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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O CÉREBRO COGNITIVO E A MEMÓRIA HUMANA FRENTE A UMA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA
Por: Adriana do Carmo Felipe
Orientadora
Profª. MARTA PIRES RELVAS
Rio de Janeiro
2013
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O CÉREBRO COGNITIVO E MEMÓRIA HUMANA FRENTE A UMA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA
Apresentação de monografia à Universidade
Cândido Mendes - AVM Faculdade Integrada
como requisito parcial para obtenção do
Grau de especialista em Neurociência
Pedagógica.
Por: Adriana do Carmo Felipe
Rio de Janeiro
2013
AGRADECIMENTOS
Ao meu Deus, aos presentes e bem perto de
minha vida em anos dedicados aos estudos e
ao trabalho com a Educação...
DEDICATÓRIA
Dedico aos meus: mãe, sobrinho, família e
amigos - razão da minha vida e grandes
incentivadores do meu sucesso.
Não tenho nada a ensinar ao mundo. A verdade é tão antiga quanto as montanhas. Tudo o que fiz foi tentar realizar experiências numa escala tão vasta quanto me foi possível. Ao fazê-lo, errei por vezes e aprendi com os erros. A vida e os seus problemas tornaram-se para mim, outras tantas experiências na prática da verdade.
Mahatma Gandhi
RESUMO
As ações e as demandas de nossa Educação no contexto atual vêm
sofrendo muitos desafios e constantes divergências em seu processo, o que
implica em julgar diversas realidades existentes a partir de critérios, na busca
de uma aprendizagem significativa.
E quando o assunto é Educação, surgem problemas, questões e
desacertos em relação a cada um dos elementos que a constituem,
principalmente no contexto da sala de aula, como por exemplo:
• Que tipo de sujeito cerebral é de fato responsável pelo sucesso
ou pelo fracasso do ensino aprendizagem? Quais são as áreas e/ou os
circuitos neurais que encaminham a escola a tornar-se uma potencializadora
de inteligência?
• Qual o papel de uma memória trabalhadora na prática de uma
aprendizagem significativa? Como estimulá-la para que as funções executivas
sejam priorizadas pelos lobos frontais?
• Que circuitos neurais são fundamentais para a realização de uma
prática pedagógica benéfica ao aluno e a família?
• Onde e como a Neurociência, através do cérebro executivo e da
“boa memória” pode contribuir para a conservação ou transformação social?
Nesse caso, um estudo mais aprofundado acerca dos estímulos que
aumentam a plasticidade cerebral, levando em conta as funções executivas do
cérebro, bem como o armazenamento das informações na memória
trabalhadora, uma vez que a aprendizagem passa por sinapses e por conexões
neurais, se faz muito necessário que o papel do “neuropedagogo”, seja facilitar
esse caminho para facilitar o acesso, o armazenamento, a acomodação e a
utilização deste conhecimento rumo a escola que pensa sobre o pensar.
O foco deste estudo são os estudantes de Neurociência, professores
e profissionais interessados no avanço da aprendizagem de alunos,
principalmente, aqueles que atuam nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental,
onde a aprendizagem acontece de forma natural e espontânea, e em como
esse conhecimento acontece, se processa e se transforma numa educação de
qualidade sináptica que visa mudança significativa na sociedade
contemporânea e globalizada na qual estamos vivendo.
São muitas as novidades nas teorias globalizantes. São inegáveis os
avanços promovidos nas mais diversas áreas da sociedade, principalmente, na
busca por uma educação de qualidade. No entanto, vê-se pessoas cada vez
mais individualistas, inclinadas para valores materiais numa tentativa de
reafirmar-se e reorganizar-se a partir da disseminada e ampla cultura do “ter”.
A preocupação da Neurociência vem ao encontro de uma reflexão
sobre o valor da educação na e para a sociedade, uma vez que a
aprendizagem é a transformação de comportamentos, por isso, nossa reflexão
pauta-se na valorização fundamentada no “ser” em todas as suas dimensões.
O presente trabalho monográfico justifica-se por pretender contribuir
com ideias relevantes apresentadas através das funções executivas do sujeito
cerebral, com competência coletiva no cotidiano escolar, utilizando-se de uma
boa memória ou ao menos de atividades e experiências que possam melhorar
a memória do indivíduo frente a uma educação qualitativa, humanizadora e
transformadora da sociedade formada por “seres/peças” de uma engrenagem
maior.
O cérebro executivo e uma boa memória se fazem necessários para
melhorar o processo ensino-aprendizagem. Por isso, devem ser entendidos
como um conjunto de operações mentais que organizam e direcionam os
diversos domínios cognitivos categoriais para que funcionem de maneira
biologicamente adaptativa e sejam integrados devidamente às memórias de
curto, médio e longo prazos. Afinal, segundo Norberto Bobbio, “somos aquilo
que recordamos.”
PALAVRAS-CHAVES: CÉREBRO COGNITIVO – MEMÓRIA –
APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA
METODOLOGIA
Para elaboração deste estudo utiliza-se como metodologia a
pesquisa teórica do tipo bibliográfica, procurando identificar diferentes teorias e
analisar os principais aspectos tratados na literatura sobre o Cérebro
Executivo, sobre a importância da Memória e seu papel na aprendizagem.
Esta pesquisa utilizou alguns autores que contribuem com suas
teorias, no momento em que elas se aplicam aos objetivos definidos acima.
São eles:
GOLDBERG (2002), bem fundamentado teoricamente, oferece um
panorama do nível atual de conhecimento das ideias e progressos em
neurociência cognitiva. Trata-se de um enfoque em memórias intelectual.
LENT (2008), que contribui significativamente para nos
contextualizar no que tange ao funcionamento do cérebro humano quanto aos
sistemas sensoriais, motores, cognitivos e emocionais da Neurociência da
Mente e do Comportamento;
IZQUIERDO (2011), um dos maiores especialistas mundiais em
memória, que desenvolve o conceito e a persistência das memórias de longa
duração, evocação, extinção e reconsolidação das memórias no processo de
aprendizagem;
DAMÁSIO (2011), que há três décadas destrincha o funcionamento
e as bases físicas da espantosa capacidade de raciocinar, de sentir emoções e
de distinguir o eu do outro, de mapear o contexto interno e externo que nos faz
humanos;
RELVAS (2012), grande nome na área de Biologia Cognitiva,
Neurociência e Aprendizagem, com sua abordagem peculiar sobre a
Neurociência e o desvendar dos estudos dos cérebros na sala de aula e sua
contribuição para uma educação mais justa e menos excludente, ou melhor, a
uma aprendizagem significativa.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 10
CAPÍTULO I - O Cérebro Cognitivo e o Sujeito Cerebral 12
CAPÍTULO II - A memória humana e o processo educativo 23
CAPÍTULO III – Neuroaprendência – A cognição e a memória frente a
Aprendizagem Significativa 35
CONCLUSÃO 42
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 44
ÍNDICE 45
FOLHA DE AVALIAÇÃO 46
10
INTRODUÇÃO
A intenção do trabalho aqui apresentado é dar um sentido dialógico
a função do sujeito cerebral, no que tange às suas funções executivas e à
utilização de uma boa memória na prática pedagógica rumo a uma
aprendizagem significativa de transformação da sociedade.
E como é sabido por todos, o acervo das memórias e o cérebro
executivo transformam os indivíduos em seres únicos na existência. Por isso,
espera-se que os assuntos abordados venham favorecer a formação e a
atuação do profissional da educação, que esteja envolvido direta ou
indiretamente com a busca da qualidade educacional, contribuindo também
para mais uma conexão neural e consequentemente, a reflexão de valores que
a Educação pode dar a um ser.
Desta maneira pode-se pontuar o seguinte objetivo geral para esse
trabalho monográfico:
Refletir acerca das infinitas possibilidades, algumas maneiras de
como o cérebro aprende, como executa funções e armazena informações com
qualidade sináptica, na busca de uma aprendizagem que respeita o ritmo
neural e prima pela qualidade de vida.
Cabe ressaltar que este trabalho visa salientar a ideia que a
maturidade neurológica acontece ao longo de nossa vida e que esta elabora a
informação num aprendizado colaborativo, cooperativo e significativo no córtex
pré-frontal e que nesse sentido, a secretária desta aprendizagem é a memória.
