amai vossos inimigos.pdf
Post on 05-Dec-2015
92 Views
Preview:
TRANSCRIPT
2
PREFÁCIO
A afirmação mais absurda e desafiadora feita por Jesus e que
ressoa pelo tempo como expressão de loucura para o mundo
atual é: “Amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam,
orai pelos que vos maltratam e perseguem. (Mateus 5, 43-44).
Numa sociedade onde o “EU” está acima do “NÓS”, onde o que
importa são as minhas coisas, o que eu acho, o que eu penso, o
que é melhor para mim, pedir para amar o inimigo é, no mínimo,
coisa de maluco.
O egocentrismo dominou o homem de hoje. Tudo é criado e
desenvolvido para tornar o homem independente, isolado e
egocêntrico. E, sem medo de errar, a razão pela qual os índices
de pessoas com depressão só crescem, é justamente essa: não
viver o amor vivido e ensinado incondicionalmente por Cristo.
Há dois tipos de inimigo na Bíblia: Um é aquele que é a razão e a
origem de todo mal. O diabo, “diabulum” que no hebraico antigo
significa “aquele que divide”. São Paulo nos ensina na Carta aos
Efésios , no capítulo 6, que “... não é contra homens de carne e
sangue que temos de lutar, mas contra os principados e
potestades, contra os príncipes deste mundo tenebroso, contra
as forças espirituais do mal espalhadas nos ares”. Este é o
inimigo que não devemos amar. Ele foi excluído da Graça de
Divina e não deve ter lugar em nossa vida.
O outro tipo de inimigo na Bíblia é, simplesmente, aquele que fez
algum tipo de mal para nós, que nos prejudicou de alguma
forma. Alguém que nos decepcionou, nos insultou, nos denegriu,
nos trouxe prejuízos. Esse é o inimigo a quem somos chamados,
3
por Jesus, a amar. Foi exatamente isso que Ele, em sua vida,
morte e ressurreição, fez conosco. Ninguém merece o que Jesus
fez e faz por nós. Ele nos ama muito além dos nossos méritos,
pois não os temos. Ao contrário: Somos pecadores e muitas
vezes incorrigíveis. Amamos o pecado e nos permitimos vivê-lo,
independente da vontade de Deus. E Cristo, ainda assim, nos
ama.
Segundo o grande líder norte americano Martin Luther King, “O
amor é a única força capaz de transformar um inimigo em
amigo”.
Madre Tereza de Calcutá foi além: “As pessoas boas merecem
nosso amor, as pessoas ruins precisam dele”.
Amar o “inimigo”, este a quem somos chamados a amar, não é
para quem deseja ter uma vida rasa, pequena e sem sentido.
Amar o inimigo é para quem quer ter o coração cheio da graça
de Deus, do seu amor, da sua misericórdia. Amar quem não
merece, quem só nos fez mal: Esse é o “caminho apertado e
estreito da e raros são os que o encontram”. (Mateus 7, 13-14)
4
CAPÍTULO 1
AMAR QUEM NÃO MERECE
A cultura contemporânea, que envolve um emaranhado de
mecanismos de difusão em massa como músicas, filmes, roupas,
atitudes, maneiras de pensar, meios de comunicação, literatura,
entre outros, é constituída por conceitos muito claros: O Eu é
mais importante que o NÓS. Tudo leva a isso.
Os casamentos não são para fazer o outro feliz, mas para ser
feliz. O trabalho não é para promover o bem comum, mas para
que eu seja feliz, para a minha promoção e realização. Até
mesmo meu envolvimento nos trabalhos da Igreja, ao invés de
serem direcionados para a glória do Reino de Deus e para o bem
dos outros, servem como barganha para que Eu conquiste a
cura, a vitória, os benefícios do céu. O EU ainda predomina.
Jesus vai completamente na contramão de tudo isso. Toda sua
vida, sua história, é marcada pela doação incondicional ao
próximo, a seu povo. Ele não veio para ser servido e sim para
servir (Marcos 10, 45). E tudo em abundância e de graça!
Não há nada que possamos fazer ou deixar de fazer que pague o
que Cristo fez e faz por nós! É absolutamente de graça!
A palavra Graça quer justamente nos fazer entender isso. “De
graça recebestes, de graça dai” (Mateus 10, 8).
Somos chamados a servir os outros com a mesma gratuidade e
amor porque fomos amados assim.
Mas não se trata apenas de amar os mais pobres, os mais
necessitados, os mais sofridos, os que são mais chegados a nós.
Principalmente, não se trata de amar os merecedores. Jesus vai
5
muito além! Nos quer amando aqueles que nunca fizeram nada
por nós. Que, pelo contrário, só nos prejudicaram, nos
trouxeram todo tipo de contratempo e mal. Esses são os
“inimigos” a quem devemos amar.
