Prisional (DEAP). Disponível em: <http://www.deap.sc.gov.br/ deap/noticia.jsp?idNoticias=245>. Acesso em: 02 nov.2010.
90
Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que: I - cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes; II - cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso; III - comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto; IV - tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração; V - cumprido mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza. Parágrafo único - Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinqüir.
No entendimento de Costa Junior, o livramento condicional integra a última etapa do
cumprimento da pena e, possibilita a liberdade antecipada do condenado. O instituto acha-se
ligado à concepção utilitária da pena e sua finalidade é a readaptação antecipada do
delinquente à comunidade. Trata-se, pois, de um direito subjetivo do apenado sempre que
presente os pressupostos objetivos e subjetivos303.
Na copiosa exposição de motivos de Marcão:
O primeiro pressuposto objetivo diz respeito à quantidade da pena imposta, já que o livramento somente poderá ser concedido ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a dois anos, como decorre do art. 83, caput,do Código Penal. As penas que correspondam a infrações diversas deverão ser somadas para efeito do livramento (art. 84 do CP)304.
Mirabete aduz que “o segundo requisito objetivo é ter o sentenciado cumprido parte da
pena ou das penas que lhe foram impostas: mais de um terço quando não é reincidente em
crime doloso ou mais da metade quando o é”305.
Por conseguinte, Marcão leciona que “o último pressuposto objetivo é a reparação do
dano causado pela infração, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo (art. 83, IV, do CP)”306.
303 COSTA JUNIOR, Paulo José da. Direito penal objetivo: comentários atualizados, p. 150. 304 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 231. 305 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 553. 306 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 234.
91
Prossegue Marcão ao destacar ainda que:
Muitas vezes o pedido de livramento é feito pelo condenado, de próprio punho; outras, por seu defensor. Seja qual for a via escolhida, o pedido deverá ser endereçado ao juiz competente para apreciação. A competência para decidir sobre o pedido de livramento condicional é do juízo da execução [...]. Antes, porém, de decidir sobre o pedido formulado, deverá o juízo providenciar o necessário visando à colheita do parecer do Ministério Público e também do defensor, conforme agora expresso no §2º do art. 112 da Lei de Execução Penal, introduzido pela Lei n. 10.792, de 1º de dezembro de 2003, estando afastada a obrigatoriedade do parecer do Conselho Penitenciário, apesar da letra expressa do art. 131 da Lei de Execução Penal307.
Assim, o livramento condicional é um benefício que a lei concede ao condenado
cumprir a reprimenda em liberdade, sendo a etapa final da pena concretizada na sentença.
Contudo, é uma liberação preparatória, mediante determinadas condições. Se algumas destas
não forem cumpridas, o livramento poderá ser revogado308.
A propósito deste assunto, relevante a lição de Rosa:
A libertação condicional diferencia-se da graça e da anistia, porque nela a pena permanece, enquanto nestas últimas a pena extingue-se. Pela própria palavra “condicional”, vê-se que o condenado, embora em liberdade, tem ainda que suportar alguns efeitos da pena, que estão representados e consubstanciados nas “condições” que lhe são impostas, na conduta que lhe é exigida309.
Assim, se ao término do período de prova do livramento condicional, o mesmo não for
revogado, conforme explicitado acima, considera-se extinta a pena privativa de liberdade
imposta ao apenado.
Salienta-se, que o aludido benefício é um direito subjetivo do condenado e não uma
faculdade do juiz Tal confusão justificou-se pela redação do art. 83 CP, que utiliza a
expressão “O juiz poderá...”. Hoje se tem claro para a maior parte da doutrina que o
livramento condicional é um direito subjetivo do condenado, desde que cumpridos os
requisitos objetivos e subjetivos que a lei exige (art. 83, Código Penal).
307 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 239-240. 308 LEAL, João José. Direito penal geral, p. 423. 309 ROSA, Antonio José Miguel Feu. Execução penal, p. 318.
92
Conforme exposto, o livramento condicional é a liberdade antecipada ao condenado à
pena privativa de liberdade. Nesse contexto, abordar-se-á no contíguo elemento sobre a
remição da pena.
3.3.4. Remição
Marcão aduz que “a palavra ‘remição’ vem de redimere, que no latim significa
reparar, compensar, ressarcir. É preciso não confundir ‘remição’ com ‘remissão’, esta,
segundo o léxico, significa a ação de perdoar” 310.
Nesta senda de raciocínio, explica Marcão:
Conforme a redação do art. 126 da Lei de Execução Penal, o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena. Para tal desiderato, a contagem do tempo será feita à razão de um dia de pena por três de trabalho, sendo que o preso impossibilitado de prosseguir no trabalho, por acidente, continuará a beneficiar-se com a remição311.
Ademais, pondera Nucci que “a obtenção da remição depende de merecimento (não ter
falta grave registrada no prontuário), cumprimento de trabalho reconhecido pela direção do
presídio e jornada mínima de seis horas diárias”312.
Outrossim, assegura Mirabete que:
A remição é um direito privativo dos condenados que estejam cumprindo pena em regime fechado ou semi-aberto, não se aplicando, assim, ao que se encontra em prisão albergue, já que a este incumbe submeter-se aos papéis sociais e ás exigências derivadas do regime, que lhe concede, objetivamente, a liberdade do trabalho contratual. Pela mesma, aliás, não se concede a remição ao liberado condicional313.
Igualmente, a jornada laborativa que assegura o direito à remição deve observar o
disposto no art. 33 da LEP, segundo o qual a jornada de trabalho não será inferior a seis, nem
superior a oito horas, com descanso nos domingos e feriados. Poderá, entretanto, ser atribuído
310 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 212. 311 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 213. 312 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1042. 313 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 518 [grafia conforme original].
93
horário especial de trabalho aos presos designados para os serviços de conservação e
manutenção do estabelecimento penal314.
Na atribuição do trabalho, diz o art. 32 da LEP que deverão ser levadas em conta a
habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem como as
oportunidades oferecidas pelo mercado. Visa-se, assim, reeducar e reinserir o preso no
mercado de trabalho, após o cumprimento da reprimenda estabelecida.
De todo modo, há que se ter a pena como uma penitência, sob essa perspectiva, a
remição tem a função de suavizar o mal ocasionado pela intervenção penal ao viabilizar a
menor duração da pena privativa de liberdade315.
Nucci expõe quanto à possibilidade de remição pelo estudo. Eis o raciocínio
formulado pelo autor:
Outro ponto importante diz respeito à possibilidade de remição pelo estudo. Segundo nos parece, deveria a lei disciplinar esse direito, de maneira clara e objetiva, fixando, inclusive, os requisitos para tanto. À falta de previsão legal, a jurisprudência brasileira dividiu-se. Alguns magistrados autorizam a remição pelo estudo, considerando-se que também é uma forma de trabalho; outra a negam, sustentando a ausência de previsão legal316.
Contudo, marcando definitivamente seu posicionamento, o Superior Tribunal de
Justiça editou a Súmula 341, que apresenta a seguinte redação: “A freqüência a curso de
ensino formal é causa de remição de parte do tempo de execução de pena sob o regime
fechado ou semiaberto”317.
A propósito, veja-se o escólio de Marcão:
Prestada a atividade laborativa pelo preso, nos termos da lei, e comprovada a carga horária regular por documento hábil, emitido pela administração do estabelecimento prisional, o pedido de declaração dos dias remidos pelo trabalho deverá ser submetido ao juízo de execuções penais, que
314 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 217-218. 315 BARROS, Carmen Silvia de Moraes. A individualização da pena na execução penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 183. 316 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1042 [grafia conforme original]. 317 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 221.
94
previamente à decisão deverá ouvir o Ministério Público. A remição só tem eficácia se for deferida por sentença judicial318.
Entretanto, Marcão aduz que “o condenado que for punido por falta grave perderá o
direito ao tempo remido, começando o novo período a partir da data da infração disciplinar. É
a regra do art. 127 da Lei de Execução Penal”319.
3.4. TRABALHO
A concepção do trabalho penitenciário seguiu os deslocamentos históricos da
experimentada conceituação da pena privativa de liberdade. Na moderna concepção
penitenciária, o momento da execução da pena contém uma finalidade de reabilitação e
reinserção social, assinalando-se, assim, o sentido pedagógico do trabalho. Entende-se hoje,
que o trabalho penitenciário é a atividade dos presos e internados, a ser realizada no
estabelecimento penal ou fora dele, com renumeração equitativa e equiparada ao das pessoas
livres, no que concerne à segurança, higiene, direitos previdenciários e sociais320.
Extrai-se dos ensinamentos de Silva:
Como o Estado não preparou até hoje estrutura para cumprimento das disposições encartadas na LEP, [...] na prática trata-se de verdadeira utopia, dentre outros, o capítulo dessa norma que cuida do trabalho do preso, de vez que não existe condições de ofertar atividade laborial num mínimo percentual das pessoas que encontram-se recolhidas nos nossos estabelecimentos prisionais321.
Nas palavras de Costa Junior sob o contexto evidencia-se que “tamanha a ênfase que,
justamente, deu o legislador penal à laborterapia que dedicou todo um artigo, o 39, à atividade
laboral do preso, como um seu direito-dever”322.
É relevante a lição de Soares:
O trabalho prisional, portanto, não pode constituir-se em algo mortificante, quase um agravante da pena, mas em um mecanismo de readaptação
318 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 223 [grafia conforme original]. 319 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 224. 320 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 91. 321 SILVA, Jorge Vicente. Manual da sentença penal condenatória, p. 23. 322 COSTA JUNIOR, Paulo José da. Curso de direito penal. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 169.
95
profissional, que inculque responsabilidades e obrigações, que combata a ociosidade e que tenha, sobretudo, um caráter pedagógico323.
Desse modo, o trabalho do apenado possui dupla finalidade: educativa e produtiva.
Assim, passar-se-á nos próximos conjuntos a elucidar sobre as duas modalidades de trabalho:
interno e externo.
3.4.1 Trabalho interno
Inicia-se com a lição de Silva, “todo condenado a pena privativa de liberdade é
obrigado a exercer atividade laborial, dentro de suas aptidões e capacidade. Esta exigência
não atinge os presos provisórios, seja qual for o título da prisão”324.
Extrai-se da lição de Mirabete que:
[...] o art. 31 da Lei de Execução Penal, além de confirmar o dever de trabalhar do preso, como já foi visto, refere-se às aptidões e capacidade do condenado, remetendo-se, evidentemente, ás condições físicas, mentais, intelectuais e profissionais do condenado325.
Quanto à jornada de trabalho, veja-se o escólio de Marcão:
A jornada normal de trabalho não será inferior a seis, nem superior a oito horas, com descanso nos domingos e feriados, podendo ser atribuído horário especial de trabalho aos presos designados para os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal (art. 33 da LEP), tais como os que desempenham atividades de “faxina, na administração, em enfermarias, etc.326.
A experiência tem demonstrado que nas penitenciárias onde os presos não exercem
qualquer atividade laborativa o índice de tentativas de fuga é muito superior aos daquelas
onde os detentos operam de forma produtiva327.
Deste modo, o trabalho do encarcerado, sem dúvida alguma, é uma das formas mais
visíveis de levar a efeito a ressocialização. Mas do que um direito, conforme já explanado, é
uma obrigação, na medida de suas aptidões e capacidade. Contudo, a LEP também prevê a 323 SOARES, Bárbara Musumeci. Prisioneiras: a vida e violência atrás das grades. Rio de Janeiro: Garamond, 2002, p. 44. 324 SILVA, Jorge Vicente. Manual da sentença penal condenatória, p. 23. 325 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 95. 326 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 61-62. 327 GRECO, Rogério. Curso de direito penal, p. 519.
96
possibilidade de realização de trabalho externo, aquele realizado fora dos estabelecimentos
prisionais, objeto de análise do próximo item.
3.4.2 Trabalho externo
O condenado que estiver cumprindo a pena em regime semiaberto está sujeito ao
trabalho em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar, admitindo-se, assim, a
atribuição do trabalho externo e a frequência a cursos profissionalizantes. Nada impede que
esse trabalho seja prestado em empresas privadas ou mesmo que tenha caráter autônomo.
