alceu domingues alvesdissertacaomestrado

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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DAS CIÊNCIAS Alceu Domingues Alves INTRODUZINDO A GEOMETRIA FRACTAL NO ENSINO MÉDIO: UMA ABORDAGEM BASEADA NAS FORMAS DOS OBJETOS CONSTRUÍDOS PELA NATUREZA. RECIFE 2008

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO PR-REITORIA DE PESQUISA E PS-GRADUAO

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENSINO DAS CINCIAS

    Alceu Domingues Alves

    INTRODUZINDO A GEOMETRIA FRACTAL NO ENSINO MDIO: UMA ABORDAGEM BASEADA NAS FORMAS DOS OBJETOS CONSTRUDOS PELA

    NATUREZA.

    RECIFE 2008

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    UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO PR-REITORIA DE PESQUISA E PS-GRADUAO

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENSINO DAS CINCIAS

    Alceu Domingues Alves

    INTRODUZINDO A GEOMETRIA FRACTAL NO ENSINO MDIO: UMA ABORDAGEM BASEADA NAS FORMAS DOS OBJETOS CONSTRUDOS PELA

    NATUREZA.

    RECIFE 2008

  • 2

    Alceu Domingues Alves

    INTRODUZINDO A GEOMETRIA FRACTAL NO ENSINO MDIO: UMA ABORDAGEM BASEADA NAS FORMAS DOS OBJETOS CONSTRUDOS PELA

    NATUREZA.

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps- Graduao em Ensino das Cincias (PPGEC), Nvel de Mestrado, da Universidade Federal Rural de Pernambuco, como parte dos requisitos para obteno do ttulo de Mestre em Ensino de Cincias e Matemtica.

    Orientador: Prof. Dr. Romildo Albuquerque Nogueira Co-orientadora: Prof.Dra Josinalva Estacio Menezes

    RECIFE Agosto / 2008

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    FICHA CATALOGRFICA

    CDD 510. 24

    1. Matemtica aplicada 2. Geometria Euclidiana 3. Geometria fractal 4. Ciclo da experincia de Kelly 5. Software 6. Geometria dinmica I. Nogueira, Romildo Albuquerque II. Ttulo

    A474i Alves, Alceu Domingues Introduzindo a geometria fractal no ensino mdio : uma abordagem baseada nas formas dos objetos construdos pela natureza / Alceu Domingues Alves. -- 2008. 150 f.

    Orientador : Romildo Albuquerque Nogueira Dissertao (Mestrado em Ensino das Cincias. Depar tamento de Educao) -- Universidade Federal Rural de Pernambuco. Inclui bibliografia.

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    Alceu Domingues Alves

    INTRODUZINDO A GEOMETRIA FRACTAL NO ENSINO MDIO: UMA ABORDAGEM BASEADA NAS FORMAS DOS OBJETOS CONSTRUDOS PELA

    NATUREZA.

    Aprovada em 29 de Agosto de 2008.

    Banca Examinadora

    Presidente: ______________________________________________________ Prof. Dr. Romildo Albuquerque Nogueira (UFRPE)

    1: Examinador____________________________________________________ Prof. Dra. Josinalva Estacio Menezes (UFRPE)

    2: Examinador __________________________________________________

    Prof. Dr. George Chaves Jimenez (UFRPE)

    3: Examinador ___________________________________________________ Prof. Dr. Cato Temstocles de Freitas Barbosa (UFPE)

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    DEDICATRIA

    Dedico esta pesquisa, a uma das melhores pessoas que tive o prazer de conhecer h exatos, nove anos e alguns meses, neste mundo to cinza. Pessoa fraterna, ddiva de Deus, passou a colorir meu mundo, deu som, formas, arrasou geral, sempre me deixando feliz com suas travessuras. Ser menina, sers adolescente e ser mulher, mas sempre estar aos meus olhos como uma doce criana, pois o amor que envolve esta criatura o mesmo que habita em meu ser: Mvia Caroline de Lima Alves, minha pequena e ao mesmo tempo grande filha. Graas a ti, Deus, por ela existir e por me presenteares com este ser maravilhoso.

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    AGRADECIMENTOS

    Primeiramente agradeo a Deus, onipotente, onisciente e onipresente, que permitiu que eu estivesse aqui hoje e por me dar toda a fora necessria para que este trabalho fosse realizado e meu curso fosse concludo. Agradeo ao meu saudoso pai Francisco Moizeis Alves, pelo grande exemplo enquanto esteve junto a ns. A minha me Mabel Domingues Alves, mulher guerreira, venceu todos os obstculos que a vida sempre insistiu em colocar. A Silvia Catarina, pela pacincia e amor; aos Professores do programa, perfeitos na troca de saberes. Ao Casal Shirley e Joo, pessoas inesquecveis num importante momento de minha vida; A minha irm Mabel, pelos cuidados com a minha filha, nas minhas ausncias devido pesquisa;

    As sobrinhas Gagau, Lili e Patricinha por participarem efetivamente neste trabalho de pesquisa;

    Aos colegas de graduao, Josa, Galego, Chico, Marcelo, Rogrio; Ao colega de trabalho: Wagner Santos, exemplo de seriedade e responsabilidade; Aos colegas de curso, Alba, Dilson, Dcio, Maria do Carmo, Ricardo Braz, Neves, Kilma, Josilvado e aos demais colegas pelo harmonioso convvio.

    AGRADECIMENTOS ESPECIAIS Agradeo ao Professor e Orientador Romildo Albuquerque Nogueira, homem simples, homem sbio, por vrias vezes paciente com meus atrasos, verdadeiro na hora de dar bronca, mas ao mesmo tempo, fraterno no reconhecimento do esforo dispendido por mim, obrigado, muito obrigado: AMIGO. Agradeo a outro ser maravilhoso que a querida e impressionante Professora J, meu guia nos primeiros passos na via do conhecimento, sou f incondicional, sempre dividindo o saber, sem escolher a quem. Obrigado senhora tambm, professora, por tudo que me proporcionou. Deus a abenoe sempre. Ao Professores Cato Temstocles de Freitas Barbosa e George Chaves Jimenez, pela disponibilidade e compreenso neste momento importante de mais uma etapa de minha vida.

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    Eu fico com a pureza das respostas das crianas:

    a vida! bonita e bonita!

    Viver e no ter a vergonha de ser feliz

    Cantar, e cantar, e cantar

    A beleza de ser um eterno aprendiz.

    Eu sei que a vida devia ser bem melhor e ser

    Mas isso no impede que eu repita:

    bonita, bonita e bonita!

    (Gonzaguinha)

  • 8

    SUMRIO

    INTRODUO 14

    1.1 Questo de pesquisa 14

    1.2 Objetivos 14

    1.2.1 Objetivo geral 14

    1.2.2 Objetivos especficos 14

    1- FUNDAMENTAO TERICA 17

    1.1 Pequeno histrico da geometria plana 17

    1.2 Um breve panorama histrico da Geometria Fractal 29

    1.3 Uma reviso sobre a geometria dos fractais.

    1.3.1 Algumas outras estruturas fractais 34

    1.3.1. 1 O Tringulo de Sierpinski 34

    1.3.1.2 O Conjunto de Cantor 35

    1.3.1.3 Fractais da Natureza 36

    1.3.2 Classes fractais 37

    1.3.3 Calculando a dimenso fractal: o mtodo de box-counting 39

    1.4 A Teoria dos Construtos Pessoais de George Kelly 39

    1.4.1 Uma breve biografia de George Kelly. 39

    1.4.2 A Teoria dos Construtos Pessoais 42

    1.4.3 Corolrio da dicotomia 46

    98

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    1.4.4 Corolrio da faixa 46

    1.4.5 Corolrio da modulao 46

    1.4.6 Corolrio da experincia 47

    1.4.7 Ciclo da Experincia de Kelly 48

    1.4.8 O Teste da Matriz de Repertrios (Rep-Teste) 49

    1.5 Cabri-Gomtre 51

    1.5.1 Caractersticas do Cabri-Gomtre 52

    1.5.2 Conhecendo O Cabri Gomtre II 53

    1.5.2.1 Barras de ferramentas 53

    1.5.3 Fundamentos de geometria 58

    2 METODOLOGIA 64

    2.1 Universo e amostra 64

    2.2 Interveno didtica 65

    2.2.1 Primeira etapa 65

    2.2.1.1 Etapa A 66

    2.2.1.2 Etapa B 72

    2.2.1.2.1 Antecipao 72

    2.2.1.2.2 Investimento, encontro e confirmao 72

    2.2.1.2.3 Reviso construtiva 73

    2.3 Experimentos didticos 75

    2.3.1 Atividade 1 - O que Geometria Fractal ? 75

    2.3.2 Atividade 2 - Conjunto de Cantor 77

    2.3.3 Atividade 3- Tringulo de Sierpinski I 81

    2.3.4 Atividade 4 Dimenso fractal atravs do mtodo Box-Counting. 82

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    2.3.5 ATIVIDADE 5 Observao e clculo da dimenso fractal de um galho de arvore utilizando o mtodo Box-counting e softwares de geometria dinmica. 84

    Atividade - Esponja de Menger 85

    3. ANLISE DOS DADOS 90

    3.1 Anlises dos dados coletados 90

    3.1.1 Registros dos consensos 90

    3.1.2 Anlise dos pr e ps-testes e das matrizes de repertrio 91

    3.2 Categorizao dos dados das matrizes de repertrio 94

    4. RESULTADOS DISCUSSES 98

    4.1 Anlises dos pr e ps-testes. 98

    4.2 Anlises das respostas dos alunos 98

    4.3 Anlise das matrizes de repertrio 103

    4.3.1 Anlise do aluno A 103

    4.3.2 Anlise do aluno B 104

    4.2.3 Anlise do aluno C 106

    4.3 Consideraes finais 107

    5. CONCLUSO 110 REFERNCIAS 114

    ANEXOS 117

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    RESUMO

    O presente trabalho prope introduzir o conceito e propriedades da Geometria Fractal no Ensino Mdio, com enfoque numa abordagem baseada nas descries das formas dos objetos construdos pelo homem e pela natureza. A Geometria Fractal um tema que tem sido explorado de maneira bastante superficial nas sries finais do ensino mdio, apesar da sua extrema utilidade na descrio das formas construdas pela natureza. O principal objetivo do trabalho investigar como os alunos concebem as formas geomtricas dos objetos e processos da natureza. A proposta metodolgica para a realizao da pesquisa consistiu em utilizar objetos construdos pela natureza e pelo homem e levar os alunos a descreverem suas formas a partir da geometria euclidiana (estudada previamente) e da geometria fractal (discutida numa oficina realizada durante a pesquisa). Softwares educacionais de geometria dinmica foram usados para trabalhar com os alunos as duas geometrias. A amostra trabalhada foi constituda de alunos de uma turma de terceiro ano do ensino mdio de uma escola pblica da rede oficial de ensino do Estado de Pernambuco. A teoria dos construtos pessoais de George Kelly foi usada para analisar os dados.