Nesse sentindo, elenca-se os seguintes objetivos específicos do
trabalho:
- Levantamento histórico do caminho percorrido pela Neurociência
nas práticas pedagógicas;
11
- Conceitos do cérebro, as funções executivas, bem como o
processo de memória na aprendizagem cognitiva, afetiva e motora;
- Destaque que “sem memória não há aprendizagem, mas que
aprendizagem não é memória”, aforismo relevante na Educação dos alunos e
na transformação social;
- Localização das áreas cerebrais nas funções executivas
necessárias para o desenvolvimento de um bom trabalho pedagógico, dentro
de um contexto educacional significativo e transformador.
12
CAPITULO I
O CÉREBRO COGNITIVO E O SUJEITO CEREBRAL
Aflições triviais à parte, vivemos num mundo clemente, onde a margem de erro é geralmente bem generosa.
Elkhonon Goldberg
1.1- O descobrimento do Cérebro– Uma breve história
Atualmente, quando se fala em cérebro, muitas são as definições e
novidades acerca desta “caixa preta”. Dentre as mais variadas definições e
tentativas de compreensões de seu funcionamento para um melhor
desempenho da sociedade, se encontra a afirmativa que ele é particularmente,
complexo e extenso, pois, contém cerca de, aproximadamente, 86 bilhões de
neurônios, contagem essa que já sofreu alterações e que ainda não se
encontra isenta de mais novidades futuras, ligados por mais de 10.000
conexões sinápticas cada.
Desde a antiguidade havia estudos e considerações acerca do
processo humano, ou ainda de como se processa o pensamento e as ações
humanas, para Hipócrates a mente se localizava no cérebro, enquanto,
Aristóteles acreditava que a mente era originada do coração.
Porém, segundo LENT (2008, p.4) a primeira e mais longeva teoria
de localização das funções mentais no cérebro nasceu provavelmente no
século IV d.C., quando o clero assimilou algumas ideias de Galeano.
Foi predominante a ideia que a doutrina ventricular defendia a
localização das funções mentais em três câmaras no centro do cérebro.
Considerando as “partes sólidas” do cérebro sujas e terrenas demais para
atuar como intermediárias entre corpo e alma, as funções superiores foram
atribuídas aos ventrículos cerebrais, confundidos com “espaços” vazios, e,
portanto, mais “puros” e nobres do que a carne da matéria cerebral para
receberem espíritos etéreos.
13
Houve ainda a identificação de três “células” ventriculares – a
anterior, a mediana e a posterior – de acordo com LENT (2008, p.4) traçava um
paralelo bem vindo com a Santa Trindade.
RELVAS (2012, p.29) acrescenta que na teoria de Galeano, os
ventrículos cerebrais eram órgãos, sede dos humanos, e nos quais estava
localizada também a capacidade intelectual do homem.
Foi Galeano, o médico responsável pela correlação entre as formas
e as funções cerebrais em que três ventrículos foram considerados:
Primeiro: responsável pelo recebimento de informações do ambiente e correspondia às sensações. Segundo: o processamento de informações em imaginação e pensamento. Terceiro: responsável pelo armazenamento de memória. (RELVAS, 2012, p.29)
A localização ventricular das funções mentais superiores continuou a
ser aceita tanto na Europa como no Oriente Médio por alguns séculos, como se
pode observar na tabela apresentada por LENT (2008):
Ventrículo anterior Ventrículo mediano Ventrículo posterior
Nemesius c. 390 Percepção Cognição Memória
St. Agostinho 354-430 Sensação Memória Movimento
ibn Sina 980-1037 Fantasia e
representação
Imaginação, racional
e discernimento Retenção e recordação
Leonardo da Vinci 1472-1519 Imaginação Cognição Memória
Gregor Reisch c. 1427-1525 Sensação, fantasia,
imaginação
Pensamento e
discernimento Memória
Corpo estriado Corpo caloso Córtex
Thomas Willis 1621-1675 Percepção Imaginação Memória e recordação
Tabela 1 (fonte: LENT, 2008, p.5)
RELVAS (2012, p.29) traz uma clara evolução da história das ideias
de cérebro e neurociência, pode-se observar que a partir da era moderna
(século XVI) Andrea Vesalius afirmou que não estava nos ventrículos a
capacidade intelectual do homem. No período Clássico da história antiga,
existiram duas doutrinas com relação a mente:
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Descartes (1649) – localizou a mente (intelecto) no cérebro e ligou-
se ao corpo na glândula pineal. Ele acreditava que a maioria das atividades do
corpo, como sensação, movimento, digestão, respiração e sono, era explicada
pelos princípios mecânicos, onde corpo físico e cérebro funcionavam.
Mesmo com a oposição de Vesalius, a ruptura com os mais de mil
anos da doutrina ventricular, levando a cognição ao córtex e ao nascimento da
neurociência, só aconteceria no século XIX.
Franz Joseph Gall (1758-1828), foi um dos primeiros a ilustrar com
precisão as circunvoluções corticais e acreditava que o cérebro é uma máquina
sofisticada que produz comportamento, pensamento e emoção, e que o córtex
cerebral é na verdade uma série de órgãos com diferentes funções. Em 1810,
postulou 27 faculdades “afetivas e intelectuais”, mais tarde ampliadas para 35
por Johann Spurzheim (1776-1832), que acrescentou que elas se localizam em
órgãos específicos (regiões) do córtex cerebral.
Localização das faculdades afetivas e intelectuais segundo Spurzheim.
Figura 1 (fonte: Lent, 2008, p.8)
Dividir a mente em 27 faculdades localizadas em órgãos cerebrais
era demais numa época em que o cérebro sequer era aceito abertamente
como o órgão da mente. E, se repartir a mente em pedacinhos era uma afronta
a unidade da alma exigida pela Igreja, repartir o cérebro em 27 “órgãos”, cada
qual com sua função, era uma ameaça à unidade do Estado – e em 1805 Gall
foi expulso do Estado de Viena. Dois anos depois, chegou a Paris. Tentou
15
entrar para a Academia de Ciências, mas teve de bater-se com Georges Cuvier
(1769-1832), anatomista que liderou a comissão que julgou o mérito de Gall.
As ideias e o trabalho de Spurzheim e Gall foram denominadas
“frenologia” por Tomas Foster (1815).
O francês Pierre Flourens (1823-1924) foi um dos vários cientistas
determinados a provar que Gall não tinha razão. Passou a fazer lesões
experimentais em pombos, inicialmente tentando delimitar o centro respiratório
a uma área ainda menor – o que parece curioso, já que mais tarde ele
argumentaria tão ardorosamente contra a localização de Gall.
Flourens acreditava na equipotencialidade do córtex, e alegava que
a lesão deste afetava igualmente todas as capacidades intelectuais, foi
considerado o pai da pesquisa experimental cerebral.
A verdadeira revolução ocorreu em 1961, quando o francês Paul
Broca (1824-1880) declarou que a linguagem tinha uma localização precisa no
córtex cerebral humano. Broca anunciou em abril de 1861 na Societé d’
Anthropologie que tinha um caso a mostrar de um paciente com problema de
fala que acabara de falecer. No dia seguinte, voltou com o cérebro do paciente
– que tinha uma lesão no córtex frontal esquerdo. Ao longo dos meses
seguintes, Broca apresentou vários casos semelhantes. Curiosamente, não foi
Broca o primeiro a fazer tal observação, e sim um médico de Montpellier, de
nome Marc Dax. Sua descoberta, no entanto, não foi anunciada com o mesmo
alarido que a de broca, que assim entrou para a história no lugar de Dax.
A descoberta estabeleceu o espírito localizacionista de funções
psicológicas no córtex cerebral, e foi considerada a ‘vingança” de Gall – a
quem Broca, aliás, considerava o “ponto de partida para todas as descobertas
em fisiologia cerebral do nosso século”. Broca fez correlações anatômicas das
afasias e descobriu uma área no cérebro que depois foi chamada de área de
Broca, relacionada com a expressão da fala.
16
Ainda no final do século XIX, o avanço das técnicas histológicas de
coloração possibilitou a entrada da Anatomia no debate sobre a localização das
funções superiores. Colocando dificuldades à proposta holista de Lashley, que
supunha a “equipotencialidade” e, portanto, uma certa homogeneidade do
córtex cerebral, estavam as ilustrações do histologista espanhol Santiago
Ramón y Cajal 91852-1934), que mostrava que o cérebro não era uma rede
contínua, mas sim um conjunto de unidades celulares discretas; e a recente
cartografia cortical, que picotava o córtex em dezenas de zonas
anatomicamente diferentes e, portanto, possivelmente especializadas
funcionalmente.