Outrossim, segundo o art. 36, caput, da LEP, e art. 34, §3º, do CP, ao preso que estiver
cumprindo pena em regime fechado somente poderá ser atribuído trabalho externo em
serviços ou obras públicas, realizados por órgãos da administração direta ou indireta ou
entidades privadas, tomando-se as cautelas contra a fuga e em prol da disciplina328.
Marcão assevera que “cabe ao diretor do estabelecimento prisional autorizar, ou não,
o trabalho externo, conforme está expresso no art. 37, caput, da Lei de Execução Penal”329.
Ainda no entendimento do autor:
O trabalho externo submete-se à satisfação de dois requisitos básicos. Um subjetivo, qual seja, a disciplina e responsabilidade, que a nosso ver devem ser apuradas em exame criminológico, e outro objetivo, consistente na obrigatoriedade de que tenha o preso cumprido o mínimo de um sexto de sua pena. Não basta, assim, o atendimento a apenas um dos requisitos. A autorização está condicionada à conjugação dos requisitos subjetivo e objetivo330.
Contudo, o trabalho externo será obrigatoriamente revogado quando o apenado
praticar fato definido como crime, for punido por falta grave, ou apresentar comportamento
contrário aos requisitos estabelecidos na lei. A fuga, por exemplo, é falta grave, autorizando,
por essa razão, a revogação do benefício, além de autorizar a regressão de regime, próximo
contexto de análise.
328 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 102. 329 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 62. 330 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 62-63.
97
3.5. REGRESSÃO DE REGIME
Se de um lado faz-se necessário dotar a pena privativa de liberdade de progressão, que
viabiliza ao condenado vislumbrar a possibilidade futura de vida livre, por outro não se deve
enfraquecer a repressão social. Em caso de não se adaptar o condenado ao regime semiaberto
ou aberto, demonstrando a inexistência de sua reintegração social, fica o condenado também
sujeito à regressão331.
Marcão aduz que “assim como a progressão pressupõe a seguinte ordem: regime
fechado, regime semiaberto e regime aberto, a regressão determina a ordem inversa: regime
aberto, regime semiaberto e regime fechado”332.
Na mesma senda de raciocínio, Mirabete elucida sobre a regressão de regime:
Constitui-se esta na transferência do condenado para qualquer dos regimes mais rigorosos quando: praticar fato definido como crime doloso ou falta grave; sofrer condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena em execução, torne incabível o regime; e, na hipótese de se encontrar em regime aberto, frustrar os fins de execução ou não pagar, podendo, a multa cumulativamente imposta333.
Destarte, o não pagamento injustificado da pena de multa cumulativamente imposta
(privativa de liberdade e multa) determinava a regressão do regime aberto para o semiaberto.
Todavia, tal situação não mais persiste após o advento da Lei n.º 9.268/96. Assim, a lei passou
a considerar a multa como dívida de valor e, impediu sua conversão em pena de prisão no
caso de não pagamento, como ocorria até então334.
Outrossim, a prática de falta grave enseja a regressão do regime prisional. Assim,
Carvalho ensina que:
O cometimento de faltas graves, rompendo com os deveres de “boa conduta” impostos pela lei, implica, necessariamente, sanções. As sanções administrativas cabíveis são o isolamento, a suspensão de direitos (art. 53, III e IV c/c art. 57, parágrafo único, da LEP) e a regressão de regime (art. 118, LEP)335.
331 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 485. 332 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 193. 333 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 485-486. 334 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 197. 335 CARVALHO, Salo de. Pena e garantias. 2. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 227.
98
Silva leciona que “no caso do condenado que teve regredido seu regime face o
cometimento de novo crime, se não for ele denunciado ou se for absolvido da acusação da
prática daquele ilícito penal, terá direito a ver restabelecido o regime anterior”336.
Neste diapasão, transcreve-se da doutrina de Marcão:
A regressão de regime prisional é medida judicial de intensa gravidade que afeta os destinos da execução e revela-se extremamente danosa aos interesses do condenado. De tal sorte, antes de sua efetivação é imperioso proceder à oitiva deste, permitindo-lhe o exercício pleno de sua mais ampla defesa, observando, ainda, o contraditório constitucional. O desrespeito a tais princípios acarreta flagrante e odioso constrangimento ilegal337.
A regressão cautelar caracteriza-se pela necessidade de que o apenado retorne
imediatamente ao regime mais severo. Assim, Nucci assevera que:
Embora a lei silencie a esse respeito, entendemos perfeitamente possível que o juiz determine a regressão cautelar, isto é, suspenda o regime semi-aberto – ou aberto – até que o condenado seja ouvido e forneça suas explicações para o descumprimento das condições do regime338.
Conforme delineado, Marcão assegura que em se tratando de regressão cautelar, não
se faz necessária prévia oitiva do condenado, como determina o § 2º do art. 118 da LEP. Tal
exigência contraria a finalidade da medida e só impõe observância em se tratando de
regressão definitiva339.
Apresentados os regimes de cumprimento das penas privativas de liberdade, assim
como os benefícios que contornam sua execução. No próximo capítulo passar-se-á a elucidar
os estabelecimentos prisionais catarinenses, a fim de abordar sua estrutura e capacitação ante
as disposições legais.
336 SILVA, Jorge Vicente. Manual da sentença penal condenatória, p. 41. 337 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 198. 338 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1038 [ grafia conforme original]. 339 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 200.
4 DO CUMPRIMENTO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE NO
BRASIL E A REALIDADE DO SISTEMA PRISIONAL EM SANTA
CATARINA
Por fim, neste capítulo far-se-á a análise dos estabelecimentos de cumprimento das
penas privativas de liberdade no Estado de Santa Catarina, foco da presente pesquisa. Para
tanto, esta pesquisa buscará demonstrar a existência, ou não, de atos que atentam contra a
tutela dos direitos da personalidade daqueles que cumprem pena nos estabelecimentos
penitenciários catarinenses.
Com o aumento da população carcerária, em razão do crescimento da violência e da
criminalidade, consequentemente atribuem-se penas mais severas, acarretando, assim, um
encarceramento imprevisível, dificultando a preservação dos direitos mínimos de dignidade
humana.
Com isso, surgem as prisões em massa, nas quais atos abusivos acabavam sendo
cometidos em nome da falsa ideia de domínio da criminalidade, cujo objetivo é afugentado
para gerar uma percepção de segurança pública.
4.1 PREVISÃO LEGAL
A população carcerária do Brasil está distribuída em diferentes estabelecimentos
prisionais de várias categorias. A LEP propõe que as várias categorias de estabelecimentos
sejam qualificadas por suas especificidades, abrigando tipos diversificados de presos. Na
prática, no entanto, tais categorias são muito flexíveis e o intercâmbio de presos entre os
múltiplos estabelecimentos não segue o que determina a lei.
Marcão preleciona que: “destinam-se os estabelecimentos penais ao condenado, ao
submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso”340.
340 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 126.
100
A LEP preocupou-se com a classificação dos estabelecimentos penais partindo da
necessidade de separação dos indivíduos quanto aos regimes de cumprimento da pena. Quais
sejam:
a) Penitenciária; b) Colônia agrícola, industrial ou similar; c) Casa de albergado; d) Centro de observação; e) Hospital de custódia e tratamento psiquiátrico; f) Cadeia pública.
Os estabelecimentos penais compreendem: 1º) a penitenciária, destinada ao condenado
à reclusão, a ser cumprida em regime fechado; 2º) a colônia agrícola, industrial ou similar,
reservada para a execução da pena de reclusão ou detenção em regime semiaberto; 3º) a casa
de albergado, prevista para acolher os condenados à pena privativa de liberdade em regime
aberto e à pena de limitação de fim de semana; 4º) o centro de observação, no qual serão
realizados os exames gerais e criminológicos; 5º) o hospital de custódia e tratamento
psiquiátrico, que se reserva aos doentes mentais, aos portadores de desenvolvimento mental
incompleto ou retardado e aos que manifestam perturbação das faculdades mentais; e 6º) a
cadeia pública, para onde devem ser remetidos os presos provisórios (prisão em flagrante,
prisão temporária, prisão preventiva ou em razão da pronúncia) e, por fim, os condenados
enquanto não transitar em julgado a sentença341.
Quanto aos estabelecimentos de cumprimento de penas previstos na LEP, extrai-se das
lições de Nucci:
São os lugares apropriados para o cumprimento da pena nos regimes fechado, semi-aberto e aberto, bem como para as medidas de segurança. Servem, ainda, exigindo-se a devida separação, para abrigar os presos provisórios. Mulheres e maiores de sessenta anos devem ter locais especiais. Conforme a destinação, o estabelecimento deve contar com áreas e serviços à assistência, educação, trabalho, recreação e prática esportiva dos presos. Os que forem destinados às mulheres terão, ainda, berçário, onde elas poderão amamentar seus filhos342.
Outrossim, a LEP prevê a existência de vários estabelecimentos para cumprimento das
sanções penais. Não obstante isso, a execução das sanções penais dá-se em locais
341 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 127 [grafia conforme original]. 342 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1032 [grafia conforme original].
101
inadequados, visto que não existem vagas disponíveis nos presídios, nem hospitais
psiquiátricos, sendo que o grande discurso governamental encontra amparo no elevado custo
da arquitetura prisional343.
A seguir, abordar-se-á sobre a arquitetura e estrutura prisional, para, enfim, adentrar
no cumprimento das penas privativas de liberdade.
4.1.1 Arquitetura prisional
Quando a prisão se destinava apenas ao homem que se encontrava aguardando a
instrução criminal ou a execução da pena, os locais para isso destinados exigiam apenas
características que lhes dessem condições de servirem à finalidade única do recolhimento, ou
seja, a de impedir que o preso fugisse. À medida que esses prelúdios cautelares foram
evoluindo e a privação da liberdade passou a ser adotada como pena surgiu à preocupação
com os locais apropriados para essa nova finalidade344.
Nesse sentido, assevera Mirabete:
Assim que a sanção privativa de liberdade passou a ser mais freqüentemente cominada e aplicada, juntou-se a tal preocupação a evolução das idéias a respeito do crime, do criminoso, da pena e da justiça penal, obrigando à reflexão a respeito da arquitetura das prisões, quer das destinadas às prisões cautelares, quer das que passaram a ter como finalidade a execução de tal sanção345.
O cumprimento das penas privativas de liberdade nesses estabelecimentos faz com que
os condenados vivenciem condições precárias, habitando praticamente em um submundo.
Neste diapasão, Guberev aduz que:
Uma muralha separa dois mundos distintos: um mundo é esse onde vivemos, composto de riqueza ou pobreza; trabalho ou desemprego; família ou solidão; amigos ou isolamento; casa ou desabrigo; alegria, tristeza e violência urbana; leis, reprimendas e sanções penais para os que cometem infrações às regras sociais, remetendo-os, assim, para outro mundo, melhor dizendo, o submundo – constituído por crime, dor, morte, maldade, erro,
343 MESQUITA JUNIOR, Sídio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 202. 344 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 249. 345 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 249 [grafia conforme original].
102
violência, sangue, promiscuidade, desprezo e desrespeito, dentre outras mazelas que perfazem o perfil de um presídio346.
Sabe-se que a prisão em vez de frear a delinquência, parece estimulá-la, convertendo-
se em instrumento que oportuniza toda espécie de desumanidade. Não traz benefícios ao
apenado; ao contrário, possibilita toda sorte de vícios e degradações, passando por todas as
instâncias do poder, desde o agente policial aos homens do cárcere347.
Oliveira enfatiza que ”a privação da liberdade é o pior dos sofrimentos que se pode
impor ao ser humano. O rompimento compulsório com a família, principalmente com os
filhos, com o recinto e a privacidade do lar, via de regra é o mais difícil de suportar”348.
Nesse sentido, Gomes expõe a revolta ante as condições subumanas em que se cumpre
pena no Brasil. Nas seguintes palavras:
Num país de tradição hierarquizada (de capitanias hereditárias, atrasado), o presídio (que só recolhe gente das subclasses, os “desqualificados”) é a última coisa com que sua camada dirigente “estamental, escravagista, colonial, senzaleira e tendencialmente corrupta” vai se preocupar. Afinal, não estamos falando de gente (cidadãos com direitos), e sim, de coisas, que ostentam hoje condições piores que no tempo da escravidão. Pelo menos naquela época havia preocupação com a mão-de-obra que o escravo prestava349.
