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3Trabalho Decente na América Latina: BrasilIntrodução

Introdução

A Rede Latino-Americana de Pesquisas em Empresas Multinacionais (RedLat) é uma iniciativa criada em outubro de 2005. Dela participam sindicatos e instituições de pesquisa sobre o mundo do trabalho na Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Peru, México e Uruguai. O propósito comum é aprofundar o conhecimento a partir do conceito de Trabalho Decente, elaborado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre as condições sociotrabalhistas na região e oferecer as informações coletadas para impulsionar a ação sindical.

Segundo a OIT, Trabalho Decente é um trabalho produtivo e adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, sem qualquer forma de discriminação, e que garanta a trabalhadores e trabalhadoras condições dignas de vida. Dentro deste marco, esta pesquisa define cinco dimensões do trabalho decente: oportunidades de emprego, remunerações, proteção social, liberdade

sindical e negociação coletiva. Também contextualiza a situação socioeconômica do Brasil, que determina o trabalho decente, e analisa a questão da terceirização no mercado de trabalho nacional.

Esta publicação faz parte de um esforço conjunto para analisar a evolução do trabalho decente ao longo da última década em cada um dos países da RedLat. O objetivo é que as informações geradas sejam uma ferramenta para a reflexão e o desenvolvimento de estratégias do movimento sindical para a região.

Especificamente sobre o Brasil, este texto aborda um período privilegiado da história recente que, desde 2003, busca combater a desigualdade social brasileira. Esperamos contribuir com o movimento sindical brasileiro no enfrentamento de um conjunto de medidas que atacam os direitos dos trabalhadores, postas mais enfaticamente no Brasil a partir de 2015 por forças políticas ultraconservadoras.

Esta publicação é uma síntese de pesquisa. A versão completa e detalhada está disponível em

www.redlat.net

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4 Trabalho Decente na América Latina: BrasilFicha Técnica

Coordenação e Elaboração de PesquisaJuliana Sousa

Equipe de PesquisaLeandro Machado

Lilian Arruda

RevisãoPaola Bello

Projeto Gráfico e DiagramaçãoMGiora

www.redlat.net

www.os.org.br

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5Trabalho Decente na América Latina: BrasilSumário

Sumário

Capítulo 5: Liberdade Sindical e Negociação Coletiva 17

6 Capítulo 1: Contexto Socioeconômico

8 Capítulo 2: Oportunidades de Emprego

11 Capítulo 3: Remunerações

13 Capítulo 4: Proteção Social

20 Capítulo 6: Terceirização

21 Conclusões

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6 Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 1: Contexto Socioeconômico

Capítulo 1: Contexto Socioeconômico

Na primeira década do século XXI, houve a mais expressiva redução da desigualdade e da pobreza no Brasil, segundo avaliação do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). O período apresentou os melhores resultados desde quando o país passou a elaborar estatísticas sobre distribuição de renda. O índice de Gini (indicador que mede a desigualdade, de 0 a 1, sendo que quanto mais próximo de zero, menor é a desigualdade) foi de 0,527 em 2011, atingindo a partir de então patamares inferiores ao menor registrado desde 1960 (gráfico 1). Para Marcelo Neri, que presidiu o IPEA de setembro de 2012 a maio de 2014, a redução da desigualdade no Brasil deve-se ao crescimento da renda per capita nos diferentes estratos sociais. Na opinião do economista, a melhoria da renda na base

da pirâmide relativiza o tímido desempenho das contas nacionais, verificado pelo Produto Interno Bruto (PIB) (gráfico 2). Em 2014, o PIB encerrou o ano em +0,1%, praticamente estável em relação a 2013. No acumulado do ano, o PIB em valores correntes totalizou R$ 5.521,3 bilhões1.

Desde 2003, a participação dos salários no PIB tomou uma trajetória ascendente. O rendimento médio dos trabalhadores alcançou aumento real significativo entre 2003 e 2012, com destaque para a política de aumento real do salário mínimo, um dos pilares do fortalecimento do mercado de consumo de massas no Brasil. A valorização do salário mínimo foi responsável por 70% da redução na desigualdade brasileira2.

1. Em 2013, o PIB brasileiro foi de US$ 2.246 trilhões. Fonte: Banco Mundial. 2. Fonte: Menezes Filho, Naercio (INSPER). “Salário mínimo é responsável por 70% da redução da desigualdade, diz professor” (08/05/2014).

Fonte: IPEA (a partir dos microdados da PNAD e Censo/IBGE e Langoni, 1973)

Gráfico 1. Brasil: Índice de Gini

0,535

0,5810,589

0,6070,594

0,5520,539

0,527

1960 1970 1979 1990 2001 2007 2009 2011

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7Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 1: Contexto Socioeconômico

Apesar do cenário favorável, com investimentos em políticas sociais e medidas para o aquecimento da economia interna, o Brasil não escapou da crise econômica internacional. Alegando a necessidade de enfrentar a crise e de equilibrar as contas públicas, o ministro da Fazenda do Brasil em 2015, Joaquim Levy, buscou inverter a estratégia até então adotada: passou a defender a receita ortodoxa do ajuste como condição para a recuperação do crescimento econômico.