    Palavras-chave: Geometria Euclidiana, Geometria Fractal, Construtos pessoais, Ciclo da experincia de Kelly, Software de Geometria Dinmica.

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    ABSTRACT

    The present work of research proposes to teach the fractal geometry in high school

    classroom, with approach in the forms the objects natural and build by the man. Despite of the utility of the fractal geometry for description of the natural objects, this geometry is a subject that has been taught poor in the last series of the high school. The objective of the work is: i. to identify as the students conceive the geometric forms of objects and processes of the nature, without previous knowledge of fractal geometry; the procedure methodological is to carry the students for to apply the Euclidian and fractal in the description of the different shape natural an build by the man. educational Software of dynamic geometry will be used to work with the Euclidean and fractal geometry. The object used will be some students the last year of the high school from a public school of the state of Pernambuco. The theory of the Kelly personal constructs were be used in the analysis of the data.

    Word-key: Euclidean Geometry, Fractal Geometry, Personal Constructs, Kelly experience

    Circle, Software of Dynamic Geometry.

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    INTRODUO

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    INTRODUO

    Os Parmetros Curriculares Nacionais para o ensino mdio - PCNEM (BRASIL, 2002), que tm como base a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (Lei nos 9.394 / 96), propem que seja dado significado para os contedos ministrados no ensino mdio. Nos documentos dos PCNEM so sugeridos que os educandos desenvolvam competncias e habilidades para sua a realizao como profissional e cidado. Os PCNEM estruturam o currculo nas seguintes reas de conhecimento: Linguagens, Cdigos e suas Tecnologias; Cincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias e Cincias Humanas e suas Tecnologias. As vrias disciplinas so ministradas dentro dessa nova perspectiva de reas de conhecimento.

    As competncias a serem desenvolvidas nos alunos, em relao matemtica, sugeridas pelos PCNEM so: capacidade de abstrao; desenvolvimento do pensamento sistmico; criatividade; capacidade de pensar mltiplas solues para um problema; ou seja, o desenvolvimento do pensamento crtico; capacidade de trabalhar em equipe; disposio para aceitar crticas; disposio para enfrentar as incertezas no conhecimento e na sua prpria vida; saber comunicar-se, capacidade de buscar conhecimento (BRASIL, 2002).

    Educar com essas propostas dos PCNEM exige do educador, alm do domnio de contedos especficos, a capacidade para criar no dia-a-dia da sala de aula situaes concretas que permitam ao educando aplicar seus conhecimentos. Neste contexto, o ensino de matemtica um grande desafio para o profissional que se prope a trabalhar nessa perspectiva de desenvolvimento de competncias e habilidades nos seus educandos. Diante disso, impe uma seguinte questo: Como contribuir para desenvolver competncias e habilidades nos discentes para aplicar a geometria na interpretao das formas dos objetos do seu cotidiano?

    A anlise das formas construdas pelo homem e pela natureza mostra que as duas usam regras geomtricas distintas na construo dos objetos. Enquanto o homem utiliza a geometria euclidiana para construir suas estruturas, tais como prdios, carros, avies etc., a

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    natureza busca novas regras geomtricas para construir as formas dos objetos e processos naturais, a exemplo dos corais, as rvores, os processos vasculares nos diversos organismos.

    Neste sentido este trabalho prope introduzir no ensino mdio o ensino de uma nova geometria (a fractal) que permita descrever as formas dos objetos construdos pelo homem e pela natureza.

    1. QUESTO DE PESQUISA

    A partir das consideraes feitas, emerge a seguinte questo: Como trabalhar com os alunos do ensino mdio uma nova geometria (a geometria fractal) que permita descrever com mais preciso os objetos e processos que ocorrem na natureza?

    1.2. Objetivos

    Na busca de discutir a questo de pesquisa apresentada, este trabalho estabelece os seguintes objetivos:

    1.2.1 Objetivo Geral:

    Analisar estratgias didticas para ensinar a geometria fractal, no nvel mdio, a partir da observao dos fenmenos da natureza.

    1.2.2 Objetivos especficos:

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    Investigar como os alunos compreendem as formas geomtricas dos objetos e processos da natureza;

    Identificar como os alunos estabelecem diferenas nas formas que a natureza e o homem constroem seus objetos;

    Analisar os sistemas de construtos dos alunos sobre a geometria fractal e suas articulaes com a geometria euclidiana.

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    CAPTULO 1 FUNDAMENTAO TERICA.

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    1. FUNDAMENTAO TERICA.

    Este captulo tem o objetivo de abordar os seguintes temas: breve histrico da geometria euclidiana; Os fundamentos da geometria dos fractais; as bases da teoria dos construtos pessoais de George Kelly, em especial, a matriz de repertrio (Rep-Teste) e descrever a utilizao do software Cabri-Gomtre.

    1.1 Pequeno Histrico da Geometria Plana

    A histria da geometria, como a de muitas outras matrias em desenvolvimento e mudana, compe-se de dois fios entrelaados. Um deles narra o desenvolvimento de seu contedo e o outro sua natureza mutvel. Ningum ignora que a geometria deve ter se iniciado provavelmente em tempos muito remotos na Antigidade, a partir de origens muito modestas, depois cresceu gradualmente at alcanar a dimenso enorme que tem hoje. Por outro lado, no so muitas as pessoas que esto cientes de que a natureza, ou carter inerente, da matria teve conotaes diferentes em perodos diferentes de seu desenvolvimento. Nesta breve histria da geometria convm nos empenharmos em dar a devida ateno a esses dois fios to intrigantes.

    As primeiras consideraes que o homem fez a respeito da geometria so, inquestionavelmente, muito antigas. Parecem ter se originado de simples observaes provenientes da capacidade humana de reconhecer configuraes fsicas, comparar formas e tamanhos.

    Inmeras circunstncias da vida, at mesmo do homem mais primitivo, levavam a um certo montante de descobertas geomtricas subconscientes.

    A noo de distncia foi, provavelmente, um dos primeiros conceitos geomtricos a serem desenvolvidos. A necessidade de delimitar a terra levou noo de figuras geomtricas simples, tais como retngulos, quadrados e tringulos. Outros conceitos geomtricos

  • 19

    simples, como as noes de vertical, paralela e perpendicular, teriam sido sugeridos pela construo de muros e moradias.

    Muitas observaes do seu cotidiano devem ter levado o homem primitivo concepo de curvas, superfcies e slidos. Os exemplos de crculo eram numerosos entre outros o contorno do sol e da lua, o arco-ris, as sementes de muitas flores e o corte transversal de um tronco de rvore.

    Uma pedra arremessada descreve uma parbola; uma corda no esticada e pendurada pelas pontas forma uma catenria; uma corda enrolada forma uma espiral; os crculos de crescimento do tronco de uma rvore, os crculos concntricos provocados na superfcie de um lago por uma pedra nele arremessada e figuras sobre certas conchas sugerem a idia de famlias de curvas. Muitas frutas e seixos so esfricos e bolhas de gua so hemisfricas; alguns ovos de pssaros so aproximadamente elipsides de revoluo; um anel um toro; troncos de rvores correspondem a cilindros circulares; configuraes cnicas so freqentemente encontradas na natureza. Oleiros primitivos construam muitas superfcies e slidos de revoluo. Corpos de homens e animais, a maioria das folhas e flores e certas conchas e cristais ilustram a idia de simetria.

    A idia de volume surge imediatamente ao se considerarem recipientes para conter lquidos e outras mercadorias.

    Exemplos como estes podem se multiplicar quase que indefinidamente. Configuraes fsicas que tm uma caracterstica ordenada, em contraste com as formas casuais e desorganizada da maioria dos corpos, necessariamente chamam a ateno de um esprito que reflete e alguns conceitos geomtricos elementares so assim trazidos luz. Essa geometria deveria, por falta de melhor denominao, ser chamada geometria subconsciente. Esta geometria subconsciente era empregada pelo homem primitivo para fazer ornamentos decorativos e desenhos, e provavelmente correto dizer-se que a arte primitiva preparou em grande escala o caminho para o desenvolvimento geomtrico posterior. A evoluo da geometria subconsciente nas crianas pequenas bem conhecida e fcil de ser observada.

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    No incio parece que o homem s considerava problemas geomtricos concretos, que se apresentavam individualmente e entre os quais no era observada nenhuma ligao. Mais tarde, a inteligncia humana tornou-se capaz de, a partir de certo nmero de observaes relativas a formas, tamanhos e relaes espaciais de objetos fsicos especficos, extrair certas propriedades gerais e relaes que incluam as observaes anteriores como casos particulares. Isto acarretou a vantagem de se ordenarem problemas geomtricos prticos em conjuntos tais que os problemas de um conjunto podiam ser resolvidos pelo mesmo procedimento geral. Chegou-se assim noo de lei ou regra geomtrica. Por exemplo, a comparao dos comprimentos de caminhos circulares e de seus dimetros levaria, num certo perodo de tempo, lei geomtrica de que a razo entre a circunferncia e o dimetro constante.

    Esse nvel mais elevado do desenvolvimento da natureza da geometria pode ser chamado geometria cientfica uma vez que induz, ensaio e erro, e procedimentos empricos eram os instrumentos de descoberta. A geometria transformou-se num conjunto de receitas prticas e resultados de laboratrio, alguns corretos e alguns apenas aproximados, referentes a reas, volumes e relaes entre vrias figuras sugeridas por objetos fsicos.

    Os dados obtidos nesta pesquisa no permitiram estimar quantos sculos se passaram at que o homem fosse capaz de elevar a geometria ao status de cincia. Mas escritores que se ocuparam desta questo unanimemente concordam em que o vale do rio Nilo, no Egito antigo, foi o local onde a geometria subconsciente transformou-se em cientfica. O famoso historiador Herdoto, do sculo V a.C., defendeu essa tese assim:

    Eles diziam que este rei [Sesstris] dividia a terra entre os egpcios de modo a dar a cada um deles um lote quadrado de igual tamanho e impondo-lhes o pagamento de um tributo anual. Mas qualquer homem despojado pelo rio de uma pane de sua terra teria de ir a Sesstris e notificar-lhe o ocorrido. Ele ento mandava homens seus observarem e medirem quanto a terra se torna menor, para que o proprietrio pudesse pagar sobre o que restam, proporcionalmente ao tributo total. Dessa maneira, parece-me que a geometria teve origem, sendo mais tarde levada at a Hlade.