Quanto ao efeito negativo que um estabelecimento prisional produz tanto para a
sociedade quanto ao condenado, Guberev assevera que:
A prisão é punitiva, pois isola, castiga, limita. Entretanto a expectativa reformativa não passa de uma meta em nível verbal. As prisões, em geral, possuem condições deploráveis de vida, em função da falta de estrutura, condições precárias de higiene, superlotação carcerária, etc. A prisão desmoraliza, embrutece, avilta, corrompe o ser humano que convive no submundo ao qual passa a pertencer. O efeito negativo e criminóico que um estabelecimento penal produz no homem que nele habita é imbatível. Geralmente um delinqüente quando inicia sua estadia em um presídio possui
346 GUBEREV, Natália. Prisão: as mazelas do cárcere. Revista cearense independente do Ministério Público. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora ABC, 2005, p.197-207. 347 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas alternativas, p. 153-154. 348 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p. 78. 349 GOMES, Luiz Flávio. Nossa barbárie prisional: Brasil rumo ao troféu mundial da violência e da corrupção. Revista IOB de direito penal e processual penal. v. 9, n. 50, Porto Alegre: Síntese, 2008, p. 214-216.
103
certa “bagagem” no que concerne a conhecimentos e experiência no crime350.
Assim, entende-se que para alcançar um novo e necessário modelo de unidade
prisional que integre o homem à ressocialização e faça desta integração um fator de
humanização, faz-se necessário antes de tudo vontade política e planejamento a médio e longo
prazo, posto que a violação de normas de arquitetura e construção prisional, para uma solução
imediata de vagas, é no mínimo uma saída superficial para um problema histórico, estrutural e
tão profundo351.
Não é diversa a apreciação de Karam ao tratar das dificuldades decorrentes da
privação da liberdade:
Às dores inerentes à privação da liberdade somam-se dores físicas provocadas pela falta de ar, de sol, de luz, pela promiscuidade dos alojamentos, pela precariedade das condições sanitárias, pela falta de higiene, pela alimentação muitas vezes deteriorada, o que resulta na propagação de doenças, especialmente doenças transmissíveis que atingem os presos em proporções muito superiores aos índices registrados na população em geral352.
Portanto, a falta de estrutura das unidades prisionais no Brasil, faz com que as penas
não sejam cumpridas conforme dispõe a LEP, tendo em vista que os presos são submetidos a
condições subumanas no transcorrer do cumprimento da reprimenda. Dessa forma, no
próximo contexto far-se-á uma análise das disposições quanto à separação dos presos e a
realidade vivenciada nos estabelecimentos penitenciários catarinenses.
4.1.2 Separação dos presos
A separação por categorias de encarcerados acata as regras mínimas para o tratamento
de reclusos, adotadas em 31 de agosto de 1955 pelo primeiro congresso das nações unidas
para a prevenção do crime e o tratamento dos delinquentes, conforme estabelecem seus
preceitos de aplicação geral, na qual se dispõe que, “as diferentes categorias de reclusos
devem ser mantidas em estabelecimentos penitenciários separados ou em diferentes zonas de
350 GUBEREV, Natália. Prisão: as mazelas do cárcere, p. 197-207 [grafia conforme original]. 351 SANTOS, Pedro Sérgio dos. Prisão: terra, trabalho e humanização. Revista do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. n. 21. Brasília: Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, 2008, p.145-149. 352 KARAM, Maria Lucia. A violenta, danosa e dolorosa realização do poder punitivo: considerações sobre a pena. In:MATTOS, Virgílio de. (Org.). Desconstrução das práticas jurídicas, p. 19.
104
um mesmo estabelecimento penitenciário, tendo em consideração o respectivo sexo e idade,
antecedentes penais, razão da detenção e medidas necessárias a aplicar”353.
Dessa forma, preceitua o art. 84 da LEP:
Art. 84. O preso provisório ficará separado do condenado por sentença transitada em julgado. § 1° O preso primário cumprirá pena em seção distinta daquela reservada para os reincidentes. § 2° O preso que, ao tempo do fato, era funcionário da Administração da Justiça Criminal ficará em dependência separada.
Marcão preleciona que os estabelecimentos penais devem ser dotados de
compartimentos distintos para as desiguais categorias de reclusos, de maneira que os presos
provisórios permaneçam separados dos condenados definitivos e os presos primários sejam
conservados em seção distinta da reservada aos reincidentes. Destarte, presos provisórios são
aqueles recolhidos no estabelecimento prisional em razão de prisão em flagrante, prisão
preventiva, prisão resultante de pronúncia, prisão decorrente de sentença penal condenatória
recorrível ou prisão temporária. Enquanto que presos definitivos são aqueles que contam em
seu desfavor com sentença penal condenatória transitada em julgado da qual já não caiba
recurso354.
No tocante ao tema, Nucci leciona que:
Determina a lei que os presos provisórios fiquem separados dos condenados definitivos e, dentre estes, deve haver divisão entre primários e reincidentes. Registremos que, se cumprida à risca a lei, muito da alegada contaminação existente entre os condenados deixaria de existir, afinal, primários não podem conviver com reincidentes, já que estes possuem maior dificuldade de recuperação355.
Assim, a LEP impõe a separação entre o preso primário e o preso reincidente, pois
aquele que delinquiu pela primeira vez, eventualmente em uma circunstância excepcional,
apresenta melhores condições para responder ao processo de reabilitação social do que o
reincidente, muitas vezes criminoso habitual e, por sua vida marcadamente anti-social, mais
refratário à readaptação aspirada com a execução da pena356.
353 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 127. 354 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 130. 355 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1032. 356 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 254.
105
Contudo, cabíveis são os ensinamentos de Adolfo:
Um país sem vagas suficientes para os condenados a cumprir pena no regime fechado e semi-aberto, sem condições de cumprir nada mais nada menos que quase 300 mil mandados de prisão – sem considerar prisões preventivas e temporárias – pretende que primários sejam colocados em espaços diferentes dos reincidentes, que sexagenários sejam separados dos demais e que tenham cuidados especiais, e que preso provisório seja separado do condenado com sentença transitada. Os dispositivos demonstram a hipocrisia de um sistema que, sem conseguir se arrastar, pretende voar357.
Infelizmente, ante a falta de estrutura e investimento do Estado nas unidades
prisionais, a separação dos presos preceituada pela LEP não é cumprida neste país, tampouco,
no Estado de Santa Catarina, fazendo com que um indivíduo recolhido em uma cadeia pública
acusado da prática de um furto de uma bicicleta, sem que tenha sido julgado, cumpra pena, na
mesma cela em que se encontra recolhido um apenado, que já foi condenado com sentença
transitada em julgado pela prática de um homicídio, um latrocínio, ou ainda – muito habitual
nos estabelecimentos penitenciários – um traficante.
Neste diapasão, aduz Guberev:
A situação das prisões no Brasil é, portanto, preocupante. As prisões de todos os Estados da federação encontram-se superlotadas, onde são enclausurados milhares de pessoas, desprovidas de assistência, sem separação alguma entre elas, no que concerne ao tipo de crime cometido, proporcionando, assim, o contato próximo entre aquele que cometeu eventualmente um crime com um indivíduo de alta periculosidade358.
Dessa forma, torna-se quase impossível que a cadeia recupere o condenado, visto que
esta se torna uma verdadeira escola para o crime, fazendo com que cada vez mais aumente a
massa carcerária, perfazendo essa situação lamentável vista hoje em todo o país.
4.1.3 Estabelecimentos para mulheres e maiores de 60 anos de idade
A mulher apresenta os mesmos princípios morais que os homens e, por isso, podem
ser aplicadas às mulheres presas todas as regras que são adequadas para corrigir os
357 ADOLFO, Lúcio. Execução penal e sua aplicação: o preso e seus direitos: modelos e quadros de procedimentos. Belo Horizonte: Líder, 2003, p. 53 [grafia conforme original]. 358 GUBEREV, Natália. Prisão: as mazelas do cárcere, p. 197-207.
106
condenados. Entretanto, comum é a afirmação de que a fraqueza física e a superior
afetividade da mulher explicam as atenuações que lhe são concedidas no regime de penas359.
Nesse sentido, ensina Mirabete:
A Ciência Penitenciária tem sustentado sempre que as prisões de mulheres devem ser separadas daquelas destinadas aos homens, pois a presença daquelas exacerba o sentimento genésico dos sentenciados, aumentando-lhes o martírio da forçada abstinência360.
No tocante à separação, Capez ensina que:
[...] devem as mulheres ser alojadas em estabelecimentos adequados às suas condições pessoais. Nesse sentido, estatui o art. 5º, XLVIII que, a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e sexo do apenado361.
Ao se referir a estabelecimento “adequado à sua condição pessoal”, conforme já
mencionado, determina a lei que devem ser levados em consideração o sexo, as condições
fisiológicas e psicológicas da mulher.
4.1.4 Capacidade das prisões
No sentido de disciplinar a lotação dos estabelecimentos penais, a LEP enfatiza:
Art. 85. O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade. Parágrafo Único. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária determinará o limite máximo de capacidade do estabelecimento, atendendo a sua natureza e peculiaridades.
Como já se adiantou, a lotação do presídio deve ser compatível com sua estrutura e
finalidade. Esse é outro ponto extremamente falho no sistema carcerário brasileiro. Se não
houver investimento efetivo para acrescer o número de vagas, respeitadas as condições
dispostas na LEP para os distintos regimes de cumprimento de pena, nada de útil poder-se-á
esperar do processo de recuperação do condenado. Na verdade, quando o presídio encontra-se
359 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 251. 360 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 251. 361 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal, p. 72.
107
superlotado, a ressocialização torna-se muito mais difícil, condicionado quase que
exclusivamente de boa vontade individual de cada sentenciado362.
A busca desenfreada por novas vagas no sistema prisional, sem a devida reflexão
sobre os reais motivos geradores de tais necessidades, suscita, no mínimo, um ciclo vicioso,
pois se busca prender e punir mais e, assim, tem-se na verdade, homens menos capazes de
viver em sociedade363.
4.1.5 Execução da pena em outro Estado
A priori, a pena deve ser executada na comarca na qual o delito se consumou, quer
porque foi a sociedade respectiva a afrontada pelo ilícito, quer porque essa é uma regra de
competência jurisdicional. Em termos de ideal penitenciário, porém, o preso deve cumprir a
pena em seu meio social, ou seja, em sua cidade ou Estado, mesmo que tenha cometido o
delito em localidade diversa. Só assim poderá permanecer em relação constante com sua
família e seus amigos, através de visitas e saídas temporárias364.
Nesse contexto, leciona Silva: “a princípio, a pena deve ser executada na localidade
onde fora cometido o crime e processada a ação penal respectiva, tendo em vista o objetivo da
prevenção geral que deve ser buscado com a pena e sua execução”365.
Ademais, ensina Mesquita Junior:
A família é muito importante para a reintegração social do condenado [...] assim, o condenado poderá ser transferido para o cumprimento da pena em outro estabelecimento penal, podendo, inclusive, cumprir a pena em outro Estado da Federação. Essa é a regra ideal na execução penal, pois só assim a execução estará mais próxima dos seus fins sociais366.
Assim, permanecer o condenado em unidade prisional do Estado com a qual não
possui qualquer vínculo pode frustrar a terapêutica pena de reinserção social, pela previsível
inadaptação ou eventual embaraço à correta execução da pena367.
362 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1032. 363 SANTOS, Pedro Sérgio dos. Prisão: terra, trabalho e humanização, p. 145-149. 364 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p.258. 365 SILVA, Haroldo Caetano da. Execução penal: com as inovações da Lei n.º 10.792, de 1º de dezembro de 2003. Porto Alegre: Magister, 2006, p. 212 366 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 190. 367 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p.258.
108
Ainda nesse contexto, no próximo elemento far-se-á a análise da competência para a
remoção dos presos, inclusive da execução da pena em outro Estado da federação.
4.1.6 Competência para a remoção
Iniciada a execução da pena pode surgir a necessidade ou conveniência de
transferência do preso para outra comarca ou mesmo outro Estado da federação. É o caso do
condenado que, por exemplo, cumprindo pena no Presídio Regional de Tijucas, apresenta
interesse em transferir-se para o Presídio de Biguaçu, porquanto, neste município residem
seus familiares, consequentemente conteria melhor assistência familiar368.