Desde 1839, quando Theodor Schwann (1810-1882) propôs que
todos os tecidos animais e vegetais são compostos por uma unidade básica – a
célula – , a Biologia encontrava células onde quer que olhasse. Mas, muitos
neurologistas relutavam em aceitar que o mesmo princípio se aplicasse
também ao sistema nervoso, e preferiam defender a chamada “teoria reticular”,
segundo o qual o sistema nervoso seria um emaranhado único, uma teia densa
de fios celulares anastomosados.
O histologista italiano Camillo Golgi (1843-1926) era um ardente
defensor da Teoria Reticular. Cajal, no entanto, usando o novo método de
Golgi, fez observações que iam diretamente contra o que o italiano defendia.
Em vez de contatos indiscriminados, como na teia de Golgi, Cajal os via
organizados entre terminações de “cilindros axiais” (axônios) de uma célula, e
corpos celulares e dendritos de outras, sempre obedecendo a arquiteturas
padronizadas que ele descreveu como “em cesta”, “pericelulares” ou “em
ramos ascendentes”. Em vez de continuidade entre células, Cajal via espaços
entre elas.
Na virada do século XX, o trabalho de Cajal levava à proposição de
uma nova teoria: a Teoria Neuronal, que vê o sistema nervoso como um
conjunto de células individuais, especializadas segundo a região do cérebro, e
organizadas ordenadamente em um sistema complexo. E terminou por jogar
por terra a Teoria reticular defendida por Golgi.
17
Um dos mapas citoarquitetônicos propostos foi o de Korbiniam
Brodmann (1868-1918), que identificava 52 áreas diferentes e ainda é usado
até hoje. Efetivamente, hoje se considera que várias das áreas identificadas
por Brodmann correspondem a áreas funcionais.
Com a existência de pequenos espaços entre as células nervosas,
como Ramón y Cajal propôs, a Neurofisiologia viu-se obrigada a explicar como
os impulsos nervosos “pulam” de uma célula para outra. Escrevendo em 1897
sobre os possíveis mecanismos de transmissão dos impulsos, o
neurofisiologista inglês Charles Sherrington (1857-1952) percebeu a
necessidade de dar nome a esses espaços intercelulares, antes mesmo de
eles serem aceitos pela comunidade científica em geral: as “sinapses”.
A estimulação elétrica do cérebro humano foi explorada em detalhe
pelo neurocirurgião canadense Wilder Penfield (1891-1976), já nos anos 1950.
Penfield produzia sensações de cores, luzes, sons e movimento percebidas
como “reais” pelo paciente, dependendo da porção do córtex estimulada.
Penfield elaborou um novo esquema de localização das funções mentais no
córtex, aceito em linhas gerais, até hoje.
Figura 2 (fonte: Lent, 2008, p.12)
Diante da linha histórica supracitada, não nos resta dúvidas que
muitos foram os estudos e os experimentos que embasaram nossa
Neurociência até aqui. Mas, não se pode perder de vista, que muitas outras
questões ou descobertas podem vir à tona, revogando ou modificando
literalmente o “pensamento”. Fica claro e registrado através do exposto que
18
nenhum estudo encontra-se fechado, ou representa a única verdade, uma vez
que muitos foram os caminhos percorridos até aqui e como afirma RELVAS
(2012):
Durante grande parte da história, os humanos estiveram muito ocupados para ter chance de refletir sobre o pensamento. Embora não se tenha dúvida de que o encéfalo humano possa exercer tais atividades, a vida exigia atenção a aspectos práticos, como a sobrevivência em ambientes adversos, a criação de melhores maneiras de viver, inventando a agricultura ou domesticando animais e assim por diante. (RELVAS, 2012, p.33)
1.2- Diversos olhares conceituando o cérebro
Sabedores que o século XX foi o ápice do estudo do cérebro, aquele
considerado “caixa preta” do ser humano, o Novo Dicionário Aurélio conceitua
o cérebro como o centro nervoso situado no crânio dos vertebrados, muito
desenvolvido no homem, no qual se compõe de dois hemisférios constituídos
por numerosas circunvoluções.
Inicialmente, RELVAS (2009, p.28) diz que o cérebro é o órgão onde
se radicam a sensibilidade consciente, a mobilidade voluntária e a inteligência;
por este motivo é considerado como o centro nervoso mais importante de todo
o sistema.
O cérebro humano constitui-se em dois hemisférios cerebrais:
esquerdo e direito. O hemisfério esquerdo controla o lado direito do corpo, e o
hemisfério direito controla o lado esquerdo. Cada hemisfério divide-se em lobo
frontal, responsável pela elaboração de pensamento, planejamento,
programação de necessidades individuais e emoção; lobo parietal, responsável
pela sensação de dor, tato, gustação, temperatura, pressão. Estimulação de
certas regiões deste lobo em pacientes conscientes produz sensações
gustativas. Também está relacionado com a lógica matemática; lobo occipital,
responsável pelo processamento da informação visual. Danos nesta área
promovem cegueira total ou parcial; e lobo temporal, relacionado
primariamente com o sentido de audição, possibilitando o reconhecimento de
tons específicos e intensidade do som. Tumor ou acidente afetando esta região
19
provoca deficiência de audição ou surdez. Esta área também exibe um papel
no processamento da memória e da emoção.
De acordo com RELVAS (2009, p.34) os dois hemisférios cerebrais
eram vistos como dois irmãos: um ativo, dinâmico e falante e outro tolo e mudo.
Em 1950, percebeu-se, que mesmo separados, funcionavam
independentemente.
Em 1960, constatou-se que o hemisfério direito era mudo, mas não
tolo. O esquerdo é resumidamente verbal e analítico. O direito é rápido,
complexo, espacial, perceptivo e configuracional.
GOLDBERG (2002, p.16) vê o hemisfério direito do cérebro como
especialmente equipado para lidar com situações e soluções novas, e o lado
esquerdo do cérebro com tarefas e processos rotineiros. Há, para ele, um ciclo
contínuo de informação, de compreensão, do hemisfério direito para o
esquerdo. “a transição da novidade à rotinização”, escreve ele, “é o ciclo
universal de nosso mundo interior.” Isto vai contra a noção clássica de que o
hemisfério esquerdo é o “dominante” e o hemisfério direito o “menor”, mas
concorda com a descoberta clínica de que lesões no hemisfério direito podem
ter efeitos muito mais estranhos e profundos do que os efeitos relativamente
diretos de lesões no hemisfério “dominante”. Deste modo, é a integridade do
hemisfério “menor”, assim chamado, que o autor crê ser crucial para o sentido
de eu ou identidade – sua integridade, e a integridade dos lobos frontais.
A autora (RELVAS, 2009, p.43) fala ainda da existência do lobo
límbico (ao redor da junção do hemisfério cerebral e tronco encefálico) – está
envolvido com aspectos de comportamento emocional e sexual e com o
processamento da memória.
Alguns autores têm outra maneira de definir essa caixinha de
surpresa presente e parte dos seres vivos. NICOLELIS (2011) discorre que o
cérebro:
20
É uma estrutura particular de células e fibras nervosas, encontrado em alguns, mas não em todos, os animais. Aqueles seres que não possuem um cérebro no mais estrito senso anatômico, apesar disso são capazes de realizar tarefas complexas, bem adaptadas às circunstâncias, definindo um comportamento que pode ser chamado de inteligência. (NICOLELIS, 2011, p.60-61)
Enquanto DAMÁSIO (2011, p.98) afirma que o cérebro tem a
capacidade de criar mapas, característica funcional distintiva de um sistema
dedicado a gerir e controlar o processo da vida. O autor traz ainda a
informação que:
O cérebro humano é um imitador inveterado. Tudo o que está fora do cérebro – o corpo propriamente dito, desde a pele até as vísceras obviamente, e mais o mundo circundante, homens, mulheres, crianças, cães e gatos, lugares, tempo quente e frio, texturas lisas e ásperas, sons altos e baixos, mel doce e peixe salgado –, tudo é imitado nas redes cerebrais. Em outras palavras, o cérebro tem a capacidade de representar aspectos da estrutura de coisas e eventos não pertencentes ao cérebro, o que inclui as ações executadas por nosso organismo e seus componentes, como os membros, partes do aparelho fonador etc. Como exatamente ocorre esse mapeamento é difícil de explicar. (DAMÁSIO, 2011, p.88)
Muitas são as definições e discussões em torno do cérebro e de
suas funções, não haverá um esgotar imediato, uma vez que a ciência é
contínua investigadora, aquela que encontra novas situações e carece de
novas soluções, mas diversos autores divergem e convergem ideias sobre o
encéfalo humano, que define quem é o ser humano, sua identidade, abriga
impulsos, ambições, personalidades e essência.
