al profmat cap01 introducao algebra linear
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capitulo 1 - introducao a algebra linear; Hefez e FernandezTRANSCRIPT
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Livro: Introdução à Álgebra LinearAutores: Abramo Hefez
Cecília de Souza Fernandez
Capítulo 1: Sistemas Lineares e Matrizes
Sumário
1 O que é Álgebra Linear? . . . . . . . . . . . . . . . 2
1.1 Corpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
1.2 Espaços Vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
1.3 Sistemas de Equações Lineares . . . . . . . . . . . 9
2 Matrizes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2.1 A De�nição de Matriz . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2.2 Operações com Matrizes . . . . . . . . . . . . . . . 16
2.3 Matriz Inversa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
2 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
1 O que é Álgebra Linear?
Os espaços em que trabalharemos são os Rn, com n ≥ 2, isto é, o produto
cartesiano de n cópias da reta real R. Para n ≥ 4, este espaço generaliza
o espaço R2 dos vetores do plano e o espaço R3 dos vetores no espaço. A
diferença crucial entre os casos n = 2 e n = 3 e os casos em que n ≥ 4
é que, para estes últimos, não se dispõe de uma representação geométrica.
O fato não diminui a importância desses espaços, pois basta pensar que o
R4 é o espaço-tempo da Física, em que os pontos são quaternos (x, y, z, t),
com as três primeiras coordenadas representando a posição no espaço de uma
partícula ideal e a última representando o instante t em que esta partícula
ocupa tal posição. Por não existir uma representação geométrica para os
pontos de Rn com n ≥ 4, seremos obrigados a tratá-los algebricamente, sem
o recurso da visualização geométrica, tão fundamental em R2 e R3.
Portanto, trataremos os elementos de Rn como vetores, onde a soma de
dois vetores (x1, x2, . . . , xn) e (y1, y2, . . . , yn) é dada por
(x1, x2, . . . , xn) + (y1, y2, . . . , yn) = (x1 + y1, x2 + y2, . . . , xn + yn),
e a multiplicação do vetor (x1, x2, . . . , xn) pelo número real a, chamado de
escalar, é de�nida por
a(x1, x2, . . . , xn) = (ax1, ax2, . . . , axn).
Os espaços Rn são utilizados de modo essencial em quase todos os ramos
do conhecimento e, por este motivo, são estudados em Matemática sob os
mais variados pontos de vista e com as mais diversas estruturas. Por exem-
plo, no Cálculo Diferencial, são considerados como espaços normados; em
Geometria, como espaços com produto interno.
A estrutura de Rn estudada em Álgebra Linear é a induzida pela estrutura
de corpo da reta real R. Essa é a estrutura mínima apropriada para se estudar
sistemas de equações lineares com várias incógnitas. Além disso, é aquela
sobre a qual se constroem o Cálculo Diferencial e a Geometria Diferencial,
entre outros.
1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? 3
Como a estrutura de corpo de R desempenhará papel fundamental, vamos
de�nir formalmente este conceito.
1.1 Corpos
Um conjunto K será chamado de corpo se for munido de uma operação
de adição (+) e uma operação de multiplicação (×), veri�cando as condições
a seguir.
A1 A adição é associativa:
(a+ b) + c = a+ (b+ c), para todos a, b, c ∈ K.
A2 A adição é comutativa:
a+ b = b+ a, para todos a, b ∈ K.
A3 A adição possui elemento neutro:
existe 0 ∈ K, tal que a+ 0 = a, para todo a ∈ K.
A4 A adição possui simétricos:
para todo a ∈ K, existe −a ∈ K tal que a+ (−a) = 0.
M1 A multiplicação é associativa:
(a× b)× c = a× (b× c), para todos a, b, c ∈ K.
M2 A multiplicação é comutativa:
a× b = b× a, para todos a, b ∈ K.
M3 A multiplicação possui elemento neutro:
existe 1 ∈ K \ {0}, tal que a× 1 = a, para todo a ∈ K.
M4 A multiplicação possui inversos:
para todo a ∈ K \ {0}, existe a−1 ∈ K tal que a× a−1 = 1.
AM A multiplicação é distributiva com relação à adição:
a× (b+ c) = a× b+ a× c, para todos a, b, c ∈ K.
Portanto, são corpos os conjuntos Q, R e C, com as suas respectivas
adições e multiplicações.
A operação de multiplicação em um corpo muitas vezes é denotada por
(·), escrevendo a · b, ou mesmo ab, no lugar de a× b, notação que adotaremos
ao longo deste livro.
4 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
Existem exemplos de corpos que à primeira vista parecem exóticos, como
o corpo de Galois1 F2, que consiste dos dois elementos 0 e 1 com as seguintes
operações:
+ 0 1
0 0 1
1 1 0
× 0 1
0 0 0
1 0 1
Note que este é o corpo com o menor número possível de elementos,
pois todo corpo deve possuir os dois elementos distintos 0 e 1. Apesar de
parecerem apenas curiosidades, os corpos com um número �nito de elementos
têm as mais variadas aplicações em quase toda a Matemática e são essenciais
na tecnologia e na computação.
1.2 Espaços Vetoriais
Os espaços Rn, por serem constituídos por vetores que podem ser soma-
dos e multiplicados por escalares, como vimos antes, são chamados espaços
vetoriais.
Como os espaços vetoriais são os objetos principais de estudo da Álgebra
Linear, vamos de�ni-los formalmente a seguir.
Um conjunto V será dito um espaço vetorial sobre um corpo K, se possui
uma adição (+) com as mesmas propriedades da adição em um corpo; ou
seja,
A1 A adição é associativa:
(u+ v) + w = u+ (v + w), para todos u, v, w ∈ V .