    Assim, o tradicional relato localiza na agrimensura prtica do antigo Egito os primrdios da

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    geometria como cincia; de fato, a palavra geometria significa medida da terra. Embora no haja a ter certeza de sua origem, parece seguro assumir que a geometria cientfica brotou de necessidades prticas, surgidas vrios milnios antes de nossa era, em certas reas do Oriente Antigo, como uma cincia para assistir atividades ligadas agricultura e engenharia.

    H indcios histricos de que isso ocorreu no s ao longo do rio NiIo no Egito, mas tambm nas bacias de outros grandes rios, como o Tigre e o Eufrates na Mesopotmia, o Indo e o Ganges na regio centro-sul da sia e o Hwang Ho e Yangtz na sia oriental. As bacias desses rios foram beros de formas avanadas de sociedade, conhecidas por sua habilidade em engenharia na drenagem de pntanos, irrigao, obras de defesa contra inundaes e construo de grandes edifcios e estruturas. Tais projetos requeriam muita geometria prtica.

    Tanto quanto possvel recuar ao passado, ainda se encontra presente um corpo considervel de geometria cientfica. Ao que parece, a geometria se manteve nesse modelo at o grande perodo grego da antigidade.

    H muito a ser dito, no plano elementar de instruo, como introduo geometria emprica ou experimental; muitos professores acham conveniente preceder um primeiro curso de geometria demonstrativa de algumas semanas de geometria experimental. Esse trabalho leva o aluno a conhecer muitos conceitos de geometria e pode ser planejado de modo a enfatizar tanto os aspectos positivos como os defeitos da geometria emprica. Esse procedimento segue a tese de que, em geral, o programa de ensino deve ser paralelo ao desenvolvimento histrico.

    Os mais antigos registros da atividade do homem no campo da geometria so algumas tbulas de argila cozida desenterradas na Mesopotmia e que se acredita datarem, pelo menos em parte, do tempo dos Sumrios, por volta do ano 3000 a.C. H outros suprimentos generosos de tbulas cuneiformes babilnicas provindas de perodos posteriores, como a poca do rei Hammurabi, na primeira dinastia babilnica, a poca do rei Nabucodonosor II, no imprio neobabilnico e as eras persa e selucida, que se seguiram. A partir dessas tbu-las vemos que a geometria babilnica antiga estava intimamente relacionada com a

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    mensurao prtica.

    Numerosos exemplos concretos mostram que os babilnios do perodo 2000-1600 a.C. conheciam as regras gerais para o clculo de reas de retngulos, reas de tringulos retngulos e issceles (e talvez de um tringulo qualquer), a rea do trapzio retngulo, o volume do paraleleppedo retngulo e, mais geralmente, o volume do prisma reto com base trapezoidal. A circunferncia de um crculo era tomada como sendo o triplo do dimetro e a rea do circulo como um doze avos da rea do quadrado construdo sobre um lado de comprimento igual circunferncia do circulo: ento o volume de um cilindro circular reto era obtido fazendo-se o produto da base pela altura. O volume de um tronco de cone ou de pirmide quadrangular aparece incorretamente como o produto da altura pela semi-soma das bases. Parece tambm haver indcios de que os antigos babilnios usavam a frmula incorreta

    k = (a + c)(b + d)

    4

    para a rea de um quadriltero tendo a, b, c, d como lados consecutivos. Esses povos sabiam que lados correspondentes de dois tringulos retngulos semelhantes so proporcionais, que a altura baixada do vrtice de um tringulo issceles sobre a base divide-a ao meio e que o ngulo inscrito num semicirculo reto. O teorema pitagrico tambm j era conhecido, desde cerca de 2000 a.C. (BOYER, 1974).

    Nossas principais fontes de informaes a respeito da geometria egpcia antiga so os papiros Moscou e Rhind textos matemticos que contm, respectivamente, 25 e 85 problemas, e datam de aproximadamente 1850 a.C. e 1650 a.C. H tambm, no Museu de Berlim, o mais antigo instrumento de astronomia ou de agrimensura conhecido uma combinao de fio de prumo e colimador procedente do Egito, aproximadamente do ano 1850 a.C. O Museu de Berlim tambm tem o mais antigo relgio de sol que se conhece. egpcio e data de cerca de 1500 a.C. Esses instrumentos revelam, naturalmente, alguns conhecimentos de geometria prtica aos quais estariam associados. Devemos tambm assinalar que a grande pirmide de Giz, cuja construo primorosa envolveu geometria

  • 23

    prtica, foi erguida em cerca de 2900 a.C.

    As mudanas econmicas e polticas dos ltimos sculos do segundo milnio a.C. fizeram com que o poder do Egito e da Babilnia diminussem. Novos povos passaram ao primeiro plano, e os desenvolvimentos posteriores da geometria foram passados aos gregos, que transformaram a matria em algo muito diferente do conjunto de concluses empricas produzido por seus predecessores.

    Os gregos insistiram em que os fatos geomtricos deviam ser estabelecidos, no por procedimentos empricos, mas por raciocnios dedutivos; as verdades geomtricas deviam ser obtidas no gabinete de estudos, e no no laboratrio. Em suma, os gregos transformaram a geometria emprica, ou cientfica, dos egpcios e babilnios antigos no que se poderia chamar de geometria sistemtica ou demonstrativa.

    decepcionante que, ao contrrio do que ocorre para a geometria dos antigos egpcios e babilnios, no haja quase nenhuma fonte primria para o estudo da geometria grega primitiva em si. Impe-se o apoio em manuscritos e relatos que datam de vrios sculos depois de os originais terem sido escritos.

    A principal fonte de informaes referente geometria grega primitiva o chamado Sumrio eudemiano de Proclus. Este sumrio constitui vrias pginas do Comentrio sobre Euclides, Livro I, e um breve esboo do desenvolvimento da geometria grega desde os tempos mais primitivos at Euclides. Embora Proclus tenha vivido no sculo V d.C., mais de um milnio depois do incio da geometria grega, ainda teve acesso a numerosos trabalhos histricos e crticos, que depois se perderam, com exceo de alguns fragmentos e aluses preservadas por ele e outros. Entre esses trabalhos perdidos est o que era, ao que parece, uma histria completa da geometria grega, cobrindo o perodo anterior a 335 a.C., escrita por Eudemo, um discpulo de Aristteles. O Sumrio eudemiano assim chamado porque, supostamente, baseia-se nesse trabalho mais antigo.

    Segundo o Sumrio eudemiano, a geometria grega parece ter comeado essencialmente com o trabalho de Tales de Mileto na primeira metade do sculo VI a.C. Esse gnio verstil, considerado um dos sete sbios da antiguidade, foi um digno fundador da geometria de-

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    monstrativa. ele o primeiro individuo conhecido a quem estar associada a utilizao de mtodos dedutivos em geometria. Tales, segundo o sumrio, residiu temporariamente no Egito, trazendo a geometria em sua volta para a Grcia, onde comeou a aplicar matria procedimentos dedutivos da filosofia grega. So creditados a ele alguns resultados geomtricos muito elementares, cujo valor no deve ser medido pelo seu contedo mas pelo fato de que ele os baseava em raciocnios lgicos e no em intuio e experimentao. Pela primeira vez, um estudioso da geometria se comprometeu com uma forma de raciocnio dedutivo, por mais parcial e incompleto que fosse. Alm do mais, o fato de o primeiro pensamento dedutivo ocorrer no campo da geometria (e no no da lgebra, por exemplo) inaugurou uma tradio em matemtica que se manteve at tempos muito recentes.

    O prximo gemetra grego importante mencionado no Sumrio eudemiano Pitgoras, considerado como o continuador da sistematizao da geometria iniciada por Tales, cerca de cinqenta anos antes. Pitgoras nasceu por volta do ano 572 a.C. na ilha de Samos, uma das ilhas do mar Egeu prximas de Mileto, a cidade natal de Tales.

    bem possvel, ento, que Pitgoras tenha estudado com ele. Ao que parece, Pitgoras visitou ento o Egito e talvez tenha mesmo viajado mais pelo Oriente. Quando de seu retorno, encontrou a Jnia sob o domnio persa, decidindo imigrar para Crotona, porto martimo grego situado no sul da Itlia. L ele fundou a famosa escola pitagrica, uma irmandade unida por mistrios, ritos cabalisticos e cerimnias e empenhada no estudo de filosofia, matemtica e cincias naturais.

    Apesar da natureza mstica de muitos dos estudos pitagricos, os membros da sociedade produziram, durante os cerca de duzentos anos que se seguiram fundao da escola, uma grande quantidade de slida matemtica. Assim, em geometria, desenvolveram as proprie-dades das retas parelelas e usaram-nas para provar que a soma dos ngulos de um tringulo qualquer igual a dois ngulos retos. Contriburam de maneira notvel para a lgebra geomtrica grega e desenvolveram uma teoria das propores bastante completa (ainda que limitada a grandezas comensurveis) que usaram para deduzir propriedades de figuras semelhantes. Tinham cincia da existncia de pelo menos trs dos poliedros regulares; descobriram a incomensurabilidade do lado e da diagonal de um quadrado. Embora muitas dessas informaes j fossem conhecidas pelos babilnios de tempos mais antigos, imagina-

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    se que os aspectos dedutivos da geometria devam ter sido consideravelmente explorados e aprimorados pelo trabalho dos pitagricos. Cadeias de proposies em que umas derivam de outras anteriores comearam a emergir medida que as cadeias se alongavam e se ligavam umas s outras, a idia ousada de desenvolver toda a geometria como uma longa cadeia foi surgindo. O Sumrio eudemiano afirma que um pitagrico, Hipcrates de Quio, foi o primeiro a tentar, com sucesso pelo menos parcial, uma apresentao lgica da geometria sob forma de uma nica cadeia de proposies baseada em algumas definies e suposies iniciais. Tentativas melhores foram feitas por Lcon, Teudius e outros. Ento, por volta do ano 300 a.C., Euclides produziu sua obra memorvel, os Elementos, uma cadeia dedutiva nica de 465 proposies compreendendo de maneira clara e harmoniosa geometria plana e espacial, teoria dos nmeros e lgebra geomtrica grega. Assim que surgiu, esse trabalho j mereceu o mais alto respeito, superando rpida e absolutamente os esforos anteriores no mesmo sentido tanto que, destes ltimos, no restou nenhum vestgio. O efeito deste nico trabalho sobre o futuro desenvolvimento da geometria foi enorme, e dificilmente se poderia superestim-lo.

