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EPG Évora 2005 Alqueva e Nevoeiro Rui Salgado Centro de Geofísica e Universidade de Évora Pedro Miranda Centro de Geofísica da Universidade de Lisboa

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EPG Évora 2005

Alqueva e Nevoeiro

Rui SalgadoCentro de Geofísica e Universidade de Évora

Pedro MirandaCentro de Geofísica da Universidade de Lisboa

EPG Évora 2005

É comum ouvir dizer-se que depois da construção das barragens há mais nevoeiro.

No Inverno de 2003/2004 foram notícia afirmações que davam contado aumento do nevoeiro na sequência do enchimento da albufeira de Alqueva (jornalistas, autarcas, populares)

O Que Dizem as Pessoas?

Barragem de Alqueva muda clima alentejano Os dias secos e solarengos deram lugar a manhãs

húmidas e nevoeiros Alterar tamanho

João Carlos Santos

O enchimento da barragem de Alqueva foi mais rápido do que o previsto. A barragem já tem 2500 hectómetros cúbicos de água, o que poderá explicar as alterações climáticas

O IMPACTE climático da barragem de Alqueva começa a sentir-se em todos os concelhos do Alentejo situados na área do regolfo da albufeira ou que com ela confinam - como Évora, Cuba e Vila Viçosa, onde, desde há dois meses, os dias secos, frios e solarengos, característicos dessa época do ano, têm dado lugar a manhãs muito húmidas e à ocorrência de nevoeiros densos que só se dissipam por volta do meio-dia. Os dias brumosos estão a sentir-se até em algumas zonas de Alvito, Vidigueira e Marmelar, concelhos que fazem parte da Rota dos Vinhos do Guadiana. O problema que está agora a colocar-se é o do efeito que isso terá na agricultura,

EPG Évora 2005

O Que diz a Literatura Científica?

• Diz pouco• É possível encontrar alguns estudos sobre a questão (e.g. ICOLD

Comissão Internacional das Grandes Barragens, 1996)– Aumento do número de dias com nevoeiro – Não quantificados– Dependem das dimensões do reservatório, da topografia da região, bem como

do clima prevalecente no local onde se inserem – Origem dos nevoeiros:

• nevoeiro forma-se a partir da evaporação do lago - ocorre com frequência em climas quentes, tropicais, ou quando a água está muito mais quente que o ar

• advecção de ar quente e húmido sobre a superfície fria do lago – Outros efeitos:

• Diminuição da Amplitude térmica• Aumento da humidade• Aumento da intensidade do vento; alongamento das rosas de vento;

geração de brisas• Efeitos contraditórios na precipitação e na evaporação

EPG Évora 2005

MetodologiaEstudo do impacto da Albufeira de Alqueva na formação e desenvolvimento de

episódios de nevoeiro durante o InvernoRealização de simulações numéricas para todos os dias dos meses de

Janeiro, Fevereiro e Março de 2003.

• Modelo não hidrostático de mesoscala: MESO-NH.• Para cada experiência numérica foram executadas duas simulações com a mesma inicialização e o mesmo forçamento atmosférico:

• uma simulação de controle com as condições de superfície pré-Alqueva(ecoclimap)• uma simulação de impacto com uma superfície modificada, admitindo que a albufeira está ao seu nível máximo

EPG Évora 2005

MetodologiaTotal: 90 experiências, cada uma respeitante a 1 dia;

Janeiro, Fevereiro, MarçoCada experiência: 2 simulações

Constante em cada simulação. Imposta a partir de dados das observações

Temperatura da superfície da Albufeira

Análises Arpege (6 em 6 horas)Condições Iniciais e de Fronteira

20sPasso de Tempo30 horas, com início às 18H do dia anteriorPeríodo de simulação

40 níveis, desde a superfície até aos 20 km, com 20 níveis nos primeiros 2 km. 1º nível a 10 m

Níveis verticais5 km × 5 km Resolução horizontal450 × 450 km2Domínio

Mapa com o domínio e a orografia, com indicação das estações sinópticas cujos dados foram utilizados na confrontação de resultados com observações

EPG Évora 2005

Temperatura da Superfície da Água

Dados disponíveis:• Temperatura superficial das Albufeiras da região Alentejo (CCDR-A)• Temperatura da água do Monte Novo no nível da captação (CME)

Temperatura da água em Albufeiras do Alentejo

8

9

10

11

12

13

14

15

16

17

18

19

15-Dez 31-Dez 16-Jan 1-Fev 17-Fev 5-Mar 21-Mar 6-Abr 22-Abr

Tem

pera

tura

(ºC

Monte Novo Roxo Vigia Alvito Monte Novo (captação)

