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Este projeto de graduação de Jornalismo, de caráter experimental, consiste em um livro reportagem que mostra historias de relacionamentos amorosos de pessoas comuns mediadas pela mídia. O livro aborda a midiatização dos relacionamentos amorosos, a partir de uma breve contextualização social do rádio, televisão e internet, bem como das histórias de pessoas comuns que se conheceram por meio de programas radiofônicos ou televisivos e de aplicativos e sites de relacionamentos.

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Dahdah; Oliveira, Giulia; Lucila Boghossian; Souza Amor nos tempos de mídia : Das ondas sonoras à internet / Giulia; LucilaBoghossian; Souza Dahdah; Oliveira. - São Paulo, 2016. 111 p. : il., color.

Trabalho de conclusão de curso (graduação) – Escola Superior dePropaganda e Marketing, Curso de Jornalismo, São Paulo, 2016.

Orientador: Cicélia Pincer Batista

1. mídia. 2. amor. 3. relacionamento. 4. midiatização. 5. histórias de vida. 6.história da mídia. I. Batista, Cicélia Pincer. II. Escola Superior de Propaganda eMarketing. III. Título.

Ficha catalográfica elaborada pelo autor por meio do Sistema de Geração Automático da BibliotecaESPM

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A nossa orientadora nos últimos seis meses de conclusão e produção deste livro, pelas suas correções e pelos seus incentivos, que realizou com paciência e compreensão.

E às personagens que nos concederam entrevista, bem como aos envolvidos na conclusão gráfica, e a todos que dire-ta ou indiretamente fizeram parte de nossa formação.

Nosso muito obrigada a todos.

Agradecimentos

Em primeiro lugar agradecemos a Deus, fonte de vida e libertação, que nos faz acreditar num mundo mais justo, mais humano e mais fraterno, crença essa que nos mantém em pé todos os dias.

A esta universidade, seu corpo docente, sua direção e ad-ministração, que nos fizeram crescer como profissionais e como pessoas, pelo mérito, pela ética e missão aqui presentes.

A nossos pais, que nos incentivaram durante os quatro anos em que estivemos na faculdade.

A todos os professores que nos auxiliaram durante o decorrer do curso.

|À professora Patrícia Guimarães Gil, que nos acompa-nhou nos primeiros seis meses de produção do pré-projeto, e que nos deu suporte no tempo que lhe coube.

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Prefácio

No célebre “O Amor nos Tempos do Cólera”, o autor co-lombiano Gabriel Garcia Márquez (1985) tentava definir o amor e suas modulações: “o amor era amor em qualquer tempo e em qualquer parte, mas ainda mais denso quando mais perto da morte.” (MÁRQUEZ, 1985, p. 491). O que terá acontecido com o amor diante das transformações da humanidade e dos cenários de comunicação ao longo dos últimos 50 anos?

Neste projeto, propusemos uma paráfrase no título deste livro reportagem para contar jornalisticamente a evolução do amor ao lado da mídia. No caminho entre as ondas sonoras e o nascimento de um sistema global de redes interligadas, enfraqueceu a hegemonia dos meios de comunicação de massa para mediar os relacionamentos amorosos. Por meio de uma narrativa de relatos, pretendemos mostrar como o romantismo sobrevive (ou não) diante da evolução comunica-tiva da sociedade moderna.

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GIULIA BOGHOSSIAN DAHDAHLibriana, nascida em São Paulo no ano de 1994, trigêmea

e também irmã da caçula Nicole. Desde pequena, sou uma pessoa comunicativa e curiosa, que sente satisfação em ouvir o próximo.Tive a oportunidade de estagiar em uma das maio-res editoras do país, a Editora Globo, redigindo matérias para a Revista Crescer, onde pude perceber meu gosto e interesse pela mídia impressa. A paixão por ouvir e contar histórias, bem como o interesse pela influência do meio digital e sua capaci-dade de transformação em nossa sociedade, me inspiraram para a escolha do tema deste livro. Minhas maiores paixões são: estar com a minha família, viajar, conhecer pessoas e vivenciar novas experiências.

LUCILA SOUZA OLIVEIRANatural de Abadia dos Dourados, interior de Minas Ge-

rais, escolheu São Paulo para chamar de casa desde agosto de 2012, quando foi aprovada para o curso de Jornalismo da ESPM-SP. É geminiana e faz jus ao seu signo: é curiosa, faladeira, tem muitas ideias, quer estar em todos os lugares, quer ser muitas coisas e quer conhecer o mundo. Para o futuro, planeja trabalhar com comunicação em algum veículo voltado para o entretenimento, ou talvez criar uma marca de produtos veganos. São muitas ideias, vontades e anseios para uma vida só.

Bio

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O destaque nos dias atuais diz respeito à capacidade de atuação das mídias digitais e ao poder desses meios de facilitar a comunicação entre as pessoas, tornando hipo-teticamente o encontro muito mais favorável e viável, seja por redes sociais, chats, sites ou aplicativos para telefones móveis. O livro traz também uma perspectiva crítica a res-peito das relações atuais, partindo da ideia elaborada pelo sociólogo Baumam de que as pessoas se tornam mais “frias” à medida que o contato virtual ultrapassa o real.

Amores e desilusões amorosas ao longo dos últimos anos nos inspiraram a ouvir experiências de outras pessoas que foram diretamente influenciadas por alguma mídia de massa na construção de seu relacionamento. Priorizamos destacar o que estamos vivendo hoje: a tecnologia a favor — ou não — das relações afetivas. Ao mesmo tempo em que um aplicativo de relacionamento ou até mesmo uma página no Facebook pode nos render grandes encontros e finais felizes, pode também ser ponto de partida para desfazer um romance. Histórias assim, nós vemos cada dia mais. Construção e desconstrução, amor e desamor, para sempre ou apenas por um tempo. Essas questões e a forma como as mídias atuam sobre nós nos fizeram pensar em estudar seu surgimento e evolução ao longo do tempo para tentar entender de que forma o meio de comunicação intervém na vida das pessoas.

Introdução

Com a proposta inicial de provocar a reflexão sobre os papeis da mídia na mediação dos relacionamentos, a obra procura identificar o grau de influência do rádio, da televisão e das mídias digitais, mídias de massa escolhidas pelas autoras, sobre as dinâmicas sentimentais observadas.

Os personagens entrevistados retratam as transforma-ções sociais provocadas por essas mídias, compondo um trabalho de apuração e reportagem das autoras. No livro “Amor nos Tempos de Mídia”, a história de cada personagem é narrada em primeira pessoa, com intervenções textuais das autoras para salientar o contexto histórico em que se passam e a evolução, ao longo do tempo, de cada uma das mídias observadas. Assim, os casos reais exemplificam o modo como as mídias moldam os romances, sensibilizando os indivíduos com a tecnologia, até então inovadora, do ponto de vista de cada momento histórico.

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Capítulo 111 A Era da internet

Conclusão ......................................................................... 107

Introdução .................................................................................. 59

Fernanda e Marco Antonio ............................................................. 72

Cecília e Wagner ....................................................................... 66

Marcele, Theo e Renato ................................................................... 88

Carolina e Natan ........................................................................... 77

Fernanda Rachel e Ricardo ......................................................... 100

Sumário

Capítulo 1 A Era do rádio

Capítulo 11 A Era da televisão

Introdução ................................................................................... 17

Introdução .................................................................................. 29

Silvia e Rodrigo ........................................................................... 23

Tatiane e Rodrigo ....................................................................... 39

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Introdução

Em 1922, o Brasil ouviu sua primeira transmissão radio-fônica, realizada durante a comemoração do centenário de independência do país. Por meio de uma antena instalada no Corcovado, Rio de Janeiro, habitantes das cidades de Nite-rói, Petrópolis, São Paulo e Rio puderam escutar o discurso do então presidente Epitácio Pessoa, feito para a abertura da Exposição do Centenário.

Apesar de naquela época ser limitado a usos científicos e comerciais, e ser um objeto de alcance de poucos, rapida-mente o rádio mostrou seu potencial inovador e vinculativo, transformando-se, duplamente, em meio de vínculo afetivo com e entre os seus usuários, de modo que ainda hoje faz parte do nosso cotidiano. Por não depender da capacidade

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faz parte do programa, onde são contadas histórias maliciosas a fim de animar o ouvinte e ajudar a estimular a criatividade do relacionamento. O programa é apresentado às segundas, terças, quartas, quintas e aos domingos.

Na mesma emissora, dois outros programas se dedicam aos encontros amorosos: de segunda a sexta, na hora do almoço, a radialista Tatá fala de amor para seus ouvintes. O programa “Hora mais Paixão” tem desde músicas românticas a recados especiais para a pessoa amada. Sintonizado na mesma frequência, o “Hora mais Correio”, com formato de correio elegante, permite ao ouvinte pedir e enviar músicas para a pessoa amada. O programa vai ao ar de segunda a sexta, às 14h.

No “Paquera Nativa”, FM 103,7, de São Cristóvão (RJ), comandado pelo radialista Fernando Borges, de domingo a sexta, das 20h às 22h, o ouvinte também pode achar sua cara metade. O “Toque de Amor”, também sintonizado na FM 103,7 e comandado pelo locutor Maurício Berger, se intitula como “o mais romântico da rádio brasileira”. A pro-gramação vai desde a tradução de músicas que marcaram o ouvinte e sua história amorosa até a procura de um novo amor. Há também um quadro especial para tocar os suces-sos do cantor Roberto Carlos.

No “Cantinho Romântico”, programa da rádio Trans-continental FM 104,7, em São Paulo (SP), comandado pelo

de leitura e se valer, sobretudo, de uma linguagem simples, informal e mais próxima da oralidade, esse meio de comu-nicação tem caráter popular, atualizando e informando as pessoas com coberturas sobre trânsito, política, economia, entretenimento e prestação de serviços.

Mas, além de sua utilidade informativa e noticiosa, o rádio possibilita a interação entre os ouvintes também no que diz respeito à sua vida afetiva, a partir de estratégias de promoção e serviços de transmissão de recados amorosos ou até mesmo de programas para “encontrar o par perfeito”. De maneira mais intensa nas décadas passadas, e, menos intensamente, ainda recentemente, as pessoas buscavam o rádio para se declarar e enviar mensagens de correio elegante para seus parcei-ros amorosos e/ou para aquela pessoa de seu interesse, na esperança de conquistá-la, uma vez que, por atingir um número considerável de pessoas, a chance de sucesso era muito maior.

Outros programas de rádio ainda hoje destinam programas para jovens e adultos que pretendem encontrar o par perfeito ou fazer uma declaração amorosa ao seu parceiro. Na rádio Nativa FM 89,3, de Campinas (SP), o programa “Paixão Nativa, o ponto de encontro com o amor” tem duração de 4 horas, das 22h à 1h59, quando ouvintes enviam uma música ou recado para a pessoa amada. Também há a opção de conhecer pessoas novas descrevendo seu perfil e o da pessoa ideal. À meia-noite entra no ar o quadro “Pimenta Nativa”, que

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Fora” é um programa de encontros que tem como objetivo principal formar casais.”

Em uma tentativa de sucesso para criar uma nova identi-dade para o programa, a produção resolveu investir em uma ”pegada mais jovem”. Vale lembrar que, na época de sua cria-ção, o ORKUT, rede social já extinta, ganhou popularidade com a explosão das suas comunidades, que serviam para reforçar e intensificar a personalidade de um usuário. Observando o com-portamento dos jovens naquela época, Aldrin Mazzei percebeu que “o brasileiro se preocupa muito em manter contato e víncu-los com outras pessoas; todo mundo espera encontrar alguém, nem que seja apenas para jogar uma conversa fora num bar. Os jovens gostam de descobrir e viver coisas.”.

Assim foi criada a dinâmica do programa, ou seja: aos sábados, uma mulher solteira ou um homem solteiro apresentava-se ao vivo na Metropolitana FM, considerando o desempenho de nove pretendentes que, por telefone, disputavam provas e brincadeiras para conquistar o coração do(a) candidato(a) da semana. Após a primeira etapa de classificação, três finalistas eram convidados a comparecer na emissora, onde realizavam a grande final, que resultaria no esperado encontro de casal. Após “vencer a prova”, os dois membros do casal formado ganhavam muitos prêmios.

A inscrição era feita pelo site e o responsável pela produ-ção fazia também a seleção dos participantes, atendendo a

locutor Kiko Russo, o ouvinte também pode mandar músicas e recados para alguém especial. O programa vai ao ar de segunda a sexta-feira, das 12h às 13h. Também da Trans-continental FM 104,7 (SP), o “Esqueci de te esquecer” conta histórias de vida enviadas pelos ouvintes, que envolvem emoções, tristezas, perdas e alegrias. Quem interpreta as histórias é Cid Luiz Jardim e o programa vai ao ar às 11h30, de segunda a sexta-feira.

O “Missão Impossível”, programa da Jovem Pan FM (SP) foi feito para quem tem problemas com relacionamen-tos, com a missão de ajudar os ouvintes a resolver seus im-passes com seus parceiros. Os problemas nem sempre são resolvidos, mas a atenção é garantida. O programa é coman-dado por Ligia Mendes e pelo locutor Bob Fernandez e vai ao ar de segunda a sábado das 17h às 19h e aos domingos, das 20h às 22h.

Nesses mesmos moldes, a rádio Metropolitana FM leva ao ar, desde 15 de fevereiro de 2003, o programa “Dentro ou Fora”, criado por Aldrin Mazzei. O material de apresentação e divulgação do programa já deixam claros seus propósitos:

“Está faltando homem no mercado!”, “Está faltando mu-lher séria pra namorar!”. Quantas vezes você já ouviu frases como essas? Acreditando que o que está faltando mesmo são encontros, a Metropolitana FM lança neste sábado, 15/02, o “Dentro ou Fora”. Com apoio da internet, “Dentro ou

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Sílvia e Rodrigo“A brincadeira que rendeu casamento”

E u sempre fui muito caseira. Não saía de casa para ir para a balada, bar; isso não era comigo. Na época, com vinte anos de ida-

de, eu estava em uma fase de mudanças na minha vida; queria encontrar pessoas que tivessem o mesmo perfil que o meu. Era num sábado, por volta das 20h30, estava em meu carro indo encontrar umas amigas e me deparei

Silvia Hernandez e Rodrigo Stevanin na cerimônia de

casamento em 2011. (Foto: Arquivo Pessoal)

alguns critérios definidos para facilitar a triagem. O perfil e his-tórico de uma pretendente no Orkut já transmitiam uma ideia a respeito do seu comportamento: “Quando a gente via que era uma menina que estava inscrita em vários sites de relaciona-mento, já pensávamos: Opa, essa realmente está procurando alguém! Aí fazíamos dessa personagem alguma candidata em potencial para ir para o programa”, explica Mazzei.

