acolhimento - o pensar, o fazer,o viver

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A C O L H I M E N T O

Plinio A F Silveira

pliniosilveira@hotmail.com

Política Nacional da Humanização da Gestão e da Atenção à Saúde

Princípios:

Inseparabilidade entre gestão e atenção

Transversalidade: da comunicação inter e

intra-gruposMétodo:

Inclusão dos diferentes sujeitos

Inclusão dos analisadores sociais

Inclusão dos coletivos

Diretrizes:

Clínica Ampliada

Co-gestão

Valorização do Trabalho

Acolhimento

Saúde do Trabalhador

Defesa dos Direitos do Usuário

O Pensar

O Fazer

O Viver

I - Acolhimento, enquanto postura:

ALGUNS FUNDAMENTOS:

Primeiro:

-Saúde como direito de cidadania

-Saúde como condição para a paz e como conseqüência dela

-Saúde como instrumento de valorização da vida

Segundo:

Temos dificuldades em compreender o mundo em que vivemos. Para nós é fácil entender as coisas divididas, aos pedaços: os acontecimentos isolados, as pessoas separadas umas das outras. Lidamos bem com fragmentos. Mas não compreendemos que o que nos cerca só existe em relação, em conjunto – que tudo tem a ver com tudo, tudo depende de tudo...

Terceiro:

Acolhimento pode ser definido como a ARTE de interagir, construir algo em comum, descobrir nossa humanidade mais profunda na relação com os outros e o mundo natural. E deixar que os outros descubram em nós sua humanidade e o mundo nos mostre sua amplitude...

Quarto:

O mundo em que vivemos, o nosso dia a dia é marcado pela exclusão, pela rejeição e pela divisão. Nosso quotidiano nos empurra para o individualismo, para o egoísmo e o comportamento narcisista, numa frenética competição para “termos cada vez mais”...

Quinto:

Pela necessidade de explicar as coisas, nasceu a ciência. A saúde foi, sem dúvida, uma das grandes beneficiárias dos progressos científicos e tecnológicos. Porém a tecnociência dá conta de explicar alguns aspectos/dimensões de nossa existência, mas pouco ou nada valem suas explicações para a intuição, as emoções e a subjetividade. O QUE NÃO PODE SER EXPLICADO PRECISA SER COMPREENDIDO.

Razão e Objetividade, Intuição e Subjetividade : precisam conviver.

A Tecnociência deve buscar a clareza da explicação.

As Humanidades buscam a sutileza da compreensão.

O Tecnocientífico e o Humano precisam estar juntos. Precisam conviver,

acolher-se um ao outro.

“SE O MUNDO FOSSE CLARO A ARTE NÃO EXISTIRIA”

EIS, TALVEZ, O PONTO CENTRAL DA ÉTICA DO

ACOLHIMENTO:

ELA TEM MUITO DE CIÊNCIA, MAS TAMBÉM TEM MUITO DE

ARTE.

“Uma parte de mim

é todo mundo:

outra parte é ninguém

Fundo sem fundo

Uma parte de mim

é multidão:

outra parte

estranheza e solidão

Uma parte de mim

pensa, pondera:

outra parte

delira.

Uma parte de mim

almoça e janta:

outra parte

se espanta

Uma parte de mim

é permanente:

outra parte

se sabe de repente.

Uma parte de mim

é só vertigem:

outra parte,

linguagem.

Traduzir uma parte

Na outra parte

- que é uma questão

de vida ou morte –

será arte ?

“Traduzir-se”

Ferreira Gullar

Se isso é fácil de ser descrito, é muito difícil de ser resolvido na PRÁTICA, porque exige uma transformação, uma mudança. E esta depende de pelo menos dois componentes:

1. Do DESEJO, de uma dimensão subjetiva portanto;

2. Do DOMINIO DE UM CERTO CONHECIMENTO, de um projeto conscientemente construído e inapelavelmente vinculado ao exercício da RAZÃO.

O problema é que a Tecno-Ciência atingiu em cheio a saúde e a medicina:

1. Os profissionais são preparados para a visão quantitativa, objetiva e concreta.

2. As ações de saúde privilegiam aspectos técnicos, econômicos e administrativos que, embora indispensáveis, são insuficientes para lidar com a complexidade da condição humana.

