actuais tendências legislativas em matéria criminal · nente no sentido de fazer penetrar os...

17
Actuais tendencias legislativas em materia criminal I. 0 s codigos penais actuais ndo correspondem as aspiraq8es da consciencia contemporiinea. HA um manifesto desequilibrio entre os principios do vigente direito repressivo e os interesses da defesa da sociedade contra o crime. Sente-se a impotencia actual da represdo; reconhece-se a insubsistencia das crenqas tradicionais, impregnadas da utopia generosa do sCculo XVIII, sabre que repousa o direito penal cl~ssico. Mas, embora a hora do crepusculo tenha soado, sem dlivida, para D direito penal aprioristico, a adop~ho brusca dos principios procla- mados em um impeto de fi, por vezes sob forma demasiadamente dogmiitica, pela escola criminal positiva, apresenta-se praticamente impossivel. 0 s interesses criados em t6rno da presente organiza~Co iuridica s5o'enormes; todo o project0 de transformaqho radical levan- aria tais resistencias que o tornariam irrealizdvel. k outro o caminho que se procura seguir. Em todos os paises .IS esforgos dos criminalistas de todas as escolas convergem actual- nente no sentido de fazer penetrar os novos critirios na velha orga- iizagCo legal. Existe urn direito criminal em forma~so,que pode :onsiderar-se como uma formula de transi~do para o positivismo ju- ridic~; defendendo ou repelindo as premissas do direito clAssico, in- tenta vivified-lo mediante certas aplicagGes, essencialmente praticas, das novas doutrinas. Poder-se-ia caracterizar deste mod0 o actual momento da sciCncia criminal: a) por obra da escola positiva, apos trinta anos de crise, a escola cllissica perdeu, definitivamente, autoridade e sequazes; b) domina, presentemente, urna orientaqiio ecletica que procura efectivar alguns dos postulados fundamentais da escola po- sitiva e que representa, pois, uma vitoria parcial desta;

Upload: vonguyet

Post on 28-Jan-2019

212 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Actuais tendencias legislativas em materia criminal

I . 0 s codigos penais actuais ndo correspondem as aspiraq8es da consciencia contemporiinea. HA um manifesto desequilibrio entre os principios do vigente direito repressivo e os interesses da defesa da sociedade contra o crime. Sente-se a impotencia actual da represdo; reconhece-se a insubsistencia das crenqas tradicionais, impregnadas da utopia generosa do sCculo X V I I I , sabre que repousa o direito penal cl~ssico.

Mas, embora a hora do crepusculo tenha soado, sem dlivida, para D direito penal aprioristico, a adop~ho brusca dos principios procla- mados em um impeto de f i , por vezes sob forma demasiadamente dogmiitica, pela escola criminal positiva, apresenta-se praticamente impossivel. 0 s interesses criados em t6rno da presente organiza~Co iuridica s5o'enormes; todo o project0 de transformaqho radical levan- aria tais resistencias que o tornariam irrealizdvel.

k outro o caminho que se procura seguir. Em todos os paises .IS esforgos dos criminalistas de todas as escolas convergem actual- nente no sentido de fazer penetrar os novos critirios na velha orga- iizagCo legal. Existe urn direito criminal em forma~so, que pode :onsiderar-se como uma formula de transi~do para o positivismo ju- r idic~; defendendo ou repelindo as premissas do direito clAssico, in- tenta vivified-lo mediante certas aplicagGes, essencialmente praticas, das novas doutrinas.

Poder-se-ia caracterizar deste mod0 o actual momento da sciCncia criminal:

a) por obra da escola positiva, apos trinta anos de crise, a escola cllissica perdeu, definitivamente, autoridade e sequazes;

b) domina, presentemente, urna orientaqiio ecletica que procura efectivar alguns dos postulados fundamentais da escola po- sitiva e que representa, pois, uma vitoria parcial desta;

c) os cultores da sciencia criminal, abandonando o campo filoso- fico, entregaram-se a elaboragiio dogmatica do direito cri- minal, procurando apresentar uma sistematizagio analoga ii das denlais disciplinas juridicas, ligando o direito criminal a todos os outros ramos do direito public0 e procurando aplicar hquele as mais recentes doutrinas que t2o largo des- envolvimento deram a @ste (orientagab dogtnatico-sistemk- tica da scif'izcia criminal);

d ) os partidarios da escola positiva, depois de se tercm ocupado, nos primeiros tempos, preferentemente, de estudos antro- polcigicos e sociologicos, veem apresentar uma organiza~iio juridica da sua concepsCo do direito repressivo, intcgran- do-o no sisten~a de todo o direito e mostrando as modifica- q6es q i ~ e a doutrina positiva da defeza contra o delito intro- duz nos dominios da filosofia do direito e nos outros ramos da scitncia juridica (fuse jrtl-idica da escola positiva) 1.

De autor para autor e de projecto para projecto varia, porem, a parte com que contribue a moderna criminologia: escessivamente li- mitada em alguns" pretende ser em outros uma sistemiitica revis50 das reformas juridicas conciliAveis com as suas bases presentes 3, ou uma coordenaqlo prlitica de meios defensivos sen1 subordinas20 aos conceitos de crime e de penaS, ou uma politica criminal de limites juridicos imprecisos 5 , ou uma reconstrug50 juridica baseada na defesa social6, ou uma reforma sabre bases mixtas, admitindo-se o velho criterio para a repress50 e o novo para a preven~50 da criminali- dade7, ou um sistema geral de luta contra a delinquencias, ou urn

1 Como ensaios de constru$io dogrndtica do direito criminal nlerecern ser ci- tados: Rocco, L'oggetto del redto e della trrtela gilrridica pettale, ,Torino, 1913; HIRSCHBEIIC, Die Schlrtjobiekte der Verbrechen spejiell rrnters~rcht an den Verbrechen gegert den Eirt~eln, Eine Konstrukfiv degtrtatische Studie ~ugleich eiir Beitrag jur StrJvechtsrefornl, Breslau, I g lo.