Mas, como amar quem só nos trouxe decepção, rancor, tristeza e
prejuízos? Isso é possível?
Somente um ser humano revestido e abastecido pela
misericórdia de Deus, por seu Amor infinito, é capaz de tal
atitude e decisão. E esse é o caminho da verdadeira liberdade e
felicidade.
Ao contrário do que a sociedade moderna tenta nos convencer
através da sua cultura de morte, não é tendo, possuindo e
acumulando que somos realmente livres e felizes. Na contramão,
é dando, sendo para o outro, principalmente, amando e rezando
por nossos “inimigos”.
Liberdade é a vivência profunda do amor de Jesus.
Ninguém foi mais livre que Ele!
Seus braços abertos na cruz, não foi apenas sinal de estar nos
abraçando, salvando a todos nós, mas também gesto de sua
liberdade perfeita, a qual somos todos chamados a viver.
6
CAPÍTULO 2
O CONHECIMENTO DO OUTRO
Não se pode amar o que não se conhece ou quem não se
conhece. Amor é a decisão fundamentada no conhecimento
profundo do outro, de sua história, de seus percalços, de suas
lutas, de seus sofrimentos e alegrias. É impossível amar sem esse
sondar o interior do outro.
Ninguém é o que é atoa. Ninguém faz o que faz, pensa como
pensa, age como age, sem razões. A não ser que tenha
desiquilíbrios mentais. Há, sim, razões, raízes, motivos. Deus nos
ama porque nos conhece perfeitamente. Ninguém nos conhece
como Ele, que sabe todos os minuciosos detalhes da nossa
existência.
“Senhor, vós me perscrutais e me conheceis, sabeis tudo de
mim, quando me sento ou me levanto. De longe penetrais meus
pensamentos. Quando ando e quando repouso, vós me vedes,
observais todos os meus passos. A palavra ainda me não
chegou à língua, e já, Senhor, a conheceis toda. Vós me cercais
por trás e pela frente, e estendeis sobre mim a vossa mão.
Conhecimento assim maravilhoso me ultrapassa, ele é tão
sublime que não posso atingi-lo”. (Salmo 138, 1-6)
“Nada de minha substância vos é oculto, quando fui formado
ocultamente, quando fui tecido nas entranhas subterrâneas.
Cada uma de minhas ações vossos olhos viram, e todas elas
foram escritas em vosso livro; cada dia de minha vida foi
7
prefixado, desde antes que um só deles existisse”. (Salmo 138,
15-16)
Para amar nossos amigos e nossos “inimigos” somos chamados a
conhecer a realidade histórica do outro. Afinal, também temos a
nossa e nossos vícios e pecados são todos enraizados nestas
situações vividas por nós.
E se não temos esse conhecimento profundo para amar como
devemos nossos “inimigos”?
Aí somos chamados a confiar no conhecimento e no amor que
Deus tem a respeito desse indivíduo. O Senhor sabe o que se
passou com ele para que se tornasse o que é, o que o levou a
fazer o que fez comigo ou com você.
Na verdade, a capacidade de amar nossos “inimigos” vem do
Amor e do conhecimento de Jesus a respeito de cada pessoa.
Confiamos que Ele conhece e ama. Por isso também amamos.
Trata-se de amar quem Ele ama.
8
CAPÍTULO 3
ORAI POR AQUELES QUE VOS MALTRATAM
Outra atitude e decisão que precisamos tomar e que é
imprescindível em relação aos nossos “inimigos” é a oração.
“Orai por aqueles que vos maltratam e vos perseguem”.
(Mateus 5, 44)
Existe um ditado popular que diz: “Diga-me com quem andas e
eu te direi quem és”. Isso significa que na medida em que
convivemos com alguém, vamos adquirindo suas virtudes,
qualidades e até seus defeitos. Quando amigos passam muito
tempo juntos, acabam pegando o jeito do outro.
Quando caminhamos com Jesus, na intimidade da oração, vamos
absorvendo Sua maneira de ser, de ver, de agir, de amar, de
perdoar.
Recordo-me sempre de uma canção do nosso querido Padre
Zezinho, que diz: “Amar como Jesus amou, sonhar como Jesus
sonhar, pensar como Jesus pensou, viver como Jesus viveu.
Sentir o que Jesus sentia, sorrir como Jesus sorria. E ao chegar
ao fim do dia sei que eu dormiria muito mais feliz”.
Não há outra forma de amar nosso “inimigo” a não ser vivendo
uma amizade profunda com Jesus. Caminhar com Ele, viver com
Ele. Esse é o caminho da conversão e para adquirirmos as
virtudes do Senhor.
