alexandre freitas câmara - lições de direito processual civil - vol. 03 (2013)

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Direito

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  • LIOES DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL

    V O L U M E 3

    Por refletir uma viso global do processo, esta obra, eminentemente didtica, objetiva servir de instru

    mento para facilitar o acesso do estudante de Direito ao Direito Processual Civil, especificamente dos

    cursos de graduao, que trava seu primeiro contato com este ramo do conhecimento jurdico de fun

    damental importncia terica e prtica.

    Mesmo sendo destinada ao estudante dos cursos de graduao, a obra passa a ser instrumento po

    deroso e fonte de consulta obrigatria para todos os profissionais do Direito (advogado, magistrado,

    promotor de justia ou qualquer outro profissional do Direito), tendo em vista a aplicao prtica de

    cada uma das questes suscitadas. Constitui-se tambm em relevante interesse para os candidatos aos

    concursos pblicos para ingresso nas carreiras jurdicas, como a Magistratura, o Ministrio Pblico e a

    Defensoria Pblica.

    Por esse motivo, o autor fez questo de apresentar, ao longo dos textos, no s sua opinio sobre os

    temas versados, mas tambm a posio dos mais importantes juristas que trataram de cada um dos

    assuntos, analisando as mais relevantes polmicas doutrinrias. O autor optou, ainda, por inserir as

    informaes de Direito Comparado e de evoluo histrica dos institutos ao longo dos captulos a eles

    destinados, sem que se apresentassem tais informaes em captulos separados.

    A obra dividida em trs tomos. No volume 1, so analisados a Teoria Geral do Direito Processual (esta

    luz do Direito Processual Civil) e o processo de conhecimento. O volume 2 examina os processos nos

    tribunais e o processo de execuo. J o volume 3 dedicado anlise do processo cautelar e dos pro

    cedimentos especiais.

    Alexandre Freitas Cmara desembargador no TJRJ, oriundo do Quinto Constitucional da Advocacia, professor de Direito Processual Civil da EMERJ (Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro) e

    de diversos cursos de ps-graduao. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual, da Academia

    Brasileira de Direito Processual Civil, do Instituto Ibero-Americano de Direito Processual e da International

    Association of Procedural Law. Autor de diversos livros de Direito Processual, entre os quais Ao resci

    sria, publicado pela Atlas.

    a t l a s . c o m . b r

  • V O L U M E 3

    ALEXANDRE FREITAS C M A R A

    LIES DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL

    20 q Edio

    SO PAULO EDITORA ATLAS S.A. - 2013

  • 2012 by Editora Atlas S.A.

    As edies anteriores so da Lumen Juris; 19. ed. 2012; 20. ed. 2013

    Capa: Leonardo Hermano Composio: Lino-Jato Editorao Grfica

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Cmara, Alexandre Freitas

    Lies de direito processual civil: volume 3 / Alexandre Freitas Cmara. -- 20. ed. -- So Paulo : Atlas, 2013.

    Bibliografia. ISBN 978-85-224-7641-1

    eISBN 978-85-224-7994-8

    1. Processo civil 2. Processo civil - Brasil I. Ttulo.

    12-06589CDU-347.9

    ndice para catlogo sistemtico:

    1. Direito processual civil 347.9

    TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - proibida a reproduo total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violao dos

    direitos de autor (Lei nc 9.610/98) crime estabelecido pelo artigo 184do Cdigo Penal.

    \ - lEditora Atlas S.A.Rua Conselheiro Nbias, 1384 (Campos Elsios)01203-904 So Paulo (SP) TeL: (011)3357-9144 atlas.com.br

  • Este terceiro volume dedicado memria de meu av, Alexandrino Franco, de quem sinto tanta saudade. E, tambm, dedicado minha

    av, Sarah, e minha mulher, Janana, como celebrao do amor que sinto por elas e que sei que elas sentem por mim.

  • SUMRIO

  • Apresentao, xvi

    Nota introdutria ao volume III, xx

    Nota introdutria 19-edio, xxiv

    Nota introdutria 129edio, xxvi

    Nota introdutria 59 edio, xxx

    PARTE 1 - PROCESSO CAUTELAR, 3

    PRIMEIRA SEO - Teoria Geral do Processo Cautelar, 5

    I - Conceito e Noes Gerais, 6 l Conceito, 7 2 Ao cautelar: conceito e condies, 10 3 Processo cautelar: conceito e pressupostos, 14 4 Medida cautelar: conceito, classificao, caractersticas, eficcia no tempo, 21

    4.1 Conceito, 214.2 Classificao, 234.3 Caractersticas, 254.4 Eficcia no tempo, 33

    5 Desnecessidade do processo cautelar como figura autnom a, 36

  • viii Lies de Direito Processual Civil Cmara

    II - Requisitos de Concesso da Tbtela Cautelar, 38 l Fumus boni iuris, 39 2 Periculum in mora, 42 3Q Colocao sistemtica dos requisitos de concesso da tutela cautelar no ob

    jeto da cognio judicial, 44

    III - Poder Geral de Cautela, 50 l Conceito, 51 2Q Limites, 54 3 Forma e m om ento de exerccio, 57 4 Medidas cautelares ex officio, 58

    IV - Competncia para o Processo Cautelar, 62 l A competncia em primeiro grau de jurisdio, 63 2 A competncia em grau de recurso, 66

    V - Procedimento Cautelar Comum, 70 l Fase postulatria, 71 2 Fase instrutria, 81 3Q Fase decisria: sentena, coisa julgada e efetivao da m edida no processo

    cautelar, 83 4 Recursos no processo cautelar, 87

    VI - Responsabilidade Processual Civil em Matria Cautelar, 92 l Responsabilidade processual civil do requerente, 93 2Q Liquidao e reparao do dano, 99

    SEGUNDA SEO - Procedimentos Cautelares Tpicos, 103

    VII - Introduo e Caractersticas Gerais, 104 l Os procedimentos cautelares especficos, 105 2Q Procedimentos no cautelares includos no Livro III do CPC, 106

    VIII - Arresto, 110 l Conceito e cabimento, 111 2Q Pressupostos de concesso, 114 3 Comprovao dos pressupostos, 117 4 Bens arrestveis, 121 5 Procedimento, 122 6 Efeitos, 124 7Q Extino, 127

  • IX - Seqestro, 130 I a Conceito e cabimento, 131 2a Pressupostos de concesso, 138 3a Disciplina comum do arresto e do seqestro, 139 4a Distino entre arresto e seqestro, 141

    X - Cauo, 146 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 147 2a Classificao, 150 3a Procedimento, 152

    XI - Busca e Apreenso, 160 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 161 2Q Pressupostos, 163 3a Procedimento, 164 4a Outras modalidades de busca e apreenso no direito brasileiro, 167

    XII - Exibio, 174 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 175 2a Classificao, 178 3a Legitimidade, 182 4a Procedimento da exibio contra parte, 185 5a Procedimento da exibio contra terceiro, 187

    XIII - Produo Antecipada de Provas, 190 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 191 2a Oportunidade, 198 3a Procedimento, 199 4a Valorao da prova antecipada, 201 5a Destino dos autos, 203 6a Produo antecipada de prova sem natureza cautelar, 204

    XIV - Alimentos Provisionais, 206 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 207 2a Distino entre alim entos provisionais e provisrios, 211 3a Procedimento, 214 4a Durao da prestao alim entar provisional, 215 5a Execuo, 216

    XV - Arrolamento de Bens, 218 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 219 2a Pressupostos, 223 3a Objetivo, 224 4a Procedimento, 224

  • X Lies de Direito Processual Civil Cmara

    XVI - Justificao, 228 l 2 Conceito, natureza jurdica e cabimento, 229 2Q Procedimento, 231

    XVII - Protestos, Notificaes e Interpelaes, 234 l 2 Protesto, 235 2Q Notificao, 241 32 Interpelao, 243

    XVIII - Homologao do Penhor Legal, 246 l 2 Penhor legal, 247 2Q Homologao do penhor legal: conceito e natureza jurdica, 252 32 Procedimento, 254 42 Sentena e execuo, 259

    XIX - Posse em Nome do Nascituro, 262 P Conceito e natureza jurdica, 263 22 Legitimidade, 266 32 Procedimento, 267 42 Sentena, 268

    XX - Atentado, 272 P Conceito, natureza jurdica e cabimento, 273 2Q Pressupostos, 278 32 Legitimidade, 282 42 Procedimento, 283 52 Sentena e execuo, 284

    XXI - Protesto e Apreenso de Ttulos, 290 P Conceito, natureza jurdica e cabimento, 291 22 Procedimento, 293 32 Apreenso do ttulo e priso do devedor, 295

    XXII - Outras Medidas Provisionais, 300a) Obras de conservao em coisa litigiosa ou judicialmente apreendida, 302b) Entrega de bens de uso pessoal do cnjuge e dos filhos, 304c) Posse provisria dos filhos, 304d) Afastamento de m enor autorizado a contrair casamento, 306e) Depsito de incapazes castigados im oderadam ente ou induzidos prtica de

    atos ilcitos ou imorais, 307f) Afastamento tem porrio de um dos cnjuges da morada do casal, 308g) Guarda e educao dos filhos, regulado o direito de visita, 309h) Interdio e demolio de prdios, 310

  • Sumrio x i

    PARTE 2 - PROCEDIMENTOS ESPECIAIS, 313

    PRIMEIRA SEO - Procedimentos Especiais de Jurisdio Contenciosa, 315

    XXIII - Introduo e Noes Gerais, 316 I a Conceito, 317 2a Tcnicas de especializao dos procedimentos, 321 3a Aplicao subsidiria do procedimento ordinrio, 323 4a Nomenclatura, 324

    XXTV - Consignao em Pagamento, 326 I a O pagamento por consignao, 327 2a Consignao extrajudicial, 329 3a Consignao judicial: natureza jurdica e competncia, 333 4a Procedimento da consignao judicial, 336 5a Legitimidade, 340 6a Consignao de prestaes peridicas, 341 7a Sentena, 344 8a Consignao em caso de dvida quanto titularidade do crdito, 345 9a Resgate da enfiteuse, 347 10 Consignao de aluguis e acessrios da locao, 349

    XXV - Restituio da Coisa Depositada, 354 I a Depsito: conceito e espcies, 355 2a Ao de depsito: conceito, natureza jurdica e cabimento, 356 3a Procedimento, 358 4a Priso civil do depositrio infiel, 364 5a Sentena e execuo, 370

    XXVI - Anulao e Substituio de Ttulos ao Portador, 374 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 375 2a Procedimento, 378 3a Sentena, 382 4a Substituio e destruio parcial do ttulo, 384

    XXVII - Prestao de Contas, 386 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 387 2a Ao de exigir contas, 391 3a Ao de dar contas, 398

    XXVIII - TUtela da Posse, 402 I a A posse e a proteo possessria, 403

  • x ii Lies de Direito Processual Civil Cmara

    2Q Os interditos possessrios: reintegrao, manuteno e interdito proibit- rio: conceito, cabimento e fungibilidade, 407

    3 Procedimento: fora nova e fora velha, 410 4 Medida liminar: natureza jurdica, 414 5S Exceo de domnio, 418 6 Natureza dplice dos procedimentos possessrios, 422 7Q Sentena, 425 8 Interdito proibitrio, 427

