memoria loucura1
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Memria da Loucura
Braslia DF2003
MMINISTRIO DA SADE
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MINISTRIO DA SADESecretaria-Executiva
Subsecretaria de Assuntos AdministrativosCoordenao-Geral de Documentao e Informao
Centro Cultural da Sade
Memria da Loucura
Srie J. Cadernos Centro Cultural da Sade
Braslia DF2003
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2003. Ministrio da Sade.No permitida a reproduo parcial ou total desta obra, exceto com a autorizao prvia do autor.
Srie J. Cadernos Centro Cultural da Sade
Tiragem: 50 exemplares
Elaborao, distribuio e informaes:
MINISTRIO DA SADESecretaria-ExecutivaSubsecretaria de Assuntos AdministrativosCoordenao-Geral de Documentao e InformaoCentro Cultural da SadePraa Marechal ncora, s/n., Praa XVCEP: 20021-200, Rio de Janeiro RJTel.: (21) 2240-5568E-mail:ccs@ccs.saude.gov.brHome page:www.ccs.saude.gov.br
Instituies parceiras:Instituto M unicipal de Assistncia Sade Nise da SilveiraInstituto Municipal de Assistncia Sade Juliano MoreiraInstituto Philippe Pinel
Apoio:Arquivo NacionalMuseu Histrico Nacional/ IPHAN/ Ministrio da CulturaTV Pinel
Projeto grfico:Joo Mrio P. d' A. Dias
Capa:Ana Aparecida Soares Ramos
Impresso no Brasil / Printed in Brazil
Ficha Catalogrfica
NLM WM 11 DB8
Catalogao na fonte - Editora MS
EDITORA MSDocumentao e Informao
SIA, Trecho 4, Lotes 540/610CEP: 71200-040, Braslia DFTels.: (61) 233 1774/2020 Fax: (61) 233 9558E-mail:editora.ms@saude.gov.brHomepage: http://www.saude.gov.br/editora
Brasil. M inistrio da Sade. Secretaria-Executiva. Subsecretaria de Assuntos Administrativos. Coordenao-Geral deDocumentao e Informao. Centro Cultural da Sade.
Memria da loucura / Ministrio da Sade, Secretaria-Executiva, Subsecretaria de Assuntos Administrativos,
Coordenao-Geral de Documentao e Informao, Centro Cultural da Sade Braslia: M inistrio da Sade, 2003.
54 p.: il . color. (Srie J. Cadernos Centro Cultural da Sade)
1. Psiquiatria - Histria - Brasil. 2. Disseminao da Informao. 3. Servios de Sade. I. Brasil. Ministrio da Sade. II.Brasil. Secretaria-Executiva. III. Brasil. Subsecretaria de Assuntos Administrativos. Coordenao-Geral de Documentaoe Informao. Centro Cultural da Sade. IV. Ttulo. V. Srie.
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SUMRIO
Apresentao do Centro Cultural da Sade .................................................................................
Apresentao da mostra................................................................................................................
Um breve histrico da Psiquiatria.................................................................................................
Philippe Pinel.................................................................................................................................
Esquirol.........................................................................................................................................
Poltica e hospital psiquitrico.......................................................................................................Aos loucos, o hospcio.....................................................................................................................
Nuno de Andrade..........................................................................................................................
Teixeira Brando...........................................................................................................................
As classes sociais da corte e o hospcio de Pedro II.........................................................................
Emil Kraepelin..............................................................................................................................
Juliano Moreira.............................................................................................................................
Luiz Cerqueira e Ulysses Pernambucano.......................................................................................
Wilson Simplcio e Oswaldo Santos..............................................................................................
Sigmund Freud..............................................................................................................................
Sntese da psicanlise de Freud.....................................................................................................
Sntese da teoria de Carl Jung.......................................................................................................
Nise da Silveira.............................................................................................................................
Sntese do trabalho de Nise da Silveira.........................................................................................
Formas de tratamento e instrumentos utilizados...........................................................................
Reforma Psiquitrica.....................................................................................................................
Franco Basaglia.............................................................................................................................
Cuidar sim, excluir no.................................................................................................................
Fontes de consulta.........................................................................................................................
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O Centro Cultural da Sade (CCS) foi inaugurado em dezembro de 2001, poriniciativa da Coordenao-Geral de Documentao e Informao da Subsecretaria deAssuntos Administrativos da Secretaria-Executiva do Ministrio da Sade (MS).
Localizado no Corredor Cultural do Rio de Janeiro, visa a integrar os campos dainformao e da comunicao utilizando-se de uma linguagem criativa que permite aopblico conhecer e compreender aspectos histricos, sociais, polticos e cientficos da SadePblica no Brasil, incentivando a participao da sociedade nas questes de sade,favorecendo a adoo de prticas preventivas.
Tem como objetivo prestar atendimento ao pblico mediante servios de informao
em Sade como exposies in locoe virtuais; eventos culturais e tcnicos; exibies de vdeos;orientao ao usurio da internet sobre consulta e pesquisa s redes governamentais deservios; divulgar e oferecer os servios da Biblioteca Virtual em Sade; apresentar aosvisitantes os servios de informao prestados pela esfera federal do SUS, como DisqueSade, Canal Sade, vdeos do MS e publicaes peridicas e avulsas correntes; empreenderfomento ao estudo, intercmbio, capacitao e pesquisa em Sade Pblica.
Com um pblico superior a 16.000 visitantes desde a sua inaugurao, o CCS jabrigou as mostras Memria da Loucura, que apresenta a trajetria da psiquiatria no Brasil;Cinco Artistas de Engenho de Dentro, integrante da exposio Retrospectiva Cinqentenrio doMuseu de Imagens do Inconsciente, com 63 obras do acervo do Museu; A Sade Bate Porta,que traz a histria do Programa Sade da Famlia; as exposies cedidas pela Fundao
Oswaldo Cruz e pela Fundao Nacional de Sade, Imagens da Peste Branca: Memria daTuberculoseeDengue; Sociedade Viva Violncia e Sade, que aborda a questo dos acidentes eviolncias e a preveno desses eventos, por meio da participao comunitria.
Em parceria com as unidades psiquitricas municipais do Rio de Janeiro, o CCScoordena o Projeto de Recuperao Documental, disponibilizando 20 estagirios das reas debiblioteconomia, museologia, arquivologia e histria para dar apoio na organizao dosacervos arquivsticos, bibliogrficos e museolgicos.
