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    Etanol: riqueza nacional adormecida

    Por Mirna Ivonne Gaya Scandiffio e Andr Tosi Furtado10/04/2007

    O ltimo relatrio do IPCC (International Pannel for Climate Change) apresenta os preocupantes problemas que a humanidadedever enfrentar ainda neste sculo devido ao aquecimento global. E isto se deve, em grande parte, ao crescente aumento das emisses deCO2, CH4 e N2O provenientes, principalmente, do consumo de energias fsseis e da queima de florestas.

    H um grande consenso entre os especialistas que o uso da biomassa uma das principais solues, no curto, mdio e longo

    prazo, para minimizar o impacto extremamente negativo dos gases de efeito estufa. A matriz energtica do Brasil detm o maior percentualde uso de fontes de energia renovvel do mundo, com uma participao de 44,5% do consumo de energia, enquanto a mdia mundial de13,1%. Se a comparao for com os pases integrantes da OCDE (Organizao para a Cooperao de Desenvolvimento Econmico) adiferena ainda maior, uma vez que apenas 6,1% da oferta interna de energia desses pases provm de fontes renovveis.

    No que diz respeito ao setor de transportes, o Brasil o pas que mais utiliza biomassa na produo de combustveis lquidos.Embora seu uso tenha se iniciado na dcada de trinta do sculo passado, foi, em 1975, com o Programa Nacional do lcool o Prolcool

    , que o pas apresentou ao mundo o nico programa consistente de substituio da gasolina, como resposta s crises de petrleo de 1973 ede 1979.

    A produo de lcool combustvel atravessou diversas situaes aps quase trinta e dois anos de implantao do Prolcool. Nosprimeiros dez anos, vivenciou-se um total sucesso, com a produo de lcool etlico saltando de 611 mil m3, na safra 1975/76, para 11,8milhes m3 na safra 1985/86. Na primeira safra, o lcool anidro representava 79% do total da produo de etanol, invertendo-se, aps dezanos, o percentual para o lcool hidratado, 77,3%, graas rpida penetrao dos carros movidos 100% a lcool (hidratado) a partir do

    incio dos anos 80.Nos quinze anos subseqentes, o pas assistiria ao progressivo declnio do Programa, com a queda das vendas de carros a lcool e

    da produo de lcool hidratado. No entanto, esse declnio no significou a estagnao da agro-indstria da cana-de-acar. Estaprosseguiu expandindo-se por conta das exportaes de acar e da introduo de constantes melhoras em suas tcnicas de produo, queminimizaram seus custos de produo. Em 2003, novas perspectivas surgiram para o uso de lcool hidratado, com a introduo de umanova tecnologia para a frota de veculos leves, os carros flex fuel, capazes de aceitar qualquer grau de mistura de etanol ou de gasolina.

    Com a introduo dessa nova tecnologia, de se esperar que a demanda de lcool hidratado no mercado interno continueaumentando, no colocando em risco a infra-estrutura de distribuio do pas, que conta hoje com cerca de 30 mil postos de abastecimentodo combustvel renovvel.

    A seguir, apresenta-se uma projeo do crescimento da frota nacional de veculos leves, da demanda de combustveis, com focono lcool carburante.

    Mercado interno

    Elaborou-se uma projeo da evoluo da frota de veculos leves para 2025, apresentada na tabela abaixo, com base nas seguintespremissas:

    A frota de veculos leves cresce 4% ao ano, acompanhando a evoluo do PIB do pas. As vendas de veculos leves aumentam 5% ao ano. Os carros flex representam 85% das vendas de veculos leves at 2025 A taxa de sucateamento dos carros flex de 3,5% nos cinco primeiros anos; 5% de 2007 a 2012 e 10% at 2025 A venda de carros que utilizam gs natural veicular (GNV) de 200 mil unidades/ano e a taxa de sucateamento desses veculos

    de 7% at 2012 e 10% at 2025.

    Com cerca de 21 milhes de unidades, a participao dos carros flex no total da frota nacional de veculos leves representa 45%em 2025.

    Quanto demanda de combustvel, especificamente de lcool combustvel, partiu-se das seguintes premissas:

    Um litro de lcool hidratado equivale a 0,7 litro de gasolina, o que corresponde ao atual rendimento dos carros flex fuel Um litro de gasolina contm 0,25 litro de lcool anidro Oitenta por cento dos carros flex utilizam lcool hidratado

    O consumo de lcool combustvel, somadas as necessidades de lcool anidro e hidratado em 2025, de 43,9 milhes m3,conforme apresentado na tabela abaixo.

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    Veculo Gasolina (106 m) lcool Anidro (106 m) lcool Hidratado (106 m)

    Gasolina 24,5 8,2 0,0

    100% lcool 0,0 0,0 0,9

    Flex fuel 4,4 1,5 33,4

    TOTAL 28,9 9,6 34,3Mercado externo

    Interessados em uma abordagem prospectiva, o Centro de Gesto e Estudos Estratgicos-CGEE do Ministrio de Cincia eTecnologia-MCT, solicitou, no incio de 2005, equipe do Ncleo Interdisciplinar de Planejamento Energtico (Nipe), da Unicamp,

    coordenada pelo professor Rogrio Cerqueira Leite um estudo sobre as possibilidades e os impactos da produo de grandes quantidadesde etanol visando substituio parcial da gasolina do mundo em um espao temporal de vinte anos.

