aliv ro sergio niza jorge ramos doo
TRANSCRIPT
-
7/21/2019 Aliv Ro Sergio Niza Jorge Ramos Doo
1/9
-
7/21/2019 Aliv Ro Sergio Niza Jorge Ramos Doo
2/9
Apresentao do livro Srgio Niza: Escritos sobre Educao 2
Jorge Ramos do
2014 | O LUGAR DOS NOSSOS TEXTOS Escritos Partilhados 4
no enfrentamento do intolervel, isto , de
uma instituio toda ela construda para, por
meio da certificao escolar, tornar natural a
supremacia e prepotncia dos "maisdotados" e, ao mesmo tempo, encher de
culpa surda e produzir a respetiva no-
inscrio social da gigantesca mole de alunos
que fica pelo caminho.
H, pois, como ele mesmo gosta de dizer,
que permanecer em "guerra aberta iluso
dos grupos homogneos" e da recapitulao
de contedos, afirmando, em alternativa, a
possibilidade de produzir, j a partir da
infncia e na sua inteireza mesma, os vrios
processos sociais em que se d "a
construo da cultura toda". Na assuno da
sua diferena individual, insiste Srgio Niza,
todos os alunos devem participar no
planeamento, organizao e avaliao da
vida da turma e das tarefas escolares.
Estamos, j se v, perante uma proposta em
que o ato de aprender dispensa a funo
ensinante das lies formais iguais para
todos, em favor de uma prtica vocacionada
para assumir, e cito, a "heterogeneidade
como recurso fundamental", quer dizer,
que descubra na individualizao do percursoescolar e no convvio cultural com os pares a
condio da melhoria das capacidades
cognitivas. Nos seus escritos e ditos, Srgio
Niza est continuamente a lembrar-nos que
a agigantada e paradoxal mquina de
excluso em que se transformou nos ltimos
100 anos o programa da chamada "escola
para todos", pode ser questionada no
corao de si mesmo, por meio de umtrabalho curricular "em cooperao plena"
H ento que fazer comparticipar os alunos
nas funes de ensino e acompanh-los em
projetos de trabalho e na resoluo de
problemas, desmultiplicar os recursos
coletivos, alimentar continuamente
dispositivos de planificao do currculo e
avaliao feitos em grupo, dando sempre e
sempre "especial relevo ao valor cognitivo da
controvrsia conceptual atravs da
linguagem", desencadeando "novas formas
de tutoria entre os alunos", baseadas na
colaborao e reciprocidade solidria.
Assim, de repetidor-infinito de uma verdade
cientfica que j chega sem vida ao livro
escolar e nele permanece, o aluno
descoberto como um "parceiro intelectual"
que constri e escreve as aprendizagens,
podendo a turma adquirir, enfim, e cito, "a
dimenso colegial de uma comunidade que
aprende e se autorregula com a mais valia
de um adulto o docente , agora um
profissional da aprendizagem e do estudo". Anossa maior urgncia que a escola pblica
comece a trabalhar para que tambm os
alunos que no provm da classe mdia
possam ter nela sucesso.
Eis-nos por esta via colocados ante uma
-
7/21/2019 Aliv Ro Sergio Niza Jorge Ramos Doo
3/9
Apresentao do livro Srgio Niza: Escritos sobre Educao 3
Jorge Ramos do
2014 | O LUGAR DOS NOSSOS TEXTOS Escritos Partilhados 4
inverso fundamental do ato pedaggico.
Aquele em que um normativismo
essencialmente manipulatrio "que
confunde a transposio didtica de umconhecimento com esse Conhecimento"
cede lugar a um encontro dos alunos com os
instrumentos atravs dos quais se produz a
linguagem da cincia. Parece de uma
meridiana evidncia, mas a escola que
temos ignora, to soberana e cheia de si
mesma, que o conhecimento se produz na
ao de se produzir, que "no possvel
construir aprendizagens sem falar e escrever
as aprendizagens". Esclarece-nos bem
Srgio Niza neste passo da sua narrativa.
