américa latina eleicoes e governabilidade democratica

Upload: henry-pease

Post on 05-Apr-2018

219 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    1/12

    E d i t o r a

    d a U n i v e r s i d a d e

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    2/12

    d o s a u to re s- Ndc leo de Pesquisa e Documentacfio da PolfticaRio-Grandense e Polftica Comparada n o C o ne Suida America Latina (Nupergs-Consul)- Programa de Pds-Graduacllc em Cmncia Polldca - IFCHIUFRGSAv. Bento Goncalves, 9. 500- Campus do Vale91500- Porto Al egre, RS - Br asil

    Direitos reservados desta edil,;ao:Unlversidade Federal do Rio Grande do Sui

    Capat Carla LuzzattoEditoracllo; Geraldo F. HuffRevis1io: Marli de Jesus Rodrigues dos Santos,Ana ja ra Carbone ll C loss e Mar ia da Graca S to rt i F6resMontagem: Rubens Renate Abreu

    D lv ul gn cf io; J ur an di r S oa re s .Adrninistracfio; Antonio A. Dallazen

    A512 A m er ic a L at in a : e le i .. ii es e g ov er nn bi li da de d em o cr dt ic aI o rg an iz ad o p orH61gioTrindade, - Por to Alegre: Ed . da Unive rs idadelUFRGS, 1991.

    1 . P ol ft ic a - D cm o cr ac ia - E le il ,; oe s - A m er ic a L at in a. 2 . D em o cr ac ia -P ol ft ic a - E le i! tO es - A me ri ca L at in a. 3 . P ol fti ca -Eleicdes - D er no cr ac ia - America

    Latina. 4. America L at in a - E lc i! tO es -Polftica - Democracia, I. Trindade, Helgio,org, U. Tftulo.

    CD U 321.7:324(7/8=4/6)324:321.7(718=416)

    Catalogal ,;50 na pub li cacl lo (CIP) Zaida Mar ia Moraes Prcusslcr CRElO/203

    ISBN 85-7025-227-7

    SumarioIntroducao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . " , , " " 11 . 7

    Eleicdes presidenciais de 89 no Cone SuIe desafios da construcao dernocratica

    Helgio Trindade . 9

    Governabilidade e consolidacao dernocratica:sugest6es para a discus sao do caso chileno

    Angel Flisfisch 23

    Padr6es de governabilidade na transicao

    a democracia na ArgentinaMario R. dos Santos 46

    Governabilidade, partidos polfticos e reforrna polfticana restauracfio dernocratica do Uruguai

    Juan Rial " ,.. 61

    o Peru na decada de 80: construira democracia a partir da precariedade

    Henry Pease Garcfa 85

    Mexico: reforrna polftica e realinhamento partidarioCarlos Martinez Assad 102

    Transicfio polftica e crise de governabilidade no BrasilBenfcio Viero Schmidt ".." ,. ,,, 114

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    3/12

    LAU, Richard R & SEARS, David O. (ed), Political cognition. Hil lsda le , NJ/London , La~wrence Erb lbaum Ass , Pub li sher s, 1986.

    MAQUIAVELO, Nicolas; Obras, Buenos Aires , AmericaJee.1943 . 2 . v.MEZZERRA. Jaime . Notas sabre la segrncn tacion del mercado Iaboral u rbane, Documentos

    de Trabajo de PREALCIOrr, San ti ago, n . 289 , 1987.MOSCA, Gaetano. La classe polkica, R om a/ Bar i, L at er za , 1 97 5. ( Tr ad ucl lo c spa nho la no

    M~;tico, FCE, 1982.)O 'DO NN EL L, G ui lhe rmo , O n t he f rui tf ul c onv er gen ces o f Hi rsch man' s " Ex it , v oi ce and l ow

    yal ty" and "Sh if ting involvements" : r ef lect ions f rom the recen t a rgen tine exper ience, In:FOXLEY, A.; MAC PHERSON, M. S. O'DONNELL, G. Development, democracy andthe art of trespassing; 1986.