Editou e distribuiu a Legislao em Sade Mental 1990-2002, que encontra-seesgotada em sua terceira edio com tiragem total de 16.750 exemplares, e com a quartaedio, atualizada e revista, j programada. Assim tambm com o livro A Histria de Beta,relato de uma ex-usuria de instituies psiquitricas que conseguiu superar as dificuldades eprosseguir na luta cotidiana por uma vida digna. Com a primeira edio tambm esgotada(700 exemplares), uma nova tiragem est sendo editada.
Seu sitena internet (www.ccs.saude.gov.br) oferece informaes atualizadas sobrequestes de sade, agendas, mostras virtuais e linkspara entidades acadmicas e culturaisrelacionadas.
APRESENTAO DO
CENTRO CULTURAL DA SADE
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APRESENTAO DA MOSTRA
A Mostra Memria da Loucura apresenta, em cinco mdulos, a trajetria dos 150 anosda Histria da Psiquiatria no Brasil, expondo as diversas formas de tratamento, as
personalidades relevantes, as influncias estrangeiras, os depoimentos, fotografias inditas e
mostra de vdeos na rea de Sade Mental.
A trajetria da assistncia psiquitrica foi marcada por isolamentos e teraputicas
repressoras e desumanas. Uma histria que a sociedade hoje se empenha em reescrever,otornando realidade a Lei Antimanicomial n. 10.216, de 6/4/2001, que dispe sobre a
humanizao da assistncia e a gradativa desativao dos manicmios. Apesar desse
importante avano, muitos preconceitos ainda persistem e muitas conquistas ainda se fazemnecessrias para que o Pas garanta os legtimos direitos civis e humanos s pessoas
acometidas de transtorno mental.
O Ministrio da Sade pauta esse debate ao incorporar uma forma instigante e criativa
de despertar o interesse do pblico e ao agregar valores nas instituies por onde passa,
procurando mudar essa realidade e favorecer a incluso social dos usurios dos servios de
Sade Mental e a atuao do Estado.
Para realizar um trabalho de maior abrangncia, foi idealizada uma itinerncia da
mostra pelas cidades brasileiras e tambm sua veiculao pela internet. A mostra Memria da
Loucura j foi montada em Santo Andr (SP), Betim (MG) e Nova Friburgo (RJ), e o sitedo
Centro Cultural da Sade (www.ccs.saude.gov.br), alm de apresentar a mostra virtual,
complementa o conjunto de informaes. O usurio pode ter acesso legislao, aos
documentos e s publicaes com textos na ntegra e linksde interesse, com destaque para o
Portal da Sade (www.saude.gov.br) e os servios de pesquisa da Biblioteca Virtual em Sade
(www.saude.gov.br/bvs).
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! UM BREVE HISTRICO DA PSIQUIATRIA
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Por muito tempo, os portadores de doenas mentais foram considerados alienados.Eram vistos como pessoas que viviam fora da realidade, sem capacidade para entender ouexercer seus direitos. Hoje, essa histria j mudou bastante e a luta diria para que osusurios de servios de Sade Mental possam ter um tratamento diferenciado e para que asociedade os respeite como seres humanos comuns, mesmo com capacidades restritas ealgumas limitaes. Apesar dos avanos do modelo assistencial e da humanizao doatendimento, a histria mostra que as atitudes em relao aos portadores de transtornosmentais nem sempre foram as mais adequadas.
Na Grcia Antiga, acreditavam que os loucos possuam poderes divinos. Na IdadeMdia, eram associados ao demnio e vistos como entes possudos e, por isso, passavam seus
dias acorrentados e expostos ao frio e fome ou, em casos extremos, queimados em fogueirascomo hereges.Esse tipo de tratamento se estendeu at o sculo XVIII. Nessa poca, ainda no se falava
em doena mental e, como sempre, o desleixo com as pessoas acometidas de transtornosmentais persistia. Todos que apresentavam um comportamento diferente, sobretudo quandoagitados e agressivos, eram considerados loucos, e a sociedade, preocupada apenas com a suasegurana, permanecia com a mesma conduta: jogava os loucos em prises e eles l ficavam aolado de outros excludos espera da morte .
As reformas polticas e sociais, na virada do sculo XVIII para o sculo XIX, inspiraramo francs Philippe Pinel a dar o primeiro passo para mudar a vida dessas pessoas. A loucuratornou-se uma questo mdica e passaria a ser vista como uma doena que poderia e deveriaser tratada. Surgiram a clnica, como local de internao, e os estudos sobre psiquiatria. Comessa nova estrutura, coube aos enfermeiros os cuidados com os loucos. Na constantetentativa de dominar a loucura e defender-se de tudo o que o desconhecido representava, asinstituies psiquitricas no mundo inteiro se transformaram em locais de represso, onde opaciente era isolado da famlia que desconhecia ou ignorava o que se passava com ele.
A partir dessas mudanas, o mdico que se especializava no tratamento dos alienadosera chamado de alienista e, aps essas transformaes, grandes nomes se destacaram namedicina por suas pesquisas e inovaes nessa rea. Nesse perodo, pode-se destacar otrabalho de Esquirol, aluno e seguidor de Pinel, precursor da psiquiatria, e integroujuntamente com Morel (1809-1873) e Edouard Sguin (1812-1880) a escola francesa iniciadapor Pinel. No sculo XIX, Emil Kraepelin, integrante da corrente organicista alem, que apscuidadosa descrio de sintomas clnicos, a evoluo e a anlise anatomopatolgica, formulauma nova doutrina que serve de referncia s prximas geraes de especialistas. No sculoXX, Freud cria a psicanlise que se populariza em todo o mundo e se impe como marco nocampo da Sade Mental.
Apesar de toda a evoluo dos estudos sobre a mente, entre 1940 e 1960 algumasterapias beiravam barbrie. Havia o eletrochoque (ainda usado, nos dias atuais, em casosgraves com laudo de junta mdica), a malarioterapia (contaminao do paciente com oprotozorio da malria na tentativa de criar distrbios), a insulinoterapia (coma diabticoprovocado por meio de injeo de insulina) e o uso do cardiazol (droga para provocarconvulses).