Cito: " necessrio criar ambientes onde os
alunos possam falar, possam dizer o
conhecimento, escrever o conhecimento e
p-lo a circular, principalmente na sua
comunidade, para perceberem, desde logo,
como conhecer socialmente til. Eu no
estou a aprender para amanh. Eu estou a
aprender para j. Tudo o que eu aprender
tenho de partilh-lo com os outros para
ajudar os outros, e se estou a fazer um
estudo eu apresento-o aos outros e
submeto-o ao juzo dos outros. ali queganha sentido. No ao professor que eu
vou ensinar. O professor uma figura um
pouco imaginria. O aluno tem de produzir
para as pessoas reais, com o professor
tambm l dentro e que o ajuda a ir mais
longe". Como se verifica, esta operao
crtica no se faz em nome do facilitismo,
como tantas vezes se quer fazer passar,
mas, antes, em favor da democratizao dogesto mais ocultado pela cultura escolar. O
que autoriza a posse efetiva dos mtodos e
processos intelectuais sobre que se
constroem os vrios saberes. A fora do
discurso de Srgio Niza a de fazer
imaginar, como realizvel hic et nunc, a
possibilidade de fazer corresponder ao ato de
aprendizagem uma prtica de discusso
incondicional e sem pressuposto
Multiplicidade e multiplicao. O lugar da
Cincia que toda a escola democrtica
deveria compor seria, ento, o da
reelaborao permanente da verdade e o da
fico da experimentao. Ele no cessa de
nos dizer que ser por essa via de uma
problematizao sem fim que se superar a
velha lgica da ordem explicadora, esse
mito-maior da pedagogia, que tem estado
quase sempre ao servio da edificao de
uma fronteira, logo tornada um fosso, entre
as matrias ensinadas e quem se dispe a
aprend-las em sala de aula. A parbola de
um mundo dividido entre espritos sbios eespritos ignorantes, insistia-se, s tem
servido para negar a simetria de duas
vontades, a possibilidade de um encontro
feliz entre duas inteligncias. Ora, na sua
proposta de uma gesto cooperada, Srgio
-
7/21/2019 Aliv Ro Sergio Niza Jorge Ramos Doo
4/9
Apresentao do livro Srgio Niza: Escritos sobre Educao 4
Jorge Ramos do
2014 | O LUGAR DOS NOSSOS TEXTOS Escritos Partilhados 4
Niza, incita-nos a compreender que ensinar e
aprender no constituem uma potncia
divisvel. E que o cerne de todo o mtodo
consiste, to s, em procurar e que, noprocesso da procura, alunos e professores
coincidem por inteiro. No h possibilidade
de construo da informao fora da troca,
dos canais, das redes, dos servidores, dessa
potica da fluidez que torna todo o
pensamento hbrido e cada texto um
intertexto. Formao e mestiagem
deveriam nesta perspetiva tornar-se, atravs
da vivncia escolar, palavras sinnimas.
Srgio Niza, semelhana de vrios de ns,
escolheu o palco da histria para melhor
entender como a instituio escolar mau
grado as constantes reformas "inovadoras"
que se vm atropelando sem descanso na
arena educativa desde o primeiro quartel de
Oitocentos permanece no essencial a
mesma desde o sculo XVII. Ao lermos as
pginas deste seu livro percebemos que os
princpios de uniformidade, homogeneizao
e normalizao dos comportamentos,
concretizando-se num figurino organizacional
altamente seletivo e discriminatrio,
constituem a marca mais funda epermanente da escola, posto que esto nela
inscritos desde a sua fundao. Ora, ser em
nome da anlise desta ocultada evidncia
histrica que Srgio Niza nos aparece to
firme e determinado na oposio ao que
denomina aqui de "ensino simultneo
sistemtico", em favor de uma cultura por
vir da diferena.No podemos deixar de nos
inquietar com constantes afirmaes suasque nos dizem que a maioria dos professores
se limita, na atualidade, a dar continuidade
aos mtodos de trabalho iniciados por Jean-
Batiste de La Salle (1651-1719) fundador
da congregao religiosa os Irmos das
Escolas Crists destinados a ensinar
muitas crianas pobres como se fossem uma
s, atravs de um dispositivo curricular
constitudo por: (i) um mesmo livro para
todos utilizado numa sala de aula de acordo
com um ritmo decidido pelo professor; (ii)
um emprego calculado do tempo para evitar
a ociosidade dos alunos e otimizar o
rendimento escolar; (iii) um controlo do
saber adquirido atravs de um exame que
determina a passagem de um nvel para
outro e, dessa forma, organiza todas as
prticas de aprendizagem; (iv) uma
vigilncia organizada que atinge no s a
conduta do aluno como a sua interioridade
psicolgica. Esta matriz seiscentista que
produziu o enclausuramento do escolar, a
racionalizao magistercntrica do trabalhodocente, a uniformizao dos mtodos e dos
materiais didticos, foi universalizadacom o
triunfo do liberalismo-iluminista, ao longo da
primeira metade do sculo XIX, constituindo
desde ento a gramtica da escola laica,
-
7/21/2019 Aliv Ro Sergio Niza Jorge Ramos Doo
5/9
Apresentao do livro Srgio Niza: Escritos sobre Educao 5
Jorge Ramos do
2014 | O LUGAR DOS NOSSOS TEXTOS Escritos Partilhados 4
democrtica e republicana.