Desta forma, preceitua o art. 86 da LEP:
Art. 86. As penas privativas de liberdade aplicadas pela Justiça de uma Unidade Federativa podem ser executadas em outra unidade, em estabelecimento local ou da União. § 1o A União Federal poderá construir estabelecimento penal em local distante da condenação para recolher os condenados, quando a medida se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio condenado. § 2° Conforme a natureza do estabelecimento, nele poderão trabalhar os liberados ou egressos que se dediquem a obras públicas ou ao aproveitamento de terras ociosas. § 3o Caberá ao juiz competente, a requerimento da autoridade administrativa definir o estabelecimento prisional adequado para abrigar o preso provisório ou condenado, em atenção ao regime e aos requisitos estabelecidos369.
Assim sendo, a remoção de condenados e internados faz jus a destaque, porquanto são
inúmeros os problemas que se apresentam em razão da referida competência do juiz da
execução, eis que, a execução decorre de atividade multidisciplinar, envolvendo não somente
o Judiciário, mas também o poder executivo. Com efeito, o juiz autorizará a remoção de
presos, mas quem programará tal decisão será a autoridade administrativa, sendo que a
escassez de recursos torna, em muitos casos, a autorização judicial inócua370.
Nesta senda de raciocínio, é assente Mirabete que:
Segundo o art. 66, V, g e h, compete ao juiz da execução determinar o cumprimento de pena ou medida de segurança em outra comarca e a
368 SILVA, Haroldo Caetano da. Execução penal: com as inovações da Lei n.º 10.792, de 1º de dezembro de 2003, p. 211. 369 BRASIL. Lei 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/ L7210.htm>. Acesso em: 10 set. 2010. 370 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 190.
109
remoção do condenado na hipótese prevista no §1º do art. 86 da Lei de Execução Penal. Nos termos do § 3º do art. 86, acrescentado pela Lei n.º 10.792, de 1º-12-2003, caberá ao juiz competente, a requerimento da autoridade administrativa, definir o estabelecimento prisional adequado para abrigar o preso provisório ou condenado, em atenção ao regime e aos requisitos estabelecidos371.
A determinação de remoção definitiva do condenado para cumprimento de pena
privativa de liberdade em outra comarca ou outro Estado constitui decisão jurisdicional.
Igualmente, como a transferência em caráter definitivo acarreta a alteração de competência
para a execução, que passa a ser do juiz de outro Estado da federação, ou de outra comarca, é
imprescindível que seja acolhida a prévia anuência do juízo para o qual será realizada a
remoção372.
Ademais, considerando que já foram aclarados neste item sobre as peculiaridades da
execução da pena, no próximo contexto, faz-se necessário abordar os seus estabelecimentos
de cumprimentos.
4.2 ESTABELECIMENTOS PENAIS
Atualmente o sistema prisional brasileiro é regido pela LEP, que prevê a forma de
execução da pena. A LEP elenca a divisão do sistema prisional em razão do regime de
cumprimento das penas.
Nesse sentido, preleciona Kloch, “os estabelecimentos penais destinam-se a alojar
pessoas presas, sejam segregados provisórios ou condenados, inclusive aqueles que estejam
submetidos à medida de segurança”373.
Considerando que os estabelecimentos prisionais encontram-se repletos de seres
humanos, e que estes necessitam de condições físicas e de ambientes adequados para sua
sobrevivência, as unidades prisionais necessitam de estruturas carcerárias a fim de possibilitar
o efetivo cumprimento das penas privativas de liberdade.
Assim, nos contíguos itens, passar-se-á a elucidar as peculiaridades de cada um dos
estabelecimentos de cumprimento das penas. Iniciando-se pelas penitenciárias.
371 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p.264. 372 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p.264. 373 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 42.
110
4.2.1 Penitenciária
A prisão celular recebeu sua primeira aplicação nas prisões eclesiásticas. Nesse
sentido, como os reclusos ficavam sujeitos a penitências, para pagarem seus pecados e
buscarem a salvação da alma surgiu, nesse período, a denominação penitenciária, pelo qual
essas prisões passaram a ser designadas374.
Contudo, Mesquita Junior sugere a alteração da denominação penitenciária, como
assim coloca:
Não gostamos da denominação penitenciária, visto que a mesma relembra a palavra penitência, ou seja, significa a aflição, o tormento, decorrente da falta. O ideal seria a mudança da denominação, ou, mesmo que mantida, alterada a realidade, para que o estabelecimento não mais importasse em local de sofrimento, mas de recuperação, de reeducação, dando maior ênfase ao aspecto preventivo da sanção penal375.
Costa preleciona que a penitenciária é um presídio especial onde os presos condenados
são recolhidos e o Estado, por sua vez, submete-os à ação de suas leis punitivas, buscando
recuperá-los como cidadãos, para viver em sociedade376.
Na concepção de Capez, as penitenciárias destinam-se aos criminosos apenados com
pena privativa de liberdade em regime fechado. Igualmente, são encaminhados ao regime
fechado, obrigatoriamente, os condenados à pena de reclusão superior a 8 (oito) anos e o
condenado reincidente, qualquer que seja o montante de pena de reclusão aplicada377.
Andreuci preleciona que “daí decorre que é irregular o eventual cumprimento de pena
privativa de liberdade, nos regimes semi-aberto ou aberto, em penitenciária, já que se
destinada ao regime fechado”378.
No mesmo norte, Costa destaca que:
As penitenciárias são locais destinados aos presos que já foram condenados, por sentença através de julgamento, a cumprir um afastamento da sociedade
374 ROSA, Antonio José Miguel Feu. Execução penal, p. 215. 375 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 203-204. 376 COSTA, Alexandre Marino. O trabalho prisional e a reintegração social do detento. Florianópolis: Insular, 1999, p. 15. 377 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 73. 378 ANDREUCI, Ricardo Antonio. Execução penal. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 62.
111
por determinado tempo. As penitenciárias obedecerão aos regimes de segurança a serem estabelecidas pelo sistema estadual, podendo ser de segurança média ou máxima379.
Conforme já explanado, as penitenciárias apresentam subdivisões, quais sejam: a)
penitenciárias de segurança máxima especial: estabelecimentos penais reservados a abrigar
pessoas presas com condenação em regime fechado, dotados unicamente de celas individuais.
O condenado será alojado em cela individual, conhecida como unidade celular; b)
penitenciárias de segurança média ou máxima: estabelecimentos penais destinados a abrigar
pessoas presas com condenação em regime fechado, dotados de celas individuais e coletivas;
e c) penitenciárias femininas: são estabelecimentos que abrigam mulheres presas condenadas
ao regime fechado, cujo desígnio primário é separar dos condenados masculinos380.
Por conseguinte, Mirabete leciona quanto à localização das penitenciárias, sendo que a
mesma deve almejar sempre a segurança da coletividade:
Por razões de segurança, determina-se que a penitenciária de homens seja construída em local afastado do centro urbano. A possibilidade de motins e fugas assim exige para a segurança da comunidade, que, de outra forma, estaria envolvida em acontecimentos passíveis de causar-lhes sérios perigos. Entretanto, a localização do estabelecimento não deve restringir a possibilidade de visitação aos presos, que é fundamental no processo de sua reinserção social381.
Extrai-se dos ensinamentos de Capez que “nas penitenciárias devem ser asseguradas
as garantias mínimas de salubridade do ambiente e área física de cada aposento (seis metros
quadrados por unidade individual)”382
Nesse sentido, expõe Marcão:
De inteiro teor programático o art. 87 da lei estabelece que o condenado, no cumprimento de sua pena no regime fechado, será alojado em cela individual, que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório, devendo ser observados como requisitos básicos de cada unidade celular a salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação
379 COSTA, Alexandre Marino. O trabalho prisional e a reintegração social do detento, p. 22. 380 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 43. 381 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p.272. 382 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 72.
112
e condicionamento térmico adequado à existência humana, além de área mínima de seis metros quadrados383.
Para Thompson, a característica mais marcante da penitenciária, olhada como um
sistema social, é que ela representa uma tentativa para a criação e manutenção de um
grupamento humano submetido a um regime de controle total, ou quase total. As regulações
minuciosas, estendendo-se a toda a área da vida individual, a vigilância constante, a
centralização de poder nas mãos de uns poucos, tudo isso concorre para coligar o regime
prisional como um regime totalitário384.
Assim, visto o sistema penitenciário que trata do cumprimento da pena privativa de
liberdade em regime fechado, faz-se necessário aclarar sobre as colônias agrícolas, industriais
ou similares, estabelecimento em que cumprem pena os condenados em regime semiaberto.
4.2.2 Colônia agrícola e industrial
Destina-se ao cumprimento de pena em regime semiaberto. Nesse estabelecimento
deverá existir uma relativa liberdade para os presos, sendo a vigilância moderada, com os
muros mais baixos. Leva-se em consideração a responsabilidade do condenado em face do
cumprimento da reprimenda385
Oportunas são as palavras de Mirabete:
Há condenados que, em razão de sua personalidade e do tipo de delito cometido ou pena aplicada, só não fogem da prisão diante do aparato físico da arquitetura e da vigilância constante sobre eles exercida; há outros que, com a aceitação da sentença condenatória e da pena aplicada, submetem-se à disciplina do estabelecimento, sem conflitos e sem intentar fuga. Assim, ao lado dos estabelecimentos penais com condições de manter a disciplina e evitar a fuga, são guiados por seu senso de responsabilidade e estão aptos a descontar a pena em regime aberto. Todavia, há condenados que, embora convencidos de que devem observar a disciplina e não empreender a fuga, com certo senso de responsabilidade, não tem o suficiente autodomínio para se submeter ao regime aberto386.
383 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 135. 384 THOMPSON, Augusto. A questão penitenciária. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 22. 385 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 73. 386 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 272.
113
Dessa forma, surgiu o estabelecimento de cumprimento da pena em regime
semiaberto, destinado a receber o preso em sua transição do regime fechado para o aberto ou
livramento condicional.
Marcão preleciona que serão recolhidos em estabelecimentos destinados ao
cumprimento de pena na modalidade semiaberta os condenados oriundos, por progressão, do
regime fechado, cumprindo assim uma função de transição, daí a denominação de regime
intermediário, bem como aqueles a quem se impôs, desde o início, o cumprimento de pena
privativa de liberdade na modalidade semiaberta, em atenção os preceitos dos arts. 33 e 59 do
CP. Acrescente-se que também devem cumprir sua reprimenda no regime semiaberto os
condenados ao regime aberto que obtiverem regressão.
Mirabete aduz que:
A par do inegável avanço com o sistema de prisão semi-aberta, notaram-se nele alguns inconvenientes, entre os quais o de estarem os estabelecimentos situados na zona rural e serem destinados ao trabalho agrícola, situações a que não se adaptavam os condenados das cidades. Contornando tal dificuldade idealizou-se um sistema misto, com setores industriais nas prisões semi-abertas ou mesmo com a instalação de colônias industriais. Em razão disso, a lei de execução destina esses condenados a cumprir a pena em regime semi-aberto às colônias agrícola, industrial ou similar (entre esta a agroindustrial)387.
O Brasil não dispõe de muitas colônias agrícolas e industriais razoáveis nas quais se
destinam ao cumprimento da pena privativa de liberdade no regime semiaberto. A maioria das
colônias agrícolas é verdadeira adaptação que não pode acolher a um grande número de
condenados. Igualmente, a atividade profissional rural para os condenados procedentes dos
centros urbanos não apresenta qualquer benefício prático, visto que eles retornaram para
locais em que não poderão exercitar a atividade laboral desenvolvida388.
Nucci, por conseguinte, ensina que a colônia penal agrícola, industrial ou similar
destina-se ao cumprimento das penas privativas de liberdade no regime semiaberto.
Igualmente, os alojamentos serão coletivos, mas sempre com salubridade e evitando-se a
superlotação389.
387 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 274 [grafia conforme original]. 388 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 204. 389 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1033.