No início de 2015, o crescimento das demissões e da inflação e a política fiscal contracionista impulsionaram protestos pelo país. Um dos mais expressivos foi realizado em 13 estados brasileiros pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) no Dia Nacional de Lutas, em 18 de março. No mesmo período, as centrais sindicais se manifestavam publicamente exigindo a

revogação das medidas provisórias 664 e 665. Anunciadas pelo Governo Federal em 30 de dezembro de 2014, essas medidas restringem o acesso a benefícios trabalhistas. Por várias outras vezes, as centrais ocuparam as ruas em defesa da manutenção dos direitos - porém, com ciência de era preciso defender o projeto de sociedade eleito em 2014 do ataque e das campanhas golpistas da oposição.

Mesmo com a saída do ministro em 2016 (quando assumiu o cargo de diretor financeiro do Banco Mundial), a política neoliberal continuou imposta. Neste cenário, as camadas mais vulneráveis da população acabam arcando com os apertos da política econômica. Assim, não são buscadas alternativas para mudança, como uma reforma que corrija a regressividade do sistema tributário3, a taxação de grandes fortunas e investimentos para o financiamento do gasto social.

3. As estimativas sobre a distribuição da carga tributária bruta por nível de renda mostram que, enquanto os que ganham até dois salários mínimos recolhem ao Tesouro 53,9% da renda, os que ganham acima de 30 salários mínimos contribuem com 29%. Fonte: Carta Capital: Belluzzo, Luiz Gonzaga. “Feliz ajuste fiscal” (11/01/2015).

Fonte: IBGE

Gráfico 2. Brasil: variação anual do PIB

19951996

19971998

19992000

20012002

20032004

20052006

20072008

20092010

20112012

20132014

4,2

2,2

3,4

0,4 0,5

4,4

1,3

3,1

1,2

5,7

3,14,0

6,0

5,0

-0,2

7,6

3,9

1,82,7

0,1

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8 Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 2: Oportunidades de Emprego

Capítulo 2: Oportunidades de Emprego

A crise internacional teve início no segundo semestre de 2007 e foi acelerada com a quebra do banco Lehman Brothers, em setembro de 2008 - desencadeada pela bolha no mercado imobiliário estadunidense em uma etapa de desequilíbrio estrutural do capitalismo. Diante da crise, o governo brasileiro respondeu implementando uma política contracíclica, baixando impostos e fortalecendo o crédito dos bancos públicos. Vencido, no entanto, pela sobreapreciação da taxa de câmbio, que até aquele momento prevalecia nas economias em desenvolvimento, e pelo declínio dos preços das commodities exportadas, a presidente Dilma assumiu seu primeiro mandato em um contexto já em modificação. A situação internacional tornou a deteriorar-se em 2011, com a estagnação da economia dos Estados Unidos e a desaceleração da China, principal motor da economia mundial, e a grave crise dos países do Euro, com perspectivas de deflação. Consequentemente, os países ricos apresentaram taxas de crescimento baixas ou mesmo negativas em 2012, reduzindo a demanda pelos bens exportados a partir do Brasil.

No período de prosperidade, ao invés de percorrer a estabilidade financeira assegurada por uma taxa de câmbio competitiva, o governo brasileiro optou por incentivar o consumo no

curto prazo – o que resulta em déficits na conta corrente. Deixou, assim, de impulsionar a produtividade pela industrialização, medida com a qual transferiria mão de obra de setores com baixo valor adicionado per capita para setores com alto valor adicionado per capita, tecnologicamente mais sofisticados e que oferecem maiores salários. Desde 1994, o país reduz o incremento da produtividade da economia por meio da transferência inversa, bem como pela transformação da economia brasileira na “fazenda do mundo” (Bresser-Pereira, 2013).

Embora o desempenho da indústria nacional tenha sido intensamente comprometido pela dificuldade de exportar, o país beneficiou-se recentemente com a expansão do mercado interno, em virtude da elevação dos salários reais e da ampliação do crédito ao consumidor, do incentivo à formalização, assim como pelos investimentos estatais em infraestrutura: o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o Programa Minha Casa Minha Vida. Em um período de dez anos, entre 2002 e 2012, o emprego formal no Brasil cresceu 65,7%, segundo o IBGE. O total de empregados saltou 28,6 milhões para 47,4 milhões – apesar de a informalidade ainda ser muito expressiva no país. A construção civil foi o setor que mais gerou postos formais de trabalho, atingindo

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9Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 2: Oportunidades de Emprego

2,8 milhões de trabalhadoras e trabalhadores, com expansão de 155% nos registros em carteira de trabalho. A formalização do trabalho no Brasil aumentou de 44,6% para 56,9% no mesmo período, conforme a Síntese de Indicadores Sociais do IBGE. Em termos absolutos, o setor de serviços manteve a liderança na quantidade de empregos formais, com 16,1 milhões, avanço de 78% na comparação de 20024. Em dezembro de 2014, a taxa de desocupação brasileira foi de 4,3% da População Economicamente Ativa (PEA), segundo dados da PME/IBGE, consistindo na menor taxa da série histórica, iniciada em março de 2002 (tabela 1). A taxa média de desocupação de 2014 fechou em 4,8%.

