almeida; mário duarte de releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

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INTRODUÇÃO Este trabalho tem como objetivo precípuo, obedecendo a uma formatação acadêmica mostrar, de maneira sistemática, o resultado da pesquisa teórica, assim como o prático, do estudo de tradições da cultura brasileira, destacando o folclore nordestino Guerreiro e reproduzir um fragmento desse brincante que é o chapéu, através da linguagem visual da Marchetaria. Não tem a pretensão de tornar-se um corolário sobre a temática, nem tampouco se tornar um manual de orientação à execução da linguagem apresentada, a marchetaria; mas tão somente, uma síntese de ambos assuntos. Procurei dar formatação sucinta ao conteúdo, uma vez que seu estudo demandaria muitas e muitas páginas, para não confundir o leitor. Não pretendo me aprofundar na composição física das cores, como veículo de expressão visual em si, ou como instrumento de comunicação estética, ou seja, da cor propriamente dita. Apesar de não utilizar cores à base de luz, ou pigmentos usando apenas as cores naturais da madeira que sofrem algumas interferências da mão humana ou da industrialização; desejei produzir uma leitura visual no plano bidimensional a partir de abstrações feitas em fotografias dos objetos em tridimensionalidade. Procurei realizar um trabalho que proporcionasse uma agradável visualização e uma fácil interpretação dos objetos reproduzidos. Utilizando apenas as cores e texturas naturais das lâminas de madeira, dei aos trabalhos ares de movimento e flutuabilidade, para imprimir ao observador um devaneio visual. Demonstrar na prática, essa forma de linguagem visual, utilizada há milhares de anos, a marchetaria, foi para mim um desafio. Primeiro, por não ter maiores conhecimentos acerca do assunto, e segundo, por utilizar apenas ferramentas manuais em noventa por cento dos trabalhos. Ferramentas simples, como estiletes e mini-formões. Além, de uma reduzida quantidade de matéria-prima, devido à falta de oferta em nossa região.

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Page 1: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo precípuo, obedecendo a uma formatação acadêmica

mostrar, de maneira sistemática, o resultado da pesquisa teórica, assim como o prático, do

estudo de tradições da cultura brasileira, destacando o folclore nordestino Guerreiro e

reproduzir um fragmento desse brincante que é o chapéu, através da linguagem visual da

Marchetaria.

Não tem a pretensão de tornar-se um corolário sobre a temática, nem tampouco se

tornar um manual de orientação à execução da linguagem apresentada, a marchetaria; mas tão

somente, uma síntese de ambos assuntos. Procurei dar formatação sucinta ao conteúdo, uma

vez que seu estudo demandaria muitas e muitas páginas, para não confundir o leitor. Não

pretendo me aprofundar na composição física das cores, como veículo de expressão visual em

si, ou como instrumento de comunicação estética, ou seja, da cor propriamente dita.

Apesar de não utilizar cores à base de luz, ou pigmentos – usando apenas as cores

naturais da madeira que sofrem algumas interferências da mão humana ou da industrialização;

desejei produzir uma leitura visual no plano bidimensional a partir de abstrações feitas em

fotografias dos objetos em tridimensionalidade.

Procurei realizar um trabalho que proporcionasse uma agradável visualização e uma

fácil interpretação dos objetos reproduzidos. Utilizando apenas as cores e texturas naturais das

lâminas de madeira, dei aos trabalhos ares de movimento e flutuabilidade, para imprimir ao

observador um devaneio visual.

Demonstrar na prática, essa forma de linguagem visual, utilizada há milhares de anos,

a marchetaria, foi para mim um desafio. Primeiro, por não ter maiores conhecimentos acerca

do assunto, e segundo, por utilizar apenas ferramentas manuais em noventa por cento dos

trabalhos. Ferramentas simples, como estiletes e mini-formões. Além, de uma reduzida

quantidade de matéria-prima, devido à falta de oferta em nossa região.

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É bem verdade que a variedade de cores das madeiras utilizadas possa haver sofrido

algum tipo de interferência da mão humana quando da industrialização da mesma, todavia,

isso não descaracteriza sua naturalidade.

Para mim, o resultado final, se apresentou rico em detalhes e contrastes tonais,

agradáveis à apreciação visual. E isso, só obtive graças a uma combinação prévia do material

disponível e, uma certa variedade de espécies de madeira, cujas constituições orgânicas

oferecem desde cores e texturas diferenciadas, à disposição de fibras e desenhos nas lâminas.

Tais madeiras, são extraídas da natureza, obedecendo algumas normas técnicas de

escolha, corte e segmentação. Para realizar este trabalho, tomei como referência temática já

citada acima, o chapéu do Guerreiro; e, procurei trabalhar na Marchetaria a composição de

painéis, observando os princípios estéticos de formas, cores e texturas dos originais. Os

resultados ora apresentados, sintetizam sobremaneira, minha abnegação em realizar este

trabalho. O estudo da composição visual obedeceu a alguns princípios técnicos e à quantidade

dos matizes cromáticos disponíveis. É de bom alvitre salientar que, em razão das dificuldades

na aquisição de uma maior variedades de cores, texturas e espécies de lâminas, tive de

reorganizar meu trabalho pensando na reduzida quantidade desse material. É claro, que com

uma maior diversidade de materiais e ferramentas, poder-si-a alcançar melhores

performances. Entretanto, acredito haver atingido meu objetivo, ao realizar artesanalmente

todo o processo produtivo. Somente em torno de dez por cento deste, foi utilizado maquinário.

Entendo haver cumprido o desafio, e justificada a temática escolhida, pela apresentação das

obras.

O objetivo deste trabalho é mostrar um fragmento do que é a cultura nordestina através

do folguedo Guerreiro. E isto se comprova agora com sua finalização e apresentação pública.

Fiz esta opção com a clara intenção de falar da cultura de maneira não muito abrangente, e

sim, apenas mostrar um fragmento dela, em linguagem visual da marchetaria. Foi uma missão

quase impossível, pois o assunto da temática é extenso e controverso. Existem várias

correntes de pesquisadores e estudiosos do assunto, o que deixa pairar dúvidas quanto à

origem, formação dos folguedos e divulgadores. Mas não posso prescindir das informações

básicas necessárias, para que o leitor entenda minha proposta. Procurei ser o mais equânime

possível no que tange aos comentários a respeito da temática e da linguagem.

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Ao fazer este trabalho pensei em avivar a memória de um folguedo que sempre

marcou minha infância. E, é para mim muito gratificante, porque me renova as esperanças de

ver reflorir na sociedade brasileira a cultuação às brincadeiras infantis, religiosas e de roda,

visto que isso faz parte da formação moral e cívica de um povo. Recentemente vi nos

telejornais que em São Paulo as professoras estão resgatando esses princípios fundamentais na

formação cultural das crianças. Ao resolver falar desse tema, entendi que de alguma maneira

estou contribuindo para o retorno de tais brincadeiras à baila do cotidiano das escolas.

Sei que este trabalho não ficará arquivado apenas nas prateleiras de alguma seção da

universidade, mas possivelmente será divulgado por alguém que entenda o que é cultura e

saiba o seu valor na formação de um povo, de um país e de uma nação. Uma rica cultura

como é a nordestina, e mais particularmente a alagoana, precisa ser conhecida por outros

rincões deste imenso território brasileiro.

É apenas uma sementinha que estou plantando das muitas que pretendo semear de

agora em diante, me tornando um divulgador da cultura nordestina por onde quer que venha

estar. Falar de uma dança, folguedo ou brincadeira nordestina me transporta no tempo, já que

no momento não posso estar no espaço, aos meus idos de criança. Só isso para mim, já

justifica a proposta de meu trabalho. Todavia, quando se torna um documento acadêmico de

maior consistência histórica, mais justificada está em relação à propositura acadêmica do

curso.

Falo do Guerreiro como temática, - centrado no adorno de cabeça -, mas também

discorro sobre outros que lhe deram origem. Falo da Marchetaria como arte milenar, mas

também cito alguns trechos de movimentos artísticos e suas particularidades. Cito diversos

artistas e escritores que sem suas referências bibliográficas e obras, talvez não houvesse

chegado a este fim.

Apenas a título de uma prévia informação ao leitor, quero salientar que o Guerreiro é

uma mistura de várias outras danças com conotação religiosa, mas que ao longo dos tempos

ganhou tons de profanidade. O Guerreiro também é uma arte, uma vez que se enquadra no

campo das danças dramáticas brasileiras e da música.

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E porque a marchetaria como linguagem de expressão? Bem, nos vários momentos de

reflexão na escolha do que deveria apresentar como linguagem de expressão visual, no

trabalho de final de curso, sempre me deparei com dificuldades em coadunar o tema com a

linguagem. E isso, me impulsionou ao desafio de encarar a marchetaria, pela sua peculiar

característica.

A Marchetaria me fascinou, por ser uma arte milenar em que a criatividade, a

paciência e a dedicação exclusiva, são atributos que não podem faltar quando de sua

elaboração. Tudo isso me deu coragem e determinação para chegar onde ora estou.

Apresentando este trabalho, com sua parte teórica e prática atendendo ao preconizado pelas

normas acadêmicas.

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CAPITULO I

DIVIDIR PARA SOMAR

1 - COMPOSIÇÃO DAS PARTES

1.1 – Elementos de composição

O que é compor algo? Etimologicamente falando, compor significa arrumar de forma

ordenada, partes diferentes ou iguais, dando uma nova estruturação ao todo. O Dicionário

Aurélio, (1975: 454) dispõe que: “Compor [Do lat. Componere.] V.t.d. 1.Formar ou construir

de diferentes partes, ou de várias coisas. 3. Produzir, inventar”.

Segundo o dicionário, numa concepção filosófica, e aí se faz necessário remeter à

teoria platonista, que diz podermos chegar a uma forma definida no campo físico, a partir de

uma concepção no campo do imaginário. Platão com sua teoria afirma que o que se forma no

campo do ideal pode ser transformado em real, isto é, para ele o campo do ideal é o campo da

razão, enquanto o do físico é o campo do sentimento. Esse campo do real, que segundo a

teoria platonista é o campo do sentimento, permite que o artista possa criar a partir de uma

idéia. Partindo desse conceito, as coisas imaginadas tomam sua forma definitiva, e aí se

concretizam.

Mas, para começar o processo de criação daquilo que foi imaginado, necessário se faz

que elaboremos uma composição do que será concretizado. E para isso necessitamos de várias

partes.

A essas partes chamarei de elementos de composição. Os que procurei empregar na

confecção de meu trabalho, são os que normalmente se usa quando da criação de uma obra de

arte. Seja ela de natureza bidimensional ou tridimensional. São elementos do desenho e da

forma. O desenho, inicialmente um esboço. A partir dele, a definição final do que será

executado na prática. Foi o que procurei fazer no processo de criação ou recriação do chapéu

do Guerreiro. E como os elementos que se dispõem ao desenho são: o ponto, a linha, as

formas geométricas de uma maneira geral, além da luz, sombra e cor, me dispus de tudo isso

para a minha composição.

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Também utilizei alguns fundamentos de desenho, no corte adequado da chapa de

MDF. Por exemplo, para o corte da chapa, cujas dimensões são de 2,70m por 2,20m, procurei

sistematizá-lo de forma que, aproveitasse o máximo do material. A perda total situou-se em

torno de um por cento. A placa foi dividida de tal maneira, que descontando o corte da serra e

os possíveis retalhos, consegui quinze pedaços retangulares medindo aproximadamente 0,60m

por 0,50m o que me proporcionou os suportes de medidas aproximadas ao que preconiza o

retângulo áureo.

O retângulo áureo é uma figura geométrica que apresenta as dimensões mais perfeitas

para utilização em telas quadros e painéis. Observando-se sua proporcionalidade. E isto tem

uma influência fundamental no que concerne ao processo de visualização do ser humano, em

cuja disposição facial situam-se os olhos, que formam proporcionalmente, um retângulo áureo

em disposição panorâmica. O artigo que explica esse conceito e traz uma demonstração

prática do exposto neste parágrafo, relativo ao retângulo, é realizada por SODRÉ e TOFFOLI

(2005). Observando as (Figuras 01 e 02) podemos melhor entender o gráfico que representa o

retângulo áureo. Não usei o rigor das medidas do referido retângulo para cortar e compor os

painéis, mas, procurei racionalmente aproveitar o material obedecendo a esse fundamento.

Figuras 01 e 02 - Gráficos de composição do retângulo áureo.

Fonte: http://pessoal.sercomtel.com.br/matematica/alegria/fibonacci/seqfib2.htm

Já no que concerne às lâminas de madeira, o que posso explanar, é que algumas foram

importadas de outro estado, com as seguintes dimensões: 0,31m X 0,31m X 0,001m. As

demais adquiridas na região. Algumas têm 0,40m de largura por 3,00m de comprimento e

0,001m de espessura, outras têm 0,30m de largura por 3,0m de comprimento e a mesma

espessura citada.

Para a composição dos painéis procurei me nortear no princípio do retângulo citado.

Mas o que é um painel? Explica CORTELAZZO (2005): “O painel é uma forma de

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apresentação dos resultados dos trabalhos realizados em torno de um tema”. Se tomarmos

como base que o homem é um animal de estatura erétil, e que sua área de visibilidade está

distribuída dentro da área de um retângulo áureo, isso me leva a crer que por ser um animal de

estatura erétil sua área de visualização é mais voltada para tudo que está na vertical. Por essa

razão, optei pela disposição retrato nos painéis. Isto se deve ao fato de que procurei distribuir

as imagens de maneira que o observador numa primeira olhada, possa definir o objeto

interposto no campo visual. A minha intenção é que na primeira leitura visual, ele possa

vislumbrar o motivo principal.

Para pessoas leigas ao folguedo Guerreiro, a primeira impressão que se tem das

imagens é de formas de igrejas, entretanto, logo se percebe que não existe a linha do

horizonte, que delimita o espaço do chão, e que demonstraria se tratar de um desenho

arquitetônico. Inexistente nos meus trabalhos, essa linha não divide o campo visual em espaço

e chão, dando ao observador a impressão de apenas um cosmo. E isso foi intencional, pois

queria que as figuras em Marchetaria representassem chapéus flutuando. E isso incomoda de

alguma forma, a primeira visualização da imagem. A supressão natural dessa linha, se deu

para levar o observador a vivenciar o movimento do objeto, como se estivesse vivendo o

momento do folguedo. Procurei aproximar o máximo o objeto, como se o estivesse

fotografando em zoom, reduzindo a visão do fundo par justificar minha intencionalidade.

Mas, numa olhada mais criteriosa, pode-se observar que se trata de outra imagem, e não de

um simples desenho arquitetônico. A imagem parece mover-se em rotação e translação,

segundo afirma FONTOURA (1962: 38): “Translação é o movimento de um corpo em que o

conjunto de seus pontos tem em cada instante a mesma velocidade e este mantém uma direção

constante”. Em outra conceituação FONTOURA (1962: 40) diz: “Rotação é o movimento de

um corpo em que o conjunto de seus pontos, em um instante determinado, descreve arcos de

circunferência cujos centros estão sobre uma mesma reta, denominados eixo instantâneo ou

simplesmente eixo de rotação”. Todas as figuras dos painéis insinuam movimento. Isto se

percebe pelas formas curvilíneas das fitas e pelo aspecto dos cortes em perspectiva. É a partir

daí, que o observador começa a abstrair conforme sua idealização e conhecimento.

Só numa segunda investida visual perceberá que está diante de um objeto que flutua, e

não diante de uma retratação arquitetônica de igreja ou de outro objeto. Pois se assim o fosse,

haveria a base ou linha de horizonte. Isto, se deve aos elementos de composição empregados

na realização da obra. Utilizei neste trabalho, vários elementos de composição como: o ponto,

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a linha, a perspectiva, o escorso, a deformação; finalmente, todos os elementos do desenho,

de maneira que pudesse dar leveza e movimento nas composições dos quadros.

Procurei situar o enquadramento de tal maneira, que imagens e formas se

apresentassem bem próximas do observador, remetendo-o a uma leitura visual próximo do

infinito. Capturei essas informações em alguns sites da Internet como o que destaco a seguir

SODRÉ E TOFFOLI (2005) no qual comentam:

Anexando dois quadrados com lado = 1, teremos um retângulo 2x1, sendo o

lado maior igual à soma dos lados dos quadrados anteriores. Anexamos agora

outro quadrado com lado = 2 (o maior lado do retângulo 2x1) e teremos um

retângulo 3x2. Continuamos a anexar quadrados com lados iguais ao maior

dos comprimentos dos retângulos obtidos no passo anterior. A seqüência dos

lados dos próximos quadrados é: 3,5,8,13,... que é a seqüência de Fibonacci.

Procuro demonstrar com este trabalho, o que se situa entre o imaginário e o real. Na

minha concepção, é um trabalho metafísico do ponto de vista filosófico. Metafísico, porque

parto do imaginário daquilo que quero representar, para a realidade do que apresento: (meta:

além, e física: matéria). Ou seja, a obra não quer ser apenas uma mimese do real, ela é em si, a

síntese do que foi concebida no campo do ideal. O Mito da Caverna narrado por PLATÃO

(2004: 225) é, talvez, uma das mais poderosas metáforas imaginadas pela filosofia, em

qualquer tempo, para descrever a situação geral em que se encontra o homem. Para o filósofo,

todos nós estamos condenados a ver sombras a nossa frente e tomá-las como verdadeiras.

Essa poderosa crítica escrita há quase 2500 anos atrás, narra a condição em que o homem se

encontra diante do inusitado, inspirou e ainda inspira inúmeras reflexões pelos tempos afora.

