actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · viaje del parnaso, publicada no ano seguinte, traz...

309

Upload: duongthu

Post on 06-Nov-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia
Page 2: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

2

_____________________________________________________________________

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS

CAMPUS I (DCHI) - COLEGIADO DE LETRAS/LÍNGUA ESPANHOLA E LITERATURAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS

Actualidades de la lengua del Quijote:

anais [Atualidades da língua do Quixote: anais]

I SEMINÁRIO DO CURSO DE LETRAS/ LÍNGUA ESPANHOLA E

LITERATURAS DE LÍNGUA ESPANHOLA

Salvador, BA, de 24 a 27 de novembro de 2015

Adriana de Borges Gomes

Organizadora

Page 3: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

3

FICHA CATALOGRÁFICA

Sistema de Bibliotecas da UNEB

Bibliotecária: Jacira Almeida Mendes – CRB: 5/592

Seminário do Curso de Letras/Língua Espanhola e Literaturas de Língua Espanhola

(1.:2016:Salvador:BA)

Anais / I Seminário do Curso de Letras/Língua Espanhola e Literaturas de Língua Espanhola.

Actualidades de la lengua del Quijote, Salvador, BA, de 24 a 27 de novembro de 2015 / Organizado

por Adriana de Borges Gomes . – Salvador, 2016.

ISBN 9788592206109

1. Língua espanhola - Estudo e ensino - Congressos. 2. Literatura espanhola - Estudo e ensino

- Congressos. I. Gomes, Adriana de Borges. II. Universidade do Estado da Bahia, Departamento

de Ciências Humanas.

CDD: 468.2469

Page 4: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

4

REALIZAÇÃO:

COLEGIADO DO CURSO DE LETRAS/LÍNGUA ESPANHOLA E

LITERATURAS DA UNEB (DCH-I)

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS - PPGEL

APOIO:

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS - CAMPUS I

FINANCIAMENTO DA ESTRUTURA DO EVENTO

Adriana de Borges Gomes (UNEB)

Coordenadora do evento

COMISSÃO ORGANIZADORA

Aline Silva Gomes (UNEB)

Carla Severiano de Carvalho (UNEB)

Cláudia Silva Santana (UNEB)

Iára Kastrup Schaepfer (UNEB)

Lívia de Carvalho Mendonça (UNEB)

Lorena Oliveira Tavares (UNEB)

Marco Luiz Mendes de Oliveira (UNEB)

Maria Auxiliadora de Jesus Ferreira (UNEB)

Núbia Silva Cruz (UNEB)

Roberto Matos Pereira (UNEB)

CONTATOS:

Rua Silveira Martins, nº 2555, Cabula, Salvador – BA. CEP: 41.150-000

Telefone: (71) 3117-5400/ E-mail: [email protected]

Page 5: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

5

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA

REITOR

José Bites de Carvalho

VICE – REITORA

Carla Liane Nascimento Santos

PRÓ – REITORA DE ENSINO DE GRADUAÇÃO – PROGRAD

Kathia Marise Borges Sales

PRÓ-REITOR DE PESQUISA E ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO - PPG Atson Carlos de Souza Fernandes

DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS - CAMPUS I

Flávio Dias Santos Correia

COORDENADORA DO CURSO LETRAS/LÍNGUA ESPNHOLA E

LITERATURAS

Adriana de Borges Gomes

COORDENADOR DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE

LINGUAGENS

Gilberto Nazareno Telles Sobral

Page 6: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

6

COMITÊ CIENTÍFICO

Dra. Cecília Gabriela Aguirre Souza - UFBA

Dra. Patricia López – Gay - BARD COLLEGE NEW YORK

Dr. Patrício Nunes Barreiros - UEFS

Dra. Márcia Rios - UNEB

Dra. Rosa Helena Blanco Machado - UNEB

Dr. Maurício Matos Pereira - UFBA

Dra. Lívia de Carvalho Mendonça - UEFS

Dra. Ilmara Valois Bacelar Figueiredo Coutinho - UNEB

Dra. Sally Cheryk Inkpin - UNEB

Dr. Amarino Oliveira de Queiroz - UFRN

Dra. Juliana Soledade Barbosa Coelho - UFBA

Dra. Jaqueline Barreto Lé - FSBA

Dra. Anna Nolasco de Macêdo - UFBA

Dra. Encarnación Medina Arjona - UNIV. DE JAÉN

Dr. Antonio Donizeti da Cruz - UNIOESTE

Dr. Eleuterio Santiago-Díaz - The University of New Mexico

ARTE DA CAPA

Mike Sam Chagas (artista visual EBA/UFBA)

EDIÇÃO TÉCNICA

Adriana de Borges Gomes (UNEB)

Marco Luiz Mendes de Oliveira (UNEB)

Page 7: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

7

«—Ahora digo —dijo a esta sazón don Quijote—,

que el que lee mucho y anda mucho,

vee mucho y sabe mucho.»

(Don Quijote de La Mancha, capítulo XXV, parte II)

Page 8: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

8

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO..........................................................................................................10

MIGUEL DE CERVANTES E ALGUMAS DE SUAS

REFERÊNCIAS NA ARTE DA ESCRITA

Maria Augusta da Costa Vieira (USP)..........................................................................11

ENSEÑANZA DE ESPAÑOL EN BRASIL DE 1996 A 2025: ¿QUÉ HEMOS HECHO

Y QUÉ FALTA HACER?

Gretel Eres Fernández (USP) ...................................................................................... 25

LA MEDIACIÓN EN LA ENSEÑANZA DE ESPAÑOL COMO LENGUA

EXTRANJERA

Cristina Corral Esteve (UFPE) ....................................................................................37

LA FORMACIÓN DE MEDIADORES INTERCULTURALES EN LAS CLASES DE

ESPAÑOL: CONVERSACIONES CON DON QUIJOTE DE LA MANCHA

Luciana Contreira Domingo (UNIPAMPA) ..................................................................45

LEITURAS DA CIDADE DO MÉXICO NA PROSA DE JOSÉ EMILIO PACHECO

Antonio Ferreira da Silva Júnior (UFRJ, CEFET/RJ) ..................................................56

EL SURREALISMO EN AMÉRICA

Ruben Daniel Méndez Castiglioni (UFRGS, CNPq) .....................................................73

LA LENGUA ESPAÑOLA EN SUS DICCIONARIOS

Félix Valentín Bugueño Miranda (UFRGS) ..................................................................89

CORTESIA E ESTRATÉGIAS DE ATENUAÇÃO EM ESPANHOL E PORTUGUÊS

SOB UM OLHAR INTERCULTURAL

Camilla Santero Pontes/ Cecília Aguirre (UFBA) .......................................................116

APROXIMAÇÕES ENTRE O QUIXOTE E O JOGO DA AMARELINHA

Adriana de Borges Gomes (UNEB) ............................................................................142

POEMAS CAMONIANOS EM LÍNGUA ESPANHOLA

Carla da Penha Bernardo (UNEB)..............................................................................162

POESIA NAS AULAS DE E/LE: PROPOSTAS DIDÁTICO-CULTURAIS

Jeferson Mundim de Souza (Educação Básica) ........................................................176

Page 9: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

9

LOS ANTIPOEMAS DE PARRA: MUNICIONES PARA UNA INSURRECCIÓN

HISTÓRICA Y LITERARIA

Antonio Martínez Nodal (UFPA/ IC Salvador)...........................................................193

GUÍA PRÁCTICA PARA SOBREVIVIR Y DISFRUTAR DEL MUNDIAL DE BRASIL:

ESTUDO DA ARGUMENTAÇÃO EM PUBLICAÇÃO DO JORNAL ESPANHOL

EL MUNDO

Carla Severiano de Carvalho (UNEB)........................................................................ 209

“LA FIESTA DE LOS EXCLUIDOS” DA COPA DO MUNDO DE 2014: UMA ANÁLISE

DISCURSIVA.

Máira Barboza de Oliveira Coelho (UNEB)................................................................222

ANÁLISE DAS RELAÇÕES DE GÊNERO EM PANTALEÃO E AS VISITADORAS

Viani da Silva Soares (UNEB) .....................................................................................233

O DESENVOLVIMENTO DA HABILIDADE LEITORA EM ESPANHOL COM O

USO DE “TIRAS”: um relato de experiência

Luzilene Cardoso de Souza (Educação Básica)............................................................255

O ENSINO DE ESPANHOL E O AUXÍLIO DOS DICIONÁRIOS

Laura Campos de Borba (UFRGS) ...............................................................................279

SOBRE OS AUTORES ................................................................................................305

Page 10: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

10

APRESENTAÇÃO

A Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Campus I, o

Departamento de Ciências Humanas I (DCHI), o Programa de

Pós – graduação em Estudos de Linguagens (PPGEL) e o

Colegiado do Curso de Licenciatura em Letras/Língua

Espanhola e suas Literaturas tiveram a satisfação de realizar o I

Seminário do Curso de Letras/Língua Espanhola e Literaturas:

Actualidades de la lengua del Quijote, que ocorreu entre os dias

24 a 27 de novembro do ano de 2015, no campus de Salvador da

UNEB.

O evento (que contou com a pré-atividade Farándula das

Letras Espanholas) foi, em primeiro lugar, um espaço de

reflexão sobre práticas e teorias para atuais e futuros docentes,

assim como para pesquisadores da língua espanhola, das

literaturas de língua espanhola e do ensino e aprendizagem de

línguas estrangeiras. Em segundo, especialmente, o evento

ofereceu uma programação em comemoração pelo transcurso

dos 10 anos do Curso de Letras/Espanhol da UNEB e do IV

Centenário da publicação da segunda parte de El Ingenioso

Caballero Don Qvijote de La Mancha.

O I Seminário do Curso de Letras/Língua Espanhola e

Literaturas – Actualidades de la lengua del Quijote constituiu-

se, por um lado, com conferências e mesas redondas

apresentadas por convidados. Por outro, contou com a

participação de estudantes e docentes que já atuam

profissionalmente, mediante a apresentação de comunicações

orais em simpósios temáticos e minicursos.

Publicam-se agora, neste espaço, os artigos completos dos

participantes que os enviaram, no prazo estabelecido, à

Comissão Organizadora do Seminário, em atendimento às

normas de publicação devidamente divulgadas no site do

evento: https://actualidadesdelquijote.wordpress.com/. Os

artigos foram avaliados e aprovados pelo Comitê Científico do

Seminário, em colaboração com o trabalho executor de edição

técnica. Ressalta-se, ainda, que os artigos estão escritos nos

idiomas dos oficiais do Seminário: o português e o espanhol.

Carla Severiano de Carvalho

Page 11: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

11

MIGUEL DE CERVANTES

E ALGUMAS DE SUAS PREFERÊNCIAS

NA ARTE DA ESCRITA

Maria Augusta C. Vieira

Universidade de São Paulo

No ano em que são celebrados os 400 anos da morte de Cervantes o objetivo

maior do presente trabalho é o de apresentar alguns aspectos de sua obra com a

perspectiva de que esta breve apresentação sirva como um convite ao leitor – seja ele

ocupado ou desocupado – para um contato direto com os textos cervantinos, pois, como

bem lembra o autor do Quijote ao redigir o prólogo às Novelas Ejemplares, “no siempre

se está en los templos; no siempre se ocupan los oratorios; no siempre se asiste a los

negocios, por calificados que sean. Horas hay de recreación donde el afligido espíritu

descanse.” (NE, 2001, p. 18)

Notícias sobre os dias e trabalhos de dom Miguel

Seria possível iniciar dizendo que, ao contrário do que acontece com alguns

autores do chamado “Século de Ouro”, Cervantes praticamente não deixou vestígios que

dessem margem a muitas conclusões sobre seu pensamento, apesar do importante

estudo de Américo Castro intitulado El Pensamiento de Cervantes (1925). Além de suas

narrativas, poesias e obras de teatro, não deixou escritos que pudessem precisar suas

idéias acerca da poética e da literatura em geral, como o fez, por exemplo, Lope de

Vega, autor de um texto que poderia ser entendido como uma poética sobre os

princípios de composição da comédia, intitulado El Arte Nuevo de Hacer Comedias

(1609). Da mesma forma não deixou cartas ou outros escritos que evidenciassem

Page 12: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

12

alguma polêmica travada com outros autores, como as que ocorreram com Gongora e

seus detratores, por exemplo. Cervantes não deu margem a esse tipo de especulação

que, sem dúvida, poderia estimular cruzamentos indevidos entre aspectos biográficos e

produção artística. Não deixou registro de cartas, debates ou mesmo manifestos sobre

seu modo de entender a arte da escrita. Foi mais habilidoso: deixou uma obra repleta de

discussões em que as próprias personagens, muitas vezes discutem sobre o próprio

modo de narrar.