Outro critério levado em conta era a desenvoltura da candidata. “A menina deveria ser comunicativa, afinal, num programa de rádio, que não pode se valer da ajuda de imagens, uma boa comunicação se torna imprescindível para o bom desempenho do candidato.”. Para garantir o sucesso, a produção contratava uma celebridade para comandar o programa, que funcionava como uma espécie de cupido. Daniela Cicarelli foi a primeira “cupida” do “Dentro ou Fora”, onde ficou até Fevereiro de 2004. Após sua saída, a produ-ção convidava uma personalidade nova a cada semana. O programa entrava no ar todos os sábados, das 20h às 22h, nos 98,5 mHz, e foi extinto em maio de 2005.

Foi graças ao “Dentro ou Fora” que Sílvia e Rodrigo se conheceram, engataram um romance, se casaram e tiveram seu primeiro filho, como contam a seguir.

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em me relacionar com alguém. Como de costume, era um sábado e eu e um amigo bem próximo estávamos indo para um barzinho e aquele programa nos insti-gou a atenção. Na ocasião, o Ricardo me desafiou a participar: duvido que você iria. Me inscrevi e duas semanas depois me ligaram perguntando se eu podia participar do programa no próximo final de semana, pois uma mulher havia me escolhido. Antes de desli-gar o telefone a equipe de produção disse que eu de-veria chegar duas horas antes do início do programa e que poderia entrar com o carro no estacionamento da rádio e levar um amigo de acompanhante, que no caso foi o Ricardo.

Chegando lá, por volta das 18h30, eles me fizeram mais algumas perguntas e precisei assinar alguns ter-mos... Depois disso, eu subi para uma sala e encontrei os outros dois candidatos que já estavam lá. Antes de começar o programa, ficamos conversando. Nenhum de nós estávamos lá com a esperança de encontrar al-guém, fomos mais pela a zoeira mesmo e deu nisso. Não deu nem tempo de aproveitar a solteirice.

Durante o programa os meninos deveriam fazer uma declaração para a futura amada e soltar a voz em plena Avenida Paulista, dedicando uma música à participante da semana. Após a primeira etapa realizada, Silvia já eliminaria um. Na segunda prova, outro. E sobraria, as-sim, o seu futuro companheiro – e, como nunca poderia imaginar, marido.

com o programa “Dentro ou Fora” na rádio Metropoli-tana FM, de São Paulo.

Achei o programa divertido e resolvi tentar. ”Va-mos ver se dá certo esse negócio”. Entrei no site e fiz o pré-cadastro. Dois dias depois, a produção me ligou me convidando para ir até a rádio na semana seguinte. Marcamos o horário: 16h de uma quarta-feira. Che-gando lá, a produção fez um questionário para saber um pouco mais sobre minha vida e sobre o que eu gos-tava de fazer: o que eu fazia nas horas vagas, onde eu gostava de sair, que tipo de música gostava de ouvir; foram algumas das perguntas. Lembro também que eles pediram para tirar fotos, de perfil, de frente...

Antes de eu ir embora, disseram que meu perfil seria publicado no site quinze dias antes de o programa ir ao ar, e todos os candidatos que fossem inscritos aparece-riam para mim com a foto e as respostas das mesmas perguntas que me fizeram. Dos oitenta selecionados, eu deveria escolher três, que compareceriam no programa caso estivessem disponíveis. Eu cheguei por volta das 18h e ficava dentro de uma cabine enquanto a produção realizava as provas com os meninos.

Diferentemente de Sílvia, Rodrigo já não botava tan-ta fé no programa e se inscreveu apenas por uma brin-cadeira de moleque, no auge dos seus 19 anos de idade:

Pra mim era mais uma brincadeira de moleque. Namorei por dois anos e havia terminado há pouco tempo. Naquele momento não estava nem pensando

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Foi um sucesso! Namoramos durante seis anos, ficamos noivos em 2010 e, um ano depois, em 2011 nós casamos. E como eu mantive contato com o Aldrin e tenho um carinho e uma gratidão por tudo que aconteceu, eu liguei avisando que íamos casar e o convidei para a cerimônia. “Foi o único casamento em que chorei.”. Após cinco anos casados, engravidei e tive o Victor.

Assim que nos viu, o pequeno Victor já abriu um sorri-so. Ê, menino dado! Esticava a mão querendo nosso colo e assim ficou, durante os dez primeiros minutos de entre-vista, até avistar seus brinquedos. Sentou-se no tapete e se divertiu sozinho.

Finalmente, após a última fase de eliminação, era hora de o sortudo do Rodrigo conhecer sua futura esposa.

Eu subi para uma sala onde nós estávamos sepa-rados por um vidro e ela estava de costas para mim. Quando a produção disse que ela poderia virar, come-çou a tocar uma música para dar aquele clima român-tico. Quando finalmente nos vimos, o Aldrin pergunta para ela: ”Dentro ou Fora?”.

”Dentro!”. Aí, nesse momento, ele entrou na sala onde eu estava e nós finalmente nos conhecemos pesso-almente. Depois disso eles chamam para o intervalo en-quanto nós e a produção nos acomodávamos numa van em direção a uma balada na Vila Olímpia. Durante o per-curso e até a entrada da boate, a apresentadora narrava o que estava acontecendo, além de anunciar ao vivo convi-tes vip para o ouvinte que quisesse comparecer ao local.

Na balada mesmo nós nem nos beijamos. Só dan-çamos e conversamos. Percebemos muitas coisas em comum, gostos e desgostos. Descobrimos até que mo-rávamos super perto! Depois disso, começamos a sair, marcar encontros em cinemas, restaurantes, apresentar para os amigos... após um mês ficando sério, ele foi pe-dir para meus pais para namorar comigo. Quinze dias depois o Aldrin me liga para saber como estávamos e eu contei a novidade. Ele nos chamou para voltar para a rádio, como convidados, para contar nossa história e mostrar que realmente pode ser possível encontrar um(a) companheiro(a) naquele tipo de programa.

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Introdução

Depois que o rádio foi criado, na década de 1920, o grande desafio dos cientistas passou a ser agrupar e trans-mitir as ondas sonoras com a imagem em movimento, para a criação da TV. O engenheiro escocês, John Logie Baird, bem que tentou trazer a televisão para o mundo, porém tudo que conseguiu foi uma imagem televisiva um tanto quanto distorcida. O responsável por trazer o primeiro aparelho com possibilidade de uma melhor definição e qualidade de ima-gem foi o engenheiro sueco da General Eletric (GE), Ernst Alexanderson, em janeiro de 1928, em Nova Iorque.

No Brasil, a televisão ganhou destaque em 1950, após estar plenamente desenvolvida e conhecida nos Estados Unidos e na Europa, e por iniciativa do empresário Assis

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O primeiro projeto com esse propósito na televisão bra-sileira surgiu nos anos de 1980, com a apresentação de um dos maiores ícones da comunicação brasileira, Silvio Santos. O programa “Namoro na TV” unia casais que estavam à beira da separação, encontrando a “metade da laranja” para os participantes e, no final, promovendo um baile animado que culminava com a pergunta: “É namoro ou amizade?”.

Assim como esse, muitos outros programas com o mesmo intuito foram surgindo. O programa “Em nome do amor” chegou para substituir o “Namoro na Tv”, na década de 1990. Jovens solteiros se inscreviam com a itnenção de procurar um grande amor. Homens de um lado e mulheres do outro se estudavam por meio de um binóculo, dançavam uma valsa e, no fim das contas, ainda respondiam à clássica pergunta: “é namoro ou amizade?”. Os que escolhessem pelo namoro ainda ganhariam um buquê de flores e um jantar do padrinho Sílvio Santos. A atração terminou no ano 2000, quando foi substituída pelo “Show do Milhão”.

Integrante da então nascente TV a cabo brasileira, a emis-sora MTV também embarcou na onda do namoro na TV. O “Fica Comigo”, programa exibido todas as segundas-feiras, às 22h, no período de 2000 a 2003, era mais moderno e ousado, quando comparado aos seus concorrentes da TV aberta.

A cada mês eram selecionados quatro “Queridos” (dois homens e duas mulheres dispostos a engatar um namoro)

Chateubriand, que a trouxe para o país, criando a primeira emissora de TV brasileira, a TV Tupi.

Chateaubriand, ou Chatô, como veio a ser mais conheci-do, um dos homens mais influentes do Brasil nas décadas de 1940 e 50 e dono do primeiro grande conglomerado de mídia no país, os Diários Associados, foi além. Como, de manei-ra semelhante ao Rádio, em seu momento de chegada ao país, os aparelhos de TV eram muito caros, restringindo seu acesso a uma pequena parcela da população, o jornalista viabilizou a aquisição de cerca de 200 aparelhos televisores, possibilitando, dessa forma, a ampliação de seu alcance.

De imediato, a TV Tupi, emissora criada por Chateu-abriand, tornou-se um fenômeno de sucesso e audiência, abrindo espaço e demanda para o sugimento de novas emissoras e para a popularização da programação televisiva, fazendo da televisão o meio de comunicação mais importan-te e influente no Brasil ainda hoje.

A partir dos anos finais da década de 1960, a televisão se tornou a mídia de maior influência e importância na formação de opinião, comportamentos e valores dos brasileiros, pas-sando a ser a principal porta para a disseminação de cultura, entretenimento, informação e até mesmo para a aproximação de pessoas no país. Assim, não deixa de parecer normal que, logo após seu surgimento e sua popularização, surgissem na TV programas voltados à promoção de encontros amorosos.

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amigo ou familiar escolhido pelo pretendente, momento em que eram exibidas as fotos de quando era um “girininho”, a resposta a um questionário e uma serenata, onde o preten-dente deveria fazer uma paródia de uma música para cantar com o intuito de conquistar o “Príncipe” ou a “Princesa”. Os pretendentes excluídos, ou pela “Princesa” ou pelo “Prínci-pe”, ainda tinham a oportunidade de beijar na boca mesmo assim. Logo após a eliminação de um pretendente, Daniela Cicarelli chamava algumas pessoas da plateia para disputar no grito, com a frase “Socorro, Cicarelli!!!”, a chance de beijar a pessoa eliminada.

No SBT, o programa “Rola ou Enrola”, criado com propó-sitos semelhantes, teve seu fim em outubro de 2015. Estre-ado em 2009 e comandado pela apresentadora Eliana, esse programa desafiava vinte homens selecionados a convencer cinco mulheres de que eles valiam a pena e deveriam, portan-to, ser escolhidos, em apenas sessenta segundos. Na atração valia tudo: fazer uma declaração, cantar, dançar, tocar algum instrumento, o que a inspiração do pretendente permitisse.

Após o show, as mulheres levantavam uma placa de “Tô fora!” ou “Eu quero!”. Se mais de uma mulher escolhes-se o mesmo homem, seria ele, o homem, quem decidiria com quem ficar. Em julho de 2012, mais um programa com temática parecida estreou no programa da Eliana. Pode ser sussurrada, gritada ou cantada... mas essa é, sem dúvi-

e, em cada programa, um “Querido” poderia escolher entre quatro “Interessados” (pretendentes que haviam se inscrito pela internet para paquerar o “Querido”). Apesar de estarem no mesmo cenário, os participantes não se viam durante o processo de conquista. A cada bloco do programa era elimi-nado um “Interessado”, de acordo com as etapas realizadas, para transparecer a personalidade de cada pretendente. A exclusão não era por aparência, mas sim pelo papo, pela voz, maneira de pensar, ou até mesmo pelo toque e cheiro, que eram permitidos na última etapa. Só então, no final do programa, o “Querido” se encontraria com o “Interessado” que escolheu e decidiria, a partir de um beijo, se queria ou não namorar com ele. Se na hora H não pintasse um clima, o beijo seria dado na bochecha, significando intenção de apenas amizade.

Também da extinta MTV, o programa “Beija Sapo” era apresentado pela modelo Daniela Cicarelli no início dos anos 2000. Seu formato era muito semelhante ao anterior “Fica Comigo”, com a diferença na forma como os participantes e o público interagiam. No programa, um participante denomi-nado “Príncipe” ou “Princesa” tinha que escolher um, dentre três participantes vestidos de sapos ou pererecas, para dar um beijo na boca no final do programa. Todo o processo para a escolha de um deles passava por fases, como a visita ao quarto do pretendente, a defesa feita no programa por um

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O programa consolidou-se na vice-liderança da audiência brasileira para aquele dia e horário e, segundo a assessoria da emissora, a atração que era exibida entre 15h30 e 19h de sábado alcançava 10 pontos de média e 20% de share. Durante a exibição do quadro “Vai dar Namoro”, entre 16h50 e 18h30, o programa chegou a dar picos de 12 pontos de média de audiência e share também recorde de 24%, maior índice de audiência registrado pelo programa. O quadro não tinha segredo: homens e mulheres se inscreviam a partir do site da emissora em busca de sua cara metade.

Em um bate papo informal com Caio Nicolau, produtor do programa no período de 2006 a 2009, foi possível entender melhor como funcionava o processo de seleção bem como a repercusão que o quadro tinha:

Inicialmente, “O Melhor do Brasil” era um programa de calouros. Tínhamos desde melhor cantor até melhor imita-dor. Eram cinco horas de atração, apenas com calouros. A direção da Record, almejando maior audiência, projetou um quadro de relacionamentos. Tínhamos a premissa de fazer algo de verdade. Abríamos a inscrição no site, e também fazíamos casting em shoppings.

1. Corresponde à percentagem de audiência de um canal/programa relativa-mente à audiência do total de televisão, para o mesmo período.

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da, a frase que toda pessoa apaixonada quer ouvir: “Quer casar comigo?”.

O pedido se transformava numa grande prova de amor quando feito em rede nacional, de uma maneira original, inu-sitada e criativa. Se o pedido fosse aceito, o casal iria para o palco disputar um prêmio em provas divertidas. O quadro é atual e vai ao ar todos os domingos às 15h.

Representante da Record na lista de programas desse tipo, o “Vai dar Namoro” é um quadro de “O Melhor do Brasil”, apresentado por Rodrigo Faro. Seu objetivo, como o dos demais, é unir casais em busca de uma grande paixão. O pro-grama é conhecido por ser bastante engraçado e mesclar a interação entre os casais e as performances do apresentador, que a cada semana se veste de um personagem famoso.

Esse programa de auditório, que foi ao ar na TV Re-cord entre 5 de novembro de 2005 e 20 de abril de 2014, contava com uma variedade de quadros que prometiam entreter e divertir o telespectador e os participantes que estavam ao vivo nos estúdios da emissora. A programa-ção contava com atrações musicais, quadros de namoro, games e reportagens. Entre os destaques da primeira fase do “O Melhor do Brasil” estava o quadro “Vai dar Namoro”, com apresentação inicial de Márcio Garcia, que anunciou sua saída em abril de 2008, passando o coman-do para Rodrigo Faro.

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player. Já na producão, a ou o pretendente deveria preen-cher outra ficha, na qual forneceria informações como seu nome, profissão, escolaridade, onde morava, por qual motivo havia escolhido participar do programa, com quantas pesso-as já havia se relacionado, por que havia terminado a última relação, entre outros dados.

Além disso, o(a) canditato(a) assinava um termo em que dizia que tudo o que havia escrito na ficha era legítimo. Por fim, era gravado um vídeo, de aproximadamente dois minutos, com o concorrente, para testar sua desenvoltura em frente às câmeras. Aqueles que se mostrassem mais desini-bidos, eram selecionados e, por fim, a diretora de produção elegia os 21 candidatos que estariam ao vivo no programa seguinte, sendo nove mulheres e 12 homens.