9
Tem algum “inimigo”, alguém que lhe traiu, que lhe fez mal? Ore
por ele! Na oração, o rancor, a decepção e até o ódio vai se
tornando amor e compaixão. Aí, o caminho das bênçãos e da
cura de toda nossa vida acontece.
10
CAPÍTULO 4
TESTEMUNHO DE AMOR AO “INIMIGO”
A história está repleta de histórias de pessoas que souberam
amar seus “inimigos”. Além de Jesus, o precursor de tudo isso,
que veio selar a Nova Aliança, o novo jeito de amar, houveram
homens e mulheres que compreenderam o Evangelho e também
amaram incondicionalmente.
João Paulo II perdoou Ali Agca, logo após o atentado na Praça de
São Pedro, dentro da ambulância que o transportava em alta
velocidade até ao Hospital Gemelli, pouco antes de perder os
sentidos e quando julgava que ia morrer.
O papa em seu livro “Memória e Identidade” dedicou um
capítulo, o epílogo, sobre o atentado e contou que na
ambulância falou ao cardeal Dom Stanislaw que tinha perdoado
o autor do atentado.
11
"Agca disparou para matar, um tiro que devia ser mortal. Ele era
um assassino profissional, não foi uma iniciativa sua. Alguém o
encarregou de me matar. Não tenho a menor dúvida. Disse ao
meu secretário, D. Stanislaw, ainda no carro, que tinha perdoado
o autor do atentado. Sabia e sentia como era gravíssima a minha
situação, sabia que tinha sido ferido na barriga, doía muito...
Praticamente já estava do outro lado... mas senti que me iria
salvar”, escreve o Papa.
Após 19 anos do atentado, em 2000, João Paulo II se encontrou
com Ali Agca na prisão.
Na visita à prisão, no Natal de 1983, encontrou-se a sós com Ali
Agja. Reafirmou seu perdão, apesar do mal que Ali havia lhe
causado.
Nosso querido Papa João Paulo II entendeu tudo. Amou até o
fim. Amou quando todos fariam o oposto se estivessem no lugar
dele. Deu o passo do amor e tornou-se exemplo sublime de
doação e compaixão.
12
Capítulo 5
MEU CHAMADO É PARA O AMOR
Eu, pobre pecador, também fui responsável por causar muito
mal a pessoas próximas de mim. Fui infiel, injusto e mentiroso. E
tudo isso levou muita decepção e tristeza para pessoas a quem
eu deveria amar e respeitar.
E nesse processo de pecado, fui muito julgado e condenado.
Passei de médico a monstro, de amigo a inimigo. E tenho
buscado me reconciliar com este passado dentro de mim,
perdoando a mim mesmo (tarefa difícil!) e corrigi-lo na medida
do possível.
Mas foi impressionante perceber o quanto as pessoas, de modo
especial as que estão dentro das comunidades cristãs, dentro das
paróquias e comunidades de vida, são 1as que mais sentem
dificuldade de perdoar e amar os que erram, amar os que não
merecem. Se dizem seguidores de Cristo, mas até certo ponto.
Quando chega o momento de viver o amor ao “inimigo”, a
história complica.
Cheguei a participar de uma comunidade onde me chamavam de
co fundador, em que o carisma divulgado era o da misericórdia e
do trabalho com pessoas difíceis. E adivinhem? Me expulsaram
logo quando souberam dos meus erros. O lugar que deveria me
acolher acima de todos, com mais amor e maior cuidado, foi o
que me repudiou. Atitude cristã? Longe disso.
13
Há comunidades que só valorizam o culto e as atividades de
praxe. Esquecem da essência do Evangelho, que nos convida ao
amor incondicional. Sem isso não há Graça.
Não se trata de ser conivente com o pecado dos outros, com os
erros dos outros. Mas é preciso haver a correção fraterna,
amorosa. Amar setenta vezes sete. Acolher o pecador, para que
o amor seja instrumento de transformação em sua vida. Só o
amor transforma, cura e liberta. Só o amor incondicional constrói
um mundo novo, pessoas novas, novas famílias, novos
casamentos.
Amai vossos inimigos! É o caminho da paz e da liberdade.
14
ORAÇÃO
Senhor, Tu que me amas com este amor que não conseguimos
compreender, de tão grande. Tu que nos ama mesmo quando
nos afastamos de vós, quando pecamos e quando pecamos de
novo. Tu que nos conhece tão perfeitamente, tão
profundamente. Ensina-nos e capacita-nos a amar desse jeito,
com este amor gratuito, que não exige nada em troca.
Cura nosso coração de toda decepção, rancor, mágoa,
ressentimento que possam ter nos causado. Seja qual for o mal
com que tenham nos afligido, nos ajude a perdoar e amar.
Coloque o nome da pessoa ou das pessoas pelas quais você está
orando neste momento. E peça ao Senhor a graça de amá-las
sem medida.
top related