as chuvas na bacia do rio acre e o fluxo das Águas em rio
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AS CHUVAS NA BACIA DO RIO ACRE E O FLUXO DAS ÁGUAS EM RIO
BRANCO, AMAZÔNIA OCIDENTAL
Alejandro Fonseca Duarte
Departamento de Ciências da Natureza, Universidade Federal do Acre – UFAC
alejandro@ufac.br
RESUMO
O conhecimento sobre as características dos fluxos dos rios amazônicos é assunto de
grande interesse relacionado com a preservação ambiental e os serviços ambientais. A
grande bacia hidrográfica do Amazonas e sua significação global estão sintetizadas em
dez sub-bacias e numerosas microbacias que obedecem a escalas regionais e locais
importantes para ecossistemas florestais, urbanos e rurais. A bacia do rio Acre faz parte
da sub-bacia Solimões-Purus-Coari, tem 35 mil km2 de área de drenagem, deles 23 mil
km2, a montante de Rio Branco. A relação entre chuvas e vazões reflete as
características geomorfológicas da bacia, que pela sua vez se mostram nas
particularidades dos registros de níveis e hidrogramas. Neste trabalho são expostos os
resultados dos estudos dos hidrogramas de enchentes do rio Acre em Rio Branco, que
incluem suas formas, sequências de picos e vazões associadas ao comportamento
sazonal e às variabilidades climáticas na parte sudocidental da bacia amazônica.
Palavras-chave: Hidrografia, Bacia do rio Acre, Amazônia.
ABSTRACT Knowledge about the characteristics of the Amazon River flows is a subject of great
interest related to environmental conservation and services. The vast Amazon Basin and
its global significance are summarized in ten sub-basins and watersheds that meet the
numerous regional and local scales relevant to forest ecosystems, and urban and rural
areas. The Acre River basin is part of the Solimões-Purus Coari sub-basin, It has 35.000
km2 of drainage area, with 23.000 km2 of them being upstream from Rio Branco. The
relationship between rainfall and streamflow reflects the geomorphological
characteristics of the basin, which in turn are shown in the particularities of its
hydrographs. In this work are exposed the results of studies of the flooding hydrograph
of the Acre River in Rio Branco, including their shapes, sequences of peaks and flows
associated to seasonal and climate variability in the South Western Amazon.
Key-words: Hydrography, Acre River Basin, Amazon.
2
1. INTRODUÇÃO A preservação da qualidade das águas nos ecossistemas e a manutenção do equilíbrio do
ciclo hidrológico, bem como também a preservação da distribuição geográfica
harmônica da água no planeta: nas suas fases de vapor, liquida e sólida; em mares, na
atmosfera, rios, lagos, subterrâneos, aquíferos, calotas polares e geleiras, constitui uma
preocupação compartilhada por governos e comunidades sociais. A Amazônia é uma
região de florestas, campos e cidades, com mais de 11 % da água doce do planeta.
Segundo o censo de IBGE (2010), a população da Amazônia ascende a 24 milhões de
pessoas, delas 80% moram nas cidades. Em 2009, quase a metade dessa população
vivia com menos de meio salário mínimo por mês. Circunstância incompatível com a
riqueza de recursos ambientais da região, em especial a água.
Na parte ocidental da Amazônia, a sequência das estações de chuvas e seca traz consigo
a alternância entre o regime de inundação e de déficit de água, sendo que as
manifestações de extremos em ambos os casos, aparentam ser mais frequentes e severas
como prevêem alguns modelos de circulação global da atmosfera. As extremas secas de
2005 e 2010 se correlacionaram com as altas temperaturas da superfície do oceano
Atlântico (Lewis et al. 2011), em quanto as variabilidades climáticas interanuais em
forma de inundações e pronunciadas estiagens têm tido periodicamente a influência
direta dos fenômenos La Niña e El Niño. Nos casos de eventos extremos existe uma
afetação importante da população.
A geometria, o relevo, a drenagem (Valeriano, 2004; Cardoso et al. 2006), a geologia, a
hidrologia e o clima da região, foram estudadas por Cavalcante (2006), Silva Dias et al.
(2005), Marengo (2006), Nobre (2001) e outros. Estas características são de interesse
para o conhecimento sobre: balanço hídrico, ciclo hidrológico, sazonalidade das cheias
e vazantes, variabilidade e mudanças climáticas e outros temas importantes para o
manejo dos recursos hídricos.