A Galatea (1585) é sua primeira obra publicada e, embora seja uma narração em

prosa, está repleta de versos, assim como em meio a situações idílicas intervêm

conteúdos trágicos, conferindo um caráter inovador ao gênero pastoril. A obra teve boa

acolhida e, em cinco anos, já contou com a segunda edição, apesar de não se ter mais

notícias acerca da segunda parte prometida. Na “aprovação”, assinada pelo licenciado

Márquez Torres na segunda parte do Quixote, comenta-se a grande aceitação que teve a

Galatea na Espanha e fora dela. No entanto, em tempos de Lope de Vega o gênero mais

apreciado era o teatro e o escritor que desejasse projeção para sua obra deveria também

mostrar seu talento na composição de obras dramáticas.

Cervantes escreve várias peças, entre elas Los Tratos de Argel e Numancia, tão

admiradas, tempos depois, pelos românticos alemães. No entanto, é bem provável que

tenha escrito mais peças do que as que se tem notícia uma vez que era hábito na época

que o escritor de obras dramáticas vendesse seu texto a um diretor de companhia teatral,

que, por sua vez, passava a figurar como o autor da peça.

Em 1605, Cervantes publica a primeira parte do Ingenioso Hidalgo Don Quijote

de la Mancha, que teve um grande sucesso. Em março do mesmo ano já iniciam-se os

trabalhos para a segunda edição. Transcorrem oito anos sem que surja nenhum outro

título e somente em 1613, Cervantes publica as Novelas Ejemplares, que tem êxito

imediato: em dez meses aparecem quatro edições e, ao longo de todo o século XVII, um

total de vinte e três edições.

No prólogo às Novelas, o autor promete para breve a publicação de Los Trabajos

de Persiles y Sigismunda e da segunda parte do Quijote, além de Semanas del Jardín,

que nunca foi publicado. Nos três últimos anos de vida, várias obras serão editadas,

embora não se saiba ao certo quando foram escritas: em 1614 será publicado Viaje del

Parnaso; em 1615, Ocho Comedias y Ocho Entremeses Nuevos, Nunca Representados,

além da segunda parte do Quixote. Em 1616, no dia 20 de abril, dois dias antes de sua

Page 13: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

13

morte, redige o prólogo a Los Trabajos de Persiles y Sigismunda, que será publicado

somente no ano seguinte, graças às providências de sua esposa, Catalina de Palacios.

No caso das Novelas Ejemplares, trata-se de uma obra que reúne doze novelas

breves de formas e temas variados. Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz

uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia se

equiparar aos grandes poetas e por não dispor de artifícios que o destacassem no mundo

da poesia: “Yo, que siempre trabajo y me desvelo/ por parecer que tengo de poeta/ la

gracia que no quiso darme el cielo” (Viaje del Parnaso, cap. I, vv. 25-27). Trata-se de

uma imitação de Viaggi in Parnaso (1582), de Cesare Caporali, como informa o próprio

autor no prólogo das Novelas, em que se cria uma alegoria burlesca na qual maus poetas

atacam bons poetas que se encontram refugiados no Monte Parnaso. Para Elias Rivers,

esta é uma obra madura de Cervantes, que revela “profunda preocupación por la poesía,

por la sociedad española, y por la propia carrera literaria del autor” (RIVERS, 1973, p.

146).

Publicada no ano seguinte, portanto em 1615, Ocho Comedias y Ocho

Entremeses Nuevos Nunca Representados é prova do interesse cervantino pela arte

dramática evidenciado em diversos momentos de sua obra, ao longo de inúmeras

reflexões sobre o gênero. Um deles, talvez o mais significativo, ocorre entre os capítulos

quarenta e sete e cinqüenta da primeira parte do Quixote, quando se dá o longo diálogo

entre Dom Quixote, o Padre e o Cônego sobre a poética em geral, e sobre a comédia em

particular. No entanto, é em Viaje del Parnaso, no anexo intitulado “Adjunta al

Parnaso” – um diálogo entre o autor e um mancebo “al parecer de veinte y cuatro años”

– que vêm à tona as possíveis dificuldades que Cervantes enfrentou para representar

suas comédias e daí sua decisão de publicá-las, algo nada usual na época em que teatro

e representação constituíam uma só coisa, ou seja, o teatro não existia sem o palco.1

No prólogo às Ocho Comedias y Ocho Entremeses Nuevos Nunca

Representados, após um relato sucinto e preciso acerca do gênero comédia, Cervantes

narra sua opção pela publicação, já que a possibilidade da representação dramática era

de fato uma quimera, como se justifica pelo próprio título dado à obra:

1 “Adjunta al Parnaso”, em Viaje del Parnaso, p. 179.

Page 14: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

14

Algunos años ha que volví yo a mi antigua ociosidad, y

pensando que aún duraban los siglos donde corrían mis

alabanzas, volví a componer algunas comedias; pero no

hallé pájaros en los nidos de antaño; quiero decir que no

hallé autor2 que me las pidiese puesto que sabían que las

tenía, y así las arrinconé en un cofre y las consagré y

condené al perpetuo silencio. En esta sazón me dijo un

librero que él me las comprara si un autor de título3 no

le hubiera dicho que de mi prosa se podía esperar

mucho, pero que del verso nada; y si va a decir la

verdad, cierto que me dio pesadumbre el oírlo y dije

entre mí: “O yo me he mudado en otro, o los tiempos se

han mejorado mucho; sucediendo siempre al revés, pues

siempre se alaban los pasados tiempos.” Torné a pasar

los ojos por mis comedias y por algunos entremeses

míos que con ellas estaban arrinconados, y vi no ser tan

malas ni tan malos que no mereciesen salir de las

tinieblas del ingenio de aquel autor a la luz de otros

autores menos escrupulosos y más entendidos.

Aburríme y vendíselas al tal librero, que las ha puesto

en estampa como aquí te las ofrece; él me las pagó

razonablemente; yo cogí mi dinero con suavidad […].4

Além das comédias e entremeses, Cervantes escreveu outras obras de teatro

como já mencionadas - El Trato de Argel e Numancia - no entanto se desconhece o

número exato de sua produção dramática, uma vez que, como mencionado acima, um

autor de comédias perdia seus direitos autorais no momento em que vendia a peça

dramática a um diretor de companhia, que por sua vez passava a assumir todos os

direitos sobre a obra, passando a ser considerado, portanto, o “autor” da obra.

A última obra de Cervantes, Los Trabajos de Persiles y Sigismunda, de

publicação póstuma, também tem bom êxito editorial. Publicada em 1617 contará no

mesmo ano com edições em diversos lugares: Barcelona, Valência, Pamplona, Lisboa,

Madri, Paris e, em seguida, será traduzida e publicada em outras línguas. Trata-se de

uma longa peregrinação de Persiles e Sigismunda, narrada em estilo romanesco, repleta

de aventuras, personagens, histórias intercaladas, relatos de vida, terras e mares

fantásticos e múltiplas reflexões do narrador sobre a arte da composição narrativa. No

prólogo às Novelas Ejemplares, Cervantes anuncia: “si la vida no me deja, te ofrezco los

2 “Autor”, na época, equivalia a diretor de companhia teatral.

3 “Autor de título” era o empresário que se encarregava dos gastos da companhia e possuía privilégio real

para poder representá-la publicamente. 4 “Prólogo al lector” em Ocho Comedias y Ocho Entremeses Nuevos Nunca Representados- Obras

Completas, 1999, pp. 877-878.

Page 15: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

15

Trabajos de Persiles, libro de que se atreve a competir con Heliodoro, si ya por atrevido

no sale con las manos en la cabeza”.5

Esboço de um retrato e os prólogos cervantinos

É bem provável que um leitor de hoje inicie a leitura de uma obra do passado

sem prestar muita atenção em alguns aspectos que, na época de sua composição,

ocupavam lugar de grande importância. Um deles é a presença de prólogos, mais ou

menos longos, mais ou menos esclarecedores, que acompanhavam muitas das obras em

prosa ou em poesia. Hoje em dia, raramente aparecem prólogos na abertura de

romances, contos ou poemas, ao contrário do que ocorria nos tempos de Cervantes em

que normalmente as obras traziam prólogos que continham informações substanciosas

acerca de princípios poéticos adotados, fossem eles mais ou menos explícitos.

Tendo em conta este dado, é importante observar que os prólogos cervantinos

merecem atenção especial do leitor que facilmente pode se deixar levar pela narração de

histórias breves que vão sempre entremeadas com questões de poética e que conduzem

o texto para horizontes nada previsíveis. Histórias breves que supõem, entre outras

coisas, o encontro do autor com um interlocutor que pode ser um eventual leitor, um

suposto amigo, um livreiro ou personagem similar que abre espaço para um diálogo

repleto de comentários curiosos sobre a obra, sobre circunstâncias de sua composição e,

em particular, sobre o próprio autor, configurando aos poucos um certo autorretrato

retórico construído por meio de vários artifícios.

No “prólogo” às Novelas ejemplares é introduzida uma voz que corresponde à

de um suposto amigo do autor e que se encarrega de apresentar um autorretrato curioso,

baseado numa síntese autobiográfica. Assim como nos demais prólogos de Cervantes,

esta voz expõe algumas ideias que poderiam ser consideradas como relativas à biografia

do autor, no entanto, é preciso ter em conta que os textos cervantinos não são ingênuos

5 Novelas Ejemplares, pp. 19-20. Heliodoro foi escritor grego do século III e, como relata Cervantes no

“Prólogo”, lhe serviu de modelo. A expressão “sale con las manos en la cabeza” corresponde, segundo

Covarrubias, a “volver descalabrado o maltratado”. No caso, Heliodoro poderia ficar exasperado com a

atrevida equiparação do autor, o que poderia funcionar como um indício de que a obra estaria malparada

(ver de Covarrubias, Tesoro de la Lengua Castellana).

Page 16: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

16

e, portanto, ao contrário do que faz dom Quixote com relação às novelas de cavalaria

que leu, o leitor de Cervantes não deverá tomar a palavra escrita ao pé da letra.

Várias edições cervantinas estampam um suposto retrato de Cervantes com um

perfil de linhas alongadas, olhar profundo, nariz fino e levemente adunco, boca pequena

encoberta em parte por um espesso bigode que se prolonga e se confunde com o

cavanhaque, arrematado por um protuberante rufo de cor branca bem engomado. A

autoria deste retrato foi atribuída a Juan de Jáuregui, pintor e poeta sevilhano,

provavelmente amigo de Cervantes. No entanto, ao que parece, a suposta obra de

Jáuregui teria desaparecido, restando apenas uma cópia, hoje conservada na Real

Academia Espanhola, em Madri. Na realidade, não sabemos ao certo quais são os traços

fisionômicos de Cervantes, e assim, o retrato do autor do Quixote impresso em muitas

páginas paira no horizonte das incertezas, tanto no que diz respeito à autenticidade do

retratista quanto às verdadeiras feições do retratado.