Tabela 1. Taxas de desocupação total, por gênero e de jovens no Brasil, em anos

selecionados (%)

Ano Total Homens Mulheres Jovens

2005 8,3 6,9 10,2 17,62010 5,3 4,1 6,7 11,52013 4,3 3,5 5,3 10,32014 4,3 3,8 5,0 10,5

Fonte: PME/IBGENota: Para o Brasil, em dezembro. Regiões Metropolitanas (Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre).

De 2003 a 2013, a representação do setor de serviços (que engloba o comércio) saltou de 64,7% para 69,4% do valor adicionado do PIB, segundo as Contas Nacionais Trimestrais do IBGE. Particularmente, o comércio apresentou significativa expansão, ao passar de 10,6% em 2003 para 12,7%

do valor adicionado do PIB em 2013. As mudanças no perfil da renda e do consumo de massas observadas no período recente impulsionaram os setores de Comércio e Serviços, que mais empregaram desde 2003 – incentivando também a redução da informalidade, de 50,4% em 2003 para 39,3% em 2012, de acordo com a PNAD/IBGE. Em 2013, Comércio e Serviços corresponderam a 76% do saldo total de empregos criados com carteira de trabalho assinada, adicionando, respectivamente, 305 mil e 546 mil postos de trabalho, segundo o CAGED/MTE (acompanhe na tabela 2 a distribuição do total de ocupados por atividade econômica em 2012 e 2013).

Ao longo da primeira década do século XXI, as mulheres representavam cerca de 94% das pessoas ocupadas nos serviços domésticos no Brasil. Em 2013, elas corresponderam a 92,65%, sendo que as mulheres negras ocupavam 61,6% dos postos de trabalho nesta profissão, segundo o IPEA.

Em 2012, 70,1% das trabalhadoras e trabalhadores ocupados nos Serviços Domésticos trabalhavam na informalidade. Este índice caiu para 66,96% em 2013. Um dos possíveis motivos para este avanço foi a aprovação no Congresso Nacional da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 478/2010. A chamada “PEC das Domésticas” foi aprovada em 26 de março de 2013 e tinha o objetivo de equiparar os direitos desta categoria aos conquistados pelos demais trabalhadores urbanos e rurais. Apenas dois anos depois, em junho de 2015, o projeto foi aprovado pela presidenta Dilma, mas com mudanças no

4. Fonte: Portal Brasil.

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10 Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 2: Oportunidades de Emprego

texto que acabaram contrariando a igualdade de direitos.

Com o crescimento da economia, houve geração de novos postos de trabalho. Este cenário pode ter acentuado uma tendência que já havia sido observada nos últimos

anos, de redução da participação do serviço doméstico no mercado de trabalho. Isso aconteceu devido ao aumento da demanda por trabalhadores em comércio e serviços com o mesmo perfil dos trabalhadores domésticos.

Tabela 2. Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, segundo a atividade do trabalho principal no Brasil

Atividade

Ano2012 2013

Nº absolutos(em mil) % Nº absolutos

(em mil) %

Total 95.293 100,0 95.880 100,0Agrícola 13.569 14,2 13.568 14,2Indústria 13.366 14,0 12.906 13,5Indústrias de transformação 12.636 13,3 12.170 12,7Construção 8.334 8,7 8.848 9,2Comércio e reparação 16.933 17,8 17.055 17,8Alojamento e alimentação 4.534 4,8 4.414 4,6Transporte, armazenagem e comunicação 5.331 5,6 5.393 5,6Administração pública 5.248 5,5 5.353 5,6Educação, saúde e serviços sociais 9.229 9,7 9.912 10,3Serviços domésticos 6.446 6,8 6.423 6,7Outros serviços coletivos, sociais e pessoais 3.802 4,0 3.769 3,9Outras atividades 8.432 8,8 8.176 8,5Atividades mal definidas 70 0,1 63 0,1

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, PNAD 2012-2013

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11Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 3: Remunerações

Capítulo 3: Remuneração do trabalho

O salário mínimo foi criado em 1940 no Brasil por meio do Decreto-Lei nº 2.162 e unificado nacionalmente em 1984. Inicialmente destinado a proteger os rendimentos dos trabalhadores ocupados no mercado de trabalho urbano, apenas na década de 1960 o salário mínimo passou a abranger também os trabalhadores rurais. A partir de meados da década de 1990, houve uma tendência de melhoria do salário mínimo. Entretanto, mesmo com o processo de valorização, em 2005 o salário mínimo real equivalia ao pago na década de 19705. A valorização do salário mínimo foi intensificada após 2004 e, com o reajuste de abril de 2006, atingiu o maior valor real desde novembro de 19856. Essa valorização beneficiava os trabalhadores e proporcionava o crescimento da renda nacional, influenciando positivamente o crescimento da economia do país.