Poucos são os trabalhos dedicados ao estudo da bacia do rio Acre e suas águas, ademais,
entre eles não existe uma relação de continuidade temática, falta informação e
monitoramento ambiental, tanto na dimensão espacial quanto temporal.
Mascarenhas et al. (2004) estudaram a presença de mercúrio nas águas do rio Acre
pertencentes à microbacia Trinacional, visando esclarecer as altas concentrações de esse
metal pesado em peixes consumidos pela população. Não obstante, as concentrações
encontradas no rio e seus afluentes foram inferiores a < 0,200 μg g-1, valor referido
como o teor médio característico dos rios amazônicos. Estudos sobre qualidade das
3
águas do rio Acre, têm tido em conta principalmente as características de acidez e de
sólidos dissolvidos. Furtado e Lopes (2005) mediram valores de pH do rio Acre, na área
urbana de Rio Branco, entre 7 e 8, e valores de condutividade elétrica entre 50 e 170 µS
cm-1. Praticamente esses mesmos valores de pH, entre 6,7 e 7,8, e de condutividade
elétrica, entre 40 e 125 µS cm-1, foram medidos também ao longo do percurso do rio
que se estende de Brasileia a Porto Acre (Duarte, 2009). Faltam estudos sobre vazões do
rio e sua relação sazonal com os valores de pH e condutividade elétrica. O que significa
que são escassos os estudos sobre quantidade e qualidade das águas do rio Acre e sua
sazonalidade. O presente trabalho visa contribuir ao conhecimento sobre o
comportamento do fluxo do rio Acre, no que diz respeito aos seguintes objetivos.
1.2 Objetivos
1) Descrever as características morfológicas gerais da bacia do rio Acre, bem como das
chuvas que caem a montante de Rio Branco;
2) Descrever os registros de níveis e os fluxos das águas sazonais do rio Acre, em Rio
Branco, para o intervalo entre 1971 e 2011;
3) Observar a ocorrência de eventos extremos de nível e vazão do rio Acre em Rio
Branco, no caso de enchentes e déficit de água que afetam sensivelmente à população.
2. METODOLOGIA
2.1 Área de estudo
A bacia hidrográfica do rio Acre encontra-se no extremo sudeste da sub-bacia Solimões-
Purus-Coari1. Na Figura 1 se destacam as cinco microbacias que integram a bacia do rio
Acre; as elevações estão entre as altitudes de 400 e 100 m, aproximadamente.
Figura 1. Bacia do rio Acre: o rio Acre a leste e seus afluentes principais. Os números na imagem topográfica significam as altitudes em metros (SRTM, 2000). Em destaque as cinco microbacias que a integram e as cidades importantes no curso do rio Acre.
1Agência Nacional de Águas, http://ana.gov.br
4
A bacia do rio Acre se estende por 35.000 km2 de área de drenagem. Divide-se
convencionalmente em cinco microbacias, que são: Trinacional (Brasil, Peru, Bolívia),
Xapuri, Rôla, Porto Acre e Biestadual (Acre, Amazonas).
O acumulado anual das chuvas na bacia é de 1956 mm. As chuvas na região se
concentram de outubro a abril, sendo que durante estes meses caem 83% do total anual.
A estação seca acontece entre maio e setembro (Duarte, 2006).
2.2 Microbacias
2.2.1 Trinacional (Brasil-Peru-Bolívia)
As nascentes do rio Acre estão nesta microbacia, nas alturas do Peru. O rio corre de
oeste para leste atravessando áreas de floresta e as cidades de Iñapari (Peru), Assis
Brasil, Cobija (Bolívia), Epitaciolândia e Brasileia.
2.2.2 Xapuri
Envolve uma área de floresta densa cruzada por inúmeros igarapés e afluentes.
2.2.3 Rôla
É a maior das cinco microbacias em estudo. O afluente principal do rio Acre nesta
microbacia é o riozinho do Rôla. Inúmeros cursos de água cruzam uma área de floresta
e a cidade de Rio Branco.
2.2.4 Porto Acre
Destaca-se pela passagem do rio Acre através da cidade de Porto Acre.
2.2.5 Biestadual (Acre-Amazonas)
Situa-se na parte mais ao norte da bacia do rio Acre, compreende as regiões banhadas
pelos rios Andirá e Antimari. Em Boca do Acre (AM) acontece a desembocadura do rio
Acre na margem direita do rio Purus.