2 RODOLEO RIVAROLA, Derecho penal argentino, hladrid, 1910, pig. 47 e segs. 3 CONTI, Diritto pertale e suoi lirniti nnf~rrali (Le trltinze sistenla~ioni proposte),

Cagliari, 191 I, pag. nor. 4 PEDRO DORADO, Estudios de derechopenalpreventivo, Madrid, !go I , pig. 7 e segs. 6 VON LISZT, Traite de droit penal allernrrrtd, trnd. par LOBSTEIN, tom. I, 191 I ,

p8g. 94 e segs. 6 FRANCHI, I1 sistenla gilrridico della difesa sociale e i suoi presupposti storici e

antropo-sociologici, apud Sclrola Positiva, 1910, pdg. 102 e segs. 7 SII.VIO LONCHI, Repressione e prevert~iorte nel dir i t~o penale nttunle, Milano,

igt t , p6g. 779 e segs. 8 THOMSEN, Das deutsche Strafrechts, Berlin, 1906, pig, 15 e segs,

2 9 ' vote UI. l 4 . O 3

onjunto de medidas tendo por fim assegurar a mhsima defesa contra 1s individuos perigosos, permitindo a mdiima rehabilitapio dos re- ldaptdveis a vida social ', ou um sistema que, baseado na identidade ie pena e medida de seguranGa, funda a prevenq50 e a repress50 pe- la1 2.

8 Surge, pois, urn direito criminal em formaq5o. E existe n5o so no espirito dos criminalistas, mas em todos os ensaios de reforma penitenciaria e nos novos projectos de codigos criminais.

2 . Como prirneiro factor deste movimento de reforma apresen- ta-se nos a insuficiencia da rcpress5o. Ndo que a conscie^ncia popular censure ao direito bend vigente a renuncia ao: pr-uccssos abomindveis que a revoluqCo francesa definitivamente condenou. HA mais dum sCculo que se discute, i certo, se C necessario op8r ao criminoso a indulg&ncia ou o rigor: discutia-se isto quando, na clara luz do cCu de ItAlia, H~cc.\w~.\ glorificava a humanidade, ao mesmo tempo que, nas brumas de S. Petersburgo, DE MAISIRE se pronunciava pelo al- goz; e discutiu-se, decorrido mais dum siculo, quando T o ~ s r o r , vendo no crime uma forma de sofrimento, Ihe opunha a piedade, ao passo que NIE-IZSCH~:, considerando o vicio e o sofrimento corno uma invasa'o da espicie superior pela inferior, via na piedade uni factor de deca- dencia e n5o a admitia contra o direito do mais forte.

Mas a humanizaq50 do espirito publico, conquista definitiva do belo impulso do racionalismo filantropico, repele as tentativas de al- guns espiritos paradosais 3 no sentido do restabelecimento dos castigos corporais e at6 da tortura.

0 s exemplos da lei norueguesa de 12 de dezembro de 1903 6, do c6digo penal egipcio de 14 de fevereiro de 1 g o 4 ~ , do codigo penal da

Josd INGEGNIE~OS, crintitio!ogio, Madrid, 1913, p8g I I .

2 GRISPIGNI, L'odierttn scieti~n cr-iniirlnle i l l I~alin, apud Scuol'7 Positivn, 1909, pig. 257 e segs.; I1 ttuovo diritto critnitlnle tiegli nvnnlprogetli della Sv i~ jern , Ger- nrniria c d Atrstria, Milano, I gr I , pAg. I e segs.

3 Vid. CUCHE, Trait6 de sciettce el de IegislatioapPttitei~tinirc) Paris, 1905, phg. 228

e segs.; H. LAURENT, Le jotlet contre le crirtte, Paris, 1913, pBg. 17 e scgs. 4 Restabelece os castigos corporais para os condenados com menos de 18 anos

de idade ou para aqueles que tenham sido privados do exercicio dos direitos poli- ticos. 0 director da prisiio niio pode, portm, ordenar esta medida disciplinar sem parecer d o mCdico e aprovaqiio do Conselho da pris50. E as estatisticas provam que ela tern sido, eplicada pouco freqtienten~ente: de 1903 a igo7 empregou-se o chicote em go/^ dos cosos em queefoi necesshrio recorrer a meios violentos.' Actes dti corrg1.i.s pe'nitet~tinire ir~te~~rlntiottnl de Budopest di 190.5) 1906, tom. iv,

pig. 421 e segs. b 0 artigo-61.0 de^ste codigo prescl-eve que, 3e o condenado tiver mais de ji e

Coreia de rgoj 1, cia lei inglesa de 1 3 de novembro de 19125 fificdm como provid@ncias transitorias, excecionais, que os costumes far50 bcm cedo revogar.

Assim, na Dinamarca, onde a opiniCo publica, impressionada corn o progress0 da criniinalidade, levara a publica~lo da lei de I de abrii de 1905 s8bre penas corporais, eram estas abolidas, com aplauso ge- ral, pela lei de I de abril de 191 I . A Holanda e a Bilgica, a Tur- quia e o Si5o acabam de abolis - estes dois paises a pena de aGoute, aqueles todos os castigos corporais; no impirio moscovita.punha-se terrno pelo ukase de 30 de julho de 1903 ao regimen do Roqgui, do plet', do ktzout.

0 s costumes, mais fortes do que as leis, restringiam dia a dia o campo de aplica~5o dos castigos corporais na Russia; o manifesto do tzar, daquele ano, pode bem considerar-se como o ponto de partida para a sua aholigiio geral.

E o inquirito aberto em 1908 por D ~ R I \, director geral das pris6es itqlianas, em que depozeram tantos dos mais nothveis cr~minalistas europeus, mostra bein que i impossivel o regress0 ao sistema penal do antigo regimen 3. ,

Reconhece-se, porCrn, que o sistema que os codigos modernos substituiram ao antigo regimen repressive, e que repcusa e-ssenciak mente s6bre as penas privativas da liberdade, nCo garante suficiente- rnente a ordem e a seguranqa social: t urn facto inegdvel que as penas

menos de 1 5 anos de idade, o juiz, em lugar de pronunciar as penas previstas na lei em mattiria de crimes ou delitos, poderh fazer aplicar ao menor unla pena afli- tiva ou condeni-lo a receber um determillado n61nero de aqoutes, nEo excedente a 1 2 em matiriii de contraven~50 e a 24 quando se trate de crime ou delito. Deve, todavia, dizer-se que em 1915 foram criados no Egito tribunais especiais para crianqas, suavizando-se o tratamento dos menores delinquentes. At6 1910 tinharn sido submetidos a correcqiio corporal I ,384 dos 5.294 drlinqi~entes menores julga- dos nos tribunais egicios. C H ~ ~ I ~ O N , Les jelrrtes dclirlq~rnr~ts en Egypre, apud Revue pinifentinire et de droit pPnnl, 1906, p8g. 770 e segs.; HASSAU R A ~ ~ A T , Les jeurtes delirtqunnts, Paris, 1913 , p8g. IOS e segs.