No dia da gravação, duas vans da emissora eram res-ponsáveis por passar pela casa dos participantes, sendo que em uma íam só homens e na outra apenas mulheres. As can-didatas chegavam quatro horas antes de o programa come-çar e a emissora lhes disponibilizava almoço e um tratamento vip de beleza, com direito a maquiagem e penteado.

Na hora do quadro, as nove mulheres ficavam sentadas enquanto um homem de cada vez saía de trás do estúdio e se apresentava. Em ordem, o apresentador perguntava para cada uma: “você quer conhecer fulano?”. Se a mulher não se identificasse com o perfil, dizia “hoje não”. Caso contrário,

No momento da inscrição, o candidato deveria preen-cher uma ficha com todos os dados e contar por que gostaria de participar do programa. Havia um espaço para colocar uma foto e um “conte mais sobre você”, que deveria ser preenchido com qualidade e defeitos pessoais.

Sabe aquele pessoal que trabalha com telemarketing e não tem tempo para sair porque tem uma rotina maluca com questão de horário? Priorizávamos pessoas que realmente não tinham tempo para sair e encontrar alguém. Modelo? Não serve. Nos inspiramos no programa do Sílvio Santos, “Em Nome do Amor”, porém com uma pegada mais moder-na. Sempre priorizamos pessoas comuns, que você pode encontrar no metrô, ônibus, na praça, e não aquelas(es) modelinhos que vão bem arrumados, com discurso pronto... Juntamos a proposta do quadro do Sílvio Santos transmitindo verdade e com a participação de pessoas comuns, porém com a modernidade do século XXI.”.

Eram em média 300 inscritos no site. Caio Nicolau, a assistente de produção e o estagiário da época faziam con-tato com todos. Alguns eram trote, outros agendavam com a produção para comparecer na emissora para a pré-seleção, porém não apareciam, desistiam. Quando dava certo, o candidato era convidado para uma entrevista presencial na emissora, já avisado de que não ganharia nenhum cachê pela participação, no máximo um agrado, ou melhor, um mp3

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Tatiane e Rodrigo “não foi coincidência e muito menos

sorte, foi o encontro de duas almas gêmeas”

Tatiane, que acaba de ganhar seu terceiro filho, deu seu depoimento para nós via telefone. Morando atualmente em Campinas e uma semana antes de dar à luz seu primeiro menino, o Théo, Tatiane já atendeu à ligação bem empolgada para contar sua história, que vai muito além de uma simples

Da esquerda para à direita: Larissa Flo-si, Tatiane Flosi grávida de oito meses

do pequeno Théo, o papai Rodrigo Flosi com a Heloisa Flosi em seus ombros.

(Foto: Arquivo Pessoal)

os dois poderiam passar o resto do programa conversando. Ao final do quadro, a produção perguntava ao casal se eles gostariam de se conhecer melhor, caso em que organizariam o “Primeiro Encontro” do casal, que acontecia, na maioria das vezes, em parques da cidade de São Paulo.

Foi no “O Melhor do Brasil” que Tatiane e Rodrigo se conheceram.

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A lgumas coisas acontecem porque têm que acontecer. É o destino e não dá para fugir. Comigo não foi diferente e mudou com-

pletamente a minha vida. Nunca vou esquecer o dia em que conheci o meu amor, meu parceiro e companheiro, Rodrigo. Algumas pessoas podem dizer que foi o aca-so, sorte ou coincidência. Para mim, foi muito mais que isso, foi o encontro de duas almas gêmeas. Eu acredito muito em Deus e eu sei que teve a mão dele nessa his-tória; foi o caminho que ele encontrou para juntar eu e o Rodrigo. Não canso de contar sobre como tudo isso começou, foi tão lindo e tão rápido que mexeu comigo de uma tal maneira que eu não poderia esperar. Já se passaram nove anos quando eu olhei nos olhos dele pela primeira vez e esse momento eu nunca vou esquecer.

Nasci em Santo André no dia cinco de novembro de 1986. Minha mãe, Sandra Flosi, me registrou como Tatiane Flosi; mal sabia que no futuro eu iria me tor-nar Tatiane Flosi de Melo. Quando tinha quatro anos, meus pais se separaram e me mudei para Indaiatuba, no interior de São Paulo. Minha mãe arrumou as ma-las e levou eu, meus avós, e minhas irmãs, Thalita e Thaís para uma nova vida. Tive uma infância tranquila e muito feliz. Nunca me faltou nada e cresci em um lar com muito amor.

Minha adolescência também foi muito boa e eu sempre fui uma menina de namorar. Comecei a me relacionar muito cedo, com 13 para 14 anos tive o meu primeiro namorado. Foi uma fase tão boa, ficamos

participação em um programa de relacionamento televisivo. Antes mesmo de isso acontecer, sua vida já tinha dado uma de suas reviravoltas e mudado completamente seus planos. Quando quase já não havia mais esperança, encontrou um cara que colocaria sua vida no lugar de novo. Em 1 hora e 23 minutos gravados de entrevista, Tatiane conta que passou por alguns perrengues em sua vida, mas como ela mesma diz, “nada acontece por um acaso. Se eu precisasse passar por tudo de novo para chegar onde estou agora, reviveria tudo eternamente.”.

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seguido superar. Todos dentro de casa ficaram em cho-que com as atitudes dele porque ele frequentava minha casa, era praticamente da família.

Minha mãe desde o começou me deu suporte, fi-cando ao meu lado todas as horas. Como cresci sepa-rada do meu pai, ele não disse muito, mas também deu o seu apoio. A situação mais difícil foi com o meu avô porque ele tinha um pensamento mais antigo. Moráva-mos com ele, então foi bem complicado. No começo, vovô não aceitou e chegou até a dizer que na casa dele eu não poderia ficar. Para minha sorte, minha mãe fa-lou que se eu saísse ela também iria junto. Essa época foi conturbada, até que no fim ele aceitou e disse que tudo ficaria bem. Como só estudava e não trabalhava, eles me deram todo o apoio financeiro e tive forças para continuar com a gravidez.

No dia 16 de junho de 2004, nasceu minha filha La-rissa, que hoje tem 11 aninhos. Minha pequena veio ao mundo prematura, quando eu ainda estava com oito me-ses de gravidez. O pai dela fez apenas a obrigação, deu o seu nome e nada mais. Não teve contato nenhum com a minha menina e muito menos um amor paternal. Ele as-sumiu e registrou, mas foi tudo tão frio e isso me mago-ava muito. Queria tanto que ele participasse da vida de Larissa e no primeiro ano ligava para ele pedindo, quase implorando, para que viesse ver minha princesinha. Não adiantou e com o tempo fui descobrindo que ele nun-ca foi o que eu pensei que fosse. Amigos começaram a me contar que quando namorávamos, ele me deixava

juntos três anos até que a vida deu aquelas voltas que a gente não imagina. Eu tinha 17 anos quando desco-bri que estava grávida e isso mudou completamente as coisas. O pai do meu bebê era o meu primeiro namora-do, frequentava minha casa e eu tinha certeza que ele iria casar comigo. Aquela ilusão de adolescente apai-xonada que acha que o mundo é um conto de fadas.

Quando contei para ele que estava grávida, um balde de água fria me fez cair na realidade. Depois da notícia, o pai do meu filho desapareceu por duas se-manas. Fiquei desesperada sem saber o que iria acon-tecer. Ele voltou e disse que só iria assumir a criança, mais nada. Ele não quis ficar comigo, muito menos casar. Foi muito difícil e fiquei arrasada. Ainda estava na escola com um filho na barriga e sem marido. Tive depressão e não conseguia parar de chorar. O futuro já não existia para mim, só tinha certeza que dentro de mim tinha uma vida muito especial.

O meu ex-namorado não conversava comigo e não olhava na minha cara. Na época eu ainda estava apaixo-nada por ele e isso tornou tudo ainda mais difícil. Preci-sei mudar de escola para terminar o Ensino Médio, por-que, apesar da situação, eu não queria parar de estudar.

Foi uma fase muito complicada, especialmente com a questão do preconceito porque 11 anos atrás não era normal ser mãe solteira. Eu fiquei cada dia mais triste e a vida foi ficando desanimada. Se não fosse o apoio da minha família, eu não sei se teria con-

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de me envolver com outra pessoa. Tudo o que eu vivi foi um trauma e pensava que se colocasse alguém na minha vida e acontecesse tudo de novo, eu não iria aguentar. Eu também me preocupava muito com a minha filha, não queria que ela passasse por isso. Eu sei que ela sen-tiu tudo dentro da minha barriga, não seria justo fazê-la sentir fora. Mas, às vezes, a vida leva a gente para cada lugar e não tem como escapar. Não dá para fugir.

Foi no segundo ano da faculdade, em 2007, que começou o programa da Record, “Vai Dar Namoro”. O apresentador era o Márcio Garcia e eu acabei par-ticipando. Quem diria que um programa de televisão fosse transformar a minha vida e abrir o meu coração para o amor?

Tudo começou com uma brincadeira. As poucas vezes em que saía, eu e minhas amigas tínhamos a mania de falar “hoje não, Márcio”, se algum menino feio chegasse na gente. Essa frase era muito popular no programa quando alguém queria dizer não. Todo mundo se divertia falando isso e o “Vai dar Namoro” ficou cada vez mais famoso na minha cidade.

Um dia, passou na televisão um aviso para as mo-ças que estavam procurando namorados na região de Campinas se inscreverem. Minha mãe viu e ficou toda empolgada e disse para eu participar. Fiquei meio as-sim - “será?”. E fui contar para minhas amigas. Elas falaram “vamos nos inscrever, vai?”, de brincadeira mesmo. Nunca vou me esquecer. Era uma quarta-feira

em casa e ia para a balada, me enganando sempre. Aos poucos fui percebendo que no fundo tinha me livrado de uma pessoa que não me acrescentava nada. Então, decidi parar de ligar e fui levando minha vida.

Quando terminei o colégio, minha mãe disse que era hora de escolher uma profissão. Sempre gostei de dançar e resolvi fazer educação física. Passei na facul-dade, em Itu, e minha vida começou a tomar um novo rumo. Minha mente abriu e eu vi que meu mundo não tinha acabado. Voltei a ter alegria de viver e as coisas estavam melhorando. Fiz um ano de educação física, mas percebi que não era o que eu queria. Acabei de-sistindo do curso e mudei para administração. Estava com 18 para 19 anos e fiz várias amizades na faculda-de. Foi então, que me dei conta que tinha me despren-dido totalmente do pai da minha filha. O medo de me relacionar continuava, e isso fez com que eu nunca tivesse outros namorados sérios. De vez em quando, minha mãe falava para eu sair e me divertir um pouco. Eu não gostava porque toda vez que saia, achava que não estava sendo mãe para a minha Larissa. Me sentia na obrigação de ficar com ela sempre. Às vezes, eu ia para um barzinho, mas sempre muito preocupada. Não é fácil ser mãe na idade que eu fui.

O pai da minha filha pagava pensão; era pouco mas já ajudava. Consegui arrumar um estágio legal, tinha uma menina linda, uma mãe maravilhosa, estudava em um local bacana e tudo estava indo bem. Porém, a últi-ma coisa que eu queria era um namorado. Tinha receio

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contei para ninguém, só minha mãe, minhas irmãs, minhas amigas e meus avós sabiam. Foram 15 dias de muita ansiedade.

Era uma segunda-feira do dia 4 de junho de 2007 e essa data transformou minha vida por completo. Uma equipe da Record chegou bem cedinho em casa para me buscar. Eu fui sozinha, não podia levar ninguém. Quando cheguei no estúdio fiquei encantada com os bastidores. Era tudo tão lindo. Estávamos em mais ou menos 15 meninas, sendo três da minha cidade. Pas-samos o dia todo em um camarim bem grande nos ar-rumando. Às vezes, aparecia algum famoso para brin-car com a gente. Lembro que o Marcos Frota entrou e falou: “as encalhadas da Record!”. Todo mundo deu risada; foi uma diversão só. A produção pediu para a gente levar três opções de roupas porque, caso não gostássemos das que eles oferecessem, poderíamos usar as nossas. Eu preferi colocar a minha, me sen-ti mais confortável. Passamos o tempo todo lá, sem acesso algum aos meninos e isso ia me deixando cada vez mais ansiosa. Até que chegou a grande hora.

Quando eu entrei no estúdio, fiquei em choque. Olhei para o Márcio Garcia e vi luzes, câmeras, pla-teia... foi uma sensação tão intensa! Meus olhos en-cheram de lágrimas e eu não conseguia andar. A pri-meira coisa que eu pensei foi em desistir e falei “não quero mais”. O menino da produção me olhou e disse que não dava para voltar atrás. Ele me colocou bem no banco da frente e eu fiquei ainda mais nervosa. Meu

à noite, quando eu e mais duas meninas fomos para a sala de informática da faculdade fazer a inscrição. Não coloquei muita fé; para mim tudo não passava de uma diversão. Abri o computador, anexei uma foto e respondi algumas perguntas básicas como meu peso, altura, cor do cabelo, o que eu gostava de fazer... Não era nada em relação ao tipo de homem que eu gostava, mas informações pessoais minhas. Sem pensar muito, fiz a inscrição e voltei para casa.

Não demorou muito quando meu celular tocou. Era o Caio, produtor do programa, que queria fazer uma pré-seleção comigo. Fiquei bem nervosa, mas aceitei. No entanto, as minhas amigas que também se inscre-veram não foram chamadas. Conclusão: fui a única que recebeu o telefonema. Fiquei morrendo de vergonha, mas já tinha dito sim e não dava para voltar atrás.

A pré-seleção aconteceu num dia da semana e, por isso, precisei pedir folga do estágio para ir a Campi-nas. Chegando lá, só tinha menina e a produção ex-plicou como funcionava o programa. Perguntaram se a gente realmente queria participar, que era algo bem sério. Deixaram claro que não era para marketing pes-soal ou para se promover. Eles não pagavam nada, no máximo, poderíamos ganhar alguns brindes. Fiz um vídeo falando sobre minha vida, o que eu gostava e o meu tipo de música. Voltei para Indaiatuba ainda sem levar muito a sério, até que me ligaram falando que em 15 dias seria a gravação do programa. Eu gelei, não estava esperando que fosse mesmo dar certo. Não

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sim na hora. Já estava com a resposta na ponta da lín-gua, mas não fui a primeira. O Márcio começou com a fila de trás. Logo, seria a última.

Aquele desespero percorreu meu corpo todo. Se alguma das meninas falasse sim, eu ia perdê-lo. Ti-nha certeza que não ia dar certo, mas precisava ser confiante. Fiquei encarando tempo todo e ele também, mas não estava em nossas mãos. E cada vez que ele perguntava para uma das meninas eu ficava torcendo pelo não. Eu tive muita sorte porque como o Rodrigo era o primeiro, elas estavam mais interessadas em ver os próximos e ninguém queria falar sim logo de cara.