1.3- Uma ênfase ao cérebro cognitivo
A intencionalidade do indivíduo está investida nos lobos frontais, e
estes são cruciais para a consciência mais elevada, para julgamento,
imaginação, empatia, identidade, “alma”.
Assim, no famoso caso de Phineas Gage – um trabalhador de
ferrovia que, ao instalar uma carga de explosivos em 1848, teve uma bucha de
aço de setenta centímetros atingindo seus lobos frontais com a precipitação da
explosão –, embora sua inteligência tenha sido preservada, bem como sua
21
capacidade de mover-se, falar e ver, outras mudanças, profundas, ocorreram
nele. Ele se tornou imprudente e descuidado, impulsivo, irreverente; ele já não
podia planejar ou pensar no futuro; e para os que o haviam conhecido antes,
“ele não era mais Gage.” Ele perdera a sim mesmo, a parte mais central de seu
ser, e (como é o caso com todos os pacientes com severas lesões nos lobos
frontais) ele não sabia disso.
GOLDBERG (2002) diz:
Tal “anosognosia”, como é chamada, é, ao mesmo tempo, uma bênção (os pacientes não sofrem ou se angustiam ou lamentam sua perda) e um problema importante, pois ela solapa compreensão e motivação, e torna as tentativas de remediar a condição muito mais difíceis. (GOLDBERG, 2002, p.14)
Segundo CHABOT (2005, p.31) múltiplas conexões entre o sistema
límbico e o córtex pré-frontal foram descobertas, o autor destaca a distinção do
funcionamento do cérebro emocional e do cérebro racional, pois como o nome
mesmo indica, o cérebro racional, é racional e lógico, funciona de maneira
sistemática e ordenada, conhece a linguagem e pode se comunicar
verbalmente. Funda seu ajuizamento sobre as percepções e a lógica. Chabot
completa:
Sempre que uma nova informação ou um novo conhecimento chega até ele, examina-os e classifica-os em seu sistema conceitual. Se uma informação nova não entra em seu sistema, ele pode tanto rejeitá-la quanto questionar seu sistema de crenças, pois ele também é guiado por suas crenças e valores. São elas que orientam suas ações. Seu modo de aprendizagem, é cognitivo e sua memória declarativa concerne aos hipocampos. (CHABOT, 2005, p.32)
O cérebro possui uma capacidade de aprender informações
compostas e reproduzi-las mais tarde, queiramos ou não, com considerável
fidelidade e de várias perspectivas, o que traz a máxima de Marta Relvas, não
há aprendizagem, sem memória.
RELVAS (2009, p.56) afirma que a memória é a base de todo o
saber e, também, de toda a existência humana, desde o nascimento.
22
O conceito de memória vai, portanto, muito além do poder de
recordar. Memória é também a capacidade de planejamento, abstração,
julgamento crítico e atenção, conforme pode ser visto no capítulo a seguir.
23
CAPÍTULO II A MEMÓRIA HUMANA E O PROCESSO EDUCATIVO
A memória não é apenas aquilo que lembramos, mas também aquilo que esquecemos. O esquecimento é a saúde da Memória.
2.1- Em busca da Boa Memória
A oralidade e a escrita são dois fatores determinantes na viagem do
ser humano ao mundo. De uma para a outra, foram criadas as memórias,
através não só das lembranças, mas dos registros em imagens, fotografias,
escritas, livros, exposições, museus, enfim, a cada dia uma nova forma de
livrar-nos do esquecimento. NUNES (apud RELVAS, 2010, p.131) diz que “a
projeção incisiva no mundo é para lembrar. Há um desejo constante de se
reinventar e onde o conjunto de todas as invenções incorpore sua ideia
criadora: lembrar”.
A memória não está localizada em uma estrutura isolada do cérebro;
ela é um fenômeno biológico e psicológico envolvendo uma aliança de
sistemas cerebrais que funcionam juntos.
Para RELVAS (2009, p.56) a memória é a base de todo saber e,
também, de toda a existência humana, desde o nascimento. Daí, a autora
acrescenta que o conceito de memória vai muito além do poder recordar, pois,
define como a capacidade de planejamento, abstração, julgamento crítico e
atenção.
O autor IZQUIERDO (2011, p.11) abre seu livro de memória
definindo: “ “Memória” significa aquisição, formação, conservação e evocação
de informações. A aquisição é também chamada de aprendizado ou
aprendizagem: só se “grava” aquilo que foi aprendido.”
Quando se escuta a máxima: “somos aquilo que recordamos”, é que
vem à tona o quão importante é o armazenamento e o cuidado que se deve ter
24
com a memória, pois ela caracteriza as pessoas e contribui com a maneira de
ser e conviver com o outro, sem falar da projeção para o futuro, ou seja, de
quem se pode ser.
IZQUIERDO abrange o conceito quando diz:
Não podemos fazer aquilo que não sabemos, nem comunicar nada que desconheçamos, isto é, nada que não esteja na nossa memória. Também não estão a nossa disposição os conhecimentos inacessíveis, nem formam parte de nós episódios dos quais esquecemos ou os quais nunca atravessamos. O acervo de nossas memórias faz com que cada um de nós seja o que é: um indivíduo, um ser para o qual não existe outro idêntico. (IZQUIERDO, 2011, p.11)
Para LENT (2008, p.242) memória se refere ao processo mediante o
qual adquirimos, formamos, conservamos e evocamos informação. A fase de
aquisição é coloquialmente chamada “aprendizagem”, enquanto a evocação
recebe também as denominações expressão, recuperação e lembrança.
O acervo de nossas memórias faz com que cada um seja o que é,
um indivíduo, um ser para o qual não existe outro idêntico, e como a memória
provém da experiência, LENT diz que é mais sensato falar de “memórias” e
não de “Memória”, já que existem tantas memórias quanto experiências
possíveis.
LENT (2008, p.242) traz:
Nossa memória constitui nosso acervo pessoal de dados, o único que possuímos, o tesouro que nos permite traçar as linhas de ação atravessando o presente efêmero em que vivemos rumo ao futuro. Se não nos lembramos de como se caminha, não poderemos fazê-lo. (LENT, 2008, p.242)
O autor reforça que o conceito de memória requer abstrações, por
isso, enfatiza que seria apropriado reservar o uso da palavra “Memória” para
designar a capacidade geral do sistema nervoso central de adquirir, guardar e
evocar informações; e utilizar a palavra “memórias” para designar cada uma ou
cada tipo delas.
25
A memória se faz muito importante no processo de ensino
aprendizagem, principalmente, porque a retenção do conhecimento por um
determinando tempo é conhecido por memória. Baseada nisso, RELVAS
(2010) diz:
A aprendizagem se dá pela criação de novas memórias e pela ampliação das redes neuronais que armazenam o que já foi trabalhado, por meio das aprendizagens de conceitos e das metodologias que irão formar ou ampliar estas memórias. (RELVAS, 2010, p.35)
Para GOLDBERG (2002, p.100) “memória” não soa como um
conceito misterioso para a maioria das pessoas. O autor aponta que este termo
é quase sempre usado, sem sentido, para referir indiscriminadamente todos os
aspectos da mente. Ele diz que a memória está entre os aspectos mais
estudados e exemplifica dizendo que se for perguntado a dez pessoas o que a
“memória” faz, as respostas serão um tanto uniformes: aprendizado de nomes,
números de telefone, a tabela de multiplicação, e ter as datas dos eventos
históricos para o exame final.
GOLDBERG (2002) acrescenta:
Na maioria das situações na vida real, armazenamos e lembramos informações não em prol da lembrança em si, mas como um pré-requisito para resolver problemas que surgem. Aqui, lembrar é um meio para um fim, não um fim. Além disso, e isto é particularmente importante, certas lembranças são acessadas e trazidas não em resposta a um comando externo vindo de alguém mais, mas em resposta a uma necessidade interiormente gerada. Em vez de dizerem o que devo lembrar, eu próprio tenho de decidir que informação é útil para mim no contexto de minhas atividades em decorrência no momento. (GOLDBERG, 2002, p.100)
Todas as memórias, por sua vez são guardadas e classificadas,
enfim, coordenadas pelo lobo frontal. Nessa área cerebral, as diferentes
memórias se completam dando origem ao raciocínio.
O início da formação das memórias se dá na fase conhecida por
aquisição e que consiste na chegada das informações aos sistemas sensoriais
26
(visual, tátil, auditivo, olfativo e gustativo) na forma de estímulos. Os dados que
chegam ao cérebro são, então, processados em diferentes regiões e resultam
em memórias que pode ser vista a seguir.