    XXIX - Nunciao de Obra Nova, 430 l Conceito, natureza jurdica e cabimento, 431 2Q Legitimidade, 433 32 Embargo extrajudicial de obra, 435 42 Procedimento, 436 52 Embargo liminar: natureza jurdica, 438 62 Prosseguim ento da obra, 440 7Q Sentena e execuo, 440

    XXX - Usucapio de Imveis, 442 l 2 Usucapio: conceito, espcies e requisitos, 443 22 Legitimidade, 447 32 Procedimento, 450 42 Sentena e coisa julgada, 452 52 Registro de Imveis, 454 62 Usucapio especial, 455 72 Usucapio como defesa, 458

    XXXI - Diviso e Demarcao de Terras, 460 l 2 Disposies gerais, 461 2Q "Ao de demarcao, 466 32 "Ao de diviso, 470

    XXXII - Inventrio e Partilha, 474 l 2 Disposies gerais, 475 22 N atureza jurdica, 477 32 Inventrio negativo, 479 42 Competncia, 480 52 Universalidade do foro da sucesso, 481 62 Questes de alta indagao, 482 7Q Inventariante, 483 8 Legitimidade, 486 9 Procedimento, 487

  • Sumrio xiii

    10 Partilha, 491 11 Arrolamento sumrio, 494 11-A Inventrio e Partilha Extrajudiciais, 495 12 Disposies comuns, 496

    XXXIII - Embargos de Terceiro, 498 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 499 2a Competncia, 505 3a Procedimento, 506 4a Sentena, 509

    XXXIV - Habilitao, 512 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 513 2a Legitimidade, 515 3a Competncia, 515 4a Procedimento, 516 5a Habilitao nos autos do processo principal, 517

    XXXV - Restaurao de Autos, 518 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 519 2a Legitimidade, 520 3a Competncia, 521 4a Procedimento, 522 5a Sentena, 523 6a Restaurao de autos no Tribunal, 524 7a Responsabilidade civil do causador do desaparecimento dos autos, 524

    XXXVI - Vendas a Crdito com Reserva de Domnio, 526 I a O contrato de compra e venda com pacto de reserva de domnio, 527 2a Procedimento da execuo do preo, 530 3a Procedimento para recuperao da coisa vendida, 531

    XXXVII - Procedimento Monitrio, 534 I a Conceito, natureza jurdica e cabimento, 535 2a Espcies de procedimento m onitrio, 549 3a Cognio sumria e inverso de iniciativa do contraditrio, 550 4a Procedimento, 554 5a Provimento inicial e m andado m onitrio, 558 6a Embargos, 563 7a Sentena, recursos e coisa julgada, 567 8a Execuo, 572

  • xiv Lies de Direito Processual Civil Cmara

    XXXVII-A - Procedimentos do CPC/1939 ainda em vigor, 576 l 2 Os procedimentos especiais do CPC/1939 m antidos em vigor pelo Cdigo

    atual, 577 2Q Da Dissoluo e liquidao das sociedades, 578 32 Do Dinheiro a risco, 582 42 Da vistoria de fazendas avariadas, 583 52 Da apreenso de embarcaes, 584 62 Da Avaria a cargo do segurador, 584 72 Das avarias, 585 82 Da arribada forada, 586

    SEGUNDA SEO - Procedimentos Especiais de Jurisdio Voluntria, 589

    XXXVIII - Noes Gerais, 590 l 2 Jurisdio voluntria, 591 22 Procedimento comum, 593

    XXXIX - Alienao Judicial, 598 l 2 Conceito, natureza jurdica e cabimento, 599 22 Procedimento, 600 32 Extino de condomnio, 601

    XL - Separao Consensual, 604 l 2 Conceito e natureza jurdica. Sobrevivncia do institu to aps a Emenda

    Constitucional n2 66, 605 22 Requisitos, 607 32 Procedimento, 608 42 Sentena, 611 52 Reconciliao do casal, 611

    XLI - Cumprimento de Disposio de ltima Vontade, 612 l 2 Testamentos e codicilos, 613 22 Conceito e natureza jurdica, 614 32 Competncia, 615 42 Procedimento, 615 52 Sentena, 618

    XLII - Arrecadao de Herana Jacente, 620 l 2 Herana jacente, 621 22 Competncia, 622 32 Legitimidade, 623 42 Procedimento, 623 52 Administrao da herana jacente, 626 62 Declarao de vacncia, 627

  • Sumrio XV

    XLIII - Arrecadao dos Bens dos Ausentes, 628 I a Ausncia, 629 2a Pressupostos, 630 3a Competncia, 630 4a Procedimento, 631 5a Converso da sucesso provisria em definitiva, 633

    XLIV - Arrecadao das Coisas Vagas, 634 I a Conceito e natureza jurdica, 635 2a Legitimidade, 636 3a Competncia, 636 4a Procedimento, 637

    XLV - Curatela dos Interditos, 640 I a Interdio: conceito e natureza jurdica, 641 2a Legitimidade, 642 3a Competncia, 643 4a Procedimento, 644 5a Sentena, 645 6a Levantamento da interdio, 647 7a Curador: investidura e remoo, 647 8a Disposies comuns tutela e curatela, 648

    XLVI - Organizao e Fiscalizao das Fundaes, 650 I a Fundaes, 651 2a Procedimento para instituio de fundaes, 652 3a Estatutos: elaborao e alterao, 652 4a Extino das fundaes, 653

    XLVII - Especializao da Hipoteca Legal, 654 I a Hipoteca legal, 655 2a Conceito e natureza jurdica, 656 3a Competncia, 656 4a Legitimidade, 657 5a Procedimento, 657 6a Insuficincia de bens, 658 7a Sentena, 658

    Referncias bibliogrficas, 660

    ndice remissivo, 672

  • APRESENTAO

  • A operatividade do Direito, ao contrrio do que o senso com um terico dos juristas deixa transparecer, um a tarefa absolutam ente complexa. Ou seja, a cincia jurdica sofisticada, independentem ente daqueles que querem simplific-la (ou tom -la sim plria), m ediante a aplicao de verbetes standar- tizados, encontrveis em m anuais jurdicos dos mais variados. A complexidade do Direito exsurge, pois, revelia de nossa vontade. Dizendo de outro modo, fenomenologicamente, a realidade existe independentem ente de ns. Nossa tarefa des-co-bri-la, des-ven-d-la, para, ento, transform-la.

    No h Direito sem dogm tica (jurdica). E no se pode confundir dogm tica com dogmatism o, questo para a qual autores como Clem erson Clve e Lus Alberto W arat de h m uito chamam a ateno da com unidade jurdica (crtica), que, em determ inado perodo de nossa histria, considerava vivel/ possvel substitu ir a dogm tica jurdica pela crtica do Direito. Contem pora- neam ente, como se sabe, m orm ente em face do advento dos novos tem pos constitucionalizantes, a dogm tica jurdica pode questionar e servir de instru m ento fundam ental para a realizao de direitos dos mais variados. Basta ver, nesse sentido, a gama de direitos (ainda) no realizados em nossa sociedade.

    C iente dessa problem tica, A lexandre Freitas Cm ara m ergulha na com plexidade tcnico-dogm tica do D ireito, desvendando os infindveis segredos do seu m anejo. N esta densa obra, em linguagem objetiva - com o ele m esm o diz - A lexandre apresenta conceitos e teorias acerca do processo

  • x v ii i Lies de Direito Processual Civil Cmara

    cautelar, dos procedim entos cautelares tpicos e, na segunda parte, tra ta dos procedim entos especiais.

    A abordagem da tu te la cautelar, em diversas dim enses, insere-se no contexto da efetividade/instrum entalidade do processo em nosso pas. O autor tem presente a im portncia das urgncias s quais o sistem a jurdico deve dar guarda. Ou seja, Alexandre Cmara, em anlise percuciente, tem conscincia do papel que representa o processo cautelar, at m esm o como condio de possibilidade da prpria instrum entalidade do processo e da funo social da jurisdio, em um pas em que, m uito em bora tenham os um a Constituio recheada de direitos, expressiva parcela destes ainda no foi efetivada. H, pois, um dficit de realidade jurdica, decorrente do crescim ento das dem andas provenientes de um a sociedade cada vez mais conflituosa, sem o devido atendim ento por parte do judicirio.

    nesse contexto que a abordagem da obra assum e relevncia, o p ro cesso com o a vida do D ireito, com o queria C arnelutti, e no como obstculo realizao dos direitos. este salto (Uberspringen) que deve ser feito, onde o processo - visto como instrum ento de efetivao do D ireito - se constitui em um D ireito Fundam ental do cidado. Um processo civil sem instrum en- talidade constitu i a violao flagrante do princpio constitucional do acesso justia e do direito prestao jurisdicional. Por isso, o modo de alcanar essa efetivao - o processo - tem na tu te la de urgncia (entendida lato sensu) um com ponente/m ecanism o sem sim ilar no restan te do ordenam ento. Por isso, cresce de im portncia a obra de A lexandre Cmara, a qual, registre-se, tenho a honra de apresentar com unidade jurdica. , assim, um a obra de m anuseio indispensvel para quem opera o D ireito e fonte substanciosa para a pesquisa jurdica.

    Lenio Luiz Streck D outor em D ireito

    Professor dos Cursos de M estrado e D outorado em Direito da UNISINOS-RS

  • NOTA INTRODUTRIA AOVOLUME III

  • Com este terceiro volume, encerram os nossas Lies de direito processual civil. Este volum e cuida de dois tem as (processo cautelar e procedim entos especiais) que, infelizmente, tm sido pouco tratados nos cursos de graduao em Direito, principalm ente em razo da insuficiente carga horria dedicada ao estudo do Direito Processual Civil em tais cursos. Isso faz com que o bacharel ingresse no m ercado de trabalho, m uitas vezes, despreparado para lidar com o que aqui se vai analisar.

    Procuramos manter, neste terceiro volume, o m esm o sistem a em pregado nos volumes anteriores destas Lies. Linguagem objetiva, apresentao de conceitos, utilizao de exemplos, estas foram nossas principais preocupaes. Acresa-se a isso a apresentao de divergncias doutrinrias, expondo as correntes existentes sobre cada ponto do programa, com a indicao das fontes onde as m esm as podem ser estudadas com mais profundidade.

    Como os anteriores, este no um livro pretensioso. Esperamos, apenas, que possa o m esm o ser til a estudantes dos cursos de graduao e candidatos aos concursos pblicos, que formam, sem som bra de dvida, o pblico-alvo deste m odesto trabalho. Ficaremos gratos, contudo, se verificarmos que estas Lies foram teis, tam bm , aos profissionais do Direito, os quais so levados a lidar d iuturnam ente com o direito processual civil.

    Dedicamos, por fim, estas Lies m em ria do saudoso advogado An- tonio Evaristo de Moraes Filho, de quem tivemos o privilgio de ser aluno

  • xxii Lies de Direito Processual Civil Cmara

    na Faculdade de D ireito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e que perm anece vivo na lem brana de todos aqueles que vivem, todos os dias, as alegrias e tristezas da advocacia.