Até que chegou a vez da menina do meu lado, e pensei só falta mais um não para ser minha vez e ela respondeu: “Eu até queria, mas ele está olhando muito para minha amiga aqui do lado, então vou deixar para ela”. Não estava acreditando e finalmente ele me per-guntou se eu queria conversar e sem pensar duas ve-zes falei sim. Sentamos nuns banquinhos no canto do estúdio para conversar e foi muito bom. Como fomos os primeiros, ganhamos tempo e ficamos o programa todo conversando. No começo a gente só ria porque os nossos gostos eram iguais. Na época eu gostava muito de pagode e disse que adorava o Jeito Moleque e ele também. Os lugares de sair, as músicas, os hobbies, tudo combinava. Era incrível a sensação que senti ao lado dele, mas precisava falar que eu era mãe e não podia esconder isso. Sempre tive preconceito comigo mesma e muito medo de contar, mas preferi dizer logo

cabelo estava de escova, e isso me deixou muito inse-gura. Comecei a me sentir feia porque gosto do meu cabelo natural. Não sabia mais o que estava fazendo ali e entrei em pânico. Pensei no pessoal da faculdade, em como iria encarar todo mundo no dia seguinte; me deu muita insegurança. Afinal, não sou tão feia para precisar apelar para um programa de encontro. Eu não tinha tempo para mais nada, fiquei sentada em uma cadeira olhando todo aquele cenário e não conseguia me mexer. Minhas mãos estavam geladas e eu mal res-pirava. O Márcio Garcia conversou com todas as me-ninas antes de começar. Disse que era algo tranquilo, para todo mundo se divertir. Fiquei um pouco, mas bem pouco, aliviada.

Quando começasse a gravação, ele ia chamar os meninos, um por vez, para entrarem. Cada um iria se apresentar e perguntar para as meninas se elas queriam conversar ou não. Eu já estava envergonhada, sem ter ideia do que iria acontecer. As câmeras ligaram e o Márcio chamou o primeiro menino, o meu Rodrigo. Ele entrou e meu coração explodiu. Olhei nos olhos dele e tinha certeza que um dia eu me casaria com aquele homem. Não foi o físico que me chamou a atenção, foi algo muito maior. Rodrigo era minha alma gêmea e eu tinha certeza disso desde o primeiro momento em que o vi. O meu amor se apresentou falando que tinha 24 anos e morava em Campinas. Eu estava toda animada porque como era a primeira da fila da frente, tinha cer-teza que o Márcio iria começar por mim e quando o Rodrigo perguntasse se eu queria conversar, diria que

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ele mais uma vez?”. O meu celular estava com pouca bateria e eu anotei o número dele correndo. Foi tão rápido que não deu tempo de pensar em muita coisa. Nos despedimos com um beijo no rosto e cada um foi para a sua van. Como ele morava em Campinas e eu em Indaiatuba, íamos em carros separados.

Eu vi que ele chamou o Caio antes de entrar na van e o produtor do programa veio em minha direção com um sorrisinho no rosto: “O Rodrigo pediu para te dar.”. Era um sonho de valsa, do qual tenho o papel guardado até hoje. Fiquei toda tímida e o Caio disse para eu ir agradecer. Fui até a van dele falei obrigada e dei um selinho. Meu corpo pegou fogo e tinha certeza que estava apaixonada.

Quando cheguei em casa, a primeira coisa que falei para minha mãe foi que tinha conhecido o homem da minha vida. Contei como foi e corri para colocar o meu celular para carregar porque estava sem bateria. Não via a hora de ligar para ele salvar o meu número. Quando eu abro o telefone, o número dele não ficou salvo. Chorei igual uma criança e não parava de so-luçar. Não sabia o que fazer porque não tinha mais nada dele. Fiquei tão triste, mas tão triste que não con-seguia nem comer. Precisava esperar a produção me ligar para marcar o encontro. Foi uma tortura porque eles não ligavam. O programa passou no sábado e todo mundo da minha cidade ficou sabendo. Contei para to-dos, mas eu não conseguia esconder a tristeza de não ter o número dele. Já tinha desistido e acabei ficando

porque não era justo omitir. Me enchi de coragem e falei que era mãe solteira e tinha uma princesinha de quase 2 anos. Ele foi tão fofo, já quis saber o nome dela. Quando voltávamos a conversar, eu não aguen-tava e falava: “então, eu tenho uma filha”. Até que ele pegou na minha mão e disse: “O preconceito está em você e não em mim. Fica em paz. Acho muito legal você ter uma filha, eu adoro criança”. Escutar aquilo foi um alívio para mim, a conversa foi fluindo e eu aproveitando aquele momento.

Depois que todos os casais já tinham conversado, um grupo famoso entrava e todo mundo dançava. Foi uma surpresa para mim e para ele quando entrou o Jei-to Moleque. Rodrigo olhou para mim e eu para ele e demos muita risada. Fiquei tão feliz, porque nós dois gostávamos e sabíamos dançar. Dançamos como se fosse um show particular. Quando terminou, o Márcio perguntava para cada menino se ele ia chamar a meni-na para sair. Foi então que chegou a nossa vez. Antes de perguntar, ele disse que precisava fazer uma con-sideração: “Olha, pode até não dar certo, mas vocês dois são os únicos que tiveram sintonia dançando”. Foi muito emocionante. Então, Rodrigo perguntou se eu queria sair com ele. É claro que respondi sim e todo mundo bateu palma.

A minha história de amor ainda estava só começan-do. A gravação terminou e foi a maior correria porque todo mundo tinha que voltar para a van para ir para casa. Eu pensei, “mas e agora, é isso? Quando vou ver

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pouco tenso, mas não parava de olhar nos meus olhos. Então eu escutei tudo o que eu mais queria: “Eu gos-tei muito de você, pensei demais em você todos esses dias. Você quer namorar comigo?”. Era o pedido de namoro que tanto esperei, não tive dúvidas e respondi que sim. A gente se beijou, um beijo gostoso e apaixo-nado até a gravação terminar.

Como fomos os primeiros, tivemos que esperar to-dos os outros e continuamos conversando. Foi tudo muito rápido e intenso e eu o convidei para ir no ani-versário da minha filha no fim de semana, em uma fes-tinha em casa. Rodrigo ficou contente com o convite e aceitou na hora. Trocamos muitos beijos. Porém, ain-da tinha aquela insegurança de como ia ser dali pra frente. Quando os casais terminaram de gravar, cada um voltou para o seu carro. Eu logo pensei: “bom, vou dar o presente para ele”. O Rodrigo disse “espera um pouco” e, quando eu virei, ele também estava com um pacote na mão e demos muita risada. Os dois compra-ram presentes. O produtor do programa achou graça e brincou que isso ainda ia dar casamento. E essas pa-lavras acabaram virando realidade. Trocamos os pre-sentes e ele me deu uma blusinha e uma caixa com um piercing. Me assustei e perguntei como ele sabia que eu tinha piercing. “Quando dançamos no Jeito Mole-que, bati a mão na sua barriga e senti”, explicou.

A semana passou rápido e não parávamos de con-versar um só minuto. Então, chegou o aniversário da minha filha. Ele foi na festa e trouxe uma Barbie para

muito doente. Tive febre e fui parar no hospital. Era emocional e não dava para controlar. Tomei até uma benzetacil para tentar melhorar. Até que finalmente a produção me ligou e avisou que a gravação seria no dia seguinte. Eu fiquei sem reação, tinha acabado de tomar uma injeção, mas disse que iria com toda cer-teza. Lembrei que estava chegando o dia dos namo-rados, então tive a ideia de comprar um presente para o meu amor. Se ele me pedisse em namoro lá, ia ficar muito chato eu não dar nada. Pedi dinheiro para minha mãe e comprei uma camisa. Iria deixar no carro e, se não desse certo, traria de volta para casa.

No dia da gravação do encontro dos casais, que aconteceu num parque em Campinas, todos os outros seis casais que também fariam a gravação já estavam lá, menos o Rodrigo. O desespero tomou conta de mim, pensei que ele estava com raiva porque eu não liguei. Foi então que uma mão tocou o meu ombro. Ele estava atrasado e foi um alívio quando meu amor chegou. No parque, recebemos as instruções que terí-amos microfone e não podia demorar muito. As câme-ras ficaram longe e fomos os primeiros. Eu expliquei que o número dele não salvou, contei que fiquei muito doente, mas não falei que estava quase morrendo de paixão. Conversamos bastante até que o produtor fez sinal para ir mais rápido. Senti que o Rodrigo ficou um

2. Benzetacil é um antibiótico da família da penicilina, bastante usado no combate a doenças causadas por alguma bactéria

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falo que o programa foi um canal que Deus encontrou para me juntar com o meu amor. O Rodrigo era todo baladeiro e eu com uma vida oposta, com filha. Se de-pendesse da gente, nunca iríamos nos conhecer. Foi uma emoção sem fim. Nesse período voltamos duas vezes para o programa. A primeira foi num programa especial de ano novo, que iria mostrar casais que de-ram certo. Quem apresentava já era o Rodrigo Faro e nós contamos essa linda história de amor. Ganhamos de presente um show do Jeito Moleque e a produção filmou tudo. Ainda não tinha ficado noiva quando isso aconteceu.

Foi com o noivado que o Caio chamou a gente para voltar para o programa. Eles queriam gravar o pedi-do de casamento e ter um troca de alianças, como se fosse na hora. Eu e Rodrigo concordamos e ficamos felizes em poder compartilhar esse momento. E assim fizemos, fomos até o estúdio, gravamos o pedido de casamento e foi tudo muito emocionante. Depois que já estava com a aliança no dedo, o Rodrigo Faro falou que o programa tinha uma surpresa para o casal. Eu não entendi nada, porque isso não estava no roteiro. Quando olhei para trás apareceu no telão tudo o que tinha sonhado para o meu casamento. Eles deram a cerimônia de presente e eu fiquei em estado de cho-que. Nós não faríamos festa, apenas uma viagem. Mas as coisas mudaram depois do programa. A produção ligou para os meus amigos, minha família para saber o que eu desejava para o casamento e eles contaram. Então, o programa realizou o meu sonho e me deram

ela. A primeira que ela ganhou. Todo mundo em casa o recebeu muito bem e foi muito divertido. Quando aca-bou a comemoração, fui levá-lo até a rodoviária para que ele voltasse para Campinas. Porém, não tinha mais ônibus e Rodrigo não tinha como retornar. Sem pensar duas vezes falei que ele ficaria em casa. Coloquei um colchão na sala e ele logo já se sentiu parte da família. No dia seguinte, Rodrigo até ficou para o almoço. E assim foi, ele em Campinas e eu em Indaiatuba. A gen-te se via de fim de semana e era tudo muito gostoso. Até que chegou o momento de conhecer a família dele. Fiquei morrendo de receio de levar a Larissa e preferi ir sozinha. Chegando lá, fui tão bem recebida e todo mundo perguntava pela minha filha. Me senti queri-da e acolhida. Especialmente pela atenção e o carinho que Rodrigo tinha com a minha princesa. Ele foi como uma pai para ela, ajudou a tirar a chupeta, foi com ela no primeiro dia da escola e eles criaram literalmente um vínculo de pai e filha, que Larissa nunca tinha tido antes. Sempre expliquei para a minha menina que ela tinha um pai de sangue e também tinha o Rodrigo. O papel dele na vida da pequena sempre foi importante.

Namoramos 10 meses, de junho de 2007 até abril de 2008. No dia do aniversário de Rodrigo, ele me pe-diu em casamento. Fiquei noiva de um homem ma-ravilhoso, que assumiu minha filha sem preconceito e me ama muito. Por incrível que pareça, foi alguém que conheci num programa de encontro para casais. Para quem pensava que nunca mais ia se apaixonar, eu estava enganada. O amor bateu com tudo. Até hoje eu

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fora e precisei ficar mais com as meninas. E a vida foi seguindo seu rumo. Hoje o Rodrigo é autônomo e trabalha com um carrinho de espetinho e bebida lá em Hortolândia, eu trabalho em casa para poder ficar mais tempo com as crianças. Faço a administração da em-presa do meu cunhado, montei um escritório na sala e é ótimo porque tenho mais tempo para minhas filhas.

Já se passaram nove anos desde que conheci o amor da minha, sete de casados e agora eu tive mais uma surpresa: estou grávida do meu terceiro filho. Para completar a família, estamos esperando a chegada do Théo que vai nascer na segunda-feira, dia 21 de março de 2016. O Théo não foi planejado, foi um sustinho, mas ficamos felizes em ter um menino em casa.

O destino apronta cada uma que nunca espera-mos. É uma história bonita, mas temos problemas como qualquer outro casal. Somos uma família fe-liz, o Rodrigo é meu parceiro, ajuda a cuidar da casa das crianças. Quando dá, a gente deixa as meninas com o meu cunhado e conseguimos escapar para viajar juntos. É tudo tão gostoso. Nossa família está aumentando e ver tudo o que construímos juntos é muito emocionante. Foi uma época maravilhosa que marcou para sempre a minha vida. Não é todo mun-do que sabe como eu conheci o amor da minha vida, mas eu não canso de contar. Até hoje brinco que a nossa história era para ser.

de presente tudo exatamente do jeito que eu queria. Ganhei a festa no buffet que eu tinha vontade, o vesti-do que eu queria, ganhei o casamento inteiro. Eu não consegui segurar a emoção e chorei muito porque era um sonho se tornando realidade. Lembrei a primeira vez que eu vi o Rodrigo e tinha certeza que me casaria com ele. Agora era realidade.

O casamento aconteceu no dia 30 de janeiro de 2009, exatamente como eu desejava. Foi tudo tão per-feito, a produção até filmou a cerimônia e eu chamei o Caio para ser o padrinho. A festa foi em Indaiatuba, do jeitinho que eu imaginei. Depois, passamos a lua de mel em Natal. Foram 8 dias de amor e paixão. Fica-mos um ano em um casinha de aluguel em Indaiatuba. Depois, surgiu a oportunidade de voltar para Campi-nas, onde eu moro hoje, e conseguimos ter nossa casa própria. Arrumei um emprego e já estava no último ano da faculdade. Eu saía do trabalho e ia direto para a aula, quem buscava minha filha na escola era Rodrigo. Durante todo o namoro e depois com o casamento, ele sempre estava junto, ele é um pai para a Larissa.

Depois de quatro anos de casados, resolvemos au-mentar a família e decidimos ter mais um filho. Eu queria que fosse uma gravidez tranquila, o oposto da minha primeira, e foi exatamente isso que aconteceu. No mesmo dia do aniversário da Larissa, nasceu a Heloisa, em 16 de junho de 2011. Foi um momento de muita emoção e minha vida mudou ainda mais. A rotina não era mais a mesma, eu parei de trabalhar

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Introdução

Quem diria que em plena Guerra Fria surgiria um novo meio de comunicação que revolucionaria o modo de nos comunicarmos? A internet nasceu com a finalidade de manter os norte-americanos informados caso houvesse algum ataque inimigo que destruísse os meios convencionais de telecomunicação. Ela era usada somente para fins militares.