2.2 – Tipos de Memória
Levando em conta seu conteúdo, pelos estudos de LENT (2008,
p.245) pode-se distinguir basicamente dois grandes tipos de memórias: as
declarativas ou explícitas e as memórias procedimentais ou implícitas, as que
muitos denominam também hábitos, e que evoca-se de maneira mais ou
menos automática.
Classificando, as memórias declarativas são aquelas que contêm
informação que, em geral, sabe-se que o ser humano a possui e à qual se tem
acesso consciente. Esse tipo de memória inclui o conhecimento da história
pessoal sobre o mundo que rodeia o indivíduo, e pode subdividir-se em dois
tipos: memórias episódicas e memórias semânticas. A memória episódica é
aquela que contém informação acerca da própria vida e de eventos
relacionados com ela, como por exemplo, a festa de 15 ou 18 anos ou o dia em
que se conheceu a companheira ou o companheiro. Ao contrário, as memórias
declarativas semânticas contêm informação a respeito do ambiente que rodeia
cada pessoa e da qual se é capaz de lembrar sem saber como, quando e/ou
onde a adquire. As memórias procedimentais (de procedimento ou implícitas,
ou ainda não declarativas) contêm informação à qual não se tem acesso
consciente, tal como o conhecimento de um procedimento automático (dirigir
um automóvel, digitar um documento) e a informação adquirida durante
paradigmas de condicionamento e habituação.
Na formação das memórias declarativas participam várias regiões
corticais (pré-frontal, entorrinal, parietal, etc.) e, fundamentalmente, o
hipocampo, uma estrutura cortical filogeneticamente antiga localizada no lobo
temporal do cérebro. A formação das memórias implícitas envolve uma dessas
27
áreas, mas depende principalmente de circuitos subcorticais (envolvendo o
núcleo caudado, por exemplo) ou cerebelares.
LENT (2008) descreve que de um ponto de vista funcional, existe um
tipo de memória que é crucial no momento da aquisição e da evocação de toda
e qualquer outra memória, seja declarativa ou não: a memória de trabalho ou
operacional:
Comparativamente, a memória de trabalho representa a função que a memória RAM (random-access memory) cumpre em um computador: manter a informação viva disponível enquanto está sendo percebida e/ou processada. Essa forma de memória é sustentada pela atividade elétrica dos neurônios do córtex pré-frontal e sua interação com o córtex entorrinal, o hipocampo e a amígdala. A memória de trabalho não deixa traços: depende exclusivamente da atividade neuronal on-line. Em alguns quadros esquizofrênicos existem falhas graves da memória de trabalho, as quais causam distorção da percepção ou alucinações. (LENT, 2008, p.247)
As memórias que persistem no tempo denominam-se memórias de
curta e de longa duração, declarativas ou procedimentais. As primeiras duram
entre 30 minutos e 6 horas, enquanto as segundas perduram durante muitas
horas, dias ou até anos. Neste último caso são denominadas memórias
remotas. O processo de formação de memórias de longa duração requer uma
sequência de eventos moleculares que dura várias horas e que é suscetível de
numerosas influências. A memória de curta duração é a encarregada de
manter a informação comportamentalmente disponível durante essas horas nas
quais a memória de longa duração ainda não adquiriu sua forma definitiva.
Outro grande nome no que diz respeito a memória, IZQUIERDO
(2011, p.25) afirma que existem basicamente dois tipos de memória de acordo
com sua função. Uma muito, breve e fugaz, serve para “gerenciar a realidade”
e determinar o contexto em que os diversos fatos, acontecimentos ou outro tipo
de informação ocorrem, se vale a pena ou não fazer uma nova memória disso
ou se esse tipo de informação já consta dos arquivos. É a memória de trabalho.
Seve para manter durante alguns segundo, no máximo poucos minutos, a
informação que está sendo processada no momento, e também para saber
28
onde se está ou o que se está fazendo a cada momento, e o que se faz ou
onde se está no momento anterior. Dá continuidade, assim, aos atos
individuais.
A memória de trabalho diferencia-se das demais porque não deixa
traços e não produz arquivos. Os demais tipos de memória, sim.
A memória de trabalho se define melhor através de exemplos. Usa-
se a memória de trabalho, por exemplo, quando se “conserva” na consciência
por alguns segundos a terceira palavra da frase anterior (que a esta altura, já
se esqueceu). A retenção dessa palavra só serviu para conseguir entender
essa frase, seu contexto e o significado do que veio a seguir. Usa-se a
memória de trabalho quando se pergunta para alguém o número do telefone do
dentista: conserva-se esse número o tempo suficiente para discá-lo e, uma vez
feita a comunicação correspondente, o esquece.
A memória de trabalho pode ser medida através da memória
imediata e, de fato, ambos os termos podem ser considerados sinônimos.
Muitos não consideram a memória de trabalho como um verdadeiro
tipo de memória, mas como um sistema gerenciador central que mantém a
informação “viva” pelo tempo suficiente para poder eventualmente entrar ou
não na Memória propriamente dita.
Numa definição básica, IZQUIERDO (2011, p.30) descreve que
dentre as memórias declarativas, as referentes a eventos aos quais se assiste
ou dos quais se participa denominam-se episódicas ou autobiográficas e as de
conhecimentos gerais, semânticas. As lembranças da formatura, de um rosto,
um filme ou de algo que se lê ou que se contam são memórias episódicas. As
memórias episódicas são todas autobiográficas; existem na medida em que se
sabe sua origem.
Denominam-se memórias procedurais ou memórias de
procedimento as memórias de capacidades ou habilidades motoras e
sensoriais e o que comumente se chama de “hábitos”. Exemplos típicos são as
29
memórias de como andar de bicicleta, nadar, saltar, soletrar, etc. É difícil
“declarar” que se possui tais memórias; para demonstrar que se tem, deve-se
de fato andar de bicicleta, nadar, saltar ou soletrar.
Pode-se dividir esses dois tipos de memória em explícitas e
implícitas (até poucos anos atrás, consideravam-se explícitas só as memórias
declarativas). As memórias de procedimentos são em geral adquiridas de
maneira implícita, mais ou menos automática, e sem que o sujeito perceba de
forma clara que as está aprendendo: resulta difícil, senão impossível, descrever
de forma coerente (e, portanto, tornar explícita) cada passo da aquisição da
capacidade de andar de bicicleta. Muitas das memórias semânticas também
são adquiridas de maneira inconsciente ou implícita; por exemplo, a língua
materna. As memórias adquiridas sem a percepção do processo denominam-
se implícitas. As memórias adquiridas com plena intervenção da consciência se
chamam explícitas.
Muitos autores consideram a memória evocada através de “dicas”
(fragmentos de uma imagem, a primeira palavra de uma poesia, certos gestos,
odores e sons).
IZQUIERDO (2011, p.34) traz os seguintes exemplos: “Muitas vezes
um homem só lembra realmente da localização de um determinado edifício
quando vira a esquina prévia ao mesmo. Um músico só lembra o resto de uma
partitura quando executa ou ouve as primeiras notas.”
Ainda de acordo com IZQUIERDO (2011, p.36) o priming é um
fenômeno essencialmente neocortical. Participam dele o córtex pré-frontal e
áreas associativas.
Diante do que foi exposto acerca das definições, tipos e
processamento da memória, fica o aforismo que memória e aprendizado são
duas faces da mesma moeda, por isso, se pode compreender, facilmente, que
tudo aquilo que vier a ocupar a nossa memória de trabalho terá o poder de
afetar a sua eficácia. Daí valerá deixar claro para educadores a importância de
se conhecer o funcionamento da memória dos alunos para um aprendizado
30
rumo ao sucesso, sem falar dos entraves e empecilhos que podem impedir o
bom funcionamento e execução da boa memória, ou ainda como se pode
entender os esquecimentos, também conhecidos como “brancos”.
Esquecer do inútil e nocivo e lembrar do útil e prazeroso, certamente
consiste em uma boa fórmula para a manutenção de um cérebro saudável.
2.3 – Esquecimento
O aprendizado, o pensamento e o raciocínio não seriam possíveis
sem a memória como já visto anteriormente, mas a capacidade de esquecer
também tem muitas funções significativas no processo. Até porque a
característica mais saliente da memória é o esquecimento.