114
Não obstante a literalidade do texto, é notória a falência do regime semiaberto, que
pode ser identificada por distintos fatores, conforme preleciona Marcão:
Em primeiro lugar, e destacadamente, exsurge a absoluta ausência de estabelecimentos em número suficiente para o atendimento da clientela. Diariamente, milhares de condenados recebem pena a ser cumprida no regime inicial semiaberto. Entretanto, em sede de execução, imperando a ausência de vagas em estabelecimento adequado, a alternativa tem sido determinar que se aguarde vaga recolhido em estabelecimento destinado ao regime fechado, em absoluta distorção aos ditames da Lei de Execução Penal. Não raras vezes a pena deveria ser cumprida desde o início no regime intermediário acaba sendo cumprida quase que integralmente no regime fechado. Quando não, o executado aguarda vaga para o sistema semiaberto na cadeia pública, e, por interpretação equivocada de alguns juízes e promotores que atuam na execução penal, acabam por não usufruir de direitos outorgados aos presos que cumprem pena no regime semiaberto, como ocorre, por exemplo, nas hipóteses de saídas temporárias (art. 22 da LEP)390.
Ainda no entendimento do autor: “em segundo lugar, merece destaque o fato de que o
cumprimento de pena no regime semiaberto não tem apresentado qualquer resultado prático
positivo, notadamente no campo da ressocialização”391.
Nota-se que o cumprimento das reprimendas no regime semiaberto, constitui-se em
uma sucessiva violação de normas, em face da estrutura ministrada pelo Estado.
Por conseguinte, abordar-se-á sobre as casas de albergado, estabelecimento no qual
cumprem pena os condenados ao regime aberto, bem como a pena restritiva de direitos
consistente em limitação de fim de semana.
4.2.3 Casa de albergado
Conforme já se adiantou, o estabelecimento supracitado destina-se à execução da pena
privativa de liberdade em regime aberto, assim como a pena restritiva de direitos, consistente
em limitação de fim de semana.
390 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 137.138. 391 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 138.
115
Nesse sentido, leciona Capez: “tem por finalidade receber aqueles presos que guardam
uma atitude consciente de aceitação da sentença condenatória e da pena cominada,
submetendo-se à disciplina do estabelecimento penal pacificamente, sem intento de fuga”392.
A fim de aclarar sobre as regras do regime aberto o CP preceitua:
Art. 36 - O regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado. § 1º - O condenado deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, freqüentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga. § 2º - O condenado será transferido do regime aberto, se praticar fato definido como crime doloso, se frustrar os fins da execução ou se, podendo, não pagar a multa cumulativamente aplicada.
Quanto à localização das casas de albergados, Nucci ensina que o prédio deverá situar-
se em centros urbanos, diferentemente das colônias agrícolas que devem localizar-se em
zonas rurais. Nas seguintes palavras:
O prédio deverá situar-se em centro urbano, separado dos demais estabelecimentos sem obstáculos físicos impeditivos de fuga. A medida é correta, uma vez que, não só o albergado fica fora o dia todo, trabalhando, como também o regime conta com sua autodisciplina e senso de responsabilidade (art. 36, CP)393.
Contudo, como já se sabe, a quase absoluta ausência de estabelecimentos penais do
gênero tem impossibilitado, por inteiro, o cumprimento de tais penas conforme o desejo da
LEP, já que passam a ser cumpridas, ambas – privativa de liberdade no regime aberto e
limitação de fim de semana –, em regime domiciliar, ao arrepio da lei, porém, no mais das
vezes, sem outra alternativa para os juízes e promotores que operam com a execução penal394.
Tece oportuna consideração Muakad:
A prisão aberta [...] oferece aos presos condições de sociabilidade, uma vez que permite liberdade de movimentos, não o afastando de vez de tudo o que cercava antes da condenação. Na prisão aberta o comportamento do indivíduo é testado em liberdade, pois somente em liberdade ele poderá mostrar que saberá, depois, fazer uso dela395.
392 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 74. 393 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1033. 394 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 140. 395 MUAKAD, Irene Batista. Prisão albergue. São Paulo: Cortez, 1984, p. 76.
116
Mesquita Junior ensina que a casa de albergado apresenta uma estrutura simples e de
baixo custo, visto que a mesma caracteriza-se pela existência de grandes alojamentos, na qual
os condenados só se recolhem nos períodos de folga. Assim, não existindo uma estrutura de
segurança máxima, sua construção é muito mais barata, mas, curiosamente, são raras as casas
de albergado construídas no país396.
4.2.4 Centro de observação
Na concepção de Kloch, são estabelecimentos penais de regime fechado e de
segurança máxima, onde devem ser realizados os exames gerais e criminológicos, cujos
resultados serão encaminhados às comissões técnicas de classificação, as quais indicarão o
tipo de estabelecimento e o tratamento adequado para cada pessoa detida397.
Traz-se a lição de Capez:
O Centro de Observação, em sintonia com o Departamento Penitenciário local ou similar, é o órgão destinado a proceder à classificação dos condenados que iniciam o cumprimento da pena em regime fechado, mediante a realização de exames e testes de personalidade, como o criminológico, visando à individualização na execução da pena, devendo encaminhar os resultados à Comissão Técnica de Classificação, a qual formulará o programa individualizador398.
Conforme dispõe a LEP, em seu art. 97, o aludido estabelecimento será instalado em
unidade autônoma ou anexo a estabelecimento penal.
Neste diapasão, assevera Mirabete:
Quando ocorre a segunda hipótese não significa que o Centro destina-se apenas aos exames gerais e criminológicos dos condenados do estabelecimento penal anexo. O Centro de Observação é o estabelecimento de cada unidade federativa destinado justamente à primeira classificação dos condenados a fim de verificar-se qual a penitenciária ou colônia mais adequada para recebê-lo399.
Outrossim, prevendo as dificuldades para a instalação de centros de observação em
várias unidades federativas, a lei concede que, em sua falta, os exames sejam feitos pela 396 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 205. 397 KLOCH, Henrique. O Sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 44. 398 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 75. 399 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 281.
117
comissão técnica de classificação instalada na unidade prisional em que se encontra recolhido
o apenado400.
Hoje, a realidade dificulta a efetiva execução, tendo em vista que a inexistência de
exame criminológico prévio contribui para a promiscuidade e para a manutenção da noção de
que a prisão é escola do crime.
De todo modo, passar-se-á a tratar no contíguo elemento mais um estabelecimento de
cumprimento de pena, qual seja, o hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, destinado
aos sentenciados por medida de segurança.
4.2.5 Hospital de custódia e tratamento psiquiátrico
Inicialmente, tendo em vista que o estabelecimento em análise trata do cumprimento
de medida de segurança e não de pena privativa de liberdade, far-se-á uma breve explanação
sobre o mesmo, com o escopo de não afugentar do foco da presente pesquisa.
Outrossim, conforme delineado acima, são os estabelecimentos penais destinados a
abrigar pessoas submetidas à medida de segurança. Destina-se à internação dos inimputáveis e
semi-inimputáveis401.
Ademais, aduz Mesquita Junior que “a medida de segurança não é pena, nem espécie
de sanção penal. Ela será cumprida, preferencialmente, em hospital psiquiátrico. Entretanto,
são raros os hospitais psiquiátricos existentes”402.
Nucci preleciona que:
Nesses locais, periodicamente, realizam-se os exames psiquiátricos para o acompanhamento dos internados (arts. 99 e 100, LEP). Por vezes, podem também abrigar aqueles que estão sujeitos a tratamento ambulatorial (art. 97, CP), embora não se equipare a internação403.
400 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 282. 401 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 44. 402 MESQUITA JUNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 207. 403 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1034.
118
Na dicção do art. 99 e parágrafo único da LEP, o hospital de custódia e tratamento
psiquiátrico destina-se aos inimputáveis e semi-inimputáveis referidos no art. 26 e parágrafo
único do CP, aplicando-se ao hospital, no que couber o disposto no art. 88 da lei404.
Quanto à estrutura do aludido estabelecimento, Capez ensina que:
Conforme estabelecido na Exposição de Motivos, esse hospital-presídio, de caráter oficial, não exige cela individual, posto que se submete aos padrões de uma unidade hospitalar, atendendo às necessidades da moderna medicina psiquiátrica405.
Igualmente, a adoção das medidas de segurança trouxe consigo a exigência de diverso
estilo arquitetônico e da existência de aparelhagem interna nos estabelecimentos penais
destinados a sua execução. Assim, o hospital de custódia e tratamento psiquiátrico é um
hospital-presídio, um estabelecimento penal que visa afiançar a custódia do internado.
Embora se destine ao tratamento, que é o fim da medida de segurança, pois os alienados que
cometem crimes assemelham-se em todos os pontos a outros alienados, distinguindo-se
essencialmente dos outros criminosos, não se pode afastar a coerção à liberdade de locomoção
do internado, presumidamente perigoso em decorrência da lei406.
Capez assegura que “Na falta de estabelecimento oficial, ou de sua existência em
condições inadequadas, a lei prevê prestação de serviços por entidades particulares, desde que
estas ofereçam amplas possibilidades de recuperação ao condenado”407.
Por fim, adentrar-se-á no próximo contexto na análise da cadeia pública, um dos
estabelecimentos que enseja os maiores problemas no tocante ao cumprimento de reprimenda,
a fim de encerrar o estudo sobre os estabelecimentos de cumprimento das penas.
4.2.6 Cadeia pública
Determina a lei que cada comarca terá pelo menos uma cadeia pública, justificando tal
exigência pela necessidade de resguardar o interesse da administração da justiça criminal e a
404 MARCÃO, Renato. Curso de execução penal, p. 142-143. 405 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 75. 406 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p.282. 407 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 76.
119
permanência do preso próximo do local em que se desenvolve o inquérito policial e do Juízo
onde tramita o processo penal408.
Extrai-se dos ensinamentos de Kloch:
Também conhecidas como Unidades Prisionais Avançadas, são estabelecimentos penais destinados ao recolhimento de pessoas presas em caráter provisório. Cada Comarca deverá ter uma cadeia pública a fim de resguardar o interesse da administração da justiça criminal e a permanência do segregado em local próximo ao seu meio social409.
Ressalta-se que em alguns Estados, as cadeias públicas são regionalizadas,
denominando-se Presídios Regionais: presídio regional é o local em que os presos esperam
julgamento, ou aguardam o surgimento de vaga na penitenciária, até que possam ser
transferidos.
Capez ensina, “Destinam-se ao recolhimento de presos provisórios, assim como aos
casos de prisão civil e administrativa; nesses dois últimos casos objetiva-se a coação do
indivíduo ao cumprimento de sua obrigação, sendo desnecessário o rigor penitenciário”410.
De acordo com os ensinamentos de Mirabete:
A separação instituída com a destinação à Cadeia Pública é necessária, pois a finalidade da prisão provisória é apenas a custódia daquele a quem se imputa a prática do crime a fim de que fique à disposição da autoridade judicial durante o inquérito ou a ação penal e não para o cumprimento da pena, que não foi imposta ou que não é definitiva. Como a execução penal somente pode ser iniciada após o trânsito em julgado da sentença, a prisão provisória não deve ter outras limitações se não as determinadas pela necessidade da custódia e pela segurança e ordem dos estabelecimentos411.
Embora a literalidade da lei seja clara, sabe-se que as cadeias públicas estão repletas
de condenados definitivos e superlotadas, gerando grave situação de risco, impedindo, assim,
que ocorra a ressocialização dos mesmos.
408 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 287. 409 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 42. 410 CAPEZ, Fernando. Execução penal, p. 76. 411 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11-7-1984, p. 285-286.
120
Nesse sentido, traz-se a lição de Guberev:
É do conhecimento que grande parte da população carcerária está confinada em cadeias públicas, presídios, casas de detenção e estabelecimentos análogos, onde prisioneiros de alta periculosidade convivem em celas superlotadas com criminosos ocasionais, de escassa ou nenhum nocividade, e pacientes de imposição penal prévia (presos provisórios ou aguardando julgamento), para quem é um mito, no caso, a presunção de inocência. Nestes ambientes de estufa, a ociosidade é a regra; a intimidade inevitável e profunda412.
Portanto, ante a falta de estrutura desta unidade prisional, Mesquita Junior assevera
que o pior estabelecimento penitenciário existente, na prática, é a cadeia pública, a qual está
sempre superlotada, não dispondo dos recursos materiais mínimos, bem como de instrumentos
para as outras assistências previstas na LEP. Assim, a previsão legal reverte-se em detrimento
do condenado, pois não existe pior estabelecimento para cumprimento da reprimenda que a
cadeia pública413.