    OFFE, Claus.l llgovemabiJitd e mutamento delle democrazie, Bologna,Il

    Mulino, 1982.PASQUINO. Gianfranco, Crisi dei partiti e govenrabilita. Bologna , I I Mul ino, 1980.PEIXOTO, Mar tin. EI debate pol ft ico ene l Uruguay. Montevideo, 1987. Claeh , paper.PERELLI . Car ina. Someter 0 COltvellcer. EI discurso militar, Montevideo, EBO: CLADE,

    1987.PERELLI , Car ina & RIAL, Juan. De mitosymemorias pollticas. L a r ep re si dn , e l m i ed oy des-

    pIlls... Montevideo, EBO.1986.PITTA LUGA. Juan & ESMORIS, M. Contracul tu ra juvcn il aquf, Relaciones, Montevideo, n,

    41.out.1987.RI AL, Jua n. C on cer taci dn y g ov er nabi li da d - pr oyc ct o, acu er do p ol ft ico y p nct o s oci al . La

    rcciente experiencia uruguaya, Documentos de Trabajos; CIESU n, 123, 1985/6. E tarn-~m em: Sistemas electorates y representac idn pol it icaen America Latina. Madrid, AAVV.FESICI,1986.

    __ E leccionesde J 984. Sistema e l ec t or a l yresultados. Sun j05~ de Costa Rica, Centro In-terarnericano de Asesoria y Promocidn Electoral /CAPEL. Tambdm em versf io resumidatTh e Ur ugu ay an Ej ect ion oj J98 4: a t ri um ph o f t he ce nt re. In: DRAKE, P. W. & SILVA,E. EJections and democratization. Latin America, 198085 . San Diego , CILAS/CEUSMexSfIoFA. 1986.

    __ Las fue rzas a rmadas tambicn exi st cn , Ent revi st a a J. R. Punta y Aparte, Montevideo.n, 1.1987. '

    RO SE , Ri char d. Ri sor se d ei go ve rno e sov rac car ico d i do rna nde , I n: UR BA NI , G . S i nd i ca t i epot it ica nel le socieulpost-industrialle, Bologna ,I I Mul ino, 1976.

    Ungobernabi li ty ; i s the re f ir e between the smoke? Political studies, XXVII , set . 1979.ROTH, Guenther. The soc ia l democra ts in imper ia l germany : a s tudy in working c lass i so la tion

    and national integration, To tow a, Be dm ins ter Pr ess , 19 63 . ( Tr ad , i tal ian a, Bo log na, 11Mulino. 1971.)

    RUSCONI, Ginn E. Gobernare 10 scambio politico. Laboratorio polhlco; n , 2 , 1981.SCHMITT. Car l. Legalidad y legltimidad, Madrid. Aguil ar, 1954.__ T he concepts of politics, New Jersey. Rutgers University Press, n. 29.1966.(Tamb~m

    em espanhol: Folios. 1984.)__ La dictadurn.Revirta de Ocidente, n . 21, 1967.SCHMITtER, Phi lippe. Interes t intermediat ion and reg ime governabi li ty in contemporary

    West er n E ur ope a nd No rt h Am er ica. I n: B ER GE R. S ( e d. ), Organiz ing in teres tin Western

    Europe. Cambr idge , Cambr idge Unive rs ity Press , 1981.VERNAZZA, Francisco. E/ sistema electoral uruguayo y el descanso de la representatividad delos diputados, 1925 w 1984. Montevideo.sf 11987. Tese mirneografada.)

    84

    o Peru na decada de 80: construira democracia a partir da precariedade

    HENRY PEASE GARCIA

    INTRODUc;:Ao

    Quem observar de fora a polftica peruana encontrara algumas pe-culiaridades, e nao poucos paradoxes, que poem em questao 0 conceitode governabilidade e fazem duvidar da vigencia da democracia na so-c iedade peruana, Apesar dessas di ividas, j:1 t ranscorreram mai s de seteanos desde 0 restabelecimento do poder civil em 1980. No entanto,juntarnente com a redemocratizacao, surgi u 0 grupo terrorista SenderoLuminoso, arrastando-nos numa "guerra suja" que mais de urn adeptodo t otali tarismo pretende usar para que os milit ares voltem a cena,

    Nao podemos falar de governabilidade em dernocracia sem colo-carmos algumas questoes preliminares: 0 que essa democracia oferece auma juventude confrontada, no Peru, ao subemprego e ao desemprego?