No início do prólogo às Novelas o autor já anuncia sua falta de entusiasmo para

redigir a presente prefação. Seu desânimo deve-se aos problemas que enfrentou com a

publicação do prólogo da primeira parte do Quijote e também à ausência de um amigo

que pudesse ter esculpido e gravado na primeira página do livro, como era costume

entre os autores de importância, suas feições a partir do suposto retrato que teria feito o

famoso poeta e pintor sevilhano Juan de Jáuregui.6 Dando continuidade às queixas, o

autor imagina que abaixo de seu retrato o suposto amigo faria constar um texto

descritivo que desse a conhecer aquele que propagou tantas invenções na “praça do

mundo”. No caso, quem deveria ter redigido o texto – uma mescla de autorretrato e

autobiografia – seria o suposto amigo, daí o uso das aspas, o tom distanciado e

irreverente em meio a um discurso satírico e pseudo-laudatório. Eis, então, o retrato do

autor:

“Este que veis aquí, de rostro aguileño, de cabello

castaño, frente lisa y desembarazada, de alegres ojos y

de nariz corva, aunque bien proporcionada; las barbas

de plata, que no ha veinte años que fueron de oro, los

bigotes grandes, la boca pequeña, los dientes ni

menudos ni crecidos, porque no tiene sino seis, y ésos

mal acondicionados y peor puestos, porque no tienen

correspondencia los unos con los otros; el cuerpo entre

6 No entanto, pelo que se sabe, Jáuregui nunca chegou a fazer o retrato de Cervantes.

Page 17: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

17

dos extremos, ni grande, ni pequeño, la color viva, antes

blanca que morena, algo cargado de espaldas, y no muy

ligero de pies; este, digo, que es el rostro del autor de La

Galatea y de Don Quijote de la Mancha, y del que hizo

el Viaje del Parnaso, a imitación del de César Caporal

perusino, y otras obras que andan por ahí descarriadas y

quizá sin el nombre de su dueño, llámase comúnmente

Miguel de Cervantes Saavedra. Fue soldado muchos

años, y cinco y medio cautivo, donde aprendió a tener

paciencia en las adversidades. Perdió en la batalla naval

de Lepanto la mano izquierda de un arcabuzazo, herida

que aunque que parece fea, él la tiene por hermosa, por

haberla cobrado en la más alta ocasión que vieron los

pasados siglos, ni esperan ver los venideros, militando

debajo de las vencedoras banderas del hijo del rayo de

la guerra, Carlo Quinto, de felice memoria. (NE, 2001,

p. 16-17)

Ao lado de vários fatos que compõem sua biografia como as obras que publicou,

a batalha memorável em que atuou e a marca indelével que herdou de sua atividade

guerreira (a paralisia da mão esquerda), surge a descrição em tom burlesco de suas

próprias feições que dão alguma ideia de seus possíveis traços fisionômicos. É

importante ter em conta que nos tempos de Cervantes os textos não eram criados a partir

de critérios baseados na subjetividade ou na espontaneidade de cada autor. Ao contrário,

a escrita era algo regrado que se originava de determinadas convenções presentes em

tratados de poética e de retórica e, a partir delas, o autor deveria ajustar sua capacidade

inventiva.

No caso específico da descrição de pessoa, havia um repertório de atributos que

deveriam ser respeitados, fossem eles destinados aos elogios ou à vituperação. Para a

descrição, portanto, era de se esperar que houvesse referências às circunstâncias

externas ao indivíduo, a seus atributos físicos e às suas qualidades morais.7 Para Frei

Miguel de Salinas, autor da primeira retórica em língua castelhana, publicada em

meados do século XVI, alguns pontos deveriam aparecer como nome, linhagem, idade,

disposição corporal, virtudes da alma, educação, oficio, fortuna, estado social, o dito e o

feito.8

7 Ver Retórica a Herenio, Introd., trad. y notas de Salvador Núñez. Madrid: Gredos,

1997, Libro III, pp. 171-190. 8 Ver de Elena Artaza, Ars narrandi en el siglo XVI español. Teoría y práctica.

Bilbao: Universidad de Deusto, 1989, pp. 186-203.

Page 18: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

18

Tendo em conta este repertório que deveria compor a descrição de pessoa, o

retrato de Cervantes que aparece no prólogo às Novelas Ejemplares deixa algumas

dúvidas. A descrição é conduzida na direção do engrandecimento, seja por meio dos

elogios, pondo em evidência o homem das armas que atuou bravamente na memorável

batalha de Lepanto, seja pela exaltação feita ao homem das letras por ter escrito A

Galatea, o Dom Quixote e a Viagem do Parnaso, em vias de ser publicada. Certamente,

a reunião de duas atividades, isto é, a relativa às armas e também às letras correspondia

nesse tempo à idealização de uma vida plena, tendo em conta a concepção humanista da

existência.

No entanto, dando continuidade ao autorretrato, há componentes que parecem

caminhar, não propriamente na construção dos elogios, mas sim na elaboração de um

retrato, no mínimo, duvidoso. Além das virtudes evidenciadas pelo fato de haver

aprendido a encontrar “paciência diante das adversidades” e da menção a alguns de seus

traços físicos que ressaltam sua jovialidade e inteligência, como “olhos alegres”, “testa

lisa e desembaraçada”, há referências que ficam a meio caminho entre o elogio e o

vitupério. Por exemplo, qualificar seu nariz como “nariz adunco”, poderia sugerir uma

origem judaica, o que naquele período seria um grande problema. No entanto, em

seguida a qualificação é atenuada ao se acrescentar que o nariz também é “bem

proporcionado”. Menciona também os “dentes mal postos” e “pior dispostos”, as

“costas encurvadas” e sua disposição corporal já limitada como se evidencia por meio

dos “pés não muito ligeiros”. Enfim, trata-se de um retrato que se sustenta, por um lado,

pela inteligência, juventude, dedicação às armas e às letras e, por outro lado, carrega o

peso da velhice, deixando para o leitor uma imagem cômica produzida pela

incongruência presente em seus próprios traços. Afinal, como bem lembra Cervantes no

próprio prólogo, com um tom algo brincalhão, “pensar que dicen puntualmente la

verdad los tales elogios es disparate, por no tener punto preciso ni determinado las

alabanzas ni los vitupérios” (Novelas Ejemplares, 2001, p. 17).

Além da ironia voltada para si mesmo, o artifício usado neste fragmento do

prólogo ultrapassa a figuração e aponta para um procedimento que se reitera em outros

prólogos, quando há a utilização da primeira pessoa, isto é, quando o autor assume a voz

na primeira pessoa. A presença de um tal “amigo” não se dá apenas no prólogo das

Novelas Ejemplares. Trata-se de recurso recorrente, como observou Jean Canavaggio,

que surge quando Cervantes, usando a primeira pessoa num discurso supostamente

Page 19: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

19

referencial, multiplica as vozes, desdobrando-se em um “ele” que emite opiniões,

confunde-se e contrapõe-se à voz da primeira pessoa, provocando afetos e opiniões

divergentes.

Segundo Canavaggio, esses discursos, em lugar de servirem de base documental

para traçar algumas linhas relativas ao pensamento de Cervantes, acabam resultando

num diálogo no qual, em meio ao discurso do autor, intervém uma “personagem” – um

amigo, um leitor, um livreiro, um mancebo– que apresenta pontos de vista discrepantes

ou emite juízos sobre a sua obra, juízos estes que provavelmente o autor preferiria

omitir, estejam eles voltados para os louvores ou mesmo para os vitupérios.

Algo semelhante ocorre no prólogo às Ocho Comedias y Ocho Entremeses,

quando o autor simula um diálogo com um livreiro que o acaba convencendo a publicar

suas peças teatrais, já que as mesmas não haviam produzido interesse algum entre os

diretores de companhias de teatro e, sendo assim corriam o risco de se perderem entre

papéis velhos.

No prólogo a Los Trabajos de Persiles y Sigismunda, redigido nas derradeiras

horas de vida e com plena consciência de que a morte está a caminho, o prólogo recorre

ao mesmo procedimento, isto é, compõe uma narrativa na qual Cervantes relata que, nas

proximidades de Esquivias (povoado onde viveu Catalina de Palácios, sua esposa), ele

se encontra com um estudante, grande admirador do “manco de Lepanto”, com quem

dialoga. O encômio que faz o jovem a sua obra se contrapõe à modéstia do autor, que

num gesto generoso recompõe o diálogo e relata sua enfermidade prontamente

identificada por seu interlocutor como hidropisia – um acúmulo anormal de líquido

seroso em tecidos ou em alguma cavidade do corpo. É o estudante – o jovem em

diálogo com o ancião – quem explicita a moléstia e ao mesmo tempo destaca o apreço e

o respeito que as pessoas em geral tinham pelo escritor. Ou melhor, funciona como a

voz do reconhecimento que provavelmente o próprio escritor projetava para si mesmo

em suas derradeiras horas. Como diz Canavaggio, nesses textos introdutórios Cervantes

apresenta-se em constante mise-en-scène de si mesmo, num movimento em que se

revela e se oculta simultaneamente (CANAVAGGIO, 2000, pp. 65-72).

Mais surpreendente entre todos talvez seja o prólogo à primeira parte do Quixote

no qual, sem saber o que dizer, o autor confessa sua incapacidade para redigir tal

prefação, estando a ponto de desistir da publicação do livro. Não restam dúvidas de que

os prólogos, no final das contas, oferecem pistas valiosas acerca de princípios de

composição poética, mas é preciso dizer também que, via de regra, Cervantes opta por

Page 20: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

20

formas um tanto inusitadas que poderiam ser consideradas como um antiprólogo ou um

“metaprólogo” como é o caso do prólogo do Quijote de 1605.

Aparentando grande modéstia como recurso para captar a benevolência do leitor,

o autor confessa abertamente suas fraquezas e suas dificuldades. Pelo que informa,

durante a composição da obra, enfrentou muitas dificuldades e, no momento de

redigir o prólogo, padece de uma grande timidez que não lhe permite a desenvoltura

na escrita além da incapacidade para emitir juízos sobre a própria personagem que

criou. É certo que tudo isso não passa de um grande artifício criado para levar o

leitor a pensar sobre a própria obra e sobre sua poética.

Uma opção seria redigir um prólogo repleto de pompa, com citações e

ornamentos, sonetos de autores famosos, epigramas e sentenças laudatórias o que

poderiam produzir aos olhos do leitor a afirmação de autoridade do autor, como era

costume entre muitos. No entanto, esta opção não se adapta aos propósitos

cervantinos e nem ao seu temperamento que rejeitava todo e qualquer tipo de

pedantismo. Em meio a essas queixas, chega um amigo que lhe oferece ideias práticas

para solucionar o problema da redação do prólogo, elaborando implicitamente uma

crítica declarada aos prólogos em uso e criticando, em particular, as estratégias

utilizadas por alguns para construir em torno a sua imagem a ideia de autoridade a partir

da aparência de erudição. A grande suposição é que o alvo indireto dessas críticas fosse

Lope de Vega, quem utiliza em seus prólogos muitos dos recursos assinalados por

Cervantes como instrumentos para conquistar notoriedade.

Com uma insolência inescrupulosa, o amigo vai indicando como deve ser

elaborado um prólogo ao mesmo tempo em que, ao dar conselhos, o constrói.

Embora saiba quais são as estratégias para provocar determinadas reações, o amigo

reconhece muito bem que a originalidade da história de dom Quixote -a luta contra

os livros de cavalaria- dispensa toda e qualquer recorrência a quaisquer autoridades

uma vez que nem sequer o próprio Aristóteles, como diz, imaginou tal possibilidade.

Enfim, a voz do amigo define com a ousadia que faltaria ao “autor” as qualidades de

sua própria invenção. Por meio de suas ideias e dos desabafos daquele que se diz

“padrasto” de dom Quixote, o leitor assiste à elaboração do prólogo que se constrói nos

bastidores, isto é, numa conversa aparentemente confidencial entre “autor” e “amigo”

que, pouco a pouco, vai desmascarando artifícios e criticando de forma alusiva

escritores famosos e práticas adotadas na escrita.

Page 21: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

21

É curioso observar que o contraponto que aparece no prólogo acaba

quebrando a expectativa do próprio leitor que espera um texto de caráter

predominantemente referencial, ou pelo menos uma apreciação geral acerca das

qualidades da obra e, no entanto, se depara com uma cena ficcional - a visita e a

conversa com o “amigo” – como se para a abordagem de questões relacionadas com

a composição de um texto fosse imprescindível a efabulação.

“Escribo como hablo”

Verdaderamente que hay poetas en el mundo

que escriben trovas que no hay diablos que las entienda;

“La Ilustre Fregona”,NE, p.410.

Como foi possível observar nos prólogos cervantinos, algo bastante

criticado por Cervantes é o pedantismo literário. Este seu “gosto” entretanto, parece

fazer parte de uma ideia mais ampla, divulgada em tratados que circulavam na época

como De Ratione Dicendi (1532), de Juan Luis Vives, que considerava que os textos

não deveriam ter “nada superfluo, nada vicioso, ni mucha carne y de sangre y jugo

cuanto es suficiente”.

Ao mesmo tempo em que Vives defendia um estilo claro, Juan de Valdés,

por motivos diversos, propunha a idéia de que a escrita deveria reproduzir a fala.