    O Autor

  • NOTA INTRODUTRIA A199 EDIO

  • Esta 19a edio a prim eira a ser lanada pela prestigiosa Editora Atlas. A m udana de selo editorial no representa, porm, um a modificao do contedo ou do estilo da obra, que se preservam, fazendo-se, apenas, as sem pre devidas correes e atualizaes. Acrescentou-se, a este terceiro volume das Lies, um captulo novo, dedicado ao exame dos procedim entos especiais que, regulados pelo Cdigo de Processo Civil de 1939, foram m antidos em vigor pelo CPC de 1973 e ainda hoje perm anecem vigentes, tem a que no havia, ainda, sido abordado.

    Espero que este livro continue a ser merecedor da acolhida que sem pre teve em suas edies anteriores. Sempre me surpreendeu a quantidade de citaes que dele encontrei em obras de doutrina, no Brasil e no exterior, na jurisprudncia de todos os tribunais, em peties e pareceres de advogados e m em bros do M inistrio Pblico de todos os lugares. Alm disso, a adoo da obra por professores e sua acolhida por estudantes de todos os cantos deste im enso Pas sem pre me fascinaram, e acabaram por me levar a viajar, m inistrando aulas e palestras, por todas as regies. Ao elaborar esta 19a edio, s no tive ainda oportunidade de visitar dois Estados brasileiros: Tocantins e Amap, falha que, espero, serei brevem ente capaz de corrigir.

    Encerro esta breve introduo agradecendo aos m eus novos editores pela acolhida e dedicando esta nova edio, como todas as anteriores, aos grandes am ores de m inha vida: Janana, Rodrigo e Guilherme, que sem pre esto ao m eu lado.

    O Autor

  • NOTA INTRODUTRIA A12- EDIO

  • A aprovao, no final de 2006, de diversas leis provocou modificaes im portantes no direito processual civil brasileiro. Dos trs volumes destas Lies de direito processual civil, o m enos afetado, sem qualquer dvida, este terceiro. Apesar disso, foi preciso realizar um a cuidadosa reviso de todo o seu contedo. Trata-se, porm , e substancialm ente, do m esm o livro que antes vinha recebendo da com unidade jurdica calorosa acolhida, que se espera possa continuar a existir.

    Esta breve introduo nova edio das nossas Lies, porm, tem um propsito: apresentar consideraes (breves) acerca dessas reformas por que vem passando o direito processual civil brasileiro. Estam os absolutam ente convencidos de que o legislador tem se valido de suas arm as para atacar o alvo errado. Os m aiores problem as da prestao jurisdicional civil no Brasil, a m orosidade do processo e a qualidade das decises judiciais, devem ser resolvidos atravs de reformas estru turais (como, por exemplo, a contratao de pessoal ou a informatizao de procedim entos adm inistrativos dos tribunais que ainda no o fizeram), bem assim com a realizao de cursos de atualizao para m agistrados e outros profissionais, que precisam estudar mais do que tm feito (e preciso dizer que m uitos no estudam no porque no queiram , mas sim plesm ente porque no tm tem po para estudar, em razo da sobrecarga de trabalho a que so subm etidos).

    Isso, evidentem ente, no quer dizer que reform as das leis processuais no tenham de ser feitas. Tais reformas, porm, deveriam ser feitas para atacar

  • xxviii Lies de Direito Processual Civil Cmara

    pontos da lei que, atuados na prtica, no tenham sido capazes de resolver adequadam ente os problem as que se destinam a solucionar. Como disse, com m uita propriedade, um dos mais autorizados processualistas brasileiros, "de que adianta reform ar as leis, se pela inobservncia delas que o retardam ento dos feitos se d? (H um berto Theodoro Jnior, A onda reform ista do direito positivo e suas implicaes com o princpio da segurana jurdica, Revista Ma- gister de Direito Civil e Processual Civil, v. 11, p. 31). Alm disso, m uitas alteraes tm sido capazes de gerar dvidas doutrinrias que as norm as anteriores no geravam. Assim, acaba-se por se pr em dvida a efetividade de m uitas das reformas, que acabam - em razo dessas divergncias - gerando um a perda de tem po ainda maior.

    Isso no quer, evidentem ente, dizer que nenhum a reform a seja positiva. O processo eletrnico, por exemplo, um passo adiante no modo de se desenvolver o processo civil no Brasil. Tomados os cuidados necessrios com a aplicao de um sistem a como esse em um pas de excludos digitais (e basta dizer que no Brasil apenas 8% da populao tem acesso In ternet a partir de com putadores instalados em residncias, e 89% da populao brasileira form ada por excludos digitais, segundo dados do Com it para Democratizao da Informtica, um a organizao no governam ental criada no Brasil), o processo eletrnico pode m elhorar m uito a qualidade da prestao jurisdicional.

    A nosso juzo, preciso ter cuidado para no se pensar que toda reforma s vem para m elhorar o sistem a. Juristas no so Pollyanas, e no pode ser saudvel a existncia de juristas naif. preciso elogiar o que apresenta bons resultados, e criticar o que no o consegue, de modo a perm itir que - atravs do trabalho dos juristas com prom etidos com a boa qualidade da prestao ju risdicional - se consiga aperfeioar sem pre o direito objetivo.

    Esperamos, sinceram ente, que nossa obra seja capaz de contribuir no s para a com preenso do direito processual civil brasileiro vigente, mas tam bm para a m elhoria desse sistema.

    Esta nova edio do terceiro volume destas m odestas Lies , como no poderia deixar de ser, dedicada a m inha esposa, Janana, e aos m eus filhos, Rodrigo e Guilherme. Disse o grande escritor francs Saint-Exupry, em Terra dos Homens, que "Amar no olhar-se um ao outro, olhar jun tos na m esm a direo. Para eles, que olham na m esm a direo que eu, esta edio dedicada.

    O Autor

  • NOTA INTRODUTRIA A5a EDIO

  • Depois da aprovao da Lei n2 10.444/2002 e do novo Cdigo Civil, o direito brasileiro passou por um a im ensa reformulao. Enquanto este, em bora destinado precipuam ente a regulam entar o direito privado, provoca inm eras alteraes no direito processual civil, decorrentes da inegvel influncia recproca que cada um destes ram os da cincia jurdica exerce sobre o outro (basta pensar na influncia exercida sobre o direito civil pela transform ao do art. 461 do CPC, que regulam entou a tu te la jurisdicional especfica relativa s obrigaes de fazer e de no fazer), aquela foi responsvel por um a verdadeira revoluo processual, na m edida em que dim inuiu m uito a desarrazoada necessidade que anteriorm ente tnham os de m ultiplicar processos para solucionar um a nica causa. Agora, com a possibilidade de reunir em um s processo cognio e execuo, bem como por ser possvel obter, em um s processo, tu te la cautelar e tu te la satisfativa, o direito processual civil brasileiro d mais um passo adiante em busca de sua plena efetividade.

    Este terceiro volume das Lies de direito processual civil vem, em funo de tudo isso, trem endam ente reformado. As transform aes provocadas pela Lei n 2 10.444/2002 se m anifestam (entre outros pontos) em sede cautelar, m atria aqui tratada. Ademais, o novo Cdigo Civil impe um a srie de mudanas nos captulos atinentes aos procedim entos especiais, onde o direito processual e o direito m aterial interagem com maior frequncia.

    Repita-se, aqui, porm , algo que vem sendo dito nestas Lies desde a sua prim eira edio: este um livro de direito processual. As consideraes

  • xxxii Lies de Direito Processual Civil Cmara

    sobre o direito m aterial que aqui so apresentadas tm por nica funo facilitar a exposio dos tem as processuais. No espere o leitor, pois, aqui encontrar um a exposio sistem tica de direito civil, m as apenas algumas breves consideraes sobre os tem as de direito privado que precisam ser conhecidos para que o direito processual civil seja convenientem ente conhecido.

    Espero, sinceram ente, que esta qu in ta edio tenha um a acolhida to generosa quanto as edies anteriores tiveram.

    Por fim, no poderia deixar de dizer que esta quin ta edio dedicada ao m eu filho Rodrigo, o m aior presente que a vida me deu. E tam bm dedicada a Janana, m inha mulher, meu amor, que esteve comigo em todos os m om entos, bons e ruins, e que certam ente estar sem pre comigo por todos os dias de m inha vida. A eles tudo que posso dizer : eu amo vocs!

    O Autor

  • PARTE 1

  • PROCESSO CAUTELAR

  • Pr i m e i r a Se o

  • TEORIA GERAL DO PROCESSO CAUTELAR

  • ICONCEITO E NOESGERAIS

  • l e CONCEITO

    Aps o estudo dos m dulos processuais de conhecim ento e de execuo, realizado nos dois prim eiros volum es desta obra, passa-se ao estudo do processo cautelar, que costum a ser indicado (sem m uita preciso, frise-se) como um "terceiro gnero. N a verdade, o processo cautelar, como se poder ver, um segundo gnero de processo, colocando-se em posio oposta ocupada, em conjunto, pelos processos cognitivo e executivo (e ao processo sincrtico, form ado pela fuso de um m dulo cognitivo e um executivo). Isso porque esses dois tipos de processo podem ser reunidos num nico gnero: o dos processos satisfativos, assim entendidos aqueles processos em que o desfecho final norm al capaz de perm itir a realizao do direito m aterial. Tal realizao se d pela declarao da vontade do direito (m dulo processual cognitivo), ou pela realizao prtica do com ando do direito substancial (mdulo processual executivo).

    J o processo cautelar no capaz de satisfazer o direito substancial, m esm o quando alcana seu desfecho norm al (o que ocorre quando prolatada a sentena cautelar, com a posterior efetivao do com ando nela contido).1

    1 No m esm o sentido, afirm ando que o processo cautelar se ope aos processos de conhecim ento e de execuo analisados em conjunto, Jos Carlos Barbosa M oreira, Estudos sobre o novo Cdigo de Processo Civil, p. 230, onde se l: O Cdigo reconhece ao processo cautelar a sua plena indi-

  • 8 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    Do exposto, j razoavelm ente sim ples inferir a distino existente entre o processo cautelar e os dois outros tipos de processo, considerados estes em conjunto. Enquanto estes so satisfativos, ou seja, so capazes de perm itir a tu te la jurisdicional im ediata do direito substancial, tom ando possvel sua atuao prtica, o processo cautelar s perm ite um a tu te la jurisdicional me- diata, ou seja, este tipo de processo se destina a perm itir a fu tura realizao do direito substancial.

    Isso se d porque o processo cautelar tem por fim garantir a efetividade de outro processo, ao qual o m esm o se liga necessariam ente. Com o se sabe, os processos exigem, para que possam chegar ao seu desfecho, um tem po que, m uitas vezes, bastan te longo. Este tem po essencial para que os atos processuais possam ser praticados adequadam ente, para que os prazos possam ser respeitados, enfim, para que o processo possa alcanar o resultado que dele se espera.

    Ocorre que, m uitas vezes, o tem po acaba por ser prejudicial ao processo, pois esta dem ora na entrega da prestao jurisdicional pode ser capaz de provocar o surgim ento de um risco para a efetividade do prprio processo. Pense-se, por exemplo, num m dulo processual de conhecim ento, em que se pretende a condenao do dem andado ao pagam ento de certa quantia. Esta condenao pode dem orar tan to que, quando chegar o m om ento da execuo forada da sentena condenatria, j no se encontre, no patrim nio do devedor, nenhum bem capaz de assegurar a satisfao do crdito, pois a dem ora do processo perm itiu a ele desfazer-se de todo os seus bens penhorveis.