    o que significa para mais de 200 mil jovens que a cada ano ingressamno rnercado de trabalho sern esperancas de urn ernprego estavel? Poracaso nao foi num regime democratico que sofremos as polfticas neoli-berais de Beladnde? E uma economia destrufda por rnais de uma deca-da de polfticas de estabilizacao que 0 presidente Alan Garda herda em1985. E em poueo rnais de do is anos 0 populismo aprista corneca a sedesgastar bruscamente depois de enfrentar, de irnprevisto, os bancosque. no Peru, sao a cabeca visfvel dos monopdlios,

    Depois de urn fastidioso debate - ainda que democratico - a va-cilacfio aprista leva a ,aprovacao de uma l ei confusa, COm a spectos i na-plicaveis, que reforcam a of ens iva direitista, E 0 governo vac ila ent reatos de forca e de permissividade, chegando a negociar com os prd-

    prios banqueiros atingi dos, sobre a aplicacao da lei que os expropriava,para em segui da romper a negociacfio e voltar a atacar,

    Henry Pease Garda. Soci61ogo e jomalista peruano. Professor na PontiffciaUniversidade Cat6lica do Peru. Pesquisador no Centro, de Estudos e Prornocaodo Desenvolvimento (DESCO)~ Presidente do Instituto para a Democracia Local(IPADEL).

    85

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    4/12

    ..~

    o marco instituci onal sera reduzido a cinzas ? Para urn velho l fderdireitista, 0 s imples aminc io de expropriacao jus ti fi cava a proclarnacaodo direi to a desobediencia civil. enquanto que para urn certo general dareserva, conhecido conspirador, s6 se resolve 0 problema do Peru ma-tando, e para i sso se deve solapar e acabar pri rneiro com a democracia,

    Na d6cnda de oitenta acostumarno-nos com a precariedade eco-norn ica e po lft ica, Cons trui r u rna dernocracia part indo da precariedadesupoe levar em conta as crises sucessivas - na economia, na sociedadee na polftica - buscando resolve-las em funcao de uma alternativa demassas que nao Ieche os espacos abertos , que privi legie a par ti cipacaoe que considere a luta do povo - construindo fatores de poder - comourn processo coletivo que, de baixo para cima, vai forjando nfveis mf-nirnos de consenso, Contra essa perspectiva, situarn-se aqueles que -de um Iado au de outro - apregoam a militarizacao e que - caso logrernexi to - nos aproxi marao do drama s alvadorenho ou, por caracterfsticasgeopolfticas, do interrninavel Lfbano,

    Sem recapitular todas as acepcoes do conceito de governabilidade- procedente da econornia, embora s6 seja util - a nosso ver - na me-dida em que equacione econornia e polftica, ordern interna e conjuntivaintema~~onal - para comecar a dicussao 6 suficiente entender como go-

    vernabilidade a capacidade de urn governo s er obedecido sem infringir?s r~gr~s do jogo dernocraticas e sem que a arneaca de que estas sejarninfringidas por outro ator social significative seja plausfvel para 0conjunto social.

    Certamente isso requer uma eficacia especffica do governo em~la;,;ao as aspiracoes dos di v ersos grupos sociais que esperarn da poIf-nca urn nfvel de solucao de seus problemas comuns, com graus diver-sos de acordo e desacordo nos objetivos, prioridades e caminhos ado-tados para realiza-los, Nesse caso, a eficacia supoe optar, respeitandoas regras dernocraticas, mas trata-se, em ultima analis e, de op;,;ao e de-ve guiar-se pela maioria, sern excluir as rninorias. E opcao e adrninis-trao;ao de conflitos e contradicoes, porquanto a soma zero e ineficaz- 'nao res olve os problemas nern costurna durar,

    Como a democracia nao existe em abstrato, vamos situar a discus-sao sobre govemabilidade dernocratica nos contextos especfficos dassoc iedades lat ino-amer icanas. Nfio sao ident icas uma ordem dernocra ti -ca resultante da vi t6ria do movimento popular e dos agent es que irnpul-sionarn a mudanca social e, por outro lado, urna ordem que parte de suaderrota ou de uma situacao de relativo equilfbrio, Havera ate mesmoaqueles que pretenderfio charnar de democratica uma ordem que - par-tindo da derrota do movimento popular - exclui urn setor de partidos

    8 6

    vinculado ao povo, qualquer que seja a razao da exclusao. Entretanto,dificilmente se podera chamar democratica uma ordem que parte da ex-clusao de urn sctor ou nega a possibilidade de alternancia e previo voto

    majoritario,Nes ta anal ise examinaremos 0 process o polftico recente no Peru

    para verificar - a' partir de uma situacao concreta - 0 que significaconstruir uma democracia em condicoes de precariedade e a que con-c1us6es podemos chegar sobre 0 conceito de govemabilidade.