Dados pouco concordantesVai utilizar-se a Temperatura

da Água do Monte Novo(Numa outra experiência

foram utilizados os valores médios das outras séries)

Análise de perfis térmicos disponíveis indicam que o gradiente vertical máximo é da ordem dos 3ºC/10m

EPG Évora 2005

O Modelo Atmosférico: MESO-NHLafore et al. (1998)

Características gerais:

Sistema de equações Não hidrostático. Aproximação pseudo incompressível do sistema de equações anelástico (Duran, 1989)

Sistema de coordenadas e discretização

Grelha horizontal assente numa projecção conforme; Coordenada vertical de Gal –Chen e Sommerville; Utilização do sitema grelhas deslocadas dotipo C de Arakawa (1976)

Condições fronteira laterais Radiativas Parametrizações físicas:

Nuvens e precipitação Explícito (Kessler, 1969), com 3 variáveis de prognóstico: vapor, água líquida e precipitável.

Convecção Kain e Fritsch (1993); Bechtold et al., 2001. Camada limite planetária Evolução da energia cinética turbulenta de Bougeault e Lacarrérre (1989).

Interacção superfície-atmosfera

Modelo ISBA de Noilhan e Planton (1989) sobre as superfícies vegetais; modelo TEB de Masson (2000) sobre as superfícies urbanas; parametrização de Charnock (1955) do comprimento de rugosidade sobreas superfícies de água.

Radiação Modelo do Centro Europeu de Previsão do Tempo (Mocrette, 1989) Difusão horizontal Operador ∇4

EPG Évora 2005

Resultados versus Observações

0.24Nevoeiro

38.87 º55.58 º-1.71 º0.89Direcção do vento

1.2 ms-11.52 ms-10.02 ms-10.69Intensidade do vento

1.08 gkg-11.41 gkg-1-0.14 gkg-10.82Humidade específica

9.65 %13.42 %-0.25 %0.73Humidade relativa

2.2 K2.75 K0.59 K0.89Temperatura

4.65 mm0.4 mm0.6Precipitação diária

EAM REQM EM Correlação

A comparação estatística entre os resultados da simulação de controlo e as observações em estações meteorológicas de superfície revela que o modelo consegue reproduzir razoavelmente bem a evolução das principais variáveis meteorológicas junto à superfície

A confrontação dos indicadores de validação calculados neste estudo com indicadores análogos apresentados em outros estudos de modelação em mesoscala indica que os resultados do presente programa de simulações cumprem os standards de qualidade actualmente possíveis.

EPG Évora 2005

Resultados versus Observações

Padrão da evolução da temperatura do ar aos 2 m está bem representado, principalmente a temperatura média do ar● Amplitude térmica está, em geral, sobre avaliada● humidade: ar demasiado seco durante o meio do dia

● O modelo resolve bem os episódios de nevoeiro observados, mas tende a aumentar o número de dias com nevoeiro (sobre Évora e Beja)(de notar que a resolução temporal dos resultados é superior à das observações)

Temperatura do ar em Beja

Nevoeiro em Portalegre

- Resultados- Observações

EPG Évora 2005

Análise dos Resultados

1 – Tabela com sumário dos resultados sobre o nevoeiro calculado nas simulações de controlo e a diferença induzida pela introdução daAlbufeira

-0.-1618.1966003.-15.-10822.73012.-1.-12441.2039014.TOTAL (60 days)

-1.-905.108568.-21.-1372.6510.-2.-2277.115078.day 31/03

41.6455.15830.130.90.69.41.6545.15899.day 29/03

-4.-627.14174.-30.-573.1915.-7.-1200.16088.day 20/03

-1.-623.60927.-17.-469.2826.-2.-1093.63753.day 19/03

1.786.110027.-0.-19.5380.1.767.115407.day 14/03

-1.-377.41610.-59.-1533.2580.-4.-1910.44191.day 06/03

-0.-106.91061.-10.-293.2900.-0.-399.93962.day 05/03

0.386.146615.0.13.6018.0.399.152632.day 04/03

2.1395.65529.-21.-24.113.2.1370.65642.day 03/03

0.158.98161.-13.-51.395.0.107.98557.day 28/02

1.410.54609.-22.-6.27.1.404.54636.day 18/02

-3.-945.37522.-22.-374.1664.-3.-1319.39186.day 13/02

0.166.51351.-22.-272.1265.-0.-107.52616.day 10/02

-0.-156.93089.-21.-542.2582.-1.-698.95671.day 07/02

0.13.37985.-11.-237.2190.-1.-224.40175.day 06/02

1.198.34008.-20.-4.22.1.194.34030.day 04/02

8.6086.80879.-10.-345.3569.7.5741.84448.day 03/02

3.1479.54369.-8.-392.5207.2.1086.59575.day 23/01

-------0.0.day 10/01

-1.-1160.104824.-8.-448.5577.-1.-1607.110401.day 07/01

-1.-1854.138259.-13.-1080.8365.-2.-2934.146624.day 04/01

variação (%)anomaliacontrolevariação (%)anomaliacontrolevariação

(%)anomaliacontrole

Área restante Área Alagada Domínio

Área Tempo de nevoeiro (km2.H)Experiência

EPG Évora 2005

Análise dos ResultadosCampo do nevoeiro total (número de horas) e impacto da Albufeira