    Era preciso, assim, criar-se um mecanismo capaz de assegurar a efetividade do processo, apesar de sua dem ora. Este instrum ento o processo cautelar, o qual perm itir, e. g., que - na hiptese acima aventada - se realize um a apreenso de bens do devedor (chamada no direito objetivo brasileiro de arresto), para o fim de assegurar a efetividade da futura execuo. N ote-se que com esta apreenso no se satisfaz o crdito. Este s ser realizado quando a execuo chegar ao seu desfecho norm al. A tu te la jurisdicional cautelar se lim ita a proteger a execuo contra os males do tem po, assegurando que, quando de sua realizao, seja possvel a atuao prtica do direito substancial, com os m eios executivos incidindo sobre aqueles bens previam ente apreendidos.

    Com o processo cautelar, portanto , cria-se um m eio (no o nico, como se ver em seguida) de preveno dos males do tem po, sendo certo que,

    vidualidade, quer em face do processo de conhecim ento, quer do processo de execuo. A meu ver, alis, talvez no seja m uito exato contrapor-se o processo cautelar, com o um terceiro gnero, a esses dois antes m encionados. Creio que ele m ais verdadeiram ente se contrape ao processo de conhecim ento e ao de execuo considerados em conjunto, j que um e ou tro tm natureza satisfativa, visando portanto tu te la jurisdicional im ediata, ao passo que o processo cautelar se distingue precisam ente por constituir um a tu tela mediata, um a tu tela de segundo grau.

  • Conceito e Noes Gerais 9

    como disse um dos m ais notveis ju ristas de todas as pocas, "o valor que o tem po tem no processo im enso e, em grande parte, desconhecido. No seria dem asiadam ente atrevido com parar o tem po a um inim igo contra o qual o ju iz lu ta sem descanso".2

    Pelo que se exps at aqui, pode-se ento definir o processo cautelar como o processo que tem por fim assegurar a efetividade de um provim ento jurisdicional a ser produzido em outro processo.

    de se notar que o processo cautelar um instrum ento de proteo de outro processo. O que se quer dizer que com o processo cautelar vai-se combater situaes em que existe risco para a efetividade de um processo. Quando o tem po de durao do processo gerar um a situao de perigo para o prprio direito material, no ser adequada a utilizao do processo cautelar, mas sim do institu to - anteriorm ente estudado - da tu te la antecipada.

    Assim , por exemplo, pode-se figurar a hiptese em que algum v a juzo pedindo a condenao do dem andado a pagar um tratam ento m dico de que o dem andante necessita, sendo essencial que o tratam ento se realize desde logo, custa do dem andado, sob pena de o dem andante no sobreviver. Nesse caso, como parece bvio, o que sofre risco de dano se no for tu te lado de im ediato o prprio direito substancial do dem andante, razo pela qual te r o Estado de prestar a ele a tu te la jurisdicional antecipada. Situao diversa seria aquela em que o dem andante j tivesse se subm etido ao tra ta m ento, e pretendesse ser ressarcido dos gastos que teve, verificando-se que o dem andado, para se furtar ao pagam ento, estivesse se desfazendo de todos os seus bens penhorveis. Nesse caso, seria a efetividade da fu tura execuo que estaria sofrendo risco, pois nenhum a utilidade se pode esperar de um a execuo se o executado no dispe de bens de valor suficiente para assegurar a realizao do crdito exequendo. Far-se-ia necessrio, ento, que neste caso se realizasse um a apreenso de bens do devedor, tan tos quantos fossem necessrios para assegurar que, na fu tura execuo, seu patrim nio fosse ainda capaz de assegurar a realizao do direito m aterial do credor. Nesse caso, em que se pretende assegurar de form a m ediata a tu te la jurisdicional, evitando- -se a consum ao do dano que a efetividade do processo poderia sofrer, ser cabvel a tu te la jurisdicional de ndole cautelar.

    O processo cautelar , pois, instrum ento de proteo de outro processo, a que se liga, e que recebe tradicionalm ente o nom e de processo principal. Foi neste sentido, alis, que se m anifestou um pioneiro do estudo deste meio de prestao de tu te la jurisdicional, ao afirmar que "se todos os provim entos jurisdicionais so um instrum ento do direito substancial, que atravs deles atuado, nos provim entos cautelares se verifica um a instrum entalidade qualifi

    2 Francesco C arnelutti, Derecho y Proceso, trad. esp. de Santiago Sentis M elendo, p. 412 ( minha a verso para o vernculo).

  • 10 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    cada, ou seja, elevada, por assim dizer, ao quadrado: esses so de fato, infalivelm ente, um meio predisposto a um m elhor proveito do provim ento definitivo, que por sua vez um meio para a atuao do direito; so, pois, em relao finalidade ltim a da funo jurisdicional, instrumentos do instrumento.3

    O processo cautelar , pois, "instrum ento do instrum ento, pois que se apresenta como instrum ento de realizao de outro processo, sendo este, por seu turno, instrum ento de atuao do direito substancial.

    O Cdigo de Processo Civil brasileiro, no se pode deixar de dizer, afirma, em seu art. 796, que o processo cautelar sem pre dependente de um processo principal. Frise-se, alis, que o vigente CPC foi o primeiro Cdigo de Processo do m undo a dedicar todo um livro (o Livro III, formados pelos arts. 796 a 889) ao processo cautelar, pois os Cdigos anteriores a ele (e m uitos Cdigos posteriores) trataram do processo cautelar de form a assistem tica, incluindo a matria, por exemplo, en tre os procedim entos especiais (como fazia o revogado CPC de 1939, e faz o vigente Cdigo italiano), na parte geral (como faz o Cdigo da Nao Argentina), ou em outros locais que tam pouco se m ostram apropriados.

    O processo cautelar , pois, instrum ento atravs do qual se presta um a modalidade de tu te la jurisdicional consistente em assegurar a efetividade de um provim ento a ser produzido em outro processo, dito principal. Ao contrrio do que ocorre com os outros dois tipos de processo (cognitivo e executivo, e tam bm com o sincrtico, que resultado da fuso dos outros dois), o processo cautelar no satisfaz o direito substancial, m as apenas garante que o m esm o possa ser realizado em m om ento posterior, perm itindo, assim, um a form a de tu te la jurisdicional mediata.

    O processo cautelar, como afirma o m esm o art. 796 do CPC anteriorm ente citado, pode comear antes do processo principal, ou no curso dele. No prim eiro caso, fala-se em processo cautelar antecedente ou preparatrio, e no segundo em processo cautelar incidente.

    2 - AO CAUTELAR: CONCEITO E CONDIES

    Como j foi visto no prim eiro volume desta obra, costum e classificar a ao conforme o tipo de tu te la jurisdicional pretendida. Em bora no concorde com esta classificao, por te r em vista que, sendo una a jurisdio, deve ser

    3 Piero Calam andrei, Introduzione alio studio sistemtico dei prowedimenti cautelari, in Opere Giuridi- che, vol. IX, p. 176 ( m inha a verso para o portugus). de se dizer que a edio original desta obra de 1936, sendo por todos considerada obra pioneira no estudo sistem tico do processo cautelar.

  • Conceito e Noes Gerais 11

    uno tam bm o poder de provocar seu exerccio (poder de ao), no se pode negar a vantagem de ordem didtica que esta classificao produz, apesar de desprovida de contedo cientfico. Assim sendo, tratarei aqui da "ao cautelar", buscando estabelecer seu conceito e tra tar de suas "condies".

    A im portncia do tem a ainda m aior quando se verifica que h, na prtica forense, um a certa prom iscuidade terminolgica, sendo com um o emprego de expresses de contedo tcnico bastante determ inado em sentido diverso daquele que se afigura como sendo o correto. Assim, por exemplo, comum encontrar-se em peties iniciais a afirmao de que o dem andante est propondo "m edida cautelar", quando em verdade est ele propondo "ao cautelar". O m esm o equvoco encontrado em um a srie de provim entos judiciais, onde se l, m uitas vezes, que o juiz julga procedente "a m edida cautelar proposta" pelo dem andante, quando em verdade ele julga procedente o pedido para conceder a m edida cautelar pleiteada.

    No difcil conceituar a "ao cautelar", j que esta nada mais do que um a manifestao do poder de ao. Pode-se dizer que "ao cautelar" o poder de pleitear do Estado-Juiz a prestao da tu te la jurisdicional cautelar, exercendo posies ativas ao longo do processo. A "ao cautelar" tem , obviam ente, as m esm as caractersticas da ao em geral, sendo autnom a em relao ao direito substancial que m ediatam ente se pretende proteger; e abstrata (o que significa dizer que existe o poder de ao ainda que no exista o direito substancial afirmado pelo dem andante).4

    Q uanto s "condies da ao cautelar", estas so as m esm as que das dem ais "aes": legitim idade das partes, interesse de agir e possibilidade ju rdica da dem anda.5

    O fato de as "condies da ao cautelar serem as mesm as das aes em geral, porm , no pode levar o intrprete a considerar que, num caso concreto, as "condies da ao cautelar" sero as m esm as "condies da ao princi-

    4 A afirmao da natureza abstrata da "ao cautelar se encontra na doutrina am plam ente dom inante. Por todos, consulte-se Enrico Tbllio Liebman, Manual de direito processual civil, vol. I, trad. bras. de Cndido Rangel D inam arco, p. 217, onde se l: "No obstante, a ao cautelar autnom a e pode ser acolhida ou rejeitada, conform e seja em si m esm a procedente ou im proceden te. Essa posio, porm , no unnim e, nem m esm o entre aqueles autores que, no estudo da teoria geral do direito processual, defendem teorias abstratas acerca da ao. Basta citar, entre estes, Cndido Rangel D inam arco, Prefcio obra de Sydney Sanches, Poder cautelar geral do juiz, p. XVII, onde afirm a aquele processualista que pessoalm ente "levado a colocar a hiptese de ser concreta a ao cautelar, tendo por condies precisam ente os requisitos para a sua concesso. A esse tem a voltarem os adiante, quando do estudo da colocao sistem tica dos requisitos de concesso das medidas cautelares no objeto da cognio judicial.

    5 Sanches, Poder cautelar geral do juiz, p. 40. A utores h que, em posio com a qual no concordo, e de que tratarei com m ais profundidade adiante, incluem en tre as "condies da ao caute lar o fumus boni iuris e o periculum in mora. N este sentido, por todos, Marco TUllio Zanzucchi, Diritto processuale civile, vol. II, p. 168.

  • 1 2 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    pai. A "ao cautelar ter, em cada caso, suas prprias "condies, as quais no se confundem com as "condies da ao principal .

    A prim eira "condio da ao cautelar a legitimidade das partes. Aqui no h m aior dificuldade, j que legitimado ativo ser aquele que se diz titu lar de um direito substancial (sendo certo que, no processo cautelar, como se ver mais adiante, no se ir verificar a existncia ou no de tal direito, conten- tando-se o Estado-Juiz em verificar se tal existncia provvel), e legitim ado passivo o sujeito apontado pelo dem andante como sendo o outro sujeito da res in iudicium deducta. Assim, por exemplo, num a "ao cautelar de arresto, ser legitimado ativo aquele que se diz credor de um a dvida de dinheiro, e legitimado passivo aquele que apontado como sendo o devedor (ou responsvel).