A2 A adição é comutativa:
u+ v = v + u, para todos u, v ∈ V .
A3 A adição possui elemento neutro (elemento zero):
existe 0 ∈ V , tal que v + 0 = v, para todo v ∈ V .
1Em homenagem a Évariste Galois (França, 1811-1832), considerado um dos grandes
gênios da Matemática.
1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? 5
A4 A adição possui simétricos:
para todo v ∈ V , existe −v ∈ V tal que v + (−v) = 0.
E além disso, existe uma operação chamada de multiplicação por escalar, que
associa a um elemento a ∈ K e a um elemento v ∈ V , um elemento av ∈ V ,
tal que
ME1 a(u+ v) = au+ av, para todos a ∈ K e u, v ∈ V .
ME2 (a1 + a2)v = a1v + a2v, para todos a1, a2 ∈ K e v ∈ V .
ME3 (a1a2)v = a1(a2v), para todos a1, a2 ∈ K e v ∈ V .
ME4 1v = v, para todo v ∈ V .
Os elementos de V serão chamados de vetores e os elementos de K de
escalares. Assim, o elemento 0 de V será chamado de vetor nulo e o elemento
−v de vetor oposto de v.
O primeiro matemático a dar uma de�nição abstrata para um espaço
vetorial foi Giuseppe Peano (Itália, 1858 - 1932) em seu livro Calcolo Geo-
metrico, de 1888. No Capítulo IX, Peano dá uma de�nição do que ele chama
de um sistema linear. Para Peano, um sistema linear consistia de quantidades
com operações de adição e multiplicação por escalar. A adição deveria satis-
fazer as leis comutativa e associativa, enquanto a multiplicação por escalar
deveria satisfazer duas leis distributivas, uma lei associativa e a lei de que
1 · v = v para toda quantidade v. Além disso, Peano incluiu como parte de
seu sistema de axiomas a existência de uma quantidade 0 (zero) satisfazendo
v + 0 = v, para todo v, assim como v + (−1)v = 0 para todo v. Peano
também de�niu a dimensão de um sistema linear como o máximo número de
quantidades linearmente independentes do sistema (veja esta noção na Seção
2 do Capítulo 3). Peano veri�cou que o conjunto das funções polinomiais em
uma variável forma um sistema linear, mas não existia um tal número má-
ximo de quantidades linearmente independentes, portanto, a dimensão deste
sistema deveria ser in�nito.
O fato a seguir decorre da de�nição de espaço vetorial. Para a ∈ K e
6 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
v ∈ V , tem-se que
a = 0 ou v = 0 ⇐⇒ av = 0.
De fato, sejam a ∈ K e 0 ∈ V . Como 0 + 0 = 0, pela propriedade ME1,
segue-se que
a 0 = a(0 + 0) = a 0 + a 0.
Somando o simétrico −a 0 de a 0 a ambos os lados da igualdade acima e
utilizando as propriedades A4, A1 e A3, temos que
0 = a 0 + (−a 0) = (a 0 + a 0) + (−a 0) = a 0 + [a 0 + (−a 0)] = a 0 + 0 = a 0.
De modo semelhante, mostra-se (faça-o) que para 0 ∈ K e v ∈ V tem-se
0 v = 0, onde o elemento 0 da direita é o elemento zero de V .
Reciprocamente, suponhamos que av = 0 e a 6= 0, então, multiplicando
ambos os lados da igualdade acima pelo escalar a−1, temos que
0 = a−10 = a−1(av) = (a−1a)v = 1v = v.
Dois vetores u e v em um espaço vetorial V serão ditos colineares, se
existir um elemento a em K tal que v = au. Portanto, são colineares os
vetores u e au, para todo a ∈ K. Note que o vetor 0 é colinear com qualquer
vetor v, pois 0 = 0v.
É um exercício fácil mostrar que Rn é um espaço vetorial sobre o corpo
R, com as operações de adição de vetores e a multiplicação por escalares
que de�nimos anteriormente, onde o elemento zero é o vetor (0, 0, . . . , 0) e o
simétrico de (x1, x2, . . . , xn) é o vetor
−(x1, x2, . . . , xn) = (−x1,−x2, . . . ,−xn).
Observe que não há nada de especial sobre os reais, além de sua estrutura
de corpo para que Rn seja um espaço vetorial sobre R. Mais geralmente,
dado um corpo qualquer K, o espaço Kn é um espaço vetorial sobre K, com
1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? 7
operações semelhantes às de adição de vetores e de multiplicação de vetores
por escalares que de�nimos no caso em que K = R.Por exemplo, os espaços vetoriais Fn
2 sobre F2, por mais inócuos que
possam parecer, são de extrema utilidade em várias aplicações, dentre elas
na construção de códigos corretores de erros (veja a referência [3] para maiores
detalhes sobre esta teoria).
Outros exemplos importantes de espaços vetoriais são os espaços R e Csobre o corpo Q e o espaço C sobre o corpo R.
Como sucede com frequência em Matemática, ao introduzir um conceito
para lidar com determinado problema, cria-se um instrumento que muitas
vezes transcende o problema inicial e se constitui em um conceito central em
vários outros contextos. Isto ocorreu com a noção de espaço vetorial, que
inicialmente foi introduzida para tratar de alguns tipos de problemas em Rn,
como a resolução de sistemas de equações lineares cuja discussão iniciaremos
na próxima subseção, e se desenvolveu em uma teoria com vida própria.
Pode-se sinteticamente dizer que a Álgebra Linear é a parte da Matemática
que se dedica ao estudo dos espaços vetoriais e de certas funções entre esses
espaços, chamadas de transformações lineares.