Quero salientar, que meu trabalho pode parecer confuso do ponto de vista estético e

estrutural, mas certamente com um olhar mais acurado o observador notará que está diante de

algo que representa o que se propõe. O trabalho na sua organização visual, traz elementos de

composição como o escorso, a profundidade, a vista em corte, a linha, o ponto etc. Conforme

já disse anteriormente. Além dos elementos geométricos em várias configurações. Também

podem ser percebidas, a cor, a luz e a sombra.

Todavia, para alguns observadores pode parecer obscura a leitura visual. Talvez pela

falta de conhecimento daquilo que quero retratar, - o chapéu do guerreiro. Reportando-me à

fábula de Platão, a uma primeira olhada, parece ao observador leigo, como as sombras da

caverna de Platão. Porém, após uma melhor reflexão, revelará imagens do real, do mundo da

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luz, citado no exemplo. Dependerá da capacidade interpretativa de cada observador. Mas não

tenho o compromisso de justificar a capacidade ou não de cada indivíduo, uma vez que a arte

não tem compromisso com a verdade, ela é mimética na suas essência. Depende do grau de

assimilação que cada um possa ter como no caso dos homens da caverna. E para justificar esta

colocação, tomei como base o seguinte trecho do artigo de SCHILLING (2005) mas que li no

livro VII de a Republica de PLATÃO (2004: 225):

Platão viu a maioria da humanidade condenada a uma infeliz condição.

Imaginou (no Livro VII de A República, um diálogo escrito entre 380-370

a.C.) todos presos desde a infância no fundo de uma caverna, imobilizados,

obrigados pelas correntes que os atavam a olharem sempre a parede em frente.

O que veriam então? Supondo a seguir que existissem algumas pessoas, uns

prisioneiros, carregando para lá para cá, sobre suas cabeças, estatuetas de

homens, de animais, vasos, bacias e outros vasilhames, por detrás do muro

onde os demais estavam encadeados, havendo ainda uma escassa iluminação

vinda do fundo do subterrâneo, disse que os habitantes daquele triste lugar só

poderiam enxergar o bruxuleio das sombras daqueles objetos, surgindo e se

desfazendo diante deles. Era assim que viviam os homens, concluiu ele.

Acreditavam que as imagens fantasmagóricas que apareciam aos seus olhos

(que Platão chama de ídolos) eram verdadeiras, tomando o espectro pela

realidade. A sua existência era pois inteiramente dominada pela ignorância

(agnóia). Se por um acaso, segue Platão na sua narrativa, alguém resolvesse

libertar um daqueles pobres diabos da sua pesarosa ignorância e o levasse

ainda que arrastado para longe daquela caverna, o que poderia então lhe

suceder? Num primeiro momento, chegando do lado de fora, ele nada

enxergaria, ofuscado pela extrema luminosidade do exuberante Hélio, o Sol,

que tudo pode, que tudo provê e vê. Mas, depois, livre aclimatado, ele iria

desvendando aos poucos, como se fosse alguém que lentamente recuperasse a

visão; as manchas, as imagens, e, finalmente, uma infinidade outra de objetos

maravilhosos que o cercavam. Assim, ainda estupefato, ele se depararia com a

existência de um outro mundo, totalmente oposto ao do subterrâneo em que

fora criado. O universo da ciência (gnose) e o do conhecimento (espiteme),

por inteiro, se escancarava perante ele, podendo então vislumbrar e

embevecer-se com o mundo das formas perfeitas. site:

educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/caverna.htm

A estética do meu trabalho, é indissociável da teoria das idéias. Pois sua composição

estética surge no campo do ideal, não é uma cópia daquilo que se baseia, mas uma nova

criação, a partir de um modelo. É a partir de sua idealização no campo do imaginário, que

fica evidenciada a nova forma, agora real. Ela se apresenta ao observador como algo novo,

pois já fluiu do campo do imaginário, (razão) para tomar sua forma definitiva no campo do

real (sentimento) situada por assim dizer como matéria, posta no campo dos sentidos que

Platão preconizava, uma vez que agora pode ser vista tocada e sentida. E a essa nova

composição, atribuo um novo valor estético. Segundo FONTES (2005): PLATÃO dizia:

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“Como as idéias são imutáveis e eternas, se pretendemos apreciar as obras de arte devemos

seguir estes princípios, exigindo que elas se aproximem das idéias, o mesmo é dizer da

perfeição”. Neste sentido, Platão não pode admitir qualquer mudança ou inovação no campo

artístico. Entretanto, quero destacar como síntese do meu trabalho, inúmeros pensamentos e

antevisões daquilo que vivenciei. E não mudo minhas pretensões, por entender que elas só se

tornarão arte, a partir dessa tomada de decisão. Não só juntei partes (etimologicamente

falando) ao rejuntar retalhos de madeira e compor uma nova figura; fui mais além, rejuntei

partes distintas de um todo fragmentado, quero dizer, de minhas lembranças; e, rejuntando-as

novamente imprimi-lhes uma nova forma num trabalho difícil e meticuloso. Procurei dar uma

nova cara ao ornato de cabeça usado no Guerreiro, como também, juntei fragmentos de vida,

numa nova dimensionalidade visual que se concretiza na elaboração de cada quadro.

Ao dividir cada lâmina de madeira, em pequenos pedaços e tiras, para depois compor

uma nova imagem; pude sentir o prazer de realizar o meu trabalho. Percebi, que mesmo com

retalhos esparsos de madeira, é possível se produzir uma forma esteticamente equilibrada, e,

que possa proporcionar prazer visual ao observador. E, é isso que cada painel se propõe. É a

síntese do trabalho meticuloso e paciente, onde o amor, a paciência e a dedicação exclusiva

podem agregar à obra, o sentimento de que Platão fala. E esse sentimento que sai do meu

interior (campo do imaginário e da razão) pode fluir da própria obra em direção ao observador

quando visualizá-la, que certamente fruirá seu conteúdo estético refazendo o caminho inverso

da teoria platônica.

Efetuar uma composição pictórica, a partir de partes distintas de delgadas lâminas de

madeira, de cores e textura variadas, e, se chegar a uma nova composição visual, foi muito

interessante e gratificante. Cada passo dado, sentia uma nova emoção! E a satisfação pelo

objetivo alcançado não podia ser outra, senão a esperada.

Uma vez recortadas as partes conforme as necessidades, procurei compor imagens e

dar-lhes forma e expressão visual organizada e harmônica. Neste trabalho de composição em

mosaico, agrego algumas sutilezas, que de alguma forma dão conotações do impressionismo,

do expressionismo e do cubismo.

Do impressionismo, porque parto do meu olhar exterior ao modelo, e o transporto para

o consciente onde elabora no campo do imaginário o que vou reproduzir no suporte. Dessa

forma, as características do impressionismo, que se envolvem neste caso, são a impressão que

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abstraio do modelo e transformo em outras formas. Uma das premissas do impressionismo, é

que a impressão é um movimento do exterior para o interior, ou seja, é a realidade do objeto

que se imprime na mente do sujeito.

A arte alegre vibrante e moderna dos impressionistas, enche os olhos de cor e luz.

Prevalecem a luz e a cor natural. É a presença da natureza, a transparência luminosa, a

claridade das cores. É a sugestão de felicidade e de vida harmoniosa que transparece nas

imagens criadas pelos impressionistas. É isto que acontece no momento que olho o trabalho.

Obviamente não possui a transparência visual, pois são feitos de materiais opacos, mas existe

uma certa transparência no campo do imaginário.

Do ponto de vista expressionista, o movimento acontece ao contrário, ele parte do

interior para o exterior, e isso, de alguma forma é o que tento passar no trabalho. O

Expressionismo é a arte do instinto, trata-se de uma arte dramática, subjetiva, “expressando”

sentimentos humanos. Tento transmitir ao observador meus sentimentos e vivências. Ao ver

os trabalhos, mesmo um leigo em relação a arte, se remete imediatamente à religião, e isto se

dá, pelas características visuais da obra.

Já do ponto de vista cubista, a própria disposição dos retalhos de madeira, formando

uma imagem às vezes indecifrável aos olhos do observador, um verdadeiro mosaico; remete

àquele. O artista cubista tenta representar os objetos em três dimensões, numa superfície

plana, sob formas geométricas, com o predomínio de linhas retas. Não representa, mas sugere

a estrutura dos corpos ou objetos. Representa-os como se movimentassem em torno deles,

vendo-os sob todos os ângulos visuais, por cima e por baixo, percebendo todos os planos e

volumes. Não é o que minhas imagens retratam com uma fidelidade, porém, remete-se ao

cubismo quando verificadas as formas e, percebe-se que flutuam livres e como se estivessem

em movimento. É aí, que o observador mais atento vai logo entender não se tratar de uma

representação arquitetônica, cujo fundamento básico seria a linha delimitadora do horizonte.

Nos meus trabalhos, essa linha não existe, pois intencionalmente quis induzir o observador a

um mergulho imaginário no cosmo, como dito anteriormente.

O leitor mais familiarizado com as artes logo perceberá essas características; mas,

entendi necessária esta explicação, uma vez que nem todos, têm o conhecimento da história

da arte de tal modo que possa vislumbrar à primeira vista o exposto.

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Quanto à utilização do campo visual disponível nos painéis, procurei ocupar de tal

maneira que deixasse destacado o meu motivo pictórico. Procurei compor de tal forma que,

os contrastes de luz e sombra, como também da cor e seus matizes, surgissem ao ritmo da

disponibilidade do material. Obedeci à minha intuição e ao que diz SILVA, (2005) quando

afirma:

Num quadro, todas as partes serão visíveis e desempenharão o papel que lhes

é atribuído, seja ele principal ou secundário. Tudo o que não é útil no quadro é

prejudicial. Uma obra de arte deve ser harmoniosa em sua totalidade; pois os

detalhes supérfluos, na mente do espectador, usurpariam os elementos

essenciais.

Nas composições que formulei, procurei ocupar todo o espaço visual, de forma que o

espectador possa melhor aproveitar a disposição dos objetos, bem como de suas interposições

cromáticas. A partir de uma idealização do mosaico, e utilizando o material disponível,

procurei compor os painéis de maneira que não deixasse se distanciar demais das formas que

serviram como referenciação. A composição deveria refletir parte do que estava reproduzindo.

Daí, me centrar de certa maneira, na reprodução abstrata dos meus modelos. Novamente em

SILVA, (2005) encontra-se:

O lugar ocupado por figuras ou objetos, o espaço vazio em torno deles, as

proporções, tudo desempenha um papel. A composição é a arte de dispor, de

maneira decorativa, os vários elementos à disposição do pintor para a

expressão de seus sentimentos.

Procurei dispor nos meus trabalhos, formas de fácil interpretação visual, porém,

imprimi a estas, minhas características pessoais, o que de certa maneira, traduz o que foi

preconizado por MATISSE na citação anterior. Já em relação à expressividade das formas por

mim adotadas nos painéis, parto do pressuposto de que na arte cada um deve procurar seu

estilo, para assim, poder logo imprimir a seus trabalhos sua marca como objeto de

identificação pessoal, e, que de certa forma dita a personalização artística. E fui buscar esta

premissa em OSTROWER, (1990: 16), o grifo é meu:

Na arte, as formas expressivas são sempre formas de estilo, formas de

linguagem, formas de condensação de experiências, formas poéticas e,

nesse sentido, também as palavras, das poesias, ou de níveis poéticos,

devem ser entendidas como formas verbais- (...).

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1.2 – COMPOSIÇÃO ATRAVÉS DA TÉCNICA DO MOSAICO

A origem do mosaico vem do latim musa, que também proporcionou música e museu.

Está entre as primeiras manifestações elevadas do ser humano, tais como a pintura ou a

escultura. Arqueólogos e estudiosos costumam datar os primeiros mosaicos em painéis do

século V a.C., encontrados na Suméria. Quando os gregos fundaram estabelecimentos

coloniais no sul da Itália, entraram em contato com uma vastidão de mármores, que logo se

tornou matéria-prima para a ornamentação de pavimentos e paredes. Os romanos

aprofundaram seu uso, difundindo-o por todo o mundo sob seu domínio, desde os confins da

Ásia Menor até a Lusitânia (Portugal), onde hoje ainda se encontram vestígios, muitos bem

conservados especialmente em Conímbriga próximo à cidade de Coimbra. Internet

ALIBERTI (2005).

O primeiro trabalho em mosaico foi realizado pelos sumérios há 5000 anos. Este povo,

originário do Oriente, criou pilastras revestidas com cones de argila colorida e fixadas em

massa. Os motivos eram geométricos e mostravam inspiração na arte da tapeçaria.

Aproximadamente 300 anos a.C., os gregos já formavam quadros de pequenos seixos brancos,

pretos e vermelhos com cenas de luta e caça, além de motivos mitológicos. Desde então, o

homem tem usado pedaços de pedra, cerâmica, vidro, conchas e os mais diferentes materiais

para criar mosaico.

Antigamente a técnica do trabalho em mosaico consistia na colocação de fragmentos

de mármore ou de pasta vítrea de diferentes cores sobre o piso de cimento, composto de várias

camadas de lama misturada com seixos e com uma leve cobertura de gesso. O artista

procurava as linhas do desenho esboçado sobre o gesso e demonstrava sua perícia em

desenvolver formas e cores, além de conseguir contraste de sombra e luz. Em geral os

mosaicos eram executados no local, embora a figura central que requeria uma mão-de-obra

acurada em materiais mais refinados, fosse preparada sobre o desenho de um painel especial

na oficina do artesão e depois inserida dentro do local escolhido.

Page 14: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

14

Para a realização de um mosaico podem se distinguir três etapas importantes. O

desenho do mosaico é a primeira e através dele deve-se preparar, em papel, um esboço em

escala inferior do tamanho real da peça desejada.

A próxima etapa é o traslado deste desenho para a superfície escolhida. Amplia-se, a

lápis, a escala real do desenho para o local onde o mosaico será instalado. Por último, realiza-

se a colocação das pastilhas mediante dois métodos distintos para a instalação: direto e

indireto. A partir de 40 a.C. a Itália torna-se o maior centro de produção de mosaicos. Ele era

utilizado principalmente em motivos religiosos, revestindo pisos e paredes. Ravena é umas

das cidades italianas onde se encontram mosaicos maravilhosos. O mosaico bizantino utiliza

muito o tom dourado e prateado e foi utilizado principalmente no revestimento de tetos de

igrejas. No Brasil o mosaico foi utilizado por Cândido Portinari, Di Cavalcanti e Tomie

Ohtake em diversas de suas obras. Ele ainda é utilizado, principalmente na construção civil

em imensos painéis, na decoração de piscinas e em pisos e paredes dos mais diversos

ambientes. ESTHER (2005) Internet.

Paulo Werneck (1907 / 1987) nasceu no Rio em 29 de julho. Foi pintor, desenhista e

ilustrador de livros infantis e colunas políticas de diversos jornais. Autodidata, Paulo Werneck

introduziu no Brasil a técnica do mosaico. Contribuiu com seus murais para projetos de

arquitetos como Oscar Niemeyer, Marcelo, Milton e Maurício Roberto. Dentre os painéis

realizados destacam-se os localizados nos edifícios Ministério da Fazenda, Seguradoras,

Marques do Herval, Banco Boavista, no Rio, na Igreja São Francisco de Assis, na Pampulha,

e no Palácio do Itamaraty, em Brasília. Paulo Werneck foi um incansável colaborador do

Modernismo. Como ilustrador Paulo Werneck publicou duas lendas brasileiras – Negrinho do

Pastoreio (1941) e Lenda da Carnaubeira (1939). Esta última foi também publicada nos

Estados Unidos pela editora Grosset & Dunlap (1940). (Figura 03). Internet WERNECK

(2005).

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15

Figura 03 – Mosaico de Paulo Werneck

Fonte:www.projetopaulowerneck.com.br

Procurei referenciar artistas brasileiros por entender que dessa forma estou valorizando

o que temos de melhor em nossa sociedade. Paulo Werneck é um artista conhecido no meio

artístico brasileiro como também no campo literário com vários trabalhos publicados.

Também procurei informações a respeito de um marcheteiro que trabalhasse essa arte mais no

aspecto mosaicista. E encontrei na obra de Marcos Resende o que buscava para me

referenciar. Até porque, sendo ele um artista admirador de Volpi, pois suas obras carregam

fortes traços de identidade com aquele, entendi que deveria citá-lo porque também vejo em

minha obra alguma semelhança com a obra de Volpi, pois as fitas multicoloridas dos quadros

lembram de certa forma as bandeirinhas. Não quero que leitor entenda que meu trabalho tenha

verossimilhança com o do Grande Mestre Volpi, até porque, as linguagens são bem distintas,

porém, existe uma pequena lembrança daquele no que se refere aos contrastes de cores nas

fitas dos chapéus com as bandeirinhas. (Figura 04).

Figura 04 - Pintura de bandeirinhas de Alfredo Volpi

Fonte: www.pinturabrasileira.com/artistas

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16

1.3- MARCHETARIA – O MOSAICO DE MADEIRA

O que é marchetaria e onde surgiu? O termo Marchetaria refere-se cortar, encaixar e

colar, especialmente pedaços ou lâminas de madeiras sobre uma superfície sólida, para então,

montar um projeto decorativo de acordo com as tendências próprias do artesão. Este termo do

francês, marqueter, quer dizer embutir.

A origem da marchetaria é desconhecida, porém sua atribuição é dada à França por

haver difundido a arte pelo resto do mundo. Desde a época dos Egípcios já se praticava a

Marchetaria. Data de aproximadamente 3000 anos atrás. Caixas de alto requinte, painéis e

mobílias decorativas enriqueceram os projetos nos palácios e templos da época.