O valor do salário mínimo saltou de R$ 260,00 em maio de 2004 para R$ 724,00 em janeiro de 2014, o que representa uma variação nominal de 178,46%. Com as taxas de inflação acumuladas pelo Índice do Custo de Vida (ICV-DIEESE) e pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC-IBGE), de 66,20% e 65,51%, respectivamente, os aumentos

acima da inflação foram de 67,55% e 68,24% nesses índices, respectivamente. O acréscimo do poder de compra do salário mínimo em 2015 em relação a 2004 superou 70%, segundo estimativas do Poder Executivo.8 Analisando por faixas o rendimento médio mensal comparativamente ao salário mínimo nacional, a partir de dados da PNAD/IBGE para pessoas de 15 anos ou mais de idade ocupadas no Brasil (tabela 3), verificamos que mais de 25% destes trabalhadores, ou seja, uma em cada quatro pessoas abrangidas pela pesquisa, receberam rendimentos de até um salário mínimo no triênio de 2012 a 2014. Aproximadamente 60% das pessoas ocupadas obtiveram como rendimento até dois salários mínimos no Brasil: 61,73% em 2012, 59,97% em 2013 e 58,6% em 2014.

Quando analisamos os rendimentos por gênero, observamos que as mulheres não conseguiram os mesmos patamares que os homens. Ao longo do triênio verificado (tabela 4), a discrepância foi equivalente a cerca de 30%, ou seja, as mulheres obtiveram em torno de 70% da remuneração observada pelos homens – embora tenha sido registrada uma leve tendência de redução dessa disparidade de um ano ao outro. Essa

5. Fonte: Saboia, 2007.6. Fonte: DIEESE.

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12 Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 3: Remunerações

Tabela 3. Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, e valor do rendimento médio mensal de todos os trabalhos, por classes de rendimento, no Brasil (%)

Classes de rendimento mensalAno

2012 2013 2014

Até 1/2 salário mínimo 7,97 7,31 7,10Mais de 1/2 a 1 salário mínimo 19,78 17,86 18,32Mais de 1 a 2 salários mínimos 33,98 34,80 33,18Mais de 2 a 3 salários mínimos 11,00 14,27 14,75Mais de 3 a 5 salários mínimos 10,30 7,70 8,94Mais de 5 a 10 salários mínimos 5,14 5,39 5,64Mais de 10 a 20 salários mínimos 1,71 1,96 1,83Mais de 20 salários mínimos 0,60 0,69 0,70Sem rendimento¹ 6,65 6,60 7,07Sem declaração 2,89 3,42 2,48Total 100,00 100,00 100,00

Fonte: PNAD/IBGENota 1: Inclusive as pessoas que recebiam somente em benefícios.

diferença de remuneração, aliás, acentua-se conforme aumenta o grau de instrução formal de trabalhadoras e trabalhadores. Ou

seja, a maior escolaridade das mulheres não assegura, no mínimo, a igualdade salarial com os homens.

Tabela 4. Valor do rendimento médio mensal de todos os trabalhos das pessoas de 15 anos ou mais de idade ocupadas na semana de referência, no Brasil, em Reais

Ano Total Homens (B) Mulheres (A) A/B

2012 1.396,00 1.602,00 1.119,00 69,85%2013 1.539,00 1.763,00 1.240,00 70,33%2014 1.644,00 1.882,00 1.332,00 70,78%

Fonte: PNAD/IBGE

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13Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 4: Proteção Social

Capítulo 4: Proteção Social

A Constituição Federal Brasileira de 1988, também chamada de Constituição Cidadã, foi resultado de luta política de diversos movimentos sociais. Dessa forma, seu texto visa assegurar amplo acesso a direitos sociais e à dignidade. Para isso, estabelece que a seguridade social é composta por políticas de saúde, previdência e assistência social.

A seguridade social articula um conjunto de políticas que garantem o acesso a diferentes serviços, entre eles os benefícios previdenciários (como as diferentes modalidades de aposentadorias descritas no quadro 1), seguro-desemprego, entrega de remédios gratuitos e vacinação. Também oferece benefício monetário em casos de vulnerabilidade social, como o Programa Bolsa Família.

Também previsto na Seguridade Social brasileira, o seguro-desemprego foi criado em 1986 pelo Decreto-Lei nº 2.284 (veja as regras no quadro 2). O seguro é custeado pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), cujos recursos provêm das contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP) – sendo que 40% da receita do FAT é repassada ao Banco Nacional

do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para o financiamento de programas de desenvolvimento econômico. O seguro-desemprego apresenta como objetivos:

• Prover assistência financeira temporária ao trabalhador desempregado sem justa causa;

• Auxiliá-lo na manutenção e busca de emprego (orientação, recolocação e qualificação profissional).

Todas as situações em que ocorrer acidente do trabalho ou doença do trabalho (veja no quadro 3 os tipos de seguro contra acidentes de trabalho existentes no Brasil) devem ser informadas ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) por meio da emissão da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT). O sindicato da categoria e o trabalhador lesionado ou que tenha sido acometido por enfermidade devem receber uma via do documento. Ela serve para formalizar o caso e gerar estatísticas para criação de melhorias pelas autoridades previdenciárias e de fiscalização trabalhista. No entanto, em 2013, mais de 20% do total de acidentes de trabalho em âmbito nacional tiveram omissão do registro da CAT.

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14 Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 4: Proteção Social

Quadro 1. A Previdência Social no Brasil – regimes de aposentadoria e cobertura

Previdência Social: RegrasRegimes de Aposentadoria:1. Regime Geral de Previdência Social (RGPS) – filiação obrigatória e contributiva. Contempla trabalhadores com registro na carteira de trabalho; trabalhadores domésticos; contribuintes individuais; trabalhadores rurais, autônomos e empregadores.