3. Os profissionais de saúde se transformaram em fornecedores e as pessoas que procuram seus serviços em consumidores.

4. O excesso de pragmatismo tende a reduzir o ser humano às suas necessidades biológicas e medidas,isto é, ao homem máquina

O resultado disso ?

Relações frias, mecânicas, distantes e impessoais e que geram uma atmosfera pesada que atinge a todos e a todos

embrutece.

Como mudar essa realidade?

Para pensar o acolhimento é necessário partir da base, do modelo mental, ou sistema de pensamento, por meio do qual construímos o mundo e fomos construídos por ele. Há poucas esperanças de mudar o mundo que construímos se não modificarmos o modo de pensar.

O que se propõe é a seguinte dinâmica:

Mudar o modo de pensar

Mudar o modo de falar

Mudar o modo de agir

Mudar o modo de sentir

O que caracteriza um sistema de saúde é que nele

atuam pessoas, seres humanos que estabelecem

relações entre si.

A qualidade dessas relações é que reflete a qualidade dos

serviços prestados.

Em outras palavras:“A eficácia e a efetividade do Sistema de Saúde está fortemente determinada

pela qualidade do relacionamento humano

estabelecido entre os profissionais e os usuários

no processo de atendimento.”

Portanto, qualquer processo de mudança no sentido da humanização

significa necessariamente um processo de mudança das relações entre todos os envolvidos e onde a

palavra tem lugar destacado.

Mas para que possamos melhor entender e refletir

sobre como agir no sentido da humanização precisamos

rever e reavaliar os papéis que desempenhamos, os

conceitos que construímos, as organizações das quais

participamos, os atos que praticamos...

Essa reflexão implicará numa releitura

das “organizações” em que

trabalhamos: hospitais, clínicas,

unidades de saúde... E onde certamente

encontraremos a necessidade de se

fazer uma transformação:

uma MUDANÇA NA NOSSA CULTURA

ORGANIZACIONAL, no sentido de inserir

atitudes e práticas humanizantes.

MUDANÇASMUDANÇAS NASNAS

PESSOASPESSOAS

MUDANÇA NA CULTURA ORGANIZACIONALMUDANÇA NA CULTURA ORGANIZACIONAL

Comportamento do Grupo

Comportamento Individual Comportamento Individual

Atitudes

Difi

cu

ldad

es

En

volv

idas

Peq

uen

a

Tempo Necessário

Gra

nd

e

Curto Longo

Conhecimento

Fonte: Hersey / Blanchard

MUDANÇAS NAS MUDANÇAS NAS PESSOASPESSOAS

Uma mudança só será possível mediante a

utilização de um importante atributo, que só é possível aos seres

HUMANOS...

T x H

... a L I B E R D A D E !

Essa LIBERDADE nos remete a duas importantes questões:

1. Não somos livres para escolher O QUE NOS ACONTECE, mas somos livres para RESPONDER AO QUE NOS ACONTECE DE UM OU OUTRO MODO.

2. Sermos livres para TENTAR não significa CONSEGUIR INFALIVELMENTE. Portanto a liberdade, que consiste em escolher dentro do possível, não é o mesmo que onipotência, que seria conseguir sempre o que se quer.

Há coisas que dependem da MINHA vontade (e

isso é ser livre) mas nem tudo depende de minha vontade (porque aí eu

seria onipotente) pois no mundo existem OUTRAS

vontades.

RESUMINDO:

Ao contrário de outros seres, animados ou inanimados, nós SERES HUMANOS podemos inventar e escolher nossa forma de viver ou, melhor ainda, de conviver. A arte da convivência é, em última instância, a base do ACOLHIMENTO.

RELAÇÃO – eis a palavra-chave da convivência, do ACOLHIMENTO.

Se soubermos tudo sobre uma doença, uma técnica ou um tratamento, podemos dizer que somos especialistas, eruditos. Mas só quando compreendermos e vivermos as relações entre as pessoas, as coisas e os fenômenos é que poderemos afirmar que somos educados. Nesse sentido, acolher é educar. Acolhimento é, pois, um processo pedagógico. Nossas escolas instruem, adestram e treinam. Poucas educam.