A descrição morfométrica da bacia do rio Acre contempla o emprego do Sistema de
Informação Geográfica ArcGis 9 para visualização do relevo e para cálculos de áreas,
formas e distâncias, importantes para a descrição do escoamento superficial das águas
pluviais, tais como: volume de chuvas recebida pela microbacia; tempo de concentração
(duração do percurso de uma massa de água entre o ponto mais distante da microbacia e
sua foz); coeficiente de escoamento superficial das águas (relação entre o volume de
água que corre, durante um tempo, por uma seção do rio principal e o volume de chuvas
precipitado na parte da bacia anterior a tal seção); etc. (Yeh e Eltahir, 1998; Viglione et
al. 2009; Duarte, 2009).
5
Foram determinadas as seguintes características: Perímetro P (comprimento do limite
ou divisor de água da microbacia), Área de drenagem A (superfície horizontal
delimitada pelo perímetro), Comprimento axial Ca (distância entre a saída da microbacia
e seu ponto mais afastado), Comprimento do rio Cr (extensão da linha da tendência do
rio principal, sem considerar as curvas dos meandros), Trajetória do rio Ct (extensão do
canal do rio principal), Índice de forma If (relação entre a área de drenagem e a área de
um quadrado com lado igual ao comprimento do rio principal), Fator de forma Ff
(relação entre a largura média da microbacia e o seu comprimento axial), Coeficiente de
compacidade Ic (relação entre o perímetro da microbacia e o perímetro de uma
circunferência que encerra uma área igual à Área de drenagem da microbacia), Perfil do
rio (perda de altitude do canal ao longo do curso do rio) e Declividade St (relação entre
as diferenças da altitude e do cumprimento da trajetória do rio entre dois pontos, ou
trecho), representa a inclinação média do perfil do rio em um trecho (é uma grandeza
adimensional, as vezes expressada em cm/km).
As definições relacionadas com as anteriores características se aplicam igualmente a
bacias, sub-bacias e microbacias (Porto et al. 1999; Borsato e Martoni, 2004; Cardoso et
al. 2006). As microbacias foram divididas em partes que facilitam dimensionar o
Comprimento axial Ca e a largura média B a partir da largura Bi nas diferentes partes da
microbacia: a direção do comprimento axial se modifica do sentido leste para nordeste.
Os solos da região são de tipo argiloso (IBGE, 2005).
Os valores do Fator de forma Ff, do Coeficiente de compacidade Ic, e do Índice de
forma If, são adimensionais, e foram calculados mediante as seguintes expressões.
(1)
(2)
(3)
(4)
Os valores de chuvas foram medidos em vários pontos da bacia do rio Acre: na estação
meteorológica de número 82915 do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET),
localizada na Universidade Federal do Acre (UFAC), em Rio Branco, bem como
6
mediante pluviômetros localizados em Assis Brasil, Epitaciolândia, Xapuri, Capixaba,
Poro Acre e áreas rurais e florestais do município de Rio Branco.
Os valores de nível do rio Acre foram medidos sazonalmente e a partir dessas medições
foram corrigidos os dados da estação fluviométrica da Agência Nacional de Águas
(ANA), em Rio Branco. A relação (5) entre a vazão média Q e o nível h do rio (Curva-
chave) foi estabelecida com base em um modelo empírico a partir das medições
sazonais de velocidade das águas na seção de controle fluviométrica, em Rio Branco
(Duarte, 2009).
(5)
Na expressão acima o nível está dado em metros e a vazão em metros por segundo. O
modelo anterior permite estimar a vazão, e está sujeito a modificação para se ajustar às
mudanças na geometria da seção de controle.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na Tabela 1 estão apresentados os valores calculados do perímetro P, da área de
drenagem A, do comprimento do rio Cr, do comprimento da trajetória Ct, e do índice de
forma If, para as cinco microbacias consideradas.
Tabela 1 - Valores de P, A, Cr, Ct, e If para cada microbacia.
A microbacia Rôla é a de maior área de drenagem, seguida pela microbacia Biestadual.
