lua de papel
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...o amor é um sentimento arisco, que provoca mudan-
ças surpreendentes.
No caso de Alexandra, protagonista de "Lua de Papel",
romance de Lunna Guedes que será lançado em agosto,
a transformação gera desconforto... cheia de rótulos e
oriunda de uma cidade pequena, onde "certo e errado"
são vertentes comuns de seus moradores; a persona-
gem, vê sua conturbada realidade ser esmigalhada por
um sentimento, considerado impróprio. Completamente
apaixonada por Raissa, a amiga que conhece na facul-
dade, Alexandra finge, foge e sucumbe em si mesma.
Com a verve poética que lhe é característica, a autora
conta a história desse conflito interno que é aceitar as
diferenças que norteiam o amor pelo outro, no caso, pe-
la outra...
A narrativa de Lunna Guedes nos oferece desde a pri-
meira linha o mundo de Alexandra Mendes, nos propor-
cionando sabê-la em suas limitações até o instante em
que um novo mundo acena a partir da personagem de
Raissa Mendelson que na história sendo es-
sa personagem sem regras ou preciosismo — vivendo
por viver somente... e a cada novo contato, personagem
e leitor são seduzidos por essa experiência nova e inusi-
tada.
Aceitar-se será, sem dúvida, o maior desafio de Alexan-
dra, que mergulha em um turbilhão de sensações, que
vão do fascínio ao desespero e da tristeza à decepção
num mesmo segundo.
Mais que um romance entre mulheres, Lua de Papel tra-
ta de escolhas e como cada decisão afeta a vida das pes-
soas envolvidas… Sem julgar as personagens em mo-
mento algum, Lunna traça o perfil das mulhe-
res envolvidas nessa trama e nos surpreende com um
cotidiano próximo a todos nós, cabendo ao leitor perce-
bê-los e reconhecer-se neles.
Na vida — nasci em Gênova, (Itália) num dia de novembro, em meio ao outono… Mudei para São Paulo no meio de minha vida, num dia qualquer de agosto... disseram-me que era inverno, mas o asfalto quente e, a atmosfera seca lembravam o verão… Um pouco mais adiante, bem
provável que tenha sido num dia
qualquer de maio, me tornei :
“colecionadora de palavras” —
não há lembranças em mim
acerca da estação.... mas o calen-
dário local dirá que era outono,
mas a alma exibia tempestades
de janeiro, em pleno verão…
No papel — pouco me atenho às publicações e, não me sinto pronta para um argumento defi-nitivo: “em estado de espanto é mi-nha condição no momento”... Talvez por isso tenha escolhido o formato artesanal, que combi-na com essa metamorfose que sou... Minha estreia aconteceu com “Reticências” (2010) - que ce-lebra minha escrita experimen-tal, um olhar para dentro... A primeira edição contou com 30 exemplares, entregues a olhos curiosos e próximos. A seguir veio “Diálogo Notur-no” (2011) — que é esse passo para dentro do precipício e, por fim “Escrevendo Pretéri-tos” (2012) que considero ser – ainda hoje - o meu melhor en-saio. E encerrando a série experimen-tal “diário das 4 estações”: o de-licioso “desenhando sombras no que resta da noite” — que veio celebrar essa fase de olhar para fora...
Na Web — minhas primeiras letras começaram em junho de 2002 quando comecei a dese-nhar palavras no blogue intitula-do por mim de "menina no sótão", que hoje é parte inte-grante do zine "apenas um blogue" publicado em formato artesanal em meados de 2012.. Escritos na primeira pessoa do singular... eram uma espécie de ensaio para os dias seguintes. O ponto de partida da minha escri-ta… Em junho de 2004 surgiu
"caderno vermelho" — por-
que vermelho é o sentir, a emo-
ção, o existir e as palavras que
deixo no avesso da folha e a cor
da capa do caderno onde eu
comecei a inventar figuras
humanas na primeira terceira
pessoa do singular…
Primeira Parte
A cidade é um chão de palavras pisadas
Na primeira página ela anotou o ano em
letras grandes como se acostumou a fazer ao
longo dos últimos anos — aquele era o seu oi-
tavo caderno —, sempre de capa preta com
folhas brancas e linhas retas.
Ainda se lembrava do primeiro caderno —
um presente de sua mãe — o mais caro dos
presentes. O único a fazer diferença de fato. A
deixá-la feliz. Saltitante. Empolgada... nunca
antes um presente causou tal efeito na menina
do interior.