2. Regime Próprio dos Servidores Públicos (RPPS) – servidores públicos ingressados mediante concurso público. Adesão compulsória.

3. Regime de Previdência Complementar (RPC) – facultativo. Abrange a previdência privada aberta (comercializada por bancos e seguradoras) e a previdência privada fechada (fundos de pensão criados por empresas exclusivamente para funcionários).Tipos de Aposentadoria:

1. Aposentadoria por idade: concedida a homens aos 65 nos de idade e a mulheres, aos 60 anos. No caso dos trabalhadores rurais, a homens aos 60 anos e a mulheres, aos 55 anos. Carência: 15 anos de contribuição a inscritos após 25/07/1991; se inscrito anteriormente, são exigidas 144 contribuições.

2. Aposentadorias por tempo de contribuição: exigência de 35 anos de contribuição para homens e 30 anos para mulheres. Algumas categorias, como professores, têm tempo de contribuição diferenciado: 30 anos para homens e 25 para mulheres. Para o cálculo do valor, aplica-se o fator previdenciário.

3. Nova regra de cálculo para aposentadoria por tempo de contribuição:Fórmula 85/95 Progressiva (Lei 13.183/2015): considera a soma da idade e o tempo de contribuição do segurado – se mulheres, 85 pontos, se homens, 95 pontos, até 31/12/2018, e a modificar-se conforme elevação da expectativa de vida no Brasil. Permite a exclusão do fator previdenciário do cálculo do valor das aposentadorias. Carência: 180 meses de contribuição.

4. Aposentadoria por invalidez: concedida após perícia médica avaliar total incapacidade para o trabalho, por motivo de doença ou acidente.

5. Aposentadoria especial: destinada a trabalhadores expostos a agentes nocivos à saúde (físicos, químicos ou biológicos).

VALOR: Nenhum benefício previdenciário pode ser inferior ao salário mínimo (área urbana ou rural).

Proteção Previdenciária: Cobertura

Proteção Previdenciária da População Ocupada (16 a 59 anos)

Cobertura/ Ano

2003 2013

Total Homem Mulher Total Homem Mulher

62,5% 63,8% 60,7% 72,5% 72,6% 72,3%Obs.: Não abrange cidadãos que possuem cobertura social em ações da Assistência Social e Saúde.

Fonte: Brasil, Ministério da Previdência Social

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15Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 4: Proteção Social

A licença-maternidade no Brasil possui duração de 120 dias, com remuneração integral. No caso de servidoras públicas e de trabalhadoras de empresas que tenham aderido ao Programa Empresa Cidadã, a licença-maternidade é prorrogada por 60 dias. A licença-paternidade, por sua vez, prevê um período de 5 dias de afastamento remunerado do pai (quadro 4). Portanto, ao estabelecer o período de afastamento, a legislação já modela as relações sociais de cuidados da criança, definindo as distintas

responsabilidades e papeis sociais, de acordo com o gênero, de mãe e pai. Desde 2013, entretanto, segundo um novo entendimento que considera o benefício como um direito da criança, também em casos de adoção, mulheres e homens, inclusive em uniões homoafetivas, podem solicitar o salário-maternidade. Houve recentemente decisões judiciais determinando que, na ausência da mãe, em caso de falecimento, por exemplo, o pai pode solicitar a licença por 120 dias para prestar os primeiros cuidados ao bebê.

Quadro 2. O seguro-desemprego no Brasil

Regras

Regras para solicitação

Lei Nº 13.134, de 16 de junho de 2015 (Conversão da Medida Provisória nº 665/2014)

1ª solicitação: ter recebido salários em no mínimo 12 meses nos últimos 18 meses imediatamente anteriores à data da dispensa – Regra antiga: ter recebido salários em cada um dos 6 meses imediatamente anteriores à data da dispensa;2ª solicitação: ter recebido salários em no mínimo 9 meses nos últimos 12 meses imediatamente anteriores à data da dispensa;3ª solicitação: recebimento de cada um dos 6 meses imediatamente anteriores à data da dispensa.

Nº de parcelas: Entre 3 e 5 parcelas, a depender do período comprovado do vínculo empregatício e do número de vezes em que solicitou o benefício.

Valor do benefício (2015):Calcula-se o salário médio dos últimos 3 meses e aplica-se a seguinte fórmula:

Faixas de salário

médioValor da parcela

Até R$ 1.222,77 Multiplica-se o salário médio por 0,8 (80%) De R$ 1.222,78 até

R$ 2.038,15O que exceder a R$ 1.222,77 multiplica-se por 0,5 (50%) e soma-se a R$ 978,22

Acima de R$ 2.038,15 O valor da parcela será de R$ 1.385,91 invariavelmente.

Obs.: O valor do benefício não poderá ser inferior ao valor do Salário Mínimo. Em vigor a partir de janeiro de 2015. Salário Mínimo de R$ 788,00.