Mais tarde, entre as décadas de 1970 e 1980, começou a ser usada como um meio de comunicação para o meio acadêmico, especialmente nos Estados Unidos, onde alunos e professores universitários trocavam informações, ideias e descobertas através da grande rede.

A internet só começou a ser comercializada no Brasil alguns anos mais tarde, em meados de 1994. Começou a

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Hoje, com o avanço tecnológico, conseguimos nos informar sobre qualquer assunto, realizar pesquisas, comprar qualquer tipo de produto, fazer cursos, e o mais importante: nos comunicarmos com qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo e a qualquer hora. Cartas, telefones e até encon-tros casuais, em alguns casos, se tornam a cada dia mais “coisas do passado”.

Para que ligar para aquele amigo que você não vê há muito tempo se você pode mandar um “WhatsApp”? Quem recebe algo dos correios a não ser alguma encomenda feita pela internet? E quem se dá ao trabalho de ligar para aquele amigo ou parente para parabenizá-lo pelo seu aniversário? E quem lembra? Ainda bem que existe o Facebook que faz isso por nós, não é mesmo?

No contexto em que as pessoas estão cada vez mais ligadas ao mundo virtual e desapegadas do real, o sociólogo Zygmunt Baumam usa o termo liquidez para definir não ape-nas a nova forma de amar, mas também as relações huma-nas como um todo, caraterizando-as pela fluidez e ausência de comprometimento, por laços momentâneos e frágeis.

Em 2004, o sociólogo polonês lançou seu mais famoso li-vro, “Amor Líquido - Sobre a fragilidade dos laços humanos”. Na obra, o autor ressalta que a proximidade virtual presente reduz a compressão que o contato real deveria exercer. Para Bauman, os seres humanos estão sendo ensinados a

ser vendida pela empresa de telecomunicação Embratel. Em 1995 o ministério das telecomunicações, em conjunto com o Ministério da Ciência e Tecnologia, começaram atividades para disponibilizar o acesso à internet para a população brasileira.

Foi a partir desse momento que a internet no Brasil começou a ser utilizada também para a educação, como, por exemplo, com a oferta de cursos virtuais, web conferências sobre temáticas educativas, seminários online, entre outros conteúdos que foram surgindo, como é os sistemas de edu-cação a distância.

Com o advento das novas tecnologias digitais, a geração do século XXI experimenta uma nova forma de se comunicar e relacionar a partir das transformações do consumo midiáti-co. Diante das relações efêmeras da pós-modernidade - fa-laremos sobre o conceito de “liquidez” do sociólogo Zygmunt Baumam logo abaixo - as comunidades virtuais surgem como possibilidade de aproximar desconhecidos ou até mesmo unir aquilo que se distanciou. A carência humana e a necessida-de de do indivíduo de encontrar sua cara metade incentiva o imaginário a buscar formas de pertencimento na vida dos outros. Muitas vezes, os usuários nem se conhecem pessoal-mente, tampouco dividem o mesmo espaço geográfico, mas agregam-se por meio da rede. Expõem sem receio algum dos seus hábitos e a sua imagem na esperança de encontrar um(a) companheiro(a) ou simplesmente uma amizade.

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Imagine se o amor da sua vida estivesse a um clique de distância? O que começou nos anos 1990 e início dos 2000 com as salas de bate-papo em grandes portais, além de comu-nicadores instantâneos como ICQ e MSN, hoje se tornou ainda mais prático com um simples touch na tela do smartphone. O “boom” dos relacionamentos online agora é representado pelos aplicativos. E a variedade de opções é enorme.

O primeiro aplicativo de relacionamento disponível no Brasil, para ser baixado nas versões Android ou IOS, foi o Badoo, em 2011. A rede social serve de meio-de-campo para quem quer conhecer novas pessoas. Em muitos casos, esse “barzinho virtual” para adultos também é visto como uma oportunidade para quem busca sexo casual. O site tem 10 milhões de usuários ativos por mês só no Brasil, onde tem sua maior audiência. Basta baixar o aplicativo em qualquer uma das versões e ele localiza os usuários online próximos a você. Se os gostos forem semelhantes, a combinação é certa e aí é só deixar a conversa rolar.

O Tinder surgiu logo depois, em 2012. Concorrente do Badoo, a ferramenta de paquera promete juntar pessoas que estejam a até 160km de distância uma da outra. Por meio do Facebook e de interesses em comum, o aplicativo mapeia pessoas geograficamente próximas, de acordo com as definições do usuário, e assim apresenta um leque de pessoas disponíveis para um possível “Like”, que significa

não se apegarem a nada, para não se sentirem sozinhos. Isso porque têm medo de sofrer por uma desilusão amorosa e, logo, pensam que, não mantendo uma relação estável e duradoura, evitariam frustrações, trocando de parceiros facilmente. A nossa sociedade não pensa mais na qualidade, mas sim na quantidade. Quanto mais relacionamentos, me-lhor. Assim como ocorre com o consumismo material quando compramos algo que não nos é necessário, também descar-tamos e colocamos pessoas em nossas vidas a todo mo-mento. O contato virtual permite a descontrução do vínculo com apenas um “adeus” ou um contato deletado da agenda telefônica. O descarte, que também caracteriza o conceito de liquidez, está diretamente ligado à sociedade cada vez mais consumista em que vivemos. Se as pessoas compram algo material não por desejo ou necessidade, mas por impulso, isso ocorre também nas relações humanas.

Porém, se por um lado a tecnologia esfria os laços pessoais, por outro ela facilita, e muito, a comunicação e a interação entre indivíduos. Quando falamos em tecnologia digital, logo pensamos na crescente onda dos aplicativos que estão cada vez mais inseridos em nossas vidas, ou melhor dizendo, em nossos smartphones. Os aplicativos de rela-cionamento surgem com o propósito de facilitar encontros casuais, a possibilidade de conhecer pessoas novas e até, quem sabe, engatar um namoro.

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pessoas que cruzaram o caminho do usuário em qualquer momento do dia, seja na rua, no metrô ou em algum bar. Todos os dias, uma lista de pessoas que cruzaram o caminho é atualizada, permitindo aos usuários avaliarem-nas positiva-mente ou negativamente. Se duas pessoas se gostam, um aba lateral é aberta para se iniciar uma conversa.

Esses são alguns dos aplicativos mais famosos para o encontro de casais disponíveis na plataforma digital. A tecno-logia possibilita a todo instante que pessoas distantes entre si possam se conhecer por meio de um simples touch na tela do celular. Algumas histórias estão aqui para mostrar que há credibilidade nas ferramentas e que o amor pode sim estar do outro lado do smartphone, e que, muito provavelmente, se não fosse por essa ferramenta, dificilmente alguns casais teriam se encontrado de alguma outra forma.

uma aprovação, em formato de coração, ou um “Dislike” que se remete a uma reprovação, em formato de X. Quando o like é mútuo, quer dizer que houve o “MATCH” , ou seja, uma combinação de duas pessoas que se gostaram, abrindo uma janela de conversação para o casal se comunicar. O Tinder já atua em 194 países e 1,5 milhão de encontros são marcados toda semana por meio do aplicativo, totalizando 9 bilhões de combinações, o equivalente a 30 milhões por dia. No Brasil, a empresa declara ter 10 milhões de usuários, com 2% de crescimento por dia. O aplicativo é gratuito e pode ser baixa-do nas versões Android e IOS.

O Kickoff, que está disponível desde 2014 para os bra-sileiros, apresenta o mesmo mecanismo do Tinder, porém com diferente propósito. Intitulado de “O aplicativo para quem busca namoro sério”, ele mapeia um número limitado de pessoas através dos amigos em comum. Todos os dias aparecem 10 perfis para o usuário avaliar com um “sim” ou ”não”, abrindo um janela de conversação caso o interesse seja mútuo. O serviço é gratuito e também pode ser baixado nas versões Android e IOS.

Também com a proposta de conhecer pessoas novas, o Happn, mais recente aplicativo, criado em 2015, tem um grande diferencial. Seu mecanismo de busca se dá pela geolocalização do usuário, ao contrário de amigos e interes-ses em comum, como no Tinder e Kickoff. O Happn rastreia

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para o fim do desastre, fiquei com bastante receio de não conseguir um emprego bacana nessa área. Pois bem, iniciei a faculdade em 2006 e me formei em 2010 pela Universidade Anhembi Morumbi. No período en-tre 2011e 2013 eu fiz uma pós-graduação em Terapia Familiar na UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo).Atualmente trabalho como assessora científica na Roche Farmacêutica, desde 2013 - ou seja, acabei fugindo um pouco também até da Enfermagem, atuan-do mais na área de Comunicação.

Sempre fui muito caseira. Um barzinho com os amigos de vez em quando caía bem, balada nem pensar. Gosto de almoçar fora, ver séries... sou mais tranquila. No último ano da faculdade, em 2009, me envolvi com um garoto da minha sala. Era sério, mas não era namoro. Depois de dez meses terminamos. Sem estresse, porém não posso negar a tristeza que tomou conta de mim, afinal ainda existia sentimento da minha parte.

Uma das minhas melhores amigas, também cole-ga de classe, era usuária convicta do Badoo e disse: ”se cadastra, amiga! Pelo menos serve para aumentar o ego!”. Como eu estava bem para baixo mesmo após o término, como toda garota envolvente e carente, fiz o que ela pediu. À tarde, quando cheguei em casa, bai-xei o aplicativo. Minha primeira impressão era de uma coisa muito vazia, não me senti muito bem. Como de costume, fui trabalhar, e, quando voltei para casa, à noite, abro meu e-mail com notificações do aplicativo,

Cecília e Wagner “Sr. Badoo, traz a conta e o amor, por favor”

M eu nome é Cecília, tenho 28 anos e depois de muitas dúvidas sobre qual profissão seguir, decidir fazer Enfer-

magem. Pensei em História, Direito e Moda, que é o que eu realmente gostaria de fazer. Porém, com o atual cenário em que estamos vivendo - me refiro às condi-ções políticas e econômicas do país - e sem previsões

O casal Cecília Fernandes e Wagner Cassiano de Souza Junior(Foto: arquivo pessoal)

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menininha iludida quebrar a cara mais uma vez”. Bom, não preciso nem dizer que já estava louca de vontade de vê-lo pessoalmente, quando, finalmente, quatro dias após completarmos um mês de muita intimidade virtu-al, ele me chamou para sair. Ufa!

Oito de maio, véspera de Dia das Mães. Combi-namos de nos encontrar no Shopping Morumbi. Esta-va insegura, nervosa, com medo de que toda aquela expectativa que havia criado fosse por água abaixo. Cheguei no local de encontro, porém sem meus ócu-los que me faziam enxergar de longe qualquer pessoa ou objeto. Sou míope, com três graus em cada olho. Mandei uma mensagem perguntando onde ele esta-va. ”Atrás de você”. Olhei e não encontrei. A primeira coisa que pensei foi que ele tinha me dado um perdido. Fiquei arrasada por uns dois segundos. Até que avisto um homem fazendo um sinal com a mão querendo di-zer ”oi, estou aqui”. Fiquei aliviada. Fui ao encontro dele e nos abraçamos.

Acho que já tínhamos conversado bastante para ficar de enrolação. Logo rolou o beijo, e depois dis-so, não nos desgrudamos mais. Vinte dias depois ele me pediu em namoro. ”Apenas para oficializar, porque por mim já estou namorando com você des-de o dia em que te vi”. Algumas semanas depois eu já conhecia toda a família dele, e ele a minha. Como estava no último ano da faculdade e traba-lhava meio período, nos víamos no final de semana. Gostávamos de ficar em casa vendo séries, íamos

que me deram mais motivos para eu não querer mais brincar daquilo.

Quando entrei para cancelar, nem 24 horas depois de ter baixado, enquanto o aplicativo atualizava os usuários online, um garoto me chamou a atenção. Dei uma olhadinha, mas sem grandes expectativas. Dei uma chance. Como todo início de conversa de duas pessoas que nunca se viram... ”Oi, tudo bem? Como você está? Onde você mora?”. Primeira coisa em co-mum: moramos no mesmo bairro. Para quem gosta de estar sempre perto, até que era um ponto bastante posi-tivo. Mas avisei. ”Estou deletando o Badoo, se quiser conversar, me adiciona no Orkut.”. É, não estava com tanta paciência e minha preguiça e falta de esperança de encontrar alguém bacana me tornou uma pessoa um pouco fria e desapegada naquele momento.

Então, ele me passou o celular dele e pediu que eu enviasse uma SMS (em inglês, Short Message Service, que em português significa Serviço de Mensagens Cur-tas) para deixar gravado meu número no celular dele. Na hora até comentei com as minhas amigas: que cara carente! Mal nos falamos e já passou o número... Enfim, conversa vai, conversa vem, descobrimos muitas coisas em comum, já estava rolando um romance virtual bem forte, estávamos apaixonados já sem nem termos nos visto ainda. Meu Deus, rápido demais para quem não estava botanto fé nenhuma nisso. Até que, um mês de-pois do primeiro contato, me pego apaixonada por uma pessoa que eu nunca vi na vida. Logo pensei: ”lá vai a

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Naquele momento o que eu queria mesmo era cur-tir e conhecer pessoas, esperava muito mais uma ami-zade do que um relacionamento sério engatado no ou-tro. Até que, em fevereiro conheci um cara no Tinder.Estamos saindo e nos conhecendo melhor. Mas dessa vez quero ir com calma, sem pressa!

A impressão que eu tenho desses aplicativos é que as pessoas os procuram para aumentar a autoestima, para passar o tempo, diminuir a carência. Porém, você pode ter a grande sorte de conhecer o amor da sua vida. Eu não canso de tentar e não irei desistir tão fácil (risos). Por exemplo, dei MATCH no Tinder com um cara que foi noivo por 12 anos e outro que namorou dois anos, e ficou casado por seis. É o perfil de pessoa que entra sem querer nada, porém existe a chance de, muitas vezes sem querer, encontrar alguém especial.

para o cinema quando estreiava algum filme, saía-mos com os amigos...

Como toda mulher apaixonada, nunca penseis que um dia aquele amor todo iria acabar. Mas acontece. Nem tudo é da forma que desejamos que fosse. Às vezes perde a química, o tesão, a paixão... no nosso caso, as perspectivas mudaram. Para mim, não fazia mais sentido estar com uma pessoa acomodada. Após cinco anos e meio juntos, terminamos. Apesar disso foi um término bem tranquilo, amigável, sem estresse ou drama. Como disse, não foi falta de nenhum senti-mento que me fizesse sofrer e chorar rios de lágrimas. Quando eu comecei a faculdade ele estava no sexto semestre. Quando terminei ele estava no quarto.Quase retrocedeu. Em setembro de 2015 eu já estava forma-da há cinco anos, as expectativas de vida começaram a ficar muito distantes. Ele é uma ótima pessoa, porém eu o carregava nas costas. Não havia projeto de futuro por parte dele. A vida dele era ficar comigo.