    Referi-me, at aqui, como parece bvio, legitim idade ordinria. No se podem afastar, porm, os casos de legitimidade extraordinria. Assim, por exemplo, o M inistrio Pblico, legitimado extraordinrio para propor "ao de investigao de paternidade, tam bm legitim ado para ajuizar "ao cautelar de produo antecipada de provas, destinada a colher antecipadam ente o depoim ento de um a testem unha que deveria ser ouvida no processo da "ao de investigao de paternidade mas, por algum motivo (por exemplo, doena incurvel que gere um a expectativa de vida inferior ao tem po necessrio para que o processo de conhecim ento alcance o m om ento adequado para a colheita de prova testem unhai), precisa ser inquirida antes do m om ento adequado. Tendo o M inistrio Pblico legitimidade extraordinria para o processo principal, ter tam bm para o processo cautelar. O que aqui se diz, obviamente, aplicvel a qualquer legitim ado extraordinrio.

    A segunda "condio da ao o interesse de agir, que pode ser conceituado como a utilidade da providncia cautelar pleiteada pelo dem andante. Esta "condio form ada por um binmio: necessidade da tu te la jurisdicional cautelar e adequao do provim ento cautelar pleiteado e do meio eleito para sua obteno.

    O interesse-necessidade, prim eiro elem ento form ador do interesse de agir, verificado em sede cautelar da m esm a form a que nas dem andas cognitivas e executivas. Vedada a autotutela, toda vez que algum pretender obter um a providncia capaz de assegurar a efetividade de um futuro provim ento jurisdicional, a ser produzido em processo de conhecim ento ou de execuo (o processo principal), haver necessidade de pleitear perante o Estado-Juiz a prestao da tu te la jurisdicional cautelar. Estar, assim, presente a necessidade da tu te la cautelar, essencial para que esteja presente o interesse de agir.

    O segundo elem ento form ador do interesse de agir o interesse-adequa- o, que se revela como a adequao da providncia jurisdicional pleiteada e do meio eleito para sua obteno. Pleiteada um a m edida cautelar, preciso verificar, em prim eiro lugar, se a m esm a a adequada para conceder a tu te la m ediata do direito substancial que se presta atravs das providncias cautela-

  • Conceito e Noes Gerais 13

    res. Assim , por exemplo, figure-se a hiptese de algum que se diz credor de obrigao de entrega de coisa certa ir a juzo, afirm ando que o devedor pretende fazer perecer a coisa devida, o que retirar toda a efetividade do futuro processo de execuo para entrega de coisa. Pleiteia ele, ento, a concesso de um arresto. sabido, porm , que o arresto destina-se a garantir a efetividade de um a futura execuo por quantia certa, e que a m edida adequada para proteger a fu tura execuo para entrega de coisa o seqestro. N esse caso, te r o dem andante pleiteado m edida inadequada para resolver a crise por ele narrada na dem anda, faltando a ele, pois, interesse-adequao.

    No se pode deixar de afirm ar que para alguns juristas existiria a possibilidade de, tendo o dem andante pleiteado um a m edida cautelar, o juiz conceder m edida diversa da devida. Existiria, assim, um a autorizao para que o juiz do processo cautelar decidisse extra petita, concedendo m edida diversa da pleiteada.6 Assim, porm , no me parece. No h norm a autorizando o Estado-Juiz a prover fora do pedido no processo cautelar. Deve-se observar, pois, o princpio da adstrio da sentena ao pedido, previsto expressam ente no CPC para o processo de conhecim ento, m as aplicvel tam bm aos processos executivos e cautelares.7 Assim, tendo o dem andante pedido m edida cautelar inadequada para solucionar a situao de crise por ele narrada em sua petio inicial, dever o juiz consider-lo carecedor de ao, por falta de interesse de agir.

    No faltar interesse de agir, todavia, se o dem andante propuser a "ao cautelar para pedir m edida satisfativa, que deveria ter sido pleiteada no bojo do processo cognitivo, atravs da tcnica conhecida como tutela antecipada. E isso se d em razo do disposto no 7Q do art. 273 do CPC, que cria um a fungibilidade entre os meios de obteno da tu te la jurisdicional de urgncia. Abre-se, aqui, um a exceo regra geral, e se perm ite a obteno de tu tela jurisdicional por meio que, a princpio, no seria o adequado. Legitima-se a exceo, porm em razo da urgncia da m edida postulada.

    A inda que adequada a m edida pleiteada, poder faltar interesse-adequao se o dem andante eleger o meio inadequado para sua obteno. Explique-se m elhor o que acaba de ser dito: norm alm ente, a tu te la jurisdicional cautelar prestada atravs de um processo, autnom o em relao ao processo principal, que chamado de processo cautelar. H casos, porm, em que se adm ite a prestao da tu te la cautelar sem que se faa necessria a instaurao de um processo para tal. Em outros termos, h casos em que a m edida cautelar deve ser pleiteada dentro do processo cuja efetividade se quer proteger (e que no ser chamado, neste caso, de processo principal, eis que o nico). Basta pen

    6 N este sentido, en tre outros, H um berto Theodoro Jnior, Curso de direito processual civil, vol. II, p. 414.

    7 No sentido do texto, em posio que, em bora m inoritria, m e parece a m ais acertada, Jos Joaquim Calmon de Passos, Comentrios ao Cdigo de Processo Civil, vol. X, tom o I, p. 108.

  • 1 4 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    sar, por exemplo, na m edida cautelar que se destina a assegurar a efetividade do processo de m andado de segurana (art. 7Q, III, da Lei n 12.016/2009). Tal m edida dever ser pleiteada dentro do prprio processo de conhecim ento iniciado pela dem anda de m andado de segurana, no sendo adequado, nesta hiptese, oferecer dem anda autnom a, para dar incio a processo cautelar autnom o. O ptando o dem andante por este meio, inadequado para a prestao da tu te la cautelar cabvel no caso, dever o juiz consider-lo "carecedor de ao por falta de interesse de agir.

    A terceira e ltim a das "condies da ao a possibilidade jurdica da dem anda. A presena desta se verifica da m esm a form a que nas dem andas cognitivas e executivas. Em outros term os, ser juridicamente impossvel a dem anda toda vez que o ordenam ento jurdico estabelecer um a proibio em abstrato para que se aprecie determ inado pedido ou determ inada causa de pedir. Assim, por exemplo, juridicam ente impossvel a dem anda cautelar de arresto se o crdito cuja satisfao se vai buscar no processo principal decorre de um jogo ou de um a aposta. Da m esm a forma, no se pode pleitear a priso civil cautelar, j que esta (ao contrrio da priso cautelar penal) no encontra guarida no sistem a jurdico brasileiro.

    3fi PROCESSO CAUTELAR: CONCEITO E PRESSUPOSTOS

    Depois de tratar da "ao cautelar, no se pode deixar de tecer algumas consideraes acerca do processo cautelar, principalm ente no que concerne aos seus pressupostos. o que se passa a fazer.

    Q uanto ao conceito de processo cautelar, no h m uito mais o que se dizer alm daquilo que foi dito no prim eiro item deste captulo. O processo cautelar um processo no satisfativo, o que o pe em posio oposta ocupada pelos dois outros tipos de processo (cognitivo e executivo), j que estes dois outros so destinados a perm itir a realizao prtica do direito substancial. O processo cautelar, por sua vez, tem por finalidade assegurar a efetividade de um provim ento jurisdicional futuro, a ser em itido em outro processo (o processo principal). Por tal razo, como j afirmado, que o processo cautelar tem sua instrum entalidade elevada ao quadrado, sendo chamado "instrum ento do instrum ento.

    preciso, porm , aprofundar um pouco mais este ponto. A natureza no satisfativa do processo cautelar afirmada por um a srie im ensa de dou- trinadores, em posio a que m anifesto m inha adeso.8 No se trata, porm,

    8 Entre os inm eros doutrinadores que afirm am que o processo cautelar no pode levar, jamais, satisfao do direito m aterial pode ser citado, en tre outros, Ovdio Baptista da Silva, Do

  • Conceito e Noes Gerais 15

    de posio unnim e, sendo grande tam bm o nm ero de estudiosos do tem a que afirmam a existncia de casos em que a tu te la jurisdicional cautelar tem carter satisfativo, antecipando os efeitos que seriam produzidos, norm alm ente, apenas quando da entrega da prestao jurisdicional definitiva.9 Assim, por exemplo, teriam natureza cautelar as lim inares concedidas em "ao possess- ria, e todos os dem ais casos que, a m eu sentir, m elhor estariam se inseridos no conceito de tu te la antecipada, que no se confunde com o de tu te la cautelar.

    A m eu sentir, est com a razo Marinoni, quando afirma que a satisfati- vidade requisito negativo da tu te la jurisdicional de ndole cautelar.10 A denominao processo cautelar foi reservada pela cincia processual para designar um processo m eram ente assecuratrio, atravs do qual se presta um a espcie de tu te la jurisdicional que pode ser considerada "de simples segurana. Isso se confirma, at mesmo, pela term inologia em pregada para designar este tipo de processo. Cautelar palavra que, j em desuso, era em pregada como verbo,11 significando "tom ar cautela, acautelar-se, precaver-se.12 Verifica-se, pois, que o vocbulo cautelar, hoje em pregado na cincia jurdica como adjetivo (qualificando um a srie de institu tos, como o "processo cautelar, a "ao cautelar, a "m edida cautelar e a "sentena cautelar, en tre outros), d a ideia de segurana, preveno, garantia. Assim sendo, no se pode adm itir a existncia de um a "tutela cautelar satisfativa, pois se teria aqui verdadeira contradictio in terminis. O que cautelar no pode satisfazer, pois, se satisfaz, no m eram ente cautelar.

    Estas medidas, que nada mais fazem do que conceder desde logo, com base em cognio sumria, aquilo que como regra s poderia ser obtido aps a formao de um juzo de certeza, fundado em cognio exauriente, realizando im ediatam ente o direito substancial (cuja existncia se afigura, ao menos, pro

    processo cautelar, p. 11. Afirma o notvel processualista gacho que "se a parte deduz no processo algum direito subjetivo, ou qualquer ou tra pretenso legtim a, e o provim ento judicial satisfaz essa pretenso ou o direito subjetivo afirm ado pela parte, parece indiscutvel a concluso de que a sentena no se teria lim itado a sim plesm ente assegur-lo. As duas categorias so inconfundveis: a tu te la de sim ples segurana que se p resta com a sentena cautelar , por definio, um a form a de proteo que ainda no satisfaz, m as apenas assegura a fu tu ra satisfao do direito afirm ado pelo requerente. Alm desse autor, m uitos ou tros afirm am o carter necessariam ente no satisfativo do processo cautelar, en tre os quais T heodoro Jnior, Curso de direito processual civil, vol. II, p. 363; Barbosa M oreira, Estudos sobre o novo Cdigo de Processo Civil, p. 230; Luiz G uilherm e M arinoni, Tutela cautelar e tutela antecipatria, p. 75-79.