Embora muitas das ferramentas básicas da Álgebra Linear, particular-
mente as que estão relacionadas com sistemas lineares, datem da antigui-
dade, o assunto começou a tomar sua forma atual em meados dos século
XIX. A partir desta época, muitas noções estudadas em séculos anteriores
foram abstraídas e muitos métodos generalizados.
A Álgebra Linear tem várias aplicações fora da Matemática. Por exemplo,
citamos a teoria da relatividade e a mecânica quântica na Física e a teoria
de análise de regressão na Estatística.
A seguir, daremos alguns exemplos diferentes de Rn para ilustrar situações
onde aparecem os espaços vetoriais e que, muitas vezes, quando tratadas
dessa forma ganham clareza.
Exemplo 1 O conjunto das funções de um conjunto não vazio A em Rforma um espaço vetorial sobre R, onde a soma é a soma usual de funções
8 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
com valores reais
(f + g)(x) = f(x) + g(x), para todo x ∈ A,
e a multiplicação de uma função f por um escalar a ∈ R é de�nida como
sendo
(a f)(x) = a f(x), para todo x ∈ A.
Em particular, se I = [a, b] é um intervalo em R, sabe-se do Cálculo Dife-
rencial e Integral que o conjunto das funções contínuas, bem como o conjunto
das funções integráveis, de I em R, são espaços vetoriais sobre R.
Exemplo 2 De acordo com o Exemplo 1, o conjunto S das sequências de
números reais, isto é, o conjunto das funções de N \ {0} em R é um espaço
vetorial sobre R. É fácil veri�car (leitor, faça-o) que o conjunto R(a, b) dassequências (un) em S que satisfazem a recorrência
un+1 = aun + bun−1, n ≥ 2,
onde a e b são dois números reais �xados, é um espaço vetorial sobre R. Emparticular, o conjunto R(1, 1), que contém a sequência de Fibonacci2 (aquela
para a qual u1 = u2 = 1), é um espaço vetorial. Veremos no Capítulo 5
como esta informação nos ajudará a achar todas as sequências em R(1, 1),determinando suas fórmulas fechadas.
Exemplo 3 (Peano) O conjunto K[x] dos polinômios com coe�cientes em
um corpo K forma um espaço vetorial sobre K. Para n ∈ N, os conjuntos
K[x]n = {p(x) ∈ K[x] ; grau(p(x)) ≤ n} ∪ {0}
também são espaços vetoriais sobre K. Em particular, o conjunto
R[x]2 = {a0 + a1x+ a2x2; a0, a1, a2 ∈ R}
é um espaço vetorial sobre R.2Apelido de Leonardo de Pisa (Itália, ∼ 1170 - ∼ 1250). Foi o primeiro grande mate-
mático europeu da Idade Média.
1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? 9
1.3 Sistemas de Equações Lineares
Desde a antiguidade, em diversas áreas do conhecimento, muitos pro-
blemas são modelados matematicamente por sistemas de equações lineares.
Damos a seguir um exemplo de sistema de equações lineares:{x+ y = 36
x− y = 2,(1)
onde se subentende que estamos buscando dois números reais cuja soma
vale 36 e cuja diferença vale 2. Portanto, as soluções procuradas podem ser
representadas por pares de números reais (a, b) tais que, se substituírmos x
por a e y por b, nas equações, elas se tornam igualdades de fato. Por exemplo,
o par (x, y) = (19, 17) é uma solução, pois obtemos as igualdades:{19 + 17 = 36
19− 17 = 2.
Os sistemas com duas equações lineares, como o acima, já eram consi-
derados pelos babilônios por volta de 1800 a.C. e resolvidos por um método
que chamamos hoje de método de eliminação gaussiana3.
Por exemplo, para resolver o sistema de equações (1), ao somarmos a
segunda equação à primeira, o transformamos no �sistema equivalente�,{2x = 38
x− y = 2,
que seguimos transformando até obtermos um sistema onde as soluções são
trivialmente encontradas:{2x = 38
x− y = 2⇔
{x = 19
x− y = 2⇔
{x = 19
x− y − x = 2− 19⇔
{x = 19
y = 17.
3Em homenagem a Carl Friedrich Gauss (Alemanha, 1777 - 1855), considerado um dos
maiores matemáticos de todos os tempos.
10 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
Esse método será generalizado e sistematizado para sistemas de equações
lineares com m equações e n incógnitas do tipoa11x1 + a12x2 + · · ·+ a1nxn = b1
a21x1 + a22x2 + · · ·+ a2nxn = b2...
am1x1 + am2x2 + · · ·+ amnxn = bm ,
(2)
onde os aij's e os bi's, para 1 ≤ i ≤ m e 1 ≤ j ≤ n, são números reais dados,
ou, mais geralmente, elementos de um corpo K dado.
Seja
S = {(c1, c2, . . . , cn) ∈ Rn ; ai1c1 + ai2c2 + · · ·+ aincn = bi, 1 ≤ i ≤ m}.
Esse subconjunto de Rn é chamado de conjunto solução do sistema (2). É
precisamente este conjunto que queremos determinar ou descrever o mais
explicitamente possível.
Note que para resolver o sistema (1), do exemplo acima, o modi�camos
gradativamente, por meio de uma sequência de transformações elementares,
em um sistema mais simples de resolver, onde por transformação elementar
de um sistema entendemos uma das seguintes transformações:
1) Trocar a posição relativa de duas equações do sistema;
2) Trocar uma equação pela soma membro a membro da própria equação
com um múltiplo de outra;
3) Trocar uma equação dada por um de seus múltiplos (i.e., a equação obtida
multiplicando ambos os membros da equação dada por um número real não
nulo).