O ritual surgiu por acaso, permanecendo
ano após ano: sentava-se em sua cama. Cos-
tas contra a parede. Pés com meias brancas e
os dedos em movimentos ali dentro... silencio
imperfeito no quarto escuro. Um único fecho
de luz atravessava as frestas da janela indo
pousar, àquela hora — pouco depois das seis
de uma tarde quente de primavera —bem em
cima do lençol branco. Alexandra agitava o
lápis preto entre os dedos das mãos batendo o
lado sem ponta na capa do caderno.
Lua de Papel
O olhar, pouco a pouco, se perdia junto ao
pedaço de paisagem que chegava pelos vãos
da janela se misturando a qualquer coisa sua...
era tão fácil velar aquela paisagem com um
suspiro próprio. Conhecia tão bem aquele ce-
nário que mesmo com os olhos e a janelas fe-
chados seguia revisitando os lugares... ela tinha
suas desordens pessoais. A estrada entre planta-
ções em primeiro lugar, percorria aquele chão
de terra batida, com suas imensas árvores ao
lado e o som das águas do rio que cortava a ci-
dade... o prédio da escola — do lado oposto —
em segundo, depois a represa, o banco da pra-
ça em frente a igreja e a avenida que a levava
de volta para casa... Se perder seria impossível.
A escrita se precipitava junto aos seus pas-
sos imaginários — primeiro dentro da pele — de-
pois junto ao papel. Havia qualquer coisa de se-
melhança e igualdade sendo preservada junto
aquelas linhas que diziam a cidade, sua g ente,
os lugares — era seu baú de memórias, já que
sua mente nem sempre dizia o que era de fato
necessário. Suas lembranças sempre foram au-
sentes...
Depois de se deixar dizer em linhas naquele
caderno — guardava-o na primeira gaveta da
cômoda embaixo de um punhado de toalhas
de banho e de rosto que vinha sendo guarda-
das para o momento mais esperado naquela
casa: o dia do casamento de Alexandra. Tudo
era comprado aos poucos, lençóis, fronhas, to-
alhas... O dinheiro era pouco, mas quando as
festas chegavam à cidade de Teodoro, sempre
sobrava um pouco para uma nova peça do
enxoval.
O olhar de Alexandra desviou-se rapida-
mente para a gaveta onde seu passado se es-
condia. Respirou fundo, como sempre fazia ao
se dar contar que toda a sua vida se limitava a
uma simples gaveta. Ali estava toda a sua histó-
ria. Seu legado. Suas lembranças mais importan-
tes... parecia um pouco triste ter que carregar
aquela chave junto ao peito, pendurada em
sua corrente de prata, presente na infância de
seu pai. Alguém a tinha esquecido na mesa do
bar onde ele passava a maioria de suas horas.
Ele esperou alguns dias e, como ninguém apa-
receu, ao chegar a casa — ele, homem sem jei-
to e de poucas palavras — indagou "alguém es-
queceu lá no bar. Quer para você?" — foi a pri-
meira e a única vez que ele presenteou a filha,
não por falta de amor por aquela menina que
brilhava junto aos seus olhos, mas por não ter
habilidade em presentear. Não sabia fazê-lo...
ficava sem graça quando o gesto alheio toca-
va-lhe as mãos...
A chave presa ao peito tinha suas razões
de ser, fosse diferente, seus segredos na certa se
espalhariam pelos quatro cantos da cidade e,
seria insuportável saber que olhos que não os
dela visitaram aquelas páginas... e como na-
Lua de Papel
Na segunda página ela escreveu,
“há esse lugar sem poemas. Uma linha reta
— traçada para dividir os homens e seus mo-
vimentos — damos voltas ao redor de um
mundo que não vai além da próxima esqui-
na. É sempre o mesmo céu, o mesmo véu.
Todos os homens aqui são pequenas ilhas e
todas as mulheres pequenas cidades…
Há uma multidão inteira do lado de fora da
minha janela, contando antigas histórias com
os mesmos nomes e eu os conheço todos,
embora seja indiferente a eles.
Aqui não há norte — apenas esferas —, e a
vida pulsa esse estranho ritmo que não me
satisfaz. Todos envelhecem sem perceber os
anos e as rugas que eles deixam nos cantos
da pele. Todos envelhecem… mas, olha-se
tanto um para o outro — todos os dias — que
fica impossível perceber-se. Saber-se. Então
não há diferença… é como se estivessem to-
dos empalhados!
As casas grudadas umas às outras contam a
vida alheia através das paredes finas e as
calçadas negam passos para outras dire-
ções pela manhã. É sempre para o mesmo
portão que se anda… Tudo aqui se mistura —
e se confunde — todo mundo sabe ou pensa
saber absolutamente tudo sobre a vida do
outro… todo mundo vive ou pensa viver… As
cartilhas são as mesmas entregues em sala
de aula — reza-se o mesmo rosário — o Deus
na Igreja é o mesmo que faz a missa vestindo
a batina sagrada… e, nas ruas da cidade, as
cabeças acusam as maldições que carrega-
mos e que são denominadas como pecado.