    9 Entre outros, susten tam esta posio Calam andrei, Introduzione alio studio sistemtico dei pro- vvedimenti cautelari, p. 185-188; C am elutti, Derecho y proceso, p. 421-423; Galeno Lacerda, Comentrios ao Cdigo de Processo Civil, vol. VIII, tom o I, p. 9.

    10 M arinoni, Tutela cautelar e tutela antecipatria, p. 75.

    11 Alfredo Buzaid, Exposio de motivos do CPC, 1972, n 6.

    12 Baptista da Silva, Do processo cautelar, p. 10.

  • 1 6 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    vvel), nada mais do que a tu te la antecipada, que no se confunde com a cautelar exatam ente por te r carter satisfativo, em bora seja, tam bm , um a tutela jurisdicional prestada com base em juzo de probabilidade (cognio sum ria).

    O processo cautelar , assim, instrum ento de que se vale o Estado-Juiz para prestar um tipo de tu te la jurisdicional no satisfativa, consistente em assegurar a efetividade de um futuro provim ento judicial, a ser prestado, via de regra, em outro processo (o processo principal).

    O processo cautelar tem pressupostos prprios, que no se confundem com os pressupostos processuais exigidos para a existncia e validade do processo principal. So trs os pressupostos processuais deste tipo de processo (assim como de todas as dem ais espcies): um juzo investido de jurisdio, partes capazes e um a dem anda regularm ente formulada.

    No h, em verdade, m uito o que acrescentar ao que se disse a respeito de pressupostos processuais quando do estudo da teoria geral do direito processual. Q uanto ao prim eiro pressuposto, um juzo investido de jurisdio, valem rigorosam ente as m esm as observaes anteriorm ente feitas. O processo cautelar, para existir, deve ser instaurado perante um juzo (trata-se, pois, de pressuposto processual de existncia), assim entendido qualquer rgo do "Poder Judicirio que exera funo jurisdicional. No basta, porm, que o processo se desenvolva perante um juzo, sendo necessrio, para que o feito possa se desenvolver regularm ente (pressuposto processual de validade), que tal juzo esteja investido de jurisdio, ou seja, preciso que o processo cautelar se desenvolva perante rgo judicirio que tenha "competncia constitucional.

    Em outros term os, o processo cautelar s ser vlido se instaurado perante o rgo judicirio que, segundo a Constituio da Repblica, esteja legitimado a exercer a funo jurisdicional naquele caso concreto. Assim, por exemplo, num processo cautelar em que, e. g., a Unio Federal seja a dem andada, o feito se desenvolver regularm ente apenas se instaurado perante um juzo federal. Da m esm a forma, um processo cautelar em que sejam partes duas pessoas naturais, em um caso em que a relao jurdica de direito m aterial que os une seja de carter privado, no se tratando de relao de em prego (basta pensar, por exemplo, num a locao, ou num a relao regida pelo direito de famlia, como a filiao), s ser vlido se estiver se desenvolvendo perante juzo que integre o Judicirio estadual.

    de bom alvitre recordar que a com petncia do juzo no por mim considerada um pressuposto processual, como ficou dito no prim eiro volume deste livro, razo pela qual no tratarei agora do assunto, sendo certo que neste volume dedicarei todo um captulo ao estudo da com petncia para o processo cautelar.

    O segundo pressuposto processual a ser analisado em sede cautelar o das partes capazes. Em prim eiro lugar, de se considerar que o processo

  • Conceito e Noes Gerais 17

    cautelar s existe se houver partes, assim considerados todos aqueles que participam do procedim ento realizado em contraditrio. Pelo m enos duas partes (dem andante e dem andado) so exigidas para que o processo cautelar possa existir. N o se pode deixar de dizer, alis, que o CPC emprega, para designar estas duas partes, os nom es de requerente e requerido, m as inegvel o acerto, tam bm neste passo, das denom inaes demandante e demandado. No se deve, porm , falar em autor e ru, pois estes so nom es tradicionalm ente em pregados apenas no processo cognitivo (assim como exequente e executado no processo de execuo).

    N ada impede, obviamente, a formao de litisconsrcio no processo cautelar, em todas as hipteses em que tal coligao de partes poderia (ou deveria, nos casos de litisconsrcio necessrio) se form ar no processo principal. Alis, de se dizer que, nos casos em que o litisconsrcio seja necessrio no processo principal, ele o ser, tam bm , no processo cautelar.13 Tambm se deve lem brar que o M inistrio Pblico ser chamado a intervir como custos legis nos casos previstos no art. 82 do CPC.

    No que se refere interveno de terceiros, esta ser possvel no processo cautelar, ao m enos em algumas m odalidades. Em prim eiro lugar, no pode haver dvidas quanto possibilidade de assistncia no processo cautelar. Pendente um processo desta natureza, o terceiro, que tenha interesse jurdico em que algum a das partes obtenha sentena (cautelar) favorvel, poder intervir no processo como assistente, seja a assistncia simples ou qualificada.14

    No que concerne oposio (embora no seja ela propriam ente um a m odalidade de interveno de terceiro, m as processo autnom o, como visto no prim eiro volume destas Lies), no a m esm a cabvel incidentem ente ao processo cautelar. Isso porque requisito de adm issibilidade da oposio que o processo principal se dirija a um a deciso acerca da titularidade do direito. Como no processo cautelar no se ter a declarao da existncia ou inexistncia do direito, m as to som ente um a afirmao (ou negao) de um a probabilidade de existncia do direito, no est presente aquele requisito essencial para que a oposio seja adm itida.15

    13 Lacerda, Comentrios ao Cdigo de Processo Civil, vol. VIII, tom o I, p. 176.

    14 Theodoro Jnior, Curso de direito processual civil, vol. II, p. 389; Cndido Rangel Dinam arco, Interveno de terceiros, p. 172. Este ltim o au tor chega a afirm ar que a assistncia acaba por ser a m odalidade de interveno de terceiro que m ais se adapta ao processo cautelar".

    15 Assim , tam bm , Theodoro Jnior, Curso de direito processual civil, vol. II, p. 389. de se notar, porm , que a perspectiva de um a futura oposio, a ser apresentada incidentem ente ao processo principal, legitim a o terceiro (que ser opoente) a intervir no processo cautelar, com o assistente, num caso em que, por exemplo, se pretenda obter um a m edida cautelar de seqestro (assim D inam arco, Interveno de terceiros, p. 166).

  • 18 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    No que concerne ao recurso de terceiro, este , obviamente, adm itido no processo cautelar, m esm o porque no se poderia conceber que este fosse inadmissvel se outras modalidades de interveno, como a assistncia, por exemplo, so adm itidas. Isso porque, como se sabe, legitim ado para recorrer aquele terceiro que poderia te r intervindo no processo (como assistente, por exemplo, ou em qualquer outro tipo de interveno de terceiro admitida) e no o fez.

    Resta exam inar o cabim ento das m odalidades de interveno forada. A prim eira delas a nomeao autoria, cujo cabim ento no processo cautelar de ser adm itido.16 Basta pensar na hiptese em que se ajuza dem anda cautelar em face de detentor de um bem, como se fora ele o possuidor da coisa. Nesse caso, dever ele nom ear autoria o possuidor ou o proprietrio do bem (art. 62 do CPC). O m esm o se dar na hiptese prevista no art. 63 do CPC.

    Q uanto denunciao da lide, trata-se da m odalidade de interveno de terceiro cujo cabim ento no processo cautelar gera mais controvrsia. H, certo, quem sim plesm ente negue a possibilidade de se te r denunciao da lide no processo cautelar,17 por considerar que esta m odalidade de interveno de terceiro exige, para ser adm itida, um processo em que se vai regular em definitivo a relao jurdica de direito m aterial (o que se daria no processo de conhecim ento).

    Autores h, de outro lado, que adm item a denunciao da lide no processo cautelar, por considerar que neste processo existe um a "lide, que perm itiria o emprego desta modalidade de interveno de terceiro.18

    Parece-me, porm , que as duas posies acima referidas devem ser to m adas em considerao com um certo cuidado. Isso porque, se certo que no processo cautelar no se vai prover em definitivo acerca da relao jurdica de direito material, o que, ao m enos em linha de princpio, seria capaz de excluir o cabim ento da denunciao da lide, inegvel a existncia de pelo m enos um caso onde a interveno daquele a quem , no processo principal, se iria denunciar a lide fundam ental. E o caso da cautelar de produo antecipada de prova. Pense-se, por exemplo, num a dem anda em que um m orador de um edifcio pretenda a condenao do condom nio a indenizar as leses que o m esm o sofreu em razo de um incndio ocorrido na parte com um do edifcio. O condom nio de edifcio, neste caso, poderia denunciar a lide seguradora com que tivesse contratado o seguro contra incndio, para que a sentena que condenasse o dem andado a indenizar o dem andante declarasse tam bm a existncia do direito de regresso do condom nio em face da seguradora.

    16 Dinam arco, Interveno de terceiros, p. 166.

    17 Assim , por exemplo, Theodoro Jnior, Curso de direito processual civil, vol. II, p. 389-390.

    18 M ilton Flaks, Denunciao da lide, p. 192.

  • Conceito e Noes Gerais 19

    Imagine-se, agora, que o morador, ao invs de ajuizar de im ediato a dem anda condenatria, tenha optado por ajuizar dem anda cautelar de produo antecipada de prova, pleiteando a realizao antecipada de um a percia mdica, para que pudesse desde logo ser fixada a extenso das leses sofridas, podendo ele ento, logo em seguida, iniciar o tratam ento mdico de que necessitasse. Nesse caso, ajuizada a dem anda cautelar em face do condom nio, no poderia ele realizar a denunciao da lide, o que geraria um a perspectiva de que sua situao ao final do processo principal fosse diversa da que surgiria se no tivesse havido este processo cautelar antecedente.

    Isso porque, ajuizada a dem anda cautelar antecedente, a seguradora no participar da atividade de instruo probatria, no se integrando ao contraditrio quando da realizao da prova pericial antecipada. Ao contrrio, a seguradora do exemplo figurado s passaria a integrar o contraditrio no processo principal, quando j tivesse sido colhida a prova, a qual no seria capaz de estender seus efeitos em relao a quem no integrou o contraditrio no m om ento de sua produo. de se notar, porm, que, no caso de o m orador que se queim ou optar por ajuizar de im ediato a dem anda condenatria, e sendo realizada, no processo cognitivo, a denunciao da lide, a seguradora participar do contraditrio no m om ento da produo da prova, a qual produzir seus efeitos tam bm em relao a ela.

    Assim sendo, era preciso criar um mecanismo que perm itisse trazer para o processo aquele terceiro, a quem seria denunciada a lide no processo principal, para que o m esm o participasse do contraditrio no m om ento da produo (antecipada) da prova, para que esta fosse eficaz tam bm em relao a ele. A soluo encontrada pela m elhor doutrina, a que m anifesto m inha adeso, permitir, nestes casos, que se tenha um a assistncia provocada, ou seja, que se perm ita parte que, no processo principal, fosse realizar a denunciao da lide, que, no processo cautelar, provoque a vinda daquele terceiro ao processo cautelar de produo antecipada de prova, para atuar como seu assisten te .19 Com isso, estar-se- perm itindo a participao do terceiro na produo da prova, assegurando-se, assim, o respeito devido ao princpio do contraditrio, essencial para que a prova possa produzir seus efeitos tam bm em relao a ele.