1 0 artigo 672.0 dispBe que aserh p u n i b com 40 aqoutes todo aquele qud tiver 2ito o que n'io devesse fazer; se se tratar de facto grave, a pena ser i de 80 aqoutes.. ~ O I S S O N A D E , Code pennl corearr, apud bkvlre pillitentinire et de droit penal, 1905,

phg. 598 e segs. 2 Prescreve o aGoute para os souterlelrrs e pproxenetas do sexo masculine. Mas

o resultado da votaqPo parlamentar mostra-nos q~re os castigos corporais estiio em desfavor na Inglaterra: a lei foi aprovada por uma maioria de quatro votos. k es. tamos bem longe da aplicaq80 do Gnrotters nct de h i poucas dicadas.

'

3 Refererldurn slrr 1e sysfCrrle de golrverrlerrzerlt des detenus indisciplirtk, rebelle8 ct ng i tk~ , dnrl~ les etablissenrertts per~ifentiaires, apud Rivist.7 di disciplirle cbrce- rarie, 1908, pdg. 41 e wgs,

nsertas nas leis penais n5o s5o exemplares, n5o intimidam o crimi- loso e raramente o corrigem. Pelo contrlirio, precipitam-o, nCo raro, mais adiante na via do crime. 2 N5o o reconlieceu o prciprio legisla- dor, prescrevendo em certos casos a suspensZo da pena, cujo fim 6 , precisamente, preservar o delinquente dos perigos de corrup~Co da prisCo ?

A estatistica mostra, de facto, o continuo aumento das infrac~Ses, tanto nas suas formas legais e contravencionais, como nas naturais I .

Eis alguns dados quanto aos principais estados europeus:

t Individuos condenados por crimes . . . . . . . . . . Franqa

e delitos de roo a 181 (em 70 anos)

Idem por contravenqbts. . . . . de roo a 398

1810-1842 1893-1895

Bilgica [ Individuos condenados por crimes e delitos . . . . . . . . . . de IOO a 192

(em 50 anos) 1 Idem por contravenqbes. . . . . . de loo a 135

i8&-18842 1893-1895

I Individuos condenados por crimes

. . . . . . . . . . Alemanha e delitos de IOO a 125

(em 14 anos) Idem por contravenqiies. . . . . de loo a 172

1873-1875 1893-1895

Ithlia . . . . . . . . . . Individuos condenados por crimes

e delitos de ICO a 128 (em 23 anos)

Idem por contravenq6es. . . . . de IOO a 136

' Individuos condenados por crimes Austria . . . . . . . . . . I e delitos de IOO a 368

(em 29 anos) Idem por contraven~6es. . . . . de loo a 173

1 Constitue excep~50 a Inglaterra. HA 50 anos que o decrescimento do nG- mero das infraqiies graves se vem produzindo quk i regularmente; e, embora o numero das infrq6es leves tcnlla progredido, deve notar-se que 81e comprcende factos destituidos de todo o caracter delituoso.

A estatistica acusa quanto As irtdrctnble o f inces : Midia anual

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1861-1865 91.651

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1881-1885 94,473

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1901-1905 87.591,

2 A estatistica criminal alen15 foi publicadil pel8 primeira re2 em 1884; o pri- -: . r m a qn\i,*n.cp 30% ye~y,\ta\l~s judicihrios de 1882.

/I

c4ctunis fend4rrcins legislativas en1 titate'rin ci-i~tzianl 435

i 885 1895 Individuos condenados por crimes de I oo a I 56 Idem por contravenq6es. . . . . de loo a 215

1835-1837 1893 1895 Individuos condenados por crimes de loo a 96 Idem por delitos e contraven~6e.s de loo a 176

1883-1885 1893-1895 Individuos condenados por crimes de loo a 108 Idem por contraven~Bes . . . . . de I oo a I 14.

Para se avaliar com precis50 o aumento da criminalidade nos pai- ses e nos periodos acima indicados, deve ter-se em vista a causa mais gcral e constante daquele aumento: o progress0 da popula~lo. Nos periodos correspondentes aos do acrtscimo da delinquencia verificou-se o seguinte aumento proportional na popula$io dos varios estados:

F r a n ~ a . . Bdlgica . Alemanha Italia . . Austria . Russia. . Inglaterra Espanha .

E m Portugal, a estatistica mostra, quanto ao continente, os se- guintes rcsultados proporcionais no period0 de trinta e dois anos:

1878-1881 1891-1895 1903-1910

Individuos condenados (media anual). . . 7.647 1 7 . 0 1 ~ ~ 17.078

. . . . . . Aumento de IOO a 222 a 223.

E a popula~Zo do continente aumentou

de 4.160:315 a 4.660:095 a , 5.021657 (censo de 1878) (censo de ~Fgo) (censo de 19-0)

0 s quadros scguintes mostram, quanto aos acusados e condenados por todas as categorias de infraccBes, as cifras efectivas e as cifras proporcionais a 1oo.000 habitantes, em alguns dos principais paises :

L

Alemanha ~ u s t r i a Bilgica

20?.3?2 172.694

1% . . . 561.13 4 6 110 I 1.050 Slo 562.go. ) 1 8 3 . . . 579,752 454 21 I ' 1.042.S35 558.061 1891, . . . 580.615 456.999 ! 1 .oli5.10? 575.1 81 223. ~:I!I 188.705

1898 . . .