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Na dcada de 60, Kaplan e sua psiquiatria preventiva e as experincias dascomunidades teraputicas da Inglaterra criaram outros paradigmas at as idias de FrancoBasaglia, lanadas na Itlia, em 1968 e influentes at hoje no cuidado com o pacientepsiquitrico. Atualmente, o Brasil se encontra em pleno desafio de implementar um processode desospitalizao no tratamento de portadores de sofrimento psquico. O objetivo dos
partidrios da Reforma Psiquitrica transformar o quadro da Sade Mental em uma novarealidade, que tenha como lema " Cuidar, sim, excluir, no".As palavras de Octvio Incio, paciente do Centro Psiquitrico Pedro II, atual Instituto
Municipal de Assistncia Sade Nise da Silveira, descrevem bem o que representa para uminterno a conteno atrs das barreiras de uma instituio. "O muro bonito para quem estdo lado de fora, mas para quem est aqui, horrvel. Este muro serve para fechar nossa vidapara o lado de fora, ns nunca poderemos ser considerados gente com um muro dessestapando a nossa viso". Hoje, boa parte desse muro foi substituda por uma grade e os doentespodem circular dentro do hospital e inclusive fora dele.
Esses esforos j do sinais positivos, especialmente pela forma com que se encara o
problema. Nesse mesmo hospital, est sendo construda uma nova realidade: a CasadEngenho. Criada em 1990, esse espao no se parece com um hospital. Dentro dele o que h muito trabalho e calor humano.
Pessoas portadoras de transtorno mental que so tratadas corretamente e vivem comdignidade participam da sociedade como qualquer outro cidado. E so vrios os exemplos deinstituies que, mudando a forma de tratar seus usurios, vm transformando a vida demuita gente. Muitos ambulatrios especializados em Sade Mental s recorrem internaoem ltimo caso e desenvolvem vrias atividades, no s com o usurio, mas tambm com suasfamlias, oferecendo assistncia ambulatorial de consultas e oficinas teraputicas.
A cidade de Santos, no litoral de So Paulo, foi a pioneira na transformao da Sade
Mental no Brasil. Foi a primeira cidade brasileira e a quarta do mundo a construir uma rede deservios que substitua inteiramente o asilo e o manicmio.No Instituto Philippe Pinel, no Rio de Janeiro, tambm se realiza um trabalho
diferenciado. Trata-se da TV Pinel, um espao em que os usurios tm a possiblidade de seexpressar por meio da televiso. Em Volta Redonda, tambm no Rio de Janeiro, existe umaexperincia muito interessante: A Usina dos Sonhos. Nesse ambulatrio especializado, osusurios do asas a sua criatividade e transformam sonhos em realidade. Fazem artesanato,jardinagem, pintura; escrevem em um jornal e possuem at um conjunto musical, osMgicos do Som.
Com a implementao da Lei n. 36.570, de 1989, que consolida a substituio dos
servios de natureza manicomial para servios abertos na comunidade, surgem os Centros deAteno Psicossocial (CAPS), dentre outros. Essas unidades de tratamento intensivo paraportadores de sofrimento psquico precisam contar com, no mnimo, um psiquiatra, umenfermeiro e mais trs profissionais de nvel superior, podendo ser clnico geral, psiclogo,assistente social, terapeuta ocupacional, dentre outras categorias, alm de quatroprofissionais de nvel mdio como auxiliar de enfermagem, arteso, tcnico administrativo eeducacional, dentre outros, de acordo com a proposta do centro. Nessas equipes, enfatizadaa busca de autonomia, emancipao, liberdade e o direito de expresso dos usurios.
A luta pela melhoria da ateno Sade Mental uma bandeira do Sistema nico deSade (SUS), responsvel pela quase totalidade do tratamento psiquitrico. No Brasil,
experincias bem-sucedidas no faltam e podem ser reproduzidas. A conscientizao polticase faz presente para a ampliao desses servios, de forma igualitria e humanizada,proporcionando aos portadores de transtornos mentais a possibilidade de reinsero social.
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PhilippePinel
1745-1826
"(...) h sempre umresto de razo no mais alienado dos alienados.
Publica oTratado mdico-filosfico sobre a alienao ou a mania(1801), no qual descreve uma nova especialidade mdica queviria a se chamar psiquiatria (1847).
Sintonizado com os ideais revolucionrios franceses de liberdade,
igualdade e fraternidade, preconiza o tratamento moral para osalienados e desacorrenta os loucos em Paris. Sua prtica mdicaexercida durante os anos em que chefia os hospitais em Bictre eLa Salptrire na Frana, aliada a sua profunda reflexo sobre aalienao mental, concorre para inaugurar a Escola dos AlienistasFranceses.
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PHILIPPE PINEL
1745-1826
Jlia Paglioza lvares1
Philippe Pinel nasceu em 20 de abril de 1745, em Saint-Andr, Tam, Frana, e faleceu em 25 de
outubro de 1826, em Paris. Filho de mdico, formou-se em medicina em Toulouse no ano de 1773.
Mudou-se para Paris em 1778 e, para se sustentar, traduzia obras de medicina, ao mesmo tempo em
que lecionava matemtica.
Nessa poca, Pinel visitava doentes mentais confinados e escrevia artigos sobre suasobservaes. Em 1792, tornou-se mdico-chefe do asilo para homens, em Bictre. Em 1794, passou
a ocupar idntico posto no Hospital La Salptrire, para mulheres. Em 1803, foi eleito membro do
Institut de France e, mais tarde, professor de patologia da Escola de Medicina de Paris.
Sob sua direo, o Hospital La Salptrire tornou-se um dos mais conhecidos
estabelecimentos neuropsiquitricos do mundo, sendo que, mais tarde, com acertada justia, l
seria erguida uma esttua em sua memria.
Costuma-se falar de Philippe Pinel como um homem dotado de generosidade incomum suapoca. Homem bondoso, cheio de atos caridosos para com os sofredores. O libertador dos alienados,
aquele que lhes quebrou as correntes e lhes deu dignidade, que os retirou das celas s quais estavam
confinados h anos, atos que deixaram a sociedade e a classe mdica estarrecidas.
Pinel, como se v, teve fartas razes para ser considerado pioneiro no tratamento de doentes
mentais, sendo um dos precursores da psiquiatria moderna, ramo da medicina a que ele se dedicou
aps a tragdia ocorrida com um amigo seu conta-se que tendo enlouquecido, o amigo fugiu para
a floresta onde foi devorado por lobos.