A memória é a função cerebral que mais se encaixa com o dito de
que "a função faz o órgão". Se praticada intensamente, é mantida, do contrário
dissolve-se no esquecimento. Então, na maioria das vezes, tudo o que se
aprende, de todas as várias memórias que se formam na vida, se perde ou se
extingue.
Segundo IZQUIERDO (2011, p.40) o ser humano esquece a imensa
maioria das informações que alguma vez foram armazenadas. Pode ser visto
que isso se aplica à totalidade das informações que passam pela memória de
trabalho, mas também acontece com o resto das memórias, as que formam
arquivos.
De fato, conserva-se só uma fração de toda a informação que passa
pela memória de trabalho; e uma fração menor ainda de tudo aquilo que
eventualmente se conserva por um tempo nas nossas memórias de curta e de
longa duração. As memórias remotas são às vezes intensas e quase sempre
valiosas; porém, representam somente uma pequena parte de tudo aquilo que
alguma vez se aprende e se lembra.
31
A vida social, de fato, seriam impossível se o ser humano lembrasse
de todos os detalhes da interação com todas as pessoas e de todas as
impressões que se tem de cada uma dessas interações. Não se poderia sequer
dialogar com os seres queridos se cada vez que fossem vistos viesse à
lembrança algum mal-estar ou alguma briga ou humilhação, por menor que
fosse. Por isso, há uma imensa importância o esquecimento, que por sua vez,
relaciona-se com a manutenção da sanidade cerebral, uma vez que necessita-
se “jogar fora” informações inúteis, não mais necessárias ou muito irrelevantes,
bem como o computador se apresenta lento, pesado quando está com a
“memória cheia”.
IZQUIERDO (2011) conclui:
Existem, além do esquecimento e da perda real de memórias, a habituação e a extinção. Estas são, porém, como vimos, supressões reversíveis da evocação. Uma memória habituada ou extinta não está realmente esquecida: está, pelo contrário, suprimida no que diz respeito à sua expressão. Um aumento da intensidade do estímulo reverte a habituação; uma nova apresentação do estímulo condicionado reverte a extinção. (IZQUIERDO, 2011, p.40)
IZQUIERDO (2011, p.82) explica também que os “brancos” são
falhas repentinas e inesperadas da evocação que ocorrem em momentos de
ansiedade ou estresse. Afirma que os “brancos” são comuns em alunos que
devem recitar uma poesia, ou lembrar-se de uma resposta difícil; em cantores
na hora de ver-se ante a plateia ou em professores com pouca experiência. O
autor diz que obedecem a uma descarga de corticoides da suprarrenal, como
ocorre habitualmente em momentos de estresse ou alta ansiedade. Os
corticoides agem diretamente sobre receptores próprios no hipocampo e
também indiretamente estimulando mecanismos noradrenérgicos na amígdala
basolateral.
A melhor forma de manter viva a memória, em geral, é por meio da
leitura e a melhor maneira de manter viva cada memória em particular é
recordando-a. Como isso nem sempre é possível, e certamente não desejável,
se deve aprimorar na prática da arte de esquecer.
32
Logo, RELVAS (2012, p.172) conclui que o esquecimento é uma arte
por não permitir o acúmulo desnecessário de informações inúteis que
atrapalham o raciocínio de avançar.
2.4 – A Plasticidade Cerebral e o Processo Educativo
As alterações decorrentes da aprendizagem e da memória são
chamadas plasticidade.
RELVAS (2009, p.80) traz a informação que plasticidade é a
capacidade de o sistema nervoso alterar o funcionamento do sistema motor e
perceptivo baseado em mudanças no ambiente. E estreita a informação,
quando diz que a plasticidade cerebral é a denominação das capacidades
adaptativas do sistema nervoso central – sua habilidade para modificar sua
organização estrutural própria e funcionamento. É a propriedade do sistema
nervoso que permite o desenvolvimento de alterações estruturais em resposta
à experiência e como adaptação a condições mutantes e a estímulos repetidos.
A autora RELVAS (2009) diz:
Este fato é melhor compreendido por meio do conhecimento do neurônio, da natureza das suas conexões sinápticas e da organização das áreas cerebrais. A cada nova experiência do indivíduo, redes de neurônios são rearranjadas, outras tantas sinapses são reforçadas, e múltiplas possibilidades de respostas ao ambiente tornam-se possíveis. (RELVAS, 2009, p.49)
LENT (2008, p.223) diz que o conceito de plasticidade cerebral tem-
se revelado especialmente fértil no domínio da fisiologia do movimento. Até os
anos 1980, acreditava-se que, uma vez estabelecidas durante o
desenvolvimento, as representações sensorimotoras tornavam-se estáveis,
permanecendo fixas por todas a vida adulta. Mais recentemente, tem-se
demonstrado que essas representações são dinâmicas e estão em constante
mudança no cérebro humano normal, em função do aprendizado e da
experiência individual.
33
Enquanto GOLDBERG (2002, p.245) afirma que há indícios de que o
exercício cognitivo ajuda a mudar o próprio cérebro, e revela ainda que a
melhoria no “poder cerebral” por meio da ativação cognitiva é mais do que uma
fantasia. E conclui:
Essas descobertas são essenciais em dois aspectos. Primeiro, elas desmascaram a antiga noção de que novos neurônios não podem se desenvolver em um cérebro adulto; na verdade podem. Em segundo lugar, estas descobertas demonstram com grande clareza que o aprimoramento cognitivo pode realmente mudar a estrutura cerebral e melhorar sua capacidade de processamento de informação. O crescimento de novas células foi especialmente evidente no giro dentado do hipocampo, uma estrutura na superfície mediana do lobo temporal considerada especialmente importante na memória. (GOLDBERG, 2002, p.247)
De acordo com essas afirmações, se o exercício cognitivo melhora e
aperfeiçoa o próprio cérebro, então é importante planejar um programa
sistemático, garantindo que todas as partes importantes do cérebro, ou pelo
menos a maioria delas, estejam envolvidas. Então, há uma real necessidade do
docente conhecer a realidade de seus educandos para um pleno processo
educativo.
RELVAS (2012, p.118) diz que a plasticidade cerebral pode ser
encarada sob vários ângulos, seja mediante abordagem experimental (que é a
mais comum), seja na perspectiva mais concreta da existência e expressão
funcional do sistema nervoso, como, por exemplo, motricidade, percepção e
linguagem.
A plasticidade cerebral é de fundamental importância para
conhecimento e aprofundamento de um saber maior, pois influencia
diretamente no favorecimento ou no prejuízo a formação de novas conexões
cerebrais, aperfeiçoando o progresso educativo.
E RELVAS (2009) finaliza:
Como o sistema nervoso de uma criança em desenvolvimento é mais plástico que o sistema nervoso do adulto, a atuação
34
correta e eficaz na estimulação da plasticidade é de fundamental importância para a máxima da função motora/sensitiva do aprendente, visando facilitar o processo de aprender a aprender no cotidiano escolar. È o nosso grande desafio como educador conhecer o cérebro de nossos aprendizes, e tão logo o funcionamento, pois cada um tem as suas próprias características. (RELVAS, 2009, p.50)
E o que fica para reflexão a seguir, após o supracitado é: qual a
importância da Neurociência Pedagógica e de tantos estudos no
aprimoramento da aprendizagem humana? Ou ainda o que a
Neuroaprendência pode contribuir frente a uma aprendizagem significativa?
Veja no capítulo a seguir.
35
CAPÍTULO III
NEUROAPRENDÊNCIA – A COGNIÇÃO E A MEMÓRIA FRENTE À APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA
O que não consigo construir, não consigo entender.
Richard Feynman
3.1- A Neuroaprendizagem e seus caminhos
O cérebro gosta de razões para decidir. Eis uma máxima que leva a
refletir a importância do aprendizado na vida humana, independente da
instância: escolar, pedagógica, afetiva, pessoal. Mas, é inegável a ênfase na
dimensão cognitiva, racional. E, é RELVAS (2012, p.19) quem traz a
informação para servir de base para este estudo, quando afirma que no
processo educacional não há “atrasados”, uma vez que todos têm o direito a
uma escola que promova a aprendizagem cognitiva, motora, afetiva e social. A
autora evidencia que essa é uma tarefa da Sociedade Humana, afinal, somos
diferentes em nossa totalidade. Afirma também que neuroaprendizagem é:
o estudo científico da aprendizagem que promove ao educador acompanhar os diversos desempenhos escolares dos estudantes na sala de aula, reconhecendo as áreas específicas do cérebro que poderão ser estimuladas no ato do aprender. (RELVAS, 2012, p.20)
De acordo com a autora, todos os indivíduos têm a possibilidade de
aprender, em maior ou menor grau, o importante é realizar uma observação e
investigação precoce das estruturas que envolvem os fatores da
aprendizagem, tais como: atenção (foco), memória (secretária) e compreensão
(significado).