1 - 585.883 244.045 -,

687.099 539.270 / - 600.399 z~g.q5a - - 598.883 225.863 - I - - - 508.355

.- I I I

0 s nlimeros que apontamos, sujeitos a correcq6es, dada a imprecis50 dos elementos estatistico. em a l y n s paises, foram, quanro i Espanha, por nos directamente colhidos da Estatistica de la ad~~rinistrocron de j t i . , l icr ,z en lo crir~zinnl en la penis~cla e i s l ~ s adjacentzs, publicado For el Minislerio de Gracia y Jrrsticra; relativamente' A Franqa, do Comote grneral de I'ad~ninistralron de la justzcr cr.rmineIle, presente au President de IJ Repubfiqur p a r l e Garde dm S m i , r inis t re de la justice; quanto B Itilia, dos Annali d i statistics, Attf delta Cummissimte per la stntisfica prridr;iaria e trotdrile. Para os demais paises: Bosco: La criminalitil in variipaesi d'Europa, Roma, rgo3; Archives d'atathropohgie crimz- nelle, de n~edtcir~e Icgnle el de psych do,:^^, noi-~rmle et patlzologique; Revue pe~titenfiaire et de droit penal; Rivista penale di dottrina, legislaiione z jurisprude?rqa; etc.

Espanha Frilnqa Inglaterra Italia Portugal Russia

Acnsa-

120.623 123.720 118.538 125.347 132.324 113.593 144.903 124.785 -

134.719 150.828 121.712

Conde-

94.218 97.872 95.014 99.508

121.303 96.267

114.261 115.482 - 100.314 106.325 89.447

- 410.Sj.S - - 46.242 -

-

- Acusa- Conde-

ddvr Inados

15 835 16.207 17.744 17.675 17.449 17.827 18313 15.102

- - - - - -- - -

695 497 G q g X Y S 704 2 2 1

70i.iki2 701768 665.413 6b8 go3 6791333

- - - - - - -

-

Acusa- do=

750.035 744835 723459 661.667 6p.611' 679.018 720441. 749.716 796.824 811.816 770.853 ,

664.506 669.423 671.951 674.189 667.279 623.922 631.224 648.+72

Conde- nados

615.163 611628 589.512 514.91:4 538.183 529 837 565.397 593.525 642.647 65.977 62t.706

Acusa- dos

547.383 600182 ti16.308 594.175 622.300 624.182 644.103 668752 693 I 7 724.584 (i60tirg m.514 79241$1 1 617.139

(i58.119 , 6 ~ 7 . ~ 9 5 GGz.138 631.815 CXit.q1g 631.531

Conde- nrdos

135.753 360.235 370.30' 321.509 370.144 360.28g 377.445 416.183 424.855 458262 395.382 +0Foi.125 632.419

Acusa- dos

- - - - - - - - - - - - 602214

Conde- nador

- 16.642 16.367 18.047 16.91 17.972 - 17.242 - - - - -

-4cusa- dos

55.541 57.344 57.417 - -

49.140 49.177 43.493 59.989 54.244 65.W 80.460 81.207

Conde- nadus

38.8~1 39.241 39475 - -

30 341 30.610 35 275 40.155 49.7I)(i 96.344 54.789 5 3 . : ~

Cifras proporcionais a 100.000 habitantes

--

Anos

Alemanha Austria I BClg;ca

Acusa- dos

Fspanha

Acusa- Conde- dos nados

-- -

- 1 - I

f x ~ , j y 1 5 7 7 , ~

Conde- nados

Franga

- ,

-

740902

-

6 6 0 , ~

Inglaterra

Acusa- dos

--

- 1.829~43

- - .

1.718,61

- I .665,22

-

-

- M.75

-

417.23

-

Itilia

Acusa- dos

-- -

2 qa .,pa

- -

2.412,10

-

2.373,28

-

Acusa- dos

Conde- nudos

-

1.746127

- . - 1.636,52

--

1.586~86

-

Russia E = - Portugal

Conde- nados

-

.1.950,55

-

1.918,zo

-

1.gq3,07

-

Acllsa- dos

-

1 . 9 4 5 , ~

- -

2.115,go

-

1.997.06

-

Conde- nados

Conde- nados

----

-

1.148,48

-

-

1.zQ.53

- 1.235,13

-

Acusa- dos

- - - .

- - - - -

--- 3 Conde- nados

- -

363

- - -

- 3w78

Acusa- . dos

53,bp

Acusa- dos

z - Conde- nados 2

K -- g 37,& 08.

Conde- nados

0 progressive increment0 do delito manifesta-se especialmente no aumento da reincidencia e da delinquencia precoce. 0 progress0 da reincidCncia t urn fenomeno desolador revelado pelas estatisticas de quasi todos os paises. Surge Cle com maior frequCncia nas formas de delinqutncia habitual, constituindo at6 urn dos caracteres especi- ficos desta. Mas o seu acrkscimo verifica-se a respeito de todas as categorias de criminosos.

Em Franqa, o numero de reincidentes aumentou, de 1880 a 1905, na proporg50 de 31 O/o; na Italia fez-se sentir, de 1890 a 1907, o acrks- cimo de 33 O/o; na Btlgica, a proporqa'o das infrac~6es cometidas por reincidentes passou de 38,5O/0 em 1899, a 41),fi0/0 em 1907; na AUS-

tria, de 1885 a 1904, aumentou 12O/0; n3 Inglaterra, a percentagem de reincidentes s8bre o numero total dos condenados foi de 50010 em 1893 e de 58,J OIo em 191 1; na Alemanha, passou de 26O/0 da cifra total dos condenados, em 1882, a 44,9O/0 em 1904.

Em Portugal observa-se o seguinte aumento no numero das rein- cidtncias :

Numero Propor$Bo por de reincidentes loo crirnint~\os

de 1878 a 1880 (media). . . 563 7.6 d e 1 8 9 1 a i S g 5 n . . . 3.092 1 7,6 de 1903 a 1910 n . . . 4a077 23,s.

Vejamos ainda os numeros relatives B delinquCncia infantil. Entre os caracteres que distinguem a criminalidade actual, encontra-se o da maior precocidade, o que faz com que ela tcnda a tornar-se tambCm mais tenaz, ja que a corrupqho cedo originada cria naturalmente um estado de degenerescencia mais dificil de reparar.

