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50 | PAÍS ALTO CATUMBELA REFLORESTAMENTO GARANTE EMPREGOS Texto: Edjaíl dos Santos Fotografia: Carlos Aguiar A Estrela da Floresta contratou os seus primeiros trabalhadores florestais e já são mais de 50 pessoas a trabalharem no campo e nos escritórios. A perspectiva é que esse número cresça nos próximos anos, sendo que a maioria dos trabalhadores se dedica ao tratamento dos viveiros de plantas e das plantações. Segundo informa um documento divulgado pela empresa, “os recursos florestais proporcionarão às comunidades locais meios de subsistência, criarão oportunidades para novos parceiros industriais e fornecerão mais madeira para o mercado interno”. Ademais, realça-se no documento: “as operações de reflorestamento da Estrela da Floresta almejam substituir décadas de práticas de silvicultura, geralmente pobres e muitas vezes não regulamentadas, com plantações de madeira revitalizadas e em grande escala”. A Estrela da Floresta frisa que o conceito de produção no âmbito do presente projecto pretende evoluir ao longo do tempo e de acordo com as fases previstas de investimento, começando Trinta anos depois do encerramento da antiga Companhia de Celulose e Papel de Angola, no Alto Catumbela, província de Benguela, a região ganha vida e mais postos de trabalho. A Economia & Mercado deslocou-se a essa localidade para constatar o resultado da parceria entre as comunidades locais e a empresa Estrela da Floresta, que trabalha na gestão das zonas florestais que outrora abasteciam aquela indústria. pelo processamento da madeira existente e seguindo para novas plantações. Prevê-se que a área de plantação venha a ser capaz de fornecer um volume suficiente de fibras para a implementação de uma fábrica de pasta de fibras de grande escala e para a indústria florestal criada ao longo dos primeiros anos. O responsável pela relação com as comunidades da Estrela da Floresta, Marcial Domingos, adianta que, este ano, vão replantar mais de 133 mil plantas vindas da África do Sul em 100 hectares do Alto Catumbela, mas advertiu, porém, que a importação tem os dias contados porque em breve vão clonar as espécies que têm no viveiro, das quais serão seleccionadas as que melhor se adaptarem ao clima angolano. “Não pretendemos fazer igual ao que se fez na época colonial, mas sim fazer muito melhor. Trabalhamos todos os dias e eu estou bastante empenhado neste desafio porque vem de pessoas sérias que querem desenvolver o sector madeireiro a longo prazo”, reforçou o quadro superior recém-formado no Huambo na área florestal. O investimento, porém, veio na “hora certa” para alguns dos empregados, que reclamavam por melhores condições no Alto Catumbela, como é o caso de Paulino Camussumandi, de 26 anos, que há quatro meses trabalha na empresa e garante estar a gostar O RESPONSÁVEL PELA RELAÇÃO COM AS COMUNIDADES DA ESTRELA DA FLORESTA, MARCIAL DOMINGOS, ADIANTA QUE, ESTE ANO, vão replantar mais de 133 mil plantas, VINDAS DA ÁFRICA DO SUL, EM 100 HECTARES DO ALTO CATUMBELA. Marcial Domingos

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Page 1: ALTO CATUMBELA REFLORESTAMENTO · 2017. 8. 7. · veio ajudar-me bastante, porque a vida aqui está muito difícil. Vamo-nos remediando. Por isso, este emprego é uma bênção”,

50 | PAÍS

ALTO CATUMBELA

REFLORESTAMENTO GARANTE EMPREGOS

Texto: Edjaíl dos SantosFotografia: Carlos Aguiar

A Estrela da Floresta contratou os seus primeiros trabalhadores florestais e já são mais de 50 pessoas a trabalharem no campo e nos escritórios. A perspectiva é que esse número cresça nos próximos anos, sendo que a maioria dos trabalhadores se dedica ao tratamento dos viveiros de plantas e das plantações.

Segundo informa um documento divulgado pela empresa, “os recursos florestais proporcionarão às comunidades locais meios de subsistência, criarão oportunidades para novos parceiros industriais e fornecerão mais madeira para o mercado interno”.

Ademais, realça-se no documento: “as operações de reflorestamento da Estrela da Floresta almejam substituir décadas de práticas de silvicultura, geralmente pobres e muitas vezes não regulamentadas, com plantações de madeira revitalizadas e em grande escala”.

A Estrela da Floresta frisa que o conceito de produção no âmbito do presente projecto pretende evoluir ao longo do tempo e de acordo com as fases previstas de investimento, começando

Trinta anos depois do encerramento da antiga Companhia de Celulose e Papel de Angola, no Alto Catumbela, província de Benguela, a região ganha vida e mais postos de trabalho. A Economia & Mercado deslocou-se a essa localidade para constatar o resultado da parceria entre as comunidades locais e a empresa Estrela da Floresta, que trabalha na gestão das zonas florestais que outrora abasteciam aquela indústria.

pelo processamento da madeira existente e seguindo para novas plantações. Prevê-se que a área de plantação venha a ser capaz de fornecer um volume suficiente de fibras para a implementação de uma fábrica de pasta de fibras de grande escala e para a indústria florestal criada ao longo dos primeiros anos.

O responsável pela relação com as comunidades da Estrela da Floresta, Marcial Domingos, adianta que, este ano, vão replantar mais de 133 mil plantas vindas da África do Sul em 100 hectares do Alto Catumbela, mas advertiu, porém, que a importação tem os dias contados porque em breve vão clonar as espécies que têm no viveiro, das quais serão seleccionadas as que melhor se adaptarem ao clima angolano.