Com a exceção da microbacia Rôla, as demais são bem alongadas, tanto mais quanto If
< 1. A microbacia Trinacional é a mais alongada, com If = 0,16. Isto significa ser a
microbacia em que os afluentes estão mais distribuídos em torno do rio principal, ao
longo de 350 km do comprimento de sua trajetória; com isso as águas vindas das
diferentes partes da microbacia não chegam simultaneamente a um mesmo lugar, não
acontecendo picos repentinos de enchentes. Ao mesmo tempo é a microbacia com maior
tempo de concentração.
Microbacia P (km)
A (km2)
Cr (km)
Ct (km) If
Trinacional 500 7.600 220 350 0,16Xapuri 360 5.200 150 170 0,23Rôla 520 10.200 100 224 1,02Porto Acre 260 2.700 70 115 0,55Biestadual 560 9.300 100 165 0,93
7
O tamanho das microbacias Rôla e Biestadual, da ordem dos 10.000 km2, diz respeito a
suas grandes capacidades de armazenamento de água sobre solos argilosos, pouco
permeáveis. Em particular a microbacia Rôla tem sido responsável por grandes
enchentes em Rio Branco, de vazões extremas mantidas durante um mês,
aproximadamente.
Na Tabela 2 aparecem os valores calculados da Largura média B, do Comprimento axial
Ca, do Fator de forma Ff e do Índice de compacidade Ic.
Tabela 2. Valores de B, Ca, Ff e Ic, para cada microbacia.
As microbacias Rôla e Biestadual são as mais largas, a primeira com quase 60 km de
largura média, estando o valor de Ff, entre 1/2 e 1/6. Isto significa que a afluência das
águas para o rio principal está distribuída em regiões compridas, não acontecendo em
um só trecho, o qual é um indicador de ausência de picos repentinos de cheias, isto está
reforçado pelos valores de Ic, que demonstram que nenhuma das microbacias tem
aspecto circular ou de pêra. O aspecto mais alongado das microbacias Trinacional e
Biestadual também se infere dos valores relativamente mais altos de Ic.
Na Figura 2 está apresentada a curva do Perfil do rio Acre, onde se observa como
diminui a altitude com o aumento do curso do rio. A baixa declividade contribui para
frear por gravidade a velocidade das águas e consequentemente também para evitar os
picos repentinos de cheias.
Figura 2. Perfil do rio Acre entre a nascente e a foz.
Microbacia B (km)
Ca (km) Ff Ic
Trinacional 35 216 0,16 1,61Xapuri 41 144 0,28 1,40Rôla 57 174 0,33 1,44Porto Acre 32 65 0,49 1,40Biestadual 54 170 0,32 1,63
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 100050
100
150
200
250
300
350
400
Alti
rude
H (m
)
Comprimento da trajetória do rio Ct (km)
8
Da Figura 2 e da Tabela 3, observa-se que as altitudes H na parte alta da bacia do rio
Acre estão entre 400 e 150 m nos 438 km desde a nascente do rio e a cidade de Xapuri.
Nesta parte, não obstante a alta declividade, de entre 83,3 e 44,4 cm/km, a vegetação de
floresta obstrui o escoamento superficial das águas evitando assim as rápidas afluências. Tabela 3. Comprimento da trajetória Ct e sua diferença ΔCt, Altitude H e sua diferença ΔH, e Declividade St, em trechos sucessivos do rio Acre.
Trecho Ct (km)
ΔCt (km)
H (m)
ΔH (m)
St (cm/km)
Nascente 0 0 400 - - Assis Brasil 168 168 260 140 83,3 Brasileia 348 180 180 80 44,4 Xapuri 438 90 140 40 44,4 Rio Branco 662 224 114 26 11,6 Porto Acre 776 114 108 6 5,3 Boca do Acre 940 164 100 8 4,9
A partir de Xapuri o rio corre mais lento conforme a menor declividade. O traço do
perfil do rio traz ademais outra informação, de caráter geral: o caudal do rio aumenta na
medida em que aumenta o seu comprimento; em outras palavras, os volumes de água de
chuva que precipitam nas regiões de altitudes maiores passam, parcialmente, às
sucessivas microbacias em regiões de menor altitude, aumentando o caudal do rio. Na
Figura 3 estão mostrados (a) os volumes anuais de chuvas precipitadas entre 1970 e
2010, nas três microbacias a montante de Rio Branco; o valor médio, representado pela
reta, foi de 44,6 Gm3 (± 4,9 Gm3) de água; e (b) a distribuição sazonal das chuvas na
bacia do rio Acre, segundo a climatologia de 1971 a 2000 (Duarte, 2006).