Srgio Niza adota uma metodologia do
longnquo que tem por nico objetivo
fornecer-nos uma histria do presente e,dessa forma, levar-nos a pens-lo de modo
radicalmente diferente. Depois de Srgio
Niza fica mais difcil identificar aprendizagem
com a repetio ad nauseamdo texto escrito
e aceitar a misria interrelacional da escola
quartel. A tese do poder moderno sempre
a mesma onde quer que nos encontremos:
que a opresso e a submisso possam
continuar a ser autoconsentidas pelos
destinatrios delas e que a hierarquizao
surja como consequncia natural do
proclamado mrito individual.
fundamentalmente este objetivo disciplinar
que o Estado-nao atribui instituio
escolar.
Srgio Niza coloca-nos perante a
possibilidade real de uma inverso no modo
de aprender e que atinge o mago da
gramtica da escola. As pginas do seu
punho esto cheias de consideraes
prticas no sentido de fazer de cada um dos
alunos um escritor, como ele tanto gosta de
dizer parafraseando Roland Banhes que lheest sempre to prximo. Urge trabalhar
exatamente na direo oposta em que temos
estado desde o incio da escola: partir da
escrita para a leitura e no desta para a
produo do texto. Com Srgio Niza
aprendemos que toda a discusso
pedaggica se deve iniciar e terminar em
torno de um s princpio programtico o de
inscrever e manter operacional o processode democratizao do gesto criativo. No h
como deixar de insistir que a instituio
escolar inscreveu no seu interior a escrita
como princpio e fim das aprendizagens,
mas, ao mesmo tempo, a tem subalternizado
incessantemente em favor da leitura. Isto
vale por dizer que toda uma civilizao se
vem relacionando com a cultura escrita
atravs de uma prtica da demonstrao,
fundando-se na leitura e na sacralizao do
livro, reificados como estruturas que revelam
verdades h muito estabelecidas como
necessrias e inquestionveis. E como seria
fcil mostrar que as mais das vezes estes
conhecimentos so h muito ou sempre o
foram mesmo totalmente obsoletos e
inteis nos respetivos campos cientficos de
origem! profundamente triste mas facto
que nunca ultrapassmos na escola a misso
judaico-crist que ela teve at ao fim do
Antigo Regime, a de a escrita se objetivar no
acesso ao texto cannico.
porque se apresenta como a instituio porexcelncia da conservao social que a
escola hipervaloriza e esgota os seus
efetivos em delirantes rotinas de repetio,
anotao, sntese e comentrio, fazendo
querer maioria dos que a no aguentam
-
7/21/2019 Aliv Ro Sergio Niza Jorge Ramos Doo
6/9
Apresentao do livro Srgio Niza: Escritos sobre Educao 6
Jorge Ramos do
2014 | O LUGAR DOS NOSSOS TEXTOS Escritos Partilhados 4
que a criao , justamente, o prmio que
alcanam os que se mantm at ao fim
ativos adentro da absurda mquina escrava
da mimesis e a ela sobreviver.No fundamental, ler e escrever tm sido,
como julgo se compreende melhor luz
destas consideraes, sinnimo de uma
fratura entre duas formas de vida bem
distintas. Temos, por um lado, esse mundo
exguo, constantemente rarefeito por ao
da escola, composto por aqueles que
concebem e assinam os objetos culturais,
narcisicamente eleitos por todos os meios de
comunicao como celebridades no seu
domnio de ao, seja este econmico,
cientfico ou cultural e artstico; temos, por
outro lado, a multido, sempre em
crescimento medida que o sculo XX
afirmou a chamada "escola para todos",
composta pelos que dela foram obrigados a
sair e que, no mximo, podem aspirar a
assistir ou a desejar consumir estes
poderiam, de acordo com o mesmo
raciocnio, ser designados de leitores.