    Muitas foram as realizaes dos gregos durante os trs sculos entre Tales e Euclides. Pitgoras e outros desenvolveram no s o material que acabou sendo organizado nos Elementos de Euclides, como tambm noes relativas a infinitsimos e limites e processos somatrios (noes que s foram definitivamente esclarecidas com a inveno do clculo nos tempos modernos). Tambm desenvolveram em boa parte a geometria superior, ou geometria de curvas que no o crculo e a reta e de superfcies que no a esfera e o plano. Curiosamente, muito dessa geometria superior originou-se de tentativas constantes de resolver os trs famosos problemas de construo da antigidade: a duplicao do cubo, a trisseco de um ngulo arbitrrio e a quadratura do crculo.

    Tambm durante os trs primeiros sculos de sua matemtica, os gregos desenvolveram a noo de discurso lgico como uma seqncia de afirmaes obtidas por raciocnio dedutivo a partir de um conjunto aceito de afirmaes iniciais. Ento tanto as afirmaes iniciais como as derivadas do discurso so afirmaes sobre a questo tcnica do discurso e, por isso, envolvem termos especiais ou tcnicos. Os significados desses termos devem ser claros para o leitor e, assim, os gregos sentiam que o discurso deveria comear com uma

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    lista de explanaes e definies desses termos tcnicos. Depois dessas explanaes e definies terem sido dadas, as afirmaes iniciais, chamadas axiomas e/ou postulados do discurso, deveriam ser enunciados. Essas afirmaes iniciais, segundo os gregos. deveriam ser cuidadosamente escolhidas de maneira que sua veracidade fosse completamente aceitvel pelo leitor em vista das aplanaes e definies j citadas.

    De um discurso conduzido segundo o plano acima diz-se, hoje, que foi desenvolvido atravs de axiomtica material. Certamente a contribuio mais importante dos gregos antigos matemtica foi a formulao do modelo de axiomtica material e a insistncia em que a geometria fosse sistematizada de acordo com esse modelo. Os Elementos de Euclides so o mais antigo exemplo extensamente desenvolvido do uso do modelo que nos foi transmitido. Em anos mais recentes, como ser visto, o modelo de axiomtica material foi signifi-cativamente generalizado de modo a fornecer uma forma de discurso abstrato conhecido como axiomtica formal.

    Os trs gemetras gregos mais importantes da Antiguidade foram Euclides (c. 300 a.C.), Arquimedes (287-212 a.C.) e Apolnio (c. 225 a.C.). No exagero dizer que quase tudo o que se fez de significativo em geometria, at os dias de hoje, e ainda hoje, tem sua semente original em algum trabalho desses trs grandes eruditos.

    Os trs foram escritores prolificos. Assim, embora os Elementos sejam, de longe, seu trabalho mais importante e na verdade a obra de geometria mais importante de toda a histria , Eucides escreveu vrios outros tratados de geometria, sendo que existe algum conhecimento a respeito de cerca de oito deles.

    Cerca de dez tratados matemticos de Arquimedes sobreviveram at nossos dias, e h vestgios de vrios trabalhos seus que se perderam. Dos que restaram, trs so sobre geometria plana e dois sobre geometria slida. Esses trabalhos no so compilaes de realizaes de predecessores, mas criaes altamente originais, marcando Arquimedes como um dos maiores matemticos de todos os tempos, e certamente o maior da Antiguidade. Num de seus trabalhos dedicados geometria plana, Arquimedes inaugurou o clssico

    mtodo dos permetros para calcular pi, considerando que pi est situado entre 223/71 e 22/7,

    ou que, com duas casas decimais, pi dado por 3,14. Esse procedimento de Arquimedes foi

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    o ponto de partida da longa histria da busca de aproximaes cada vez mais acuradas para

    o valor de pi alcanando-se, em 1967, a fantstica aproximao de 500 000 casas decimais

    (hoje j temos aproximaes de mais de 1 000 000 casas decimais). Em seus outros trabalhos de geometria plana, Arquimedes antecipou alguns dos mtodos do clculo integral.

    Dentre esses gemetras posteriores, merecem meno especial Heron de Alexandria (c. 75 d.C.), Menelau (e. 100), Cludio Ptolomeu (e. 85 - e. 165) e Papus (e. 320). Em geometria, Heron ocupou-se da mensurao plana e slida e Menelau e Ptolomeu contribuiram para a trigonometria enquanto auxiliar da astronomia. Papus, o ltimo dos gemetras gregos criativos, que viveu cerca de cinco sculos depois de Apolnio e esforou-se em vo, apesar de seu entusiasmo, para instilar vida nova na debilitada geometria grega. Seu grande trabalho, a Coleo, cuja maior parte chegou at ns, um misto de comentrio e guia de outros trabalhos de seu tempo. Numerosas proposies originais, aprimoramentos, extenses e valiosos comentrios histricos entremeiam a obra. A Coleo acabou sendo o rquiem da geometria grega, pois, aps Papus, a geometria grega deixou de ser uma disciplina vivida: apenas sua memria foi perpetuada por escritores menores e comentadores.

    Na geometria grega antiga encontramos o manancial do assunto, no que se refere forma e ao contedo. E inestimvel a importncia desse legado notvel para toda a geometria subseqente.

    O perodo final dos tempos antigos foi dominado por Roma. Os centros gregos foram caindo um aps o outro sob o poder das tropas romanas, e em 146 a.C. a Grcia tornou-se uma provncia do Imprio Romano. As condies revelaram-se cada vez mais sufocantes para o trabalho cientfico original, e manifestou-se um declnio gradual do pensamento criativo. O advento dos brbaros no Ocidente e o conseqente colapso no mercado de escravos, com seus efeitos desastrosos para a economia romana, encontrou a cincia e a matemtica reduzidas a um plano medocre.

    O perodo que se iniciou com a queda do Imprio Romano, na metade do sculo V, e se estendeu at o sculo XL conhecido como alta Idade Mdia europia. Durante esse

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    perodo a civilizao na Europa ocidental desceu a nveis muito baixos. O ensino quase deixou de existir, o saber grego por pouco no desapareceu e grande parte das artes e ofcios transmitidos pelo mundo antigo foram esquecidos.

    Durante este perodo estril do ensino os povos do Oriente, especialmente hindus e rabes, tornaram-se os maiores depositrios da matemtica. Todavia, o conceito grego de raciocnio rigoroso na verdade, a prpria idia de demonstrao dedutiva parecia desagradvel maneira hindu de fazer as coisas. Embora os hindus se sobressaissem na computao, contribuindo para a lgebra e desempenhando um importante papel no desenvolvimento do atual sistema de numerao posicional, em geometria ou em metodologia matemtica bsica quase nada produziram de importncia. Talvez a melhor produo da geometria hindu do perodo, e um tanto solitria quanto sua excelncia, seja o trabalho de Brahmagupta (c. 628) sobre quadrilteros cclicos, todos com lados, diagonais e reas racionais.

    O extraordinrio episdio da ascenso e queda do Imprio rabe ocorreu durante a alta Idade Mdia. Ao longo da dcada seguinte fuga de Maom de Meca para Medina, em 622, as tribos dispersas e desunidas da pennsula arbica se consolidaram numa nao poderosa, movidas por um fervor religioso intenso. Um sculo depois, a fora das armas tinha estendido os preceitos e a influncia muulmanos por um territrio que ia da ndia at a Espanha, passando pela Prsia, Mesopotmia e norte da frica. O modo como os rabes se apropriaram do saber grego e hindu teve importncia considervel para a preservao de grande parte da cultura do mundo. Numerosos trabalhos gregos e hindus nas reas de astronomia, medicina e matemtica foram diligentemente traduzidos para a lngua rabe e, assim, foram salvos at que eruditos europeus posteriormente tivessem condies de retraduzi-los para o latim e outras lnguas. No fora o trabalho dos eruditos rabes e uma grande parte da cincia grega e hindu se teria perdido irremediavelmente ao longo da Idade Mdia.

    Alm disso, os matemticos rabes deram tambm algumas pequenas contribuies prprias. Em geometria pode-se mencionar o trabalho feito por Abul-Wefa (940-998) com compassos enferrujados, ou compassos da abertura fixa a soluo geomtrica das equa-es cbicas dada por Ornar Khayyam (c. 1044 - e. 1123) e as pesquisas de Nasir eddin (c. 1250) sobre o postulado das paralelas de Euclides. Tal como os hindus, os matemticos

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    rabes consideravam-se primordialmente como astrnomos, mostrando por isso grande interesse por trigonometria. A eles pode-se creditar o uso das seis funes trigonomtricas e aperfeioamentos na derivao de frmulas da trigonometria esfrica.

    Foi s na parte final do sculo XI que os clssicos gregos da cincia e da matemtica voltaram a se infiltrar na Europa. Seguiu-se um perodo de transmisso durante o qual o saber antigo, preservado pela cultura muulmana, foi passado para a Europa ocidental mediante tradues latinas feitas por eruditos cristos que se deslocavam at centros de ensino muulmanos, e atravs da abertura de relaes comerciais da Europa ocidental com o Levante e o mundo rabe. perda de Toledo pelos mouros para os cristos, em 1085, seguiu-se um influxo dc eruditos cristos que se dirigiram cidade para adquirir o saber mu-ulmano. A infiltrao de eruditos cristos ocorreu tambm em outros centros mouriscos da Espanha, e o sculo XII tornou-se, na histria da matemtica, o sculo dos tradutores.

    O sculo XIII assistiu ao surgirnento das universidades de Paris, Oxford, Cambridge, Pdua e Npoles. As universidades vieram a se tornar fatores poderosos de desenvolvimento da matemtica, uma vez que muitos matemticos se vinculavam a uma ou mais dessas institui-es. Durante esse sculo, por volta de 1260, Johannes Campanus fez uma traduo para o latim dos Elementos de Euclides, que posteriormente, em 1482, tornou-se a primeira verso impressa dessa grande obra.

    O sculo XIV foi improdutivo quanto matemtica. Foi o sculo da Peste, que dizimou mais de um tero da populao da Europa. Durante esse sculo desenrolou-se a Guerra dos Cem Anos, com suas profundas transformaes polticas e econmicas no norte da Europa.

    O sculo XV, perodo inicial do Renascimento, testemunhou o reaparecimento da arte e do saber na Europa. Com o colapso do Imprio Bizantino, culminando com a queda de Constantinopla perante os turcos em 1453, refugiados afluiram Itlia, trazendo tesouros da civilizao grega. Muitos clssicos gregos, conhecidos at ento apenas atravs de tradues rabes que muitas vezes no eram boas, podiam agora ser estudados nas fontes originais. Tambm a inveno da imprensa com tipos mveis, por volta de meados do sculo, revolucionou o comrcio de livros e permitiu que o conhecimento se difundisse numa velocidade sem precedentes.

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    A atividade matemtica nesse sculo centrou-se principalmente nas cidades italianas e nas cidades de Nurembergue, Viena e Praga, na Europa central. Concentrava-se na aritmtica, na lgebra e na trigonometria, sob a influencia prtica do comrcio, da navegao, da astronomia e da agrimensura.