Entre 1535 e 1536, Valdés redige uma verdadeira apologia da língua vulgar

castelhana sob o título Diálogo de la Lengua, que será conhecido em forma de

manuscrito apenas na segunda metade do século XVI. Nessa obra estão presentes,

não apenas a defesa da língua vernácula frente ao latim, mas também a valorização

da naturalidade na expressão.9

Valdés considera que a língua castelhana é o instrumento primordial da

missão evangelizadora e para atingir tantos os letrados quanto os analfabetos, seria

fundamental encurtar as distâncias que separam a língua falada da língua escrita,

evitando tudo que fosse prolixo e enfadonho. Atribui grande importância aos

provérbios, tão arraigados entre os espanhóis e, privilegiando o uso da língua mais

9 Como diz Valdés em Diálogo de la Lengua: “Para deziros la verdad, muy pocas

cosas observo, porque el estilo que tengo me es natural, y sin afectación ninguna

escrivo como hablo, solamente tengo cuidado de usar de vocablos que signifiquen

bien lo que quiero decir, y dígalo quanto más llanamente me es posible, porque a mi

parecer en ningua lengua está bien el afetación” (p. 179).

Page 22: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

22

do que as normas gramaticais, passa a defender a idéia do “escribo como hablo”, que

correspondia à idéia de que a escrita deveria imitar a fala.

Além do propósito de dignificar a língua falada, havia também a idéia de

conceder à língua escrita maior naturalidade, precisão, clareza e simplicidade,

evitando toda e qualquer afectación, ou seja, tratava-se de evitar tudo o que pudesse

parecer artificial. Por outras vias e também por outros motivos, a rejeição à afetação

estava presente também em O Cortesão de Baldassare Castiglione (1527) que

circulou no universo cultural quinhentista italiano e logo foi traduzido por Boscán

com ampla difusão na corte espanhola. Nesse longo diálogo considerado como um

código de conduta da sociedade de corte são abordadas múltiplas vertentes do

estatuto do cortesão. Uma delas é a defesa da idéia de que, para se atingir a graça, é

fundamental “huir cuanto sea posible el vicio que de los latinos es llamado

afetación”.10

Além de se evitar um estilo afetado, deve-se também ter em conta que

a escrita não é senão um modo de falar que permanece após o ato de fala e assim,

tratando de criar consenso entre os senhores aristocráticos que mantêm um diálogo

durante toda a obra, chega-se à idéia de que a escrita deve seguir de perto a fala:

Paréceme luego estraña cosa juzgar en el escribir por

buenas aquellas palabras que en ninguna suerte de

hablar se sufren y querer que lo que totalmente y

siempre parece mal en lo que se habla, parezca bien en

lo que se escribe. Porque cierto, o a lo menos según mi

opinión, lo escrito no es otra cosa sino una forma de

hablar que queda después que el hombre ha hablado.

(CASTIGLIONE, 1994, p. 151)

É preciso ter em conta que se havia por parte de alguns a defesa da

naturalidade no estilo, isso certamente não correspondia à facilidade de composição.

Ao contrário, a tentativa de seguir o preceito do “escribo como hablo” supunha o

exercício cuidadoso de trazer para a escrita uma naturalidade artificiosa, fruto da

ponderação, do cálculo, enfim, de uma criteriosa operação racional. Quando

Cervantes publica a primeira parte do Quijote, nos primeiros anos do século XVII,

outra orientação bastante tentadora já se firmava, tratando de alargar a distância

10

Ver, de Castiglione, El Cortesano, 1994, p. 144. A censura à afetação encontra-se também em

Quintiliano,

que dizia: “nada hay más desagradable que la afetación” (Institutio Oratoria, I, vi, 40.).

Page 23: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

23

entre o referente e a metáfora, a fala e a escrita de modo a criar uma forma poética

ornamentada, cujo expoente foi, sem dúvida, Luis de Góngora.

Enfim, esta apresentação em torno de preceitos que orientaram a literatura

do século XVI justifica-se porque, no caso do Quijote, muito provavelmente o leitor

se dará conta de que a enunciação traz consigo essa naturalidade artificiosa,

estruturada sob a forma de um longo diálogo entre Dom Quixote e Sancho, que

transparece para o leitor como um extenso e amplo ato de fala entre o cavaleiro e seu

escudeiro: um deles analfabeto; o outro, letrado e com amplo repertório de leitura.

A obra de Cervantes - e de modo muito especial o Quijote – propõe ao leitor

uma reflexão por meio de variados artifícios sobre a arte da composição em meio à

narração, como se o narrador dialogasse constantemente com personagens, com o

próprio leitor e consigo mesmo acerca de possíveis rumos narrativos a seguir. Sua

obra vai interpelando o leitor, não apenas pelo que narra, mas também pelo modo de

narrar. Ao que parece, sem menosprezar a construção da autoridade do autor,

Cervantes projeta sua obra como um jogo em que leitor e autor participam de um

honesto divertimento. Como diz no prólogo às Novelas Ejemplares: “Mi intento ha

sido poner en la plaza de nuestra república una mesa de trucos, donde cada uno

pueda llegar a entretenerse, sin daño de barras, digo, sin daño del alma ni del cuerpo,

porque los ejercicios honestos y agradables antes aprovechan que dañan.”

Referências bibliográficas

ALEMÁN, Mateo. Guzmán de Alfarache. Edición de José María Micó. Madrid, Cátedra,

1997.

CASTIGLIONE, Baldassare. El Cortesano. Edición de Mario Pozzi, trad. de Juan Boscán.

Madrid, Cátedra, 1994.

CANAVAGGIO, Jean. Cervantes: entre vida y creación. Alcalá de Henares, Biblioteca de

Estudios Cervantinos, 2000.

CASTRO, Américo. El pensamiento de Cervantes. Barcelona, Crítica, 1987.

Page 24: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

24

CERVANTES, Miguel de. Don Quijote. Edición dirigida por Francisco Rico. Barcelona,

Instituto Cervantes/Crítica, 1998.

CERVANTES, Miguel de. Entremeses. Edición de Eugenio Asencio. Madrid, Castalia,

1970.

CERVANTES, Miguel de. Los trabajos de Persiles y Sigismunda. Ed., introd. e notas de

Juan Bautista Avalle-Arce. Madrid, Castalia, 1969.

CERVANTES, Miguel de. Novelas Ejemplares. Edición de Jorge García López. Barcelona,

Crítica, 2001.

CERVANTES, Miguel de. Teatro Completo. Edición, introducción y notas de Florencio

Sevilla Arroyo y Antonio Rey Hazas. Barcelona, Altaza, 2005.

CERVANTES, Miguel de. Viaje del Parnaso. Edición, introducción y notas de Vicente

Gaos. Madrid, Castalia, 1973.

CERVANTES, Miguel de. Obras Completas. Ed. de Florencio Sevilla. Madrid, Editorial

Castalia,1999.

RIVERS, Elias. “Viaje del Parnaso y poesías sueltas”. Suma Cervantina. Ed. J. B. Avalle-

Arce y E. C. Riley. Londres, Tamesis, 1973.

VALDÉS, Juan de. Diálogo de la lengua. Edición de Antonio Comas. Barcelona, Bruguera,

1972.

VEGA, Lope de. Arte nuevo de hacer comedias. Edición de Enrique García Santo-Tomás.

Madrid, Cátedra, 2006.

VIVES, Juan Luis. El Arte Retórica / De Ratione Dicendi. Estudio introductorio Emilio

Hidalgo-Serna, ed., trad. e notas de Ana Isabel Camacho. Barcelona: Anthropos, 1998.

Page 25: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

25

ENSEÑANZA DE ESPAÑOL EN BRASIL DE 1996 A 2025: ¿QUÉ

HEMOS HECHO Y QUÉ FALTA HACER?

Gretel Eres Fernández

Faculdade de Educação / USP

Introducción

La enseñanza y aprendizaje de español en Brasil ha pasado por situaciones

bastante variadas a lo largo de la historia11

: desde su total omisión en los currículos

hasta su destaque por medio de una ley que le otorga lugar privilegiado – al menos en el

papel – en la educación nacional. Sin embargo, la misma legislación que pretendía

concederle protagonismo a ese idioma, terminó por provocar, en muchos contextos, el

efecto contrario, de tal forma que hoy por hoy podemos observar en diferentes partes

del país la casi total ausencia de la oferta de clases de español en la enseñanza pública.

En ocasiones, la precariedad de los cursos es patente, frente a los casos exitosos que

siempre se cuentan en menor número.

Para entender, someramente, la situación actual conviene hacer un breve repaso

por la historia reciente de la enseñanza de lenguas extranjeras (LE) en Brasil, de forma

general, y de la enseñanza de español como lengua extranjera (ELE), de manera

particular. Esa mirada hacia atrás nos permitirá entender algunos de los fundamentos de

la formación inicial de profesores de español, puesto que la junción y comprensión de

esos elementos es crucial para un acercamiento más adecuado al universo de la

Educación Básica brasileña y de algunos de los problemas que afectan más directamente

a alumnos y profesores.

Al analizar, aunque de forma breve, las principales dificultades que subyacen a

ese universo, y teniendo en cuenta algunos de los documentos legales y oficiales que

orientan y direccionan los cursos de ELE en Brasil, podemos aventurarnos a trazar

11

Para información detallada véase, por ejemplo, el trabajo de Anselmo Guimarães: Panaméricas

Utópicas: a institucionalização do ensino de Espanhol no Brasil (1870-1961). Disponible en: < https://bdtd.ufs.br/bitstream/tede/1623/1/ANSELMO_GUIMARAES.pdf>.

Page 26: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

26

caminos que nos conduzcan a superar esas barreras y que suponen mudanzas de actitud

para provocar cambios en el proceso de enseñanza y aprendizaje y en los resultados.

Mirar hacia atrás no significa retroceder

Si pretendemos avanzar y proponer nuevos rumbos para la enseñanza de ELE en

Brasil es forzoso conocer la historia para no incidir en los mismos errores ni repetir

actitudes o procesos que ya se realizaron en momentos anteriores. Como, en este

momento, nos ocupamos de la historia más reciente del español en la enseñanza reglada

brasileña, centraremos nuestras rápidas observaciones en los principales textos legales y

en los documentos oficiales publicados a lo largo de los últimos veinte años.

Empezamos por la Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB-EN)

– Lei 9394/96 – que en su artículo 26, § 5º establece que, en lo referido a la enseñanza

fundamental,

Na parte diversificada do currículo será incluído, obrigatoriamente, a partir

da quinta série, o ensino de pelo menos 1 (uma) língua estrangeira moderna,

cuja escolha ficará a cargo da comunidade escolar, dentro das

possibilidades da instituição.

Ya en lo que concierne a la enseñanza media, la misma Ley determina, en el

artículo 36, inciso III que

será incluída uma língua estrangeira moderna, como disciplina obrigatória,

escolhida pela comunidade escolar, e uma segunda, em caráter optativo,

dentro das disponibilidades da instituição; [...]

Por lo tanto, y diferente de lo que a veces se comenta, esa Ley no especifica

ningún idioma como obligatorio, sino que deja a criterio de las comunidades escolares

su elección.

Lo mismo ocurre con los Parâmetros Curriculares Nacionais. Terceiro e

Quarto Ciclos do Ensino Fundamental. Língua Estrangeira. Ese documento, que no

tiene carácter dogmático12

, no determina cuál idioma se debe enseñar en los cursos

finales del nivel fundamental, aunque es posible inferir, en las entrelíneas, que

predominan el inglés y el español y se favorece el desarrollo de la comprensión lectora

en LE.

Los Parâmetros Curriculares Nacionais (Ensino Médio) – Parte II –

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, específicamente en la parte dedicada a los

1212

Como consta en la página 19 del mencionado documento y en la página 109.

Page 27: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

27

conocimientos en lengua extranjera moderna (páginas 24 a 32), tampoco mencionan

ningún idioma como preferencial en ese segmento de la educación nacional, y destacan

la competencia comunicativa como foco de la enseñanza. Además, conviene tener en

cuenta que esa parte del documento no se auto clasifica como “parámetro curricular” en

ningún momento, como se constata en el siguiente fragmento:

No presente documento, procurar-se-á traçar um breve panorama sobre a

situação das Línguas Estrangeiras Modernas no Ensino Médio, tanto a

partir de uma perspectiva diacrônica quanto de uma perspectiva de

interação e inter-relação delas com a área de Linguagens, Códigos e suas

Tecnologias. Procurar-se-á, também, esboçar as diferentes relações que elas

propiciam, a partir da sua aprendizagem, com o mundo do trabalho no qual

o aluno estará – ou não – inserido e com sua formação geral. (BRASIL,

2000, p.25 – subrayados míos)

Como se observa, queda claro que los objetivos de ese texto están lejos de

determinar orientaciones o caminos a seguir en la enseñanza de LE.