    As concluses aqui expostas acerca dos casos em que seria cabvel a denunciao da lide no processo principal, tom ando legtim a a assistncia provocada no processo cautelar de produo antecipada de prova, so tam bm aplicveis - por identidade de razes - ao chamamento ao processo.20 No se adm itir, pois, a realizao de denunciao da lide ou de cham am ento ao processo em sede cautelar, mas nos casos previstos nos arts. 70 e 77 do CPC ser possvel

    19 Adm itindo a assistncia provocada, nesta situao, Dinamarco, Interveno de Terceiros, p. 169- 171; Sydney Sanches, Denunciao da Lide no direito processual civil brasileiro, p. 145-146.

    20 Dinam arco, Interveno de terceiros, p. 171.

  • 20 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    provocar a vinda do terceiro ao processo, para que atue como assistente (assistncia provocada) daquele que requereu sua citao.

    Vistas as partes (e os casos de cabim ento do fenmeno conhecido como "pluralidade de partes, em suas duas manifestaes: litisconsrcio e in terveno de terceiros), h que se falar da capacidade processual, pressuposto processual de validade.

    Esse pressuposto processual de validade, aqui como em todos os outros tipos de processo, necessrio para que o feito possa se desenvolver regularm ente, em direo ao seu desfecho norm al. Alm da capacidade de ser parte, que est presente nas pessoas naturais, jurdicas e formais (assim entendidas aqueles entes despersonalizados a que a lei atribui capacidade de ser parte, como o esplio, o condom nio de edifcio e a m assa falida), exige-se capacidade para estar em juzo, devendo os incapazes ser representados ou assistidos, por seus pais, tu tores ou curadores, na form a da lei civil. Por fim, exige-se capacidade postulatria, devendo as partes se fazer representar por advogados ou outro deten tor de tal aptido (como, e. g., os defensores pblicos).

    O terceiro pressuposto processual a demanda regularmente formulada. Aplica-se ao processo cautelar o princpio da dem anda, enunciado no art. 2o do CPC, m antendo-se aqui a incidncia de um a das caractersticas essenciais da funo jurisdicional: a inrcia.21 preciso, assim, para que o processo cautelar exista, que seja ajuizada um a demanda, atravs da qual se dar incio quele processo. Tal dem anda, como todas as demais, ser identificada por trs elem entos: partes, causa de pedir e pedido.

    As partes da dem anda cautelar so o dem andante (ou requerente) e o dem andado (ou requerido), sobre os quais no h m uito o que se dizer. Q uanto causa de pedir, com posta pelos fatos que fundam entam a pretenso m anifestada pelo dem andante. Divide-se em causa de pedir rem ota (os fatos constitutivos do direito afirmado pelo requerente) e causa de pedir prxim a (o fato que gera um a am eaa efetividade do processo principal, onde se buscar a realizao, isto , a satisfao do referido direito). O pedido, por fim, a pretenso m anifestada pelo dem andante. D esdobra-se em pedido im ediato (a m edida cautelar pleiteada pelo dem andante) e pedido m ediato (o bem da vida que se quer tutelar, e que na dem anda cautelar a efetividade do processo principal).

    A demanda, como visto, pressuposto processual de existncia. preciso, porm , para que o processo cautelar se desenvolva regularm ente, que a m esm a tenha sido regularmente formulada. Essa regularidade formal, frise-se,

    21 Como ser visto adiante, o CPC prev a possibilidade de concesso ex officio de m edidas cautelares (art. 797), m as tais m edidas no infirm am a regra da inrcia da jurisdio pois, conforme entendim ento am plam ente dom inante, e que se apresenta com o o m ais acertado, as medidas cautelares concedidas ex officio so, sem pre, incidentais a algum processo j em curso.

  • Conceito e Noes Gerais 21

    estar presente todas as vezes que o dem andante apresentar em juzo um a petio inicial que observe todos os requisitos formais im postos por lei. Como ser visto mais adiante, quando do estudo do procedim ento cautelar comum, a petio inicial neste tipo de processo, alm de requisitos com uns a todas as peties iniciais (como, por exemplo, a qualificao das partes), deve observar ainda requisitos especficos, enum erados no art. 801 do CPC, como, por exemplo, a indicao do processo principal, cuja efetividade se pretende tu telar com a m edida cautelar pleiteada (art. 801, III), requisito exigido para a regularidade formal da dem anda cautelar antecedente (mas que dispensado nas dem andas cautelares incidentes).

    Por fim, preciso dizer que a partir da entrada em vigor da Lei n 10.444/2002 no mais necessria a instaurao de um processo cautelar para que se possa obter tu te la cautelar. Com a fungibilidade existente entre as m edidas cautelares e as antecipatrias de tu te la jurisdicional satisfativa, decorrente do 7Q do art. 273 do CPC, aquele que requerer, no processo satisfativo, tu te la antecipada quando adequado seria requerer um a m edida cautelar ver o juiz conceder a m edida adequada. Isso significa dizer que possvel ao juiz conceder m edidas cautelares sem necessidade de instaurao de um processo cautelar. A m eu sentir, deve-se conceder a m edida cautelar no processo satisfativo no s quando haja um erro de qualificao com etido pela parte, m as sem pre que ali se verifique a necessidade da m edida de urgncia. A instaurao de um processo cautelar autnom o no mais, pois, requisito necessrio para que se possa obter tu te la cautelar (em bora continue a ser possvel a obteno da tu te la cautelar pela via tradicional do processo cautelar). Falta, agora, ao legislador, a ousadia de abolir definitivam ente o processo cautelar (ao m enos o incidental), fazendo com que o sistem a saia simplificado, deform alizando-se o processo civil, o que exigncia da lu ta incessante por pleno acesso justia.

    4e MEDIDA CAUTELAR: CONCEITO, CLASSIFICAO, CARACTERSTICAS, EFICCIA NO TEMPO

    4.1 Conceito

    D enom ina-se m edida cautelar o provim ento judicial capaz de assegurar a efetividade de um a futura atuao jurisdicional. norm alm ente concedida atravs de um processo destinado verificao de seu cabim ento e, em seguida (no m esm o processo) sua efetivao, a que se d o nom e de processo cautelar. Diz-se que ela norm alm ente concedida no processo cautelar porque no se pode negar a existncia de casos em que a m edida cautelar concedida no

  • 22 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    bojo de outro processo, de conhecim ento ou de execuo. o que se tem , por exemplo, no m andado de segurana, que tem natureza de processo de conhecimento, onde se perm ite expressam ente (art. 7Q, III, da Lei n Q 12.016/2009) a concesso de m edida cautelar para suspender a eficcia do ato atacado atravs daquele rem dio constitucional.22

    A m edida cautelar, portanto, pode ser definida, com apoio na lio de Theodoro Jnior, como "a providncia concreta tom ada pelo rgo judicial para elim inar um a situao de perigo para direito ou interesse de um litigante, m ediante conservao do estado de fato ou de direito que envolve as partes, durante todo o tem po necessrio para o desenvolvim ento do processo principal. Isto , durante todo o tem po necessrio para a definio do direito no processo de conhecim ento ou para a realizao coativa do direito do credor sobre o patrim nio do devedor, no processo de execuo.23

    A definio de m edida cautelar tem de se basear sem pre na ideia, essencial para sua exata compreenso, de que este provim ento jurisdicional no capaz de realizar o direito substancial afirmado pelo dem andante, m as to som ente se destina a assegurar que, no futuro, quando chegar o m om ento de se obter a satisfao de tal direito, estejam presentes as condies necessrias para tanto. A m edida cautelar no satisfaz, e sim assegura a futura satisfao. Por essa razo que no se pode concordar com um a clssica definio deste tipo de provimento, segundo a qual esta m edida seria "antecipao provisria de certos efeitos do provim ento definitivo, dirigida a prevenir o dano que poderia derivar do atraso do m esm o.24 Por essa definio, estariam includas entre as medidas cautelares as medidas que satisfazem antecipadam ente a pretenso do dem andante, sendo certo que, a meu juzo, tais m edidas no tm ndole cautelar, devendo ser includas em outra espcie de tu te la jurisdicional: a tu te la antecipatria.

    No se pode deixar de fazer referncia, quando do estudo do conceito de m edida cautelar, a um equvoco term inolgico m uito com um na prtica forense, consistente em confundir os conceitos de "m edida cautelar e de "ao cautelar. Assim que, com bastante frequncia, podem -se ler peties

    22 No sentido do texto, considerando que a m edida prevista no art. 7o, II, da revogada Lei n 1.533/1951 (e que corresponde, com exatido, ao vigente art. 7e, III, da Lei n 12.016/2009) tem natureza cautelar, Alffedo Buzaid, Do mandado de segurana, p. 213. Em sentido contrrio, porm, considerando que tal m edida tem natureza de tu te la antecipatria, Celso Agrcola Barbi, Do mandado de segurana, p. 174 (em bora para este au tor a m edida, por ser antecipatria, no deixe de te r carter cautelar, em posio com a qual, data venia, pelos m otivos j expostos, no concordo).

    23 Theodoro Jnior, Curso de direito processual civil, vol. II, p. 362-363. A definio do ju rista m ineiro s peca ao fazer referncia a credor e devedor para designar as partes do processo executivo, em ntida adoo de term inologia de direito substancial para designar um fenm eno essencialm ente processual. M elhor seria que se dissesse "exequente e executado.

    24 Calam andrei, lntroduzione alio studio sistemtico dei prowedimenti cautelari, p. 176.

  • Conceito e Noes Gerais 2 3

    iniciais em que o advogado que a subscreve afirm a que seu patrocinado p rope "m edida cautelar em face do dem andado, quando em verdade o que se prope , sem som bra de dvida, um a "ao cautelar. O equvoco tam bm aparece em algum as sentenas, m esm o em casos onde o advogado, acerta- dam ente, tenha afirmado em sua petio inicial que estava propondo "ao cautelar. Infelizm ente, so m uitos os m agistrados que, em suas sentenas, afirmam - ao elaborar o relatrio - que o dem andante ajuizou "m edida caute lar em face do dem andado. Este equvoco term inolgico deve ser evitado a todo custo, para que se possa assegurar a preciso vocabular, to necessria para a evoluo de qualquer cincia.

    4.2 Classificao

    No h consenso em doutrina acerca da form a mais adequada de se classificarem as m edidas cautelares. Diversos m todos so empregados, todos com qualidades inegveis e nenhum inteiram ente im une a crticas. A presentarei aqui alguns desses sistem as de classificao das m edidas cautelares encontrados nas obras dedicadas ao tem a, para em seguida apresentar a classificao que, a m eu juzo, a mais adequada.

    No se pode deixar de iniciar apresentando a classificao sugerida por Calamandrei, que falava em medidas cautelares de quatro tipos:25 (a) medidas de antecipao da instruo (como seria, e. g.t a produo antecipada de prova), que tm por fim fixar certo resultado probatrio destinado a produzir efeitos num futuro processo cognitivo; (b) medidas de garantia da futura execuo forada (como, por exemplo, o arresto), destinadas a assegurar a efetividade da futura execuo, atravs de m eios capazes de evitar a disperso de bens daquele que ser executado; (c) medidas antecipatrias, capazes de estabelecer um a regulam entao provisria da situao substancial, a ser posteriorm ente substitu da pela sentena definitiva (como seriam, por exemplo, as lim inares de reintegrao e m anuteno de posse); e, finalm ente, (d) medidas que consistem na im posio de um a cauo, cuja prestao exigida como requisito para que se possa obter um posterior provim ento jurisdicional (como , e. g., a contracautela, prevista no art. 804, injlne, do CPC).