Fontes: Presidência da República, Casa Civil; Lei Nº 13.134, de 16 de junho de 2015, Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)

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16 Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 4: Proteção Social

Quadro 3. Seguros contra acidentes de trabalho no Brasil

Benefícios Regras

Pensão por morte por acidente de trabalho

Garantido aos dependentes do segurado que venha a falecer devido à doença ou acidente de trabalho. Para os filhos, equiparados ou irmãos, é devido até os 21 anos de idade. Para o cônjuge, a duração dependerá de sua idade – a partir de 44 anos, vitalício.Valor mensal: 100% do valor da aposentadoria que o trabalhador recebia ou receberia caso se aposentasse por invalidez na data do falecimento.

Auxílio-doença (comum ou acidentário)

Benefício pago por incapacidade ao segurado do INSS acometido por doença ou acidente que o torne temporariamente incapacitado para o trabalho. Valor: não pode exceder a média dos últimos 12 salários de contribuição. Em até 15 dias consecutivos, a responsabilidade do pagamento dos salários é da empresa; a partir do 16º dia, há avaliação da perícia médica do INSS e encaminhamento, caso concedido, ao sistema previdenciário para o recebimento do benefício. Particularidades:Auxílio-doença comum: Estabilidade: Não há. Carência: 12 meses, exceto para doenças específicas.Auxílio-doença acidentário: Estabilidade: 12 meses após retorno ao trabalho. Carência: isento.

Auxílio-acidente

Benefício a que o segurado do INSS pode ter direito, após perícia médica do INSS, quando desenvolve sequela permanente que reduza sua capacidade laborativa. É pago a critério de indenização. Equivale a 50% do salário de benefício que originou o auxílio-doença. Carência: isento.

Fontes: Anuário Estatístico da Previdência Social (AEPS), 2013Presidência da República. Casa Civil. Lei Nº 13.135, de 17 de junho de 2015

Quadro 4. Licença-maternidade e licença-paternidade no Brasil

Regras Licença-maternidade Salário-maternidade e EstabilidadeVigência: 120 dias (Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT), ou 180 dias (servidoras públicas, bem como empregadas em empresas que aderirem ao Programa Empresa Cidadã, mediante incentivo fiscal).

Devido a todas as seguradas da Previdência Social durante 28 dias antes do parto e 91 dias depois, com pagamento efetuado pelas empresas. É pago diretamente pelo INSS no caso das segurada trabalhadora avulsa, empregada doméstica, contribuinte individual, especial e facultativa.Em 2013, nova legislação estabeleceu que ao segurado ou segurada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança (com idade máxima de 12 anos) é devido salário-maternidade pelo período de 120 dias.A Constituição Federal do Brasil (CFB), de 1988, proíbe a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até 5 meses após o parto.

Licença-paternidadeVigência: prazo de 5 dias, garantido pela CFB, de 1988.

Fonte: Anuário Estatístico da Previdência Social (AEPS), 2013

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17Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 5: Liberdade Sindical e Negociação Coletiva

Capítulo 5: Liberdade Sindical e Negociação Coletiva

Em síntese, a atual estrutura sindical brasileira é caracterizada pelos seguintes princípios fundamentais: a unicidade sindical, isto é, apenas um sindicato segundo a categoria e a base territorial; a contribuição sindical compulsória, o imposto sindical; bem como o reconhecimento legal pelo Estado, que realiza o registro oficial das instituições. Implementada por legislação em 1931, no governo de Getúlio Vargas, embora essa estrutura geral tenha perdurado, houve distintos modelos de sindicalismo em exercício, correspondentes aos contextos das relações entre as forças sociais e aos momentos históricos.

De 1968 a 1978, período de estabilidade da ditadura militar, os sindicatos oficiais foram submetidos à tutela dos governos militares, que exerciam rígido controle das eleições sindicais, nomeavam ou depunham os dirigentes, além de estabelecer uma política salarial do governo e implementar uma lei de greve. A partir de 1978, no entanto, esse modelo de sindicalismo instituído pela ditadura militar entrou em crise, tendo contribuído nesse processo um conjunto de transformações da estrutura de classes do país, a partir do crescimento acentuado do proletariado, sobretudo o contingente de trabalhadores manuais do setor industrial. A retomada da atividade participativa dos trabalhadores teve como marco o movimento grevista de 1978, inicialmente no ABC paulista

– berço do “novo sindicalismo” – e que se irradiou pelo país em um movimento amplo em defesa da redemocratização e dos direitos trabalhistas e sociais das classes populares. Em consonância com essa nova práxis sindical, em 1983, foi criada a Central Única dos Trabalhadores (CUT).

Marco mais recente dessa trajetória histórica do sindicalismo, uma nova legislação reconheceu formalmente, em 2008, as centrais sindicais como entidades associativas de direito privado de representação dos trabalhadores em âmbito nacional. Atualmente, a participação do sindicalismo rural tem se destacado na manutenção das taxas de sindicalização no Brasil, envolvendo assalariados assim como agricultores familiares, com crescimento significativo da participação associativa das mulheres no campo nas duas últimas décadas, superando a sindicalização dos homens, principalmente nas regiões Nordeste e Norte.