E m todos os paises se nota esta alteraqdo profunda da moralidade das crianqas.

Na Alemanha, o numero de criminosos de I 2 a 18 anos elevou-se de 30.697, ou seja 568 por cada 1oo.000 individuos dessa idade, em 1882, a 87.219 ou 851 por cada 1oo.000 em 1913.

. Segundo JOLY, um dos mais activos investigadores franceses no dominio dos estudos criminais, o conjunto dos delitos dos menores de 18 anos nho excedia no seu pais I 3.500 em 1841 1 em I 910 ascendeu a 33.136.

Na Itilia, nota-se constante acrCscimo dos criminosos precoces: de 1880 a 1887, os menores de 21 anos representavam 15 "/u dos con- denados pelo juri, zoolo dos condenados pelos tribunais correcionais. De 1895 'a r%g a percentagem elevou-se, respectivamente, a 27 O / o e a 3 2 O/O.

Na ~ u s t r i a a delinqhencia infantil aumentou 27010 no periodo de

c4ctuais fe1td41zcias lcgislativas ein ~nateria criiniital 439

I 88 t- I go r ; na Hungria, os condenados de I 6 a 2 0 anos do sexo mas- culino subiram de 1895 a 1898 de 14 a 15 O/O e os do sex0 feminino de 18 a 31 O/o do conjunto de criminosos; na Holanda duplicou o nu- mero de menores criminosos no period0 de 1874 a 1894; na Russia a delinquencia precoce aumentou em vinte anos, de 1874 a 1894, 18,5 O/o; na BClgica passou de 141 por 1oo.000 habitantes em 1888 a 346 em 1 ~ 1 2 .

Sd a Inglaterra constitue excepqa'o ao acriscimo da criminalidade precoce: o numero de menores coildenados a prisCo passou, a des- peito do aumento da populaqiio, de 13.981 em 1856, a 8.801 em 1861, a 3.835 em 1891 e a 1.358 em 1899.

Da nossa estatistica resulta a seguinte mtdia anual de criminosos menores de vinte anos de idade:

1878-1880 1891-1895 1903-1908

Condenados . . . . . . . I . o p 3.384 3.397 Aumcnto . . . . . . . . de loo a 309 a 320 Por I .oon habitantes . . . I ,ti 438 5.

A confian~a na acqiio benkfica da pena privativa de liberdade dis- sipou-se. A prisso 6 , em si mesma e corno meio comum de repres- Go, um cxpediente ilogico, contraproducente e anti-scientifico. As penitenciarias, grandes edificios onde o remorso pudesse visitar co- modamente a alma do crirninoso, trabalhando-a no arrependimento e na regcneraq50, foram proclamadas a maior aberraq50 scientifica do sCculo xrx; a prisCo foi considerada uma das causas principais da rei- teraq5o do delito, a ponto que urn criminalista niio duvidou afirmar que ccle meilleur moyen de rendrc la prison eficace c'est encore d'y mcttre le moins de monde possible)).

3. Mas a corrente de reforrnas nos dominios da legislaq50 crimi- nal n'5o 6 deterrninada exclusivarnente pel0 sentimento da insuficiencia dos actuais meios repressivos: tern causas mais profundas. 0 s novos rnttodos de observaqiio permitirarn acumular urn material vasto e com- plexo que veio servir de base a reconstruqiio positiva do saber; as disciplinas incorporadas nas scie'tzcias do espirito (Ktilttri-wissenscl~aft) parecem encarninhadas a transforrnar-se rlipidarnente em scie'izcias d a n~tlii-c.;a (~\T~~t~ir~uissensc-lzaft). As sciencias sociais clue, na antiga concepqiio, se integravam nas primeiras, adaptam-se, nas suas moder- nas expressGes, aos critsrios e metodos das segundas '. Sob a in-

i Na filosofia scientifica define-se jA uma dupla tendhcia, altamente proveitosa para o desenvolvimento da cultura moderna: por urn lado C, evidente o prop6sito.

440 ljevisla dd f i t ive~*sidacie de Coim bra

fluencia destas tendCncias, foram submetidas a uma andlise severa, qud8i sempre profunda, mas n5o raro esagerada na intransigencia da sua critica, as no@ principais e a t i ent5o indiscutidas, que formam a base da actual organiza~5o juridica; o direi~o penal nCo podia con- servar-sc afastado dCste movimento de renova550 e transformou-se por sua vez.

Para estn transforma#io concorreram os alienistas, que, desde os inicios do s6culo xlx, vinham cstudando a biologia dos delinquentes nas suas relaq6es com a responsabilidade criminal. Desvanece-se a figura ideal do louco, criada pelas legislaqbcs penais, esbo~ando-se, em substitui$io, a do homem delinquente. A longa lista de alteraq6es mentais, as suas f o ~ m a s cada vez menos objectivas, mais delicadas e ocultas a simples vista-critirio unico a que a t i entCo se recorria; o seu caracter relativo, no duplo sentido de se manifestarem em uma so ideia ou sentimento e de concorrerem (e nCo se sucedereni como na antiga teoria dos intervalos Iucidos) com os estados de saude; a re- produggo de figuras juridicas de delitos em numerosas psicopatias - . .estendendo as fronteiras da enfermidade mental, reduzem o campo da delinqutncia clAssica e preparam a esplicaqCo da natureza m6rbida do delito.

PINEL c ESQUIROL haviam encerrado o cizlo cios mttodos aflitivos e propriamentc penais contra. os loucos, 1anl;ando as bases da psicluia- tria; e, meio sCculo depois, MOREI. viria considerar a degenerescencia .corn0 um desvio morbid0 da normalidade hurnana primitiva, e, estu- dando a funqBo da hcreditariedadc na ginese e desenvolvimento da- quela e a evo1uc;Co do process0 psicopatico, chegaria a estabelecer, pela primeira vez, as rela~6es entre a criminalidade e a degeneres- chc ia .