    No sculo XVI prosseguiu o desenvolvimento da aritmtica e da lgebra, sendo que o feito mais espetacular da matemtica no perodo foi a descoberta, por matemticos italianos, da soluo algbrica das equaes cbicas e qurticas. Esse desenvolvimento contnuo da lgebra, ao longo do qual ela passou da forma retrica simblica, teve posteriormente um efeito marcante, como veremos, sobre o desenvolvimento da geometria. Um estimulo mais imediato ao desenvolvimento da geometria foi a traduo, em 1533, do Comentrio sobre Euclides, Livro I, de Proclus. A primeira traduo importante para o latim dos Livros I-IV da obra Seces cnicas de Apolnio foi feita por Federigo Commandino em 1566; os Livros V-VII s apareceram em tradues latinas em 1661. Em 1572, Commandino fez uma traduo muito importante dos Elementos de Euclides, a partir do grego. Essa traduo serviu de base para muitas outras subseqentes, inclusive para um trabalho muito influente de Robert Simson (1687-1768), do qual, por sua vez, derivaram vrias edies inglesas. Na poca, muitos trabalhos de Arquimedes j tinham sido traduzidos para o latim. Com a divulgao de todos esses grandes trabalhos gregos sobre geometria, era inevitvel que mais cedo ou mais tarde alguns dos aspectos da matria voltassem a chamar a ateno dos pesquisadores.

    A geometria euclidiana apesar de descrever as formas de figuras ideais no adequada para descrever com preciso as formas construdas pela natureza. A geometria fractal foi proposta visando a descrio geomtrica de estruturas com fragmentaes, com dobras e outros aspectos no descritos adequadamente pela geometria euclidiana.

    1.2 Um breve panorama histrico da Geometria Fractal

    Benoit Mandelbrot nasceu em 20 de Novembro de 1924, em Varsvia, capital da Polnia. Em 1936, Benot e seus familiares foram morar na Frana, por causa da 2 Guerra Mundial. Este pesquisador vem de famlia com tradio acadmica, o que o levou a se interessar por

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    Matemtica, influenciado pelo seu tio Szolem Mandelbrot (1899-1983), professor de Matemtica no Collge de France.

    Benot Mandelbrot estudou no Lycze Rolin, em Paris. Em seguida, freqentou a cole Polytechnique (1944), onde trabalhou com Paul Pierre Lvy (1886-1971) e obteve o ttulo de Ph.D, concedido pela Universidade de Paris. Depois, foi para os Estados Unidos da Amrica para estudar em Princeton. Mandelbrot retornou Frana em 1955, onde se casou com Aliette Kagan. Nessa poca, comeou a trabalhar no Centro Nationale de la Recherche Scientifique como professor da Matemtica. Em 1957 retornou a cole Politechnique, ficando sua carreira acadmica marcada, principalmente, entre a Frana e os EUA. Em 1958, foi convidado para trabalhar na IBM, em Nova Iorque. Em 1987, tornou-se professor de Cincias Matemticas na Universidade de Yale e, a partir desse momento, Mandelbrot comeou a questionar a Geometria Euclidiana, pois afirmava que esta no evidenciava abstrao aceitvel para compreender a complexidade da natureza. Mandelbrot, aps ser contratado pela IBM, comeou uma srie de estudos, junto com outros pesquisadores que estudavam coisas do tipo: o rudo (telecomunicao) e sries de preos em economia. Tais pesquisas acabaram convergindo com suas idias iniciais, dando origem Geometria Fractal. A palavra fractal tem origem da palavra latina fractus, que significa quebrado, irregular. Mandelbrot reconhecido mundialmente como o criador dos Fractais. Tal reconhecimento fica marcado atravs das obras clssicas: Logique, Langage et Thorie de l Information (com L. Apostel e A Morf), de 1957; Fractais: Forma, Hipteses e Dimenso, de 1977; A Geometria Fractal da Natureza, de 1982. Conforme visto, um dos fatores que levou Mandelbrot a estudar e desenvolver os Fractais foi no acreditar que a obra Euclidiana dava conta de explicar todas as formas, principalmente as da natureza. Aps muitos estudos, Mandelbrot criticou a Geometria Euclidiana, afirmando que Euclides no se aprofundou na idia de Dimenso, a qual considera ser muito importante para o desenvolvimento da Geometria. Embora Mandelbrot seja considerado o pai dos Fractais, estudos anteriores j mostravam idias semelhantes aquelas de Mandelbrot, e que acredita-se terem colaborado para o desenvolvimento de sua Geometria Fractal.

    Por volta de 1870, vrios trabalhos estavam sendo desenvolvidos. Porm, alguns desses trabalhos geravam figuras que saam das caractersticas usuais da Geometria Euclidiana.

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    Entre eles, h o de Karl Theodor Wilhelm Weierstrass, que apresentou algumas funes contnuas, no diferenciveis, isto , em nenhum ponto podia-se descrever uma reta tangente curva. Nessa mesma poca, Georg Ferdinand Ludwig Philip Cantor, matemtico de origem Russa, estudava um processo para transformar um segmento de reta em infinitos pontos, processo denominado de poeira de Cantor. Alguns anos depois, Jules Henri Poincar, matemtico e filsofo francs, estudava o sistema solar e as rbitas dos planetas, criando assim o que hoje conhecido como topologia, afirmando que os movimentos dos planetas geravam curvas estranhas, caticas, cujas rbitas jamais se tornavam peridicas e previsveis. Estes trabalhos possuam idias que deram, mais tarde, origem aos Fractais.

    1.3 Uma reviso sobre a geometria dos fractais.

    A palavra fractal foi cunhada por Mandelbrot (1983). Ele reuniu, criou e popularizou uma grande coleo de objetos fractais. Esses objetos so caracterizados por suas propriedades que so:

    i) a auto-similaridade, a qual significa que partes de um objeto ou processo so semelhantes ao objeto ou processo todo;

    ii) a dependncia de escala (scaling), que significa dizer que a medida de uma grandeza depende da escala na qual foi medida;

    iii) dimenso fractal, a qual prov uma descrio quantitativa da auto-similaridade e dependncia de escala;

    iv) propriedades estatsticas anmalas das grandezas fractais (BASSINGTHWAIGHT et al., 1994).

    A auto-similaridade da forma geomtrica desses objetos no descrita por uma funo algbrica; ao invs disto especificada por meio de um algoritmo que instrui como construir o objeto fractal (IBID.).

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    A construo de um objeto fractal mostrada na Figura 1, onde se observa a curva de Koch para diferentes nmeros de iteraes do algoritmo gerador. A curva de Koch, cujo algoritmo de iterao consiste em adicionarse repetidamente a cada face de um tringulo eqiltero um novo tringulo cujos lados so 1/3 do comprimento do lado do tringulo anterior. O comprimento do permetro da curva de Koch aumenta de 4/3 a cada estgio da iterao. O limite de infinitas iteraes a curva de Koch ter um permetro infinito, apesar de encerrar uma rea finita. Observe-se tambm que a curva de Koch uma curva contnua, porm no diferencivel em todos os pontos.

    A dimenso fractal, definida aqui como dimenso de auto-similaridade, descreve quantos novos pedaos geometricamente similares ao objeto so observados quando a resoluo aumentada. Assim reduzida a escala por um fator F ser encontrado que existem N pedaos similares ao original, ento a dimenso de auto-similaridade dada por: N = Fd, onde d a dimenso de auto-similaridade, aplicando-se logaritmo:

    d = log N/logF.

    Quando o conceito de dimenso de auto-similaridade aplicado a um segmento de reta trivial observar-se que d = 1. Contudo, quando esse conceito aplicado ao permetro da curva de Koch, pode ser observado que uma reduo do fator de escala de 3 (F = 3), N = 4 novos pedaos so encontrados. Desta forma, a dimenso fractal de auto-similaridade, d = log 4/ log3 = 1,2619 um nmero fracionrio (NUSSENZVEIG, 1999).

    Figura 1: A curva de Koch, cujo algoritmo de iterao consiste em adicionar repetidamente a cada face de um tringulo eqiltero um novo tringulo cujos lados so 1/3 do comprimento do lado do tringulo anterior. O comprimento do permetro da curva de Koch aumenta de 4/3 a cada estgio da iterao. Construo de um

    objeto fractal (d = 1, 2619) (BASSINTHWAIGHT ET AL., 1994).

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    Muitas estruturas e processos fisiolgicos so estatisticamente auto-similares. Por

    exemplo, estruturas em que cada vez mais invaginaes aparecem medida que a resoluo vai aumentando, so tpicas em processos de transporte atravs de membranas, onde o aumento do nmero de invaginaes1 permite elevar a rea disponvel para realizaes do transporte atravs dessas membranas (GOLDBERGER et al., 1990).

    Sistemas fisiolgicos onde os padres de bifurcaes so similares em diferentes escalas espaciais so tambm exemplos de estruturas fractais. Outro exemplo de processos fractais so aqueles que ocorrem numa estrutura hierrquica. Por exemplo, protenas tm diferentes formas estveis denominadas estados conformacionais. Esses estados conformacionais so separados por barreiras de energias decorrentes das diferenas nas energias potenciais e no grau de ordem (entropia) entre esses estados. Nestas estruturas pode ser observado que pequenas barreiras de energias separam formas que diferem poucas umas da outras e que grandes barreiras de energia separam formas bastante diferentes entre si. (ANSARI et al.,1985; KEIRSTEAD & HUBERMAN,1987). A dependncia de escala descreve como uma propriedade L(r) depende da escala usada para medi-la. Grandezas fractais caracterizam-se por apresentarem uma dependncia em forma de uma lei de potncia com a escala utilizada para medi-la. Assim L(r) = A*rb , onde A e b so constantes para um determinado processo fractal.

    Uma caracterstica das grandezas fractais a dependncia linear do logaritmo da grandeza L com o logaritmo da escala utilizada na realizao da medida. Alm da dimenso de auto-similaridade, outras dimenses fractais podem ser definidas. So elas: dimenso de capacidade e a dimenso por contagem de caixas (box-counting) descritas a seguir.

    A dimenso de capacidade obtida cobrindo-se com N(r) bolas o objeto fractal, onde N(r) o nmero mnimo de bolas de raio r necessrias para cobrir todos os pontos do objeto fractal. Desde que os objetos fractais tm forma irregular, essas bolas necessariamente se superpem para poder incluir o objeto todo. Repete-se o procedimento com bolas de diferentes tamanhos e traa-se um grfico do log-log de N(r) em funo de r (raio das

    1 Invaginao, termo prprio da biologia, pode ser definida como uma dobra celular semelhante textura do

    joelho e cotovelo.