Uma confissão basta para nos resgatar de
nossos infernos mais íntimos…
As pessoas são pequenas-miúdas-encolhidas
— e fazem muito ruído dentro da manhã, da
tarde e da noite.
Às vezes, um silêncio crescente se apodera
da paisagem e o único som a se repetir lá fo-
ra é o dos grilos… nessa hora, as poucas luzes
da cidade enfrentam a escuridão — dizem
que os mortos se levantam e andam sob o lu-
ar — mas eu nunca dei por eles… vivo a espi-
ar a rua pelas frestas de minha janela, entre
uma página ou outra dos livros que leio, mas
o único movimento que percebo é de um
cão vira-lata, que veio não se sabe de onde,
há mais tempo do que eu consigo contar —
andando de um lado para o outro em busca
de alimento nas latas de lixo enfileiradas sob
as calçadas. Pela manhã, ele está deitado
na porta do bar de meu pai, que o alimenta
e trava com ele um estranho diálogo.
Lua de Papel
Mesmo sabendo não haver mortos, não ouso
visitar as poucas vias de Teodoro e, quando
espio seus contornos pela frestas de minha
janela, o medo se precipita em mim, dizendo
fantasmas que essa gente inventou e eu a-
gasalhei.
A cidade de Teodoro e seu punhado de ruas
começa a esvaziar-se por volta das seis horas
no inverno, quando os dias são invariavel-
mente mais curtos e a sopa é servida pouco
depois da ave-maria… Nos dias de verão, o
horário é outro — oito horas — porque, nes-
ses dias, as senhoras levam para a calçada a
cadeira, lãs, agulhas e uma interminável von-
tade de tagarelar, dando um novo sentido à
palavra “tricotar”… Falam da vida alheia co-
mo se falassem da novela das oito e de seus
personagens comuns. Inventam histórias. A-
crescentam verdades pessoais e acusam os
desafetos. Sempre achei estranho os sorrisos
e os acenos que elas entregam para as vizi-
nhas desprezadas por gestos — ditos — in-
convenientes. No domingo, no entanto, sen-
tam-se lado a lado e fazem o sinal da cruz
para o homem de olhar amendoado no al-
tar, pouco depois dizem ‘amém’ e já estão
livres para o pecar mais um punhado de ve-
zes…
E eu, aqui nesse meu mundo pequeno-
estreito, escondo-me a fim de sobreviver. Eu
só penso em resistir para não desaparecer,
como fazem todos nessa cidade.
Na semana passada morreu Lurdes Maria —
no velório discursou o padre Antônio, com su-
as palavras de sempre, que veem surgir no-
vas pausas em cada frase — em dezesseis a-
nos já ouvi dúzias de vezes aquele mesmo
discurso demorado…
A cidade inteira participou do cortejo — re-
zando as mesmas preces — e no dia seguin-
te ela era apenas um nome na lápide, ou o
nome citado em tom de saudade no meio
da conversa das senhoras desocupadas.
Contudo, bastou um punhado de dias para
que ninguém mais se lembrasse de quem ela
era ou do que ela tinha feito… agora ela é
apenas mais uma fotografia na parede da
loja do Paulo, que é esse homem que herdou
do pai a profissão de fotografar os habitan-
tes da cidade... o nome verdadeiro dele nin-
guém se lembra — Paulo era o nome do pai
— o dele ninguém nunca soube, porque nes-
sa cidade existir e desaparecer é quase a
mesma coisa”.
Lua de Papel
“
“
Lua de Papel
— Não, mas é que há coisas que não
são passíveis de tradução, como um poema
escrito em outro idioma. Não basta saber as
palavras, conhecer a língua… o contexto. Eu
me lembro de que passei um bom tempo
pensando em como iria ser. Disse “não” vá-
rias vezes até que, numa noite eu finalmente
disse “sim”. De todos os movimentos que fize-
mos, o melhor foi o beijo: a maneira como
nossas bocas tomaram uma à outra me fez
mergulhar naquele encontro de salgado
sabor. Senti como se estivesse me afogando,
e com a vida prestes a afastar-se do corpo,
num sopro… voltei a respirar.
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...vai te fazer mergulhar
em turbilhão de sensações:
do fascínio ao desespero...
e da tristeza à decepção
dentro de um mesmo
segundo!
Lua de Papel
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Catarina voltou a escrever
www.catarinavoltouaescrever.wordpress.com
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Scenarium Plural
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