Diremos que dois sistemas de equações lineares são sistemas equivalentes,
se pudermos obter um sistema do outro a partir de uma sequência �nita de
transformações elementares.
Esta relação entre sistemas é efetivamente uma relação de equivalência.
De fato, ela é claramente re�exiva, pois basta multiplicar uma das equações
1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? 11
do sistema por 1; é transitiva, pois basta concatenar uma sequência de trans-
formações elementares com uma outra; e é simétrica, pois podemos desfazer
uma transformação elementar com outra.
Assim, é imediato veri�car que:
Sistemas de equações lineares equivalentes possuem mesmo conjunto solução.
Dentre os sistemas de equações lineares, ocupam lugar de destaque os
sistemas homogêneos, ou seja, aqueles sistemas como em (2), porém com os
bi's todos nulos: a11x1 + a12x2 + · · ·+ a1nxn = 0
a21x1 + a22x2 + · · ·+ a2nxn = 0...
am1x1 + am2x2 + · · ·+ amnxn = 0.
(3)
Esses sistemas possuem peculiaridades não compartilhadas pelos sistemas
mais gerais. Por exemplo, o vetor (0, 0, . . . , 0) pertence ao conjunto Sh de
soluções do sistema. Além disso, se os vetores u = (c1, c2, . . . , cn) e u′ =
(c′1, c′2, . . . , c
′n) são soluções do sistema, e se a ∈ R, então os vetores
u+ u′ = (c1 + c′1, c2 + c′2, . . . , cn + c′n) e au = (ac1, ac2, . . . , acn)
também são soluções do sistema (3) (leitor, veri�que).
Assim, resulta que o espaço Sh das soluções do sistema (3) é um espaço
vetorial sobre R De fato, as propriedades A1 e A2 da de�nição são satisfeitas
para todos os vetores de Rn e em particular para os de Sh. Por outro lado,
(0, 0, . . . , 0) ∈ Sh e se (c1, c2, . . . , cn) ∈ Sh, então
−1(c1, c2, . . . , cn) = (−c1,−c2, . . . ,−cn) ∈ Sh,
o que mostra que a adição em Sh possui também as propriedades A3 e A4.
Além disso, as propriedades ME1�ME4 da multiplicação por escalar são fa-
cilmente veri�cadas para Sh.
Note que o que há de essencial em um sistema de equações lineares
(2) são os coe�cientes das equações que o formam além dos números que
12 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
compõem os segundos membros das equações. Consideremos os vetores
(ai1, ai2, . . . , ain, bi) de Rn+1 que representam os coe�cientes das equações do
sistema (2) acrescidos dos segundos membros e os organizemos como linhas
de uma tabela, chamada de matriz ampliada do sistema (2), como segue:a11 a12 · · · a1n b1
a21 a22 . . . a2n b2...
......
...
am1 am2 · · · amn bm
. (4)
Quando o sistema de equações é homogêneo, a ele associamos a matriza11 a12 · · · a1n
a21 a22 . . . a2n...
......
am1 am2 · · · amn
,
eliminando a coluna de zeros da direita na matriz (4).
As matrizes surgiram por volta do ano 200 a.C. com os chineses, motiva-
dos pelo interesse em calcular soluções de sistemas com mais de quatro equa-
ções lineares. De fato, no Capítulo 8 do texto intitulado Jiuzhang suanshu, de
autor desconhecido, que signi�ca �Nove capítulos sobre a Arte Matemática" ,
�ca claro que o procedimento de resolução de sistemas lineares usado pelos
chineses é semelhante ao método de escalonamento, que discutiremos ainda
neste capítulo, e é apresentado na forma de matrizes. Cabe observar que os
chineses só consideravam sistemas lineares com o mesmo número de equa-
ções e incógnitas, não constando em seus escritos o motivo desses sistemas
produzirem sempre uma única solução e como o algoritmo chinês funcionava.
Problemas
1.1 Veri�que que o conjunto das funções de um conjunto não vazio A nos
reais é um espaço vetorial sobre R, com as operações de�nidas no Exemplo
1. O QUE É ÁLGEBRA LINEAR? 13
1. Veri�que também que, para cada par de números reais (a, b), o conjunto
das recorrências R(a, b), de�nido no Exemplo 2, é um espaço vetorial sobre
R.
1.2 Seja v um elemento não nulo de um espaço vetorial V sobre R. Mostre
que é injetora a função
R → V
t 7→ tv.
1.3 Sejam v1 e v2 elementos de um espaço vetorial V sobre R. Mostre que a
função
R2 → V
(a1, a2) 7→ a1v1 + a2v2
é injetora se, e somente se, v1 e v2 não são colineares.
1.4 Diga, em cada caso, por que o conjunto com as operações indicadas não
satisfaz à de�nição de espaço vetorial, onde a ∈ R.
a) R2, com as operações:
(x, y) + (x′, y′) = (x+ x′, y + y′) e a(x, y) = (3ax, 3ay).
b) R2, com as operações:
(x, y) + (x′, y′) = (xx′, yy′) e a(x, y) = (ax, 0).
c) R3, com as operações:
(x, y, z) + (x′, y′, z′) = (0, 0, 0) e a(x, y, z) = (ax, ay, az).