Porventura uma das zonas mais cegas desta
poderosa mquina de hierarquizao social
a que defende massivamente, com aconfiana de ter o melhor e o mais saudvel
dos produtos para administrar aos outros,
"polticas de leitura" para as crianas e os
jovens, glorificando a figura do autor como
estando na origem de tudo o que produz e
afirma, qual deus ex machina do nosso
destino coletivo. importante compreender
como, de h dois sculos a esta parte, o
imaginrio educativo dominado quase semconcorrncia pela mundividncia liberal e
pela retrica da igualdade de oportunidades
para todos, mas toma o livro como o locus
da transcendncia e do endeusamento
Compreende-se como se trata de fazer a
apologia dos bens culturais para os
controlar, selecionar, organizar, delimitar,
restringir, rarefazer. H que insistir, sempre
e mais uma e outra vez, que o nosso modelo
escolar descobre no texto cientfico e literrio
o ndice ou a soma de tudo o que pode ser
dito sobre qualquer assunto, tornando
completamente impossvel formularem-se
proposies novas, enunciados novos. Em
nome de que modelo de sociedade por vir se
interdita em absoluto as crianas e os jovens
de participar no mais srio dos jogos, o da
busca da verdade? O aluno algum que se
deve apenas perceber "no verdadeiro",
imerso no jogo restrito e silencioso da
repetio indefinida do mesmo texto.
Ao escutar Srgio Niza fica mais clara a
urgncia de uma poltica da escrita cujapositividade afirme como sendo a mais
terrvel de todas as dominaes, a que se
produz na ausncia do questionamento. As
noes de ludicidade, de reelaborao, de
troca e de anonimato da linguagem,
-
7/21/2019 Aliv Ro Sergio Niza Jorge Ramos Doo
7/9
Apresentao do livro Srgio Niza: Escritos sobre Educao 7
Jorge Ramos do
2014 | O LUGAR DOS NOSSOS TEXTOS Escritos Partilhados 4
consubstanciais a todo e qualquer ato
criativo, cientfico ou outro, so as que
evidentemente chocam de frente com os
mltiplos e insuspeitos poderes quecombatem a expanso do mais perturbador
dos desejos, aquele que, sob o nome comum
de escrita, descobre uma operao que
simultaneamente reflete, inventa e dispe
artefactos no mundo como se de uma
qualquer fico experimental se tratasse.
Julgo que exatamente em nome de uma
vida social pobre e enfraquecida a partir do
interior de si mesma que se obstaculiza a
que a escola produza acontecimentos que
transportem, em simultneo, reflexo,
inventividade e singularidade. A nossa
tragdia tem sido a de que os poderes na
modernidade, sejam eles quais forem e
apresentem-se como se apresentarem, se
ampliam na razo inversa da livre
experimentao e do livre questionamento.
"A escola", alerta-nos Srgio Niza, "ser a
ltima a aceitar a complexidade e
heterogeneidade do conhecimento
contemporneo".
H mais de trs dcadas que Srgio Niza nos
vem lembrando que a tarefa essencial daescola tem de ser a de tornar os cidados
"verdadeiramente letrados, isto , pessoas
que conheam a necessidade e o prazer da
lngua escrita". Para isso entende que
condio instrumental evitar-se a "disperso
por dois percursos didticos, o da leitura e o
da escrita, ou pior ainda o de considerar a
leitura como motor da prtica de escrever"
por isso que diz no entender como osprofessores continuam a ensinar a lngua
escrita atravs sobretudo de textos literrios
e de lies de gramtica, "em vez de
realizarem um trabalho de reflexo sobre as
estruturas da lngua a partir das produes
dos prprios alunos". O trabalho
propriamente pedaggico que vem
desenvolvendo com os professores que
integram o Movimento da Escola Moderna
vai no sentido da viabilizao na sala de aula
de "momentos coletivos de trabalho de
escrita a partir de esboos de texto ou de
primeiras verses individuais". E avisa-nos:
"s no confronto sereno das produes
escritas a escrita evolui".
Compreende-se de imediato que esta
pedagogia da cooperao, destinada a
desenvolver a textualidade atravs de fluxos
permanentes de produes enriquecidas no
trabalho sistemtico de pequenos grupos,
traz suposta uma verdadeira revoluo na
cultura profissional dos docentes. No so
precisas consideraes detalhadas para seperceber como o trabalho dos professores
tem estado muito longe de valorizar o ensino
da escrita. As coisas tm-se passado como
se os alunos produzissem os seus textos
sozinhos ou em casa, sendo que essas
-
7/21/2019 Aliv Ro Sergio Niza Jorge Ramos Doo
8/9
Apresentao do livro Srgio Niza: Escritos sobre Educao 8
Jorge Ramos do
2014 | O LUGAR DOS NOSSOS TEXTOS Escritos Partilhados 4
produes so alvo de uma ateno quase s
policial e que se subsume as mais das vezes
em assinalar o erro. O texto passa a ser o
espao de uma imperfeio e de umaincompletude que espelham, imediatamente
a interioridade do aluno, devolvendo-lhe
uma imagem de si que, na largussima
maioria das vezes, s pode ser percebida
como incapacidade cognitiva e/ou preguia.