  • 35

    bolas). A inclinao desse grfico a dimenso de capacidade, que pode ser definida, formalmente, atravs da seguinte expresso:

    )log(/)(loglim0

    rrNr

    capacidadeD

    =

    O raio r na expresso equivale ao inverso do fator de escala F.

    Quando a dimenso de um objeto fractal determinada utilizandose uma grade retangular, ao invs de bolas, est-se diante de um novo mtodo de se determinar a dimenso fractal denominada dimenso por contagem de caixas (box-counting). Neste caso, cobre-se o objeto fractal com N(r) caixas que contenham pelo menos um ponto do objeto. Repete-se o procedimento com caixas de diferentes tamanhos e traa-se um grfico do log-log de N(r) em funo de r (lados das caixas). A inclinao desse grfico a dimenso de contagem por caixas, que pode ser definida, formalmente, atravs da seguinte expresso:

    )/1log(/)(loglim0

    rrNr

    counitngboxD

    =

    Alm desses mtodos, vrios outros so propostos para calcular a dimenso dos objetos fractais, entre esses se podem citar: dimenso de massa, dimenso de informao, dimenso de correlao e outros que fogem ao escopo desse trabalho.

    1.3.1 Algumas outras estruturas fractais

    A seguir mostram-se algumas outras estruturas fractais que foram usadas neste trabalho, so elas: O tringulo de Sierpinski e o conjunto de Cantor.

    1.3.1. 1 O Tringulo de Sierpinski

  • 36

    Este tringulo construdo da seguinte forma: marcam-se os pontos mdios de cada um dos lados de um tringulo. Em seguida, unem-se esses pontos mdios por um segmento, dividindo o tringulo original em quatro novos tringulos menores e semelhantes. Retira-se o tringulo do meio e faz-se o mesmo processo em cada um dos tringulos que sobram, e assim, sucessivamente. A imagem abaixo mostra o resultado, depois de se realizar esta operao por quatro vezes.

    Dimenso =2log3log

    1,585

    Figura 2: Tringulo de Sierpinski

    1.3.1.2 O Conjunto de Cantor

    No Conjunto ou Poeira de Cantor, considera-se um segmento de reta, dividido em trs partes iguais, sendo retirado o tero central. De cada um dos dois segmentos restantes procede-se da mesma forma anterior, isto , dividindo-os em trs partes iguais e retirando-se os teros mdios. O processo de dividir os segmentos e de retirar o pedao intermedirio prossegue infinitamente.

    Dimenso =3log2log

    0,631

    Figura 3 Este conjunto tem dimenso Fractal entre 0 e 1.

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    Os exemplos acima apresentam auto-similaridade. Quando vistas atravs de uma lente de aumento, as diferentes partes de um Fractal se mostram similares forma como um todo. Existem os Fractais exatos, ou estritamente matemticos, que so gerados no computador, e os Fractais naturais, cuja propriedade de auto-similaridade ocorre apenas aproximadamente.

    1.3.1.3 Fractais da Natureza

    Um exemplo de Fractal natural a forma de um galho de rvore desfolhada, que repete sua forma nas ramificaes, conforme mostrados a seguir.

    Figura 4. Galho de rvore desfolhada.

    Outro exemplo a foto de um relmpago, como mostrado na figura que segue:

    Figura 5. Foto de um relmpago.

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    Essa propriedade de auto-similaridade quer dizer, na linguagem dos matemticos, que uma figura fractal invariante em escalas, isto , cada pedao mnimo de uma figura se parece, com ligeiras diferenas, com a figura completa.

    A conseqncia disto que um matemtico coloca em um computador uma equao simples, e trabalhando repetidamente sobre o mesmo padro, o computador vai desenhar os ramos, galhos, troncos e, assim, produzir uma rvore completa. Pode-se com softwares de Geometria Dinmica simular dando origem a um Fractal exato, como mostram as figuras que seguem quase idnticas a uma rvore e a um relmpago real (fractais naturais).

    Figura 6. Galho de rvore construdo Cabri Gometr Figura7 Relmpago construdo Cabri Gometr

    1.3.2 Classes fractais

    Uma das caractersticas dos Fractais, como j mencionado, a sua construo, pois para isso necessrio um processo recursivo. Na construo de qualquer Fractal h a necessidade de se repetir sempre um determinado procedimento infinitamente, o que, no nosso caso, um processo geomtrico. Utilizamos o termo Classe Fractal para referir a trs grandes grupos que geram os Fractais. Estas classes so KERN et al (1990).

    i) Classe Fractal Geomtrica: nesta, os Fractais so construdos com objetos extremamente geomtricos.

  • 39

    Figura 8. Fractal Geomtrico

    ii) Classe Fractal IFS (Iterated Function System ou Sistema Iterativo de Funes): nesta classe os Fractais so construdos atravs de sistemas iterativos de funes. Para entender melhor esta classe so necessrios alguns conhecimentos em Espaos Mtricos e Topologia.

    Figura 9. Fractal IFS

    Classe Fractal Geomtrica

    Classe Fractal IFS (Iterated Function System ou Sistema Iterativo de Funes)

  • 40

    iii) Classe Fractal EnL (Equaes no Lineares) Por exemplo: zn+1 = zn2 + c , onde z e c so nmeros complexos, ou na forma:

    f: C C definida por f(z) = z2+c.

    Figura 10. Fractal EnL.

    Convm ressaltar existem alguns ambientes computacionais na Web que podem construir as trs classes Fractais citadas. Para construir os exemplos mostrados, foi utilizado um software chamado Fantastic Fractals 98, que pode ser adquirido gratuitamente pela Web no endereo http://library.advanced.org/12740/. Neste trabalho foi explorada somente a Classe Fractal Geomtrica, utilizando-se softwares de Geometria Dinmica.

    1.3.3 Calculando a dimenso fractal: o mtodo de box-counting (contagem de caixas)

    Os fractais so formas complexas que no podem ser medidas apenas por dimenso topolgica. A dimenso fractal surge ento como uma alternativa de medio j que pode assumir valores fracionrios, obtendo assim o grau de complexidade de uma forma. A dimenso fractal de um conjunto um valor que diz o quo densamente um conjunto ocupa o espao mtrico em que ele existe.

    Dentre os vrios clculos de dimenso fractal existente, o box-counting um dos mais utilizados. Sua grande popularidade se deve a sua facilidade de uso em clculos matemticos e em estimativas experimentais. O algoritmo para o clculo dessa dimenso considera uma figura fractal qualquer coberta por uma grade de reticulada quadrada e calcula o nmero de quadrados necessrios para cobrir toda a figura. Posteriormente, o lado do quadrado da grade reticulada reduzido e novamente o nmero de quadrados contados.

    Classe Fractal EnL (Equaes no Lineares)

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    Esse procedimento pode ser observado nas figuras 11 e 12. A dimenso fractal obtida a partir do clculo do coeficiente angular do diagrama log (N(s))/log(1/s), onde N(s) o nmero de caixas usadas para cada tamanho de caixa usado (escala s ). As Figuras 11 e 12 abaixo mostram diferentes tamanhos de grades usadas no clculo da dimenso de box-counting.

    Figura 11. Grade reticulada usada na medida da dimenso de contagem por caixas.

    Figura 12. Grade reticulada de lado menor usada na medida da dimenso de contagem por caixas.

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    1.4 A Teoria dos Construtos Pessoais de George Kelly

    Neste tpico ser apresentada a teoria que fundamenta este trabalho de pesquisa.

    1.4.1 Uma breve biografia de George Kelly.

    George Kelly nasceu em 28 de abril de 1905 numa fazenda no estado norte americano de Kansas. Sua educao bsica foi marcada por irregularidades tpicas de uma comunidade rural do comeo do sculo XX. Estudou durante trs anos na Friends University, obtendo o grau de Bacharel em Fsica e Matemtica no Park College no ano de 1926. (MAEHR, 1969). Participava ativamente das questes polticas e sociais, participava de debates durante seu perodo colegial. Seguindo sua nova linha de interesse, foi estudar sociologia educacional na Universidade de Kansas, onde obteve o grau de Mestre em 1928.

    No seu estudo investigou as atividades de lazer dos trabalhadores de Kansas City em seu tempo de folga. (HALL et all, 2000). Acumulou experincia em vrias instituies de ensino tendo, em 1929, obtido uma bolsa de estudos para Universidade de Edimburgo como aluno de intercmbio, obtendo o grau de Bacharel em Educao em 1930, e desenvolvido uma tese, onde trabalhou com prognsticos sobre sucesso de processos de ensino. Retornou aos Estados Unidos da Amrica, matriculando-se na Universidade de Iowa no curso de ps-graduao em Psicologia. Aps o curto perodo de um ano recebeu, ainda em 1931, o grau de Ph.D., tendo desenvolvido um trabalho de pesquisa sobre os elementos mais comuns em deficincias de fala e escrita (MAEHR, 1969).

    Nos treze anos que se seguiram Kelly lecionou no Fort Hays State College, tendo direcionado nesta poca seus esforos para montar um programa de psicologia clnica para atender escolas estaduais no Kansas. Durante este perodo, desenvolveu novas abordagens na psicologia clnica em situaes escolares, publicando vrios artigos sobre o tema. Posteriormente, ingressou na Marinha Norte Americana, em virtude da 2. Guerra Mundial, encarregado do programa de treinamento local para pilotos civis, sendo designado em seguida para o Bureau de Medicina e Cirurgia da Marinha em Washington, onde permaneceu at o fim da guerra, em 1945. Neste mesmo ano foi indicado para o cargo de

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    professor associado da Universidade de Maryland e no ano seguinte (1946) foi nomeado professor e diretor de Psicologia Clinica na Universidade Estadual de Ohio, onde permaneceu trabalhando durante as duas dcadas seguintes. Durante muitos anos, canalizou suas energias para desenvolver o Programa de Graduao em Psicologia clnica daquele estabelecimento a um nvel de destaque nacional, tendo conseguido alcanar seu objetivo maior que foi a obra intitulada A Psicologia dos Construtos Pessoais, que foi apresentada originalmente em dois volumes publicados em 1955, sendo posteriormente condensada num volume nico - Uma teoria de Personalidade: A teoria dos Construtos Pessoais (KELLY, 1963), uma das obras consultadas nesta pesquisa.

    Ao longo da sua vida profissional, George Kelly exerceu o cargo de Presidente das Divises Clnica e Consultiva do American Psychological Association, alm de presidente do American Board of Behavioral Science na Universidade de Brandels, onde permaneceu at falecer em maro de 1967, deixando vrios trabalhos inacabados (HALL et all., 2000). Sua teoria dos construtos Pessoais foi reconhecida pela comunidade cientfica como um grande avano no estudo da personalidade (MAEHR, 1969).