AnomaliaControlo

7939 (0.1%)-355252 (-5.5%)392543 (5.6%)7050394TotalAnomalia. totalAnomalia. negativaAnomalia. positivaControlo

Área tempo de nevoeiro (km2⋅H)

Zoom

EPG Évora 2005

Análise dos ResultadosCampo do nevoeiro total (número de horas) e impacto da Albufeira

Resultados indicam:• Efeitos integrais são marginais e de sinal contrário sobre a região • Diminuição do nevoeiro sobre a albufeira.

Controlo Anomalia

-15 %Sobre a zona alagada

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Análise dos ResultadosImpacto no Nevoeiro (Exemplos)

Apesar do efeito integrado da albufeira sobre o nevoeiro para todo o período ser marginal, os resultados indicam que há casos de estudo onde:• Há uma diminuição generalizada do número de horas com nevoeiro• Outros onde há um aumento generalizado• Outros ainda onde há zonas com mais e zonas com menos• Há também casos onde ocorrem alterações da evolução temporal

Os resultados diários indicam que os efeitos da Albufeira sobre o campo do nevoeiro, apesar de fracos, podem ser mais importantes do que os visíveis numa análise integral

8 Fev

29 Mar

EPG Évora 2005

15 H15 H

Análise dos resultadosEfeitos no campo do ventoEfeitos médios para todo o

período:• Aumento da intensidade do

vento sobre a albufeira – Diminuição da rugosidade

• Efeito de brisa– Muito ténue (intensidades

da ordem de 0.2 ms-1)• De noite prevalece o efeito da

aceleração do vento ao longo do vale

• A meio do dia prevalece o efeito da brisa– Com intensidade

superiores a 0.5 ms-1

– Induzida pelos contrstestérmicos água / terra

Anomalia na Intensidade

Anomalia no campo vectorial

6 H

EPG Évora 2005

Análise dos resultadosfluxos de energia e água à superfície

Nas simulações com Alqueva:

•O fluxo de calor latente e sensível durante a noite é

maior•O fluxo de calor latente, e

sensível é menor durante o período diurno

O impacto na evaporação total depende da Temperatura da água

Anomalia na evaporação Anomalia na evaporaçãoExp: Alqueva 2 (Ts ↑)

EPG Évora 2005

Sensibilidade à Temperatura da Água

• Há uma correlação embora ténue entre a diferença entre a temperatura do ar e a temperatura da água e a anomalia diária no campo do nevoeiro

• Quanto maior (Tar – Ts_ag) mais nevoeiro se forma, mais visível quando se considera a temperatura mínima

• i.e., o nevoeiro forma-se essencialmente por advecção de ar húmido mais quente sobre a superfície fria do lago (fundamentalmente de madrugada)

Anomalia do nevoeiro versus

Tar(rmínima)-Ts_lago

em dias em que a temperatura do ar aos 2m desce a valores inferiores em mais de 5-6ºC aos da superfície da água, a presença da albufeira tende a ter um impacto negativo na formação do nevoeiro

EPG Évora 2005

Sensibilidade à temperatura da Água (2)

Conjunto de simulações 20030104_tt• Objectivo: estudar a sensibilidade do modelo à Temperatura da

superfície da água no que respeita ao impacto da albufeira no nevoeiro

• O mesmo domínio e resolução• As mesmas opções físicas• A mesma superfície• Um caso de estudo: dia 4 de Janeiro de 2003 (dia onde o nevoeiro

foi mais extenso, de acordo com os resultados e as observações)• O mesmo forçamento atmosférico• Imposição de diferentes temperaturas superficiais da água:

– 5, 8, 10, 13 (anterior), 14, 15 ºC

EPG Évora 2005

Sensibilidade à temperatura da Água

Ts = 5ºC Ts = 15ºCControlo

Quanto mais fria está a água relativamente ao ar, mais nevoeiro se forma. O impacto global negativo de Alqueva no campo do nevoeiro sobre a zona da albufeira resulta assim, do facto da temperatura da superfície da água ser, frequentemente superior à da temperaturado ar simulada durante a madrugada.