Sem dvida, foi um revolucionrio no mtodo de tratamento dos doentes mentais. Para a
Frana Revolucionria, era de profundo interesse que seus cientistas se sobressassem e Pinel se
constituiu, na rea da medicina e da psicologia, em um dos seus principais expoentes. Seus escritos
privilegiam o refinamento literrio, caracterstico da Europa do sculo XVIII e incio do sculo XIX,
em que predominaram as concepes de humanismo e liberalismo, de forte influncia iluminista.
Pinel elevou a categoria dos doentes mentais, antes tratados como criminosos ou endemoniados,
condio dehomo paciense essa doena, como resultado de uma exposio excessiva a estresses sociais e
psicolgicos, e, em certa medida, a danos hereditrios, sendo que tais enfermidades decorriam de
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alteraes patolgicas no crebro. Com isso, baniu tratamentos antigos tais como sangrias, vmitos,
purgaes e ventosas, preferindo terapias que inclussem a aproximao e o contato amigvel com o
paciente, proporcionando-lhe, ainda, um programa de atividades ocupacionais, no qual o tratamento
digno e respeitoso foi a tnica.
O sculo XVIII na Europa foi aquele em que reinou, de forma absoluta, a razo, emanada do
pensamento de Descartes e entronizada pelos iluministas. Dessa forte tradio, procedeu o pensamento
de Philippe Pinel, em que o psquico se tornou matria de conhecimento objetivo e quantitativo.
Pinel foi o primeiro a elaborar uma classificao para as doenas mentais, fato este que
constituiu extraordinrio avano da psiquiatria. Utilizou como principal mtodo a observao e a
anlise de seus pacientes.
Em sua primeira obra, Nosographie Philosophique (1798), destinada classificao das
doenas, distinguiu vrias psicoses e descreveu, dentre outros fenmenos, alucinaes, isolamentos,
e uma variedade de outros sintomas, o que lhe rendeu grande projeo. Seu principal livro, um dos
clssicos da psiquiatria,Trait Mdico-philosophique sur l'alination Mentale ou la Manie (1801),
discutiu sua abordagem psicologicamente orientada.
Pode-se dizer que Philippe Pinel distinguiu-se pelas inovaes que introduziu. Sua orientao
foi visivelmente psicolgica, suas idias caractersticas de sua poca, do Iluminismo e das tendncias
promovidas pela Revoluo Francesa: igualdade, liberdade e fraternidade.A psicologia, tendo em vista o momento em que as cincias fsico-qumicas e biolgicas
monopolizavam as atenes, adotou, com a contribuio de Pinel, um modelo de cientificidade,
inspirado no marco referencial Galileico-Baconiano, uma nova epistemologia e uma nova viso do
homem que, em determinadas circunstncias da vida e de sua conflitualidade, expressa o sofrimento
humano atravs da mente e da alma.
Foi dessa forma que a psicologia, na metade do sculo XIX, aprendeu a considerar o seu material
de estudo como parte da natureza e a tentar explic-lo em termos naturais, ou seja, a psicologia tornou-se capaz de construir uma cincia, tanto na matria como no mtodo, faltando pouco para passar a ser
experimental, tarefa empreendida por Wundt, em Leipzig, ao criar o primeiro laboratrio de psicologia.
Assim, por qualquer lado que se olhe a vida e a obra desse extraordinrio psiquiatra e
psiclogo, encontrar-se- sempre a marca de algum que revolucionou a concepo de loucura de
um tempo e promoveu um caminho de humanizao e de libertao para o enfermo mental,
inscrevendo-o nos mais nobres iderios da modernidade: dignidade e liberdade!
O moderno movimento de humanizao dos manicmios, a que esto engajados osorganismos de ponta da evoluo social, no podem esquecer, na sua trajetria de luta, que o seu
representante primeiro, foi, sem sombra de dvida, Philippe Pinel.1 Jlia Paglioza lvares psicloga e integrante da Academia Brasileira de Psicologia.
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"No hospcio o que cura o prprio hospcio. Por sua estrutura efuncionamento, ele deve ser um operador de transformaes dosindivduos."
Precursor da psiquiatria, integra, juntamente com Auguste Morel(1809-1873) e douard Sguin (1812-1880) a escola francesainiciada por Pinel. Ao penetrar a mente humana, com o intuito decompreender os transtornos do humor e da melancolia comoimportantes agentes que conduzem perda do juzo, eleva pelaprimeira vez os alienados condio de homens.
Reformador de asilos e hospcios franceses, funda o primeirocurso para o tratamento das enfermidades mentais e luta pelaaprovao da primeira Lei de Alienados na Frana. Seu trabalhoinfluencia sobremaneira a criao do Hospcio de Pedro II,primeira instituio brasileira de assistncia aos doentes mentais.
Esqu
irol
1772-1840
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Em Paris, Esquirol conhece Pinel trabalhando no hospital La Salptrire.
Esquirol, atuando como reformador das instituies psiquitricas, visita os asilos,
hospitais e prises de toda a Frana.
nomeado mdico plantonista da diviso de alienados de La Salptrire, tornando-se
mdico titular no ano seguinte.
Inaugura em La Salptrire um curso clnico de medicina mental, onde suas qualidades
de orador atraem um grande pblico. Torna-se um discpulo ortodoxo de Pinel. Como seu
mentor, Esquirol acha que a loucura tem causas fsicas e morais, insiste na tendncia
hereditria e coloca na raiz do organismo a causa principal do transtorno mental. Critica os
conceitos mesogrficos de seu mestre Pinel, e volta a dividir as molstias mentais em quatro
grupos principais: demncia, cuja forma aguda e curvel chamada de estupidez; idiota,
termo que ele prefere a idiotismo;mania, delrio geral com exaltao; e a parte mais original e
criticada de sua obra clnica, o vasto grupo de monomanias, derivado do desdobramento da
melancoliade Pinel, delrio parcial crnico, de natureza alegre ou triste, mas limitado a um
nmero pequeno de objetos. Esquirol subdivide esse novo conceito em trs categorias: as
monomanias intelectuais, no qual o delrio est no primeiro plano uma das mltiplas formas
possveis a lipomania ou melancolia, com delrio crnico parcial, sustentado por uma triste
paixo, debilitante e opressiva; asmonomanias afetivasou ressonantesque levam o doente a
condutas bizarras e inconvenientes; e asmonomanias instintivasque reagrupam as futuras
perverses e psicopatias e que sero a fonte de violentas contestaes, na medida em que
parecem fornecer as justificativas de comportamentos criminais, num tempo em que a
medicina legal estava em vias de formao.