DESPINE viria ocupar-se do aspecto psicologico do criminoso, des- cobrindo no delinquente habitual uma anomalia moral caracterizada pela falta .de remorso; e M.\UDSLEY, uma das figuras mais salientes da sciOocia mental contemportinea, procuraria fazer o diagncistico do delinqhente como urn Iouco moral, notando a existencia duma vasta zona rn&dia entr-c a cnfc.rmid;tde mental e a delinquencia.

E, apbs 0s progresses da fisiologia e da patologia mental, chega- va-se a constru@o duma scitncia positiva do homem: a antropologia.

de ultrapassar a fase spenceriana, depurnndo o seu sistema de alpuns residuos teo 16gicos e escolisticos quc perturbam a sua unidade; por outro, e visivel o pertina. esf6rco para a progressiva revislo do dogmatism0 rnrtterialista, demasiadamentc rigido e esqucniitico, mcdiante uma crilic<l filos6tisa bdsea~la na incessante amplia

. $50 da experiGnz~a

c9ctuais telzddrtcias legislativas eilz ~trateria criinitlal 441

Foi sdbre o tronco da antropologia geral que LOMBROSO criou o ramo da antropologia criminal, traGo de unigo podefoso entre a psiquiatria e a justi~a penal, que veio traduzir o voto de C~CERO, de que < a na- tureza do homem que-se deve ir buscar a natureza do direito.

Abria-se assim a crise presente do direito penal. 0 s socidlogos e psic6logos convergiram a essa crise por outra via, introduzindo o conceit0 genktico-evolutico no estudo das instituic6es juridicas, de- monstrando a a c ~ 5 o dos factores ,sociais na origem da delinqusncia e investindo contra os prciprios fundamentos da responsabilidade crimi- nal.com as conclus6es da nova psicologia biologics 'e determinista.

0 act0 de f i sabre o qua1 assentava a obra da repressgo, a crenca na eficacia durn castigo expiatorio, infligido ao criminoso em nome cia justiqa eterna e na medida exacta da sua responsabilidade moral, na'o resistiu a tais investigaq6es.

A escola classica, admitindo que o acto esta integralmente contido no pensamento, ve sempre no crime a exteriorizaqgo dum pensamento criminoso. 0 delinqi~ente C pufiido porque C responsavel; t respon- sAvel porquc o seu acto C consciente e voluntdrio. A pena, no sentido cliissico do termo, C o ilnico remidio possivel para o delicto, a unica possivel compensaqIo da fitlta cometida.

Construia-sc unl tipo susceptive1 de servir de medida comum da humanidade; a aprecia~go da culpabilidad-c do delinquente, segundo esta medida comum, ngo exigia o concurso de psicologos profundos: bastaria um gcometra capaz de comparar com a medida adoptada os desvios que constituem o delito.

A moderna criminologia veio repclir esta antiga concep@io penal. Abandonava-sc a base traditional e classica do jitizo repressive- a responsabilidade subjectiva do criminoso, adoptando-se uma base ha i s objectiva - o principio da defesa social 4 .

A psicologia cliissica desconhecia as f 6 r ~ a s psiquicas que explicam a nossa actividade, quando reduzia toda a nossa personalidade moral a sste elemento irredutivel- a vontade inteligente e livre ; csquecia-se que nits somos, , como diz Hori.~.r;ous 2, uma diversidade instavel; a llossa vontade ngo pode ser considerada conlo uma abstraq5o desta- cada da realidade.

A escola positiva, reconhecendo que o crime 6 um fenbmeno es-. tritamente relacionado com a organizaqc& bio-social do individuo,

1 Contra a funqgo de defesa social, assinada A pena pelos positivistas, pronun- ciou-se recentemen te COCURULLO, Lliritto perinle e jfirrzi-iorie prever~tivn, Roma, I 91 2,

pig. 3 e segs. 2 BOUTROUX, Sciet~ce et religiorl, Paris, 1938, pig. 301.

. .

442 Revista da Urziueri idade de Coinzbra

abandona o terreno da responsabilidade e do castigo, que ainda con- serva o caracter da antiga vingan~a, cruel e ineficaz; e, em troca, procura a emenda do crirninoso, se possivel, ou limita-se a defender a sociedade dssse elemento perturbador. A defesa social C, pois, a base racional durn sisterna punitivo scientifico, exclusivamente propor- cionado h temibilidade do delinquentc.

0 tipo convencional do homem normal ou midi0 foi preterido: o homem midio nc?o C sengo uma formula matematica, que elimina tudo o que 6 individualidade, originalidade e diferen~a e reduz tudo ao esquema abstrato durn ser que na'o existe, porque uma midia nCo corresponde a nenhuma realidade viva.

Mesmo supondo que fosse possivel tentar um ensaio de generali- zaqiio, diz com razz0 o eminente criminalista PKINS 1, o que se encon- traria mais frequentemente niio seria o homem normal, mas o anor- mal. Desde o irregular, o excentrico, o indisciplinado, o vagabundo em busca de aventuras, at6 ao insuficiente mental e moral, ao ma- n i a c ~ , ao alienado ou ao idiota profundo, ha graus infinitos de estados incompletos ou defeituosos, cuja midia nso da, de mod0 algum, o

homem normal. E se os criminalistas ndo demonstraram a existsncia do criminoso-

nato, como a escola lombrosiana defendera 5 e es alienistas n lo teem, por emquanto, dcfinido os caracteres que distinguem o homem normal do anormal, assentaram, todavia, de maneira definitiva, que um grande numero de criminosos s l o portadores de fundas taras hereditarias ou adquiridas.

Ninguem pode negar a presenqa nas pris6es dum grande nurnero de individuos defeituosos 3.

E m Inglaterra, em 1907, cornputava-se em ~oO/o o numero de de- generados encerrados nas pris6es; em loO/o o dos defeituosos nas Workhouses; em 62 O/o o dos anormais nos State Reformstor-ies 6.

1 A. PKINS, t n deieilse socinle et les tmi~sformntions dlc droit pe'ltnl, Brurelles, I!)lO, pig. 7.

2 S6bre a base das anomalias morfologicas do individuo, a escoln lornbrosiana procurou construir urn tipo delinqhente especial; nPo viu que se tratava simples- mente do tipo degeneratiro comum e que os estigmas que se consideravam espe- cificos da crimirlalidade s6 eram os Ja degenerescEncia observactos nos criminosos mais degenerados. Deve dizer-se que o estudo das anomalias morfologicas dos crirninosos cedeu o passo ao das suas anormalidades psicologicas. Vid. PATRIZI, Ln-fi~se psicologic~ del l'ailiropologia criiltiitnle, Torino, 191 I .