Ademais, elencados sobre os estabelecimentos de cumprimento das penas, adentrar-se-
á no próximo contexto no foco da presente pesquisa, qual seja: os estabelecimentos de
cumprimento das penas privativas de liberdade no Estado de Santa Catarina.
4.3 ANÁLISE DAS UNIDADES PRISIONAIS NO ESTADO DE SANTA CATARINA
Como o objeto da presente pesquisa é a análise do cumprimento das penas privativas
de liberdade, buscar-se-á demonstrar as tendências contemporâneas do sistema prisional e a
humanização dos direitos dos apenados, focando na eficiência ou ineficácia dos serviços
penitenciários catarinenses, situação que não difere dos demais Estados da federação.
Conforme dados extraídos do sistema integrado de informações penitenciárias-
INFOPEN, o Brasil no mês de junho do corrente ano, possuía uma população carcerária de
494.237 presos, distribuídos em todas as unidades da federação. Igualmente, o Estado de
Santa Catarina, no mesmo período, contava com 14.481 presos em seus estabelecimentos
penitenciários, estabelecimentos estes, abordados no próximo contexto414.
412 GUBEREV, Natália. Prisão: as mazelas do cárcere, p. 197-207. 413 MESQUITA JUNIOR, Sídio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática, p. 206. 414 BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Sistema integrado de informações penitenciárias (InfoPen). Sistema prisional. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/data/Pages/ MJD574E9CEITEMIDC37B2AE94C6840068B1624D28407509CPTBRIE.htm>. Acesso em: 06 nov. 2010.
121
4.3.1 Estabelecimentos prisionais
Cada Estado possui suas próprias unidades prisionais, que são construídas de acordo
com a população. O tipo de unidade prisional edificada em cada Estado depende da
necessidade carcerária, com vistas a adequar a execução da pena415.
O quadro a seguir demonstra a quantidade de cadeias públicas, presídios,
penitenciárias, casas de albergado, colônias agrícolas e hospitais de custódia a tratamento
psiquiátrico que o sistema prisional do Estado de Santa Catarina possui416:
Cadeia Pública Presídio Penitenciária Casa de Albergado417
Colônia Agrícola
Hospital de Custódia
Anita Garibaldi Araranguá Chapecó Campo Erê Palhoça Florianópolis
Balneário Piçarras Balneário Camboriú Curitibanos Chapecó
Barra Velha Biguaçu Florianópolis Florianópolis Bom Retiro Blumenau Joinville Ituporanga
Brusque Caçador São Pedro de Alcântara
São Francisco do Sul
Campo Erê Chapecó Criciúma São José do Cedro
Campos Novos Concórdia Tangará Canoinhas Criciúma
Capinzal Feminino de Florianópolis
Correia Pinto Masculino de Florianópolis
Curitibanos Itajaí Dionísio Cirqueira Jaraguá do Sul Fraiburgo Joaçaba Imbituba Joinville Indaial Lages Itapiranga Mafra Ituporanga Rio do Sul Laguna Tijucas Maravilha Tubarão Porto União Xanxerê São Joaquim São José do Cedro São Miguel do Oeste
Urussanga Videira Xaxim
415 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 45. 416BRASIL. Departamento de Administração Prisional (DEAP). Disponível em: http://www.deap.sc.gov.br/deap/regioes.jsp. Acesso em: 20 set. 2010. 417 Dados fornecidos pelo DEAP. Contudo, em funcionamento encontram-se apenas as unidades de Florianópolis e Chapecó-SC.
122
Constata-se que, conforme dados acima citados, o Estado possui 7 casas de albergado.
Contudo, em funcionamento encontram-se apenas 2, a casa de albergado de Florianópolis e
Chapecó-SC.
Ressalta-se que das 26 cadeias públicas situadas no Estado, 13 são unidades prisionais
avançadas. Igualmente, pode se observar pela tabela acima que o Estado não possui centro de
observação.
Salienta-se que o Estado de Santa Catarina possui em construção novos
estabelecimentos prisionais418. O complexo prisional de Tubarão, cujas obras estão em fase de
conclusão, terá capacidade para 368 reclusos, destes 120 ocuparão a ala do regime
semiaberto, tal construção deu-se pelo fato de o presídio local ter capacidade para apenas 60
reclusos, e estar acomodando, atualmente, quase 330.
O presídio de Blumenau aumentou sua capacidade, com a construção de 120 novas
vagas no local para o regime fechado. Outra construção importante para o Vale do Itajaí é o
complexo penitenciário do Vale do Itajaí, com capacidade para abrigar 362 detentos, cujo
projeto prevê a expansão do complexo para 530 vagas.
Em Lages, na construção do presídio regional haverá um prédio central de dois pisos e
os agentes penitenciários não terão contato físico com os apenados, pois ficarão em
plataformas acima dos corredores. A unidade será a primeira do gênero em Santa Catarina,
com capacidade para 352 vagas.
Todas as obras supracitadas possuem previsão de término ao final do corrente ano, a
única obra já concluída em fase de inauguração é a unidade prisional avançada de Itapema,
com capacidade para 72 reclusos.
Outrossim, considerando que o Estado de Santa Catarina possui 61 unidades
prisionais, conforme delineado, e 5 novas em construção, no contíguo contexto far-se-á uma
análise da estrutura das unidades prisionais dispersas pelo Estado, com o intuito de analisar o
efetivo cumprimento das penas privativas de liberdade no Estado de Santa Catarina.
418 BRASIL. Departamento de Administração Prisional (DEAP). Disponível em: http://www.deap.sc.gov.br/deap/regioes.jsp. Acesso em: 20 set. 2010.
123
4.3.2 Estrutura
Inicia-se com os dados extraídos da realidade prisional, pertinente ao número de vagas
nos estabelecimentos penitenciários419. Veja-se:
Capacidade Masculino Feminino Total Provisórios 2.691 368 3.059 Regime fechado 2.992 61 3.053 Regime semiaberto 1.035 8 1.043 Regime aberto 10 0 10 Regime disciplinar diferenciado - RDD 72 0 72 Número de Vagas 6.800 437 7.237
Portanto, das 7.237 vagas que o sistema carcerário catarinense disponibiliza, verifica-
se que 3.059 são para presos provisórios, ou seja, em cadeias públicas, unidades prisionais
avançadas e presídios regionais, nota-se que a quantidade de vagas é proporcional ao número
de unidades desta espécie. Contudo, as referidas unidades encontram-se superlotadas,
porquanto abrigam presos definitivos.
A superlotação características dessas unidades é ocasionada pelo recolhimento
indevido de presos provisórios com condenados. Conforme leciona Oliveira:
A situação das cadeias públicas, destinadas pela lei aos presos provisórios, é alarmante não só pela superlotação desses estabelecimentos como também pela presença de mais de 60% de presos condenados em seu interior, por falta de vagas em penitenciárias e colônias agrícolas420.
Para uma compreensão mais abrangente expõe-se a situação do Presídio Regional de
Tijucas, escolhido dentre outros, visto que demonstra a realidade prisional bem próxima,
estabelecimento construído para o recolhimento de 120 presos, conta atualmente com 308
detentos, demonstrando a cruel realidade do cumprimento das penas privativas de liberdade.
Não obstante, salienta-se que embora este ergástulo seja destinado ao recolhimento de presos
provisórios, dos 308 que ali se encontram, 165 são presos definitivos, que deveriam segundo
os preceitos da LEP estarem recolhidos nas penitenciárias e colônias agrícolas do Estado.
419 BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Sistema integrado de informações penitenciárias (InfoPen). Sistema prisional. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/data/Pages/ MJD574E9CEITEMIDC37B2AE94C6840068B1624D28407509CPTBRIE.htm>. Acesso em: 06 nov. 2010. 420 OLIVEIRA, João Bosco. A execução penal: uma realidade jurídica social e humana. São Paulo: Atlas, 1990, p. 30.
124
Por conseguinte, o Estado conta com 3.053 vagas no regime fechado, distribuídas em
seis penitenciárias que não cumprem os dispositivos da LEP, visto que em seus interiores
encontram-se presos provisórios.
As 1.043 vagas no regime semiaberto, encontram-se distribuídas na colônia agrícola
de Palhoça, assim como nas penitenciárias de Chapecó, Curitibanos e Joinville, visto que
estas três unidades prisionais disponibilizam de alas específicas para o recolhimento de presos
no regime semiaberto421.
Ademais, outro índice que se mostra preocupante é o número de vagas proporcionadas
aqueles que cumprem pena no regime aberto, tendo em vista que conforme exposto na tabela
acima, Santa Catarina dispõe de 10 vagas, distribuída em 2 casas de albergado.
Elencado sobre o número de vagas nos estabelecimentos prisionais, passa-se a abordar
o número de presos, recolhidos em cada estabelecimento distinto, visando-se assim, elucidar a
real situação da lotação carcerária422. Veja-se:
Quantidade de presos / internados
Masculino Feminino Total
Presos provisórios 3.712 443 4.155 Regime fechado 5.290 368 5.658 Regime semiaberto 2.609 191 2.800 Regime aberto 1.635 87 1.722
Medida de segurança / internação
142 0 142
Medida de segurança / tratamento ambulatorial
0 4 4
Quantidade de presos custodiados
13.388 1.093 14.481
Assim sendo, extrai-se dos dados supracitados que o Estado de Santa Catarina possui
7.237 vagas em seus distintos estabelecimentos. Entretanto, apresenta uma massa carcerária
de 14.481 presos, o que corresponde ao dobro de vagas oferecidas, o que assinala a
superlotação carcerária.
421 BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Sistema integrado de informações penitenciárias (InfoPen). Sistema prisional. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/data/Pages/ MJD574E9CEITEMIDC37B2AE94C6840068B1624D28407509CPTBRIE.htm>. Acesso em: 06 nov. 2010. 422 BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Sistema integrado de informações penitenciárias (InfoPen). Sistema prisional. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/data/Pages/ MJD574E9CEITEMIDC37B2AE94C6840068B1624D28407509CPTBRIE.htm>. Acesso em: 06 nov. 2010.
125
Quanto à superlotação Guberev destaca que:
Deve haver controle e humanidade do poder punitivo. Não se podem ferir os direitos humanos daqueles que cometeram algo de repúdio às regras sociais. A pena deve infligir um mal, e não desmoralizar e aviltar o presidiário, pois o crime deve acarretar, a quem o cometeu, a perda de sua liberdade, e não de sua dignidade423.
O que se verifica ao longo da presente pesquisa é que a prisão é incapaz de produzir a
recuperação do delinquente, porquanto se trata apenas de um controle social formalizado,
deixando patente o descrédito na recuperação advinda da mesma. Ela proporciona uma
riqueza de conhecimentos criminóicos, consequência de convívio com os demais
companheiros, além da revolta que os encarcerados adquirem por se encontrar em condições
tão indignas424.
Destarte, um dos problemas apresentados pelo cumprimento das penas privativas de
liberdade dá-se pelo agrupamento de pessoas altamente perigosas, reincidentes, cumprindo
pena pelos mais diversos delitos, acoplados com presos primários, assim como provisórios.
Em análise aos crimes que levaram os presos às unidades prisionais, constata-se que a
maioria dos presos recolhidos no Estado de Santa Catarina é acusada da prática de crimes
contra o patrimônio, dentre eles 1.669 pela prática de furtos simples; 1.683 furtos qualificados
e 1.772 pela prática de roubos qualificados. Não obstante, um número elevado de reclusos
encontra-se recolhido por infração a Lei 6.368/76 e 11.343/06, entre eles 4.582 por tráfico de
entorpecentes e 173 por tráfico internacional de entorpecentes. Igualmente, 1.623 presos são
acusados da prática de crime contra a pessoa e, 1.556 por crime contra os costumes425.