Confeccionados em madeiras coloridas, muitas dessas peças, foram deixadas nas pirâmides,

mais tarde descobertas pelos arqueólogos.

Outros exemplares de Marchetaria apareceram na Ásia Menor em torno de 350 A.C.,

cujas peças foram desenvolvidas em mármore. Por simples definição, a arte da marchetaria

consiste em envolver uma determinada área com pequenos pedaços de madeira coloridas de

diferentes tipos que depois de cortadas, são devidamente embutidas ou coladas lado a lado,

posteriormente recebendo um acabamento.

Depois da queda do Império Romano, poucas oficinas sobreviveram na Itália. Nos

séculos 14 e 15 foram criadas algumas escolas de marchetaria na cidade de Florença, cujo

exterior das peças eram moldados com o formão. Somente com a criação de associações da

marcheteiros é que a arte pode se sustentar de forma mais perene. Inicialmente criadas na

Europa, foram se espalhando pelo resto do planeta nos demais continentes. Melhores

informações serão apresentadas em capítulos específicos.

O objetivo de realizar este trabalho, é trazer alguma informação aqui para a região, do

que é um a cultura nordestina, apresentando um fragmento dela em linguagem plástica. E,

também resgatar de forma artística acadêmica, a milenar arte da marchetaria.

Procurando conhecer melhor a produção em Marchetaria no Brasil, investiguei sobre

os artistas que têm trabalhos nessa técnica e encontrei Marco Resende. Nascido no Rio de

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17

Janeiro em 1966, Artista Plástico e Restaurador de obras de arte, iniciou sua carreira em 1984,

cursando Arquitetura na Universidade Santa Úrsula- RJ, logo depois passando a dedicar-se ao

estudo da pintura na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, onde teve aulas com

importantes artistas contemporâneos, como Daniel Senise, Charles Watson e Gianguido

Bonfanti, entre outros. No ano de 2000 coordenou o trabalho de restauração de cerca de 600

m² do assoalho de madeira em Parquet marchetado das salas do Palácio das Laranjeiras,

residência oficial do Governador do Rio de Janeiro.

Desde então vem utilizando a madeira em seu trabalho como artista, que se baseia nos

princípios do Construtivismo. Na Figura 05, podemos ver trabalho do artista em Marchetaria

que caracteriza sobremaneira a arte do mosaico, só que em madeira.

Figura 05 -Trabalho de Marco Resende em marchetaria

Fonte: www.volpigaleriadearte.com.br

O meu trabalho não representa as características mais marcantes do mosaico

propriamente dito, entretanto carregam em seu bojo, uma forte tendência mosaicista, haja

vista a variedade de formas cores e disposições das partes. Na elaboração do trabalho em

madeira, procurei obedecer a uma seqüência básica de confecção dos quadros ou painéis.

Primeiramente, como já citei anteriormente, produzi no campo das idéais, aquilo que

pretendia retratar na prática e na linguagem que escolhi. Depois, numa segunda fase,

vislumbrei todo o processo de execução. Desde que material iria utilizar até como deveria ser

o desfecho final. Numa terceira fase, já de posse do material, e ferramentas, parti para a

execução do trabalho.

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18

Primeiro escolhi os modelos que pretendia reproduzir, depois segui as técnicas

normais da Marchetaria. Porém, à medida que ia realizando o trabalho, diversos fatores

inesperados iam surgindo e tive de contorná-los adequando-os às minhas reais possibilidades,

conforme exposição detalhada no item 1, deste capítulo. Outros detalhes serão relatados na

parte que falo sobre a confecção de cada quadro no capitulo III.

1.4 – GUERREIRO – COR, FORMA E MOVIMENTO

Entendo ser interessante, que o leitor tome conhecimento da temática deste trabalho

que é o chapéu do Guerreiro, e, como conseqüência possa conhecer melhor um pouco da

cultura e arte nordestina, em especial a alagoana que conforme ANDRADE, (1959: 22), é:

“Uma das manifestações mais características da música popular brasileira são as nossas

danças-dramáticas”. Guerreiro”1, é um folguedo natalino de caráter dramático profano-

religioso.

Antigamente era formado por aproximadamente sessenta figurantes, mas com o

passar do tempo, e o advento da mídia eletrônica que invade os lares populares do nordeste, e

a difusão desenfreada das culturas ditas modernas como o axé-music, os trios elétricos e o

carnaval, o culto às festas folclóricas tem diminuído assustadoramente, colocando em risco de

extinção essas danças folclóricas ricas em história, musicalidade e poesia.

Hoje, esses números variam entre 25 e 35 componentes. O Guerreiro é um grupo de

dançadores e cantadores, surgido pelo sincretismo do “Reisado”2 alagoano, junto ao já

1-Guerreiro: Grupo multicolorido de dançadores e cantadores, semelhantes aos do Reisado, mas com maior

número de figurantes, maior riqueza nos trajes e mais música. Surgiu em Alagoas, entre os anos de 1927 e 1929,

sendo resultado da fusão de reisados e pastoris. Possui em média, 46 personagens entre rei, rainha, mestre,

contra-mestre, palhaço, etc.

2-Reisado: De origem portuguesa, no período natalino, músicos e dançadores vão de casa em casa anunciando o

nascimento de Jesus. Os reisados aparecem durante o ciclo de Natal, a partir da Bahia, pelos estados do Nordeste

até o Piauí. Seguem a mesma tradição secular ibérica, indo de casa em casa, fazendo em cantoria a pedição de

abertura de porta e louvação aos donos das casas. Cantam o nascimento do Menino Jesus, numa fusão de temas

sacros e profanos.

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19

desaparecido “Cabocolinhos”3, e ainda com subsídios temáticos das Cheganças, Pastoril e do

Bumba-meu-boi. Comporta também o maior número de figurantes e episódios, tendo mais

riqueza de peças e cores em seus trajes bem como mais melodia e poesia musical. Muitos

estudiosos do Folclore, costumam dizer se tratar de um "Reisado Moderno", podendo ele, o

“Guerreiro” substituir ambos, “Cabocolinhos” e “Reisado” tornando-se assim, um único

folguedo. Quero destacar o que diz LIMA (1962: 99): “O Guerreiro tem a estrutura básica dos

reisados com danças, cantos,’entremeios’ dramáticos etc.”. Essa afirmação de que o Guerreiro

é uma espécie de Reisado, já dá um certo direcionamento ao objeto de estudo da temática.

É uma espécie de dança dramática, com cantorias alegóricas relacionadas com os

festejos de natal que passeia pelas ruas do bairro ou cidade, indo de porta em porta e fazendo

louvação ao menino Jesus. Mas, como suas raízes remontam a outros folguedos como: o

Reisado, o Caboclinhos, a Chegança4, o Pastoril

5 o Bumba-meu-boi

6 etc., sua estruturação

poética é mais complexa e extensiva. Pode-se encontrar no Guerreiro, figuras da nobreza

como a Rainha7; do poder repressor, como é o caso das cheganças, simbolizada pelo General

8;

das comunidades silvícolas que habitavam a costa brasileira na figura do Índio9; da

3-Caboclinhos: São grupos de homens e mulheres, com cocares de penas de ema, pavão e avestruz. São caboclos

que evoluem nas ruas em duas filas, ao som dos estalidos secos das preacas - um objeto que reproduz o arco e a

flecha e que emite um estalido quando percutido. A manifestação dos caboclinhos é uma representação do povo

indígena e é, também, um dos mais antigos bailados populares do Brasil. Os caboclinhos preservam passos e

danças nativas que se somaram às influências européia e negra.

4-A Chegança tem sua origem na reconquista espanhola na luta travada entre cristãos e mouros. É apresentada

sempre no ciclo natalino. Trata-se de um folguedo antigo, cuja ação transcorre em terra, onde está o quartel da

mourama, e no mar, por onde chega a cristandade. São muitos os cânticos de rua, incluindo a saudação e a

despedida, e os cânticos embarcados, por parte dos cristãos.

5-Os Pastoris são danças e cantos que por ocasião das festas de Natal se realizam em homenagem ao Deus

Menino.Em geral se desenvolve; defronte de um Presépio ou em tablados, em praça pública. É um rancho alegre,

de meninas, mocinhas, que ano após ano, entoam ao Menino Jesus.

6-Dança dramática presente em várias festividades, como o Natal e as festas juninas, o bumba-meu-boi tem

características diferentes e recebe inclusive denominações distintas de acordo com a localidade em que é

apresentado: no Piauí e no Maranhão, chama-se bumba-meu-boi; na Amazônia, boi-bumbá; em Santa Catarina,

boi-de-mamão; no Recife, é o boi-calemba e no Estado do Rio de Janeiro, folguedo-do-boi.

7-Às vezes aparecem em um número de três: Rainha dos Guerreiros, Rainha dos Caboclos, Rainha da Nação.

Além de sua própria patente, elas coordenam as demais figuras.

8-Responsável pela harmonia do Guerreiro, são os apaziguadores do grupo.

9-Índio peri e seus dois vassalos: No Guerreiro substitui a Guerra dos Reisados, baseado na prisão, e, às vezes

morte de um guerreiro inimigo. Então, surge a guerra, que tem um bailado de grande beleza, onde os figurantes e

o Índio Peri digladiam-se.

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20

comunidade fidalga aqui representada pela Lira10

e os Mateus11

, espécie de intermediário

entre o Guerreiro e o Rei. ANDRADE, (1959: 21) escreve:

Uma das manifestações mais características da música popular brasileira são

as nossas danças dramáticas (1)”. (...) Possuímos um grupo numeroso de

bailados, todos eles providos de maior ou menor entrecho dramático, textos,

músicas e danças próprias. E se me fatiga bastante, pela sua precariedade

contemporânea, afirmar que o povo brasileiro é formado das três correntes:

portuguesa, africana e ameríndia, sempre é comovente verificar que apenas

essas três bases étnicas o povo celebra secularmente em suas danças

dramáticas. (...) Aliás a verdade mais fundamental. A meu ver, é que nenhum

dos dramas cantados do nosso povo tem origem profana. “O drama popular é

de origem religiosa”, generaliza Heggert Krappe (1, p. 308), o que implica

aliás todo o teatro erudito. Porque se existe fenômeno típico de

desnivelamento dum gênero artístico, é o teatro folclórico. Ele nasce como

imposição de grupos dominantes que, na celebração, ensinam por meio do

mimetismo dramático a vida imperante dos espíritos, dos deuses. Assim, não

é a profanidade do heroísmo, da coragem, dos feitos históricos tradições e

costumes raciais que provocou a fundação das nossas danças dramáticas.

Todas são de fundo religioso. Ou melhor dizendo: o tema, o assunto de cada

bailado é conjuntamente profano religioso, nisso de representar ao mesmo

tempo um fator prático, imediatamente condicionado a uma transfiguração

religiosa.

Percebe-se que, as danças dramáticas brasileiras têm origem nas epopéias vividas

pelos povos que formaram a raça brasileira, a partir, das narradas conquistas ibero-

americanas, assim como, das conquistas dos europeus, em solos brasileiros e das guerras

travadas pelos Mouros12

e Cristãos ainda em terras distantes.

Uma vez miscigenada as raças, muitas danças foram sendo elaboradas à guisa dos

enredos que envolviam cada cultura regional. Se tiver origem profana ou religiosa, a ótica

aqui nesse momento não nos interessa, o que realmente vem à tona, é a capacidade do povo

brasileiro criar em cima de suas conjecturas de vida. Andrade, (1959: 22):

Gilberto Freyre lembra que o antagonismo racial, regional ou de classe, como

entre Cristãos e Mouros “se origina ou se alimenta é quase sempre de

antagonismos econômicos (...) mas foi pela mística religiosa que o movimento

de reconquista se definiu. Cristãos contra infiéis”. É o que se dá também, às

10

- Trazida pelo Rei dos Guerreiros, ela é ameaçada de morte pelo caboclinho a mando da Rainha, por estar com

ciúme do Rei.

11

- Às vezes aparecem em dois, eles são responsáveis pelo contrato do Guerreiro. Na dança eles cantam e

grosam. 12

- Os muçulmanos eram também designados como sarracenos (e também por mouros, embora este último

termo designasse mais corretamente os muçulmanos naturais do Magrebe que se encontravam na Península

Ibérica).

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21

mais das vezes, com as criações artísticas populares. A realidade econômica,

o fator prático, é insuficiente pra criar a manifestação artística que vai se

tornar coletiva, porque as artes não aplicadas imediatamente, são de si

mesmas e pela sua função, misteriosas e inexplicáveis. E para a mentalidade

popular, que nisso coincide com a mentalidade primitiva, o mistério pode

explicar outro mistério ou qualquer realidade. É o que fazem as artes como as

religiões.Mas não sei que nunca uma realidade pudesse explicar

folclòricamente um mistério. De forma que uma razão econômica não seria

satisfatória pra justificar a existência duma manifestação artística. Explicar o

ódio ao Mouro e a Chegança de Mouros por questão de propriedade de terras

e riquezas a conquistar, é demasiado probante e simplista para o

complicadíssimo homem popular. E não explica de fato nada, porque não é

uma explicação permanente, estável, que sirva em qualquer ocasião.Não

explica principalmente o ódio, que permanece mesmo depois da vitória. A

explicação realista é clara e insolúvel por demais pra ser aplicada às mil e

uma cambiantes dos fenômenos da vida coletiva. Não tem mistério não tem

simbólica (2).

A partir do exposto acima, percebe-se claramente, que a origem das danças e bailados

brasileiros, que mais tarde foram tornando-se peças do nosso rico folclore, têm origem ainda

em terras do além mar. Na Europa ibero-asiática, onde os movimentos de lutas entre Mouros e

Cristãos se davam, à espreita de conquistas de terras e riquezas, se criaram-se determinados

hábitos e costumes que vieram aportar em nosso solo, por ocasião da descoberta do Brasil.

Na chegança tradicional do nordeste, os mouros, com suas roupas vermelhas, seus

armamentos, não cantam, salvo quando, depois de vencidos e batizados, repetem o coro dos

cristãos, como um pedido de clemência. A grande profusão de folguedos que hoje podemos

verificar em nossa cultura brasileira, se originou a partir dessas sagas. E o “Reisado”, que é

uma forma de expressão artística teatral, tem origem nessas lutas entre reinados euro-

asiáticos. Naqueles tempos, era comum um povo invadir os domínios de outros povos em

busca de riquezas e conquistas de espaços.

As danças dramáticas brasileiras, hoje denominadas folguedos, em sua maioria

carregam nitidamente em suas roupagens e cantorias, marcas que denotam a presença das

realezas européias e de outros povos, como os afros e os médio-asiáticos. Estes últimos, pela

sua penetração e conquista de parte da Europa, (Portugal) e península ibérica chegaram ao

Brasil através da colonização. Por essa razão, notam-se em algumas danças dramáticas,

aspectos que lembram fortemente os costumes e rituais daqueles povos. Já o folguedo

“Caboclinhos”, que é de origem estritamente brasileira, apresenta características da

coletividade indígena brasileira, entretanto. Sua ornamentação básica, é o uso de produtos

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22

advindos da flora e da fauna brasileiras. Penas de animais multicoloridos, sementes, cores

extraídas das plantas dão à indumentária desse folguedo o toque de particularidade que lhe é

peculiar. Mais tarde foi tomando outra conotação profano-religiosa e se tornou um bailado de

louvação festiva carnavalesca. Assim também sua indumentária foi agregando produtos de

origem industrial ao seu enredo e vestimentas.

O “Guerreiro” que é referenciado neste trabalho, tem como origem a fusão

inicialmente destas duas correntes dançantes, numa nova forma de expressão artístico-

religiosa, tem algumas figuras do povo negro ocupando lugar, mesmo que de forma sutil, nas

diversas passagens. Na Figura 06 pode-se perceber o uso dos adornos e vestimentas do

Guerreiro.

Figura 06 - Guerreira em evolução.

Fonte: www.ufal.br/guerreiropornatureza/fotos3.htm

1.4.1 – A origem

Conforme estudos de THÉO BRANDÃO citado em TAVARES (1962: 99) o

Guerreiro surgiu em Alagoas no final da década de 20 do século XX, formado através da

fusão de outros folguedos: o Auto dos Cabocolinhos, o Reisado, a Chegança e dos Pastoris. É

um grupo de cantadores e dançadores acompanhado pela sanfona, tambor e pandeiros que se

apresentam com vestimentas coloridas geralmente nos festejos natalinos.

Incorporando o Reisado, algumas figuras dos Caboclinhos, outras da Chegança, umas

do Pastoril, inventaram cantos mais animados à base da improvisação, aparecendo então o

atual Guerreiro. O Folguedo possui diversas figuras, entre elas a Lira, a Rainha, a Sereia, o

Índio Peri, os Vassalos, a Borboleta, o General e os Embaixadores etc. O mestre é a principal

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23

e a imprescindível. Tudo isto, porém, tira suas origens do Auto dos Congos cujos ramos são o

Reisado, o Bumba-meu-boi e a Chegança.

Uma das partes mais encantadoras é a Sereia, ninguém, talvez, possa explicar como

esta "figura" foi introduzida no Guerreiro. Será a Iemanjá dos negros Africanos? ou a Iara dos

Indígenas? O Guerreiro é hoje o auto popular de maior divulgação e de maior número de

figurantes. Seus trajes são mais ricos do que os do Reisado, chapéus enormes, onde se nota a

junção artística de um verdadeiro artesanato.

As roupas diferem de uns para outros grupos. Mesmo sendo o folguedo Guerreiro há

uma grande variação de modelos e figurinos. Os chapéus também diferem em estética, forma

e estrutura. Dá para se perceber, que não existe uma rigorosa padronização na confecção, e

padronização das indumentárias do Guerreiro. Tudo depende do poder aquisitivo de cada

agremiação e da localidade onde se estabelece. Porém, algumas figuras devem obedecer a

suas caracterizações. O número de figurantes também pode variar de Guerreiro para

Guerreiro.