3 A estatistica organizada por KOHLMANN acusava ern 1901 na SuCcia I dege- nerado por 500 habitantes, nos Estados-Unidos I por 700. Na Belgica, D e s ~ o o n corilputa esta proporqSo ern r degenerado por 850 habitantes.

Blire Book, London, 1908, tom. vrr.

Na Bilgica, s6bre 5.000 vagabundos que passam anualmente pela prisCo de Bruxelas, encontrou VERVAECK 400/" de defeituosos 4.

Para estes, a escola classics, quando 1-60 considerava as suas ano- maiias psiquicas como causas extintivas de responsabilidade, inven- tava as formulas da responsabilidade atenuada e da pena atenuadae, quando C certo que, podendo o defeituoso menos responsive1 ser tam- bem o mais perigoso, uma pena rcduzida comproniete neste caso a seguranqa social. Na conferencia fcita na Escola dos Altos Estudos de Paris, em 1913, notava o professor GILBERT BAI.I.E.~, que n l o hA espirito de justiqa nem medida de protecq'5o social, mas um verda- deiro perigo, em procurar causas de atenuaqiio na inferioridade mental dos defeituosos 3.

E 1120 6 SO a concepqho simplista do homem normal que nCo cor- responde hs esighcias actuais; 6 tambem a das relaqiies entre o in- dividuo e o ambiente. A doutrina cldssica isolava o individuo de tudo o que o cerca e analisava sobretudo a sua vontadc no momento em que a infraqho f8ra cometida; a moderna crirninologia liga o individuo ao ambiente: a criminalidade n5o 6, em ultinia anlilise, sengo uma das formas da vida social. 0 ritmo do crime acompanha o ritmo da acti- vidade honesta. Na sua marcha progressiva, a civiliza~go encerra como que uma f8rqa de absorqgo do delito, porisso que depois de ha- ve-la determinado, devera a propria delinqu@ncia, originando sucessi- vamente novas formas do crime.

A opiniCo publica, instruida destes problemas, sente que as antigas formulas se tornaram insuficientes e reclama as reformas necesshrias para o restabelecimento da disciplina social.

4. 0 movimento de reforma iniciou-se For toda a parte. Reformas prdticas que foram surgindo gradualmente e em forma

I VERVAECK, Existe-I-il tirl type mlthropologique du vngnborld en Belgiqtre?: Bruxelles, 1907.

2 Vid. Cotnpte-rendt~ dlr Congt-Ps de Neltrologie, Geneve, 1907, tom. I, phg. 25

A doutrina da responsabilidade atenuada teve no entanto, rccentemente, a ades5o digtla de notar-se do neurologists GRISSET (Deriti-fous et detrli-respollsnble~, Paris

1907). 3 0 reconheci~nento da loucura con10 causa de irresponsabilidade criminal (

diz INCECNIEROS (La sinl1rln~iolre dell^ pniiia, Totino, 1904, pAg. z@), o motivo prir cipal da simulat$o da loucura, considerada como um recurso dcfrnsivo do deli1 qhente na luta contra o ambiente juridico.

fragmenttiria, como a evperiencia as ia sugerindo, e sem representa- rem a efcctivaq50 dum pl,ino geral precst'ibelecido.

Dada esra origem empiriza, comprecnde-se como tais leis sejam isentas de qualquer apriorismo scientifico. Antcs clue de l i v e arbi- trio e de tipos de criminosos, falam elas de delinquentes loucos e al- coolizados, de delinqhcntcs instintivos habituais e profissionais, de delinquentes menores, primlirios e de ocasiSo, classificaqzo que se satisfaz com dados psicblogos rudimentares e que recorre a e~emehtos determinativos de ordem diversa: fisiologicos (menores), patologicos (loucos e alcoolizados instintivos), estatisticos (habituais, profissionais e prirntirios). SCo estas as distin~6e.s que mais especialmente se' en- contr'am nas Icgislaqiies menos escravas da tradiqso e da harmonia arquiltectonica do direito penal. Como era natural, foram a Alemanha e a Itlilia as illtimas n a ~ 6 e s a a b r a ~ a r as novas reformas-paises im- buidos de doutrinarismo, sujeitos B tirania dos sistcmas, pel0 menos quanto a sciencia criminal, e por isso mesmo mais inclinados 2s re- formas abstratas gerais.

A) ~Mrnol-cs. -No se'czrlo d L 7 s c.riil?lgas era natural que a delinquen- cia dos menores constituisse urn problema dominante.

A psicologia experimental veio permitir ver claro naquele pequeno mundo, extranho e caprichoso, que 6 a alma da cr ian~a. 0 homem nasce amoral, como nasce privado de movimentos volunthrios; o re- cemnascido ti urn ser espinal e 56, ulteriormente, com a forma$io pro- gressiva da propria psique, com a estratificagiio do caracter, adquire, especialmente com a ginhstica da imitaqCo, o senso moral, que C uma das ultimas adquisig6es da humanidade e do indi\iduo.