Nas duas últimas décadas, a taxa de sindicalização no Brasil tem se mantido relativamente constante, entre 19% a 17%, apesar das mudanças ocorridas no âmbito do trabalho e da produção. No período, o total de associados aos sindicatos envolvia quase 11 milhões de pessoas ocupadas em 1992 e cerca de 16 milhões em 2012, ao passo que a população ocupada adulta saltou de 57,6 milhões pra 91,3 milhões (acompanhe na tabela 5 a seguir).

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18 Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 5: Liberdade Sindical e Negociação Coletiva

Tabela 5. Taxas de sindicalização da população ocupada adulta no Brasil, de 1992 a 2012

1992 1996 1999 2002 2004 2008 2012

POA Sindicalizada

nº 10.785.116 11.163.556 11.427.243 13.259.022 15.107.498 16.726.679 15.669.339

% 19% 18% 17% 18% 19% 19% 17%

POA Não Sindicalizada

nº 46.803.447 50.242.767 54.121.148 60.526.596 64.256.563 71.356.795 75.607.238

% 81% 82% 83% 82% 81% 81% 83%

POA TOTALnº 57.588.563 61.406.323 65.548.391 73.785.618 79.364.061 88.083.474 91.276.577

% 100% 100% 100% 100% 100% 100% 100%

Fonte: PNAD/IBGE. Anos selecionadosElaboração: Rodrigues, Ramalho, 2014: 388

7. O Artigo 5°, no capítulo XVII, que trata dos “Direitos e Deveres Individuais e Coletivos”, da Constituição Federal Brasileira de 1988, explicita a seguinte normatização: “é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar”. Normatizando “Atentado contra a liberdade de associação”, o Artigo 199 do Código Penal, de 1940, prevê pena de detenção, de um mês a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência, em situação que venha a “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a participar ou deixar de participar de determinado sindicato ou associação profissional”.

Algumas denúncias de práticas antissindicais no Brasil foram relatadas em pesquisas realizadas pelo IOS no período de 2011 a 2015 (quadro 5). Nesses relatos, não constam o interdito proibitório (que, embora não tenha sido mencionado nas pesquisas, é uma das práticas às quais empresas recorrem para conter greves) e a campanha pela terceirização do sindicato patronal (cujo acesso é público, pela internet). Nas pesquisas, foram relatadas práticas antissindicais contra trabalhadores e dirigentes de empresas transnacionais brasileiras e estrangeiras das

seguintes atividades: agricultura, metalurgia, mineração e comércio e serviços. As condutas elencadas, em nossa interpretação, contrariam o direito dos trabalhadores à livre organização coletiva e autônoma, conforme preveem a Convenção Nº 87 da OIT, sobre Liberdade Sindical e Proteção ao Direito de Sindicalização, de 1948, não ratificada pelo Brasil, e a Convenção Nº 98, sobre Direito de Sindicalização e de Negociação Coletiva, de 1949, esta sim ratificada em 1952 pelo Brasil, além da própria legislação brasileira7.

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19Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 5: Liberdade Sindical e Negociação Coletiva

Quadro 5. Práticas antissindicais verificadas pelo IOS entre 2011 e 2015

Denúncias de trabalhadores e dirigentes sindicais

1. Interdito proibitório¹ (decorrente de movimento grevista) – justificativa das empresas: garantir acesso de clientes e funcionários aos locais de trabalho;

2. Demissão de dirigentes sindicais, trabalhadores militantes ou que participam de mobilizações;

3. Proibição, ausência ou pouca visibilidade de espaços para fixar (murais ou quadros informativos) ou circular comunicados sindicais (portarias, refeitórios, etc.);

4. Ameaças ou punição efetiva (boicote à ascensão profissional hierárquica e de remuneração);

5. Suspensão de pagamentos de salários a dirigentes;

6. Isolamento de dirigentes sindicais, com transferências para outros setores ou remanejamento de funções operacionais (restrição do acesso por demais trabalhadores);

7. Cerceamento à atuação sindical: proibição do acesso às instalações da empresa, ausência de estrutura física, proibição do uso de celular;

8. Assassinatos ou atentados a lideranças ou dirigentes sindicais no campo;

9. Boicotes ou proibição à criação de organizações de trabalhadores nos locais de trabalho (OLT);

10. Mecanismos de vigilância e intimidação (câmeras de filmagem em espaços de realização de assembleias, “olheiros” infiltrados) com posterior retaliação;

11. Coação de trabalhadores à gravação de vídeos com declarações de apoio à direção da empresa;

12. Assédio moral a trabalhador sindicalizado;

13. Veiculação pela internet de resultados decorrentes de processos de terceirização, segundo as empresas: “desmobilização de trabalhadores para reivindicações e greves”², “eliminação das ações sindicais”1; e de situações nas quais é possível cortar ou diminuir gastos com a terceirização: “problemas sindicais, negociações e greves”².

Elaboração: Instituto Observatório Social (IOS)Nota: 1. Interdito proibitório: em situações de greves, consiste em competência da Justiça do Trabalho. Originalmente prevista no Código do Processo Civil, é uma ação de natureza preventiva, que preza a garantia da posse, apropriada de modo que o possuidor, em comprovada ameaça, proponha e receba como segurança uma ordem judicial proibitória para impedir que se concretize tal ameaça, acompanhada de punição se houver falta ao seu cumprimento.Nota: 2. Fonte: SINDEPRESTEM (Sindicato das Empresas de Prestação de Serviços a Terceiros, Colocação e Administração de Mão de Obra e de Trabalho Temporário no Estado de São Paulo). Disponível em: www.sindeprestem.com.br. Acesso em: 11/08/2015.