Já o Reisado é uma das pantomimas folclóricas mais ricas e mais apreciadas,

principalmente no Nordeste. Faz parte do repertório das Festas Jesuínas, e é apresentado de 24

de dezembro a 6 de janeiro, isto é, pelo Natal, Ano Bom e Reis. O Reisado é formado por um

grupo de foliões, de pastores e pastoras que se reúnem numa espécie de rancho, com o fim de

visitar as casas das pessoas mais gradas e hospitaleiras da região, a cantar e a dançar. Esse

folguedo e mais outros deram origem ao atual Guerreiro. Para quem não tem conhecimento

mais profundo sobre essas folias, o Reisado pode ser confundido com o Guerreiro pela

indumentária. Todavia, os cantos, o enredo e a evolução são deferentes entre eles. Na página

seguinte pode-se ver dois componentes do Guerreiro. Um é oriundo do Reisado, o Mateus, é

aquele cujo traje é muito colorido calça comprida e frouxa, e jaquetão. Os personagens do

Guerreiro normalmente usam roupas mais sóbrias e de cores distintas. (Figura 07).

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24

Figura 07 – Chapéus Típicos do Guerreiro

Fonte: www.aiegua.com.br/folclore.php

1.4.2 – Elementos que compõem o guerreiro

Para dissertar melhor sobre a composição do Guerreiro, foi-lhe atribuída por mim,

uma classificação para que o leitor tenha um melhor entendimento. Primeiro, quero salientar

que essa iniciativa não foi baseada em qualquer informação científica ou metodológica, e

segundo, que apenas dividi em três categorias básicas do ponto de vista estrutural. O

Guerreiro fica assim distribuído: elementos simbólicos, iconográficos e estéticos.

Os elementos simbólicos são os personagens que compõe o corpo dançante do

folguedo, tais como a Rainha, a Lira, o Índio, o Mateus etc. Cada um destes personagens, tem

uma história e sua simbologia dentro do enredo.

Os elementos iconográficos, estão representados pelas vestimentas, ornatos e chapéus.

Cada um também tem uma história e sua representação dentro do enredo e das crenças de

cada povo. E os elementos estéticos são representados pelas formas dos chapéus, das

vestimentas, dos adereços e das cores. Tudo tem origem e referenciação gnóstica13

.

13

Gnóstico (a) - Gnose é o substantivo do verbo gignósko, que significa conhecer. Gnose é conhecimento

superior, interno, espiritual, iniciático. No grego clássico e no grego popular, koiné, seu significado é semelhante

ao da palavra epistéme. Em filosofia, epistéme significa "conhecimento científico" em oposição a "opinião",

enquanto gnôsis significa conhecimento em oposição a "ignorância", chamada de ágnoia.

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25

Os personagens do Guerreiro são em número maior que no Reisado. Todavia, cada

personagem tem sua função dentro do enredo do folguedo, inclusive com loas (versos) e

cantoria, diferenciando um pouco do outro. Na Figura 08 se ver um desfile de Guerreiro, e na

Figura 09 o de um Reisado respectivamente, dá para se perceber a ligeira diferença de trajes e

ornatos.

Figura 08 - Foto de Celso Brandão – Guerreiro em evolução

Fonte: www.ideario.org.br/expresculturais/guerreiro/guerreiro.htm

Figura 09 - Foto de Celso Brandão – Reisado em evolução

Fonte: www.ideario.org.br/expresculturais/guerreiro/guerreiro.htm

No anexo 01 destaco a título de informação as funções de cada personagem do

Reisado e do Guerreiro com suas semelhanças e diferenças. No Guerreiro as vestimentas

imitam os antigos trajes nobres da colônia, sendo adaptados ao gosto, e, sobretudo, à condição

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26

econômica de cada grupo que em sua maioria são bem baixas. Os homens usam calção com

meiões até o joelho e, as mulheres saiotes e camisetas nas cores vermelha e azul

caracterizando os dois cordões, coletes verde e amarelo, mantos, tênis preto e meião branco,

fitas coloridas acetinadas, espelhos, contas de aljôfar, enfeites de árvore de natal, guarda-

peitos, espadas e espadins. Os chapéus dão o toque característico do folguedo. Já no Reisado

os trajes normalmente são iguais, variando apenas de modelos e cores. Nas cabeças são

usadas coroas por todos componentes.

No Guerreiro o mestre e os embaixadores trazem chapéus em forma de igrejas e

catedrais; o rei e a rainha usam coroas; o general com seu uniforme militar de brim branco

com dragonas, faixas e cinto, e quepe do antigo sistema militar, ou ainda chapéu de dois bicos

enfeitados de arminho; os índios usam calções sob a tanga de penas, cocar e braçadeiras e

perneiras de penas, camisa justa de meia, arco e flecha. Como dissemos acima, a diferença de

trajes, de enredo, de cantoria e evolução do Guerreiro para o Reisado, é substancial. No

Guerreiro existem mais cantos, mais entremeios, mais figurantes e a variedades de adornos de

cabeça é bem maior que no Reisado. A temática do enredo também é ligeiramente diferente.

Enquanto no reisado se fala mais sobre o nascimento do Menino Jesus, no Guerreiro a

temática abrange mais as conquistas de uns sobre outros. Nas Figuras 11 e 12 podemos notar

que são dois grupos de Guerreiros diferentes em evoluções.

Figura 10 – Apresentação de Guerreiro Figura 11 – Apresentação de Guerreiro Fonte:www.amigobrasileiro.com/pt/maceio.php Fonte: www.ufal.br/guerreiropornatureza/vencedor.ht

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27

1.4.3 - Reisado

Como foi possível ver visualmente o que existe é uma ligeira diferença do Guerreiro

para o Reisado, não obstante, o Guerreiro carrega em seu bojo grande influência daquele. A

maior parte da iconografia do Guerreiro é própria deste, entretanto a objetividade como dança

dramática, a música e a composição do grupo inspiraram-se no Reisado. ANDRADE

(1959:34):

A palavra Reisado deriva evidentemente de “Reis”, e foi uma masculinização

brasileira de palavra portuguesa mais logicamente criada. Em Portugal existe

o termo “Reisada”, como quem diz “rapaziada” e “patuscada”, coisas próprias

de rapazes ou patuscos (13). A reisada é especialmente minhota, e consiste ou

consistia primitivamente na representação dum auto sobre tablado, com pano

de chita ao fundo, por onde saem os atores Alberto Pimentel que na ! Triste

canção do Sul” dá Reisada como sinônimo de canção, já nas “Alegres

Canções do Norte” descreve com minúcia a representação duma Reisada na

aldeia de Friães (Minho) O auto se intitula !Representação de Herodes com u

(sic) Nascimento do Menino”, e tem como personagens Herodes, Bambalho,

Capitão Representante, Reinaldo, Conde Alberto, reis Balthazar, Belchior e

Gaspar, moços de Balthazar e Belchior,Preto, Fama Ligeira, Anjo, pastores

Alberto, Fileno e Albano, pastoras Belmira e Florinda, sábios Sadoc e

Haiquim, Juiz, Guarda-Bandeira, Simeão. Um pouco antes o Autor afirmara

que as Reisadas das várias aldeias minhotas que cita, são autos de Natal; e

leite de Vasconcelos criticando o livro repete que se trata duma “Reisada ou

auto popular de Natal”.

Pelo exposto acima, podemos concluir que o Reisado brasileiro é naturalmente

oriundo das Reisadas portuguesas, que eram espécies de teatros populares de tablado, onde se

narravam passagens bíblicas. Daí sua grande identificação religiosa, porém, com fortes sinais

da realeza, como é o caso da presença dos três reis Magos e seus servos. Ora, todos sabemos

que os Reis magos levaram diversos presentes ao Menino Jesus, e esses presentes eram ouro,

tecidos e fitas coloridas de muito brilho. Também sabemos, que naqueles tempos muitas

roupas eram tecidas com fios de ouro e prata, e que as paramentas dos reis, como os ornatos

de cabeça, cintos, escudos, etc. eram feitos de metais valiosos como ouro e prata, às vezes

revestidos de pedras preciosas. Deduz-se daí o porquê o Reisado brasileiro é rico em brilho e

cores em suas vestimentas. Mário de Andrade, continua discorrendo sobre o que é o Reisado,

ou Reinados para alguns; e que é praticado em Minas Gerais, Bahia e Sergipe. E sempre

enfatiza: “...dança dramática, apresentada em tablado, com algumas variações e inclusão de

negros caracterizando as congadas, que também são danças africanas com forte identificação

Page 28: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

28

de cortejo”. Daí, se deduzir, que o Reisado brasileiro tomou outro rumo cultural sendo

transformado no que é hoje.

O Guerreiro por sua vez, por ter fortes traços hereditários daquele, carrega em sua

composição algumas lembranças do Reisado. Como vimos, o tema principal do Reisado é

sempre religioso, alusivo ao nascimento do Menino Jesus. Porém foi sendo misturado a outras

vertentes culturais e profanizou-se. O que importa salientar neste caso, é, que tanto a

indumentária, como a música e a evolução (Coreografia), estão assentadas em representações

teatrais e simbólicas de uma passagem bíblica, fato que foi o nascimento de Jesus. Daí, o forte

simbolismo presente. E baseado nisso, LIMA (1962: 97): (...”O Reisado Alagoano”, é uma

representação dramática, geralmente, curta e pobre de enredo, quase sempre acompanhada e

precedida de canto...”). Portanto, o Reisado que deu origem ao Guerreiro, se apresenta como

um folguedo mais pobre que o seu sucessor. No estado de Alagoas há uma predisposição do

povo pelo Guerreiro; todavia, existem muitos Reisados em atividade na região nordestina.

1.4.4 – Pastoril

Do pastoril, o Guerreiro herdou também fortes traços de simbologia. Senão vejamos:

O brincante, reproduz peças natalinas, defrontes a presépios ou em tablados armados com esta

finalidade, e é o mais popular e difundido folguedo de Natal no Folclore de Maceió.

É uma fragmentação do Presépio, sem os textos declamados e diálogos, constituído

apenas por jornadas soltas, canções e danças religiosas ou profanas, de variados estilos e

épocas, sem qualquer ordem ou seqüência lógica. Apenas a jornada inicial - ou Boa Noite - e

a final - ou Despedida -, obedecem esta ordem, sendo as demais, geralmente hozanas ao

nascimento de Jesus ou disputas entre os dois cordões, de livre criação do grupo.

Em geral, participam apenas moças, (pastorinhas), em número de doze, ou mais,

divididas em dois cordões, o azul e o encarnado, cores que ostentam nas vestes (faixas,

aventais, saias, blusas ou boleros). Os dois cordões, postados em fila no palco, um à esquerda

e outro à direita. No centro entre os dois cordões e à frente se posta a Diana, pastora que veste

metade de encarnado e metade de azul e não tem partido. O cordão encarnado é encabeçado

pela Mestra e o azul, pela Contra-Mestra.

Page 29: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

29

O Pastoril é encenado em casas de família, colégios, teatros e em festas de ruas ou

praças, com acompanhamento de orquestra variada, desde violões e sanfonas, até conjuntos de

sopro e percussão. As pastorinhas cantam diversos trechos de músicas que são entremeadas de

improvisos quando elas se dirigem aos espectadores para tecer elogios e conquista de votos.

Quando o elogiado é sensibilizado normalmente oferece uma quantia em dinheiro que é

colocado em uma urna para o grupo ou afixado em suas vestes com alfinete, como forma de

agradecimento e voto. Os demais donativos doados em dinheiro vão para urnas previamente

colocadas em locais estratégicos. Após a apresentação, a arrecadação é dividida. Parte vai

para o grupo cobrir as despesas e parte vai para as dançarinas. A lira do Guerreiro é uma

figura saída do pastoril. E alguns cantos entremeiam estrofes advindas desse folguedo. A

indumentária do pastoril é rica e variada, porém, obedece sempre a divisão em dois cordões

azul e encarnado com uma Diana dividindo os dois. No artigo a seguir extraído da Internet

(2005), de autoria não identificada, extraí o seguinte texto:

É fato comprovado pela grande maioria dos estudiosos que se dedicam às

pesquisas em torno das manifestações culturais do povo brasileiro, a falta de

elementos profanos nas suas origens, principalmente, as nossas danças

dramáticas. Lembramos, por exemplo, Gilberto Freyre e Mário de Andrade,

quando são unânimes em afirmarem a origem religiosa das manifestações

artísticas populares, mesmo que tenham suas bases ou alimento em fatores

econômicos, mas se considerarmos o sentimento religioso como permanente e

solúvel, sua afirmação se dá pela mística religiosa, justificando-se através do

mistério qualquer variante de algum fenômeno vital. Site:

www.recife.pe.gov.br/especiais/brincantes/encarte8.html

Ainda destaco o conteúdo do texto seguinte, extraído do mesmo site (2005) onde o

autor não identificado referencia ANDRADE (1959: 23) da seguinte maneira: ”Outra

característica importante salientada pelo folclorista, é que, na maioria dos nossos folguedos

encontramos a morte e ressurreição da entidade principal ou como nos Pastoris e Cheganças, a

luta do bem contra o mal, caracterizando a noção de perigo e salvação".

Podemos perceber, neste caso, que sempre existem dois lados em confronto, o bem

contra o mal; os cristãos contra os mouros, a morte e a vida, e assim por diante, sempre dando

uma conotação de embate. No caso nordestino, vem desaguar na rivalidade entre os cordões

azul e encarnado. Entretanto, é claro, que nos Pastoris, originários da Península Ibérica, o

conceito de morte e ressurreição não aparece de forma contundente, mas há no chamado

Pastoril profano, a luta entre o cordão azul e o encarnado, revelando um confronto se

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30

considerarmos o cordão encarnado como o mais audaz, atrevido, por assim dizer, do que as

pastoras do cordão azul. De qualquer forma foi a finalidade religiosa que deu a essas danças

dramáticas ou bailados, como diz ANDRADE (1959: 24 ) "Foi a finalidade religiosa que deu

aos bailados a sua origem primeira e interessada, a sua razão de ser psicológica e a sua

tradicionalização".

O Pastoril, mesmo em suas origens, nunca foi inteiramente popular, mas burguês, e,

sua justificativa se dá com os Presépios, pois, sistematicamente, os pastoris eram dançados em

frente da lapinha, representação estática do nascimento do menino Jesus. Normalmente só as

mocinhas de família, faziam parte dessa encenação.

Com poucas diferenças, os estudiosos afirmam que as comemorações do Natal, a festa

da Natividade, surgiram no início do século X. Conforme comprovam as pesquisas de

ANDRADE (1959: 344): "a idéia de comemorar o nascimento do Cristo, através de

representações dramáticas, foi do monge Tuotilo, morto em abril de 915, na Abadia de São

Galo, centro germânico onde nasceram, ou donde pelo menos se espalharam com maior

autoridade as Seqüências e os Tropos".

O Tropo consistia em intercalar textos novos e frases melódicas novas, em textos

religiosos oficiais da Igreja, cantados em gregoriano. Logo, tanto na França como na

Inglaterra, os tropos dialogados do natal se desenvolveram rapidamente, transformando-se em

núcleos do drama litúrgico medieval. Dividia-se em três partes principais: A anunciação do

nascimento do Cristo aos pastores; a adoração dos três reis magos; o massacre dos inocentes.

Os dois primeiros temas se conservaram vivos e se desenvolveram com rapidez por todo o

ocidente europeu e Portugal, através dos jesuítas, que assim repassaram para o Brasil Colônia.

ANDRADE destaca (1959: 352): “...apenas no período oitocentista o pastoril teve seu

brilho e apogeu”. Essa afirmação está relatada no livro Danças Dramáticas Brasileiras. É

curioso observar que essa dança dramática não teve uma repercussão nacional diferente dos

presépios que se tornaram tradição em todo o país, talvez, por ser um “fenômeno de

imposição burguesa”, como afirma ele. Porém, em Alagoas e Bahia este folguedo tem forte

penetração na sociedade, que participa ativamente de suas encenações, fornecendo a matéria

prima que as componentes.

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31

Ao enveredar por outros caminhos, o Auto Pastoril transforma-se em sincretismo

profano-religioso, tornando-se, muitas vezes, mais profano, que religioso. Uma vez que, suas

características ressaltam a licenciosidade do Velho do Pastoril e a sensualidade das Pastoras.

No meio dos dois cordões, cada um comandado pela Mestra (cordão azul), e, Contra-mestra,

(cordão encarnado), vamos encontrar a Diana, vestida metade azul, metade encarnado como já

citado anteriormente. O Velho, conhecido como Bedegueba14

, mas que toma diversos

apelidos é uma espécie de bufão, de palhaço de circo, que comanda as jornadas (cantos das

pastoras) e se esparrama em piadas, numa atuação que ressalta o histrionismo, a

improvisação. (Figura 10).

Figura 10 – Bedegueba ou palhaço de pastoril

Fonte: Jaime Fotografia

Na Figura 11 pode-se ver o cordão vermelho de uma dessas entidades, em pleno

exercício de evolução. Veja que a indumentária difere sobremodo, da que apresentaremos

mais adiante quando veremos o cordão azul de outro pastoril.

14

-Bedegueba- espécie de Chefe, Patrão, conforme o dicionário Aurélio.referenciado página 194.