Da mesma forma, os dados colhidos na pesquisa evidenciam que a população
carcerária é composta por jovens, conforme elementos lançados na tabela a seguir426:
423 GUBEREV, Natália. Prisão: as mazelas do cárcere, p. 205. 424 GUBEREV, Natália. Prisão: as mazelas do cárcere, p. 205. 425 BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Sistema integrado de informações penitenciárias (InfoPen). Sistema prisional. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/data/Pages/ MJD574E9CEITEMIDC37B2AE94C6840068B1624D28407509CPTBRIE.htm>. Acesso em: 06 nov. 2010. 426 BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Sistema integrado de informações penitenciárias (InfoPen). Sistema prisional. Disponível em: >http://portal.mj.gov.br/data/Pages/ MJD574E9CEITEMIDC37B2AE94C6840068B1624D28407509CPTBRIE.htm>. Acesso em: 06 nov. 2010.
126
Quantidade de presos por faixa etária
Masculino Feminino Total
18 a 24 anos 4.046 364 4.410 25 a 29 anos 3.343 219 3.562 30 a 34 anos 2.558 176 2.734 35 a 45 anos 2.132 198 2.330 46 a 60 anos 1.079 100 1.179
Mais de 60 anos 168 7 175 Não informado 4 0 4
Outrossim, os dados colhidos na pesquisa também evidenciam que a população
carcerária é composta, em sua maioria, por brancos, seguidos de pardos e negros, situação que
se caracteriza pela diversidade de etnias na região sul do país. Conforme se depreende na
tabela abaixo427:
Quantidade de presos por cor de pele/etnia
Masculino Feminino Total
Branca 7.115 688 7.803 Negra 1.736 150 1.886 Parda 2.757 174 2.931 Amarela 274 13 287 Indígena 12 4 16 Outras 102 0 102
Outro dado importante refere-se ao grau de instrução daqueles submetidos ao
cumprimento de pena privativa de liberdade no sistema carcerário brasileiro428.
Perfil do preso Masculino Feminino Total Analfabeto 633 37 670 Alfabetizado 1.536 85 1.621
Ensino fundamental incompleto 6.002 499 6.501 Ensino fundamental completo 2.363 159 2.522 Ensino médio incompleto 1.446 123 1.569 Ensino médio completo 1.125 106 1.231
Ensino superior incompleto 141 29 170 Ensino superior completo 75 6 81 Ensino acima de superior
completo 2 0 2
Não informado 54 7 61
Conforme as dados acima, nota-se que dos 14.481 presos recolhidos nas unidades do
Estado, a maioria não completou sequer o ensino fundamental, abrangendo o total de 6.501
presos. No entanto, em contrapartida, apenas 81 possui o ensino superior completo e, um
número mínimo de presos, ou seja, 2 possuem qualificação acima de curso superior.
427 BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Sistema integrado de informações penitenciárias (InfoPen). Sistema prisional. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/data/Pages/ MJD574E9CEITEMIDC37B2AE94C6840068B1624D28407509CPTBRIE.htm>. Acesso em: 06 nov. 2010. 428 BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Sistema integrado de informações penitenciárias (InfoPen). Sistema prisional. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/data/Pages/ MJD574E9CEITEMIDC37B2AE94C6840068B1624D28407509CPTBRIE.htm>. Acesso em: 06 nov. 2010.
127
Portanto, partindo da premissa que a população carcerária em sua maioria é composta
de pessoas sem instrução, nota-se que infelizmente, as unidades prisionais são destinadas aos
“desqualificados”.
Teles em sua concepção, aduz sobre a realidade das penas:
As penas devem ser iguais para todos, pobres e ricos, pretos e brancos, altos e baixos, homens e mulheres, fortes e fracos, poderosos e humildes, exploradores e explorados. A realidade não é esta. O crime é um fenômeno cujas causas também se assentam nas desigualdades econômico-sociais. O agente do crime é, em regra, um desajustado social, fruto das estruturas sociais perversas, negro, pobre, analfabeto, nascido na favela, no morro, na periferia das cidades, muitas vezes de pai desconhecido ou de mãe ignorante429.
Ademais, elencadas as estruturas dos estabelecimentos penitenciários do Estado, faz-
se necessário aclarar sobre a superlotação carcerária, infelizmente, presente em todo o Estado.
4.3.3 Superlotação
Conforme elucidado, é evidente que o Estado de Santa Catarina convive com a
superlotação nas suas unidades prisionais, tendo em vista a ausência de estabelecimento
adequado ao cumprimento da reprimenda, assim como a falta de estrutura daqueles que se
encontram em funcionamento.
A superlotação é um dos mais graves problemas que atinge o sistema penal brasileiro.
Conforme aduz Adolfo:
Simplesmente a demanda é infinitamente maior que a oferta, isso sem considerar os reiterados prejuízos com rebeliões, cada vez mais freqüentes, a desativação das unidades em face da antiguidade das instalações, das interdições verificadas justamente em face da superlotação e da insalubridade das unidades430.
A falta de cumprimento dos princípios fundamentais é um dos fatores que causam a
superlotação, e não proporcionam ao preso o mínimo de dignidade humana para que possa
conviver em sociedade. Dessa forma, diante das más condições proporcionadas nos
429 TELES, Ney Moura. Direito penal. São Paulo: Atlas, 1998, v. 2, p. 37. 430 ADOLFO, Lúcio. Execução penal e sua aplicação: o preso e seus direitos: modelos e quadros de procedimentos, p. 39.
128
estabelecimentos prisionais, o problema não se resolve aglomerando presos, o que se precisa é
educá-los.
Insere-se aqui, oportuna consideração de Guberev:
O sistema penitenciário no Brasil encontra-se um caos; presídios superlotados, fugas, motins, greve de policiais, são fortes elementos para o governo federal e os governos estaduais priorizarem e dedicarem-se com o intuito de organizar o sistema431.
A superlotação é considerada um dos mais graves problemas que enfrentam as
unidades prisionais catarinenses, situação que não difere dos demais Estados, um dos fatores
responsáveis pela aglomeração de presos é a reincidência e a falta de estrutura para a
ressocialização, itens abordados nos próximos contextos.
4.3.4 Reincidência
Como já exposto, o estado precário em que se encontram os estabelecimentos penais
catarinenses, aliada à dificuldade que a LEP tem em sua aplicabilidade, em razão do descaso e
desleixo das autoridades competentes em não investir mais na segurança pública, implica
diretamente na volta do agente, ao mundo do crime, tornando-se então um reincidente.
Deste modo, um dos dados frequentemente referidos como de efetiva demonstração do
fracasso da prisão são os altos índices de reincidência, apesar da presunção de que durante a
reclusão os internos são submetidos a tratamento reabilitador432.
Capez conceitua a reincidência da seguinte forma, “[...] situação de quem pratica um
fato criminoso após ter sido condenado por crime anterior em sentença transitada em
julgado”433
A função da pena é manter a sociedade organizada de acordo com o poder exercido; é
restabelecer a ordem; punir e reeducar o apenado; é adestrar o homem delinquente para que
não reincida contra o sistema proposto434.
431 GUBEREV, Natália. Prisão: as mazelas do cárcere, p. 197-207. 432 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas alternativas, p. 161. 433 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral, p. 434. 434 KLOCH, Henrique. O Sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 55-56.
129
Neste diapasão Kloch leciona que quando um cidadão estiver cumprindo pena, sob a
custódia do Estado, é de sua responsabilidade transformá-lo num indivíduo capaz de viver em
sociedade435.
No entanto, Lima descreve a realidade prisional:
Ao invés de reeducar, ressocializar e outros objetivos afins, o que se tem conseguido nas instituições prisionais é fabricar delinquentes. Nessa fabricação interferem tanto as condições de cárcere acima cotejadas como a própria dinâmica permitida pelo encarceramento. Isto é, a prisão torna possível, ou melhor, favorece a organização de um meio de delinquentes, solidários entre si, hierarquizados e prontos para todas as cumplicidades futuras. A própria segregação, tão desejada pela população e respeitada pelas prisões como um fundamento básico, oportuniza a congregação dos delituosos e a formação da citada “fábrica de delinquentes”436.
Assim, pode-se observar que a reincidência pode ser evitada através da reinserção. Há
que se preocupar com a condição do apenado além dos muros dos presídios, pois este é o
grande desafio: proporcionar sua adaptação para que não volte ao sistema prisional, fazendo
com que seja efetivado o previsto na LEP. Caso permaneça o modelo atual, o egresso
desassistido de hoje continuará sendo o criminoso reincidente de amanhã.
Dessa forma, é visível que o método desenvolvido com o intuito de punir e ensinar o
condenado fracassou, fazendo com que este, ao invés de ser reeducado, seja aperfeiçoado no
mundo da criminalidade.
4.3.5 Ressocialização
Sabe-se que o sistema prisional está diretamente ligado ao caráter ressocializador do
condenado, visto que acompanha o mesmo após o cumprimento de sua pena privativa de
liberdade.
É notória a situação de que a LEP prevê instrumentos para a ressocialização dos
presos, porém o Estado não as cumpre, ou seja, não ensina àquele indivíduo, conviver longe
das práticas.
435 KLOCH, Henrique. O sistema prisional e os direitos da personalidade do apenado com fins de res(socialização), p. 61. 436 LIMA, Regina Campos. A sociedade prisional e suas facções criminosas. Londrina: Edições Humanidades, 2003, p. 62.
130
Extrai-se dos ensinamentos de Medeiros:
É preciso que se faça alguma coisa; não bastam providências isoladas, esparsas. Alguns poderão estranhar que, quando há tanta necessidade de escolas, hospitais, creches, rodovias, etc, ainda se fale na construção de cadeias, que não são obras de urgência. Engano. Todas são imprescindíveis437.
Assevera Karam que a opção pelo encarceramento não esconde certo
sadomasoquismo. O lado sádico parece evidente. Por outro lado, basta considerar que,
isolando, estigmatizando e ainda submetendo aqueles que seleciona ao inútil e desumano
sofrimento da prisão, o sistema penal faz com que esses indivíduos selecionados para cumprir
o papel de “criminosos” se tornem mais desadaptados ao convívio social e,
consequentemente, mais aptos a praticar agressões e outras condutas socialmente negativas ou
indesejáveis438.
Neste norte, Karam afirma que:
Aplaudindo e sentindo-nos mais seguros, diante de muros e grades, em que encerrados indivíduos rotulados como “criminosos”, insistimos em não perceber os danos causados, a eles e a nós, pela inútil e desumana privação da liberdade439.
Nucci assevera que:
Na prática, no entanto, lamentavelmente, o Estado tem dado pouca atenção ao sistema carcerário, nas últimas décadas, deixando de lado a necessária humanização do cumprimento da pena, em especial no tocante à pena privativa de liberdade, permitindo que muitos presídios se tenham transformado em autênticas masmorras, bem distantes do respeito à integridade física e moral dos presos, direito constitucionalmente imposto440.
Hoje em dia superadas as discussões, é pacífico que toda pessoa tem direitos e
garantias fundamentais, decorrendo daí a indispensabilidade da sua proteção para preservação
da dignidade humana. Tais princípios devem ser respeitados, assegurando sua efetividade,
437 MEDEIROS, Marcílio. Penitenciárias, manicômio judiciário e cadeias públicas. Jurisprudência catarinense. Florianópolis: [s/Ed.], 1982, p. 13-15. 438 KARAM, Maria Lucia. A violenta, danosa e dolorosa realização do poder punitivo: considerações sobre a pena. In: MATTOS, Virgílio de. (Org.). Desconstrução das práticas jurídicas, p. 11-25. 439 KARAM, Maria Lucia. A violenta, danosa e dolorosa realização do poder punitivo: considerações sobre a pena. In: MATTOS, Virgílio de. (Org.). Desconstrução das práticas jurídicas, p. 11-25. 440 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal, p. 1005.
131
inclusive à população carcerária, pois o fato de terem delinquido não os retira a característica
de seres humanos.
Nesse sentido, preleciona Falconi:
Se não tivermos coragem moral e dignidade interior para propedeuticamente, corrigirmos nossos equívocos e desencontros, então é certo também que não somos capazes de resolver o problema da criminalidade na sua coletividade, e do criminoso na sua individualidade. Ninguém pode exigir de outro aquilo que é incapaz de realizar441.
A realidade social, conforme os dados apurados na presente pesquisa, quanto à
execução da pena privativa de liberdade, mostram que as grandes maiorias das disposições
contidas na LEP, na prática, não estão sendo cumpridas ou observadas.