Acolhe em sua casa alguns alienados pagantes.
Torna-se membro da Academia de Medicina.
Assume o posto de mdico chefe da Maison Royale de Charenton por falecimento de
Royer Callard.
nomeado membro do Conselho de Salubridade Pblica do Departamento do Sena,
participando ativamente com seus alunos Ferrus e J.P. Falret, dos trabalhos preparatrios da
Lei n. 1.838 sobre os alienados.
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ESQUIROL
1772-1840
1799
1807
1811
1817
1817
1820
1825
1826
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Adquire uma vasta propriedade e nela instala uma casa de sade que dirige com seu
sobrinho, M itivi. Comea a colocar em prtica suas idias sobre a construo de asilos que
ele tinha apresentado no seu clebre relatrio de 1819 ao Ministro do Interior,
Os estabelecimentos destinados aos alienados na Frana e os meios de melhor-los.
Publica os dois volumes Consideraes das Doenas Mentais sob as vises da
Medicina, da Higiene e da Medicina Legal, que nada mais do que uma coletnea de suas
publicaes anteriores.
1827
1838
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Roberto Machado2
O incio do sculo XIX assinala o momento em que o hospital percebido como fator
patognico, causa de doena e de morte e, portanto, incompatvel com a medicina moderna.
At ento, o hospital no uma instituio mdica; uma entidade religiosa destinada
assistncia a doentes pobres, forasteiros, soldados, marinheiros e outros. No tem por
objetivo a sade, mas a salvao: o planto, por exemplo, do capelo da agonia. Sua
arquitetura no obedece a um plano mdico. No h mdico em sua administrao. Aassistncia hospitalar , portanto, menos uma assistncia doena do que misria na hora
da morte, parte de uma ao criativa da Santa Casa da Misericrdia que inclui crianas
abandonadas, indigentes e prisioneiros.
nesse espao que se encontram os loucos, quando no vagam pelas ruas ou no caso
dos ricos so contidos pelas famlias. E no hospital, ele est como em uma priso: trancado e
at mesmo preso a um tronco de escravos. No considerado um doente; no recebe
tratamento; no tem mdico ou enfermeiro especfico; vive sem condies higinicas. Pode
ser louco, mas ainda no doente mental.
No sculo XIX, a medicina coloniza o hospital. Ruptura com o passado que pode ser
compreendida no s a partir de transformaes mdicas, mas tambm econmicas
advindas da abertura dos portos, intensificao do comrcio, implantao de manufaturas e
polticas que modificaro o Rio de Janeiro depois de 1808 e integraro ainda mais o Brasil na
nova ordem capitalista internacional.
Nesse contexto, o papel que desempenham os mdicos tem um objetivo claro:
combater a desordem social, o perigo dos homens e das coisas decorrente da no-planificao
da distribuio e do funcionamento da cidade. A medicina comea a se interessar por tudo o
que diz respeito ao social. Deixa de ter fronteiras. Pea integrante da nova estratgia poltica
de controle dos indivduos e da populao, vai pouco a pouco no sem lutas e obstculos
impregnar o aparelho de Estado e se interessar por instituies como a escola, o quartel, a
priso, o cemitrio, o bordel, a fbrica, o hospital, o hospcio...
Sua poltica em relao ao hospital clara: dominar o perigo que grassa no seu interior.
E para isso no basta expulsar o hospital do centro da cidade; necessrio transformar o seu
POLTICA E HOSPITAL PSQUITRICO
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espao, para capacit-lo a realizar a cura. O hospital um operador teraputico, uma
mquina de curar.
Essa poltica orientou, em 1841, criao, no Rio de Janeiro, do primeiro hospital
psiquitrico brasileiro. Resultado de uma crtica higinica e disciplinar s instituies de
recluso, o Hospcio de Pedro II significou a possibilidade de inserir, como doente mental, uma
populao que comea-se a perceber como desviante nos dispositivos da medicina social
nascente. De que forma? Realizando os seguintes objetivos: isolar o louco da sociedade;
organizar o espao interno da instituio, possibilitando uma distribuio regular e ordenada
dos doentes; vigi-los em todos os momentos e em todos os lugares, atravs de uma pirmide
de olhares composta por mdicos, enfermeiros, serventes...; distribuir seu tempo,
submetendo-os ao trabalho como principal norma teraputica. Terrvel mquina de curar,que levou Esquirol a afirmar: no hospcio o que cura o prprio hospcio. Por sua estrutura e
funcionamento, deve ser um operador de transformao dos indivduos. Em suma, uma
nova mquina de poder, resultado de uma luta mdica e poltica que impe, cada vez com
mais peso, a presena normalizadora da medicina como uma das caractersticas essenciais da
sociedade capitalista.
Mas o hospital psiquitrico no est isento de crticas. Elas o acompanham desde sua
origem. E no s crticas externas. Principalmente crticas internas: de seus mdicos ou seusdiretores. Como os ilustres Nuno de Andrade, Teixeira Brando, Juliano Moreira que atacam
sua organizao arquitetnica, a subordinao do mdico ao pessoal religioso, a ignorncia ou
a maldade dos enfermeiros, o processo no-mdico de internao, a falta de uma lei nacional
para alienados e de um servio de assistncia organizado pelo Estado.
Essas crticas, hoje ainda mais virulentas, so importantssimas para fazer pensar no
s no fracasso real da psiquiatria como instncia teraputica, mas, principalmente, na
exigncia de medicalizao cada vez maior do espao social que ela representa. Por um lado, se
a medicina mental apresenta a cura como sua aquisio cientfica, at hoje nunca deixou de
reconhecer o seu lado negro: s se entra no hospcio para no sair ou, na melhor das hipteses,
para logo depois voltar. Por outro lado, essa reconhecida incapacidade teraputica, longe de
pr em questo a prpria psiquiatria, serve fundamentalmente de apoio a uma exigncia de
maior medicalizao. A crtica faz a psiquiatria, cada vez mais, refinar seus conceitos para
atingir novas faixas da populao numa evoluo que vai do doente mental ao anormal e do
anormal ao prprio normal , tornando a sociedade uma espcie de asilo sem fronteiras.