Educar, especialmente no contexto da saúde, significa entender o significado do OUTRO. Como nós o percebemos e o tratamos? Qual é a natureza, a qualidade da relação que estabelecemos com o outro? Como falamos com o outro? Como é a nossa interação não verbal?Ela nos aproxima ou nos afasta dele?

Ex: RC

Não é fácil ser um paciente:

...se está fragilizado, ansioso para saber o que está

acontecendo,com medo e dor. De repente, chega um

estranho que apalpa, aperta, injeta, corta, dita normas...

Para iniciar essa discussão é preciso admitir que:

Mas também devemos admitir que:

Não é fácil ser profissional de saúde......percebemos que não

podemos tudo, que temos limitações; testemunhar a dor e o

sofrimento dos pacientes nos deixa igualmente vulneráveis, e quanto

mais conscientes disso maior é também o nosso sofrimento...

Mas quem é o outro, quem é o usuário?

O usuário é um SER BIOLÓGICO;

Mas é também um SER BIOGRÁFICO;

e um SER SIMBÓLICO.

um SER SOCIAL;

Os “exames” (sangue,

urina, fezes, RX,

tomografias, endoscopias,

eletrocardiogramas,

ultrassonografias, etc...) e

as “medições” (pressão

arterial, temperatura, pulso)

poderão mostrar as

alterações do corpo – doSER BIOLÓGICO.

Mas como iremos entender/correlacionar/

decifrar os aspectos BIOGRÁFICOS, SOCIAIS

e SIMBÓLICOS dos pacientes ???

O profissional da saúde deve agir como um DETETIVE:

...OUVIR o que o paciente diz;

...VER o que o paciente mostra;

...DECODIFICAR o que o paciente fala;

...INFERIR o que o paciente esconde;

...ENCONTRAR o que o paciente desconhece;

...DESVENDAR o que o paciente não quer conhecer.

Somente essa busca é que irá identificar todos os ingredientes envolvidos na atenção à saúde. E

somente assim poderemos verificar que o Ato Cuidador pode nos revelar a dimensão

altamente subjetiva dessa relação...

....pois o preço que pagamos pela

suposta objetividade da ciência é a

eliminação da condição humana da

palavra, que não pode ser reduzida

à mera descrição técnica dos

sintomas e da evolução de uma

doença, por exemplo.

O ATO CUIDADOR :... Prioritariamente uma ATIVIDADE BENEFICENTE;

... Essencialmente um ENCONTRO

ENTRE SERES HUMANOS; ... Intrinsecamente uma ATIVIDADE ÉTICA;

... Necessariamente uma ATIVIDADE TÉCNICA.

Temos que imaginar estratégias para a implosão

de uma ordem conservadora, que trata as

pessoas como coisas. É preciso criar um modelo de

atenção que valorize a FALA e a ESCUTA. As falas

do profissional, das pessoas, da sociedade; a

escuta de uns pelos outros.

ATRIBUTOS DO PROFISSIONAL:

EMPATIA - capacidade de se imaginar no lugar

do outroHUMILDADE - dá o sentido da limitação

TOLERÂNCIA - admite e respeita opinião contrária

RESPEITO - ato de reverenciar, ter consideração.

CAPACIDADE DE COMUNICAÇÃO

AMOR À VERDADE

FLEXIBILIDADE - aptidão para adaptar-se

PACIÊNCIA - ter perseverança com tranqüilidade

SOLIDARIEDADE - noção da mútua necessidade, de que uns não podem ser felizes ou desenvolver-se sem que os outros também o possam

ATRIBUTOS DO PROFISSIONAL:

Qualquer que seja o Modelo Assistencial, ele não poderá permitir que o usuário fique numa situação como esta:

Quais são os

comentários /

reclamações que

mais comumente

ouvimos dos

usuários?

1. O doutor nem me examinou......quero dizer, o doutor não quis verificar o que meu corpo tinha a “dizer” ....

2. O doutor nem me ouviu...

...quero dizer, o doutor não quis verificar o que minha alma tinha a “falar”....