Neste norte, exalta-se por fim o pensamento de Oliveira:
Este trabalho, ao mostrar tais fatos, não se dirige simplesmente a uma posição de crítica destrutiva, da crítica pela crítica. Não há qualquer intenção de invectivar contra o Estado, os seus órgãos e contra os condenados. É a análise real e honesta do sistema de execução da pena e que, ao se relatarem as deficiências, faz-se com a consciência, a esperança e o sentido de luta e conquista de um futuro marcante e gratificante para as execuções penais no país e o surgimento concreto de um Direito da Execução Penal, com seus objetivos claros e métodos definidos442.
Portanto, analisado o cumprimento das penas privativas de liberdade, nota-se que a
prisão como se apresenta hoje, apenas segrega, afasta da sociedade, gerando uma revolta no
apenado, no lugar do sentimento de regeneração; não recupera aquele que mais cedo ou mais
tarde, voltará ao seio da sociedade sem perspectiva de reinserção, uma vez que estará marcado
com o cunho do falido sistema prisional.
Diante das circunstâncias, oportunas, são as palavras de Thompson: “Não vamos
apontar falhas e culpas do passado, até porque isso não resolve o problema: vamos constatar
uma realidade que existe, e que pode ser detectada através destes números”443.
441 FALCONI, Romeu. Sistema presidial: reinserção social? p. 121. 442 OLIVEIRA, João Bosco. A execução penal: uma realidade jurídica social e humana, p. 37. 443 THOMPSON, Augusto. Quem são os criminosos: o crime e o criminoso: entes políticos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1998, p. 156.
132
Através das mazelas do cárcere, vê-se que o sistema penal nunca funcionou, jamais
ressocializou, pois foi feito para encarcerar pobres e continuar a mantê-los a margem da
sociedade.
Deste modo, diante da situação em que se encontra o cumprimento das penas
privativas de liberdade no Estado de Santa Catarina fica evidente que o Estado não possui
estrutura para manter, tampouco, educar aqueles que estão sob sua responsabilidade.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa abordou o cumprimento das penas privativas de liberdade no
Brasil e a realidade do sistema prisional em Santa Catarina, especialmente no tocante a sua
estrutura e adequação dos estabelecimentos prisionais ao cumprimento das normas jurídicas
que regem a execução penal.
A análise despendida na pesquisa partiu da realidade prisional no cenário catarinense,
com suas tradicionais carências. Ressaltando a necessidade de humanizar as unidades
prisionais e ter nelas um ambiente equilibrado no qual as relações de trabalho, saúde,
educação, lazer e desenvolvimento pessoal possam cooperar com o corpo social que se
encontra fora das grades.
No primeiro capítulo apresentou-se um apanhado histórico da pena, com ênfase na sua
origem e deslocamentos históricos. Diante da pesquisa elaborada, foi possível compreender
que os suplícios e penas infamantes utilizados nos primórdios da sociedade humana tinham
caráter exemplar e espetacular, de modo a permaner vivos na memória de quem os assistisse,
como instrumento de intimidação social.
Sem solução de continuidade, passou-se a elucidar o surgimento das primeiras
vinganças utilizadas como forma de inibir atitudes contrárias aos interesses do indivíduo,
período subdivido em três fases: vingança privada, vingança divina e vingança pública. Na
fase da vingança privada, qualquer pessoa que se encontrasse ofendida por outrem poderia
providenciar a retribuição pelo mal ocasionado, mesmo sem a proporcionalidade. Já no
período da vingança divina, a religião confundia-se com o direito e as leis em eficácia
originavam-se de princípios religiosos e morais, na qual qualquer infração dessas regras
implicava a perda de direitos, ou da própria vida. Por fim, a vingança pública, caracterizou-se
pelo poder do Estado, especialmente pelo poder político de impor as penas na medida
estabelecida pela norma jurídica.
Essa drástica conjuntura desencadeou um movimento de humanização das práticas
punitivas. Passando ao período humanitário da pena, no qual essa assume o caráter de
retribuição ética, intimidativa e regeneradora.
134
Com o escopo de restringir a liberdade humana, foram criados complexos
penitenciários, iniciando-se pelo panóptico, proposto por Bentham, um tipo de prisão celular,
de forma radial, no qual uma pessoa poderia avistar todos os ângulos dos prisioneiros, sem
que estes soubessem que estavam sendo vigiados.
Posteriormente, surgiu o sistema pensilvânico ou celular, o qual primava pelo
isolamento e separação dos presos. Contudo, o método de isolamento não prosperou
perfazendo um aumento da população carcerária. Por conseguinte, apareceu o sistema
auburniano que se originou com base no sistema pensilvânico, mas ostentou um regime de
comunidade durante o dia e no período noturno manteve o isolamento. No entanto, esses
sistemas não permitiam qualquer progressão no cumprimento da pena, assim, diante desta
necessidade, surgiu o sistema progressivo, o qual se baseava em dois princípios: estimular o
recluso a comportar-se corretamente, visto que para a obtenção de benefícios é necessário um
bom comportamento carcerário; e a reforma moral do preso, buscando o retorno a vida em
sociedade.
Elucidados os sistemas penitenciários, compreensão relevante ao tema escolhido,
passou-se a analisar as espécies de penas previstas no ordenamento jurídico, iniciando-se pela
pena restritiva de direitos, sendo elas: prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação
de serviços à comunidade ou a entidades públicas, limitação de fim de semana e interdição
temporária de direitos. Partindo à pena de multa, que consiste no pagamento ao fundo
penitenciário da quantia fixada na sentença e computada em dias-multa. Para enfim adentrar
no foco da presente pesquisa, qual seja, a pena privativa de liberdade que é aquela que
restringe a liberdade individual do indivíduo, mediante clausura, durante o período
determinado no provimento judicial, dividindo-se em: prisão simples, detenção e reclusão.
No segundo capítulo, já compreendido o deslocamento histórico das penas, tratou-se
de sua execução, para tanto se iniciou o estudo através do processo de execução criminal e os
princípios que norteiam a execução da pena, diferenciando-se a execução provisória da pena,
aquela que se encontra pendente de trânsito para alguma das partes, e a execução definitiva,
transitada em julgado para ambas as partes.
Ademais, analisou-se os regimes de cumprimento das penas privativas de liberdade,
verificou-se que o regime fechado é aquele em que o condenado fica completamente isolado
do meio social e privado da liberdade física de locomoção, por meio de seu recolhimento em
estabelecimento prisional de segurança máxima ou média. O regime semiaberto, proporciona
135
ao apenado o retorno aos poucos ao convívio social, através das saídas temporárias, e por fim,
o regime aberto, que se baseia na autodisciplina e senso de responsabilidade do apenado.
Abordou-se ainda o regime especial, previsto para as pessoas do sexo feminino e idade
provecta, assim como, o RDD, modalidade de sanção disciplinar.
Percorrendo a execução da pena, adentrou-se aos benefícios elencados na LEP, quais
sejam: progressão de regime, autorizações de saída, livramento condicional, remição da pena,
trabalhos externos e internos e, por fim, no instituto da regressão de regime, que se caracteriza
pelo oposto da progressão, ou seja, o apenado regride ao regime mais gravoso.
No último capítulo adentrou-se no enfoque da pesquisa, no que tange aos
estabelecimentos prisionais catarinenses. Perfazendo a necessidade de explanar as
características peculiares das distintas unidades, com o intuito de verificar a execução das
penas privativas de liberdade buscou-se através de dados pertencentes ao Departamento
Penitenciário Nacional, apontar a realidade vivenciada no cenário catarinense.
Apresentou-se a estrutura carcerária das unidades prisionais, com destaque para a
necessidade dos pressupostos para o regular cumprimento das reprimendas, abordando-se
cada um dos estabelecimentos, quais sejam: penitenciária, colônia agrícola, industrial ou
similar, casa de albergado, hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, centro de
observação e cadeia pública, também conhecida como unidade prisional avançada, e por fim,
presídio regional, que são cadeias públicas regionalizadas.
Por derradeiro, explanou-se, através de dados fornecidos pelo Departamento
Penitenciário Nacional, a situação do cumprimento das penas privativas de liberdade nos
estabelecimentos catarinenses, quanto à estrutura e capacidade carcerária, real situação das
unidades, características dos reclusos que ali cumprem sua reprimenda, quantidades de
estabelecimentos e por fim a análise da efetivação dos dispositivos da Lei de Execução Penal.
A pesquisa constatou que, na prática, não se vem cumprindo os dispositivos da LEP,
porquanto o caráter punitivo e repressivo não dá lugar para a ressocialização, tampouco para a
recuperação do delinquente. Observou-se que também não há participação da sociedade na
elaboração de políticas públicas de atendimento aos egressos, vestígios da reincidência.
Para a sociedade o problema da população carcerária é algo que não lhe diz respeito,
sendo problema que atinge tão somente o apenado e sua família. Deste modo, percebe-se que
136
o aspecto ressocializador vem se perdendo gradativamente, cedendo lugar ao caráter punitivo,
que objetiva apenas afastar o delinquente do convívio social.
Dentro do sistema prisional catarinense, situação que não difere nos demais Estados, o
que se tem é um ambiente de degradação marcado pela superlotação, pela ociosidade e pela
violência. Assim, ao deixar a prisão, o egresso traz consigo a marca histórica do cárcere, que
o estigmatiza abalando sua integridade física, psíquica e moral, revelando um indivíduo com
diversas dificuldades na reconstrução moral e readaptação ao convívio social.
A consequência da junção dos fatores negativos apresentados no decorrer da pesquisa
incumbe na ausência de reeducação e ressocialização dos apenados, tendo em vista que dessa
forma os mantém cada vez mais em contato com as práticas ilícitas, contribuindo para o
grande número de reincidentes e da massa carcerária.
A partir do problema elaborado para a pesquisa e diante das hipóteses levantadas, com
base no estudo e levantamento de dados, verificou-se que a primeira hipótese restou
confirmada, porquanto o Estado de Santa Catarina, diante da ausência de estabelecimentos
suficientes, aliada a falta de estrutura daqueles que se encontram em funcionamento, não
possui condições de cumprir os preceitos da LEP. Por conseguinte, a segunda hipótese não se
confirmou.
A terceira hipótese restou confirmada, tendo em vista que, conforme já elucidado, os
estabelecimentos prisionais catarinenses não oferecem estrutura para o regular cumprimento
das penas privativas de liberdade, tal posicionamento encontra amparo, entre outros fatores
elencados ao longo da pesquisa, na irregularidade quanto aos regimes carcerários. Em
consulta aos dados pesquisados, constatou-se que presos provisórios são recolhidos junto com
presos definitivos e primários, e dividem minúsculas celas com presos reincidentes. Não
obstante, provisórios encontram-se recolhidos em penitenciárias e definitivos em cadeias
públicas.
Em contrapartida, a quarta hipótese diante dos argumentos supracitados, não se
confirmou, diante da falta de estrutura das unidades prisionais distribuídas pelo Estado de
Santa Catarina.
Ressalte-se que a pena privativa de liberdade é uma das modalidades passíveis de frear
a delinquência. Nesse contexto, deve o autor de um delito ser punido pelo mal praticado.
137
Contudo, a legislação já previu a forma correta da aplicação da pena, porém o Estado não se
preparou adequadamente para o cumprimento da mesma. Situação que provocou o caos em
que se encontra o cumprimento da pena privativa no cenário catarinense.
Foi possível detectar que de nada adianta aglomerar os presos em uma cela, sem a
devida estrutura e adequação, porquanto a restrição da liberdade acarreta no indivíduo a
revolta, a vingança e o desprezo, perfazendo com que a escola do crime prevaleça e, cada vez
mais, capacite à delinquência.
Igualmente, através das mazelas do cárcere, verificou-se que o sistema prisional não
funciona, tampouco ressocializa, pois foi criado para o encarceramento da classe baixa e
continua a mantê-los a margem da sociedade, sem expectativa de transformação e
ressocialização.
Deste modo, embora a LEP apresente os mecanismos e técnicas para reintegrar o preso
à sociedade, devido o estado precário em que se encontra o sistema penitenciário catarinense,
é impossível colocar em prática tais mecanismos, predispostos pela lei, para a reintegração do
apenado, não se produzindo os efeitos erigidos pela LEP.
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