Page 32: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

32

Figura 11 – Apresentação do cordão encarnado do pastoril Estrela Brilhante

Fonte: Banco de Imagem / JC

Dentre os outros personagens do pastoril profano, também desfilavam o Anjo a Estrela

do Norte, o Cruzeiro do Sul, a Cigana, além de outras figuras que aparecem ocasionalmente

por influência do local, da região. Hoje o pastoril perdeu em sentido hierático e lírico, mas

transformou-se num gênero popular de representação, diferenciado e que atingiu sua própria

forma. Não é questão de involução mas de interferência dos artistas populares que com os

seus espíritos inquietos e brincantes conduzem esses folguedos.

O cordão encarnado, pela própria razão de sua estrutura cromática, em que o vermelho

é mais vibrante, se revela na maioria dos pastoris, como sendo o cordão da força, da avidez.

Aquele que sai à luta e busca novos horizontes. Simboliza as invasões Mouras. É o cordão da

conquista, é ele que toma a iniciativa provocante do canto e desenrolar do folguedo. Por essa

razão, se conota nele a dita profanação. Já o azul, que é uma cromatização calmante e

passivadora, representa o cordão dos católicos, de melhor índole, segundo a religião cristã. O

pastoril é um auto que conta toda uma saga dos cristãos nos momentos que viveram sob a

perseguição de dominadores como Herodes por exemplo.

A comicidade, uma das características mais fortes dos espetáculos populares do

Nordeste, aos poucos também foi aparecendo no Pastoril. Com as pastoras divididas em dois

cordões, como dito anteriormente azul e encarnado; possibilitou a formação de partidos que se

batiam pelas cores de suas preferências e muitas vezes terminava em pancadaria. O leilão

também despertava entusiasmo e quando o pastoril saiu do amadorismo para um certo

Page 33: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

33

profissionalismo, acentuou-se a sensualidade e sexualidade e era comum um pastoril terminar

com o rapto da Mestra, Contramestra ou da Diana. Na Figura 12 pode-se visualizar o cordão

azul de ouro do pastoril Vitória Régia, e, verificar-se que o conjunto traja outro tipo de

vestimenta diferente do anterior, entretanto com a mesma beleza estética.

Figura 12 – Cordão azul do Pastoril Vitória Régia em apresentação

Fonte: Banco de Imagem /JC

1.4.5 – Caboclinhos

Dos caboclinhos pode-se destacar a figura do índio Peri presente no Guerreiro que

caracteriza a luta dos índios contra a ocupação do espaço nativo. E, segundo LIMA, (1962:

155):

Caboclinhos existem ou existiram nos estados da Paraíba, Pernambuco, Rio

Grande do Norte, Alagoas, e Minas Gerais. Nesta última região, são

chamados Caboclinhos. Também dizem ”Os caboclos”, nome mais antigo,

pelo que me informaram, escreve Mário de Andrade em “Danças Dramáticas

do Brasil” O grupo se apresenta aos olhos dos folcloristas que o registraram e

estudaram como o de um folguedo popular de inspiração indígena. Com

figurado característico, partes faladas ou representadas, os caboclinhos se

exibem pelas ruas das cidades, nas festas religiosas ou durante o carnaval.

Page 34: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

34

São grupos de homens e mulheres, com cocares de penas de ema, pavão e avestruz.

São caboclos que evoluem nas ruas em duas filas, ao som dos estalidos secos das preacas - um

objeto que reproduz o arco e a flecha e que emite um estalido quando percutido.

A manifestação dos caboclinhos é uma representação do povo indígena e é, também,

um dos mais antigos folguedos populares do Brasil. Os caboclinhos preservam passos e

danças nativas que se somaram às influências européias e negras.

Os personagens dos caboclinhos são vários e estão dispostos, a título de informação no

anexo I deste trabalho junto com os dos outros folguedos. A orquestra é formada pela inúbia15

(gaita de taquara), os caracaxás16

, o tarol17

e o surdo18

, além das dezenas de preacas que

estalam num ritmo frenético. Os caboclinhos tomam várias estruturações dos grupos, variando

muito de uma localidade para outra, inclusive na vestimenta. LIMA (1962: 155) diz: “ ...De

acordo com pesquisa, ainda inéditas, de Guerra Peixe, os Caboclinhos de Recife, Pernambuco,

possuem nos seus diversos grupos ou tribos uma organização mais ou menos semelhantes...”

Ora, o que o autor quer dizer, é que esse folguedo varia de lugar para lugar, na indumentária,

na evolução, no canto e no atos; entretanto, no Caboclinhos de Alagoas, que veio a ceder parte

da origem do Guerreiro a característica lhe é própria. Senão, vejamos o que diz LIMA (1962:

157):

Em Alagoas, segundo Theo Brandão, o folguedo é “estruturalmente um

Reisado”. “O próprio traje da maioria dos personagens, bem como a

denominação de grande número destes, é o mesmo do Reisado, com

acréscimos naturais, em virtude do seu grande número de partes”. Entretanto,

o mesmo autor afirma que há Caboclinhos que obedecem “ao estilo

convencional de índio”, mencionando os Índios de Ouro, que apareceram em

Maceió no ano de 1941.

Como vimos, a variedade de formas do folguedo é grande, porém a que originou o

Guerreiro, é a de Alagoas. Na Figura 13 é possível ver uma organização de caboclinhos

desfilando. Não tecerei maiores comentários a respeito dos Caboclinhos por entender que sua

contribuição no Guerreiro restringe-se à figura do índio Peri que no enredo do Guerreiro é o

contraponto ao Rei e sua invasão e dominação das terras indígenas brasileiras. Não que o

assunto seja de pouca relevância, mas por entender que sua alegoria restringe-se à figura do

índio, no conjunto não acrescenta muito ao meu trabalho. Entretanto, entendi que devia

15

- Inúbia é uma trombeta de guerra estridente usada pelos índios. 16

-Também conhecido como reco-reco, regue-regue, o caracaxá é feito com um pedaço de bambu ou taquara

com talhos transversais. A execução é feita passando, sobre os talhos, uma vareta de madeira ou de ferro. 17

-Tarol espécie de caixa, semelhante às usadas em bandas marciais. 18

- Espécie de bumbo ou tambor, semelhante aos usados em bandas de música.

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35

reservar um espaço para esta figura, pois fala da nossa gente, da nossa cultura, do nosso povo.

E realizei um painel exclusivamente a este personagem em forma de cocar.

Os caboclinhos ainda existem na região nordestina, como na cidade do Recife, onde

tem forte aceitação pela população, todavia, sua caracterização hoje, está mais para bloco

carnavalesco que para folguedo natalino ou junino. A manifestação dos caboclinhos é uma

representação do povo indígena e é, também, um dos mais antigos bailados populares do

Brasil. Os caboclinhos preservam passos e danças nativas que se somaram às influências

européias e negras. Segundo o contido no site caboclinhos (2005), os mais antigos

caboclinhos de Pernambuco são as tribos Canidés (1897), Carijós (1897), Taperaguases

(1916), Caboclos Tupy (1933), Tabajaras (1956) e Tapirapés (1957).

Figura 13 – Caboclinhos do recife em desfile

Fonte: photos © O Globo / © JB / © A Tarde / or current holder

Também existem as tribos, que são agremiações carnavalescas que além dos

caboclinhos, é outro folguedo evocando personagens indígenas que também enriquecem a

beleza do carnaval de Pernambuco. Suas fantasias são muito influenciadas pelo imaginário do

cinema americano: um exemplo são as índias com machadinhas e índios com pequenas

lanças, todos vestidos com calças ou saias num estilo vagamente faroeste. Acompanhados por

gaitas, ganzás e surdos, as tribos evoluem com os rostos pintados de vermelho. As mais

conhecidas de Pernambuco são Paranaguases (1953), Tupy-Guarany (1956), Tupy Papo

Amarelo (1962) e Tapajós (1985).

Page 36: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

36

1.4.6 – Chegança

Quanto à chegança, sua contribuição para o Guerreiro é de grande importância, porque

fala de conquistas. A Chegança, segundo ANDRADE (1962: 118), constitui junto com o

Fandango, o que poderia ser melhor e mais belo dos trabalhos do mar Português. Já para

outros pesquisadores e estudiosos da cultura brasileira, a Chegança tem sua origem aqui

mesmo no Brasil. Um Exemplo é o que LIMA expõe (1962: 196):

É possível que o primeiro registro da Chegança, que alguns autores designam

pelo nome de “Chegança de Mouros”, seja o de Henry Koster. Na obra

”Viagem ao Nordeste do Brasil”, descreve um folguedo realizado dentro do

mar e nas praias da ilha de Itamaracá, em 1814, no qual houve lutas entre

mouros e cristãos, que terminou com a vitória destes e o batismo do rei

mouro. Nesse registro, encontramos alguns elementos essenciais da folgança

ou Chegança de Mouros referida, depois, por Silvio Romero, Pereira da Costa

e Gustavo Barroso.

O que é possível perceber depois deste destaque, é que a Chegança é um folguedo

cujas raízes podem até vir de outras partes do mundo, porém, sua sedimentação histórica está

no nordeste brasileiro, onde até o momento é praticada com grande ênfase. Existem variações

de canto, coreografia e de indumentária, mas o cerne da composição é sempre o mesmo.

Relata as conquistas e reconquistas de ambas as partes entre Mouros e Cristãos.

A Chegança surgiu, segundo afirma LIMA (1962: 197): que conforme “...Um

informante de Antonio Osmar Gomes, de Vilanova e redondezas, no Estado de Sergipe, vem

em comemoração às vitórias de Carlos Magno sobre os mouros, quando andava procurando

converter os infiéis à lei cristã, batizando-os”.

Na chegança, que varia em indumentária canto e evolução, de um lugar para outro,

podemos verificam-se algumas variações no conjunto dos componentes, entretanto sua

estruturação básica é a mesma. LIMA (1962: 197):

Seus figurantes são marinheiros ou marujos e oficiais da Marinha e como tais

se apresentam vestidos. Em Vilanova, compreendiam: primeiro-tenente,

segundo-tenente, tenente-ajudante, capitão-tenente, capitão-piloto, capitão-

patrão, general-mar-guerra, Padre, Doutor-cirurgião, dois Guardas-marinha,

dois Gajeiros, dois calafatinhos, um Cozinheiro, quatro caixas, vinte

marinheiros e dois mouros. Em Piassabuçu, na margem alagoana do Rio São

Francisco, segundo ainda Antonio Osmar Gomes, apareciam três mouros e

um Sargento-de-mar-e-guerra e não se registrava a presença dos calafatinhos

e dos caixas. Em Maceió, observamos também o almirante, Contra-almirante,

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37

dois mouros, o rei, ou general e o príncipe, ambos com manto vermelho,

coroa de lata, enfeitada com purpurina, cabelos longos feitos de corda

desfiada e espadas nas mãos.

Na versão de Vilanova, em Sergipe como diz LIMA, (1962: 197): “...o folguedo

começa com um convite às pessoas para virem ver a ‘nau tirana’, que vai para alto mar, a fim

de lutar por Deus e libertar a Terra Santa“. Percebe-se aqui que a influência desse folguedo no

Guerreiro é que realmente lhe assegura o nome que usa. E a presença do General, assim como

do rei, rainha e demais figuras da realeza que aparecem no Guerreiro, são advindas das

culturas, do Reisado e da Chegança.

Os personagens da Chegança usam trajes semelhantes aos das Marinhas de todo o

mundo, como também alguns postos. Conforme já foi citado por LIMA (1962: 197) tendo

cada um deles uma participação especial no drama e suas participações são chamadas de

entremeios.

Quatro ou seis pandeiros acompanham a coreografia que é seguida por coro de vozes.

O General, comandante das evoluções, usa um apito para a mudança das marchas. O pandeiro

é o principal instrumento de acompanhamento. A batida forte e ritmada dá o tom dos cantos e

evoluções.

A apresentação completa da Chegança demora, geralmente, 60 minutos, e é bastante

teatral, composta basicamente por duas partes: o cortejo – o deslocamento do grupo para o

local da apresentação, e, a parte dramática, compostas por diversas encenações.

A Chegança tem sua inspiração na reconquista espanhola dos embates travados entre

Cristãos e Mouros. Trata-se de um folguedo antigo, cuja ação transcorre em terra, onde está o

quartel da mourama19

, e no mar, por onde chega a cristandade. É apresentada sempre no ciclo

natalino. São muitos os cânticos de rua, incluindo a saudação e a despedida, e os cânticos

embarcados, por parte dos cristãos.

As indumentárias desse folguedo, variam do esfuziante colorido das camisas (Figura

14), em alguns lugares, ao rigor dos uniformes de marinheiro. Em alguns lugares são

dançados o fandango e a marujada, que têm grande semelhança no vestir, porém com origem

e enredos diferentes.

Os mouros, com suas roupas vermelhas, seus armamentos, não cantam, salvo quando,

depois de vencidos e batizados, repetem o coro dos cristãos, como um pedido de clemência.

19

- Mourama – Derivativa de mouros, lugar onde se estabelecia uma cidadela de mouros.

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38

Figura 14 – Exemplo de vestimenta de chegança

Fonte: www.ivanpaixao.com.br/sergipe_folclore.asp

O modo de trajar das cheganças é variado; entretanto, o básico usado no estado de

Alagoas é o uniforme de marinheiro com as cores, azul e branco bem definidas, que conforme

LIMA, (1962: 197): “Figurantes - São marinheiros ou marujos e oficiais da Marinha e como

tais se apresentam vestidos”. Nas Figuras 14 e 15, observa-se que existem diferenças nos

uniformes, porém segue sempre a mesma padronização.

Figura 15 – Apresentação de uma chegança

Fonte: www.recife.pe.gov.br/especiais/brincantes/encarte8.html

Como exemplo de avivamento das culturas nordestinas e principalmente da alagoana,

destaco como referência, um trecho do Trabalho de Conclusão do Curso de Jornalismo da

UFAL, dos formandos: Maikel Ranyeri Marques de Melo e Patrícia Yara Santos Silva, na

parte da justificava se sua monografia, em que fala do Guerreiro e sua fundadora:

Page 39: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

39

O resgate de uma manifestação folclórica por meio do mais novo veículo

contemporâneo de comunicação, a Internet, que o presente trabalho pretende

realizar, destacando-se a importância de uma mulher que esteve por muito

tempo à frente de um folguedo popular genuinamente nosso, o Guerreiro,

importa para a valorização da cultura popular alagoana, raiz e fonte de arte e

sabedoria das classes subalternas. Já que para as camadas populares, a

comunicação formal não cumpre a função de divertir, educar, informar e

refletir, estes papéis são transferidos para o campo dos folguedos, em especial

o Guerreiro, principal objeto de estudo deste trabalho. Assim, fica claro que

esse tipo de manifestação folclórica, ao promover o resgate dos costumes de

um povo, também desenvolve o papel de refletir o querer, o saber e o sonhar

do grupo que o preserva, se transformando num instrumento de intercâmbio

das vivências e tradições da cultura de Alagoas. Situando-se no campo da

folkcomunicação e trabalhando com temas como a riqueza regional e o seu

resgate universal, o folclore e sua valorização, o sistema econômico do

engenho e sua influência nos costumes do povo nordestino, a pesquisa

realizada pretende discutir a troca de idéias, opiniões e informações por meio

das manifestações típicas da cultura popular. No Departamento de

Comunicação Social da Ufal faltam trabalhos que se situem no campo da

folkcomunicação, bem como pesquisas mais delimitadas que ofereçam um

maior conhecimento da cultura popular alagoana. Entretanto, essa carência

cultural não só se restringe ao meio acadêmico. Na interconexão mundial de

computadores, a chamada Internet, ou seja, no infinito universo que ela

abriga, quase que inexistem trabalhos dessa natureza. É daí que se reforça a

importância da pesquisa realizada, pois é necessário que o mundo conheça,

através do ciberespaço , pelo menos uma fatia da imensa riqueza cultural do

povo alagoano, aqui representada por uma autêntica manifestação folclórica

que tanto contribuiu para a manutenção das tradições populares: o Guerreiro

de Dona Joana Gajuru. http://www.chla.ufal.br/multireferencial/gajuru

Embora não concorde que estejam fazendo resgate algum, já que a manifestação cultural ainda

existe por si só, achei interessante citar este trecho do trabalho dos acadêmicos acima

referenciados, por entender que é de suma importância que jovens se preocupem com a

memória cultural, seja de que estirpe for. No caso acima, são formandos em jornalismo, mas

poderiam ser de qualquer outra área de informação e cultura. O importante é que não se deixe

morrer a memória dos costumes, danças e rituais de um povo. Um país que se preza, zela pela

sua história cultural.

Page 40: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

40

CAPITULO II

PROCESSO DE CRIAÇÃO COM MADEIRA RECORTADA

METODOLOGIA

Na elaboração dos painéis, desde o momento de pensar que matéria seria utilizada até

a experimentação de um determinado material, me vi envolvido em dúvidas a respeito do que

deveria utilizar. Qual o mais adequado, o mais econômico e, o mais ecologicamente correto.

Fiz uma experiência com compensado e não gostei do resultado. O compensado,

definitivamente não é o material mais indicado para o exercício da Marchetaria. Pude

observar que em espessura inferior a dez milímetros, ele não se adaptou às reais necessidades

dos painéis. Em dois exemplares que utilizei tal material, eles se deformaram, o que me levou,

a revesti-los com molduras externas, interferindo de alguma forma na moldura de Marchetaria

por mim confeccionada.

Por orientação da pré-banca, fui aconselhado a retirar alguns detalhes que estavam

incomodando à observação dos trabalhos. Mas, para não deixar as laterais à vista, fui

orientado a reformular o adorno lateral do suporte de outra maneira, de tal forma que, não

interferissem na estética dos painéis. Como já havia feito esses dois exemplares naquele

material, a banca me concedeu a permanência das molduras, entretanto, exigiu a retirada dos

inconvenientes.