    1.4.2 A Teoria dos Construtos Pessoais

    Segundo Kelly, Um construto a maneira pela qual algumas coisas so interpretadas como sendo parecidas e, no entanto diferentes de outras (KELLY APUD HALL, 2000, p. 334).O homem-cientista busca, ento, representar o mundo exterior da melhor forma possvel, com o intuito de prever eficientemente os eventos nos quais se encontra envolvido. Essa representao feita atravs de padres, criados com o objetivo de reproduzir os diversos aspectos do universo real, sendo estes padres sujeitos a revises sempre que necessrio, visando a uma melhor adequao realidade vivenciada. Esses padres foram chamados por Kelly de construtos, e so os instrumentos atravs dos quais enxergam o mundo e tentam compreend-lo da melhor maneira possvel.

    Segundo a viso de Kelly (1963), os construtos esto estruturados de forma dicotmica; o conceito de bom, por exemplo, est relacionado de maneira indissocivel ao conceito de mau. Ainda nesse sentido, o contexto mnimo para fundamentar um construto a

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    comparao de trs elementos; dois dos quais devem ser parecidos em determinado aspecto e simultaneamente serem diferentes do terceiro num mesmo modo. Os construtos so os elementos bsicos dos sistemas de construo antecipatrios que orientam o comportamento pessoal frente s vrias situaes enfrentadas no cotidiano.

    A eficincia destes sistemas na previso de eventos depende fundamentalmente da coerncia dos diversos construtos edificados pelo indivduo. Os construtos so testados continuamente medida que vo sendo usados em tais previses, sendo passiveis de mudanas conceituais ou de natureza organizacional. O carter dinmico dos construtos pessoais, e consequentemente dos sistemas antecipatrios individuais o que fundamenta a capacidade de aprendizagem continuada dos seres vivos. A respeito do mecanismo de ajuste dos construtos, Kelly (1963, p 9 traduo livre) escreveu: Em geral, o individuo procura melhorar seus construtos incrementando seu repertrio, alterando-os para conseguir melhores adequaes, e agregando-os a construtos ou sistemas supra-ordenados.

    Em sua teoria, Kelly assume que a estrutura do sistema de qualquer indivduo singular, ou seja, cada pessoa constri e organiza de maneira nica seu sistema antecipatrio.

    Neste sentido, o estudo dos construtos e da organizao do sistema de construtos pessoais (a partir da matriz de repertrio) compe uma poderosa ferramenta de anlise, uma vez que evidencia como este sistema foi erigido e/ou modificado. No obstante, esta ferramenta de anlise adequa-se bem s aplicaes educacionais, uma vez que pode ser utilizada pelo educador para investigar o sistema de construtos de seus alunos, dando-lhes condies de direcionar as atividades pedaggicas orientado por este diagnstico (MINGUET, 1998). Nesta pesquisa sero analisados os sistemas de construtos dos alunos, bem como o nvel de articulao destes sistemas, com relao as geometria euclidiana e geometria da natureza, no caso a geometria fractal.

    A Teoria dos Construtos Pessoais foca a personalidade individual e seus processos. Para Kelly a pessoa j naturalmente ativa e tem suas aes direcionadas pelas sucessivas tentativas de antecipar satisfatoriamente os acontecimentos dos quais participa diariamente.

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    A proposta de Kelly era promover uma abordagem sistmica de fatores comumente analisados de forma isolada, como fatores cognitivos, motivacionais e emocionais (CLONNIGER, 1999). Baseado num postulado fundamental, que fornece o embasamento para onze corolrios que abordam diversos pontos relacionados aos processos psicolgicos individuais. Em cada um destes tpicos, Kelly comenta suas propostas e desenvolve suas idias sobre a sua construo da personalidade do indivduo. O postulado fundamental da Teoria dos Construtos Pessoais (TCP) transcrito a seguir: (KELLY APUD CLONINGER, 1999, p.427). O processo de uma pessoa so canalizados psicologicamente pelas maneiras como ela antecipa os acontecimentos.

    Buscando embasar a teoria de Kelly, essa afirmao no tem a pretenso de ser a verdade definitiva, busca interpretar e prever eventos psicolgicos. Como toda teoria cientfica, a TCP se sujeita a testar sua eficincia neste sentido, de modo que a consistncia do seu postulado fundamental est relacionada diretamente sua eficcia (KELLY, 1963). O domnio (psicolgico) dos processos tratados por esta teoria tambm explicitado neste postulado, domnio que abrange e contempla o objeto de estudo deste trabalho, o processo de ensino-aprendizagem de conceitos cientficos, em particular o estudo da geometria da natureza.

    Os onzes corolrios propostos por Kelly (1963, p. 103-104, traduo livre), so apresentados a seguir:

    1. Corolrio de Construo: Uma pessoa antecipa eventos ao interpretar suas reprodues;

    2. Corolrio de Individualidade: As pessoas diferem umas das outras na sua interpretao dos eventos;

    3. Corolrio de Organizao: Cada pessoa desenvolve caracteristicamente um sistema de interpretao que abrange relacionamentos ordinais entre

    construtos, para ajudar na antecipao de eventos; 4. Corolrio da Dicotomia: O sistema de construo de uma pessoa composto de um nmero finito de construtos dicotmicos;

    5. Corolrio de Escolha: Uma pessoa escolhe aquela alternativa, em um construto dicotomizado, pela qual ela antecipa a maior possibilidade de extenso

    e definio de seu sistema;

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    6. Corolrio da Faixa: O construto conveniente apenas para antecipao de um intervalo finito de eventos;

    7. Corolrio da Experincia: O sistema de interpretao de uma pessoa varia conforme ela interpreta sucessivamente as reprodues de eventos;

    8. Corolrio de Modulao: A variao no sistema de interpretao de uma pessoa limitada pela permeabilidade dos construtos dentro daquele intervalo de

    convenincia onde esto as variantes;

    9. Corolrio de Fragmentao: Uma pessoa pode empregar sucessivamente uma variante de subsistemas de interpretao inferencialmente incompatveis entre

    si;

    10. Corolrio de Comunalidade: Na extenso em que uma pessoa emprega uma interpretao da experincia que semelhante empregada por outra pessoa, seus processos psicolgicos so semelhantes aos dela;

    11. Corolrio de Sociabilidade: Na extenso em que uma pessoa interpreta os processos de construo da outra, ela pode desempenhar um papel em um

    processo social envolvendo a outra pessoa;

    Neste trabalho sero usados os corolrios da dicotomia, da faixa (ou do intervalo), da modulao e o corolrio da experincia e, em particular, o ciclo da experincia de Kelly.

    O ciclo de experincia de Kelly envolve cinco fases, que so: a fase da antecipao; a fase do investimento; a fase do encontro; a fase da confirmao ou desconfirmao e a fase da reviso construtiva. As diferentes fases do ciclo de experincia de Kelly sero descritas na seo de metodologia.

    1.4.3 Corolrio da dicotomia

    O colorrio da dicotomia na Teoria dos Construtos Pessoais de Kelly tem o seguinte enunciado: O sistema de construo de um individuo composto de um nmero finito de construtos dicotmicos. (Kelly 1963.).

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    Kelly atravs deste corolrio, prope que os sistemas individuais de construo so compostos em sua totalidade por construtos de natureza dicotmica ou bipolar. Segundo ele (1963, p 105, traduo livre), um construto uma maneira atravs da qual algumas coisas so interpretadas como sendo semelhantes e ainda diferentes de outras.

    O pensamento dicotmico uma ferramenta utilizada pelo homem para melhor estudar e compreender estes sistemas, as atitudes e processos de um individuo, baseiam-se em construtos caracteristicamente dicotmicos, no excluindo a possibilidade do mesmo trabalhar com escalas to graduadas quanto necessrias entre dois construtos. Kelly cita vrios tipos de escalas tais como, hierrquica, abstradas, de acumulao, entre outras.

    1.4.4 Corolrio da faixa

    O corolrio de faixa determina que: um construto conveniente para a antecipao de apenas uma faixa finita de eventos (KELLY, 1970, p. 16 apud BASTOS 1998). O corolrio da faixa (ou do intervalo), diz que de maneira semelhante s teorias cientficas e sistemas de representao em geral, os construtos apresentam um intervalo de convenincia e um foco de convenincia. O intervalo refere-se ao conjunto ou classe de objetos sobre os quais pertinente a classificao segundo aquele construto, enquanto que o foco faz meno ao grupo dentro do intervalo de convenincia para o qual o construto mais relevante (HALL, et al., 2000 apud Medeiros, 2005).

    1.4.5 Corolrio da modulao

    O processo de aprendizagem de um indivduo, compreende mudanas estruturais em seu sistema de construo, envolvendo seus subsistemas em diferentes nveis de organizao e ordenao. A interpretao dos eventos vivenciados pela pessoa leva reestruturao dos sub-sistemas, frisando que estas mudanas nos sub-sistemas so de acordo com suas

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    estruturas, fazendo que o individuo exera domnio sob suas habilidades. Nesta pesquisa ser investigada a forma como a natureza constri suas estruturas geomtricas, atravs de seus processos

    1.4.6 Corolrio da experincia

    O corolrio da experincia nos explica que o sistema de construo de uma pessoa muda medida que ela constri rplicas de eventos e as confronta com as realidades do universo, isto , a pessoa reconstri seus construtos para melhorar suas antecipaes. Este corolrio

    relacionado idia de Kelly sobre aprendizagem. Kelly discute neste corolrio que a aprendizagem no algo que acontece a uma pessoa em determinada ocasio, porm, o resultado das tentativas da pessoa lidar com suas experincias e seus eventos. Kelly define experincia como um ciclo contendo cinco fases: antecipao, investimento, encontro, confirmao ou desconfirmao e reviso construtiva. (KELLY, 1970, p.15 apud BASTOS 1998). Dessa forma, para haver aprendizagem, preciso engajar a pessoa nesse processo complexo, que se inicia com a fase da antecipao, quando a pessoa utilizando os construtos que possui no seu sistema de construo tenta antecipar o evento. Aps essa fase, de acordo com sua capacidade de construir rplica do evento, a pessoa se engaja numa fase de investimento, quando ela se prepara para se encontrar com o evento. No encontro, a pessoa checa suas teorias pessoais, o que conduz confirmao ou desconfirmao das mesmas, seguida pela reviso dos pontos que geraram problemas. Um aspecto importante dessa reviso a construo de novas relaes dentro do sistema de construtos, como, por exemplo, o desenvolvimento de novas estruturas subordinadas a construtos mais gerais j existentes. Esses construtos, contudo, podem ou no aceitar novas estruturas subordinadas uma caracterstica chamada permeabilidade por Kelly. Essa limitao mudana tratada pelo corolrio da modulao. Segundo Kelly A variao no sistema de construo de uma pessoa limitado pela permeabilidade dos construtos em cujas faixas de convenincia se encontram as variantes (KELLY, 1970, p. 19 apud BASTOS, 1998).