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A questo poltica da psiquiatria me parece assim mais profunda do que em geral se
pensa. Ser que as transformaes contemporneas propostas prtica e teoria
psiquitricas, mesmo as que se vestem de psicanlise em seus conceitos bsicos, se intitulam
psiquiatria como instncia poltico-cientfica de controle normalizador da vida social,
caracterstica que a acompanha desde sua constituio?
2 Roberto Machado psicanalista e professor titular do Instituto de Filosofia e Cincias Sociais da UFRJ , autor de vrios livros editados por
algumas das mais importantes editoras do Pas. 19
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Paulo Srgio da Silva Alencar3
Em 1830, no h ainda no Brasil tratamento para os doentes mentais: os ricos so
mantidos isolados na casa da famlia, longe dos olhares curiosos, enquanto os pobres
perambulam pelas ruas ou vivem trancafiados nos pores da Santa Casa de Misericrdia.
Nessa poca, inspirados pelos ideais revolucionrios franceses de Pinel e Esquirol,
propem-se novas formas de assistncia doena mental, que tem na existncia da
instituio manicomial o prprio mtodo de tratamento.
Essas idias contagiam a recm-criada Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, que se
mobiliza em torno do lema Aos loucos o hospcio!, pleito esse formulado em 1839 nocontundente relatrio de Jos Clemente Pereira:
Parece que entre ns a perda das faculdades mentais se acha qualificada como crime
atroz, pois punida com a pena de priso, que pela natureza do crcere onde se executa, se
converte na de morte.
Sensibilizado por essas denncias e impressionado com os gritos dos loucos vindos dos
pores da Santa Casa, Pedro II assina, em 1841, o decreto de criao do primeiro hospcio
brasileiro que, por 40 anos, leva seu nome.
Sagrao de Pedro I I e decreto de criao do hospcio. Jos Clemente Pereira faz
relatrio a D. Pedro II em que descreve a real situao dos doentes mentais na Santa Casa.
O Hospcio de Pedro II inaugurado com 140 leitos.
A inaugurao do suntuoso Hospcio de Pedro II, em 1852, instalado na praia da
Saudade, retira os pacientes da Santa Casa de Misericrdia, que se encontravam em condies
insalubres, e acena com a possibilidade do tratamento moral. Surge a primeira instituio
psiquitrica do Brasil.
Localizado em uma chcara afastada do centro da cidade, foi construdo com dinheiro
de subscries pblicas. O edifcio, em estilo neoclssico, era provido de espaos suntuosos e
decorao de luxo, e passa a ser popularmente conhecido como o palcio dos loucos.A amplido dos espaos, a disciplina, o rigor moral, os passeios supervisionados, a
separao por classes sociais, os diagnsticos e a constante vigilncia dos enfermos,
materializada arquitetonicamente como um panptico, representam o nascedouro da
psiquiatria no Brasil.
3 Paulo Srgio da Silva Alencar psiquiatra e atualmente trabalha na Escola Politcnica Joaquim Venncio Fiocruz
1841
1852
AOS LOUCOS, O HOSPCIO
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Nuno de Andrade foi trabalhar no Hospcio de Pedro II onde foi o primeiro a lutar pela
desanexao da Santa Casa de Misericrdia.
Permanece no Hospcio de Pedro I I at a chegada de Teixeira Brando. Deixa o cargo e
passa a dar aulas de psiquiatria na Faculdade de Medicina e a escrever artigos para jornal.
Realizado o primeiro concurso da rea de psiquiatria no Pas, no qual cinco
candidatos se inscrevem. Dentre eles Teixeira Brando, um mdico do interior do Rio de
Janeiro.
1883
NUNO DE ANDRADE
1851-1922
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TEIXEIRA BRANDO
1854-1921
considerado o primeiro alienista brasileiro devido ao concurso de 1883, no qual
aprovado com louvor e assume, portanto, o cargo de diretor do Hospcio de Pedro II. Ao
assumir, Teixeira Brando se choca com o poder das freiras e entra em confronto com a
administrao. Tambm se torna um dos grandes responsveis pela desanexao do Hospcio
de Pedro II da Santa Casa de Misericrdia.
Essa desanexao acontece com a chegada da repblica e assim o hospcio passa a se
chamar Hospcio Nacional de Alienados. Sob sua administrao, Teixeira Brando funda, em
1904, a Escola Alfredo Pinto, a primeira de enfermeiros do Brasil. Era o incio da formao em
enfermagem no Pas.
Assim, criada a assistncia mdica aos alienados e Teixeira Brando assume, com essa
mudana, outro cargo dentro do mesmo hospital, acumulando os cargos de diretor e o de
administrador.
Em 1902, Teixeira Brando se torna deputado federal e elabora a primeira lei de
Assistncia aos Alienados.
Devido lei que probe o acmulo de funes, Teixeira Brando obrigado aabdicar de
algum cargo, e com isso acaba optando em deixar o Hospital Nacional de Alienados e passa a
se dedicar poltica, a dar aulas na faculdade e a escrever para jornal, fazendo uma trajetria
parecida com a de Nuno de Andrade.
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Edmar de Oliveira4
Alguns pronturios encontrados nos arquivos do Centro Psiquitrico Pedro II nos levam
aos anos entre 1854 e 1861 e com eles classificao social do paciente, subdivididos em
primeira, segunda e terceira classes, o que parece ser um dado importante para as anamneses
da poca.
Entre os de primeira classe, chama ateno serem pacientes moradores da corte,
brancos, cidados, fazendeiros ou funcionrios pblicos, e em nmero muito pequeno em
relao s outras classes.
Na segunda classe, encontramos lavradores e pessoas que tm o ofcio de prendas
domsticas, ainda brancos e livres.
Na terceira, so todos escravos, pretos, pertencentes a um senhor importante, j que na
sua identificao possuam apenas o primeiro nome seguido da nomeao senhorial: escravo
de tal senhor, com nome e sobrenome para o seu imediato reconhecimento na corte.
Acrescente-se ainda a nao africana de origem: Nag, Congo, Iorub, Mirra, dentre outras.
Nesse perodo, no havia sido abolida oficialmente a escravido no Pas, no entanto, outra
classificao aparece em maior nmero do que as das trs classes anteriores. So os
indigentes. s vezes, possuam apenas o primeiro nome, outras vezes j traziam
sobrenome. Nessa classificao esto, sobremaneira, os pretos ou pardos libertos. Eram
funileiros, carvoeiros, quitandeiros ou cozinheiros, mas, em sua maioria, no tinham
profisso. Essa parece ser uma classe inferior terceira, pois libertos no possuam ostatusde
pertencerem a um senhor.