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20 Trabalho Decente na América Latina: BrasilCapítulo 6: Terceirização

Capítulo 6: Terceirização

Não há no Brasil, até o momento, uma lei específica regulando a terceirização. A rigor, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) normatizou inicialmente, coibindo a terceirização, por meio do Enunciado 256, de 1986, atribuindo ilegalidade à contratação de trabalhadores por empresa interposta - à exceção dos casos de trabalho temporário e de serviços de vigilância, expressando a jurisprudência da época. Desde 1993, a Súmula 331 do TST passou a restringir o trabalho terceirizado aos serviços de vigilância, conservação e limpeza, assim como a funções não relacionadas à atividade principal das empresas – e estabelecendo a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços.

Em 2015, uma nova etapa do processo de flexibilização das relações de trabalho ganhou força, com a tramitação no Congresso do Projeto de Lei (PL) nº 4330/04 – apresentado pelo deputado e empresário Sandro Mabel (à época membro do Partido Liberal - PL/GO) em 26 de outubro de 2004. Aprovado em abril de 2015 no plenário na Câmara e transformado no Projeto de Lei da Câmara (PLC) 30/2015, libera a terceirização das atividades-fim das empresas, além de reduzir a quarentena para a denominada “pejotização” do quadro de funcionários

e diminuir a arrecadação do imposto de renda do executivo federal. O projeto segue no Senado Federal, onde passará por cinco comissões prévias à análise no plenário.

Estimativa de 2013 apresentada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) apontou a existência de pelo menos 12,7 milhões de trabalhadores terceirizados no país, o que equivale a 25% do conjunto de trabalhadores formais. Além de desempenharem jornadas de trabalho mais longas, apresentarem maior rotatividade e usufruírem de salários inferiores, enfrentam maior dificuldade de organizarem-se sindicalmente: normalmente, os trabalhadores terceirizados passam a ser representados por entidades sindicais mais frágeis quanto à capacidade de reivindicação, o que se verifica por meio dos acordos e convenções coletivas negociadas segundo patamares reduzidos, acentuando a precarização da força de trabalho. Outra constatação importante envolve a correlação entre trabalho escravo e terceirização: estudo elaborado por um auditor fiscal aponta que 90% dos trabalhadores resgatados entre 2010 e 2014, nos dez maiores flagrantes de regime de trabalho escravo contemporâneo, eram terceirizados8.

8. Fonte: Repórter Brasil.

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21Trabalho Decente na América Latina - BrasilConclusões

Conclusões

Considerando a gravidade da conjuntura internacional e suas condicionantes ao desempenho da economia brasileira – assim como de outros países emergentes, outrora a locomotiva mundial –, a dinâmica de enfrentamento coordenada pela equipe econômica da presidenta Dilma passou por um revés desde as proximidades do início do segundo mandato, com aperto monetário e ajuste fiscal recessivo, em tentativas de implementação aos tropeços. Em um cenário de súbita e acentuada desvalorização do Real, a elevação das taxas de juros (com a justificativa pelo Banco Central de convergir a inflação à meta), associada aos drásticos cortes dos gastos do governo, agravaram a situação e favoreceram a recessão econômica. O resultado: expansão do desemprego, com queda do rendimento de trabalhadores, da arrecadação do governo e do faturamento das empresas. Dentre as adversidades nacionais e internacionais, a vulnerabilidade da economia brasileira à derrocada no preço das commodities – cujas exportações estão concentradas, sobretudo desde 2012, no complexo da soja, em minério de ferro e no petróleo bruto, cotados internacionalmente –, e em decorrência da minguante demanda global, as receitas nacionais sofrem contração.

Diante do preocupante cenário de deterioração socioeconômica e política no Brasil, os movimentos sociais reivindicam o

diálogo, bem como a adoção de uma política econômica propulsora das transformações e incentivadora da economia, persistindo no propósito de combate à pobreza. Demandam a retomada dos investimentos públicos em infraestrutura; um projeto industrial para o país; novos incentivos à formalização do trabalho; a ampliação das políticas sociais e das medidas de ações afirmativas – que atuem com a finalidade de reparar as desigualdades históricas –; a contenção do avanço e da institucionalização da terceirização, como uma “solução perversa”. Para tanto, a redução da taxa básica de juros consiste em um passo fundamental, aliada a uma oferta de crédito responsável.

Um projeto de desenvolvimento nacional está, portanto, na contramão de propostas que posicionam os direitos trabalhistas em situação de risco, tais como a negociação de contratos de trabalho diretamente entre empregadores e trabalhadores – que possam por em suspensão a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) – ou uma reforma restritiva da Previdência Social. Trata-se de proteger e ampliar as conquistas sociais recentes, impedindo, enfim, que a ortodoxia econômica ou neoclássica conduza a um retrocesso nas condições de vida de trabalhadores, oferecendo, além disso, munição a grupos antidemocráticos e golpistas.

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22 Trabalho Decente na América Latina: BrasilReferências

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