E a partir desta premissa o educador deve se preparar para
encontrar a sua classe diversificada, ajustando os trabalhos à classe de modo
que se permita o desenvolvimento máximo das aptidões de cada aluno.
36
Atualmente, têm sido um grande desafio a organização da
informação e da evolução humana diante de tantas ferramentas decisórias na
construção da aprendizagem e do conhecimento. O que desafia o educador é a
utilização adequada em prol de pensamentos, sentimentos e ações.
Diante do desafio proposto, encontra-se a ideia de não separar o
mundo da razão do mundo da emoção, pois, quando se aprende com a cabeça
e com o coração, sempre se tem algo a dizer sobre o que parece ter aprendido
e conforme RELVAS (2009, p.114) reforça: a aprendizagem torna-se mais
impregnada, mais verdadeira.
Faz-se necessário pensar criativamente o cotidiano e desenvolver
habilidades para enfrentar as incertezas da educação, antes que ocorra o
empobrecimento da espécie humana é uma das afirmações de RELVAS (2009,
p.113)
Hoje, a ciência admite a existência de dois cérebros, divididos pela
diferença de suas funções ligadas às regiões que as operam.
RELVAS (2012) salienta:
As emoções são conjuntos de reações químicas e neurais que ocorrem no cérebro emocional e que usam o corpo como “teatro”, ocasionando até as emoções viscerais, que afetam os órgãos internos, de acordo com a sua intensidade. (RELVAS, 2012, p.61)
Quando se fala em emoções humanas, pensa-se também em uma
fonte de informações que contribuem na tomada de decisões, na junção da
razão e da emoção, associadas a outras competências emocionais que rumam
ao sucesso nas relações humanas, sejam pessoais ou impessoais, ou ainda
interpessoais, para que haja aprendizagem eficaz.
Alguns fatores são importantes nesta caminhada. RELVAS (2012,
p.62) cita alguns: tolerância à ambiguidade, compostura, autoconfiança,
37
empatia, energia, humildade, criatividade e planejamento, como prioridade nas
ações.
Neste contexto surge a inteligência, que dá a chave para o tesouro
do entendimento sobre cada ser e como a seleção natural pôde produzir
tamanha maravilha como o cérebro humano e sua capacidade em tempo tão
curto.
RELVAS (2012) define:
Parece que existem tantas definições de inteligência, quanto existem cientistas trabalhando no campo. De acordo com a Enciclopédia Britânica, a inteligência “é a habilidade de se adaptar efetivamente ao ambiente, seja fazendo uma mudança em nós mesmos, ou mudando o ambiente ou achando um novo ambiente”. Esta é uma definição inteligente, porque ela incorpora aprendizado (uma mudança em nós mesmos), manufatura e abrigo (mudança do ambiente) e migração (encontrando um novo ambiente). De modo a nos adaptar efetivamente, o cérebro deve usar todas estas funções. Portanto, “inteligência não é um processo mental único, mas sim uma combinação de muitos processos mentais dirigidos à adaptação efetiva do ambiente”, prossegue a definição da EB. (RELVAS, 2012, p.65)
A definição perfeita da inteligência é um dos principais motivos pelo
qual ainda há obrigação de se estudar sua forma e sua estrutura.
A mente humana possui potencial para lidar com diversos tipos de
conteúdos, e um desempenho incomum tende a ser específico a conteúdos
particulares. Os seres humanos evoluíram até apresentar diversas inteligências
e não se basearam de formas diferentes em uma inteligência flexível.
RELVAS (2010, p.122) diz que cada vez mais ocorre um
convencimento de que progresso, sucesso e felicidade humana estão
intimamente ligados a melhores oportunidades educacionais, que poderiam ser
invocados, esquematizando-se um esforço centrado nas sete regiões
intelectuais nas quais a maioria dos seres humanos possui potencial para
38
sólido avanço, considerando-se, o contexto cultural no qual estes indivíduos
estão inseridos.
Conforme, dito inicialmente, atualmente, aceita-se a ideia de que
temos duas memórias: uma emocional que se emociona, sente, comove e
outra racional que compreende, avalia, julga, analisa, pondera, reflete.
Segundo RELVAS (2010, p.123) o dualismo razão e emoção se une
por meio de um mecanismo dinâmico, uma impelindo a outra com grande
velocidade na tomada de decisões.
DAMÁSIO (2011, p.378) diz que dois tipos de estruturas neurais
localizam-se na fronteira entre o cérebro e o mundo. Um tipo volta-se para
dentro; o outro, para fora.
A proporção existente entre emoção, prazer e aprendizado é o que
contribui no aumento de estímulos para gerar bons resultados, ou seja, o
melhor caminho para as convivências sociais do mundo atual é unir razão e
emoção, para que se construa o alicerce necessário à construção do
conhecimento e da aprendizagem significativa.
De acordo com as concepções contemporâneas do desenvolvimento
humano, quando a criança atinge a idade escolar, as funções neurossensório-
motoras e as demais funções cerebrais (sensação, percepção, emoção) estão
ainda muito confusas e, por isso, a discriminação entre o seu eu e sua
experiência não se realiza apenas na dimensão cognitiva.
Daí a necessidade da intervenção docente, que deve fazer vez em
sua função de promover a construção da afetividade e da organização dessas
funções citadas, nos alunos e na interação com seus grupos, pois, o intelecto
humano, a memória, a afetividade, o aprendizado, os sentimentos, as intuições,
as motivações religiosas, o estado de espírito e o mundo das emoções podem
estar associados a eventos neurológicos observáveis e perpassam toda a vida
humana.
39
Nesse sentido, RELVAS (2012, p.74) explica como ocorrem os
processos intelectivos, através dos mecanismos cerebrais responsáveis pela
aprendizagem.
O cérebro está dividido em três partes fundamentais: o hipotálamo, o
sistema límbico e o córtex.
O Hipotálamo é um pequeno órgão, localizado na base do crânio
que controla as funções de sobrevivência. Ali reside o centro da fome, da
saciedade, da sede, do impulso sexual.
O Sistema Límbico tem a função de prover o indivíduo de emoções,
é denominado como a casa dos sentimentos. É responsável pelo equilíbrio ou
desequilíbrio emocional do ser humano, responsável pela produção das
sensações ligadas aos processos emotivos.
O Córtex é responsável por três tarefas: o controle dos movimentos
do corpo, a percepção dos sentidos e o pensamento. Foi durante muito tempo
sinônimo de inteligência, razão e espírito, é o protagonista-mor dos grandes
voos humanos, é o promotor da racionalidade humana.
Cabe lembrar que as três partes existem e funcionam
simultaneamente, porém, independentes entre si e que se completam quando
são bem conduzidos os estímulos sensoriais, emocionais e motores.
De acordo com RELVAS (2012, p.75):
Esta arte de bem conduzi-las recebe o nome de arte de viver, de sucesso, de equilíbrio, de saúde. Poderíamos acrescentar que a capacidade de aprender e de ser inteligente está ligada ao prazer que a conquista do conhecimento pode proporcionar, principalmente quando este conhecimento é produzido pelo próprio educando. Isto nos leva a supor que o nível de emoção no momento do aprender interferiria no resultado final do processo. (RELVAS, 2012, p.75)
Talvez, a educação e a neurociência ainda precisam percorrer
caminhos difíceis rumo ao aprendizado significativo, mas cabe registrar que o
40
processo de aprendizagem de cada pessoa está associado à construção de
pontes entre a objetividade e a subjetividade, entre o ser que aprende e o ser
que ensina, entre o saber e o não-saber, entre os seres que coexistem e,
juntos, se humanizam, conforme diz RELVAS (2009, p.127).
Não se pode negar que o sujeito cerebral docente tem muito a
contribuir com o sucesso ou com o fracasso do ensino aprendizagem quando
faz ou não faz, ou melhor, quando não estimula corretamente as áreas
cerebrais aqui apresentadas para um desenvolvimento do conhecimento
cognitivo e emocional. Lembrando que seu papel é dialogar com ações que
tornem a escola uma potencializadora de inteligências.