Interessaria, e muito, perceber que a relao
dos adultos com a populao mais jovem,
dentro e fora da escola, se faz em torno da
ortografia essa parte de "toilette da
escrita" na feliz designao que Srgio Niza
lhe d , como se ela fosse a prpria escrita,
construindo-se a partir da a ideia porventura
mais infundada e consensual do tempo
presente. A de que a barbrie e a ignorncia
se espelham exuberantemente nos textos
dos alunos, em razo do seu desinteresse
cultural e de escolhas fteis.
H toda uma longa histria que se poderia
contar sobre o modo como, de tantas e to
variadas formas, o dispositivo de avaliao
dos escritos do aluno se destina no essencial
a engendrar culpabilidade e, com ela, a
edificar, como resultado de umaautodiscriminao, o abismo que separa o
ignorante do mundo culto.
porque "no aprendemos a usar e a gostar
da escrita como instrumento nosso das
aes quotidianas", dir Srgio Niza, que
"ela emerge em ns como fantasma
persistente". significativo pensar que a
maior parte dos alfabetizados e
escolarizados tm "pavor da escrita". Einterroga-nos com a mais instante das
perguntas: "como que se pode ser um bom
profissional da educao escolar se se tiver
medo da escrita?"
A recusa dos mtodos escolsticos,
defendida por Srgio Niza, no difcil de
antecipar nem supe recursos inauditos
Faz-se, to somente, atravs de formas de
"organizao e de trabalho que reproduzam,
estou a cit-lo, situaes anlogas s do
viver social autntico, fugindo s formas
caricaturais e despidas de sentido que a
`escola congelada' impe". Na sua
perspetiva, a escrita s pode ser trabalhada
quando se torna imprescindvel e relevante
para o aluno, num trnsito permanente "de
codificao e descodificao" que a associam
estruturalmente com a oralidade e com a
leitura". O essencial do gesto de Srgio Niza
j se adivinha e julgo se encontra nesta
assero: no processo de aprendizagem " a
atividade de escrever que constri a leitura"
Nada mais simples e todavia nada maisdistante da vida que temos e da escola que
est. O conceito de reescrita conexo com o
de intertextualidade, em que a palavra surge
como unidade migratria e elemento de
ligao entre mltiplos discursos, num
-
7/21/2019 Aliv Ro Sergio Niza Jorge Ramos Doo
9/9
Apresentao do livro Srgio Niza: Escritos sobre Educao 9
Jorge Ramos do
2014 | O LUGAR DOS NOSSOS TEXTOS Escritos Partilhados 4
processo de reelaborao ilimitado ,
inscreve-se no corao da sua proposta
pedaggica. Toda a mudana da escola que
est passa por alicerar nela um trabalhointerativo de "reviso do texto" como base
nica do desenvolvimento de competncias
de escrita. H uma conscincia de si da
escrita do processo de produo social e
transformao de significados que apenas
se adquire neste processo de "reviso
integrada de textos", mas que nada tem a
ver com os exerccios de correo que se
fazem nas nossas escolas.
Eis-nos enfim chegados nica certeza que
a escola deveria tomar como sua a de que
no interior da produo que se
compreendem os prprios processos
produtivos. Tudo o que conhecemos ou
podemos vir a conhecer se obtm na
"retextualizao". Com esta prtica
experimentamos no a beleza ou ainstrumentalidade da escrita, mas a sua
profundidade. Acentuar o entrelaamento
perptuo e no a verdade ou a servido
nivelada da lei que, desde sempre, a escola
prometeu e fez cumprir. Srgio Niza
convida-nos explorao e deriva, a
apostar tudo nas hipteses. O maior
enfrentamento que podemos ter com o
poder o de nos assumirmos como
"comunidade de escritores".
Lanamento do livro na
Faculdade de Psicologia e Cincias de Educao do Porto, Universidade do Porto
11 de outubro de 2013