    Para compreender 0 processo pol ft ico, des ta decada , CODVemco-mecar diferenciando a abertura polftica peruana das ocorri?a~ no ConeSuI porque se trata de tempos, situa

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    5/12

    Com efeito, no Cone SuI as ditaduras se insurgem para derrotar ae.squerda que propugnava uma mudanqa social, com iniciativas que va-naram des de a aventura revclucionana guerrilhei ra ate processes den-~o da constitucionalidade e expansjio no bojo de urn cornplexo popu-l~mo, Como os casos argentino e brasileiro, por exernplo, Se a repres-sao depende do que ha que destruir ou desmontar, as diferenqas COm 0go verno do general Morales Bermudez. do Peru, sao evidentes. 0 queMorales Bermudez desmonta, de 1975 a 1980, ~ urn conjunto de refer-mas feitas "de cima para baixo". Com 0 limite de agir dentro da mesma

    inst ituc iona lidade mil it ar que susten tou 0 velasquismo e enfrentandoUrn movi mento popula r que - embora i mporta nt e e muit o significa tivecomparado ~ hist6ria peruana anterior - dista rnuito do que slgniflca-yam, nurn caso, a guerrilha urbana na Argentina e em outro a s6lida t ~ ~ , ,

    mstrtuclOnahdade partidaria no interior da qual se consolidou a alter-nati va socialista chilena,

    AMm disso, as ditaduras do Cone SuI tiveram um certo carater defundacao em ~ua pretensao de desmontar 0 Estado precedente e irnporo. projeto neohberal. No Peru, urna gradual distensao tem infcio com adlt~dura de Morales Bermudez (1975-80) e as polfticas neoliberais saoaplic adas ape na s, posteriormente, no ambito da abertura dernocratioa~o g?verno de BeIaunde Terry (1980-85), que inaugura 0 regime cons~ti tucionaj, E ne nhurn dos dois conse gui u desmontar 0 Estado herdadodo ve lasq~ismo, com for te capac idade intervenc ionista na economia,

    As diferencas se verificarn tambern no pr6prio proc esso de abertu-ra democn!tica. No Peru a abertura e influenciada pel a luta do movi-mento popular, que chega ao seu auge nas greves nacionais de 1977-78q~e a ditadura enfrenta nao apenas com a repressao, porern com 0 pro-pno processo de abertura, A esquerda, em todas as suas vertentes, in-corpora-se ao c~nano ab~rto nesse processo desde 1978. PeIa primeiravez 0 novo regime politico integra todos na legalidade e no recessoparlamentar, Pois a esquerda - nao-unificada ate 1980 - nao fora der-rota da milit armente como no Cone SuI.

    .As diferencas acentuam-se ~ medida que nos aproximamos daatua~ld~de. Depois da abertura democratica, a movimento popular tem~onttnuldade, apesar de varias derrotas polfticas e conquista espacosImportantes. E ele que sustenta a uniflcacfi o da esquerdas, seus triunfos

    2 Em. fi.llSde.1980 constitui:se II coIiga~iloEsquerdll Unida (Ill) a partir da alianca do PartidoCo,?urusta Peruano, do. Partido Socialista Revoluclondno, cia Uniiio de Esquerdas Revolucio-mhias (~OCE~), 0 Partido. Comunista Revoluciomirio e tr8s partidos que depois se unifica.ramno Par tido Un; fi cado Mar ;t at egui stn. Pos tc riormente, se agrega h Agi lo PoUtica Soc ia li st a eseconvocam mtn tos esquerdJs ta s sem par tido para integ ra rem a frente, A ill vence ase lej~6es de