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Experiência de alta resolução (1 km)

As mesmas, mas não se utiliza nenhuma paramete-rização para a convecção

Opções físicas

Impostas pelos resultados da simulação a 5 km através da técnica de twoway grid nesting

Condições Iniciais e de Fronteira

5 sPasso de Tempo

18 horas, com início às 00H

Período de simulação

Os mesmos das experiências anteriores

Níveis verticais

1 km × 1 km Resolução horizontal

80 × 100 km2 “aninhado” no domínio de 450 x 450 km2

anteriorDomínio

Domínio e Fracção de água na

resolução mais fina•A esta resolução a Albufeira está melhor representada e existem mais de 150 células totalmente alagadas

EPG Évora 2005

Resultados: Nevoeiro nas simulações a 1 km de resolução (experiência 20030104_ng)

4 UTControlo Anomalia

Durante a as primeiras horas da noite as alterações no campo do nevoeiro são mínimas.

EPG Évora 2005

Resultados: Nevoeiro nas simulações a 1 km de resolução (experiência 20030104_ng)

5 UT

Às 5 UT nota-se um aumento do nevoeiro a jusante da albufeira (o vento à superfície é de sudeste)

Controlo Anomalia

V

EPG Évora 2005

Resultados: Nevoeiro nas simulações a 1 km de resolução (experiência 20030104_ng)

7 UT

Às 7 H o nevoeiro afecta grande parte do domínio de simulação; na simulação com Alqueva a mancha de nevoeiro estende-se mais para noroeste.

Controlo Anomalia

EPG Évora 2005

Resultados: Nevoeiro nas simulações a 1 km de resolução (experiência 20030104_ng)

11 UT

A partir das 10 UT o nevoeiro começa a dissipar-se; sobre a albufeira este processo desencadeia-se mais cedo.

Controlo Anomalia

EPG Évora 2005

Resultados: Nevoeiro nas simulações a 1 km de resolução (experiência 20030104_ng)

7 UTControlo Anomalia

O traçado de trajectórias permite identificar que o ar na zona onde a anomalia do nevoeiro é positiva atravessou a albufeira (mais quente) durante a noite

Durante o período de simulação, a presença da albufeira contribui para

um ligeiro aumento do total de horas de nevoeiro (~1%) no

conjunto do domínio

Trajectórias aproximadas (simulação com Alqueva) de 3 partículas de ar que às 7 UT se encontram na zona da anomalia de nevoeiro

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ConclusõesAs simulações realizadas indicam:• Na escala regional a albufeira tem um efeito global marginal no campo do nevoeiro,

durante o Inverno• O efeito em dias concretos pode não ser desprezável, nuns dias contribuindo para a

existência de mais nevoeiro, noutros para a sua diminuição, em outros ainda para a alteração da sua distribuição espacial ou temporal.

• Sobre a zona alagada há menos nevoeiro• Fora da zona alagada e da sua vizinhança, os resultados sugerem um aumento ainda

que marginal da ocorrência de períodos de nevoeiro• Os impactos da albufeira no campo do nevoeiro são mais frequentes em períodos com

circulações associadas a ventos à superfície de Sul e Sudoeste• Os resultados dependem criticamente da temperatura da água: Valores mais elevados

tendem a ter um efeito negativo• Na geração do nevoeiro, o efeito do arrefecimento do ar predomina sobre o aumento da

evaporação • Durante a noite a evaporação sobre a albufeira é superior à da vizinhança. Pelo contrário,

no período diurno, é menor. • O balanço global em termos de evaporação depende da temperatura da água, podendo

mesmo ser negativo – resultado que está de acordo com alguns estudos• O impacto na precipitação acumulada, a esta escala, é nulo. Sobre a zona alagada há

uma ligeira diminuição, o que não está em contradição com a literatura• Outros efeitos, aceites na literatura, são confirmados:

– Diminuição da Amplitude térmica– Aumento da humidade relativa– Aumento da intensidade do vento; alongamento das rosas de vento; geração de

brisas

EPG Évora 2005

Conclusões

Para um caso concreto, simulações de alta resolução indicaram:•O efeito local pode ser mais significativo.•Uma diminuição do nevoeiro (por antecipação da dissipação) sobre a albufeira e um aumento a jusante (antecipação da sua formação, em massa de ar que atravessou a albufeira).•O efeito global acumulado no domínio continua marginal, mas com uma tendência para um ligeiro aumento da sua extensão e duração.

Infelizmente não dispomos de cálculo para efectuar um programa de simulações com esta resolução tão vasto como o anterior

O estudo evidenciou algumas limitações:•A inexistência de dados sobre a temperatura da superfície da água•A não inclusão de um modelo de evolução dessa mesma temperatura da água, não se representando assim o seu ciclo diário