Apesar de ter terminado bem comigo mesma, após mais de cinco anos com uma pessoa, é difícil ficar so-zinha, ainda mais para mim que sou super carente e adoro uma companhia. Além disso, era difícil conhe-cer gente nova. No meu círculo de amizades, todos namoravam. Foi aí que, uma semana após o término, eu resolvi baixar outros aplicativos. Tinder, Kickoff, Adote um Cara... peguei geral! Chamava a pessoa no chat à tarde e já marcava de sair à noite. Às vezes era difícil até lembrar o nome do cara. (Risos)

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logo depois. A Dani tem 49 anos e se casou aos 16. Durante esse tempo nasceram seus quatro filhos. Antes de conhecer meu marido, o Marco, no auge dos meus 35 anos, já pensei que fosse “ficar para a titia”, como dizem, e não iria sair da casa da minha família. Afinal, morar sozinha era um sonho desde a adolescência.

Mas, como dizem, tudo acontece na hora certa, e, se tiver que ser, será. E foi. E está sendo a melhor e mais emocionante fase da minha vida. Mas bom, se dizem que tem que sair bastante para ter a chance de conhe-cer alguém, para mim não deu muito certo. Sempre fui muito saideira, não parava em casa, além de ter tido a experiência de morar em três cidades diferentes. Tenho muito amigos então saíamos dia sim, dia não. Bar, res-taurante, baladas, viagens... Era de se esperar que eu fosse a primeira a desencalhar, não é mesmo?

Pois bem, conheci um cara num bar quando tinha 27 anos. Namoramos durante sete, porém foi um re-lacionamento que não valeu a pena. Muita briga, de-sentendimentos, vai e volta. Até que, após todo esse tempo juntos, parei de insistir em algo que saberia que não daria certo e dei uma chance para mim mesma de poder conhecer outro alguém. Afinal, nunca fui deses-perada para encontrar meu príncipe encantado e viver felizes para sempre. Preferia sair com meus amigos, me divertir com eles, e o que rolar, rolou. Mas não ia com essa ideia na cabeça, de encontrar um com-panheiro. Tanto que nunca passou pela minha cabeça tentar ferramentas virtuais para conhecer alguém.

Fernanda e Marco Antonio“O Tinder foi meu Santo Antônio”

M eu nome é Fernanda Gomez Luz Bra-ga, sou formada em Administração pela USP e, atualmente, sou diretora

de uma rede de franquias. Sou a caçula da família, com 37 anos. Meu irmão mais velho, de 50 anos, já foi ca-sado três vezes, tem uma filha de 10 anos do segundo casamento e atualmente está solteiro. Minha irmã veio

Fernanda Gomes Luz Braga e Marco Antonio Simonini no nascimento da pequena Antonella,

hoje com 4 meses. (Foto: Arquivo Pessoal)

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chamou a atenção por sua foto. Ele parecia estar em um sítio ou fazenda, em cima de um cavalo. Como eu sou do interior, já me identifiquei com a veia caipira. Deu MATCH e começamos a nos falar. No dia seguin-te já fomos para o WhatsApp e nos falamos por um mês, todos os dias.

Nos encontraríamos antes, mas estava perto do Natal e eu fui para casa dos meus pais, em São José do Rio Preto, passar duas semanas com a minha fa-mília. Quando eu voltei, ele já estava contando os dias para me ver. Foi interessante porque tive a opor-tunidade de conhecer uma pessoa tão bem apenas por trocas de mensagens, e assim fomos descobrindo juntos que tínhamos muitas coisas em comum, as re-ações, formas de pensar, valores, senso de humor... O papo era muito divertido, ficávamos horas conver-sando sem ver o tempo passar, dava saudade de con-versar com ele e isso despertou em mim uma vontade muito grande de conhecê-lo.

Dia 10 de janeiro de 2014. Finalmente o dia tão esperado chegou e pude confirmar que a química não era apenas virtual, mas também presencial. Ele mora-va na Vila Madalena e eu na Vila Olímpia. Ele foi me buscar em casa - a intimidade já era tanta que eu sim-plesmente conseguia confiar numa pessoa que nunca tinha visto na minha vida- e fomos para um bar. Desde então as conversas se tornaram mais frequentes ain-da e torcíamos para a sexta-feira chegar logo para nos vermos. Passávamos todo o final de semana grudados!

Eu era tranquila. Para mim, as coisas acontecem na hora certa, quando menos esperamos. Se fosse para acontecer, seria pelo contato físico, presencial. Porém, algumas pessoas acabam sendo influentes em nossas vidas de certa forma, e acho que hoje eu tenho todos os motivos do mundo para agradecer minha colega de trabalho. Em junho de 2013, a Talita me apresentou o Tinder. Ela achava o máximo saber que vários caras a “desejavam”. E, de certa forma, esse tipo de aplicativo levanta a moral de qualquer um. Na hora fiquei bem receosa. Afinal, não curto ”esses negócios de internet”.

Fazia cinco meses que eu havia terminado, estava de luto, sem vontade de conhecer pessoas novas. Mas de uma coisa minha amiga estava certa: essa brincadei-ra distrai bastante. E era o que eu estava precisando no meu dia a dia, quando chegava em casa do trabalho e não tinha mais uma companhia. No mesmo dia em que minha amiga comentou sobre o aplicativo, cheguei em casa e baixei. Por pura diversão, sem qualquer intenção além de jogar conversa fora e me ocupar com alguma coisa. O tempo foi passando e a dor amenizando, até que comecei a levar a sério o intuito do aplicativo.

Saí com quatro caras que não deram em nada. Ou melhor, deu em amizades. Tão sinceras que saímos juntos hoje em dia - em programa de casais - e man-tenho contato frequentemente. Estava gostando desse negócio e não desisti. Todos os dias conhecia pelo me-nos alguma pessoa e começávamos a conversar. Um cara, dentre tantos que estavam a 15km de mim, me

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Carolina e Natan“Tinder: Match a primeira vista”

M eu nome é Carolina, tenho 25 anos e me formei em jornalismo pela PUC--SP em dezembro de 2015. Escolhi

seguir a carreira televisiva e atualmente trabalho na própria faculdade. Lá eu era produtora, repórter e edi-tora das matérias que iam para o canal universitário. Fazíamos matérias bem diversificadas: eventos, mu-

Carolina Veneroso e Natan Solin aproveitando o final de semana de tranquilidade em um parque em Jundiaí,

cidade onde o estudante de gestão ambiental mora atualmente. (Foto: Arquivo Pessoal)

Em agosto já estávamos morando juntos. Em outubro ficamos noivos. O casamento estava agendado para o dia 30 maio de 2015, porém, para nossa surpresa, dia 26 de fevereiro, descobri que estava esperando nosso primeiro bebê. Como o vestido não iria caber, tivemos que adiantar para o dia 28 de março.

Hoje, minha Antonella tem quatro meses e é a maior alegria de nossas vidas. Jamais imaginaria que eu fosse construir uma família tão maravilhosa e que eu fosse capaz de dar e receber tanto amor como nos últimos três anos, depois de um período em que esta-va completamente cética de que isso fosse capaz de acontecer um dia na minha vida. Encontrar alguém especial, casar, e realizar o sonho da minha vida: ter uma menina.

Ele sempre namorou muito, era lutador de ju-jitsu, e entrou no Tinder para pegar mulher. Afinal, estava com 39 anos e, assim como eu, não acreditava mais que conheceria alguém que o fizesse tornar-se pai.

Hoje em dia eu recomendo essa nova forma de re-lacionamento, que permite você conhecer alguém, que - se estiver na mesma circunstância que a minha - di-ficilmente se conheceria de outra forma. Eu já estava com 35 anos, não pensava mais em sair para poder ter a chance de conhecer alguém, estava em uma fase bem tranquila, caseira, coisa que nunca fui. Mas além da ida-de, meu antigo relacionamento me abalou e consumiu muito, não existia mais prazer em sair para o badalo.

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acaba mudando um pouco, e o pique também é outro. Hoje nos encontramos na mesma sintonia. Como não temos amigos em comum, procuramos marcar progra-mas que nos permitem conhecer as amizades um do ou-tro, o que de certa forma nos aproxima mais.

Como o Natan mora em Jundiaí, eu acabo indo muito para lá. O que mais gostamos de fazer? Viajar! Já fomos para o Sul passar o natal com a família dele. Primeira vez que conheci os pais, um mês depois de estarmos juntos. Foi incrível porque meu sonho era conhecer Balneário Camboriú - SC, e estar com uma pessoa que eu estava completamente envolvida, foi um sonho para mim. Nunca me imaginaria naque-la situação um mês atrás. Sempre que dá, nós vamos para algum lugar que tem trilha e cachoeira. Gostamos muito da natureza, de respirar o verde... Estamos en-gordando muito também! Adoramos experimentar no-vas gastronomias e já virou rotina no relacionamento.

Sempre tive muito preconceito com esse tipo de aplicativo de relacionamentos. Achava um absurdo quem se submetia a isso. Pensava que a pessoa era carente, sozinha... Já havia baixado o aplicativo duas vezes no começo do ano passado, mas desinstalei de-pois de dois dias em ambas as vezes. Enxergava aquilo como um cardápio de pessoas que você escolhe qual foto chamou mais sua atenção, as conversas não flu-íam. Ficavam no “Oi, tudo bem? O que você faz?” e fim. Achava extremamente superficial e acabei apa-gando por preguiça e descrença.

seus em São Paulo, política, cultura... mas a maioria eram debates sobre temas quentes, como maioridade penal, política, copa no Brasil em 2014, preconceitos, trotes nas faculdades etc..

Sempre fui uma pessoa de fases. Caseira, baladei-ra, disposta, preguiçosa... Na época em que baixei o Tinder pela terceira vez, em novembro de 2015, estava numa vibe de balada, ir para festas de faculdade, saía muito com minhas amigas para almoçar, beber, curtir um som. Hoje em dia, namorando, acabo ficando mais em casa com o Natan, o Netflix e uma pipoca. De vez em quando saímos para um bar, para dar uma variada. Passear na Avenida Paulista aos domingos é outro pro-grama que curtimos fazer juntos.

Natan, 20 anos, estudante de gestão ambiental na FA-TEC - Jundiaí, trabalha numa empresa de saneamento e conta como era sua vida antes de conhecer Carolina:

Eu sempre tive uma vida muito ativa, saía muito com os amigos, era muito entretido com o Diretório Acadêmico da faculdade, organizando as festas da Atlé-tica. Além disso, participava ativamente da militância política de esquerda, algo que defendo e valorizo muito em minha vida. Faço parte da UJS, União da Juventude Socialista, e sou presidente do Conselho da Juventude de Jundiaí, que desenvolve políticas públicas voltadas aos jovens. Me formei em gestão ambiental pela FA-TEC - Jundiaí, também em dezembro de 2015. Após os estudos, por deixar de frequentar a faculdade, a rotina

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tão, quando eu vi que ele tinha o mesmo pensamento político que eu - e uma das fotos dele deixava isso bem claro - eu pensei: É ele! Os outros eu olhava apenas para a foto. Só aquilo me chamava a atenção. Com ele foi diferente. Além de apreciar todas as fotos, a descri-ção me encantou ainda mais.

Mais uma vez, Natan dá a sua versão:

Me sentia sozinho. Havia terminado um relaciona-mento de dois anos há pouco tempo, estava distanciado dos amigos, e quis voltar a interagir com eles. Três me-ses depois baixei o Tinder. Foi uma brincadeira de ami-gos. Morávamos em uma república, e numa terça-feira, estávamos todos no sofá da sala, e resolvemos baixar o aplicativo. Era uma forma de nos aproximar e nos diver-tíamos nessa “brincadeira”. Nem pensava em encontrar alguém para me relacionar sério, estava curtindo a vida de recém-solteiro. Obviamente o ego acaba aumentando muito mesmo. Você ficava uma hora sem abrir o aplicati-vo, e do nada, 10 MATCHS! “Olha, até que eu sou boni-to”, pensava.

Mais um dia de zoeira, descartando as que não fa-ziam meu estilo e dando like nas moças queali estavam, uma fez meu olho brilhar. Na primeira foto já me apai-xonei. Era um tipo de foto que você não via no Tinder. Ela estava vestindo uma touca de ursinho de veludo e as mãos escondiam parte do seu rosto. O olhar dela na foto me enlouqueceu. Parecia que eu já conhecia aquela me-nina há anos. Passei para a próxima foto. “Quero namo-

Até que, final do ano passado, estava numa fase de querer curtir a vida, minha autoestima estava mais alta - sempre foi bem baixa - e resolvi baixar o Tinder. Quando dá o MATCH, mexe totalmente com a auto-estima. Amigas também são ótimas influenciadoras algumas vezes. A Natália baixou o aplicativo e estava saindo com dois caras que conheceu lá. Em um feria-do, ela foi viajar com um deles. Achei muito bacana e já estava me imaginando sozinha com um boy na areia da praia, nos amando como num conto de fadas.

Foi aí que eu resolvi baixar de novo. Sou brasilei-ra, não desisto nunca! E afinal, a esperança é a última que morre. E nesse caso, depois do happy end da mi-nha amiga - estão juntos desde setembro do ano pas-sado - esperança foi o que não faltou para mim. Num domingo à noite, sem nada para fazer, abri o Tinder e fui passando o dedo para o lado - nesse movimento de afastar o dedo para a esquerda, o usuário estaria “des-cartando” o candidato. -. Até que uma descrição me chamou a atenção. - No Tinder é possível que a pessoa coloque em seu perfil hashtags (#) com características relacionadas a ela, como por exemplo, estilo de vida, o que gosta de fazer, valores, gostos.

No perfil do usuário dizia que ele era estudante, músico e amante da política. Que foi o que mais me chamou a atenção, pois hoje em dia é muito difícil você encontrar alguém que tenha divergências polí-ticas com você. Ainda mais eu, que estudo na PUC, uma faculdade na qual falamos muito sobre isso. En-

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va um pouco bêbado já e sempre levei tudo numa boa, então aquela situação estava engraçada para mim. Na hora pensei: preciso contar isso para alguém. Não me vinha outra pessoa em mente a não ser ela. Mandei um áudio no WhatsApp contando o que tinha acontecido. Ela achou muito engraçado e devolveu o áudio rindo muito (pela forma como tentava explicar: “carro de per-nas para o ar”). A partir desse momento, o carinho era recíproco e a amizade foi ficando cada vez mais forte.

Carolina:

Não conseguia entender como um carro ficaria de pernas pra cima. Nisso, a Frida, minha cachorra, es-tava deitada na minha cama e ela dorme com a bar-riga e as patas pra cima. Minha irmã estava do meu lado ouvindo os áudios e olhou para a minha cachorra e disse: olha, acho que o carro dele ficou assim. Aí, para descontrair (mais ainda), tirei uma foto da Frida e mandei para ele com a legenda: ó seu carro. Aí ele me devolveu com um áudio rindo horrores e compar-tilhando com o amigo dele. Enfim, voltou outro áudio mais engraçado ainda.