Numa análise um pouco mais profunda do papel e da importância da
memória e das funções executivas no processo de aprendizagem significativa,
considerando as práticas positivas e negativas que favorecem ou não ao pleno
desenvolvimento da nossa Educação brasileira, nos dias e nas realidades
atuais, RELVAS (2012, p.78) afirma que introduzir a noção de humanização
nos estudos, no ensino, que envolve a vida humana, particularmente a
educação, significa reconhecer a implicabilidade dos sentimentos e emoções
que fazem brilhar a presença do ser no mundo.
É claro que a Neurociência sozinha não poderá dar conta de todas
as tarefas árduas da Educação, pois conta com o apoio de profissionais
envolvidos direta ou indiretamente com tal caminho, mas não se pode esquecer
existe uma íntima ligação entre o aprender e a forma como ocorre o processo
de compreensão das informações. Quando este processo ocorre de forma
harmônica entre as partes cerebrais, a aprendizagem torna-se integral,
significativa, prazerosa, humanizada. Por isso, a Neurociência, através do
cérebro executivo e da “boa memória” pode contribuir para a conservação e
transformação social da aprendizagem humana.
Afinal, alto é o valor da educação na e para a sociedade, contudo, a
maior ou menor intensidade desse brilho depende da força que impulsiona o
41
professor, o aluno, o ser humano a crescer e se transformar emocional e
cognitivamente. Pois, aprendizagem é a transformação de comportamentos.
RELVAS (2012) aponta:
Muitos educandos não conseguem aprender determinadas matérias por não encontrarem um sentido neste aprender. O conhecimento não possui nenhum sentido na vida do educando, contudo, se o educador criar novas metodologias visando à integração do educando com o conhecimento, poderá ocorrer uma melhora significativa na qualidade de suas aulas, bem como no resultado final do processo de ensino e aprendizagem, transformando sua prática cotidiana em uma educação pelo afeto ou neuroaprendente. (RELVAS, 2012, p.79)
Na certeza de que o presente trabalho não pretende esgotar esta
questão, porém formar novas conexões neurais, através de sinapses
alcançadas por estudos e por um olhar “neuropedagógico” sobre aprendizagem
significativa e transformadora.
42
CONCLUSÃO
A noite de hoje está me parecendo um sonho. - Mas não é. É que a realidade é inacreditável.
Clarice Lispector
Diante do exposto, conclui-se que a neurociência pedagógica é
fundamental para uma formação humana e digna, levando-se em consideração
o cérebro cognitivo e a memória como grandes aliados na valorização da forma
de saber e da aprendizagem significativa.
A Neurociência, na complexidade do mundo atual, implica colocar a
educação a serviço de novas finalidades, a fim de se poder, na tentativa de
superar tudo o que tem corroído a humanidade neste quadro de caos e de
barbárie em que vivemos e que a cada dia se acentua mais, construir um futuro
mais compromissado com toda a humanidade, destruindo assim, ideias e
valores defasados e preconceituosos, confrontando assim o emocional e o
cognitivo, o sistema límbico e o cérebro executivo.
A emancipação humana se conquista na razão e na emoção, mas
também na participação que o conhecimento-emancipação é capaz de
construir. O conhecimento-emancipação é assim um processo incessante de
criação de sujeitos capazes de reciprocidade, capazes de diálogo, de
participação consciente. Urge reforçar e reconstruir incessantemente a
qualidade da educação, em todo o amplo espaço público e educacional,
comprometida com a formação de homens e mulheres competentes e capazes,
seres pensantes, críticos e transformadores, que tem capacidade de lidar com
problemas educacionais e sociais, evitando-se, o que RELVAS (2012, p.126)
chama de “empobrecimento da espécie humana”. Em suma, seres realizados e
felizes.
Por tudo que a ciência já viveu, já avançou, acredita-se que ainda há
muito para avançar, mas que muito também já foi percorrido, uma vez que
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antigamente, muitas outras definições, conceitos e ideias foram considerados
verdades imutáveis e que ao longo do tempo caíram por terra.
Hoje, acredita-se que se aprendizagem ocorrer em um ambiente
motivador, que desperta o gosto, o interesse, este processo acontecerá de fato,
será verdadeiro, pois terá significado, além de enriquecer maciçamente o
âmbito escolar e o processo ensino-aprendizagem.
A educação de qualidade, não aquela voltada para o ingresso na
universidade ou aquela que se direciona para o mercado de trabalho, se
estabelece quando as competências para a formação de um indivíduo são
plenamente desenvolvidas, respeitando as individualidades do aluno, do
indivíduo, do ser humano.
A Neurociência é um instrumento essencial na mudança do ensino,
cuja transformação implica no aprender significativo, no emocionar-se até certo
ponto, sempre que se houver relacionamento com o conteúdo aprendido.
Dado o exposto, entende-se que o conhecimento, o cuidado e as
ações que estimulam o cérebro cognitivo, a memória e o sistema límbico,
implicam em uma mudança de mentalidade e, consequentemente, de atitude
por parte de pessoas, humanos, seres que aprendem com a cabeça e com o
coração, assim, abertos ao novo, compromissados, unidos, com esperança,
superando barreiras e vencendo desafios, confiantes de uma educação melhor
e plenamente significativa.
Na construção deste trabalho teve-se a clara percepção de sua
“inconclusão”. Parecia que, ao tentar responder às questões surgidas no meio
da pesquisa e dos problemas enfrentados relativos ao tema, muitas ficavam
sem respostas e outras transformavam-se em novas hipóteses. Contudo,
espera-se que fique registrado que o importante é acreditar no potencial que
cada um tem de desenvolver-se e projetar-se para o mundo, independente das
limitações afetivas, emocionais, motoras, sociais, biológicas e sobretudo,
humanas.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
& CHABOT. Daniel e Michel. Pedagogia Emocional – Sentir para aprender - São Paulo: Sá Editora, 2005.
& DAMÁSIO, António. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos sentimentos, São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
& DAMÁSIO, António R. E o cérebro criou o Homem -, São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
& GOLDBERG, Elkhonon. O Cérebro executivo: lobos frontais e a mente civilizada -, Rio de Janeiro: Imago Ed., 2002.
& IZQUIERDO, Iván. Memória. 2ª Ed., rev. E ampl. – Porto Alegre: ArtMed, 2011.
& LENT, Roberto. Neurociência da Mente e do Comportamento -, Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.
& NICOLELIS, Miguel. Muito além do nosso eu: a nova neurociência que une cérebros e máquinas – e como ela pode mudar nossas vidas -, São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
& RELVAS, Marta Pires. Fundamentos Biológicos da Educação: despertando Inteligências e afetividade no processo de aprendizagem - 4ª edição – Rio de Janeiro: Wak Ed., 2009.
& RELVAS, Marta Pires. Neurociências e transtornos de aprendizagem: as múltiplas eficiências para uma educação inclusiva. – 4. ed. – Rio de Janeiro: Wak Ed., 2010.
& RELVAS, Marta Pires. Neurociência e Educação: Potencialidades dos gêneros humanos na sala de aula. – 2. ed. - Rio de Janeiro: Wak Ed., 2010.
& RELVAS, Marta Pires. Neurociência na prática pedagógica – Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012.
& RELVAS, Marta Pires (organizadora) [et al.]. Que cérebro é esse que chegou à escola? As bases neurocientíficas da aprendizagem – Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012.
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
EPÍGRAFE 5
RESUMO 6
METODOLOGIA 8
SUMÁRIO 9
INTRODUÇÃO 10
CAPÍTULO I
O CÉREBRO COGNITIVO E O SUJEITO CEREBRAL 12
1.1 – O descobrimento do cérebro – Uma breve história 12
1.2 – Diversos olhares conceituando o cérebro 18
1.3 – Uma ênfase ao cérebro cognitivo 20
CAPÍTULO II
A MEMÓRIA HUMANA E O PROCESSO EDUCATIVO 23
2.1 – Em busca da boa memória 23
2.2 – Tipos de Memória 26
2.3 – Esquecimento 30
2.4 – A Plasticidade Cerebral e o Processo Educativo 32
CAPÍTULO III
NEUROAPRENDÊNCIA – A COGNIÇÃO E A MEMÓRIA FRENTE AO APRENDIZADO 35
3.1 – A neuroaprendizagem e seus caminhos 35
CONCLUSÃO 42
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 44
ÍNDICE 45
FOLHA DE AVALIAÇÃO 46
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Cândido Mendes
Título da Monografia: O CÉREBRO COGNITIVO E A MEMÓRIA
HUMANA FRENTE A UMA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA
Autor: ADRIANA DO CARMO FELIPE
Data da entrega: 06/04/2013
Avaliado por: MARTA PIRES RELVAS
Conceito: ______________
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