Cinco años más tarde, en agosto del 2005, sale a la luz la Ley 11.161, que

establece la oferta obligatoria del español en la enseñanza media, con matrícula

facultativa para los estudiantes, y prevé su inclusión facultativa en los años finales de la

enseñanza fundamental.

Inicialmente, se considera que esa medida legal fomentará la difusión del

español en Brasil, incrementará los cursos de formación inicial y permanente de

profesores y ampliará tanto las oportunidades de trabajo con el idioma como el

reconocimiento de su importancia en el país. Es opinión generalizada, también, que la

sanción de la Ley objetiva fines educativos; sin embargo, desde la creación del

Mercosur13

(o antes incluso) varias iniciativas ya se movilizaban en favor de la

implantación de la enseñanza del español en Brasil y más aún, del plurilingüismo.

Pese a los puntos positivos de esa medida legal que determinados sectores –

especialmente los gubernamentales – quisieron destacar, rápidamente los aspectos no

tan favorables ganaron espacio en el ámbito académico y pasaron a ser discutidos por la

sociedad, aunque no siempre con la misma profundidad. Así, se empezaron a ver las

muchas incoherencias y ambigüedades del texto de la Ley 11.161/05 y varias de las

dudas que suscitó tuvieron que ser aclaradas por el MEC, pues los estados no se sentían

13

El Mercado Común del Sur, creado por el Tratado de Asunción el año 1991, originalmente integraba

Argentina, Brasil, Paraguay y Uruguay. Más tarde se incorporó Venezuela y Bolivia debe juntarse al

grupo en un futuro próximo.

Page 28: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

28

en condiciones de determinar cómo deberían ponerse en práctica algunos de los

artículos que la integran.

A medida que se analizaba punto por punto el texto legal, el contexto de su

producción, la situación económica, la coyuntura social y comercial entre otros factores,

iba quedando cada vez más claro que los aspectos educativos y pedagógicos eran los

menos importantes en el génesis de esa Ley, lo cual ya indicaba sino el total fracaso de

su implementación, al menos la dificultad de que se lograra el éxito deseado.

En esos momentos (año 2005) y paralelamente a ese movimiento del Español, el

MEC estaba preparando un nuevo documento con directrices para todas las asignaturas

que integran la enseñanza media: Las Orientações Curriculares para o Ensino Médio

– OCEM. En el tomo dedicado a “Linguagens, Códigos e suas Tecnologias”, se incluía

un capítulo (como de hecho se dedica el capítulo 3) a los conocimientos de lenguas

extranjeras en general, ya que la mencionada LDB-EN no especifica qué idioma se debe

incluir en el nivel medio. Por lo tanto, ese documento orientador es coherente con la

legislación educativa vigente.

Sin embargo, y seguramente para también dar respuesta a la Ley 11.161/05

recién publicada, se decide a última hora incluir en las OCEM un capítulo específico

destinado a los conocimientos de Español, algo que si bien es positivo porque le da un

destaque importante al idioma, por otro lado favorece el surgimiento de muchas críticas,

en especial de profesionales de lenguas extranjeras que normalmente no están en los

currículos de la mayor parte los colegios públicos pues se considera que se trata de un

favorecimiento al español.

Sea como sea, lo que importa es que el inicio de este siglo marca, de alguna

manera, una nueva etapa para la enseñanza de lenguas extranjeras en Brasil.

Tras el surgimiento de esos documentos oficiales mencionados, el año 2010 el

PNBE do Professor – Programa Nacional Biblioteca da Escola incluye por primera vez

obras de apoyo pedagógico de inglés y de español, lo que se repetirá el año 2013.

Otro marco importante de los programas oficiales es el PNLD – Programa

Nacional do Livro Didático que incluye el inglés y el español en las convocatorias de

2011 y 2014 para la enseñanza fundamental, y en las convocatorias de 2012 y 2015 para

la enseñanza media.

No se puede dejar de mencionar que el año 2010 el Enem – Exame Nacional do

Ensino Médio también pasa a incluir preguntas de lengua extranjera – inglés y español.

Aunque muchas críticas se pueden hacer (y de hecho se hacen) a la configuración de los

Page 29: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

29

exámenes de español, contenidos, estructura, nivel de exigencia, conocimientos,

competencias y habilidades mensurados etc., no cabe duda que el hecho de constar en el

principal examen de la enseñanza media representa tanto el reconocimiento de la

importancia que el español va adquiriendo en Brasil como refuerza la necesidad de que

su incorporación a la educación básica se efective con consistencia.

Todo lo anterior supone, entre muchas otras cosas, que el profesor de español

necesita contar con formación inicial consistente de modo a poder actuar de manera

adecuada en la educación básica, puesto que él debe conocer la legislación vigente, los

documentos que orientan su labor y las iniciativas oficiales que subyacen a la educación

básica nacional.

Sin embargo, eso no es suficiente: el profesor también tiene que mantenerse

actualizado y para ello cuenta con diferentes programas de formación continuada como

cursos de extensión, de perfeccionamiento o de posgrado; asistencia a eventos del área;

participación en grupos de investigación o de trabajo, etc. El acceso a la información y

el estar activo permanentemente es fundamental pues es lo que permite adquirir y

profundizar conocimientos, además de desarrollar el pensamiento crítico por medio de

la discusión y del debate de ideas con otros profesionales del área. En ese sentido vale la

pena señalar, por ejemplo, los debates que actualmente ocurren sobre la Base Nacional

Comum Curricular14

y que deberán entrar en vigencia a partir del segundo semestre de

2016.

Pero conviene preguntarnos si la formación inicial y continuada que ofrecemos

es adecuada a la realidad que tenemos.

La formación de profesores y la realidad

Si echamos una rápida mirada a los principios que han norteado la formación de

profesores a lo largo de la historia, veremos que en determinada época el dominio de los

contenidos (gramaticales, sintácticos, morfológicos, ortográficos, fonéticos) eran los

responsables por determinar si alguien estaba capacitado a enseñar o no. Más tarde,

fueron las habilidades lingüísticas (entender, hablar, leer y escribir) las que dictaron qué

era fundamental en la enseñanza y aprendizaje de lenguas. Pasado ese momento, se

valoraron las metodologías, de tal forma que ser buen profesor suponía conocer a fondo

y ser capaz de aplicar el modelo metodológico vigente a la perfección.

14

La versión preliminar del documento está disponible en <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/>.

Acceso: 17 mar. 2016.

Page 30: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

30

En los días actuales vivimos la era de las competencias (lingüística,

comunicativa, pedagógica, metodológica, sociocultural, estratégica, discursiva, teórica,

profesional, reflexiva, de enseñanza, político-educativa...) y el buen profesor debe

dominarlas:

O graduado em Letras, tanto em língua materna quanto em língua

estrangeira clássica ou moderna, nas modalidades de bacharelado e de

licenciatura, deverá ser identificado por múltiplas competências e

habilidades adquiridas durante sua formação acadêmica convencional,

teórica e prática, ou fora dela.

Nesse sentido, visando à formação de profissionais que demandem o domínio

da língua estudada e suas culturas para atuar como professores,

pesquisadores, críticos literários, tradutores, intérpretes, revisores de textos,

roteiristas, secretários, assessores culturais, entre outras atividades, o curso

de Letras deve contribuir para o desenvolvimento das seguintes

competências e habilidades:

· domínio do uso da língua portuguesa ou de uma língua estrangeira, nas

suas manifestações oral e escrita, em termos de recepção e produção de

textos;

· reflexão analítica e crítica sobre a linguagem como fenômeno psicológico,

educacional, social, histórico, cultural, político e ideológico;

· visão crítica das perspectivas teóricas adotadas nas investigações

lingüísticas e literárias, que fundamentam sua formação profissional;

· preparação profissional atualizada, de acordo com a dinâmica do mercado

de trabalho;

· percepção de diferentes contextos interculturais;

· utilização dos recursos da informática;

· domínio dos conteúdos básicos que são objeto dos processos de ensino e

aprendizagem no ensino fundamental e médio;

· domínio dos métodos e técnicas pedagógicas que permitam a transposição

dos conhecimentos para os diferentes níveis de ensino.

O resultado do processo de aprendizagem deverá ser a formação de

profissional que, além da base específica consolidada, esteja apto a atuar,

interdisciplinarmente, em áreas afins. Deverá ter, também, a capacidade de

resolver problemas, tomar decisões, trabalhar em equipe e comunicar-se

dentro da multidisciplinaridade dos diversos saberes que compõem a

formação universitária em Letras. O profissional de Letras deverá, ainda,

estar compromissado com a ética, com a responsabilidade social e

educacional, e com as conseqüências de sua atuação no mundo do trabalho.

Finalmente, deverá ampliar o senso crítico necessário para compreender a

importância da busca permanente da educação continuada e do

desenvolvimento profissional. (BRASIL, 2001, p.30-31)

Evidentemente, no hay que ser especialista en el tema para afirmar a conciencia

que no se alcanzan esas metas en los cursos de formación inicial, por diferentes razones

que afectan tanto las condiciones de oferta de los cursos superiores y los docentes que

actúan en ellos como los estudiantes. Y de ese conjunto complejo las dificultades y los

problemas se entrecruzan y las soluciones no son fáciles. Veamos algunos ejemplos:

Page 31: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

31

Enseñar la LE desde el “principio”: ¿esta es la función de los cursos de

Letras?

Al disponer de pocas horas de clase de lengua (específicamente) se reduce

el espacio para la reflexión sobre usos, variedades, contrastes, prejuicios

lingüísticos, aspectos (socio)culturales, etc.

Por la misma razón, la oralidad ocupa – casi siempre – un lugar secundario.

Se valoran más los conocimientos formales (= gramática normativa, lengua

escrita) que el uso (oral y escrito) efectivo del idioma.

No siempre se articula la formación pedagógica a la formación en Letras

(los conocimientos lingüísticos y los didácticos muchas veces “no se

hablan”).

No se suele “enseñar” y practicar el lenguaje pedagógico en español (el

lenguaje que se usa en clase).

No siempre se conoce a fondo ni se discute en profundidad la realidad del

cotidiano escolar. Muchas veces lo único que se hace es criticar esa realidad

y buscar “culpables”.

Ahora bien, si los cursos de formación inicial no son capaces de formar

satisfactoriamente los profesores, la formación continuada termina por hacerse cargo, de

alguna manera, de eso. Así, en lugar de profundizar, de ampliar o de llevar el profesor a

especializarse, lo que muchas veces se ve en las iniciativas de formación permanente es

un intento de suplir las deficiencias de la formación inicial, tanto lingüísticas como

metodológicas. En ese sentido, algunos eventos tratan de ofrecer sugerencias

(¿modelos?) de actividades para las clases (con foco en contenidos, habilidades o

estrategias y procedimientos) que puedan llevar a resultados presuntamente eficaces,

aunque no siempre tienen en cuenta el proyecto político pedagógico del curso en el cual

el docente actúa y, con eso, dejan de tener los efectos deseados.

En otras ocasiones se discuten cuestiones teóricas pero no siempre se asocian a

la práctica; de ahí que tengan poca aplicación efectiva y, por lo tanto, nada cambia en el

salón de clases, sin contar que son raras las ocasiones en las que se les da voz a los

profesores, es decir, los responsables por esos cursos no les preguntan a los docentes

qué es importante para ellos en determinado momento, sino que se parte del principio de

que se les ofrece lo que supuestamente ellos necesitan.

Page 32: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

32

Hay que considerar, además, la realidad de las clases de español en gran parte de

los colegios públicos brasileños:

Carga didáctica insuficiente

Cantidad excesiva de alumnos por grupo

Desmotivación de profesores y alumnos

Condiciones de trabajo (sueldos insuficientes, horarios de clases

inadecuados, ausencia de trabajo en equipo, escasez de recursos, materiales

e infraestructura inapropiados, falta de apoyo administrativo y

pedagógico…)

Insuficiente dominio lingüístico y metodológico y/o formación precaria de

los profesores

Falta de interés y dedicación de los estudiantes

Falta de objetivos claramente definidos para los cursos (siempre se está

empezando)

Claro está que ni la realidad de los cursos de formación de profesores ni la de

muchos contextos de enseñanza es adecuada para lograr resultados satisfactorios. Sin

embargo eso no significa que no haya posibilidades de cambios.