...quero dizer, será que ele tem idéia de quanto isso vai me custar ? Ou, será que ele saberá o que fazer? 4. O doutor me “encheu” de remédios......quero dizer, será que ele sabe todos os efeitos desses remédios no meu organismo ?

3. O doutor me pediu um “monte” de exames/nem me pediu exames...

DEUSMISTICISMO

AUTO-MEDICAÇÃO

“ROTEIRO DA INSENSATEZ”

LABORATÓRIOEXAMES DE IMAGEM

ESPECIALISTA

IATROGENIA

TRATAMENTO

CONSULTA

DOENTE

Qual é a saída ?

Modelo Em Defesa da Vida:

Acesso: Universalização, trabalhando com idéia de “porta aberta”.

Acolhimento: Escuta qualificada, resposta positiva, humanização da assistência.

Vínculo: Responsabilização e referência segura ao usuário.

Resolutividade: Capacidade e compromisso em resolver o problema de saúde.

Autonomização: Garantia de ganhos de autonomia ao usuário, para “viver a vida”.

O Modelo em Defesa da Vida requer:

Decisão política. Apoio institucional. Reorganização do processo de trabalho. Organização democrática da gestão. Discussões sobre a organização dos serviços,

entre todos profissionais. Capacitação gerencial. Capacitação profissional. Produção de subjetividades, aptas a operar

uma nova relação, especialmente com os usuários.

Participação popular

II - Acolhimento, enquanto processo de

trabalho:

Fluxo de entrada da UBS sem acolhimento

Entrada RecepçãoConsultaMédica

Marcaçãode

Exames

Farmácia

ProcedimentosEnfermagem

Decisão concentrada na recepçãoFluxo assistencial centrado na consulta médica.

Saber médico estrutura os processos de trabalho na clínica.

FLUXO DA DEMANDA ESPONTÂNEA NA UNIDADE DE SAÚDE DA FAMÍLIA (Sem Acolhimento)

Barreiras de acesso: ficha, senha, fila,

triagem...

Entrada Recepção Acolhimento

OrientaçãoProgramas

Consulta MédConsulta Enf

outras

ProcedimentosMarcação ExEncaminham.

Decisão concentrada no Acolhimento.A recepção perde poder e orienta o fluxo.

Fluxo assistencial centrado na EQUIPE de Acolhimento.Saber multiprofissional estrutura os processos de trabalho na clínica.

FLUXO DA DEMANDA ESPONTÂNEA NA UNIDADE DE SAÚDE DA FAMÍLIA (Com Acolhimento)

Fluxo de entrada da UBS com acolhimento

CLASSIFICAÇÃO DE RISCO

VERDE : Agendamento de Consulta

AMARELO: Agendamento no próximo turno

VERMELHO: Atendimento Médico Imediato na Sala de Curativos

Acolhimento com Avaliação e Classificação de Risco

• direciona e organiza o fluxo através da identificação das demandas

• determina as áreas de atendimento (consultas, suturas, etc...)

• acolhe os pacientes e familiares nas demandas de informações sobre o processo de atendimento, tempo e motivo de espera

• faz avaliação primária, baseada em protocolos, encaminhando os casos que necessitam para a Classificação de Risco que segue critérios/fluxos previamente determinados:

emergências urgências eletivas outras

Referências Bibliográficas:

PASSOS, Eduardo (org.) Formação de apoiadores para a Política Nacional de Humanização da Gestão e da Atenção à Saúde. Rio de Janeiro:FIOCRUZ, 2006 2v

HERSEY, Paul & Blanchard, Kenneth H. 1986. Psicologia para Administradores.São Paulo: Editora Ped. e Universitária.

ACOLHIMENTO: o pensar, o fazer, o viver / Secretaria Municipal de Saúde - São Paulo: 2002

FRANCO, Túlio Batista; PANIZZI, Mirvaine; FOSCHIERA, Marlene et al. Acolher Chapecó: uma experiência de mudança do modelo assistencial, com base no processo de trabalho; São Paulo, Hucitec, 2004.

CECÍLIO, LCO et al. Inventando a mudança na saúde. São Paulo: Hucitec; 1994.

GULLAR, Ferreira. Na vertigem do dia. 1980. São Paulo. Livraria José Olympio Editora S/A.

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