1.5 Sejam U e W dois espaços vetoriais sobre um corpo K. Considere o
produto cartesiano V = U ×W desses dois conjuntos. De�na as seguintes
operações em V :
(u1, w1) + (u2, w2) = (u1 + u2, w1 + w2) e a(u1, w1) = (au1, aw1),
onde u1, u2 ∈ U , w1, w2 ∈ W e a ∈ K. Mostre que V com as operações de
adição e de mutiplicação por escalar, acima de�nidas, é um espaço vetorial
sobre K. Este espaço vetorial é chamado de espaço produto de U por W .
14 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
2 Matrizes
As matrizes são ferramentas básicas da Álgebra Linear, pois além de for-
necerem meios para a resolução dos sistemas de equações lineares, elas tam-
bém representarão as transformações lineares entre espaços vetoriais, como
veremos no Capítulo 6.
2.1 A De�nição de Matriz
Dados m e n em N \ {0}, de�nimos uma matriz real de ordem m por n,
ou simplesmente uma matriz m por n (escreve-se m× n), como uma tabela
formada por elementos de R distribuídos em m linhas e n colunas. Estes
elementos de R são chamados entradas da matriz4. Por exemplo, a matriz
[3] é uma matriz 1× 1, ao passo que[2 1 0
−1 −2 4
]
é uma matriz 2×3. As entradas da primeira linha da matriz são dadas pelos
números reais 2, 1 e 0 e as entradas da segunda linha da matriz são dadas
pelos números reais −1, −2 e 4.
É usual indicarmos as entradas de uma matriz arbitrária A pelos sím-
bolos Aij, ou ainda aij , onde os índices indicam, nessa ordem, a linha e a
coluna onde o elemento se encontra. Assim, uma matriz m×n é usualmente
representada por
A =
a11 a12 . . . a1n
a21 a22 . . . a2n...
......
am1 am2 . . . amn
,
4As entradas de uma matriz não precisam ser necessariamente números reais, podem
ser números complexos ou, mais geralmente, elementos de um corpo K.
2. MATRIZES 15
ou por A = [aij]m×n , ou simplesmente por A = [aij], quando a ordem da
matriz estiver subentendida. O símbolo M(m,n) denota o conjunto das
matrizes m× n.
Dependendo dos valores de m e n, uma matriz m × n recebe um nome
especial. De fato, toda matriz 1× n é chamada de uma matriz linha e toda
matriz m×1 é chamada de uma matriz coluna. Uma matriz n×n é chamada
de matriz quadrada de ordem n. Por exemplo, a matriz[1 −3 1 0 4
]é uma matriz linha de ordem 1× 5 e a matriz2 −1 0
0 1 2
3 1 4
é uma matriz quadrada de ordem 3.
Se A = [aij] é uma matriz quadrada de ordem n, as entradas aii , com
1 ≤ i ≤ n, formam a diagonal principal de A.
Uma matriz diagonal de ordem n é uma matriz quadrada de ordem n em
que os elementos que não pertencem à diagonal principal são iguais a zero:a11 0 . . . 0
0 a22 . . . 0...
......
0 0 . . . ann
.
A matriz diagonal de ordem n cujas entradas da diagonal principal são
iguais ao número real 1, 1 0 . . . 0
0 1 . . . 0...
......
0 0 . . . 1
,
é chamada matriz identidade de ordem n e denotada usualmente por In. Em
alguns casos, representaremos por simplicidade In apenas por I.
16 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
Uma matriz triangular superior de ordem n é uma matriz quadrada de
ordem n em que todos os elementos abaixo da diagonal principal são iguais
a zero: a11 a12 . . . a1n
0 a22 . . . a2n...
......
0 0 . . . ann
.
Portanto, uma matriz quadrada A = [aij] de ordem n é triangular superior
se aij = 0 sempre que i > j.
Analogamente, uma matriz triangular inferior de ordem n é uma matriz
quadrada de ordem n em que todos os elementos acima da diagonal principal
são iguais a zero: a11 0 . . . 0
a21 a22 . . . 0...
......
an1 an2 . . . ann
.
Portanto, uma matriz quadrada A = [aij] de ordem n é triangular inferior se
aij = 0 sempre que i < j.
Uma matriz m × n cujas entradas são todas iguais a zero é chamada de
uma matriz nula. Por exemplo, a matriz[0 0 0
0 0 0
]
é uma matriz nula de ordem 2× 3.
2.2 Operações com Matrizes
Dizemos que duas matrizes A = [aij]m×n e B = [bij]m×n, de mesma ordem,
são iguais, escrevendo A = B, quando aij = bij para todo 1 ≤ i ≤ m e para
todo 1 ≤ j ≤ n.
2. MATRIZES 17
Por exemplo, se x e y denotam números reais, temos que as matrizes[x 0
1 y
]e
[−1 0
1 2
]são iguais quando x = −1 e y = 2.
De�nimos a seguir uma operação de adição no conjunto M(m,n) das
matrizes m× n.
Se A = [aij] e B = [bij] são duas matrizes de mesma ordem m × n, a
soma de A e B, denotada A + B, é a matriz C = [cij] de ordem m× n tal
que cij = aij + bij para todo 1 ≤ i ≤ m e para todo 1 ≤ j ≤ n.
Por exemplo,[2 3 −10 −2 1
]+
[−2 −3 1
0 2 −1
]=
[0 0 0
0 0 0
].
Dada uma matriz A = [aij], de�ne-se a matriz oposta de A, como a matriz
−A = [−aij].A adição de matrizes tem propriedades semelhantes à adição nos números
reais, ou à adição de elementos em espaços vetoriais, como mostra o resultado
a seguir.
Proposição 1.2.1. Se A, B e C são matrizes de mesma ordem, então :
(i) A+ (B + C) = (A+B) + C (associatividade da adição);
(ii) A+B = B + A (comutatividade da adição);
(iii) A+ 0 = A, onde 0 denota a matriz nula m× n (elemento neutro);
(iv) A+ (−A) = 0.