Foi encontrado ainda um nico pronturio que no pertence s classificaes anteriores.
Est classificado como pobre. Possua nome e sobrenome, era branco, livre, brasileiro,
paulista, morador da corte, tinha 26 anos, era solteiro e estudante.
Quais seriam os tratamentos ou a destinao arquitetnica que o Hospcio de Pedro II
disporia para essas novas classificaes?
Os pacientes de primeira e segunda classes habitavam quartos individuais ou duplos,
ficavam entretidos com pequenos trabalhos manuais ou jogos. Os de terceira e muito
AS CLASSES SOCIAIS DA CORTE E O
HOSPCIO DE PEDRO I I
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provavelmente, os pobres e indigentes trabalhavam na manuteno, na jardinagem, na
limpeza e na cozinha. Paradoxalmente, se recuperavam em maior nmero que os primeiros
que, paralisados pelo cio, perpetuavam-se na internao.
4 Edmar de Oliveira psiquiatra e diretor do Instituto Municipal de Assistncia Sade Nise da Silveira (IM ASNS).
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"O manicmio deve diferir o mnimo possvel de uma casa particular."
Discpulo de Wilhelm Griesinger (1817-1868), integra a correnteorganicista alem. Aps a descrio acurada de sintomas clnicos,sua evoluo e a anlise anatomo-patolgica, formula suadoutrina que, expressa no livro Psychiatrie, serve de referncia amuitas geraes de especialistas em doenas mentais. Isola asformas bsicas da enfermidade psquica: psicose manaco-depressiva e demncia precoce; e promove a separao entredemncia senil e paralisia geral.
Dirige durante muitos anos a Clnica de Munique, onde buscaoferecer aos pacientes um ambiente semelhante ao domstico,que influencia a formulao da primeira legislao brasileira deassistncia s doenas mentais.
EmilK
raepelin
1855-1926
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Poucas personalidades da histria da psiquiatria brasileira tiveram uma trajetria igual a
de Juliano Moreira. Do pobre menino negro, nascido em Salvador, Bahia, em 1873, filho de
gente humilde, ao mdico de rara cultura, inteligncia e distinta sensibilidade, foi reconhecido
em todo o mundo como um dos grandes de sua poca. Foi um dos mdicos que introduziu a
psiquiatria no Brasil.
Aps formar-se mdico, aos 19 anos de idade, Juliano aprende alemo, ingls e francs,
que o auxiliaram a recolher influncias estrangeiras, a mostrar o seu trabalho e ser
reverenciado fora de seu Pas. Organizou a maior biblioteca de Psiquiatria da Amrica Latina,
com publicaes de vrios pases, hoje no Instituto Municipal de Assistncia Sade Nise da
Silveira.
Em 1903, o governo Rodrigues Alves, disposto a profundas mudanas, delega a Juliano
Moreira a direo do Hospcio Nacional de Alienados, da Praia Vermelha, cargo que ocupou
durante 27 anos, acumulando posteriormente com a Direo Geral da Assistncia aos
Alienados no Brasil.
Juliano implementa medidas que visam a novos rumos na psquiatria brasileira. Incinera
as camisas-de-fora e abre espao para dilogo com seus pacientes. Ele afirmava que com
enfermeiros preparados se podia reduzir pela metade o nmero de pacientes que se tornavam
crnicos.
Realiza reformas separando o hospital em classes sociais, aplica diagnsticos, cria
sesses e pavilhes, com destaque para o pavilho Bourneville para crianas, separando-as dos
adultos. Cria tambm lugares para epilticos, tuberculosos e separa os internos por gnero,
criando alas femininas e masculinas.
A reforma do hospcio, entretanto, dependia da reforma da legislao. Teixeira Brando,
seu antecessor na direo do hospcio e fundador da primeira escola de enfermagem do Brasil,
em 1890, j como deputado, aprova a primeira legislao da assistncia a alienados no Brasil.
JULIANO MOREIRA
1873-1933
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1892-19431911-1984
Incansvel em suas lutas, Ulysses Pernambucano,empreendedor de uma psiquiatria politicamente engajada,dirige o Hospital da Tamarineira Pernambuco, em que ospacientes, no mais contidos nos leitos, ocupam-se dapraxiterapia.
Alm das inmeras contribuies no campo da psiquiatria e dapsicologia social, destaca-se pelos trabalhos no campo dasdrogas entorpecentes e alucinognicas, dos testes psicolgicose nas pesquisas de laboratrio e reas clnicas epsicopatolgicas.
Discpulo de Pernambucano, Luiz Cerqueira, um pioneiro dadesospitalizao psiquitrica, cria, como Coordenador deSade Mental do Estado de So Paulo, o Centro de AtenoDiria (1973).
Alm de docente da Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto ede autor de vrios livros, entre os quais Psicologia Social,destaca-se pelo trabalho incansvel de levantamentos sobre ascondies da assistncia sade mental no Brasil e, sobretudo,pela denncia dos rumos mercantilistas da atividadepsiquitrica que qualifica de"indstria da loucura".
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Ulisses era incansvel em suas lutas, empreendedor de uma psiquiatria diferenciada e
engajada politicamente. Sempre crtico, dirigiu os servidores do Hospital de Tamarineira, em
que os pacientes no eram mais contidos no leito e se ocupavam em servios praxiterapia.
Ulisses defendia trabalhos em nveis de preveno primria, secundria e terciria.
Foi preso durante a ditadura do Estado Novo, acusado de pregar idias subversivas aos
seus alunos. Ao contrrio dos seus colegas de ofcio, considerava os pacientes plenamente
capazes. Estimulava o lado bom e crtico de cada um.
Desta maneira, Luiz Cerqueira, psiquiatra alagoano, destaca-se como um dos
precursores da psiquiatria social no Brasil.
Cerqueira trabalhou com dados estatsticos denunciando as condies precrias da
assistncia e os rumos mercantilistas das atividades mdico-psiquitricas, que chamou de
indstria da loucura.
A indignao de Cerqueira, associada com a de seus inmeros alunos do Rio de Janeiro e
Ribeiro Preto, lugares onde foi professor, contribuiu para a aprovao da lei que hoje
extingue progressivamente os manicmios no Brasil.