    88

    eleitorais e igualmente em larga medida, 0 triunfo do AP.RA - Alia~

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    6/12

    pos economic os conseguirarn se instalar em funcfio de sua capacidadede adaptacfio ao governo milit ar, A rnaioria do ernpresariado vivcu essepro~esso osc ilante, enfren tando como "cornunista" 0 velasquisrno queabr ia -lhe urn sign if icat ive espaco modemizado , apostando em Bela iindeTeIT~ em 1980, sob a bandeira de " tra balhar e deixar traba lh ar " , paradepots se surpreender com a virada neoliberal deste que confrontou asempresarios com a concorrencia externa e dest ruiu ainda rnais a indus-tria nacional, relegando-os a rnais profunda e recessiva crise, Nova-

    mente 0 empresariado se confronta hoje com urn governo que depois dedar-lhe todos os incentives vira-lhe a cara, qualificando-o, assim, comoo de Velasco; e os empresarios oscilam entre voltar a seu intermitentepacto com os rnilitares ou - lembrando que estes nao Ihe foram fieisnem agiram com coerencia - aspirarn a unificar a direita e accderern aogoverno,

    Esse processo rnostra fragilidades no proprio campo burgues,dentro de sua forca relativa e suscita interrogacoes que e precise anali-sar, Mas para 0 contraste entre os varios parses, serve 0 exernplo porque no Peru a inconsistencia da burguesia - que vern de longa data _se reproduz em novas situacoes e d~ a irnpressao de menor solidez naconsolidacao de sua capacidade de exercfcio real da dorninacao polftic ae econdrnica, numa sociedade muito rnais heterogenea do que as doCone SuI, rnuito rnais abalada economicarnente e tant as vezes col ocadanum repetido beeo sern safda,

    A comparacao entre os varies processes de abertura pode ser iitilquando 0 objetivo e avaliar a consistencia dos mesrnos, Certarnent efaltam-nos elementos para a cornparacfio porque dispornos de muitorna is informacoes sobre 0 Peru do que sobre 0 Cone SuI que nfio apre-senta, alias, urn processo homogeneo, Uma pergunta comum para seavaliar os diferentes processos, pode se indagar 0 que mudou duranteas ditaduras em relacao as experiencias dernocrat icas pre cedentes? Es-tabelecer se esse perfodo poli tico e democratizante somente enquantorea~ao prirnaria a brutalidade das ditaduras, Avaliar os processes dedernocratizacao para detectar aquilo que perdura e se enrafza na socie-dade e na cultura polftica, As instituicoes e sua capacidade de integra-rem faccdes em conflito requerem urn estudo mais complexo pois _embora aparentemente seja mciI a generalizacao - e diflcil assurnir co-mo total idade uma rea lidade tao heterogenea ,

    9 0

    DEMOCRATIZAC;AO E ABERTURA DEMOCRATICA: 0CASO PERUANO

    Qualquer pessoa que tenha visitado Lima h::i algumas decadasarras e volte hoje, se deparara com uma mudanca radical: a cidade dosbrancos, conservadores e aristocratas, ficou para Ms. Lima expressahoje "todos os sangues" do Peru. Em suas ruas, desordenadamente, osvendedores ambulantes, aos rnilhares, impuseram suas regras de jogo a

    prefeitos civis ou militares, eleit os ou nomeados a dedo, Foram os ricosque tiveram que migrar, prirneiro da ::irea central para San Isidro e Mi-raflores e, posteriormente, para Moli na ou Monterrico porque, com fu-dua luta, 0 migrante investi u para a part e mat s significati va da cidade,apesar de todas as agruras, da morte e da rniseria impostas pelo poderque enfrentavam,

    As decadas de setenta e oitenta expressarn - no campo e na cida-de - urn processo que inaugura a vigencia ampla e progressiva da or-ganizacao popul ar autonorna ou que, finalmente , se torna independentedo Estado, E verdade que a reforma agraria distribuiu terms a muitoscarnponeses, mas 0 proc esso foi tal que acabou por confronta-los aoEstado, As organizacoe s carnponesas de longa e nova dat a florescerame se mantern, apesar do sistematico esforco de desarticulacao e coopta-~ao feito pelo Est ado, desde 1975, por razoes contradit orias em aparen-cia, porem em realidade complementares, 0 movirnento operario alcan-ca centralizacao e direcfio polftica na decada de setenta e cornbate pelademocratizacao, com peso importante em todo 0 perfodo , As c idadesfervilham de organizacoes rnarcadas inicialrnente pela luta por urn pe-daco de terra e posteriormente por estrategias de sobrevivencia dianteda crise, Como parte dessas est rat egias, observa-se 0 apareci rnento dea tividades de pequena producao e cer ta rnente 0 comercio arnbulante,