Figura 3. (a) Variações interanuais, valor médio (reta contínua) e curva de tendência (linha de traços) do volume de chuvas que precipita nas microbacias Trinacional, Xapuri e Rôla, situadas acima de Rio Branco e (b) distribuição climatológica sazonal das chuvas na bacia do rio Acre, entre os anos de 1971 a 2000.
1970
1972
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1978
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2006
2008
2010
34363840424446485052545658
Chu
vas
(Gm
3 )
Jan Fev Mar Apr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez0
255075
100125150175200225250275300325350375400425
Chu
vas
(mm
)
(a) (b)
9
No Acre a estação chuvosa se estende de outubro até abril; maio é o mês de transição
para a estação seca, que vai de junho a agosto, sendo setembro o mês de transição para a
estação chuvosa.
A distribuição temporal das chuvas se traduz nas variações do nível e da vazão do rio ao
longo dos anos como observado na Figura 4, que abrange o intervalo entre 1970 e 2010.
A partir do ano 1991, os níveis mínimos durante a seca têm sido inferiores a 2 m, sendo
evidente a tendência a serem esses níveis cada vez menores a partir de 1995.
A curva de tendência exibe uma ascensão e uma posterior diminuição, expressando que:
enquanto para 1970 a média diária das chuvas estava em torno de 4,5 mm/dia, para
finais da década dos anos oitenta e inicio dos anos noventa esse valor alcançava um
máximo próximo a 5,6 mm/dia; seguidamente as chuvas diminuíram: para o ano 2000 a
média diária foi de 5,2 mm/dia. Constata-se que continua a fase decrescente: no ano
2001, a altura das chuvas foi de 1900 mm; no 2002, de 1910 mm; e no 2003, de 1804
mm, em torno de 5,0 mm/dia (Duarte, 2005).
Com relação a essa tendência várias perguntas podem ser formuladas:
(i) Por que inicialmente, na década dos anos setenta, os valores de chuvas eram ainda
menores que em 2003?,
(ii) O quê fez com que as chuvas aumentassem entre 1970 e 1990?
(iii) Finalmente, o quê está influenciando para a diminuição das chuvas desde 1990?
As respostas a estas perguntas estão abertas.
Figura 4. Variações interanuais do nível e da vazão do rio Acre em Rio Branco. Os níveis mínimos cada vez menores de 2 m, a partir de 1995, correspondem a vazões inferires a 50 m3/s.
1970
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1978
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1984
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1988
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el (m
)
010020030040050060070080090010001100120013001400
Vaz
ão m
3 /s
10
O ciclo anual da vazão do rio Acre e seus extremos, em Rio Branco, estão representados
na Figura 5, mediante seus valores médios mensais e desvio padrão, para cada mês, no
intervalo entre 1970 e 2010.
Figura 5. Ciclo anual da vazão média mensal e seus valores extremos, para o rio Acre em Rio Branco, para os anos de 1970 a 2010. Os registros de níveis de todos esses casos aparecem nos quadros (a) – (h) da Figura 6,
onde também está o hidrograma da evolução da vazão entre novembro de 2010 e maio
de 2011, que inclui a enchente do mês abril desse ano, cujo pico está indicado por uma
linha vertical no quadro (i).
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Nív
el (m
)
(a) 1971 - 1975 (b) 1976 - 1980 (c) 1981 - 1985
1986
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el (m
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Nív
el (m
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(d) 1986 - 1990 (e) 1991 - 1995 (f) 1996 - 2000
Jan Fev Mar Abr MaI Jun Jul Ago Set Out Nov Dez0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
1000
1100
1200
Vaz
ão (m
3 /s)
11
2001
2002
2003
2004
2005
0
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Nív
el (m
)
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2007
2008
2009
2010
0
2
4
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8
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16
Nív
el (m
)
01/11/10 01/02/11 01/05/110
2
4
6
8
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16
Nív
el (m
)
17/04/110100200300400500600700800900100011001200
Vazã
o (m
3/s)
(g) 2001 - 2005 (h) 2006 - 2010 (i) Novembro 2010 – Maio 2011 Figura 6. Registros de níveis de enchentes e secas do rio Acre, em Rio Branco, entre 1971 e 2011. O quando (i) mostra também o hidrograma da enchente de abril de 2011. Os valores extremos de vazão acima de 900 m3/s ou abaixo de 50 m3/s são devido às
variabilidades climáticas sazonais e interanuais das chuvas, que acontecem
naturalmente.