“Não pretendemos fazer igual ao que se fez na época colonial, mas sim fazer muito melhor. Trabalhamos todos os dias e eu estou bastante empenhado neste desafio porque vem de pessoas sérias que querem desenvolver o sector madeireiro a longo prazo”, reforçou o quadro superior recém-formado no Huambo na área florestal.

O investimento, porém, veio na “hora certa” para alguns dos empregados, que reclamavam por melhores condições no Alto Catumbela, como é o caso de Paulino Camussumandi, de 26 anos, que há quatro meses trabalha na empresa e garante estar a gostar

O RESPONSÁVEL PELA RELAÇÃO COM AS COMUNIDADES DA ESTRELA DA FLORESTA, MARCIAL DOMINGOS,

ADIANTA QUE, ESTE ANO, vão replantar mais de 133 mil plantas, VINDAS DA ÁFRICA DO SUL, EM 100 HECTARES DO ALTO CATUMBELA.

Marcial Domingos

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da nova experiência e da oportunidade. “Ajuda-me a sustentar a minha família, esposa e dois filhos. Espero que a empresa continue a crescer, porque a vida cá, no Alto Catumbela, é difícil devido à falta de empregos”, desabafou.

A alegria é igualmente notória no sorriso da viúva Adriana Felícia que aos 40 anos encontrou o seu primeiro emprego, já que vivia de biscates e da venda de produtos do campo. “Cuidamos das plantas e com o que ganho já consigo tirar o pão para sustentar os meus filhos e pagar a escola onde estudam”, disse, adiantando que está feliz, porque depois da morte do seu marido, em 2014, a vida da sua família complicou-se ainda mais. “Aqui, tive uma formação com os engenheiros nas áreas da rega e do tratamento do viveiro. Este trabalho veio ajudar-me bastante, porque a vida aqui está muito difícil. Vamo-nos remediando. Por isso, este emprego é uma bênção”, frisou.

Aos 30 anos de idade, a jovem Catarina Domingas destaca a

oportunidade que garantiu o sustento da sua família e os estudos dos filhos, porém, continua a reclamar das dificuldades sociais e financeiras que se sentem na região do Alto Catumbela e que, segundo ela, têm vindo a aumentar.

BREVE HISTORIAL O agrónomo e industrial Luciano Luís conta que a fábrica de celulose do Alto Catumbela era considerada um “colosso” a par de outras companhias que existiam no país, como a Companhia de Café de Angola, os Caminhos-de-Ferro ou a Diamang, hoje Endiama.

O também antigo membro do Sindicato Nacional da Agro- -pecuária referiu que a fábrica do Alto Catumbela chegou a empregar cerca de 16 mil trabalhadores, desde os que criavam o viveiro até aos que trabalhavam na transformação da madeira em papel.

A ESTRELA DA FLORESTA CONTRATOU OS SEUS PRIMEIROS TRABALHADORES FLORESTAIS E JÁ SÃO MAIS DE 50 PESSOAS A TRABALHAREM NO CAMPO E NOS ESCRITÓRIOS.

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Constituída por escritura, lavrada a 1 de Abril de 1955, a Companhia de Celulose e Papel de Angola (CCUP) foi oficialmente autorizada a instalar a sua indústria no país a 17 de Abril de 1957. De acordo com dados históricos, numa primeira fase pretendia-se atingir uma produção de 60 toneladas/dia de pasta e de 25 toneladas/dia de papéis diversos. Os atrasos, as dificuldades e os imprevistos foram muitos. Só no final de 1961 se conseguiram produções experimentais e, em 1963, o volume da produção de pasta não tinha chegado aos 80% da capacidade de produção da máquina. No que se referia a papéis, nem aos 15% se tinha chegado.

Em 1964, após empréstimos contraídos no mercado financeiro, falava-se em acabar com uma das mais extraordinárias experiências de fixação de populações no interior. A situação arrastou-se até que, em 1967, foi apresentado aos grandes accionistas um estudo de rentabilização preconizando a ampliação da produção de pasta para 110 toneladas/dia, seguida de nova ampliação para 400 a 500 toneladas/dia. Foram imediatamente encomendados os equipamentos necessários e, em 1969, os objectivos iniciais tinham sido cumpridos.

Em 1973 foi constituída no Lobito a Celangol, com o objectivo de instalar ao lado da velha CCUP uma nova unidade produtiva de pasta branqueada de eucalipto saligna de 800 toneladas/dia. Para o fornecimento de matéria-prima, proceder-se-ia à florestação de 100.000 hectares. Mas o processo de independência do país obrigou a que se adaptasse o projecto às novas circunstâncias.

Localizado na comuna do Alto Catumbela, município da Ganda, o complexo industrial foi parcialmente destruído em 1984, durante o conflito armado, tendo paralisado completamente a sua produção. Em Agosto de 2004 ocorreu nas instalações da Companhia de Celulose e Papel de Angola um incêndio de grandes proporções que destruiu uma parte importante do que sobrevivera à guerra. Hoje, tudo o que resta são algumas plantações de eucaliptos nos municípios da Ganda (Benguela), Ukuma e da Caála (Huambo) e em algumas regiões da província do Bié. &

(Extractos deste texto fazem parte do arquivo de Carlos Pires, que nasceu e cresceu na região do Alto Catumbela)