Demonstração As propriedades acima decorrem diretamente das de�ni-
ções de igualdade e adição de matrizes. Por esta razão, provaremos apenas
o item (i) e deixaremos (ii), (iii) e (iv) como exercício (veja Problema 2.5).
(i): Se A = [aij], B = [bij] e C = [cij], então
A+ (B + C) = [aij] + [bij + cij] = [aij + (bij + cij)] =
[(aij + bij) + cij] = [aij + bij] + [cij] = (A+B) + C,
18 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
onde usamos a associatividade da adição de números reais. �
Uma outra operação importante com matrizes é a multiplicação por es-
calar. Dada a matriz A = [aij]m×n, de�nimos o produto de A pelo número
real a, como aA = [aaij]m×n.
Por exemplo,
−3
2 0
1 1
0 −1
=
−6 0
−3 −30 3
.
Tendo de�nido as operações de adição e multiplicação por escalar em
M(m,n), de�nimos a operação de subtração da maneira usual: dada as
matrizes A e B emM(m,n),
A−B = A+ (−B).
Proposição 1.2.2. As seguintes propriedades se veri�cam para quaisquer A
e B ∈M(m,n), e a, a′ ∈ R:
(i) a(A+B) = aA+ aB;
(ii) (a+ a′)A = aA+ a′A;
(iii) a(a′A) = (aa′)A;
(iv) 1A = A.
Demonstração Provaremos apenas (i) e deixaremos a demonstração das
demais propriedades ao leitor (veja Problema 2.5).
(i): De fato, sejam A = [aij], B = [bij] elementos deM(m,n) e a um elemento
de R, então
a(A+B) = a[aij + bij] = [a(aij + bij)] = [aaij + abij] =
[aaij] + [abij] = a[aij] + a[bij] = aA+ aB,
onde usamos a distributividade da multiplicação em relação à adição de nú-
meros reais. �
2. MATRIZES 19
Assim, com as Proposições 1.2.1 e 1.2.2, provamos que o conjuntoM(m,n)
é um espaço vetorial sobre R.
O conjunto das matrizes tem uma estrutura muito mais rica do que a de
simples espaço vetorial, obtida com a noção de produto de matrizes, noção
esta, fundamental para a resolução de sistemas de equações lineares com o
uso de matrizes.
Nosso próximo objetivo é, portanto, de�nir a multiplicação de matrizes e
mostrar algumas de suas propriedades. A de�nição de produto de matrizes
foi apresentada por Arthur Cayley (Inglaterra, 1821-1895), no trabalho inti-
tulado �A Memoir on the Theory of Matrices�, publicado em 1858 na revista
Philosophical Transactions of the Royal Society of London. Neste trabalho,
Cayley notou que a multiplicação de matrizes, como foi de�nida, simpli�ca
em muito o estudo de sistemas de equações lineares. Também observou que
esta multiplicação deixava de apresentar propriedades importantes, como a
comutatividade e a lei do corte, e que uma matriz não nula não é necessaria-
mente invertível.
Sejam A = [aij]m×n e B = [bij]n×p duas matrizes. De�nimos o produto
AB de A por B, denotado por AB, como a matriz C = [cij]m×p tal que
cij =n∑
k=1
aik bkj = ai1 b1j + · · ·+ ain bnj
para todo 1 ≤ i ≤ m e para todo 1 ≤ j ≤ p.
Vamos explicar esta fórmula para obter o elemento da matriz AB que se
encontra na i-ésima linha e j-ésima coluna:
Na matriz A, destaque a i-ésima linha, e na matriz B, a j-ésima coluna.
Feito isto, multiplique ordenadamente o primeiro elemento da linha com o
primeiro elemento da coluna, o segundo elemento da linha com o segundo
elemento da coluna, etc., o último elemento da linha com o último elemento
da coluna e �nalmente some esses números todos.
20 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
Por exemplo, 2 4
0 0
−1 3
[−1 1
1 −1
]=
2(−1) + 4(1) 2(1) + 4(−1)0(−1) + 0(1) 0(1) + 0(−1)−1(−1) + 3(1) −1(1) + 3(−1)
=
2 −20 0
4 −4
.
Note que para o produto de A por B estar de�nido, o número de colunas
de A deve ser igual ao número de linhas de B. Assim, se A e B são matrizes
2 × 3 e 3 × 1, respectivamente, o produto AB está de�nido e é uma matriz
2 × 1. Porém, o produto BA não está de�nido. Uma condição necessária
para que AB = BA é que A e B sejam matrizes quadradas de mesma ordem.
Contudo, esta condição não é su�ciente. Por exemplo, as matrizes
A =
[0 1
2 0
]e B =
[0 1
1 0
]são matrizes quadradas de ordem 2, mas AB 6= BA. Assim, vemos que a
multiplicação de matrizes não possui a propriedade comutativa.
Observe que [1 1
1 1
] [1 1
−1 −1
]= 0,
sem que nenhuma das duas matrizes seja nula. Portanto, na multiplicação de
matrizes, podemos ter AB = 0 sem que necessariamente A ou B seja nula.
Lembremos que isto não ocorre com a multiplicação de números reais, pois
dados dois números reais x e y tais que xy = 0, tem-se obrigatoriamente que
x = 0 ou y = 0.
Os sistemas lineares como em (2) da Seção 1 se expressam de modo per-
feito pela equação matricial
AX = B,
onde
A =
a11 a12 . . . a1n
a21 a22 . . . a2n...