ULISSES PERNAMBUCANO E LUIZ CERQUEIRA
1911-19841892-1943
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No perodo em que Oswaldo Santos e Wilson Jos Simplcio trabalharam no antigo
Centro Psiquitrico Pedro II, inovando a psiquiatria brasileira com o modelo das
Comunidades Teraputicas, vivamos os anos mais duros da ditadura militar.
A psiquiatria degradada era em sua maior parte repressora e carcerria.
A rotina das enfermarias era o cio, o abandono e a insalubridade. Enfermeiros e carcereiros se
confundiam. Eletrochoques e injees eram aplicados nos mais agressivos.
Simplcio e Oswaldo, o primeiro como supervisor e o segundo como um jovem mdico
paulista, criaram dentro do hospcio uma sociedade em miniatura. Desenvolveram um tipo
de tratamento que j havia sido experimentado no Brasil por Marcelo Blaya, na Clnica Pinel
de Porto Alegre. Nele o poder mdico era diludo entre equipe e pacientes. Havia direitos e
deveres iguais para todos. Pacientes escreviam em livros de ocorrncia e suas idias eram
valorizadas. A meta era fazer sobressair o lado bom de cada um, incentivando a criao.
Apesar de reformular o tratamento sem questionar a existncia do hospcio, essa experincia
foi o marco importante de liberdade e democracia no tratamento da loucura.
WILSON SIM PLCI O E OSWALDO SANTOS
1933-20001924-2001
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SigmundFreud
"Suponhamos que umexplorador chegue regio pouco conhecida, naqual as runas despertamseu interesse (...) ele poder contentar-se emexaminar a parte visvel (...) Mas poder atacar o campo das runas,praticar escavaes e descobrir, a partir dos restos visveis, a partesepultada.
Impressiona-se com as influncias do hipnotismo e, depois de
uma investigao rigorosa dos sonhos, prope a existncia deuma atividade psicolgica inconsciente que extrapola a razo e avontade dos pacientes. Cria a psicanlise como mtodo detratamento das neuroses e faz com que o ato de ouvir no possajamais se afastar da prtica cotidiana em sade mental. Suasidias popularizam-se em todo o mundo e se impem comomarco no campo da sade mental. Seu af de penetrar os espaosrecnditos do ser, o levam condio de"arquelogo da psique".
1856-1939
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Freud elaborou a prtica e a teoria psicanaltica. A finalidade bsica da psicanlise trazer de volta o contedo rejeitado pelo indivduo para a vida consciente, preencher a lacuna
criada pela sua rejeio e assim curar a ferida que divide a personalidade contra si mesma. Isto
, tornar consciente o que estava inconsciente.
Freud traz a luz existncia do processo inconsciente do indivduo. Um fato esquecido,
porm incmodo, quer seja uma lembrana ou um desejo, tornou-se inconsciente no apenas
por haver sido esquecido ou porque saiu da conscincia, mas porque foi forado a isso.
O indivduo reprime ou rejeita a lembrana ou os desejos proibidos por serem
traumticos, da o esquecimento. Porm esse contedo recalcado no est de forma alguma
extinto, age no inconsciente, exercendo a sua influncia de forma encoberta, distorcendo a
conduta de forma fora do comum.
O eu consciente ou ego no pode elimin-lo ou mesmo torn-lo inativo, o ego pode
apenas conserv-lo no inconsciente.
A revelao do inconsciente o eixo central da teoria psicanaltica. Freud desenvolve a
teoria dos sonhos, porque ele descobre que o sonho essencialmente uma satisfao disfarada
dos desejos proibidos que foram reprimidos. As interpretaes dos sonhos revelam o caminho
tortuoso do inconsciente e tambm o carter algico de suas funes. uma das tcnicas que
orientam o psicanalista no processo analtico para tornar consciente os conflitos do indivduo
que se apresentam como sintonia (exemplos: neurose de angstia, medo ou fobia, neurose de
pensamentos obsessivos, hipocondria, parania, esquizofrenia, melancolia, etc.).
Outro ponto fundamental da teoria psicanaltica a nfase sobre a sexualidadeinfantil. Freud conceitua sobre os impulsos sexuais e descreve a fase oral (prazer oral
independentemente das necessidades de alimentar-se suco); a fase anal (prazer nas
necessidades fisiolgicas) e o complexo de castrao (descoberta da diferena entre menina e
menino, em conseqncia disso, a ameaa), dentre outros.
SNTESE DA PSICANLISE DE FREUD
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Era discpulo de Freud, porm afastou-se de seu mestre, para fundar uma nova escola de
psicologia analtica.
Em seus diversos trabalhos, Jung desenvolveu suas concepes, tendo como foco
principal o inconsciente coletivo, que podemos sintetizar dizendo que o fundamento da
imaginao est no inconsciente coletivo que comum a todos os povos atravs dos sculos,
que se manifesta nas religies, nos mitos e nas doutrinas esotricas.
Para verificar essa concepo fundamental, Jung realizou uma vasta pesquisa viajando
por vrios pases, estudou as religies primitivas e orientais, a alquimia, e meditou sobre as
obras artsticas com James Joyce e Pablo Picasso.
Essa imensa pesquisa confirmou a crena quanto existncia de um fundo comum
universal, produtos dos chamados "arqutipos", imagens e smbolos independentes do tempo
e do espao.
Jung observou o caso de um esquizofrnico paranide que dizia: se movesse a cabea
de um lado para o outro olhando o sol, o pnis do sol tambm se movia, e esse movimento era
a origem do vento. Ento Jung encontrou mais tarde na descrio de vises de adeptos de
mitra, publicadas pela primeira vez em 1910, a mesma imagem, a mesma idia daquele
paciente. Pesquisas posteriores continuaram a trazer confirmao para as observaes iniciais
em estudos sobre a esquizofrenia.
Jung, em 1957, escreve:
"Os sintomas especficos da esquizofrenia, na aparncia, so caticos e sem sentido.
Entretanto, examinados em profundeza, caracterizam-se, como certos sonhos, por associa-
es primitivas ou arcaicas estreitamente afins com temas mitolgicos".
Foi da experincia clnica que Jung deduziu os conceitos de inconsciente coletivo e de
arqutipo, importantssimos para a compreenso da prpria natureza da psique.
SNTESE DA TEORIA DE
CARL JUNG
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