Algunas perspectivas

Si bien es cierto, como hemos visto, que muchas de las iniciativas que afectan la

enseñanza y aprendizaje de idiomas tienen un trasfondo político, opino que ya es hora

de que tanto profesores como futuros profesores nos ocupemos de hacer menos política

y nos dediquemos a hacer más política lingüística; que le demos más espacio a la

política de formación de profesores y que también nos ocupemos de la política de

enseñanza de lenguas pues estas son las políticas que más directamente afectan nuestra

labor. Veamos:

Calvet entende por política linguística um conjunto de decisões tomadas pelo

poder público a respeito de quais línguas serão fomentadas, ensinadas ou

eventualmente reprimidas e eliminadas; de quais funções as línguas terão ou

deveriam ter, de que espaços sociaisocuparão. Considera este tipo de

preocupações inerentes à planificação do status das línguas. (SAAVEDRA;

LAGARES, 2012, p.15 – subrayados míos)

Como hemos visto, aunque la legislación no indica qué idioma se ha de enseñar

en la Educación Básica, los documentos oficiales, los diferentes programas (PNBE y

Page 33: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

33

PNLD) así como el Enem, de alguna manera señalan que la política lingüística adoptada

en Brasil privilegia el español y el inglés.

Cuando pensamos en política de formación de profesores hemos de reportarnos,

en primer lugar, a lo que establece el MEC y, en este caso, tenemos que “A Política

Nacional de Formação de Professores tem como objetivo expandir a oferta e melhorar

a qualidade nos cursos de formação dos docentes.”15

También es fundamental tener

presente lo que dicen los especialistas del área, en concreto, en Brasil. En este caso

estamos de acuerdo con Leffa (2001, p.334):

A formação de um professor de línguas estrangeiras envolve o domínio de

diferentes áreas de conhecimento, incluindo o domínio da língua que ensina,

e o domínio da ação pedagógica necessária para fazer a aprendizagem da

língua acontecer na sala de aula. A formação de um profissional competente

nessas duas áreas de conhecimento, língua e metodologia, na medida em que

envolve a definição do perfil desejado pela sociedade, é mais uma questão

política do que acadêmica. A sala de aula não é uma redoma de vidro,

isolada do mundo, e o que acontece dentro da sala de aula está condicionado

pelo que acontece lá fora.

Por lo tanto, es esencial asociar conocimiento teórico y práctico y eso solo es

posible si la academia y los sistemas de enseñanza reglada trabajan en conjunto.

La política de enseñanza de lenguas, a su vez, supone, de acuerdo con Bohn

(2000, p.129-130), que:

1. Haja uma boa circulação de informações e de decisões entre os diversos

“estratos” (intelectuais) que participam da política de ensino - entre

professores e pesquisadores particularmente;

2. Os processos decisórios não forem repressivos e conservadores, mas

progressistas e democráticos buscando claramente elevar o nível de

participação e a qualidade desta participação entre os membros;

3. Os participantes do grupo se sintam deliberadores e não meros executores

de tarefas e normas prescritas pelos intelectuais tradicionais ou pelas

instituições.

Todo lo anterior significa, en resumidas cuentas, que el profesor – y el futuro

profesor en última instancia – necesita:

Hacerse (co)responsable por su formación lingüística y pedagógica, lo cual

conlleva al desarrollo de mayor autonomía de aprendizaje durante la

formación inicial y continuada (y mayor autonomía como docente.

15

Disponible en <

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=232&Itemid=459>. Acceso:

18 mar. 2016.

Page 34: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

34

Desarrollar la crítica y la autocrítica, lo que supone exigir más de los cursos

y programas de formación y de sí mismo, y eso significa ser proactivo. En

este sentido, hay que considerar que

Proactividad no significa solo tomar la iniciativa, sino asumir la

responsabilidad de hacer que las cosas sucedan; decidir en cada momento lo

que queremos hacer y cómo lo vamos a hacer. […] La proactividad, según

Vicktor Frankl, es la libertad de elegir nuestra actitud frente a las

circunstancias de nuestra propia vida. (PALLARÉS, 2006, s/p)

Con el propósito de ofrecer contribuciones al área de Políticas de Enseñanza de

Lenguas, los Profesores Doctores José Carlos Paes de Almeida Filho (UnB) y Gretel

Eres Fernández (FE-USP), en estos momentos coordinan el Proyecto Renide:

Referencial de Niveles de Desempeño en la Enseñanza de Lenguas desarrollado por un

equipo de 15 profesionales (profesores e investigadores) de instituciones de diversos

estados brasileños (Mato Grosso do Sul, Paraná, São Paulo, Distrito Federal) y que

también cuenta con la colaboración de una investigadora de EUA.

El Proyecto Renide se aplicará en las siguientes etapas: Enseñanza Fundamental

cursos iniciales (EF I), Enseñanza Fundamental cursos finales (EF II), Enseñanza

Media, Enseñanza Superior (en las Licenciaturas para la Enseñanza de Español e Inglés

y en los contextos de Enseñanza Superior Tecnológica), Enseñanza de Portugués

Lengua de Herencia en el exterior y Enseñanza de PLE en Brasil y en el exterior. Los

principales objetivos del Proyecto Renide son:

a) la descripción y análisis de la actual situación de los campos relacionados a

las Políticas de Enseñanza de Lenguas en contextos nacionales, y

b) construcción de un cuadro orgánico de niveles de actuación en las lenguas

enseñadas (inicialmente, Inglés, Español, Portugués para Extranjeros y

Portugués Lengua de Herencia)

Conviene aclarar que el Proyecto Renide no pretende tener un carácter

excluyente, sino más bien se propone a ofrecer unos descriptores capaces de orientar los

objetivos de la enseñanza y las metas a alcanzar en cada momento y en cada

competencia.

Page 35: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

35

De todo lo expuesto espero haber podido ofrecer una pequeña contribución a la

reflexión sobre la historia más reciente de la enseñanza de lenguas extranjeras en Brasil

y, en concreto, del español.

Si bien es cierto que se ha avanzado en los últimos veinte años, mucho todavía

queda por hacer y tenemos un largo camino por delante. En ese sentido, el pasado nos

puede auxiliar a trazar los rumbos de los próximos veinte años. Así, por ejemplo, el

Proyecto Renide puede ser un auxiliar para (re)definir los contenidos propuestos por la

Base Nacional Comum Curricular para la Educación Básica o, incluso, puede servir

como punto de apoyo en una eventual reformulación de los exámenes de LE del Enem.

De todas formas, lo que efectivamente importa es que nadie espere a que los demás

hagan algo: todos debemos tomar cartas en este asunto, porque el futuro de la enseñanza

y del aprendizaje de español está en nuestras manos: profesores y futuros profesores.

Referencias

BRASIL. Casa Civil. Lei no. 11.161, de 05 de agosto de 2005. Disponible en:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11161.htm>. Acceso:

12 oct. 2015.

BRASIL. MEC/Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CES NO. 492/2001.

Disponible en: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES0492.pdf>. Acceso: 18

mar. 2016.

_____. MEC/Secretaria de Educação Básica. Orientações curriculares para o ensino

médio - volume 1: Linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília, MEC/SEB, 2006.

Disponible en: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/book_volume_01_internet.pdf>.

Acceso: 18 mar. 2016.

_____. Parâmetros Curriculares Nacionais – Ensino Médio. Brasília, MEC/SEB,

2000. Disponible en: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/14_24.pdf>. Acceso:

12 oct. 2015.

_____. MEC/Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares

nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua estrangeira. Brasília. MEC/SEF, 1998. Disponible en:

<http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/pcn_estrangeira.pdf>. Acceso: 17 mar. 2016.

_____. MEC. Sistema Nacional de Formação de Professores. Disponible en:

<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=232&Itemi

d=459>. Acceso: 18 mar. 2016.

GUIMARÃES, Anselmo. Panaméricas Utópicas: a institucionalização do ensino de

Espanhol no Brasil (1870-1961). Universidade Federal de Sergipe. Dissertação de

Mestrado (167 f.). São Cristóvão (SE), 2014.

LEFFA, V. J. Aspectos políticos da formação do professor de línguas estrangeiras. In:

LEFFA, Vilson J. (Org.). En: O professor de línguas estrangeiras; construindo a

Page 36: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

36

profissão. Pelotas, 2001, v. 1, p. 333-355. Disponible en:

<http://www.leffa.pro.br/textos/trabalhos/formacao.pdf>. Acceso: 18 mar. 2016.

PALLARES, M. Proactividad, ¿qué es? En: La Flecha. Tu diario de ciencia y

tecnología. 2006. Disponible en: <

http://www.laflecha.net/articulos/empresas/que_es_proactividad?page=1>. Acceso: 18

mar. 2016.

SAAVEDRA, M.M.G.; LAGARES, X.C. Política e planificação linguística: conceitos,

terminologias e intervenções no Brasil. En: Gragoatá. Niterói, n. 32, p. 11-27, 1. sem.

2012. Disponible en: <http://www.uff.br/revistagragoata/revistas/gragoata32web.pdf>.

Acceso: 18 mar. 2016.

Page 37: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

37

LA MEDIACIÓN EN LA ENSEÑANZA DE ESPAÑOL COMO

LENGUA EXTRANJERA

Cristina Corral Esteve (UFPE)

En la enseñanza de español como lengua extranjera existen, como en otras áreas,

un sinfín de estudios que intentan dar respuesta a preguntas como qué, cuándo, cómo,

para qué o a quién enseñar. Esto es, sin duda, enriquecedor y tiene como consecuencia

que sigan las investigaciones, se desarrollen posiciones encontradas y, por consiguiente,

se multipliquen los debates. Sin embargo, a pesar de ello, y a pesar de que mucho se ha

hecho ya a nivel teórico, no hemos conseguido todavía construir todos los puentes

necesarios hacia unas aplicaciones prácticas que nos ayuden en los problemas diarios

de nuestro trabajo en el aula.

Con la aparición de conceptos como competencia y actuación de la teoría

chomskiana en los años 60, comienza un nuevo período en el que enseñar una lengua ya

no era enseñar un código lingüístico, una estructura compuesta por diversos

componentes, como el estructuralismo había defendido hasta ese momento. Autores

como Hymes, Campbell y Wales o Canale y Swain, entre otros, comienzan a trabajar y

a debatir sobre estos conceptos y el alcance de los mismos. La publicación en 2002 (en

español) del Marco común europeo de referencia: aprendizaje, enseñanza, evaluación

(en adelante, MCER) abre un espacio de reflexión sobre todas las teorías desarrolladas

en las décadas anteriores, convirtiéndose en una herramienta de unificación de criterios

en relación a la enseñanza y aprendizaje de lenguas en el contexto europeo, en un

primer momento, para, después, ampliar su ámbito geográfico.

En Brasil, por ejemplo, este documento aparece reflejado en las Orientações

Curriculares para o ensino médio (2006) donde se habla, al igual que en el MCER, de

cuatro competencias generales: aprender a conocer, aprender a hacer, aprender a vivir y

aprender a ser. Esto, según el texto,

Page 38: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

38

deve ser levado em consideração, dada a situação particular que passaram a

viver os europeus a partir da criação da União Européia e das políticas

lingüísticas que foi preciso estabelecer em função da nova realidade, mesmo

reconhecendo que essa realidade é bastante distante e diferente daquela que

vivenciamos em nosso país e em nosso continente. Valha, no entanto, a

referência, para observarmos que, apesar das diferenças, há alguns pontos de

confluência nesta proposta com aquela (pp. 146-147).

De la misma forma, se retoma uno de los pilares del MCER, el plurilingüismo y

el pluriculturalismo, es decir, la idea de que las distintas lenguas y culturas con las que

entra en contacto un individuo no se guardan en compartimentos mentales separados

sino que se comparan, se contrastan y llegan a interactuar, desarrollándose, así, la

competencia comunicativa del hablante a la que contribuyen todas estas experiencias.

De esta forma, la educación en una lengua se presenta no como el logro del dominio de

una o varias lenguas, sino como el desarrollo de un repertorio donde tengan cabida

todas las capacidades lingüísticas. Se aboga, por lo tanto, por la diversificación de la

oferta de lenguas en las instituciones educativas con el objetivo de ayudar a formar

ciudadanos y a ayudarlos en su inserción social.

En el MCER se distinguen, además de las competencias generales ya

mencionadas, tres tipos de competencias comunicativas: lingüísticas, sociolingüísticas y

pragmáticas. Las primeras incluirían

los conocimientos y destrezas léxicas, fonológicas y sintácticas, y otras

dimensiones de la lengua como sistema, independientemente del valor

sociolingüístico de sus variantes y de las funciones pragmáticas de sus

realizaciones (MCER, 2002, p. 13).