......
am1 am2 . . . amn
, X =
x1
x2
...
xn
e B =
b1
b2...
bm
.
2. MATRIZES 21
As matrizes A, X e B são chamadas, respectivamente, de matriz dos
coe�cientes do sistema, matriz das incógnitas e matriz dos termos indepen-
dentes.
Na seguinte proposição apresentamos algumas propriedades da multipli-
cação de matrizes.
Proposição 1.2.3. Desde que as operações sejam possíveis, temos:
(i) A(B + C) = AB + AC (distributividade à esquerda da multiplicação
em relação à adição);
(ii) (A+B)C = AC +BC (distributividade à direita da multiplicação em
relação à adição);
(iii) (AB)C = A(BC) (associatividade);
(iv) A I = IA = A (existência de elemento identidade).
Demonstração Provaremos a propriedade (iii) e deixaremos a demons-
tração das demais propriedades ao leitor (veja Problema 2.5).
(iii): Suponhamos que as matrizes A, B e C sejam de ordens n× r, r × s e
s×m, respectivamente. Temos que((AB)C
)ij=∑s
k=1(AB)ikckj =∑s
k=1
(∑rl=1 ailblk
)ckj =
∑rl=1 ail
(∑sk=1 blkckj
)=∑r
l=1 ail(BC)lj =(A(BC))ij.
Isto mostra que a propriedade (iii) é válida. �
Tendo de�nido a multiplicação de matrizes, de�nimos a potenciação da
maneira usual: dados A emM(n, n) e k ∈ N \ {0},
A0 = In e Ak = A A · · ·A︸ ︷︷ ︸k fatores
.
Dada uma matriz A = [aij]m×n, chamamos de transposta de A, e denota-
mos por At, a matriz [bij]n×m, onde
bij = aji,
22 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
para todo 1 ≤ i ≤ n e para todo 1 ≤ j ≤ m.
Por exemplo, −4 0
−1 2
0 3
t
=
[−4 −1 0
0 2 3
].
Uma matriz quadrada A é chamada simétrica se At = A e antissimétrica
se At = −A.Por exemplo, dadas as matrizes
A =
2 −1 3
−1 1 0
3 0 5
e B =
0 1 −3−1 0 2
3 −2 0
,
a matriz A é simétrica e B é antissimétrica.
Terminamos esta seção apresentando o conceito de matriz em blocos.
Uma matriz A é dita ser uma matriz em blocos se A está subdividida em ma-
trizes menores, chamadas blocos. Esta subdivisão é, geralmente, apresentada
por linhas horizontais e/ou linhas verticais, como mostra o seguinte exemplo:[2 1 1 0
6 4 0 1
]=
[2 1 | 1 0
6 4 | 0 1
].
Uma matriz pode ser subdividida em blocos de várias maneiras. Porexemplo,
0 1 0 2
1 4 2 1
0 0 5 3
=
0 1 | 0 2
1 4 | 2 1
−− −− −− −− −−0 0 | 5 3
=
0 | 1 | 0 2
−− −− −− −− −− −−1 | 4 | 2 1
0 | 0 | 5 3
.
Uma propriedade interessante da partição em blocos é que os resultados
das operações de adição e multiplicação com matrizes em blocos podem ser
obtidos efetuando o cálculo com os blocos, como se eles fossem simplesmente
elementos das matrizes.
2. MATRIZES 23
2.3 Matriz Inversa
Dada uma matriz quadrada A de ordem n, chamamos de inversa de A a
uma matriz quadrada B de ordem n tal que
AB = BA = In .
Por exemplo, dada a matriz
A =
[2 5
1 3
],
temos que a matriz
B =
[3 −5−1 2
]é uma inversa de A, já que AB = BA = I2 .
Note que uma matriz quadrada não possui necessariamente uma inversa.
Por exemplo, seja A =
[0 0
0 0
]. Dada qualquer matriz B =
[a b
c d
], temos
que
AB =
[0 0
0 0
] [a b
c d
]=
[0 0
0 0
]6= I2 .
Logo, A não tem inversa.
Mesmo que uma matriz não seja nula, ela pode não ter inversa. Por
exemplo, a matriz A =
[1 1
1 1
]não possui inversa, já que não existe uma
matriz quadrada B de ordem 2 tal que AB = I2 (veri�que).
Uma matriz quadrada A é dita invertível se A admite uma matriz inversa.
Se uma matriz A possui uma inversa, então essa inversa é única. De fato,
suponhamos que B e C são duas inversas de uma matriz A de ordem n× n.
Então AB = In e CA = In . Assim, por (iii) e (iv) da Proposição 1.2.3,
C = C In = C(AB) = (CA)B = InB = B.
24 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
Já que a inversa, no caso de existir, é única, escrevemos A−1 para denotar a
inversa de A. Se k ∈ N\{0} e A é uma matriz invertível, de�nimos A−k por:
A−k = A−1A−1 · · ·A−1︸ ︷︷ ︸k fatores
.
Vejamos algumas propriedades das matrizes inversas.
Proposição 1.2.4. Sejam A e B matrizes quadradas de ordem n.
(i) Se A é invertível, então A−1 é também invertível e (A−1)−1 = A.
(ii) Se A e B são invertíveis, então AB também é invertível e
(AB)−1 = B−1A−1.
Deixamos a demonstração desta proposição ao leitor (veja Problema 2.12),
bem como a generalização do item (ii) para um número arbitrário de fatores.
O interesse das matrizes invertíveis reside no fato de que dado um sistema
linear de equações com n equações e n incógnitas, AX = B, se soubermos
que a matriz A é invertível e soubermos como calcular sua inversa, então o
sistema se resolve efetuando apenas a multiplicação da matriz A−1 com B,
pois
AX = B =⇒ X = (A−1A)X = A−1(AX) = A−1B.