Qualquer que possa ser, pois, a apreciaqllo clue se faqa da eficacia da educa~Co como meio de luta contra a criminalidade, indiscutivel 6 a influencia que ela exerce s6bre a alma do homem em forma~a'o; afora os casos duma verdadeira e propria teratologia psiquica, a edu- c a ~ z o pode sempre fazer duma crlanqa um homem honesto, ou um amoral ou um deliquuente, segundo favorega, guie e excite a natural evoluqa'o psicolbgica para as sucessivas adquisiqiies morais, ou favo- refa, pelo contrdrio, a paralizaqiio do desenvolvimento ou, peor, o seu desvio. E esta educa~iio consiste menos na repetiqlo oral de normas morais do que na a c ~ l o eficacissima do exen~plo. SCo postulados pe- dag6gicos em que substancialmente concordam os mais varios e opos- tos &stemas, de HERBART a PBREZ, a B,\IN, a A R ~ I G O . Assim, 0s legis- ladores, emancipando-se do antigo conceit0 da pena retributiva, pros- creveram o absurdo tratamento penal preconizado pela escola cldssica para' a ipfancia abandonada ou perigosa. 6sse absurdo era duma euidencia f lagante. Por um lado, admitia-se at6 certa idade a irres-,

ponsabilidade legal, graduando, depois, de periodo para periodo, atC a maioridade, as f r a~6es de livre arbitrio e de responsabilidade: era o preconceito da escala do delito, segundo a qua1 o menor deve, antes dc sc tornar um malfcitor, comeGar por dclitos leves, seguindo uma como que carreira burocrAtica do crime; era o esquecimento de que a precocidade constitue urn dos caracteres do criminoso por tendencia conginita. Pcr outro lado, entendendo-se quc ao menor se deve atri- buir uma certa parcela de responsabilidade, defendia-se o seu inter- namento na prisgo, isto C, em uma escola em que se aperfei~oarh na arte do delito, se fica em contact0 com criminosos peores do que cle, e em que a sua degeneresccncia fisica e moral aumentara, se fica no isolamento ou con1 outros menorcs.

E interessante passar em revista os diversos meios empregados corn o fim de remover o perigo ptreril.

I ) Estados- U~liilos da Arne'rita do ,Yo~-te. -Foi cste pais o que primeiro deu o exemplo duma 1egislac;a'o i crdadeiramente humana e bem compreendida para a luta contra a delinquencia precace. Em 1899 era criado em Chicago, gracas ,ios esfor~os da Chicago visifa- tion 0nd aid Society, um tribunal especial para crianqas; em 1902 instituiram-se outros em Filadilfia, Dower e New-York; em 1906, to- lnados como que por urna febre de emulac;a'o, 24 estados totavam a criaqiio destes tribunais. Muitos congresses especiais se reuniram, atestando o intercssc dos norte-americanos por Gste problema; em 1910, de 2 a 8 de outubro, realizava-se o congresso penitcnciario in- ternacional de Washirlgton 4, que veio imprimir nova orienta~a'o & le- gisla~a'o referente aos menores delinquentes.

0 congress0 penitencihrio internacional de Ii'ashington, de 1910, exprimiu, ~ -

quanto aos menores dclinquentcs, o seguinte yoto: I ) os menores .delinqbentes nPo dcven~ ser submetidos hs formas de processo

penal que actualmente se aplicnnl aos adultos.; 2) os principios que devem reger o processo para os menores delinqhenhes,sIo

os seguintes : a) os tncarregados de conhecer e instruir os processos devem, em primeiro

lugar, ser individuos com reconhecida nptiddo para compreender os nlenores e posi suir conhecimt-nto das scigncias sociais e penologicas;

b) conviria que fossem auxiliados por empregados especiais (pi.obntiotz oficers), que teriam por miss50 faze17 urn exame particular em cada caso, vigiar e auxiliar 09

que estlo submetidos h prova (oil probatioirj; c) seria convenlente que, com base no exanle '10s processos dos jovens delin-

qbentes, sc fizessem investigaq6es que podessem trazer novas informaq6es AcErcd da criminalidade dos menores, para aproveith-las sempre. que se ofereqa a oporlu- nitja.de de sucessivos processes, 0 s exames medicos nLo devem ser feitos sen50

444' qevista da filive~-sidade de Coimbra

A legislac50 americana ten1 por primeira caracteristica a especia- liza$Co do juiz iinico. Com excepqc50 de New-York, todos os Jtrvenile Courts americanos possuem Cste juiz unico, de caracter familiar e pa- ternal, ou nomeado pelo governador do Estado ou eleito pel0 povo.

Segunda caracteristica: as audiencias s lo igualmente especializadas, sem aparato, simples, familiares, quasi intimas. N5o intervem o Mi- nisttrio Publico, nem, except0 no Colorado, advogado. A crianqa tem em face de si o juiz, e G tudo.

0 s Juljenile Cotrr-ts sZo completados pela institui~iio dosprobation oficers, delegados do tribunal, encarregados de assistir ao juiz, de preparar o process0 do delinquente menor, inquirindo acerca do seu ambiente familiar, caracter, habitos e relaq6es, e de vigiar pela exe- cuqa'o da sentenGa do magistrado.

0 juiz americano n5o esta adstrito, no exercicio das suas fun@es, a nenhum texto legislativo, nem a jurisprudtncia alguma: decide se- gundo a sua consciCncia, quasi sempre em primeira e ultima ins th- cia, e pode fazer entregar o menor a familia, ou coloca-lo em liber- dade vigiada, ou confia-lo a uma comiss5o de patronato, ou interna-lo em uma casa de correc~5o.

~ s t e sistema tem dado jli. os seus frutos: o ndmero de menores reincidentes diminuiu sensivelrnente na America do Norte, duma ma- neira quasi geral. Em Chicago a sua propor~Co t, no conjunto dos criminosos, de 8 a 10 O/o; em Dower, de 5 O/o '.

(Continuo). J . CAEIRO DA MATA.

por facultativos que tenham conhecimentos especiais das scigncias sociais e psico- logicas ;

d ) sempre que seja possivel, deveri evitar-se a prislo dos menores, que n l o convgm decretar sen50 a titulo excepcional ;

e) quando seja necesssrio deter os menores, n l o deverEo ser colocados nos mesmos pavilhBes ocupados pelos adultos;

f ) nos paises em que o conhecimento dos crimes estA confiado aos juizes, nlo deverlo as causas referentes aos menores ser discutidas na mesma audigncia que as dos adultos, e dever-se h i proceder, quanto possivel, por via de confergncia, ten- dendo ao bem da crianqa maisdo que h discusslo a seu respeito. Vid. ARMANDO CLARO~, Nuevns tendencins penales en el Congresso penitenciario de Washington, Buenos Aires, 191 I , p ig 22 e segs.

1 GI~IFFE, Les tr~buna~rw pour rrfints, Paris, 1914, pig. I I e segs.; JULHIET, Les ~viburlorrx pour enfants aux & t a t s - ~ ~ r i s , 1912, pig. 6 e seas, I