Vazões acima de 900 m3/s correspondem a níveis do rio acima de 13 m: situações de
enchentes que, recorrentemente, deixam desabrigados entre 20 e 30 mil pessoas,
moradoras de bairros pobres de Rio Branco. Eventos de enchentes aconteceram em
fevereiro de 1971; fevereiro e março de 1972; fevereiro e março de 1973; fevereiro e
março de 1974; fevereiro, março e abril de 1976; fevereiro e março de 1977; abril de
1978; de dezembro de 1978 a abril de 1979; fevereiro e março de 1982; abril de 1984;
abril de 1985; fevereiro de 1986; fevereiro de 1988; janeiro de 1991; abril de 1994;
fevereiro, março e abril de 1997; janeiro e fevereiro de 1999; fevereiro de 2006; março
de 2010 e abril de 2011.
Vazões abaixo de 50 m3/s relacionadas com níveis do rio inferiores de 1,8 m, levam
quase ao colapso o abastecimento público de água, recorrentemente. Elas aconteceram
entre agosto e outubro de 1998, em setembro do ano 2000, entre setembro e outubro de
2004, de julho a novembro de 2005, de julho a setembro de 2006, em agosto de 2007,
de julho a outubro de 2008, de agosto a novembro de 2009, e de agosto a novembro de
2010. As previsões indicam que o mesmo deve acontecer entre julho e setembro de
2011.
Excetuando os casos extremos que acontecem durante os meses mais chuvosos e os
mais secos, as vazões do rio Acre são de centenas de metros cúbicos de água por
segundo. A cidade de Rio Branco tem 180 bairros, aproximadamente. Na suas
instalações de captação no rio Acre se bombeia 1 m3/s de água, considerado suficiente
12
para as necessidades demandadas, na atualidade. Por outro lado, 50 % da população
carecem da garantia do abastecimento público de água, sendo que durante a seca essa
percentagem pode chegar a 75 %. Mas as vazões do rio durante o ano superam as
necessidades de suprimento de água atuais e futuras até 2025 entre 50 e 300 vezes,
considerando que no Atlas de Abastecimento Urbano de Águas2 se estima uma
demanda para a cidade aproximadamente de 3,5 m3/s em 2025.
4. CONCLUSÕES Cidades no ambiente de águas na Amazônia, como Rio Branco, capital do Estado do
Acre, sofrem os impactos negativos de enchentes e secas motivados pelas variabilidades
climáticas interanuais. Na medida em que essas cidades aumentam em população e,
regularmente, em deficiente infraestrutura, tais problemas se agravam em números
crescentes de pessoas desabrigadas, bairros carentes do suprimento do serviço de água,
e as consequências em termos de falta de bem-estar e de saúde, embora a situação seja
evitável. A bacia hidrográfica do rio Acre, pela sazonalidade anual e interanual das
chuvas que recebe e dos níveis do rio principal, se comporta de maneira natural, sem
aparentes modificações em seu ciclo anual das vazões, segundo as observações de longo
prazo. Durante os últimos quarenta anos, entre 1971 e 2011, aconteceram 21 eventos de
enchentes em Rio Branco com vazões acima de 900 m3/s, entre os meses de janeiro e
março, principalmente; aconteceram também 9 eventos de vazões muito baixas,
inferiores a 50 m3/s. O conhecimento hidrometeorológico sobre as características da
bacia e do comportamento dos fluxos do rio podem contribuir para políticas de
gerenciamento dos recursos hídricos com vistas a minimizar ou evitar tanto os excessos
quanto os déficit de água, que, recorrentemente, impactam áreas de risco e de
vulnerabilidade social. As construções hidráulicas devem ser feitas de modo que se
adaptem às condições de vazões mínimas, ou incluam a estruturação de reservatórios
para garantir o suprimento contínuo da água à população durante todo o ano. Isto não
tem sido levado em conta, pelo qual, muitos bairros de Rio Branco ficam sem o
abastecimento na época da seca.
5. AGRADECIMENTOS Agradeço o apoio dado pelo CNPq (Processo 303054/2009-3) para a realização deste trabalho. 2 Agência Nacional de Águas, http://atlas.ana.gov.br/atlas/forms/analise/Geral.aspx?est=25
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6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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