Las segundas, por su parte,

se refieren a las condiciones socioculturales del uso de la lengua. Mediante su

sensibilidad a las convenciones sociales (las normas de cortesía, las normas

que ordenan las relaciones entre generaciones, sexos, clases y grupos

sociales, la codificación lingüística de determinados rituales fundamentales

para el funcionamiento de una comunidad), el componente sociolingüístico

afecta considerablemente a toda la comunicación lingüística entre

representantes de distintas culturas, aunque puede que los integrantes a

menudo no sean conscientes de su influencia (ibidem, pp. 13-14).

Y la tercera, a las pragmáticas que

tienen que ver con el uso funcional de los recursos lingüísticos (producción

de funciones de lengua, de actos de habla) sobre la base de guiones o

escenarios de intercambios comunicativos También tienen que ver con el

dominio del discurso, la cohesión y coherencia, la identificación de tipos y

formas de texto, la ironía y la parodia (ibidem, p.14).

Page 39: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

39

En 2007, se publica el Plan Curricular del Instituto Cervantes. Niveles de

referencia para el español (en adelante, PCIC) que significa un avance en la concreción

de las propuestas del MCER. En este sentido, se desarrolla explícitamente la triple

dimensión del alumno, frente a lo que aparecía en el texto anterior, donde solo se había

trabajado la primera. Así, el aprendiente se presenta como agente social, por lo cual

debe poder participar en transacciones e interacciones sociales así como manejar textos

orales y escritos; como hablante intercultural, es decir, ser "capaz de identificar los

aspectos relevantes de la nueva cultura a la que accede a través de la lengua y

desarrollar la sensibilidad necesaria para establecer puentes entre la cultura de origen y

la cultura nueva" (PCIC, 2007, p. 33); y como aprendiente autónomo, aquel que se

responsabiliza de su propio proceso de aprendizaje y es capaz de avanzar con autonomía

más allá del currículo. La propuesta se concreta, además de en los objetivos propios de

cada de uno de estos papeles, en trece inventarios o subdivisiones de cinco

componentes: gramatical, pragmático-discursivo, nocional, cultural y de aprendizaje.

Este es, de forma general, el marco del que partimos para abordar el tema que

nos ocupa en estas líneas: la mediación en la enseñanza de español como lengua

extranjera, frente a otros acercamientos que encontramos en la bibliografía reciente.

La mediación en el MCER

Si nos centramos en la competencia lingüística, esta se pone en funcionamiento a

través de la realización de distintas actividades de la lengua, tradicionalmente conocidas

como destrezas, lo que en ocasiones producía conflictos al confundirse con la idea de

habilidad con la que se hace algo. Para poder realizar estas actividades, es necesario,

además de unas competencias, unas estrategias que permitan llevar a cabo los procesos

lingüísticos necesarios. En este sentido, a partir de la publicación del MCER, además de

las actividades primarias que tradicionalmente aparecían en la bibliografía, es decir,

comprensión oral, comprensión escrita, expresión oral y expresión escrita (a la que se

suma la comprensión audiovisual) tenemos, gracias a su combinación, procesos

complejos como el de la interacción y la mediación, tanto oral como escrita. Se hace

evidente, por ejemplo, que en una conversación necesitaremos activar simultáneamente

la expresión y la comprensión y que esto no responde a las características aisladas que

puede presentar una actividad de uno u otro tipo. Uno de los ejemplos más claros en

este sentido se produce cuando en la interacción oral se solapan las intervenciones,

Page 40: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

40

momento en el que entran en juego elementos diferentes como la predicción del

mensaje al que se responde antes de su finalización. En el caso que nos ocupa, el de la

mediación, se reconoce la importancia de hacer posible la comunicación entre aquellos

que no pueden realizarla directamente.

Para cada una de estas actividades de la lengua, el MCER va a describir los

procesos necesarios dividiéndolos en cuatro apartados: actividades y estrategias de

expresión, actividades y estrategias de comprensión, actividades y estrategias de

interacción y actividades y estrategias de mediación. Sin duda, estas últimas son las que

menos atención han recibido en el documento, ya que no aparece ninguna escala

ilustrativa como sucede con el resto. Es decir, no aparecen ejemplos de lo que cada

aprendiente sería capaz de llevar a cabo en cada uno de los niveles de dominio

lingüístico recogidos en el MCER (A1, A2, B1, B2, C1 y C2) en relación a las

actividades de mediación.

Nos queda, pues, por aclarar en este punto cuáles serían estas actividades. Estas

estarían destinadas, como ya mencionamos, a la actuación como intermediario. El

MCER cita ejemplos como los siguientes: la interpretación oral, la traducción escrita, el

resumen y la paráfrasis de textos. En concreto, ejemplos de mediación oral pueden ser:

interpretación simultánea (congresos, reuniones, discursos formales, etc.); interpretación

consecutiva (charlas de bienvenida, visitas con guías, etc.) o interpretación informal

como a la hora de recibir visitantes extranjeros en el país propio, de hablantes nativos en

el extranjero, en situaciones sociales y en intercambios comunicativos con amigos,

familia, clientes, huéspedes extranjeros, etc. o de señales, cartas de menú, anuncios, etc.

En relación a la mediación escrita, encontramos la traducción exacta (por ejemplo, de

contratos, de textos legales y científicos, etc.), la traducción literaria (novelas, obras de

teatro, poesía, libretos, etc.), el resumen de lo esencial (artículos de periódicos y

revistas, etc.) en la segunda lengua o entre la lengua materna y la segunda lengua y la

paráfrasis (textos especializados para profanos, etc.). Hay que aclarar que no se está

refiriendo únicamente a situaciones donde existan dos o más lenguas diferentes (excepto

en el caso de la interpretación y la traducción), ya que puede ser necesaria la presencia

de un mediador en situaciones donde aparezca una única lengua, por ejemplo, cuando

estén representados diferentes contextos sociales.

Page 41: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

41

En cuanto a las estrategias de mediación, estas reflejan las formas de enfrentar la

necesidad de usar un número limitado de recursos con el fin de procesar la información

y establecer un significado equivalente. Como en el resto de actividades se dividen en

cuatro apartados: planificación (desarrollo de los conocimientos previos, búsqueda de

apoyos o preparación de un glosario), ejecución (procesamiento de la información de

entrada y formulación del último fragmento simultáneamente en tiempo real, anotación

de posibilidades y equivalencias o superación de obstáculos ), evaluación

(comprobación de la coherencia de dos versiones o comprobación de la consistencia de

uso) y corrección (precisión mediante la consulta de diccionarios o consulta de expertos

y de fuentes).

La mediación en la actualidad

Como ya mencionamos en el epígrafe anterior, el MCER no presenta escalas

ilustrativas relativas a la mediación ni tampoco se han desarrollado sus descriptores

posteriormente, es decir, los niveles de dominio lingüístico exigidos por los exámenes y

programas de evaluación para A1, A2, B1, B2, C1 y C2.

En 2013, el Consejo de Europa, consciente de esta situación, decide retomar la

mediación y desarrollar sus descriptores, un trabajo que esperamos se haga público a lo

largo de este año. En este sentido, se comienza definiendo la mediación a partir de la

propuesta del MCER para después ampliarla, es decir, pasa a ser cualquier

procedimiento, acuerdo o acción concebida para reducir la distancia entre dos o más

polos de alteridad. El mediador se convierte en facilitador del conocimiento, de la

comprensión de conceptos y de la reducción de tensiones, construyendo, así, puentes

hacia lo nuevo. Como vemos, esta propuesta continúa respondiendo a las necesidades

de un mundo en el que cada vez más la movilidad geográfica de sus ciudadanos, por

muy diferentes motivos, nos obliga a reflexionar y enfrentar retos en el ámbito de la

enseñanza-aprendizaje de lenguas, ya que será fundamental para la total inserción del

individuo en esta nueva realidad plurilingüe y pluricultural.

A grandes rasgos, este nuevo acercamiento continúa con el trabajo tanto con la

mediación oral como con la escrita, distinguiéndose en cada una de ellas la mediación

conceptual y la relacional. Por la primera, se entenderá aquella situación en la que el

individuo no puede acceder al nuevo conocimiento o concepto por razones como la falta

Page 42: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

42

de familiaridad con la lengua o una determinada barrera lingüística o cultural. En este

apartado, siempre se considerarán actividades que tengan que ver con la construcción

del significado o la transmisión del significado recibido como puede ser generar una

conversación conceptual, transmitir información recibida, explicar gráficos o diagramas

o la traducción de textos. Por otro lado, la mediación relacional tratará la creación y

manejo del entorno, consiguiendo una atmósfera positiva que mejore la efectividad de la

mediación, elemento este fundamental tanto en un contexto educativo como social. Nos

encontraremos, en este punto, actividades como gestionar la interacción o resolver

situaciones delicadas.

De la misma forma, se van a concretar en este momento las estrategias de

mediación que en el MCER se presentaban de manera genérica divididas en cuatro

momentos. Podemos ejemplificar este punto con algunas estrategias como aumentar el

texto (añadiendo elementos, ejemplificando, ilustrando, usando metáforas) más

relacionadas con la mediación conceptual o establecer una atmósfera positiva que

tendría que ver directamente con la mediación relacional. Debemos tener en cuenta, por

último, que no todas las estrategias podrán ser usadas en todos los contextos. Es

evidente que no se espera de un traductor que aumente, reduzca o ajuste un texto que

está traduciendo mientras que sí se esperará poner en práctica algunas de estas

estrategias en una interpretación informal.

Mucho es, por lo tanto, el trabajo que se está desarrollando actualmente para

conseguir concretar este documento que nos permitirá trabajar con la mediación, no solo

desde el punto de vista educativo, con el objetivo de desarrollar un repertorio

lingüístico, sino, y sobre todo, para conseguir darle a la mediación la importancia social

que merece. En el momento actual se convierte en una necesidad para lograr una

sociedad en la que haya una comunicación real y efectiva. En este sentido, junto a la

interacción en línea y los textos relacionados con la literatura y el arte, aparecerán

nuevas escalas relacionadas con la mediación, dedicadas a las competencias plurilingües

y pluriculturales que pretenden aprovechar ese repertorio plurilingüe y pluricultural de

los hablantes así como su conocimiento intercultural.

Como acabamos de mencionar, la mediación se convierte en una necesidad

social y política pero, al mismo tiempo, debe prestarse una especial atención a este

aspecto desde la enseñanza de lenguas. Dos son los motivos fundamentales,

Page 43: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

43

interrelacionados a su vez, que nos permiten darle ese papel fundamental. En primer

lugar, su importancia en el proceso de aprendizaje y en el uso de las lenguas y, por otro

lado, el hecho de que actividades de este tipo sean habituales en la comunicación real

fuera del aula.

En este sentido, si reflexionamos durante unos segundos, nos vendrán a la mente

multitud de ejemplos en los que actividades y estrategias de mediación tengan una

presencia fundamental tanto dentro como fuera del aula. Ejemplos en el aula pueden ser

la lectura de un texto que deben resumir, explicar o transmitir a sus compañeros;

establecer conexiones entre lo ya visto y lo nuevo; o reestructurar un texto eliminando la

información difícil y parafraseándola o bien añadiendo ejemplos tomados de su propia

realidad de forma que pueda ser entendida. Por otro lado, también tendrán que ver con

la mediación el trabajo con la creación de una atmósfera apropiada para el aprendizaje,

por ejemplo, proponiendo al alumno que gestione el trabajo en plenario o grupo o que

realice diferentes tareas como miembro de un equipo.

De la misma forma, fuera del aula, el conocer una lengua extranjera nos

permitirá actuar como mediadores en varias situaciones como ayudar a turistas

extranjeros en nuestra ciudad tanto traduciendo algo como intentando minimizar los

choques culturales que puedan surgir (recordemos, por ejemplo, los tan estudiados

falsos amigos o expresiones tan comunes en Brasil como “A gente se vê depois” que

suelen crear innumerables problemas), traducir una canción a un amigo o comunicarse

de forma efectiva y adecuada en redes sociales. Todo esto nos ayudará a conseguir, por

otro lado, que el alumno adopte una postura crítica, reflexione, compare y comprenda

mejor su propia lengua, su propia realidad, ayudando en su formación como ciudadano

y en la eliminación de estereotipos y prejuicios.