Entendi aí, que é de suma importância haver uma intimidade entre o artista e o

material com qual vai trabalhar. É uma espécie de simbiose. Um estar para outro na mesma

razão e proporção de suas qualidades. E revendo este fato lembrei-me de uma citação de

OSTROWER, (1990: 22): “Quem não vivenciar a sensualidade da matéria com que trabalha,

como profunda verdade existencial, e como compromisso irredutível com o próprio ser, não

há de se tornar artista”. É bem verdade, a qualidade da matéria com que se trabalha é de suma

importância, e isso às vezes nada tem a ver com preços. É mais uma questão de identidade

entre as partes.

Page 41: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

41

Foi a partir de determinadas observações que cheguei à conclusão de que para se

chegar a objetivos proveitosos no campo das artes, necessário é, que sejamos obstinados e

coerentes com o que nos propomos a realizar. E ainda mais uma vez, refleti sobre uma citação

de OSTROWER (1990: 52): “O mundo de nossa sensibilidade é um mundo de diálogos com

as formas de matérias, físicas ou psíquicas”. Ser artis ‘ta é antes de tudo ter consciência de

suas limitações e suas potencialidades. FRAZÃO (2005) diz: “Artista é antes de tudo um ser

com vocação religiosa. Existem sim muitas mitologias mas antes existe o poder de vir a ser

descoberto pela mídia para tornar-se um ser mítico - é desta forma que se separa o joio do

trigo. O artista não esta interessado em aparecer antes do seu trabalho”. Mas também observei

Matisse na citação feita em SILVA (2005): “O que eu busco, acima de tudo, é expressão... A

expressão, no meu modo de pensar, não consiste na paixão espelhada num rosto humano ou

denunciada por um gesto violento. Toda a disposição de minha pintura é expressiva.”

1 – MARCHETARIA

O meu trabalho foi pensado de forma que pudesse realizá-lo em marchetaria,

utilizando os recursos disponíveis no momento. Parti da premissa, de que não dispondo de

uma gama maior de materiais e ferramentas mais elaboradas, que pudesse realizar

satisfatoriamente o que me propus a fazer. E para isso, inicialmente procurei verificar no

comércio de Campo Grande, MS., o que encontraria de lâminas e de ferramentas. E foi

pensando como deveria resolver as deficiências encontradas que cheguei a uma conclusão:

buscar recursos técnicos e materiais fora da cidade. A partir disso procurei pela Internet

empresas que fornecessem o material necessário. Por questões econômicas, não consegui tudo

que pretendia, algumas empresas só vendem por atacado. Fortuitamente, descobri um ateliê

que vende lâminas de cores e texturas diferenciadas em pedaços de 0,30 m X 0,30 m,

condição necessária ao acomodamento da embalagem para transporte.

Dessa forma, o custo unitário saiu um pouco alto o que me limitou a adquirir apenas

algumas variedades. De posse do material para mão-de-obra e de algumas ferramentas

manuais como estiletes, tesouras e mini-formões, comecei a planejar na mente o que deveria

levar a efeito na prática. Depois do processo idealístico, partí para a combinação de materiais.

Fiz inúmeras combinações visuais entre as lâminas, obedecendo à disponibilidade do material.

E o resultado mais adequado que pude atingir é o que ora é apresentado. Certamente outras

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42

infinitas combinações poderiam ser feitas, mas para mim o que ora apresento foi o que melhor

se ajustou às condições e materiais disponíveis

O que pensei em termos de formas do que iria reproduzir, não saiu exatamente de

minha imaginação, pois queria fazer um trabalho que se baseasse em algo já existente, e que

não destoasse muito do meu propósito que era fazer uma releitura do chapéu do Guerreiro em

uma linguagem diferente da que ele se apresenta naturalmente. Para essa nova releitura,

escolhi a Marchetaria. Parecia-me mais fácil. Mas não foi. Isto, pela limitação de variedade

de materiais e cores. O que limitou sobremodo muitas alternativas. Reproduzir imagens no

bidimensional usando a linguagem visual da marchetaria, não a mesma coisa que usar tinta,

pastel ou crayon.

Experimentei alguns modelos antes de iniciar o trabalho definitivo e constatei que

cada lâmina de madeira apresenta características próprias tais como: dureza, sentido das

fibras, consistência, cor, reação à cobertura com seladora, disposição das fibras reação aos

recortes etc. Foi a partir esse primeiro experimento, que tracei os primeiros rumos a serem

seguidos.

Numa primeira etapa, procurei fotos na Internet sobre os diversos chapéus do

Guerreiro e procurei identificar aqueles que melhor se encaixavam nas minhas pretensões. A

seguir selecionei aqueles que achei mais adequado às minhas condições de realizar o trabalho

e à disponibilidade do material. Por isso, procurei analisar cautelosamente cada chapéu dos

que pude ter acesso, e, estudei cuidadosamente suas formas e dificuldades de reprodução.

Uma vez resolvida essa primeira etapa, passei para a execução do primeiro exemplar.

Conforme relatei no início, verifiquei que o compensado não era a melhor solução. Foi

aí que comecei a descobrir alguns segredos da Marchetaria. A cada pedaço de lâmina cortado

e colado, eu ia adquirindo experiência na lida com a arte milenar. E pude entender o que diz

MOTTA20

(2005): “Para se trabalhar em marchetaria é necessário se conciliar: amor,

paciência e exclusividade.” E foi fazendo esse trabalho que constatei ser verdade a máxima

acima citada.

Inicialmente pensei em fazer fotografias de um único modelo de chapéu em oito

posições diferentes, e depois reproduzi-las na marchetaria. Mas, logo percebi que não

atenderia ao meu propósito. Quero mostrar um pouco da história do Guerreiro, com algumas

de suas peculiaridades. Foi aí que decidi realizar oito modelos diferentes de chapéus, sendo

20

- Mauricio Mota é artista especializado em Marchetaria e tem o site disposto nas referencias bibliográficas.

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43

quatro em formas de templos cristãos representado o sagrado e quatro de formas diferentes

representando o profano.

E isto se impõe pelo fato de que o Guerreiro é um folguedo sacro-profano.

(Inicialmente não tinha a intencionalidade de ser profano como é afirmado por ANDRADE

1959: 21,22) “Assim, não é a profanidade do heroísmo, da coragem, dos feitos históricos,

tradições e costumes raciais que provocou a fundação das nossas danças dramáticas” Mas, ao

se mesclar com outras danças dramáticas como o Pastoril, a Chegança e os Caboclinhos,

ganhou sua dose de profanação. Por isso, defini que quatro dos chapéus representariam o

mundo sacro, e quatro retratariam o profano. Os chapéus característicos do Guerreiro, são os

que trazem miniaturas de capelas, igrejas ou catedrais. Todavia, outros tantos fazem parte de

outras vertentes como, o Índio, a Lira, o Mateus o Embaixador etc. Sobre cada um desses

elementos falarei na parte que narra cada quadro mais especificamente.

Deveria a partir dessa nova concepção idealística do que seria realizado, compor cada

painel de acordo com o que foi previamente pensado. Escolhi quatro formas diferentes de

retratar as imagens de templos e quatro tipos diferentes que não simbolizam o religioso e sim

o profano.

Quanto às formas, não as criei, procurei abstrair das fotos de chapéus capturados da

Internet. Entretanto, dei a cada trabalho minha identificação pessoal. Não fiz cópia e sim uma

mimese daquilo que serviu como referência visual dentro da linguagem adotada. No tocante

às cores, procurei contrastar de modo que o objeto de apreciação ficasse o mais definido

possível no contexto visual. Mas também brinquei com inserção de linhas num mesmo

panorama visual, demonstrando ser possível se divisionar uma imagem num mesmo suporte

cromático, usando apenas as linhas para separação do objeto do fundo. Os elementos do

desenho estão presentes em todos os quadros. Alguns fundamentos também podem ser

percebidos em FONTOURA (1982: 8):

É evidente que o aspecto do objeto não se determina apenas pela imagem que

impressiona o olho, nem tão pouco, pelos seus limites, mas este estudo

deteve-se sumariamente à forma em si, uma visão geométrica a partir das

denominadas ‘formas fundamentais’: o circulo, o triangulo e o quadrado.

A minha intenção, é demonstrar que os meus modelos estão num espaço etérico sem

qualquer base de sustentação, em plena leveza cósmica. Determinando dessa maneira não se

tratar de uma simples imitação arquitetônica. Isso porque não quero deixar parecer apenas

uma reprodução mimética do real-imaginário que é o chapéu do Guerreiro. A minha produção

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44

pretende ser o que é, ou seja, é fruto de uma imaginação, não é o real. Procurei observar o que

diz FOUTOURA (1982: 11):

Levando-se em conta os ensinamentos da Gestalt, um objeto é uma forma na

medida em que este objeto é percebido. A percepção da forma destaca sempre

uma figura do fundo, que por outro lado, mantém uma relação de

interdependência. Perceber esta relação de figura e fundo é fundamental no

âmbito da composição e da criação artística, além de fornecer elementos para

melhor leitura dos objetos. A figura está sobre o fundo e depende do fundo

sobre a qual está localizada. Este, serve como uma estrutura ou suporte em

que a figura está colocada, por conseguinte, determina a figura. A diferença

de articulação entre figura e fundo é universal. Portanto, não só se apresenta

em relação a suas configurações como também em relação a suas cores”. O

mesmo campo cromático se parece mais colorido quando é figura do que

quando é fundo.

Ao ler minhas imagens o observador poderá constatar alguns princípios fundamentais

conforme os relatados acima, além dos fundamentos básicos do desenho, como: a perspectiva,

a luz, a sombra, a cor etc. Porém, procurei imprimir em alguns trabalhos princípios de

desenho artístico como o escorso, a deformação, o contraste etc. A dimensionalidade dos

painéis, obedeceu ao princípio do retângulo áureo como foi dito em capitulo anterior,

entretanto, não foi seguido o rigor da perfeição do referido retângulo por questões de

economia.

Os painéis se apresentam nas seguintes dimensões: os dois primeiros que foram

realizados no compensado de 6 mm, têm as medidas: 0,60m X 0,50m com as molduras, e os

demais, feitos em MDF, ficaram com as medidas: 0,61 X 0,50m sem molduras.

Procurei dimensionar as partes de maneira que o todo apresentasse uma visualização

conjunta intercalando-se o fundo com o objeto descrito ou delimitado nesse espaço. Todos os

cortes efetuados nas diversas tiras que compõem o trabalho, não obedeceram a qualquer

forma previamente elaborada, mas, à disposição que a madeira ia se apresentando no que

tange à dificuldade de lidar com ela. Num primeiro momento, ia sendo imaginada uma forma,

mas, à medida que iam sendo recortadas as tiras de madeira, se fazia necessários ajustes e

recortes que de certa maneira mudava aquilo que previamente se concebeu na minha mente. E

isso é o mais importante para mim neste trabalho, pois não obedeci a cânones

preestabelecidos, e, sim, à minha intuição e capacidade contornar problemas. Como diz

FONTOURA, (1982: 17):

O corte é um elemento fundamental neste estudo, pois é a causa para a

obtenção das partes. Duas ou mais partes é um problema de seleção, porque o

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45

seu número influenciará diretamente no resultado final. A princípio quanto

maior o número de cortes maior o número de partes, mas analisando melhor

chaga-se a outra situação, principalmente se os cortes foram previamente

estudados.

No caso dos cortes exercidos por mim nos quadros, a maioria foi estudada, uma vez

que obedeci a formas já previamente selecionadas, que são os modelos. Entretanto, os recortes

de algumas partes seguiram a ordem natural e, as condições das fibras das madeiras. Por essa

razão, é que nem tudo obedeceu a conceitos previamente selecionados. Muitos dos recortes,

principalmente os que simbolizam as fitas, foram aparecendo à medida que iam sendo

executados. Segundo FONTOURA (1982: 18):

Antes que o corte se efetue fisicamente, isto é, atue na constituição molecular

do material do corpo a ser cortado, separando-se efetivamente em partes, é

necessário considerar dois aspectos preliminares. O primeiro, de caráter

puramente imaginativo, de forma intuitiva ou não, mas revelador do processo

criativo como idéia A seguir, esta idéia deve ser registrada, baseando-se no

fato de que é possível esquecê-la. Aplicando-se neste caso, uma das leis de

Murphy: a esquecida seria a melhor das idéias. O segundo, é justamente o

gráfico, capaz de garantir a idéia por algum tempo; pela sua natureza permite

ser dedutivo.

O mesmo autor comenta FONTOURA (1982: 29) “Além de guias e cortadores este

trabalho requer outros materiais complementares para serviços auxiliares e acabamento como

tesouras, pinças, cola para papel, pano para limpeza, etc”. Todos estes materiais foram por

mim utilizados nos cortes das partes. Também fala de papelão, cola, papel e demais materiais.

No meu caso em particular, utilizei todo material descrito, além de outros próprios para

madeira, como seladora, cola de sapateiro, cola fórmica, thiner, solvente para cola, riscadores

de madeira, raspadores, lixas de madeira, lixa d’água, e, todo material necessário ao manuseio

da Marchetaria.

No que concerne ao movimento aparente das fitas pela suas formas, quis fazer uma

insinuação clara dos balanços das fitas no espaço, determinando o movimento e evolução de

cada chapéu quando em uso no folguedo. Procurei imprimir no trabalho a minha

característica, o meu estilo a minha particularidade. E isso não foi por acaso, houve a

intencionalidade a partir da idealização, entretanto a prática da marchetaria apresentou uma

certa dificuldade em retratar esse movimento preconcebido no campo das idéias. Mas, como

diz OSTROWER (1990: 18):

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46

O ‘essencial e necessário’. O estilo de um artista se revela em inúmeras

decisões intuitivas (conscientes ou inconscientes), cobrindo todas as etapas

detalhes do trabalho, desde a escolha inicial da técnica e do material, dos

elementos visuais e sus relacionamentos formais, à configuração da imagem.

Tais decisões, e também as hesitações, são formuladas com a maior

naturalidade e simplicidade: ‘aqui seria melhor acrescentar algumas linhas; ali

vou ter que interrompê-las; aqui cabe uma cor mais intensa; ali um vazio

maior’. Os pensamentos não precisam ser verbalizados – nem sequer

pensados. Basta o artista agir. Mesmo assim envolvem decisões, escolhas,

avaliações que vêm do foro íntimo da pessoa e exigem coragem e coração

(ambas as palavras tem a mesma raiz). Por vezes, a decisão de uma única

pincelada torna-se bastante difícil, extremamente difícil até, que a decisão

como que de vida ou morte, e o artista sofre com ela, pelo sentimento de

responsabilidade e a acompanha.

Por isso, entendo que a própria imagem de cada painel, falará por si só. E falando em

sentimento de responsabilidade, conforme foi dito na citação anterior, quero destacar uma

outra alusão ao sentimento referenciado VISCOTT (1976: 17) em que o autor comenta:

Os sentimentos são a maneira como nos percebemos. São nossa reação ao

mundo que nos circunda. São a maneira pela qual percebemos que estamos

vivos. Quando nossos sentimentos estão consolidados, experimentamos nosso

maior grau de consciência. Sem sentimento não há existência, não há vida.

Falando com simplicidade, cada um de nós é os sentimentos que tem. Aquilo

que sentimos a respeito de qualquer coisa reflete nossa história e

desenvolvimento, nossa influências passadas, nossa agitação presente e nosso

potencial futuro. Compreender nossos sentimentos é compreender nossa

reação ao mundo que nos circunda.

Meu trabalho está assentado em pilares de sentimentos, pois refletem hoje o menino

do passado. Minhas lembranças adormecidas precisam ser expostas através de minhas

realizações artísticas, seja ela de qualquer natureza. Ao realizá-lo me encontro com o passado

e me fortaleço em minhas convicções. E aí destaco o que diz VISCOTT (1982: 17): “Sem

sentimentos não há existência não há vida”. Falando com simplicidade, cada um de nós é os

sentimentos que tem”. Examinando GONBRICH (1993: 3): “Nada existe que se possa dar o

nome de Arte. Existem somente artistas”. Alicerçado nesta afirmação, fico convencido de que

o que estou apresentando certamente não é Arte com “A” maiúsculo, segundo o ponto de vista

de GONBRICH, mas, é fruto da dedicação de um artista.. O que importa para mim é que o

observador possa vislumbrar no trabalho aquilo que pretendo que veja. E aí, mais uma vez

lembro o que o mesmo GOMBRICH (1993: 3) relata: “De fato , não tardaremos em descobrir

que a beleza de um quadro não reside realmente na beleza do seu tema”. Ora, ao mesmo passo

que o autor diz que não existe Arte e somente artistas, ele enfatiza que o que importa num

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47

quadro, seja ele de que natureza for, não é a beleza de seu tema e sim a beleza que pode se

revelar a cada observador segundo seus sentimentos e vivências. Isso é muito complexo para

se entender em uma leitura breve e sucinta, mas, posso dizer que me parece o seguinte: A

beleza que se pode ver em um quadro depende do grau de experiência vivida pelo observador

e da afetuosidade que o mesmo possa lhe imprimir. Em outro trecho de sua explicação

GOMBRICH (1993 : 5) afirma:

“O que ocorre com a beleza também e válido para a expressão. De fato,

amiúde é a expressão de uma figura no quadro o que nos leva a gostar da obra

ou detestá-la. Algumas pessoas preferem uma expressão que elas entendam

com facilidade e, portanto, que as comova profundamente”.