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    1.4.7 Ciclo da Experincia de Kelly

    O ciclo de experincia de Kelly envolve cinco fases, que so: a fase da antecipao; a fase do investimento; a fase do encontro; a fase da confirmao ou desconfirmao e a fase da reviso construtiva.

    A fase da antecipao compreende a previso dos eventos a serem vivenciados pelo indivduo, de maneira que ele possa observar o que est para acontecer. Nessa fase o indivduo constri as primeiras replicas dos processos que foram apresentados, buscando um prognstico inicial dos eventos subseqentes, de acordo com o seu sistema de construo de conhecimento. A segunda etapa a fase do investimento na qual o individuo deve procurar envolver-se com os eventos a serem vivenciados durante o processo da sua aprendizagem. Na fase do encontro estabelecida a interao entre o indivduo e os eventos vivenciados. O produto destas interaes tem a capacidade de transformar o indivduo e sua forma de construir os eventos vivenciados (KELLY, 1977). Aps a experimentao dos eventos vivenciados pelo individuo (encontro), este deve ser capaz de confirmao ou refutao de suas observaes, frente aos eventos vivenciados por ele. Esta fase chamada confirmao ou desconfirmao, podendo ou no o indivduo criar novas construes.

    Chamado de reviso construtiva, a quinta fase do ciclo da experincia de Kelly, permite ao individuo a concluso deste, sendo contemplada a unidade bsica de aprendizagem definida por Kelly. Nesta fase do ciclo o indivduo passa a reconhecer uma significativa mudana em seu sistema de construes, se conscientizado que seu crescimento cognitivo foi promovido, graas experincia e a aprendizagem, segue uma ilustrao mostrando o ciclo da experincia de Kelly.

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    ANTECIPAO do

    acontecimento

    INVESTIMENTO no resultado

    ENCONTRO com o

    acontecimento

    CONFIRMAOOU REFUTAO

    da antecipao hiptese

    REVISO CONSTRUTIVA

    do sistema de construtos

    Fonte: Cloninger, 1999

    1.4.8 O Teste da Matriz de Repertrios (Rep-Teste)

    George Kelly desenvolveu o Teste da Matriz de Repertrios (Rep-teste), como tcnica para investigar os sistemas antecipatrios de seus pacientes, com o intuito de explorar os seus construtos e suas relaes com diversos elementos. Embora o desenvolvimento da tcnica tenha acontecido priorizando aplicaes clnicas, estudos mostram que este teste pode ser utilizado para diagnosticar alteraes nos sistemas antecipatrios decorrentes de experincias educacionais. Neste trabalho de pesquisa, este teste ser utilizado, com o propsito de investigar os sistemas antecipatrios dos alunos. Sero explorados os construtos utilizados para fazer referncia a propriedades e caractersticas da Geometria

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    Fractal, alm do nvel de articulao estabelecida entre estes construtos. A verso da matriz utilizada na pesquisa ser a proposta por Bannister e Mair(1968)(apud MINGUET, 1998). Realizado o teste, foram apresentadas aos alunos trs estruturas geradas pela natureza e trs estruturas construdas pelo homem, tais como: rvores, arborizaes vasculares, corais, edifcios, cadeiras, veculos. O pesquisador escolheu trs dessas estruturas criadas pelo homem ou pela natureza e solicitando que o aluno cite caractersticas geomtricas que sejam comuns a duas dessas estruturas e que no pertenam terceira estrutura.

    As formas geomtricas euclidianas e fractais que foram sero usadas como plos, foram desenvolvidas, a partir das atividades propostas nas atividades com material concreto e o programa Cabri-Gomtre II. Dessa forma, foram estabelecidos dois plos dicotmicos relacionados a um construto. A seguir solicitado que o aluno categorize as formas geomtricas construdas pela natureza ou pelo homem com base nos dois plos estabelecidos. Para isto deve-se construir uma escala numerada entre 1 e 5, sendo a pontuao 1 referente a duas formas geomtricas mais semelhantes e a pontuao 5 a forma geomtrica que mais diferiu das duas primeiras. O procedimento foi repetido diversas vezes para vrias trades de formas geomtricas criadas pelo homem ou pela natureza at que se obteve um razovel nmero de construtos.

    Com o objetivo de esclarecer o procedimento da matriz de repertrio ser dado um exemplo de uma matriz de repertrio, construda a partir de uma interveno com mestrandos do curso de Ensino de Cincias da UFRPE da rea de biologia, onde se questionava o que seria importante na formao continuada de professores de cincias.

    A anlise do quadro adiante mostra que o conceito de formao continuada para os estudantes da rea de biologia envolve a capacitao, a especializao, o mestrado, participao em congresso e a publicao de artigos cientficos. Alm disso, a matriz de repertrio tambm mostra a importncia da participao do sujeito no seu processo de formao continuada. Observe-se que numa escala de 1 (mximo) a 5 (mnimo) o entrevistado atribuiu grau 1 (mximo) a participao do sujeito durante a formao do indivduo nos cursos de capacitao, especializao e mestrado. Para participao em Congresso o grau atribudo foi 3, um valor mais prximo do mnimo (grau 5),

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    possivelmente porque ele acha que participao do sujeito neste tipo de formao menor que durante realizao de um curso formal.

    Na atividade publicao de artigos cientficos o entrevistado atribuiu grau 2, um valor mais prximo do mximo (grau 1), mostrando que ele reconhece importncia do sujeito nesta atividade de formao. Observe que alm dos plos dicotmicos sujeito ativo e sujeito passivo foram criados pelo entrevistado vrios outros plos dicotmicos.

    Portanto, o conceito de formao continuada para os entrevistados envolve no s os diferentes nveis de cursos realizados pelo professor em sua formao continuada, porm tambm a participao do professor em formao durante todo o processo.

    1.5 Cabri-Gomtre

    O software Cabri-Gomtre, a abreviatura da expresso CAHIER DE BROUILLON INTERACTIF (Caderno de rascunho interativo). Idealizado por Jean-Marie Laborde e Franck Bellemain no Institute DInformatique et Mathematiques Aplliques de Grenoble na Universidade Joseph em Grenoble, Frana. O Cabri-Gomtre representado no BRASIL

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    desde 1992 pela PROEM (Programas de Estudos e Pesquisas no Ensino da Matemtica) na PUC-SP. Ele tem o diferencial de possibilitar a interao do educando no que se refere manipulao direta das figuras geradas via microcomputador.

    1.5.1 Caractersticas do Cabri-Gomtre

    Geometria Dinmica - Figura com movimento mantendo as suas propriedades

    Construtivista - O aluno cria as suas atividades construindo seu conhecimento

    Software Aberto - O professor cria as atividades como queira

    Trabalhar Conceitos - Construes de figuras geomtricas

    Explorar Propriedades dos Objetos e suas Relaes - Comprovar Experimentalmente

    Formulao de Hipteses e Conjecturas Histricos das Construes Criao de Macros

    O Cabri est disponvel em mais de 40 pases e em 24 idiomas diferentes e pode ser considerado um micro mundo da geometria dinmica. Que em termos, se prope a realizar construes da geometria euclidiana, que eram feitas com auxilio de rgua e compasso.

    Uma das reas que vem recebendo ateno especial no ensino da matemtica a geometria. Aps um perodo em que o seu ensino foi praticamente abandonado, tm se procurado esclarecer seus objetivos, os principais obstculos para que estes sejam atingidos e elaborar novas estratgias para serem aplicadas em sala de aula.

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    A partir deste desafio, foram desenvolvidos os softwares conhecidos como ambientes de Geometria Dinmica, dentre os quais se destaca o Cabri-Geometre II que utilizamos nesta pesquisa. O Cabri-Geometre um programa que permite construir e explorar de forma interativa os objetos do universo da geometria elementar em uma linguagem muito prxima a do universo lpis e papel. O Cabri funciona como um caderno interativo. Partindo desta concepo, orientamos os alunos a realizarem etapas distintas a fim de descobrirem propriedades e regularidades geomtricas. A primeira etapa a construo geomtrica, no Cabri, da situao a ser analisada, em seguida, utilizando todo o dinamismo do software, os alunos devem explorar a figura para que ento possam formar uma conjectura (mentalmente ou no papel), a qual vai se procurar verificar sobre diferentes configuraes e, por fim, formalmente, sem o uso do computador, demonstrar as concluses obtidas.

    Inicialmente, faremos uma breve apresentao do software Cabri-Geometre II a respeito dos itens constantes no menu. Em seguida, realizaremos atividades construdas de acordo com a perspectiva descrita acima que visam propiciar o raciocnio matemtico atravs de construes envolvendo simetria axial, construes geomtricas euclidianas e fractal.

    O software Cabri-Gomtre apresentado com menus e barras de rolagem que ilustraremos a seguir algumas das funes bsicas do Cabri.

    1.5.2 Conhecendo O Cabri Gomtre II

    1.5.2.1 Barras de ferramentas

    O programa abre-se numa tela onde, no topo, esto apresentados o menu e a barra de

    ferramentas, com os botes que so chamados de caixas de ferramentas.

    Clicando e mantendo pressionado o boto para que voc veja as opes em cada um. Para selecionar uma das opes, basta ir com o ponteiro opo (mantendo pressionado o boto) e soltar o clique.

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    Ponteiro Pontos

    Retas Curvas

    Construir Transformar

    Medir

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    Exibir

    Desenhar

    FORMAS DO PONTEIRO

    O ponteiro ( ) assume algumas formas de acordo com tarefa:

    ponteiro: para selecionar as opes

    lpis: quando o ponteiro movido para a tela serve para desenhar. mo apontando: quando aparece mensagens do tipo este ponto, por este ponto, nesta reta, etc.

    mo cumprimentando: quando pressionado o mouse, a mo apontando se transforma em mo cumprimentando serve para mover. uma lupa: quando tiver mais de um objeto a marcar a mo apontando transforma-se numa lupa com a mensagem Qual objeto?

    Alguns comandos freqentemente utilizados so descritos a seguir:

    APAGANDO TUDO: menu editar, escolhendo a opo selecionar tudo, ficar tudo piscando, aperte a tecla delete.

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    APAGANDO APENAS UMA FIGURA: apertando o boto ponteiros, levando o cursor figura que deseja apagar, aparecer uma mensagem especificando a figura; clicando a figura ficar piscando; aperte a tecla delete. MARCANDO NGULO: pressionando o boto exibir