Depois disso trocávamos mensagens todos os dias, dia e noite. Até que uma hora eu surtei. Estávamos nos gostando sem nem nos conhecermos pessoalmen-te e eu ficava pensando o quanto isso era bizarro. Eu sempre critiquei essas pessoas que vivem num rela-cionamento virtual, e de repente eu me vi assim. Não

rar essa menina”. Nunca tinha acontecido isso antes. Foi Tinder à primeira vista. Quando comentei com meu ami-go Jorge, ele perguntou se eu estava carente (risos). Sem dúvida alguma, dei like. E, por minha sorte, MATCH! Mas diferente dos outros, não foi apenas mais um, foi o único que me fez apaixonar. Deu um frio na barriga. Na hora chamei ela no chat.

Mas, Carolina explica que, apesar do interesse mútuo, a conversa não evolui muito por causa de um comportamento do Natan:

Conversa vai, conversa vem, eu resolvi perguntar o que ele gostava de fazer. A resposta foi: beber. Tudo na minha vida está relacionado à bebida. Broxei de um jeito...namorado que bebe já deu pra mim! Me distan-ciei e parei de dar atenção.

Natan continua:

Várias vezes, depois disso, tentava conversar com ela, mas nada de ela me responder. Ficava me pergun-tando o que poderia ter acontecido, onde eu tinha erra-do. Até que um dia fui para a casa de um amigo meu, beber. Essa ainda era minha vida naquele momento. Sair para beber com os amigos. A casa dele ficava em uma ”ladeirona” e eu estava de carro. Na hora de estacionar, bati e ele ficou meio que “de perninhas para o ar”. Esta-

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Quando nos vimos, nos abraçamos muito forte, pare-cia que já nos conhecíamos há anos. Fomos conversan-do durante todo o passeio, vendo coisas interessantes, conhecendo as exposições. No meio do caminho, um se-nhor muito humilde escrevia mensagens de amor em co-rações de papel. Nisso, o Natan leu uma das frases e dis-se que era a minha cara. Ele comprou e me deu. “Limpe seu coraçãozinho e respire o vento que há”. Tinha tudo a ver com o que a gente tinha conversado, sobre os dois gostarem da beleza da natureza. Cansados de caminhar, sentamos. Mais conversas e mais sorrisos. Fazia muito frio aquele dia e nenhum dos dois estávamos com ca-saco. Mas não saíamos de lá, não nos desgrudávamos. Depois de muito papo, ele me deu um beijo. “Até o beijo é bom”, ele disse. Mais algumas horas juntos e depois cada um para sua casa. Isso foi num domingo. Quarta--feira ele já voltou para São Paulo para me ver.

Natan:

No próximo fim de semana que iria para o IN-TERFATEC (Jogos Universitários) e não conseguiria esperar mais de uma semana para vê-la novamente. Por isso voltei no meio da semana, dormi na casa dela, e voltei para Jundiaí às 5 horas da manhã de quinta-feira. Quando fui para os jogos, não tive von-tade de ficar com ninguém, só pensava nela. Estava numa vibe totalmente diferente de todos que estavam lá (afinal, é um evento bem atrativo). Beber, passar

conseguia aceitar. Finalmente, era um domingo, e ele disse que estava disposto a ir para São Paulo me ver e sugeriu que fôssemos a uma feira que estava tendo no Parque da Água Branca. Nos encontramos no metrô da Barra Funda e fomos juntos até o local da feira.

Natan:

Na verdade eu já tinha visto ela uma vez em uma entrevista que ela deu na Record, para o programa Do-mingo Espetacular. Ela pediu para eu assistir, que seria minha chance de conhecer ela. Liguei a TV meia hora antes e fiquei esperando. Era uma entrevista sobre pes-soas que postam muito em rede social. Não sei mais detalhes porque estava vidrado nos olhos dela. “Você é de verdade! E mais linda ainda na TV”.

O que marcou muito para mim, foi que eu chamei ela para ir comigo em uma feira da MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), e ela aceitou. Que menina aceita ir em uma feira da MST?! A ex-pectativa era enorme. E junto, o medo de dar errado. Porém, deu mais do que certo. No dia em que nos en-contramos pessoalmente só confirmou o que pensei quando vi a foto: É ela mesmo!

Carolina:

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Natan:

No próximo final de semana, adivinha? Ela foi lá em casa de novo. Estávamos na cama. Era para es-tarmos em um Sarau em que meus amigos estavam, mas ninguém queria sair de lá. Eu morria de vontade de dizer que amava ela, mas sempre segurava porque não queria falar uma coisa tão séria em tão pouco tempo. Apenas um mês... mas não deu, estava trans-bordando amor já. Oficializei o pedido de namoro, olhei fundo nos olhos dela e disse que amava. Era a maior certeza que eu tinha naquele momento. E até hoje. Já eram quatro horas da manhã. Perdemos o Sa-rau, mas fizemos um de nosso programas preferidos: sair para comer.

Vejo que hoje as pessoas se conectam num mundo deles, muito fechado, ficam apenas naquele mesmo núcleo de amizade, o que impede sua expansão. Tem tantas pessoas interessantes no mundo, com histórias diferentes, e esses aplicativos de relacionamento são uma ótima ferramenta e abrem esse leque, para você conhecer alguém que você jamais encontraria de ou-tra forma. Me atrai muito saber a história de vida das pessoas, o que elas têm para contar e oferecer. E mesmo que não seja para virar namoro, que vire uma simples amizade.

mal e pegar todas. Na hora pensei: estou gostando mais dela do que eu imaginava. Como eu já havia planejado antes mesmo de conhecer ela, uma semana depois dos jogos eu mudei de casa. Chamei ela para passar o fim de semana comigo lá. Foi tudo lindo e maravilhoso, mais uma vez.

Carolina:

Já que não nos desgrudávamos mais, lá ia eu de novo passar o fim de semana com ele. Quando eu entro no quarto, a cama que uma semana atrás era de solteiro, agora é de casal (risos). Essas atitudes contavam muito para mim porque mostravam que ele realmente estava interessado em ter algo sério comigo. Nós até adotamos um cachorro! Ele estava procurando uma companhia para ele durante a se-mana e uma amiga minha estava doando os filhotes da cachorra dela. Foi aí que eu comentei com ele, mostrei a foto do Chico e ele simplesmente se apai-xonou. Foi muito legal esse dia porque passamos no pet shop logo depois, compramos ração, cama, brin-quedinhos... programa de casal feliz (risos). Postei uma foto no Facebook, nós três. Choveram comentá-rios de amigos meus e dele, indignados com o quão séria jáa estava nossa relação. “Já adotaram até ca-chorro?! Isso já é casamento...”

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Direito ou Engenharia. Eu disse que me interessava por Direito ou Medicina, porém, teria que ir embora para a capital, Campo Grande, porque na minha ci-dade não tinha escolas preparadas para um vestibular tão concorrido. No fundo, era apenas uma desculpa. Nunca pensei em fazer nada daquilo.

A realidade é que eu estava passando por uns pro-blemas na escola e não queria mais ficar naquela cida-de onde todo mundo se conhecia e era muito pequena. Eles aceitaram a ideia e me matricularam num colégio da capital que era focado para estudantes que gosta-riam de seguir a carreira mais concorrida. A rotina era bem puxada. Desde então, eu passei a morar com a minha avó e visitava meus pais casualmente.

Após dois anos com uma rotina extremamente exaustiva – afinal, a exigência do colégio era compatí-vel com a dificuldade de enfrentar um vestibular para Medicina -, finalmente terminei o Ensino Médio. No final de 2011, prestei vestibular na UFMS (Universi-dade Federal do Mato Grosso do Sul) para Direito, e em 2012 eu entrei na faculdade.

Fiz um ano do curso e em 2013 abandonei tudo. Para ser sincera, me surpreendi por ter aguentado esse um ano completo. Desde então, não fiz nada da minha vida a não ser ficar na frente do computador. No início de 2014 meus pais me deram um ultima-to: “se você não for fazer nada, terá que voltar pra casa, para Corumbá”. Como era a última coisa que

Marcele, Theo e Renato

“dois é bom, três é demais”

E u sou de Corumbá, interior do Mato Grosso do Sul, tenho um irmão de seis anos, o Marcelo, e uma irmã de nove, a

Mariana. Em 2009, eu me mudei para Campo Grande, a cerca de 600km da minha cidade natal para estudar em uma escola melhor. Sempre existiu uma pressão por parte dos meus pais para que eu fizesse Medicina,

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bre séries e filmes que gosto de assisitir, entre outras coisas. No Twitter, a maioria das pessoas que seguia eu nem conhecia, muito menos tinha alguma intimi-dade. Dava “follow” apenas pelo fato de que nossos pensamentos e ideias eram parecidos. Foi dessa forma que eu conheci meu primeiro namorado, o Theo.

Eu o segui por que eu achava divertidas as coisas que ele postava. Ele era da minha cidade, porém, num primeiro momento, nenhum de nós sabia da coinci-dência, porque no perfil dele não dizia, e nem no meu. Ao invés do nome da cidade, ele colocou um nome fic-tício de um lugar de jogo. Sabe quando você pega um livro e o personagem principal mora em uma cidade imaginária? Estava assim no perfil dele. (Risos)

Na foto ele era um Pokémon, o Squirtle. Não de-morou muito tempo, uns três dias depois ele me seguiu de volta. Naquela época, era muito comum as pessoas te seguirem de volta. Logo, para mim não significou muita coisa. Vida que segue.

No Twitter, o usuário pode expresssar suas ideias em 140 caracteres. Apesar de o espaço ser relativa-mente pequeno, eu já pude ter uma ideia de quem ele era e como ele pensava. Isso fez eu ter uma conexão com o Theo e segui-lo. Deu muito certo porque a gen-te pensava de forma parecida.

Ele tinha o costume de twittar piadas, e eu, de sem-pre comentar alguma coisa para acabar puxando as-sunto. Foi numa quarta-feira, final de tarde, quando o

gostaria que acontecesse, logo pensei em um rumo para minha vida.

Me mudei para São Paulo em agosto de 2014. Pres-tei vestibular para Design Gráfico na faculdade Belas Artes, na Vila Mariana, Zona Sul da cidade, passei e me mudei já no mesmo mês . Fiz o primeiro semes-tre e voltei para a casa dos meus pais, em Corumbá. Não consegui me adaptar, era muito difícil e triste para mim morar sozinha em uma cidade que pouco conhe-cia, e, a princípio, sem amizades. Tranquei a matrícu-la, fiquei seis meses na minha cidade e resolvi voltar para São Paulo para tentar recomeçar minha vida de estudante. Retornei em janeiro de 2015, recomeçei do zero e atualmente estou no terceiro semestre.

Nunca gostei de sair muito, arrumava qualquer desculpa para não sair de casa. Não fazia quase nada na rua. Sou introvertida e um pouco tímida, e isso fez com que eu acabasse conversando e interagindo com as pessoas muito mais pela internet do que ao vivo. Não é à toa que hoje em dia tenho muitas amizades virtuais que construí nesses tempos de internet. Jogos Online, Twitter e até Orkut já me aproximaram de pes-soas que hoje eu não troco por nada. O contato virtual passou para o real e tenho amigos até hoje.

A rede social que mais usava era o Twitter. Passava horas do meu dia postando sobre assuntos aleatórios - de preferência questões da atualidade que estão sendo repercutidas - expressando opiniões, comentando so-

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se envolver e ocupar seu tempo jogando ou postando nas redes sociais. Ficamos juntos por quatro anos. Na época eu tinha 14 anos e ele 15. Nos finais de semana nós gostávamos de ir em casa de amigos, ver filme na casa dele, deitar na grama da praça e ficar abraçados ouvindo música... durante a semana nós estudávamos. Era do colégio para casa. Estava no primeiro ano do Ensino Médio, e ele, no segundo.

Como tudo tem um porém, e nem tudo acaba em final feliz, terminamos. Eu era muito nova, era meu primeiro relacionamento sério e apesar de gostar mui-to dele, para mim já estava desgastado. Mas o estopim dessa história toda foi quando descobri que ele me traiu. Tentamos reatar, porém o fato de eu não conse-guir mais confiar nele sempre fazia a gente brigar e a relação ia desgastando ainda mais. Eu gostava muito dele, era aquele amor de adolescente que você pensa que o primeiro e o último e que nunca irá encontrar al-guém igual. Apesar de todas as crises, fui muito feliz, me descobri e cresci ao lado dele.

Ao longo do meu namoro com o Theo, ele me apre-sentou ao mundo dos jogos virtuais. Ele era viciado e um dia eu tive vontade de participar dessa brincadei-ra também. Nós jogávamos um RPG online chamado World of Warcraft, que é um jogo de representação, no qual os jogadores assumem papéis de um personagens e criam narrativas coloborativamente. São jogos mais sociais do que competitivos.

prefeito de Campo Grande anunciou uma ação - que não vou me lembrar agora - que desaprovei totalmen-te. Sem pensar duas vezes, fui desabafar no Twitter sobre o ocorrido. Quando ele viu, me chamou no di-rect messeger (DM), que é o chat privado do Twitter, perguntando se eu morava em Campo Grande. Res-pondi que sim e então ele disse que também morava lá, inclusive num bairro que era próximo ao meu. Com isso a conversa fluiu e continuamos conversando por DM mesmo. Antes de descobrir que ele morava em Campo Grande, não havia despertado nenhum inte-resse por ele, porque eu nunca imaginei que ele fosse solteiro e morasse na mesma cidade que eu.

Uma semana antes do seu aniversário, ele disse que iria fazer uma festa de aniversário e me convidou. E eu fui. Conversamos por uns quatro dias até eu conhecê--lo ao vivo. Na festa, conheci também os amigos dele, que por sorte já me cativaram logo de cara. Todos me trataram super bem e pude conhecer pessoas que até hoje tenho contato. Depois desse dia trocamos número de telefone e nos falávamos diariamente. Saímos mais algumas vezes, e, até que enfim, um mês depois de termos nos visto pela primeira vez, rolou o primeiro beijo. Química perfeita! Não nos desgrudamos desde então. No outro mês já estávamos namorando.

O Theo era filho único e uma pessoa bastante intro-vertida. Os pais dele sempre foram muito proterores, então ele sempre foi um menino extremamente mima-do e vigiado. Por isso e outros motivos, ele prefere

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me aproximar mais dele. Dava vontade de jogar o dia inteiro como uma desculpa para ir falar com ele (risos).

Acabou que ficamos amigos e os assuntos já co-meçaram a se diversificar, não era mais apenas sobre jogos. Conversamos por uns sete meses e nesse tempo eu já estava falando pro meu ex-namorado, Theo, que eu ia me mudar de cidade e que não ia dar certo por causa da distância.

Falei isso mais para dar uma desculpa, porque na verdade já estava exausta por conta de todo o estresse que estávamos passando. Se ele já traiu minha con-fiança a apenas alguns quilometros de mim, imagina como minha cabeça ficaria morando em outro estado, sem saber realmente onde ele está e o que está fazen-do? Eu enlouqueceria, não seria nada saudável. Não tinha mais como dar certo. Apesar de tudo, faltava co-ragem para colocar de fato um ponto final num rela-cionamento de quatro anos.

Já estava me acostumando com a ideia de me mu-dar para São Paulo, para uma cidade relativamente nova para mim em que não conhecia ninguém, quan-do comentei com o Renato que viria prestar vestibular em São Paulo. Nisso ele pediu para eu avisar quando chegasse que ele gostaria de me conhecer pessoalmen-te assim que a prova acabasse. Bem, foi exatamente assim que aconteceu.