Baseado nessas afirmações, fica entendido que, segundo GOMBRICH, algumas

pessoas ao observarem meu trabalho possam entender ser uma coisa, mas, ao analisar com

maior perceptividade, logo entenderá se tratar de outra. Isso é natural, uma vez que, para se

abstrair informações de uma obra de arte, se faz necessário um mínimo de experiência sobre o

tema e, sobre a linguagem em que essa obra se expressa, isso já disse anteriormente. Como o

próprio autor relata algumas pessoas têm conceitos preestabelecidos a respeito de coisas que

vê. E isso se deve às informações que são adquiridas ainda na infância como por exemplo que

as estrelas tem a forma estelar, e isso todos sabemos não ser verdade. Num outro parágrafo,

GOMBRICH (1993: 11) diz:

“Isso constitui, sem dúvida, um exemplo extremo, mas erros semelhantes não

são raros, em absoluto, como poderia se imaginar. Todos nós somos

inclinados a aceitar formas ou cores convencionais como únicas corretas. Por

vezes, as crianças pensam que as estrelas devem ter o formato estelar, embora

naturalmente não o tenham. As pessoas que insistem em que, num quadro, o

céu deve ser azul e a grama verde, não diferem muito dessas crianças.

Indignam-se ao ver outras cores numa tela, mas se tentarmos esquecer tudo o

que ouvimos a respeito de grama verde e céu azul, e olharmos o mundo como

se estivéssemos acabados de chagar de outro planeta numa viagem de

descoberta, vendo-o pela primeira vez, talvez concluíssemos que as coisas são

suscetíveis de apresentar as cores mais surpreendentes. Ora os pintores

sentem, às vezes, como se estivessem nessa viagem de descoberta. Querem vê

o mundo como uma novidade e rejeitar todas as noções aceitas e todos os

preconeitos sobre a cor rosada da carne e as”. maçãs amareladas ou

vermelhas. Não é fácil nos livrarmos dessas ideais pré-concebidas, mas os

artistas que melhor conseguem fazê-lo produzem geralmente as obras mais

excitantes.Eles é que nos ensinam a ver a natureza novas belezas de cuja

existência não tínhamos suspeitado. Se os acompanharmos e aprendermos

através deles, até mesmo um relance de olhos para fora da nossa janela poderá

converter-se numa emocionante aventura”.

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Isso é o que espero do observador, ao visualizar meus trabalhos. Abra a sua janela e

veja o mundo de uma forma diferente da que está acostumado. È uma nova leitura de um

objeto tridimensional, retratado para o bidimensional que é a fotografia, depois reproduzido

em outra linguagem expressiva em bi-dimensionalidade, que é a Marchetaria.

CAPITULO III

AS OBRAS E SUAS PARTICULARIDADES

Após a realização total de cada trabalho, posso fazer uma análise de tudo o que senti e

percebi visualmente sobre as dificuldades e o prazer pelo desfecho final do trabalho. Posso

afirmar que as dificuldades foram muitas, desde a escolha do tema e da linguagem até a

aquisição do material e finalizando com a confecção dos painéis ou quadros.

1 - O PRIMEIRO E SEGUNDO TRABALHOS

Figura 16 Figura 17

Título:Esperança Título: Paz

Dimensão: 0,50m X 0,61m Dimensão: 0,50m X 0,61m

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Apresento os dois modelos que fiz primeiro. A partir do modelo referenciado no anexo

II, que representa o chapéu característico do Guerreiro, onde se pode ver a imagem de uma

típica igreja interiorana, procurei abstrair da foto que serviu de modelo apenas as linhas

básicas daquele; mas, procurei dar nova cara e disposição das partes distintas que fazem a

composição final da maneira que imaginei. Percebe-se que o mesmo, está em perspectiva e

com corte frontal que lhe dá movimento. Como fundo, procurei utilizar a madeira de

tonalidade azulada de nome Blue apycot, para caracterizar um céu noturno que nas noites

quentes de verão alagoano, no mês de dezembro, sempre aparece límpido e com estrelas.

Também em Belém o céu estava limpo na noite do nascimento do menino Jesus. Pois foi a

estrela que guiou os reis magos até ele. Entretanto, como no nordeste chove nos dias de

dezembro às vezes o céu torna-se nublado e nuvens extemporâneas caem, para lavar os maus

agouros, pode-se divisar faixas claras que insinuam essa chuva.

Nota-se também, que a imagem do primeiro quadro, (Figura 16) apresenta-se em

contra-mergulho demonstrando claramente a (copa) do chapéu por baixo. O produto que

normalmente é utilizado para suporte das construções plásticas é de palha. Esses chapéus, na

maioria das vezes, têm a aba da frente levantada sobre a copa e, a partir daí, a ornamentação

da igreja, capela ou catedral. Também se observa a torre lateral com a abertura em forma de

vitral, que no meu trabalho, é apresentada em quatro cores diferentes. Divisa-se ainda a

estrutura principal que representa nave central de uma igreja comum.

Logo abaixo na aba restante do chapéu, as fitas multicoloridas, como que balançado,

dão o movimento imaginado. Essas fitas, são símbolos presentes em todos os ornatos de

cabeça.

Circundando o fundo, um filete de madeira branca que é sobrejuntado ao filete da

moldura em viés de Marchetaria. A este chapéu lhe foi atribuído o título de Esperança.

Alude ao nascimento do menino Jesus. O balão simboliza as festividades pelo nascimento de

são João primo de Jesus. E também, porque alguns folguedos como o Reisado por exemplo, é

brincado em datas juninas.

O Outro chapéu da Figura 17, é uma reprodução do mesmo modelo da foto, que foi

feito o primeiro, só que procurei dar uma ênfase maior na perspectiva e escorço, deformando

de certa forma a imagem para representar uma mesma igreja construída em cima de morro,

como comumente encontramos no nordeste. Mas como estou reproduzindo o chapéu e, não a

igreja, também suprimi a linha do horizonte para imprimir-lhe a idéia de flutuabilidade

espacial. Estes dois trabalhos foram realizados no mesmo tipo de material de suporte, que foi

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50

o compensando. Mas, como não gostei da performance apresentada após a prontificação, pela

deformação que o mesmo apresentou, resolvi fazer os demais trabalhos em MDF de 9mm.

O segundo trabalho lhe foi atribuído o titulo de Paz. O morro ou montanha na história

bíblica é o local de oração e paz. Neste exemplar, usei para o fundo uma madeira meio cinza,

querendo retratar um dia nublado ou chuvoso, como se anunciasse a paz do nascimento do

menino Jesus. A chuva lavaria e apagaria as marcas deixadas pela família de José em busca de

uma morada para o nascimento do menino Jesus. Como fugiam da perseguição de Herodes,

precisavam ser despistados. A chuva lavaria as pegadas.

O morro representa o terreno acidentado de Belém onde nasceu o Salvador. A lua e as

estrelas têm a ver com a indicação do local para onde deveriam se dirigir os três reis magos. A

estrela maior ao fundo, representa a estrela do oriente a menor, estrela d’alva. Na história

ela é a estrela de Belém. Veja no anexo IV dois versos da loa que se refere ao três reis magos

cantadas na folia de reis.

Ademais, também simboliza flutuação espacial dos chapéus. As fitas sempre estão

presentes reforçando a idéia de movimento.

Quero deixar como informação complementar neste parágrafo, que os títulos

atribuídos a todos os chapéus estão relacionados com a história do Guerreiro, porém

remetendo à história do filho de Deus. São títulos simples porém, taxativos remetendo

imediatamente ao contexto do Guerreiro. De alguma forma indissolúveis dos movimentos que

marcaram a história e trajetória do Salvador.

2 - O TERCEIRO E QUARTO TRABALHOS

Figura 18 Figura 19

Título:Irmandade Título: Fé

Dimensão: 0,50m X 0,61m Dimensão: 0,50m X 0,61m

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Feitos em MDF, estes trabalhos apresentam uma estética mais harmoniosa no tocante

à emoldurarão que fica disfarçada no próprio suporte. Procurei me esmerar mais na execução

do mesmo, uma vez que estava descobrindo uma nova técnica. E escolhi um chapéu que traz

uma peculiaridade ao mesmo tempo em que caracteriza um chapéu mouro, também tem muito

a ver com certos chapéus utilizados por cristãos.

Como no pastoril existe a figura da Diana que divide suas personagem entre o cordão

azul e o encarnado, quis agregar a este ornato a dupla utilização, como que um símbolo de

mediação entre o bem e o mal. È o único em que as fitas não estão baseadas na parte inferior

das abas do suporte (chapéu de palha) e sim, no topo. Este chapéu normalmente é feito de

pano ou fibras e a ele são colados espelhos fitas e outros adereços. E os personagens que

usam são geralmente figurantes do Reisado sem muita expressividade no grupo. Porém, no

Guerreiro ele assume uma marcante representação de mouro. Como na chegança geralmente

existem os mouros que são dominados pelos cristãos, no Guerreiro existem dois desses

personagens. A este trabalho (Figura 18), foi-lhe atribuído o nome de Irmandade. Os mouros

ao serem dominados e batizados tornavam-se cristãos. Porém essa conversão era feita pela

força e não pela persuasão. O beija-flor é símbolo de delicadeza, atitude que muitas vezes

faltou, ao se tratar os novos irmãos. Por essa razão procurei lembrar essa atitude.

A (Figura 19), representa uma catedral, símbolo de grande expressividade na religião

cristã por se tratar de um templo maior de adoração a Deus. As catedrais de estilo

arquitetônico romano, normalmente são construídas com duas torres laterais, ficando a

estrutura da nave central entre estas. Hoje, com a modernização, outros estilos se difundiram,

pelo mundo, entretanto procurei me referenciar neste modelo, por entender que sendo oriundo

de Roma nada melhor que isto para representar o cristianismo. Neste trabalho procurei retratar

a parte posterior do chapéu conforme o modelo se apresenta no anexo II. Quis retratar o lado

oculto da religião, aquele em que a sociedade não tem conhecimento. E a diminuta imagem

de uma lua em quarto crescente que aparece ao fundo quer demonstrar o acanhamento do fiel

em relação ao clero. Por essa razão aparece acanhadamente, querendo lembrar que diante da

pompa e da exuberância às vezes praticadas pelas religiões, a fé torna-se menor e acanhada.

Também flutua de forma tênue no espaço, demonstrando sutileza em relação ao objeto

principal que é o chapéu. Com isso quero demonstrar o poder da natureza na pessoa do

criador. E esse poder é que proporciona no homem a sua fé.

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52

O chapéu de palha se apresenta de forma mais compreensível porque todas extensões

das abas traseira e lateral, estão à mostra. Neste trabalho procurei desafiar à estética,

combinando madeiras de matizes cromáticos bem próximos, mas, com texturas diferentes. A

coloração de madeiras diferentes, é que dão ao painel, a distinção do fundo em relação ao

objeto. A este quadro foi-lhe atribuído o título de Fé. Uma vez que é nas catedrais que se

congrega a maioria das comunidades em busca de maiores e melhores esclarecimentos da

religião. A catedral é tida como símbolo de congregação da sociedade cristã. Como o de

muitas igrejas, o formato da Catedral é de uma âncora "que é o ponto firme numa

tempestade"; sinal de fé, confiança, esperança e salvação.

3 - O QUINTO E SEXTO TRABALHOS

Figura 20 Figura 21

Título: Igualdade Título: Mediação

Dimensão: 0,50m X 0,61m Dimensão: 0,50m X 0,61m

Também representando uma catedral com as duas torres e a nave central entre ambas,

(Figura 20), apresenta mais um chapéu do Guerreiro com enredo religioso porém, de formas

mais simplista, essa imagem quer passar para o observador a singeleza do povo pobre do

interior. Contudo, não deixa de ser uma representação de catedral, só que com maior

humildade que a anterior. Com aspecto mais simples quer demonstrar o que é pregado pela

igreja pelo mundo afora, que é a humildade, fraternidade e igualdade. Quis que ela traduzisse

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53

a grande maioria do povo cristão cujos maiores valores estão nos valores acima citados. De

tons mais singelos e linhas menos arrojadas que a anterior, carrega em sua própria singeleza a

caracterização de fé, esperança e paz. Com este exemplar, procuro reverenciar o povo pobre

cujas qualidades são a humildade, a fraternidade e a busca pela igualdade.Qualidades

dignificantes ao ser humano.

O material usado foi Marfim, Cerejeira, Mogno, Crown bronze, Ébano linheiro

listrado, Canela, Blue apycot, Imbuia, Louro Faia clareado, Rose wood e Pau Brasil, a Imbuia,

a Rádica branca, o Cedro e outras lâminas de madeira. Foi-lhe concedido o título de

Igualdade. O sol, ligeiramente encoberto por uma nuvem, quer insinuar a desconfiança do

povo em relação às religiões de um modo geral. Quer dizer que está duvidoso entre a luz e as

trevas.

Já na Figura 21 pode-se perceber que não representa um templo católico, porém,

carrega sinais da cristandade em suas linhas. Vê-se que os vitrais são em forma de cruz

símbolo maior da cristandade. Refere-se à diplomacia cujos prédios de embaixadas, se

verifica a pompa representativa dos poderes. Foi referenciado na figura do embaixador da

chegança que fiz este exemplar. Percebe-se a presença da fé cristã nos vitrais em forma de

cruz.

Utilizei o fundo como panorama principal, e recortei-o introduzindo linhas pretas em

leve alusão ao movimento neoclássico que dava grande importância a natureza destas. No

exemplo anterior também dei algumas conotações desse movimento introduzindo algumas

linhas sugestivas. Nesse trabalho, procurei separar a figura, do fundo, apenas com as linhas.

Aplicando alguns detalhes de outros materiais dei maior distinção à forma.

Foi-lhe concedo o título de Mediação. É o que faz um embaixador e, na chegança essa

figura é quem medeia a luta entre cristãos e mouros. Sempre acompanhava o conquistador,

que normalmente era um rei, príncipe ou imperador. Faz-se presente na chegança, seja ela de

mouros ou cristãos. Observando melhor, notar-se-á uma pequena borboleta a flutuar,

simbolizando a delicadeza no trato com as inter-relações diplomáticas. Também é símbolo de

leveza e fragilidade. O material utilizado foi o seguinte: Canela rosa, Cedro, Rádica branca,

Louro faia, Louro linheiro, Rádica branca, Blue apycot, Branco neve, Carvalho, Crown

bronze, Louro Faia, Louro Faia clareado, Rose wood entre outras.

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54

4 - O SÉTIMO E OITAVO TRABALHOS

Figura 22 Figura 23

Título: Liberdade Título: Vida

Dimensão: 0,50m X 0,61m Dimensão: 0,50m X 0,61m

Também representando uma capelinha, porém bem mais singela, este trabalho da

(Figura 22) que está montada sobre um chapéu de Mateus (Figura advinda do Reisado),

simboliza também no Guerreiro o Mundo Sacro, porém torna-se profano ao passo que

representa a liberdade. E essa liberdade é repensada pela igreja como uma rebeldia, caso o

indívíduo não aceite a catequização. O Mateus era uma espécie de guarda-costas do rei,

príncipe ou imperador, seja ele de que origem fosse, africana, indígena ou européia. E como

era um vassalo tinha sempre em mente a idéia de libertação. Como era um trabalhador a

serviço do poder, lhe foi atribuído o título de Liberdade. Entendo que o homem só consegue

a liberdade a partir do trabalho. Abstraída do chapéu de um Mateus, que é uma das figuras do

Guerreiro, advém do Reisado e do Pastoril e representa uma espécie de segurança nos dias de

hoje. Esta figura do Mateus apresenta também uma singeleza da capela o que vem enfatizar a

singeleza povo. Por entender que a liberdade vem com o trabalho, e deste a segurança e a paz,

a pombinha pretende dar interpretação de liberdade. Não o trabalho subumano ou predatório

do ponto de vista sócio-econômico, mas o trabalho de subsistência dignificante.

Page 55: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

55

Também utilizei vários materiais como alguns dos já descritos acima. Parte da figura,

foi utilizada a Cerejeira contrastando com o fundo de Figueira Branca. Usei ainda o Marfim,

Mogno, Blue apycot, Imbuia, Louro Faia clareado, Rose wood, Branco neve, Cedro e outros.

Quando realizava este trabalho me recordava das injustiças por que passa o povo no

Brasil e no mundo. A falta de liberdade de expressão e pensamento que é mascarada pela

comunicação de massa e a falsa democracia socialista implantada com a globalização. Isto me

impeliu atribuir este título.

A (Figura 23) é uma referência mais do que justa, ao nosso índio. O trabalho que

realizei em homenagem ao índio muito me sensibilizou, por entender que além de ser uma

figura do Guerreiro, também se volta para uma luta das populações indígenas. Marginalizado,

massacrado e esquecido, esse povo que era dono das terras brasileiras, está acuado em

pequenas reservas delimitadas pelo governo. Quase extinto, e, usurpado nos seus direitos,

pela sociedade dita civil.

A figura do índio, presente no folguedo, é mais do que justa, uma vez que enaltece

esse povo como os verdadeiros Guerreiros que são. Neste trabalho procurei dá um pouco mais

de atenção e dedicação ao tema, e procurei retratar da melhor forma o que representa essa

população. Utilizei quase todas as madeiras em micros retalhos, e isto de propósito, pois é na

selva que se encontra a variedade de espécies e o índio sabe preservar e tirar proveito de tudo

que ela oferece sem depredar a natureza. Procurei retratar através da figura do cocar, peça da

indumentária dos Caboclinhos, e que, é um dos objetos mais apreciados pelos povos não

indígenas como souvenir por ser o símbolo maior das nações indígenas.