    O utra classificao que no se pode deixar de m encionar a p ro posta por Camelutti, que reconhecia a existncia de trs tipos de m edidas cautelares:26 (a) m edidas cautelares in ib itrias, como a m anuteno de posse ( de se no ta r que, para o citado jurista , as dem andas possessrias so cautelares, no se restring indo o carter cau telar apenas s lim inares, como

    25 Calam andrei, Introduzione alio studio sistemtico dei prowedimenti cautelari, p. 180-191.

    26 C am elutti, Derecho y proceso, p. 419-423.

  • 24 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    fazem alguns - reiterando-se, aqui, o que j disse acerca de m inha convico quan to ndole no cautelar tam bm destas m edidas - , m as o estendendo tam bm sen tena de m rito proferida nas "aes possessrias) e o seqestro; (b) m edidas cautelares restitu t rias , como a reintegrao de posse; e, por fim, (c) m edidas cautelares antecipatrias, como a produo antecipada de prova.

    N a doutrina brasileira especializada, m uito conhecida e acatada a classificao de Galeno Lacerda,27 que prope trs critrios de classificao das m edidas cautelares: quanto finalidade, quanto posio processual e o carter da medida; e quanto natureza.

    Q uanto finalidade, as medidas cautelares se dividiriam, segundo o citado jurista gacho, em medidas de segurana quanto prova (cognio), como a produo antecipada de prova e a exibio; m edidas de segurana quanto aos bens (execuo), como o arresto e o seqestro; e m edidas de segurana mediante antecipao provisria da prestao jurisdicional, como os alim entos provisionais e a guarda provisria de filhos.

    No que concerne posio processual e ao carter da m edida, adm ite Lacerda a existncia de duas categorias de medidas cautelares: (a) medidas antecedentes; e (b) medidas incidentes. As m edidas da prim eira espcie so pleiteadas antes de iniciado o processo principal, e as da segunda espcie no curso dele. Considera, ainda, o festejado ju rista do Rio Grande do Sul que as medidas incidentes podem ser de dois tipos: (b .l) m edidas preventivas; e (b.2) medidas repressivas, de que seria exemplo o atentado.

    Por fim, quanto natureza da tu te la cautelar, afirma Lacerda a existncia de dois tipos de m edida cautelar: (a) medidas jurisdicionais, como o arresto e o seqestro; e (b) medidas administrativas, que seriam divididas em: (b .l) m edidas voluntrias, como a produo antecipada de prova e a justificao; e (b.2) m edidas concedidas de ofcio pelo juiz, autorizadas pelo art. 797 do Cdigo de Processo Civil.

    O utro ju rista brasileiro que tratou do tema, apresentando um a classificao das medidas cautelares, foi Humberto Theodoro Jnior,28 para quem h trs tipos de m edida cautelar: (a) m edidas para assegurar bens, que tm por fim proteger a futura execuo forada; (b) medidas para assegurar pessoas, como a guarda provisria de incapazes e os alim entos provisionais; e (c) medidas para assegurar provas, como a exibio. Afirma, ainda, o citado autor que o Cdigo d especial im portncia a duas outras classificaes das medidas cautelares: a que as divide em medidas tpicas e atpicas; e a que as separa em m edidas preparatrias e incidentes.

    27 Lacerda, Comentrios ao Cdigo de Processo Civil, vol. VIII, tom o I, p. 8-11.

    28 Theodoro Jnior, Curso de direito processual civil, vol. II, p. 366-368.

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    Algumas destas classificaes propostas, e outras que poderiam ser referidas, devem ser exam inadas com cuidado, pois seus defensores m uitas vezes tm posturas diferentes quanto ao exame da tu te la jurisdicional cautelar. Assim , por exemplo, autores como Calamandrei e Camelutti incluem en tre as m edidas cautelares provim entos nitidam ente satisfativos do direito substancial, o que os afasta do pensam ento que me guia no estudo da m atria, j que, a m eu sentir, as m edidas cautelares so, por definio, m edidas incapazes de perm itir a realizao prtica do direito do dem andante.

    A m eu sentir, as m edidas cautelares devem ser classificadas de trs formas: quanto tipicidade, quanto ao m om ento da postulao e quanto finalidade.

    Q uanto tipicidade, o sistem a processual brasileiro adm ite dois tipos de medidas cautelares: (a) m edidas tpicas, isto , m edidas descritas no direito objetivo, como o arresto e o seqestro; e (b) medidas atpicas, assim entendidas as medidas cautelares que, em bora no estejam descritas pelo ordenam ento jurdico, podem ser concedidas pelo juiz (atravs do chamado "poder geral de cautela, que ser objeto de anlise mais frente).

    No que concerne ao m om ento em que a medida cautelar postulada, tam bm se podem considerar dois tipos: (a) medidas antecedentes, pleiteadas antes da instaurao do processo principal; e (b) medidas incidentes, pleiteadas no curso do processo principal.

    Por fim, quanto finalidade, adm ito a existncia de trs categorias de m edidas cautelares: (a) m edidas de garantia da cognio, que se destinam a assegurar a efetividade de um futuro m dulo processual cognitivo, como a produo antecipada de prova (que perm ite a im ediata produo de um m aterial probatrio que se destina a gerar efeitos num futuro processo de conhecim ento), ou a sustao de protesto cambirio (que tem por fim assegurar a efetividade de um a futura declarao de inexistncia da obrigao representada pelo ttu lo protestado, a qual no traria resultados teis se o protesto produzisse seus regulares efeitos, m esm o no existindo a dvida); (b) medidas de garantia da execuo, que se destinam a assegurar a efetividade de um futuro m dulo processual executivo, evitando a dissipao dos bens sobre os quais incidiro os m eios executivos, como so o arresto e o seqestro; e, finalmente, (c) medidas que consistem em um a cauo, como a contracautela, prevista na parte final do art. 804 do CPC.

    4.3 Caractersticas

    As medidas cautelares tm caractersticas prprias, que perm item ao ju rista distingui-las dos dem ais provim entos jurisdicionais. Algumas dessas ca

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    ractersticas esto presentes tam bm em outros tipos de provim ento, como o caso da revogabilidade (que tam bm encontrada nas medidas antecipatrias, ex vi do art. 273, 4o, do CPC). O utras so exclusivas deste tipo de provim ento jurisdicional, como o caso da fungibilidade (que, como se ver, a possibilidade de substituio da m edida por cauo que assegure o m esm o resultado prtico a que a m edida cautelar se destinava).

    So as seguintes as caractersticas das m edidas cautelares: instrum enta- lidade hipottica, tem porariedade, revogabilidade, modificabilidade e fungibilidade.

    A prim eira caracterstica das m edidas cautelares, apontada por Calaman- drei em sua obra pioneira, a instrumentalidade hipottica.29 Trata-se de caracterstica anteriorm ente mencionada, m as que deve ser reapreciada neste passo, por razes de ordem sistem tica.

    Como j visto, o processo cautelar se liga a outro processo, chamado principal, cuja efetividade tem o fim de assegurar. A m edida cautelar, assim, o provim ento jurisdicional cujos efeitos asseguram a efetividade (assim com preendida a aptido para alcanar os resultados prticos norm alm ente esperados) do processo principal. A m edida cautelar, pois, tem um carter instrum ental em relao ao processo principal.

    certo que todo processo instrum ental, sendo a instrum entalidade do processo um a de suas caractersticas mais relevantes e evidentes. Essa instrum entalidade, como sabido, se m anifesta de duas formas: o processo instrum ento de que se vale o Estado para atingir os escopos jurdico, sociais e polticos da jurisdio (instrum entalidade em sentido positivo), e , alm disso, instrum ento de realizao da vontade concreta do direito substancial (instrum entalidade em sentido negativo). a este segundo sentido da instru m entalidade do processo que se liga a caracterstica de que ora se trata.

    preciso te r claro o seguinte: enquanto o processo principal instru m ento de realizao do direito material, o processo cautelar instrum ento de realizao do processo principal. Por isto, alis, j se disse que o processo cautelar instrumento do instrumento.

    A m edida cautelar deferida com base num juzo de probabilidade, pois que cabe ao juiz que aprecia a pretenso de concesso da m edida verificar se provvel a existncia do direito m aterial afirmado pelo dem andante. Cabe, pois, ao juiz conceder a m edida cautelar para a hiptese de, no processo principal, ser deferida a m edida satisfativa do direito substancial. por ser concedida como instrum ento de tu te la desta hiptese (a de o dem andante ser vencedor no processo principal) que se afirma que a m edida cautelar se caracteriza pela instrumentalidade hipottica.30

    29 Calam andrei, Introduzione alio studio sistem tico dei p row ed im en ti cautelari, p. 200.

    30 Sobre essa caracterstica da m edida cautelar, de se referir a sem pre lcida lio do m aior dos processualistas brasileiros: Por que hipottica? Porque a m edida cautelar concedida para

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    No estudo desta prim eira caracterstica das m edidas cautelares se insere a anlise do que se tem chamado de referibilidade.31

    A referibilidade essencial s medidas cautelares. Entenda-se o que se pretende aqui afirmar: toda m edida cautelar se refere a um a situao substancial, que se quer proteger. Esta referibilidade dado indicativo da cautelarida- de. Onde no h referibilidade, no h m edida cautelar. Pense-se, por exemplo, nos alim entos provisrios, fixados no procedim ento da "ao de alim entos. O provim ento que fixa os alim entos provisrios atende diretam ente pretenso substancial do dem andante. J as medidas cautelares no perm item esta realizao im ediata, lim itando-se a assegurar o gozo futuro da situao substancial a que se referem. Esta referibilidade, pois, marca que distingue a m edida cautelar dos dem ais provim entos jurisdicionais.32

    esta referibilidade a um a situao a ser acautelada, alis, que explica a razo pela qual o processo cautelar estar sempre ligado a um outro processo (processo principal). que no processo principal ser regulada a situao acautelada, a que se refere a m edida cautelar que tenha sido concedida. A inexistncia de referibilidade afasta a natureza cautelar da medida, tom ando desnecessria (ao m enos em algumas hipteses) a propositura de dem anda "principal. Nessas hipteses, satisfaz-se o ordenam ento com o ajuizam ento de dem anda que levar instaurao de processo de cognio sumria, onde se em itir um provim ento satisfativo.

    A segunda caracterstica das m edidas cautelares a temporariedade. de se notar que poucos so os autores que afirm am a existncia da caracterstica aqui referida, sendo dom inante a afirmao segundo a qual seria caracterstica das m edidas cautelares a provisoriedade.33 preciso, pois, e antes de m ais nada, d istinguir os conceitos de provisrio e temporrio, para que se possa en tender a diferena en tre o que aqui se su sten ta e a posio da dou trina dom inante.

    A distino entre provisoriedade e tem porariedade conhecida da mais autorizada doutrina do direito processual desde a obra de Calamandrei, tantas

    a hiptese de que aquele que a pleiteia eventualm ente tenha r