Na minha cabeça estava planejando terminar de vez com o Theo assim que me mudasse para São Pau-

E foi aí que eu conheci o meu segundo namorado, o Renato.Conheci ele quando ainda estava namorando o Theo e foi totalmente inesperado.

Pra realizar as missões no jogo você precisa estar em um grupo grande. As missões que eu gostava de fazer, no caso, eram RAIDS - o jogador deveria matar vários monstros - precisavam de 10 ou 25 pessoas. Eu fazia parte de uma RAID, que se chamava Toca do Goblin, e que tinha 25 pessoas.

Todo grupo possui um líder para comandar e certifi-car-se de que as funções de cada um estão sendo reali-zadas de forma correta. Nesse grupo em que eu estava, o Renato fazia esse papel. Logo, ele acabava tendo con-tato com todos os outros jogadores que estão no grupo.

No começo só conversávamos sobre o jogo. Coisas do tipo, “Olha, hoje nessa luta eu preciso que você faça isso...”. Um dia, ele resolveu experimentar um jogo de cartas que se chamava Heart Stone. Eu já joga-va havia bastante tempo e perguntei se ele queria que eu explicasse como funcionava, porque ele estava su-per perdido, não sabia por onde começar. Obviamente ele aceitou e eu adicionei ele no Skype para conseguir explicar enquanto estávamos com a outra tela do com-putador aberta no jogo. Nunca por vídeo, apenas áu-dio. Depois de ele estar craque no jogo, continuamos conversando sobre jogos em geral.

Ele tem o jeito bem parecido com o meu e pensa-mos muito igual. Isso me cativou e comecei a de fato

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Quando ainda estava na minha cidade, procuran-do em sites e rede sociais algum lugar para morar em São Paulo, encontrei uma pensão com um quarto com um preço bom e já fechei o negócio. Foi com-plicado porque o que eu queria mesmo era dividir apartamento com outras meninas, até para ter com-panhias. Porém nenhuma estava querendo “me acei-tar”, pois gostariam de me conhecer pessoalmente antes, porém não era possível eu ir para São Paulo antes de as aulas começarem para resolver isso, até porque foi tudo muito rápido e acabou mesmo fican-do de última hora.

Quando cheguei na cidade e vi o lugar em que eu ficaria, me assustei. A localização era horrível, a re-gião parecia ser bastante perigosa, sem iluminação, rua pouquíssimo movimentada e escondida. Fiquei desesperada! Não queria ficar mais nem um minuto lá dentro. A primeira coisa que veio na minha cabeça foi falar com o Renato e pedir ajuda. Como ele morava sozinho, perguntei se eu poderia ficar na casa dele por 1 mês enquanto eu tentava encontrar outro lugar para ficar. Esse 1 mês acabou virando quatro meses, porque eu não encontrava nada. (Risos)

No início do ano passado, eu voltei para São Paulo e recomecei a faculdade do zero. As aulas começaram em fevereiro de 2015. Dessa vez, finalmente encon-trei um lugar bom para ficar. Apesar de morar pratica-mente no porão da casa e meu quarto ser super peque-no, apertado e a janela ser literalmente um quadrado

lo. Acontece que, quando vim para cá prestar vestibu-lar, eu fiquei uma semana hospedada na casa da minha prima - e me encontrando com o Renato todos os dias - e voltei para o Mato Grosso. Logo, eu e o Theo conti-nuamos nos encontrando normalmente. Mas confesso que minha cabeça já estava em outra pessoa.

Com tudo isso acontecendo na minha vida, fiquei confusa. A única certeza que eu tinha era que não que-ria mais levar para frente meu namoro com o Theo.

Bom, após os sete dias em São Paulo ao lado de uma pessoa que eu adorei conhecer, voltei para Campo Grande. Nisso o Theo já me esperava para sair, disse que estava com saudades e precisava me ver. Sincera-mente eu não estava nem um pouco afim, zero vontade e tesão de estar junto. Porém, eu fui.

No dia seguinte terminei com ele. Falei que não estava dando mais certo, o sentimento não era mais o mesmo e precisava de um tempo sozinha. Ok, qua-se tudo era verdade. Enfim, surpreendentemente ele compreendeu e colocamos o ponto final. Cada um para o seu canto.

Eu entrei na Belas Artes no segundo semestre de 2014, só que eu tive vários problemas de adap-tação, de não saber lidar com a cidade e de morar sozinha, então eu tranquei a faculdade e acabei vol-tando para o Mato Grosso do Sul. Nesse tempo em que morei em São Paulo, eu morei a maior parte do tempo com o Renato.

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Tinder, por exemplo, para mim, tem o foco principal na aparência da pessoa. Você pode não gostar do rosto da pessoa e simplesmente passar o dedo para o lado e dispensá-la. Ela pode ter ideias, valores, e uma histó-ria de vida incrível por trás da estética, mas tem gente que não dá muito valor a isso.

10x10, o pessoal que vivia comigo era muito bacana e acabei ficando por lá.

Claro que o conforto de uma cama de casal, a co-mida e a companhia de uma pessoa que estava me fazendo tão bem seria melhor que aquilo, porém era folga demais da minha parte continuar morando com alguém que conheci recentemente.

Nunca imaginei que sairia namorando de um jogo. Embora eu conheça alguns casais que se formaram lá. O World of Warcraft, que é o jogo que eu jogava, de-manda muito tempo do seu dia para conseguir cumprir as missões do jogo. E é uma coisa viciante. É muito dificil alguém jogar menos do que cinco horas por dia. E, como eu disse, pra organizar as funções, os jogado-res precisam estar em um grupo, e isso acaba criando proximidade entre eles.

E eu acho que esse ambiente força as pessoas a conviverem juntas e conversarem e isso faz com que muitas pessoas que pensem parecido ou passem por coisas parecidas se encontrem e acabem criando ami-zades. Eu criei muitas amizades legais lá dentro que eu tenho até hoje. Eu conheci esses dias um [garoto], que é do Rio de Janeiro e veio visitar São Paulo. E eu acho que esse universo digital me forçou de certa forma a manter um diálogo com as pessoas, porque sou muito tímida. E conhecê-las a partir de uma tela de computador me permitiu saber como ela é por dentro, qual a sua história, seu interior antes do exterior. O

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Sou formada em jornalismo pela Universidade Es-tácio de Sá e trabalho com marketing digital. Esse meu contato diário com a internet me deixou exposta a novos canais muito antes da maioria das pessoas. Já tive algu-mas experiências de relacionamento online e alguns até vieram para fora do computador. Em 2006, usava o site de namoro chamado “Par Perfeito” para tentar conhecer alguém especial. Lá conheci duas pessoas e com uma delas até tive um namorico de 3 a 4 meses, mas não deu em nada, ainda não era ele.

Também me relacionava com amigos de amigos. Tinha uma turma muito grande e acabava conhecendo novas pessoas. Nunca fui de balada, ia bastante a bares e happy hours depois do trabalho. Meu último relacio-namento, antes do Ricardo, foi bem complicado e sofri bastante. Ficávamos meses sem nos falar e depois ele aparecia e a carência falava mais alto. Não aguentava mais a situação que estava e cortei a relação. Deletei meu ex das redes sociais e comecei uma nova etapa na minha vida. Prometendo não procurar por um novo amor.

O ano de 2009 estava terminando e fiz uma viagem para Búzios, no Rio de Janeiro, durante o ano novo. Quando deu meia noite, 2010 começava e minha vida mudaria por completo. Mal sabia que, nesse mesmo dia e nessa mesma cidade, Ricardo também estaria passando o ano novo. Na época eu tinha 33 anos, estava mais ma-dura, sabia o que eu realmente queira e o que não queria. Uma de minhas certezas era que eu não estava procuran-do por um namorado, e o destino, ou melhor a internet, acabou me levando para outro caminho.

“Tchau ano velho, feliz amor novo”

M eu nome é Fernanda Raquel de Oliveira Rodrigues e a internet foi responsável por me apresentar ao meu marido, Ricardo

Lombardi. Antes de essa história começar, preciso voltar no tempo, na época em que era mais jovem. Sempre tive relacionamentos longos e que me machucaram, demorou bastante para encontrar alguém que me completasse.

Fernanda Rachel e Ricardo

O casal Fernanda Rachel de Oliveira Rodrigues e Ricardo

Lombardi (Foto: arquivo pessoal)

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todo empolgado falando que nesse exato momento esta-va na Paulista. No fim do dia, ele me enviou outra men-sagem e disse que havia deixado um bilhetinho atrás de um CD, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional. Me senti uma adolescente, alguém tinha deixado um recado escondido dentro de uma livraria para mim. Fiquei an-siosa e até fui mais cedo achar o tal bilhete. No começo, fiquei um pouco com vergonha e com medo de as pes-soas me verem procurando por um recadinho amoroso. Encontrei o bilhete que dizia: “Passei por aqui para dei-xar um beijo para você”.

Fiquei toda encantada e disse para a minha amiga que precisava conhecer esse Ricardo. Ficamos dois meses só por mensagem, já estava na hora de vê-lo pessoalmente. Cheguei em casa, agradeci o bilhete e disse que queria conhecê-lo. Tinha um pouco de medo e queria marcar um café e levar minha amiga junto, mas ele disse para ser algo mais reservado.

No dia seguinte ele me chamou para jantar no Made-laine, na Vila Madalena. Era domingo de Páscoa e, quan-do cheguei lá, o Ricardo estava me esperando com um ovinho de brigadeiro. O nosso primeiro encontro presen-cial foi tão gostoso e parecia que já nos conhecíamos de longa data. Não ficamos, só conversamos e foi muito legal. Ainda saímos mais três vezes só para conversar. Até que combinamos de nos encontrar no dia 13 de abril, que era o Dia do Beijo. Era a quarta vez que íamos sair e recebi um e-mail com um cupom escrito “vale beijo”, que eu deveria imprimir para ganhar um beijo. Imprimi o papelzinho e quando cheguei no encontro logo de cara

Tudo começou pelo Twitter, eu seguia o jornalis-ta Gabriel Priolli, que hoje considero o meu padrinho de casamento. A rede social tinha a prática do Follow Friday, em que toda sexta-feira mostrava cinco pessoas que você segue para outros usuários. Numa sexta-feira qualquer, o Gabriel deu Follow Friday em cinco amigos, inclusive em mim e no Ricardo, que também é jornalista.

O Ricardo viu e entrou no meu perfil e acabou pedin-do para me seguir, afinal minha conta era fechada. Aca-bei aceitando, sem nunca imaginar que esse convite seria muito mais que uma simples solicitação do Twitter. Vi que tínhamos muitas coisas em comum. Eu e ele traba-lhávamos com internet, erámos jornalistas, escrevíamos em blog e tínhamos gostos bem parecidos. Começamos a conversar por direct message e não conseguíamos pa-rar de nos falar.

A conversa foi ficando mais íntima e contávamos so-bre o nosso dia-a-dia. Detalhes do cotidiano eram o prin-cipal assunto e, além do Twitter, o messenger do MSN também foi uma ferramenta para a gente conversar du-rante o dia. Ficamos assim, dois meses só falando por mensagem, todos os dias. Trocamos também celular para conversar por SMS e aos poucos fomos nos envolvendo um com o outro. Só nos vimos por fotografia, nada além disso. Nem mesmo a voz dele eu sabia como era.

As coisas começaram a mudar quando uma amiga minha que morava em Nova Iorque veio me visitar. Eu e ela íamos ao cinema no Conjunto Nacional da Paulista. Era um sábado e como de costume contei para o Ricardo o que eu iria fazer à noite. Ele respondeu a mensagem

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e aconteceu porque era para acontecer. Hoje em dia os aplicativos de paquera são complicados, as coisas não são tão simples como antes. O Tinder, por exemplo, traz a sensação de que as pessoas estão virando mercadoria. Diferente de uma página com as informações da pessoa, que já tem um filtro, esse aplicativo é muito superficial. Não condeno quem usa, mas a sua velocidade é muito rápida e parece que os pretendentes estão em uma vi-trine. Acho que as pessoas precisam se valorizar mais. No meu caso foi diferente, teve algo além. A internet é indispensável, porém, não podemos esquecer que somos de carne e osso.

já o beijei. Meu coração explodiu e tive certeza de que era o homem da minha vida. Depois desse beijo, a gente não se separou mais.

Foi tudo tão rápido que quando vi já estava namoran-do. No aniversário dele, em julho, viajamos para Buenos Aires e cada vez mais íamos curtindo a companhia um do outro. Em outubro de 2010, com seis meses de namo-ro, decidimos morar juntos e no final do ano ele se mu-dou para a minha casa. Nesse período a mãe do Ricardo faleceu, então as coisas aconteceram de um jeito bem turbulento. Um mês antes de ele vir para minha casa, eu fui pedida em casamento. Marcamos a data para abril, quando faríamos um ano de namoro.

Até hoje eu não sei como tudo isso deu certo, mas acho que os dois estavam prontos. Não era mais a fase da balada e queríamos uma companhia. Alguém que tivesse química, mas também que fosse companheiro. Nós dois fazemos terapia, então conhecíamos nós mesmos e isso ajudou bastante.

Agora, tenho uma filha, Malu, de dois anos, e ela é mi-nha prioridade de vida. Eu e o Ricardo cuidamos dela com todo o amor do mundo. Tenho um estilo de vida alternati-vo, gosto de levar minha filha na pracinha, ir ao Sesc ver peças de teatro e não quero que ela fique viciada com a in-ternet. Não deixamos que ela tenha acesso a smartphones e tabletes porque a Malu ainda é uma criança e eu quero que ela aproveite a infância fazendo coisas de criança.

Foi pela internet que eu consegui achar alguém para ficar ao meu lado. O Twitter foi um caminho inesperado

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Com a produção e conclusão do projeto de livro reporta-gem, pretendemos disponibilizar uma versão digital para que um maior número de pessoas tenha acesso e possa se inspi-rar e se sensibilizar com diferentes histórias de vida contadas segundo a perspectiva narrativa dos próprios personagens. Esperamos também ter contribuído com uma linguagem inova-dora e com a realização de um produto inédito com a proposta de abordar as referentes mídias, analisando e demonstrando o papel e a influência que as mídias de massa exerceram e exercem sobre a sociedade, especificamente na constituição de novas histórias de amor.

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Com o “Amor nos tempos de mídia”, concluímos o curso de Jornalismo e colocamos em prática, de maneira experimen-tal, o exercício da profissão, especialmente no que se refere ao processo de apuração de pesquisas e fontes, trabalho de reportagem e técnicas de entrevista. O encontro e a conversa ao vivo nos permitiram observar detalhes do comportamento das personagens, bem como perceber as nuances dos senti-mentos e das emoções provocados pela midiatização.

O projeto, além de nos oferecer conhecimento profissio-nal da prática jornalística, nos proporcionou discernimento e compreensão da História da Mídia, desde o surgimento dos primeiros meios de comunicação — escrita e o letramento mediado — até o sistema mais inovador de redes interligadas.

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