    Durante a ditadura de Morales Bermudez todos esses nfveis deorganizacfio se mobilizarn ate se enveredarern numa mesma direcao eenfrentarem 0 governo com as greves gerais de 1977 e 1978. Dentro dopr6prio aparato estatal, professores e funcionarios publicos aderem aomovimento e atravessam urn processo de radicalizaca o mul to marcadope la demanda salar ia l imediata, E a partir do movimento popular que aabertura democratica tern urn componente pr6prio na luta do povo con-tra a ditadura, Entretanto, a greve nacional de 19 de julho de 1977 -que con segue derrubar 0 estado de ernergencia e 0 toque de recolher -exigia "abaixo a ditadura" mas nfio propunha explicitarnente a convo-ca~ao de elei90es, processo que. no entanto, se tornou possfvel gracasa essa ofens iva .

    91

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    7/12

    15So traduz um processo de dernocratizacjio que s upos previa-mente algumas rnudancas nas relacoes s ociais bas icas - ~ o desapare~ i-mento do grande latifundiario e nas relacocs semi-escravistas au na 10-[ormal izacfio no mercado de parte da classe operaria e inclusive dafuncfi o publica, na alteracao de s ucess ivos ccn6.ri?s polrti.cos e no mu-danca cultural, tanto em sentido arnplo quanta mars es pecificarnente noda cultura polftica, A esse nfvel, quem se lcmbrar do compon~ nt e ~a-cista inercnte a hierarquia oligarquica e a forma como ele se evidencia-va em Lima, e corurasta-lo com a realidade aural, detectara indfcios su-ficlcntes da magnitude da rnudanca,

    Trata-se, portanto, de um proccsso de dernocratizacfio situado nasociedade, mas abrangendo 0 Estado . Nfio nos rcferirnos apenas a seusantecedentes, no ample processo migratorlo e na urbanizaciio aceleradaque sc produz nos anos 50 e 60, porem ao terremoto polftico que para avelha ordcm oligarquica significou Velasco Alvarado atendendo e re-cri audo propostas anteriores de rnudanca e, sobretudo, a irrupcao, den-tro desse processo, de urn movirnento popular que foi, e e capaz deir impondo, parcialmente, seus termos ao processo polftico global,ocontribuindo para a irnpossibilidade de que a burguesia reformada pos-sa desenvolver urn Estado e urn pro je to coerente com suas necess idades

    globais.Com a mcdiacao de reforrnisrnos e populismos que fracassararn

    rapidarnentc, 0 proccs so de dernocratizacao avanc;ou na medida em queas sentou c, ao mes mo tempo, reforcou a organizacao popular autonornaou independente do Estado, E no tocante ao movimento popular na vi-da polftica, 0 processo de dernocratizacfio e a abertura democratica t ~mno Peru pontes de contato que podern nao tcr ocorrido em outros paf-ses.

    Assim no novo regime polftico a importancia adquirida em areaspopulares urbanas e rurais pelos governos locais conquistados pela Es-querda Unida, e a propria existencia dessa coalizao, tern sido urn meiopara que os dirigentes popuiares acedam ao Estado, vinculem 0 fortale-cirnento do rnovirnento popular a gestfio de novos espacos, a partir dos

    quais podern proper a dernocratizacao do Estado e, ernbora com trope-cos e lirnites, orientar uma fase do processo de dernocratizacao quesignifica "rlesestatizacflo " no sentido participative e descentralizacaocia funcfio publica, para aproxima-la ao nfvel da vida cotidiana do po-vo, Iortaleccndo a dcmocracia local.

    o terna cia abcrtura democratica continuara evocando urn "rno-mente de trans icao" da di tadura a dcmocracia po lf ti ca , com urn proces -so que gera essa rnudanca e outro que a consolida. Pode ou nao impli-

    92

    car UIll previo process a de democratizacfio ou descncadearacordos que viabil izarn a abertura podern impedir que a rnudanca s ocialganhe terrene, ou asscgurar que nao se configurem como forcas polfu-cas os setorcs que irnpulsionarn a mudanca, pelo mcnos por urn borntempo.