    Nascia ento o Projeto Etanol que, na sua primeira fase, tinha como meta estudar a viabilidade da expanso da produo de etanolpara exportar cerca de seis vezes a produo atual, o que significaria substituir 5% da demanda mundial de gasolina em 2025. Paraalcanar essa meta, estabeleceram-se as principais premissas do estudo:

    Expanso da produo de cana-de-acar em reas no ocupadas por florestas (Amaznia e Mata Atlntica) ou em reservasambientais e terras indgenas

    Desconcentrao da produo de cana-de-acar e de etanol

    Para conhecer o potencial de expanso da produo de cana-de-acar no pas, o Projeto Etanol contratou especialistas queelaboraram, em funo do solo e do clima, um mapa das reas potenciais para a cultura da cana, com e sem irrigao, excluindo-se aquelascom restrio ambiental e com declividade acima de 12%, em decorrncia da meta 100% de mecanizao na colheita. O estudo utilizou o

    mapa das terras com potencial para produo de cana-de-acar sem irrigao, ao qual foram acrescentadas as reservas ambientais, taiscomo reservas indgenas, parques ecolgicos, militares e outras, conforme apresentado na Figura 1.

    FIGURA 1: POTENCIAL DE PRODUO DE CANA DE ACAR NO BRASIL SEM IRRIGAO

    Atualmente, a produo de cana-de-acar e etanol est excessivamente concentrada na regio Sudeste do pas. Acredita-se que adesconcentrao, visando minimizar as diferenas regionais, seja possvel se forem empreendidas aes de planejamento e de pesquisa emreas que hoje detm potencial quanto ao solo, clima e declividade, mas que carecem de tecnologias especficas, como, por exemplo,variedades adaptadas de cana-de-acar.

    A primeira fase do estudo, concluda em dezembro de 2005, selecionou doze reas com potencial para produo de cana-de-acar. Definiu-se uma destilaria padro e a formao de clusters, o que viabiliza a infra-estrutura necessria para o escoamento degrandes quantidades de etanol. O estudo incluiu os impactos sociais e econmicos, considerando-se a gerao de energia eltricadisponvel atravs da co-gerao.

    O estudo prosseguiu com a fase dois, que foi concluda em maro de 2007. Nesta fase, duplicou-se a meta de produo de etanolpara substituir 10% da demanda mundial de gasolina, tambm em 2025. Para isto, o Projeto Etanol selecionou mais cinco novas reas e

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    projetou uma destilaria modelo que maximizasse os ganhos na rea agrcola e industrial, alm de abordar alternativas para o escoamentodo lcool das reas produtoras at os principais portos do pas.

    Na rea agrcola, destacam-se os estudos de melhoramento gentico da cana-de-acar, de colheita e plantio mecanizado, tcnicasde fertilizao, tratos culturais e outros. Entre as novas tecnologias estudadas, na rea industrial, merece destaque a introduo da hidrlisecida e enzimtica com o uso do bagao e da palha.

    A cana-de-acar ocupa atualmente cerca de seis milhes de hectares do pas, sendo que praticamente a metade destinada produo de etanol. Quanto ao uso da terra, o estudo identificou 53 milhes de hectares com potencial alto e mdio para a produo decana-de-acar. Para atingir a meta de 205 milhes de m3, seriam necessrios cerca de 40 milhes de hectares, se forem mantidos os

    parmetros atuais de produtividade, e sem considerar avanos tecnolgicos na rea agrcola e industrial.A segunda fase do Projeto Etanol dinamizou a demanda de terras de cana-de-acar, considerando tambm a necessidade de

    atender ao mercado interno de etanol e aos mercados interno e externo de acar.Prosseguindo com a viso de longo prazo, a terceira fase do Projeto Etanol, que dever ser concluda este ano, contempla estudos

    de sustentabilidade, no que diz respeito manuteno e melhorias na produo de etanol na rea agrcola e industrial bem como osrequisitos de excelncia no uso do solo, diminuio e controle de gua, tratamento do vinhoto e outros. Essa fase contempla ainda estudossobre a legislao de possveis pases compradores e do marco regulatrio nacional.

    O Projeto Etanol busca garantir a sustentabilidade de toda a cadeia produtiva e de escoamento, contemplando o desenvolvimentodas comunidades locais, com educao, sade, emprego, alm de prever um sistema de produo ecologicamente sustentvel. Para isso indispensvel a atuao do Estado como rgo coordenador desse desenvolvimento, integrando o setor pblico e privado.

    Com a implantao de um projeto dessa magnitude, o Brasil manteria e ampliaria sua posio de pas lder de fontes renovveis deenergia de modo competitivo e sustentvel. Contribuiria ainda com a reduo de gases de efeito estufa, principalmente o CO2, atravs dasubstituio do uso de combustveis fsseis pelo uso de etanol proveniente de biomassa.

    Mirna Ivonne Gaya Scandiffio pesquisadora do Ncleo Interdisciplinar de Planejamento Energtico (Nipe), da Unicamp e Andr TosiFurtado professor do Departamento de Poltica Cientfica e Tecnolgica, do Instituto de Geocincias, da Unicamp.

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