As fitas também se fazem presentes para dar maior autenticidade na composição

cromática e na originalidade do chapéu do Guerreiro. Os dois elementos de composição

complementares, a seta e o sol escurecido, têm a intenção de remeter o observador a repensar

sobre dois fatores que assolam o planeta. A destruição das florestas e da camada de ozônio. A

seta, lembra a caça de subsistência, seriamente ameaçada pela depredação do homem nas

florestas. E o sol enegrecido pelas queimadas e toneladas de poluentes despejadas diariamente

na atmosfera. Entendi que acrescentar estes dois símbolos poderia levar o observador a uma

melhor reflexão. Foi-lhe atribuído o título de Vida. É uma forma de apelo à conscientização

do homem. Quero dessa maneira artística, dar o meu grito de basta! Os materiais utilizados

foram, praticamente todos os que se encontravam à disposição. É vida porque a floresta é o

que se pode qualificar como o maior laboratório de procriação de todas as espécies. E o índio

aqui representa exatamente a floresta

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56

5 - O NONO E DÉCIMO TRABALHOS

Figura 24 Figura 25

Título: Morte Título: Poder

Dimensão: 0,50m X 0,61m Dimensão: 0,50m X 0,61m

A Figura 24 é uma referencia à lira, figura simbólica presente no Guerreiro, mas, que é

oriunda de outros folguedos como o Reisado, o Pastoril e a Chegança. Segundo a lenda, os

reis magos levaram suas escravas para acompanhá-los na visita ao menino Jesus. E essas

escravas despertavam ciúmes nas rainhas, que as mandava matar. Porém, na chegança

também se faz presente a lira que por outro lado se tem como as musas que cantavam para os

seus amos. Em ambos os casos ela representam uma personalidade de dupla atividade. Uma

como escrava honesta representando o sacro, e outra como amante representado profano. Por

isso me quero me reportar à figura da Diana no pastoril, que não é partidária de nenhum dos

cordões, mas é dos dois ao mesmo tempo, representando uma espécie de dicótoma. E aí mais

uma vez vem à baila o sagrado e o profano, o bem e o mal, o cristão e o mouro.

Para realizar o painel que representa a Lira, procurei abstrair alguns detalhes do

modelo e retratá-los numa espécie de coliseu. O coliseu era um local sacro-profano onde se

realizavam as lutas de gladiadores e a destruição de cristão pelos leões. Normalmente os

gladiadores eram escolhidos entre os escravos cristãos, para fazer a alegria dos monarcas

pagãos. Por isso, procurei inserir neste trabalho, símbolos que representam tanto os mouros

como os cristãos. O quase imperceptível cometa que dispus discretamente, tem dupla

intencionalidade, uma remeter ao nascimento do menino Jesus, e outra de deixar claro que

nem tudo na vida é permanente, só Deus.

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57

Já os recortes em forma de arcos árabes remetem aos mouros, que eram descendentes

daqueles. Mas também lembra algumas construções cristãs. Também se encontram inseridos,

signos cristãos como os triângulos que representa a santíssima trindade. A este trabalho lhe foi

atribuído o titulo de Morte. Pois era no coliseu que os cristãos eram trucidados uns pelos

outros nas lutas sangrentas ou pelos leões famintos do imperador. A morte reinava impiedosa.

Foram utilizadas quase todas as lâminas de madeira com algumas abstenções. Na

(Figura 25) trato do poder, na figura do rei. Esse poder está presente no desenvolvimento

temático do folguedo Guerreiro. Por isso, como símbolo de poder, procurei me centrar numa

Coroa. Neste caso particular, procurei dar a essa imagem, características que se encontram em

ambas culturas religiosas. Tanto na dos mouros, onde os califas reis e príncipes, usavam-nas

nas suas incursões, assim como na dos cristãos através de papas e conquistadores em nome da

igreja como Carlos Magno. A forma e a estética desse trabalho, provavelmente remeterá o

observador, a visualizar as linhas utilizadas nas culturas árabe e romana. Existem símbolos

como o olho, o caracol, os arcos e, a própria forma da coroa que tanto pode ser assimilada

como árabe ou cristão. O fundo foi feito em cerejeira e as figuras em outros materiais tais

como: Pau Brasil, Walmut, Rose wood, Amapá, Figueira Branca, Weng e outros. Os pássaros

em retirada lembram as migrações de mouros e cristãos em busca de novos horizontes. Mas

também é símbolo de liberdade. Todos os títulos que atribui aos trabalhos estão ligados direta

ou indiretamente ao Guerreiro e aos fatos históricos da vida de Jesus Cristo. O quadro ou

painel de número dez lhe foi atribuído o título Poder, porque representa o domínio do grande

sobre o pequeno, do rico sobre o pobre do intelectual sobre o incauto. Ele se apresenta em

forma de coroa que é o símbolo maior monarquia. Não coincidentemente coloquei lado a lado

os dois, a Lira como representante da escravidão em Coroa como representante do poder

dominador.

Se por um lado realizei um trabalho artístico, por outro procurei narrar de forma

sucinta e visual em apenas dez exemplares, uma pequena parte do que é o folguedo,

retratando um fragmento de sua indumentária,que neste caso é o chapéu. Contando algumas

passagens da história do Guerreiro e de sua origem, em linguagem visual. Espero que findo

estas explicações, o leitor possa compreender a proposta por mim escolhida que era a de

mostrar através da arte da Marchetaria, uma resenha do que é o folguedo Guerreiro e quais

suas raízes e destinações. Também aproveitar a oportunidade para falar de uma arte milenar

que anda de certa forma esquecida, mas que já ornamentou muitos palácios pelo mundo afora

que é Marcheta

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58

CONCLUSÃO

Finalizando este trabalho, entendo que consegui atingir o objetivo de levar ao

conhecimento do leitor vários fatores que de alguma maneira o fazem indagar acerca do

contexto em que vive. Na introdução talvez não tenha conseguido atribuir uma conotação

mais explicativa que levasse o leitor a entender imediatamente o desfecho final da minha

propositura. Falo superficialmente sobre a temática que é o chapéu do Guerreiro mas, em

outros parágrafos destaco como figura central dessa temática o fragmento desse folguedo que

é chapéu.

Depois já entro com explicação sobre a linguagem utilizada na reprodução de tais

objetos. Aí falo da marchetaria, arte milenar desconhecida de muitos. E termino minha

introdução falando um pouco sobre a história e origem de ambas.

Agora quero encerrar este relatório, dizendo que foi difícil discorrer sobre a temática

sem passear pelos demais folguedos que deram origem ao guerreiro. Por isso fiz um breve

apanhado de cada um deles. Procurei resumir ao máximo o comentário, falando apenas de

alguns traços característicos que os envolve. Todavia, muita coisa deixou de ser citada, pois

não caberia aqui extrapolar o objetivo precípuo do trabalho, que é sem dúvidas a apresentação

prática em marchetaria, linguagem expressiva visual que escolhi para realizar minha

monografia. Depois de tudo feito e avaliado, entendo que cumpri com minha tarefa.

Os quadros ora apresentados à banca, com suas fotos dispostas no portifólio, com as

explicações necessárias ao entendimento do leitor creio eu, em si já explicam o objetivo a que

se propõem. A titulação atribuída aos mesmos, foi uma forma de demonstrar que apesar de ser

uma temática que possa, de imediato, remeter o leitor ou o observador a uma interpretação

preconceituosa de que o assunto se refere, no caso o chapéu com suas peculiaridades, também

o leva a conhecer mais criteriosamente o que é um folguedo como o Guerreiro, cuja origem

temática é voltada para o lado religioso e não profano.

O trabalho, não só fala do folguedo como forma de expressão cultural, e da

Marchetaria como forma de expressão visual, mas também da história que deu origem ao

mesmo, como forma de expressão espiritual. Fala do nascimento do menino Jesus e de toda

sorte de lutas, perseguições, domínio, poder, fé, morte, reconciliação, inter-relação entre

povos, liberdade, amor, ódio e demais sutilezas que permeiam a sua história. Fala do místico

de uma maneira geral. Trata, também, da forma de compor em partes, do recorte, do

Page 59: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

59

combinar, do organizar. Portanto, o trabalho alcançou a dimensão tanto racional quanto

sentimental histórico e cultural.

Cabe ao leitor tirar suas conclusões interpretativas. O trabalho textual bem como o

visual procura se enquadrar no contexto das normas acadêmicas por se tratar de um trabalho

de final de curso. Porém, como trabalho plástico, levado à exposição, o olhar do espectador é

que provavelmente fruirá as informações necessárias à interpretação do conteúdo, abstraindo-

lhe as informações que lhe forem convenientes. Entendo dessa forma haver conseguido o

objetivo.

Page 60: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

60

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Page 63: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

63

VESTIMENTAS do Guerreiro sem autor identificado

www.ufal.br/guerreiropornatureza/tremeterra.htm. - Visitado em 18/09/2005.

WERNECK, Paulo - Foto de obra e Biografia do autor

www.projetopaulowerneck.com.br/areaGrid.asp?area=PROJETOS&Idioma=P

Page 64: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

64

Anexo I

Lâminas de madeira para Marchetaria.

As que foram utilizadas nos trabalhos estão com asterisco.

Abdu rendado *

22x25cm - Germany - deslumbrante

E.V. ash * - zebrano

31x31cm

Amapá *

28x31

EV. red devil wood

32x32cm

Blue apycot *

32x32

Figueira Branca*

31x27cm

Branco neve *

27x31cm

Imbuia *

29x31cm

Canela*

31x31cm

Imbuia Branca*

29x31cm

Carvalho*

28x31cm

Imbuia crespa* -

Meia rádica 26x31cm - imitação

Cedro* 29x31cm

Ipê tabaco

23x31cm

Cerejeira*

31x31cm

Louro Faia*

Crown bronze*

31x31cm - Made in Italy

Louro Faia clareado*

12,5x31cm

Curupixa 30x31cm

Louro Vermelho*

31x31cm

Ébano linheiro

listrado*

31x31cm

Makoré

31x31cm

Ébano linheiro negro* - Ebony

31x31cm

Maple*

16x31cm

Page 65: Almeida; mário duarte de   releitura de imagens do guerreiro em marchetaria

65

Pereira* 20x31cm - linda cor (mistura de rosa com vermelho)

Radica oliva*

31x31cm

Rose wood*

31x31cm

Walmut*

31x31cm

Walmut Listrado*

31x31cm

Weng

31x31cm

Marfim *

31x31cm

Marfim linheiro*

31x31cm

Mogno africano *

26x32cm - Imitação natural do nosso mogno

Muirapiranga 31x31cm - Tende bastante

para o vermelho

Nogueira *

24x31cm

Olho de gato

31x31cm

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66

Anexo II

Modelos de chapéus que serviram como base para a realização da parte prática da

monografia.

Modelo dos dois primeiros exemplares intitulados Esperança e

Paz.

Modelo que serviu como base para a confecção do trabalho

intitulado Irmandade.

Modelo que serviu de base para a realização do trabalho

intitulado Fé.

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67

Modelo que inspirou a confecção do trabalho intitulado

Poder.

Modelo que inspirou a confecção do trabalho intitulado

Igualdade.

Modelo que inspirou a confecção do trabalho intitulado

Mediação.

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68

Modelo que inspirou a confecção do trabalho intitulado Vida.

Modelo que inspirou a confecção do trabalho intitulado

morte.

Modelo que inspirou a confecção do trabalho intitulado

Liberdade.

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69

Anexo III

Algumas informações complementares sobre os folguedos que deram, origem ao

Guerreiro.

Pastoril

Composição e coreografia:

Indumentária: Dois cordões e uma Diana entre estes. Roupas coloridas de uma só cor ou

combinadas mais de uma. Azul e Encarnado. Diana as duas cores.

Instrumentos musicais: ganzá, cavaquinho, violão, flauta, viola, trombone, etc.

Integrantes: Pastoras, Pastores, Velho palhaço e Diana.

Coreografia: Pastoras ou Pastorinhas: São blocos compostos de mulheres, e às vezes também

de homens. Formam dois ranchos ou cordões que recebem o nome conforme a cor das

vestimentas - no Nordeste cordão azul e cordão encarnado.

Reisado

Composição e coreografia:

Indumentária: Também dois cordões, vestidos com muito colorido seus chapéus são

variados mas, diferem do guerreiro.

Instrumentos musicais: ganzá, cavaquinho, violão, flauta, viola, trombone, pandeiros,

sanfona etc.

Integrantes: Rei, Mestre, Contramestre, Catarina (palhaça), Figuras - trajes idênticos

Coreografia: Abrição da porta, Entrada, Louvação ao Divino,Chamadas do rei, Peças de sala

e Danças.

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Chegança

Composição e coreografia:

Indumentária: Roupas de marinheiros ou camisetas de seda coloridas em dois cordões. A

predominância é do azul e do branco.

Instrumentos musicais: ganzá, cavaquinho, violão, flauta, viola, trombone, pandeiros,

sanfona etc. O pandeiro é o principal instrumento de acompanhamento, eles utilizam também

apitos e espadas

Integrantes: General, Capitão, Capitão Piloto, Marinheiros, Mouros, Rei, ou Príncipe, Lira,

Mateus, Padre, Bêbado etc.

Coreografia: A Chegança é uma verdadeira apresentação teatral, e o espetáculo tem cerca de

60 minutos.É uma dança que representa em sua evolução a luta dos cristãos pelo batismo dos

Mouros. A apresentação sempre acontece nas portas de igrejas, onde uma embarcação de

madeira é montada para o desenvolvimento das jornadas.

www.infonet.com.br/saojoao/2002/culturase/grupos.asp -Foto

Caboclinhos

Composição e coreografia:

Indumentária: Roupas feitas com penas de aves exóticas, cocares e pintura corporal feita

com frutos silvestres..

Instrumentos musicais: ganzá, pandeiros, matracas, maracaxás, arcos e flechas, bordunas

etc.

Integrantes: Cacique, pagé, índios/índias e curumins. As figuras da dança são: Cacique,

Índia-Chefe, Capitão, Tenente, Perós(meninos e meninas), Porta-Estandarte, Caboclos de

Baque(músicos), Caboclos e Caboclas. Caboclo no Nordeste significa a mistura de índio com

branco, e caboclinhos são os filhos dos caboclos.

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71

Coreografia: Danças conforme as tradições indígenas, como o toré por exemplo, que é muito

dançado pelas tribos do nordeste. Não tem dois cordões apenas um bloco.

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72

ANEXO IV

Versos narrados nas loas (Cantorias) dos folguedos.

Cantos de Folia de Reis Cantadas no Guerreiro.

Destaquei apenas alguns versos como exemplos para que o leitor possa ter uma idéia entre os

títulos dos quadros e sua fundamentação.

Reisado Pastoril

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73

Sai a estrela do Oriente,

Que nasceu pelo Natal,

À meia noite em ponto,

Antes do galo cantar.

O Menino Deus nasceu,

Num ranchinho de capim,

Sendo um Deus tão poderoso,

Sendo tão modesto assim.

Os trêis Reis foro guiado,

Onde as estrela lumiô,

Já nasceu Sinhô Menino,

Para ser o Redentor.

Aí vem os trêis Reis,

Com seu presente na mão,

Vem visitá Menino Deus,

Vêm fazê-lo adoração.

Vamo-nos, vamos com pressa,

À capelinha de Belém,

Adorá este menino

Que cavalou o mundo bem.

Da cepa nasceu a rama

Da rama nasceu a flor,

E da flor nasceu Maria

Mãe de Nosso Senhor.

Vamos companheiras, vamos,

Vamos a Belém,

Para queimar as palhinhas

Onde nasceu nosso bem.

Sou a Mestra

Do Cordão encarnado

O meu cordão

Eu sei dominar

Eu peço palmas

Peço riso e flores

Ao partidário

Eu peço proteção.

Sou a contramestra

Do Cordão azul

O meu partido

Eu sei dominar

Sou a Diana, não tenho partido

O meu partido são os dois cordões,

Eu peço palmas, fitas e flores

Ó meus senhores, sua proteção..

Caboclinhos Chegança

"Sou Pataxó,

sou Xavante e Cariri,

Ianonami sou Tupi,

Guarani, sou Carajá"

Somos todos de baitará

A raça de tupi,

Somos marão de quá

Do chefe caiubi.

Côro de mouros ao longe

-Faziam trêis anos i um dia

Qui andam’ na costa vagando

 procura dus cristão

Qui anda nus pèrtubando!...

Côro de mouros( aparecendo):

-Eu venho de Aragóis!

Um’ imbaixada

Qui meu sinhô

Vus mandô dá!

-Lá na linha’avistei vela!

Avistei, seu Cumandante,

Uma fragata di guerra!

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74

Obs: Os erros de português são normais. Versos tirados do livro de Mário de Andrade e de

Rossini Tavares de Lima.

Três exemplos do chapéu mouro denominado irmandade.

Anexo V

Somos tudo inadara

Da Raça de tupi,

Somu barão de guerra,

Do chefe Itajubi.

Mi parece qu’é us môro,

Qui vêm dá cumbat’im terra!

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Memorial Descritivo

Painel em Marchetaria

Título: Esperança

Dimensões: 0,50m X 0,61m

Autor: Mário Duarte de Almeida

Mário Duarte de Almeida

Portfólio

Marchetaria

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76

Esperança

Reprodução de Chapéu do Guerreiro em forma de Igreja, em corte frontal, com

tomada em contra-mergulho com vitrais, portais e janelas estilizadas. O fundo

representado por céu escurecido, sugerindo uma noite chuvosa. A linha de horizonte foi

abstraída para dar uma conotação de suspensão ao objeto. As fitas coloridas sugerem

movimento. Feito em compensado de 6mm e emoldurado. A imagem do objeto foi feita

em Lâminas de Marchetaria de vários tipos e matizes.

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Modelo de referência -------- >

Anexo V

PORTIFÓLIO

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Marchetaria