Vimos que uma matriz quadrada não nula não possui necessariamente
inversa. Uma pergunta natural é se podemos caracterizar as matrizes qua-
dradas invertíveis, ou seja, se podemos apresentar uma condição necessária
e su�ciente para que uma matriz quadrada seja invertível. Também esta-
mos interessados em obter um método para o cálculo da inversa de uma
matriz invertível. No próximo capítulo, apresentaremos uma caracterização
de matrizes invertíveis e um método para inversão de matrizes que utiliza as
transformações elementares nas linhas de uma matriz e a forma escalonada.
No Capítulo 8, Proposição 8.3.1(iii), veremos um outro modo bem diferente
de atacar este problema pelo uso dos determinantes.
Problemas
2. MATRIZES 25
2.1* Sejam A=
[1 −2 3
4 1 0
]e B=
[−1 2 0
1 −2 0
].
Calcule 2A, 3B e 2A−3B.
2.2 Determine os valores de x, y e z em R para que as matrizes A e B dadas
sejam iguais:
A =
[x+ y 0
z x− 2y
]e B =
[13 0
1 4
].
2.3 Dadas as matrizes
A =
[−1 4 −22 0 −1
], B =
[0 1 −20 1 −1
], C =
113
e D = [−1 1],
determine:
(a) A+B; (b) −2C; (c) AC; (d) CD; (e) BC; (f) DA.
2.4* Considere as matrizes
A = [aij]4×5 com aij = i− j,
B = [bij]5×9 com bij = j e
C = [cij] com C = AB.
(a) É possível determinar c63? Justi�que a resposta.
(b) Determine c36.
2.5 Conclua as demonstrações das Proposições 1.2.1, 1.2.2 e 1.2.3.
2.6* Dada uma matriz A, dizemos que uma matriz X comuta com A se
AX = XA. Determine todas as matrizes que comutam com
A =
[1 0
0 3
].
2.7 a) Mostre que a matriz c In, onde c ∈ R, comuta com toda matriz X ∈M(n, n).
26 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
b) Ache todas as matrizes M =
[x y
z t
]que comutam com a matriz
[1 1
0 1
].
2.8 Verdadeiro ou falso? Justi�que.
(a) Se A e B são matrizes quadradas de mesma ordem, então
(A−B)(A+B) = A2 −B2.
(b) Se A, B e C são matrizes quadradas de mesma ordem tais que AB = AC,
então B = C.
2.9 Mostre que se A é uma matriz triangular superior, então A2 também é
uma matriz triangular superior.
2.10* (a) Obtenha At, onde A =
[1 2 3
0 −1 4
].
(b) Veri�que que a transposta de uma matriz triangular superior é uma
matriz triangular inferior.
(c) Mostre que (A+B)t = At +Bt e (kA)t = kAt, onde A e B são matrizes
de mesma ordem e k ∈ R.
(d) Se A é uma matriz m × n e B é uma matriz n × p, prove que
(AB)t = BtAt.
(e) Mostre que (At)t = A para toda matriz A de ordem m× n.
2.11* Mostre que se B é uma matriz quadrada, então:
(a) B +Bt e BBt são simétricas;
(b) B −Bt é antissimétrica.
(c) Observando que
B =B +Bt
2+
B −Bt
2,
conclua que toda matriz quadrada se escreve como soma de uma matriz
simétrica e de uma matriz antissimétrica.
2. MATRIZES 27
(d) Mostre que a escrita em (c) é o único modo possível de escrever uma
matriz quadrada como soma de uma matriz simétrica e de uma matriz an-
tissimétrica.
2.12 Prove a Proposição 1.2.4.
2.13 Demonstre que:
(a) se A tem uma linha nula, então AB tem uma linha nula;
(b) se B tem uma coluna nula, então AB tem uma coluna nula;
(c) qualquer matriz quadrada com uma linha ou uma coluna nula não é
invertível.
2.14 Mostre que uma matriz A é invertível se, e somente se, At é invertível.
Conclua que as operações de inversão e de transposição comutam; isto é,
(At)−1 = (A−1)t, quando A é invertível.
2.15 Sejam a = (a1, . . . , an), b = (b1, . . . , bn) ∈ Rn. De�namos
Diag(a) =
a1 0 · · · 0
0 a2 · · · 0...
.... . .
...
0 0 · · · an
.
Mostre que:
(a) Diag(a) + cDiag(b) = Diag(a+ cb) onde c ∈ R;(b) Diag(a) ·Diag(b) = Diag(b) ·Diag(a) = Diag(a1b1, . . . , anbn);
(c) Diag(a)m = Diag(am1 , . . . , amn ), onde m ∈ N \ {0};
(d) Em que condições a matriz Diag(a) é invertível e qual é a sua inversa?
Este problema mostra que somar, multiplicar, calcular potências e inver-
ter matrizes diagonais é muito simples.
2.16 Supondo que as matrizes A,B e C são matrizes quadradas de mesma
ordem e invertíveis, resolva as seguintes equações matriciais nas quais X é a
incógnita:
28 CAPÍTULO 1. SISTEMAS LINEARES E MATRIZES
(a) CX + 2B = 3B; (b) CAX t = C; (c) ABX = C.
2.17 Dada uma matriz A =
[a b
c d
], mostre que :
a) se ad− bc 6= 0, então A é invertível e
A−1 =1
ad− bc
[d −b−c a
];
b) se ad− bc = 0, então A não é invertível.
Bibliogra�a
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