    A mudanca social irnplfcita no process o de dernocrat izacao nfio serestringe ao que rnencionamos em relacfio ao Peru. Varies dess es tracesslio tributaries do atraso relative da sociedade peruana - ainda sob 0domfnio oligarquico nos anos sessenta - em relacjio lls do Cone Sui, epodem ser cornpartilhados por outros parses andinos, 0 signi ficado dasmudancas geradas pela ernanclpacao da mulher e pelo cornbate de ve-lhas concepcoes machis tas que se deslocararn da s ociedade t radicionalpara a moderna t ern, por exernplo, uma potenclalidade enorrne que noCane Sui ou Peru ter iam ident ico i rnpacto se part ic iparern e fe tiva rnentede urn processo de dcrnocratizacao, entendido como ernergencia do po-vo, antes postergado, em sujeito da polftica, sujeito coletivo, alem decidadao, a prirneiro como fonte de poder - organizacao e iniciativa - eo segundo como fonte de direito c condicfio de Iiberdade, Aqui cabeconsignor a opinifio de Bobbio segundo 0 qual as sujeitos coletivos saoparte constitutive da atual dernocracia repres entativa, embora sempres eja negado por seus defensores locals."

    A referenda aos perfodos de abertura parece-nos necessaria paraque possamos ver com mais clarcza os rumos polfticos, Tais perfodospodem ter ocorrido com maier ou menor rnobilizacfi o popular; supoem,em geral, urn acordo entre as forcas polfticas e as poderes reais quees tas express arn, formal izadas, ou nao, numa nova cons tituicao. Nao ti-rararn de cena as forcas autoritarias que derarn seu aval as ditaduras,Ale rn di sso, jus ti fi ca -se pe lo menos pergun ta r-se ate onde abre rn espa-C ;O - ou nfio - para Iorcas antes exclufdas devido a derrota , Is so podeverificar-se no memento da abertura ou algum tempo depois ,

    A pergunta-chave sabre os processos de democratizacao diz res-peito a conquista de condicoes de cidadania e lls poss ibi lidades de par-ticipacfio dos sujeitos coletivos que represent arn os explorados au mar-ginal izados, com ou s em rnediacoes populistas , P ara alguns obs ervado-res, 0 movirnento popular decai apos a abertura dernocratica," No Peru,isso nao aconteceu, apesar do irnpacto que tern sabre 0 movimento po-pul ar a guerril ha terrorista e a respost a dada pelo go verno. J us tarnentea capacidade de expansao do rnovimento popular na sociedade civil e -

    3 B nb bi o N or be rt o, Elfuturo de La democracia, Mt'Sltieo. FeE, 1986.4 Barros: Robert Izquicrda y dcmocraciar debates en Arnerica Latina. Zona Abierta, 39-40,abril-sct, 1982.

    93

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    8/12

    no memento da abertura - seu acesso significative aos municfpios e aoparlame nt o ~em de sat ivar suas pr6prias orga ni zacoes pe rmitiu, no ca soperuano , maiores avancos no sen tido da democra tizacao.

    o que ~ca _evidente, a partir do nosso caso, ~ como um processode democratizacfio se trunca, se lirnita e at~ se decompoe quando asavances em termos participativos e a abertura na qual ele se insere naoconse~uem se .expressUf, de rnaneira convincentc, na satisfacao real denecessl~ades ur,gentes e nurn desernpenho economico que expresse econcretlz.c - mars alern de ocasionais avances - a luta polfiica.

    MUl to do atual processo peruano parece jogar-se na capacidadede enfrentar, a curto prazo, a pobreza generalizada e urn crescirnentoecondrnico cornpatfvel com tal necessidade e com 0 encerrarnento daspossibili da des de inversao t ra di cionais. Essa questfio incl ui , h

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    9/12

    si stir quando a dereri oracao da econornia popul ar torna precarios todosos direitos? Quando as doencas respiratdrias recrudescern impetuosa-mente, quando a desnutricao infantil se eleva a cifras monstruosas ouquando os precos jii nao permitern subsistir? Com urn governo que per-deu 0 controle da inflacao, a democracia se ve nao apenas arneacadamas ridicularizada e objeto de escamio. No entanto, mais uma vez asrespostas do povo organizado nfio estao nem na espontaneidade nem nodesespero, 0 desenvolvimento de organizacoes de sobrevivencia, asiniciativas no campo da alirnentacao e da saiide, as raras, mas oportu-

    nas, greves gerais mostram 0 escopo da resposta popular, ao nfvel desuas organizacoes mais si gnificativas. Por isso, em 1985, a vontade demudanca se expressa tarnbern na Esquerda Unida e e rnais de 80% doeleitorado que exige mudancas, nao apenas de polftica economica masde partidos, pessoas e projetos,

    o FOPULISMO APRIST A E UMA ESQUERDA ENTRA VADA

    Poucos presidentes chegaram ao governo com tantos recursosconquistados pelo voto, 0 carisma de AIn Garcia e uma campanhaonde oferecia tudo a todos deu-Ihe as rnel hores condicoes para cornecar

    a governar, Contudo, diante de suas genericas propos tas programaticasera possfvel afirmar que a presidente queria "fazer bolos sem quebraravos". No entanto, uma polftica econornica inovadora, de curto prazo,permiti a-Ihe ganhar tempo para outras rnedidas e prol ongar 0 entusias-mo inicial, Mas toda a sua aposta se baseava na relnversao dos princi-pais grupos econornicos - os doze a postolos - e estes nao responderarn,apesar de receberem enorrnes incentives,

    Desde 1985, ha urn processo que personaliza nao apenas a vito-ria, mas 0 ato de governar e ate os conflitos parciais, Aqui ja nao haministro mas secretaries do presidente, unico protagonista em termosreais, e assim se desenvolve um processo que chega a dar indfcios dedesgate, com enfrentarnentos no APRA a partir da reniincia do primei-ro-rninistro Luis Alva Castro e com 0 impacto de uma important e gre-ve nacional em maio de 1987, que denunciava a fragilidade da situa-

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    10/12

    Na conjuntura atual , a direi ta l iberal esta se reerguendo ap6s ocu-par urn lugar centra l nes se s dois anos, Enquan to alguns de seus r epre-sentantes tradicionais clamam pela insubordinacao e outros pelo golpemilitar, pode-se afirmar que 0 grosso da direita se manteve nos limi tescons tituciona is , Por que razao des sa vez? Ta lvez 0 ernpresariado selembre de que os rnilitar es de 1968 , nOf im das con tas , nao lhe for amfieis, irnpondo sua propria tentative de transformacao social e agredin-do a classe dominante, Sera que no Peru 0 tinico carninho e da trans-formacao?

    A dir eita liber al procura r enovar su a mensa gem ide olo gica e emnome dos informais - considerados como chefes do novo libera lis rno -procura tracar uma utop ia que possa ser ace ita po r algurna parcela dapopulacao. Os rnilitares, por outro lado, fustigados pela crftica, mas de-fendidos em condicoes de irnpunidade pelo presidente, terao que pensarduas vezes antes de dar urn novo golpe. Como combater 0 grupo Sen-dero Lurninoso a pa rtir do governo sem a adesao c iv il? 0 grupo Sende-ro Luminoso oao busca explic itamente uma ditadura mil itar que amplieocampo inirnigo pa ra, des sa forma , pode r se expandir? Ta lvez 0 quecharnamos dernocracia peruana s6 se mantenha e desenvolva devido aseus proprios entraves e, portanto, e nesse ponte que devemos situar asinterrogacoes.

    QUESTOES SOBRE A POSSlBILIDADE DEMOCRATICAE A GOVERNABILIDADE

    Continuamos vivendo dentro das regras do jogo que a consti tu i-

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    11/12

    grar~m {;~ito. co~siderarao que 0 pars tern que mudar e avancar oucontmuarao espoliando-o e. para tanto, buscarfio 0 golpe?

    Certament:_ trata-se de relagoes de forca e nne de boas intens:oes,mas nessa relacao de forca ha uma diversidade de atores que optaraodentro .ou ~ora dos procedirnenros democraticos, A construcao da de-mo~racIa nao ISapenas uma questao de procedimentos, porem depende~UltO do que se obtenha as margens dojogo, inclusive na cena interna-clon.a~,por exemplo, com 0 problema da dfvida externa, No Peru, afragil idade burguesa tern relacao com sua incapacidade blstcr ica de

    oferecer urn projeto atraente , que viabilize urna rnudanca qualquer,Responder apenas com a forca e COm 0 goJpe tern 0 limite de irnpulsio-nar 0 carro da subversao, Tais l imites nao Ievarn a enfatizar a demo-cratizacao?

    Algo que ~epoe a favor da viabilidade dernocratica est

  • 8/2/2019 Amrica Latina Eleicoes e Governabilidade Democratica

    12/12