En este sentido creemos que la consideración de los elementos presentes en la

mediación a la hora de planificar la enseñanza de la lengua pueden resultar muy

motivadores para los alumnos, que verán en su aprendizaje una posibilidad de uso real

de la lengua en su día a día, tanto dentro como fuera del aula.

Conclusiones

Page 44: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

44

En estas breves líneas hemos pretendido acercarnos al esfuerzo que se está

realizando en los últimos tiempos en relación al desarrollo de los descriptores sobre la

mediación desde el Consejo de Europa. Como mencionamos al inicio, creemos que es

importante conocer los avances que está dando este organismo, ya que muchos

elementos pueden ser de gran ayuda tanto dentro como fuera de Europa. A pesar de que

los descriptores se orientan básicamente a la construcción de criterios de evaluación,

creemos que sus reflexiones y conclusiones pueden ser extrapoladas para ayudarnos a

entender mejor la importancia de las actividades y estrategias de mediación en el

proceso de enseñanza-aprendizaje y, sobre todo, su capacidad para que los alumnos

vean en la práctica la importancia de acercarse a una lengua extranjera. Por todo ello,

esperamos que a lo largo de este año aparezca el resultado de estos años de estudio y

que podamos analizar con más detalle de qué forma podemos aplicar sus resultados para

mejorar nuestra práctica educativa.

Referencias

CONSEJO DE EUROPA (2002). Marco Común Europeo de Referencia de las

lenguas: aprendizaje, enseñanza y evaluación. Madrid: MEC.

INSTITUTO CERVANTES (2007). Plan Curricular del Instituto Cervantes.

Niveles de referencia para el español (A/B/C). Madrid: Biblioteca Nueva.

BRASIL. Ministério de Educação (2006). Orientações Curriculares para o ensino

médio (2006). Brasília: Ministério de Educação.

Page 45: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

45

LA FORMACIÓN DE MEDIADORES INTERCULTURALES EN

LAS CLASES DE ESPAÑOL: CONVERSACIONES CON DON

QUIJOTE DE LA MANCHA

Luciana Contreira Domingo

UNIPAMPA – Campus Jaguarão/ RS

PARA COMENZAR

El presente trabajo propone un ejercicio de ingenio: imaginemos que Don

Quijote de la Mancha se ha despertado de un sueño profundo. Después de muchos

siglos se despierta y nos encuentra reunidos hablando de la enseñanza de español. Por

supuesto, no entiende nada. ¿Qué hace esta gente encerrada en un teatro con tanto

calor?, se pregunta nuestro ilustre manchego… El objetivo del texto es que le echemos

una mano: vamos a contarle por qué estamos reunidos en Salvador de Bahía, que nos

dedicamos a la enseñanza de la lengua española en Brasil, que somos estudiosos e

investigadores de su idioma y de su cultura; le vamos a decir que vivimos en un país

multicultural, que la educación por estos pagos no va muy bien, pero no aflojamos. En

suma, le vamos a explicar que unos estudiosos han llegado a la conclusión de que la

enseñanza de la cultura ha adquirido un rol importante en la didáctica de las lenguas,

razón por la cual optamos por enseñar lengua-cultura, o sea, lengua como sinónimo de

cultura.

INTERCULTURALIDAD EN EDUCACIÓN

Una mirada sobre las referencias a la educación intercultural en nuestro

continente destaca las perspectivas bicultural y bilingüe como antecedentes de la

educación intercultural. El origen del término intercultural remonta, según Walsh (2005,

p. 13) a los años ochenta como resultado de la condición de marginalidad lingüística y

cultural de algunos países como Ecuador, Bolivia y Perú. Para la misma autora, la

educación intercultural apunta a una interacción respetuosa entre individuos y culturas:

Page 46: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

46

El proceso de la interculturalidad puede describirse como la construcción de

puentes, no de integración o de separación, sino de intercambio entre los

individuos portadores y constructores de las varias culturas que conforman el

país; de ese modo se supera la noción de que no hay diferencias culturales, o

la idea de que existen culturas puras, aisladas y cerradas (WALSH, 2005,

p.19).

La construcción de puentes, sugerida por la autora, permite que pensemos en

nuestro contexto de enseñanza de español a brasileños y formación inicial docente. La

integración de diferentes elementos culturales que componen una suerte de mosaico con

el cual podemos identificar nuestra sociedad se presenta como alternativa a la enseñanza

de la lengua española en Brasil, como escribe López:

[...] la interculturalidad en la educación se refiere a un aprendizaje enraizado

en la cultura propia de un grupo histórico-social determinado, en su lengua,

valores, visión del mundo, y sistema de conocimientos; y, al mismo tiempo, a

un aprendizaje abierto hacia otros conocimientos, valores, culturas e idiomas.

Estos otros elementos culturales, en relación de distribución complementaria

con los de la propia cultura, contribuirán al logro de mejores condiciones de

vida (LÓPEZ, 2013, p.151).

En su reflexión sobre la interculturalidad en educación, Walsh (2010), distingue

tres perspectivas distintas en referencia al término:

1) Perspectiva Relacional: hace referencia de forma más básica y general al contacto e

intercambio entre culturas: es decir, entre personas, prácticas, saberes, valores y

tradiciones culturales distintas, los que podrían darse en condiciones de igualdad o

desigualdad. De esta manera, se asume que la interculturalidad siempre ha existido en

América Latina porque siempre ha existido el contacto y la relación entre los pueblos.

El problema es que esta perspectiva oculta o minimiza el conflicto y alimenta la falsa

idea de que en Brasil, por ejemplo, no hay racismo.

2) Perspectiva Funcional: busca promover el diálogo, la convivencia y la tolerancia. La

interculturalidad es “funcional” al sistema existente, no toca las causas de la asimetría y

desigualdades sociales y culturales, tampoco “cuestiona las reglas del juego”, por eso es

compatible con la lógica del modelo neo-liberal existente (TUBINO, 2005)”. El

reconocimiento y el respeto a la diversidad se convierten en una nueva estrategia de

dominación, que apunta no a sociedades más igualitarias, sino al control del conflicto

étnico y la conservación de la estabilidad social con el fin de impulsar los imperativos

Page 47: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

47

económicos del modelo neo-liberal de acumulación capitalista, ahora incluyendo a los

grupos históricamente excluidos en su interior.

3) Perspectiva Crítica: no parte del problema de la diversidad o diferencia en sí, sino del

problema estructural-colonial-racial; del reconocimiento de que la diferencia se

construye dentro de una estructura y matriz colonial de poder racializado y jerarquizado,

con los blancos y “blanqueados” en la cima y los pueblos indígenas y afrodescendientes

en los peldaños inferiores. En esta perspectiva la interculturalidad se entiende como

herramienta, como proceso y proyecto que se construye desde la gente, en contraste a la

funcional que se ejerce desde arriba.

Walsh (2010, p. 78) sugiere que la interculturalidad entendida críticamente aún

no existe, es algo por construir. Yo entiendo que el espacio para la construcción de esa

perspectiva crítica es el aula, son las clases de lenguas, sobre todo en las escuelas de

educación básica y los cursos de formación inicial docente. La enseñanza de lenguas en

perspectiva intercultural crítica promueve la mediación porque posibilita la

transformación de los aprendientes a partir de su relación con el medio, con otros

individuos, con otra lengua-cultura, con su propia lengua-cultura.

La adopción de la forma compuesta lengua-cultura se justifica debido a la

comprensión de cultura como todas las formas de vida, espacio fundamental del

lenguaje, a punto de confundirse con el propio término. Todas las cuestiones que

involucran el uso, la enseñanza y el aprendizaje de una lengua son, además de

cuestiones lingüísticas, cuestiones políticas, históricas, sociales y culturales. Remito a

Mendes (2004) con quien comparto la comprensión de lengua como sinónimo de

cultura:

Abordar a questão do ensino/ aprendizagem da cultura, ou melhor, o ensino/

aprendizagem de língua como cultura, insere-se nesse contexto, o de

assumirmos, como pesquisadores e professores, uma postura crítica diante da

nossa prática; e também de enxergarmos o indivíduo, seja ele aluno ou

professor, dentro do contexto no qual vive, age e interage com os outros, com

os seus modos particulares de interpretarem o mundo à sua volta (MENDES,

2004, p. 91).

La consideración del contexto y la cultura de origen y los modos de vivir y de

estar en el mundo también aparecen en la propuesta de Serrani (2005, p. 15-27) de

Page 48: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

48

profesor como mediador cultural (postura defendida por Paulo Freire en los años

sesenta en sus campañas de alfabetización en el Nordeste brasileño). Según Serrani, los

contenidos del contexto cultural de salida (con contenidos me refiero al contexto y a la

problemática del entorno) deben dialogar con los contenidos de la lengua meta,

promoviendo la reflexión.

Por otro lado, el término cultura ha sido muy discutido en diferentes disciplinas

de las ciencias humanas constituyendo hoy un concepto fundamental para el

pensamiento contemporáneo. Vez (2006) afirma que:

Los pasados siglos son testigos de una creciente confirmación social y

académica del concepto de persona culta como alguien que domina a la

perfección varias lenguas. Alguien que sabe lenguas. Claro que al inicio del

presente milenio disponemos de indicios suficientes para sospechar que un

nuevo concepto se abre paso, lenta pero progresivamente, a través del siglo

XXI: el concepto de individuos cultos por resultar ser buenos comunicadores

interculturales. Todo parece indicar que el nuevo siglo será el de la

intercomprensión lingüística y la comprensión intercultural (VEZ, 2006 p.

21).

El profesor de español, en ese proceso, moviliza los conocimientos previos de

sus alumnos y actúa como mediador entre las relaciones, entre conocimientos y

construcción de sentidos entre la lengua de origen y la lengua meta. La clase de español

puede, pues, convertirse en el ambiente adecuado para el reconocimiento de la

diversidad (multiculturalismo) y la promoción de relaciones de equidad e igualdad entre

los diferentes repertorios identitarios que componen el mosaico de nuestras aulas.

En la enseñanza de español en Brasil sigue presente el discurso occidental,

europeo, blanco y masculino sobre la universalidad del mundo (un verso, un discurso),

plasmado en los materiales didácticos de origen nacional y refrendado por programas

nacionales como el PNLD (Programa Nacional do Livro Didático). Las verdades otras

(WALSH, 2013; 2010; 2009; 2007; 2006; 2005; 1998), de los países periféricos,

brindan por su ausencia o quedan relegadas a secciones del libro didáctico como

curiosidades del mundo hispano. El tratamiento dispensado a la diversidad cultural del

continente hispanohablante queda evidente en la disociación entre lengua y cultura,

observables en los índices de los materiales o en las secciones denominadas “contenidos

culturales”, en general al final del material.

Page 49: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

49

La situación de nuestro sistema educativo está muy lejos de la ideal. Un análisis

crítico de la educación en Latinoamérica, en especial en nuestro país, revela la

subalternidad y colonialidad del poder, del saber/ del conocimiento y del ser

(QUIJANO, 2014, 2007, 2000; MIGNOLO, 2007) que mantienen las desigualdades

sociales y se plasman en la actualidad de la realidad educativa brasileña y comprometen

su futuro.

El reto de la educación comprometida con valores humanos que objetiven la

equidad y la igualdad social es conjugar los principios de la educación intercultural con

la pluralidad y diversidad culturales. Es, sin lugar a dudas, una tarea compleja e implica

asumir los conflictos resultantes del encuentro intercultural y el deseo de aprender a

manejarlos de manera reflexiva y crítica, considerando el conflicto como condición

inherente a toda relación intercultural.

PAUTAS PARA LA FORMACIÓN DE MEDIADORES INTERCULTURALES

En esta sección del artículo destacaré dos puntos a tener en cuenta en la

formación de mediadores interculturales en las clases de español.

El primer punto se refiere justamente al concepto de mediación. Diferentes

autores se están dedicando a la reflexión sobre la formación de profesores como

mediadores interculturales o interculturalistas (MENDES, 2004; SERRANI, 2005;

DOMINGO, 2015) y desvelando múltiples aspectos de esa perspectiva. En este trabajo

opto por discutir la interacción profesor-alumno. Por lo tanto, es imposible obviar el

legado de Vygotsky (2009; 2007) sobre la relación del hombre con el mundo; relación

que sostiene mi tesis de que las clases de lenguas que privilegian únicamente aspectos

lingüísticos o gramaticales deben dar lugar a la educación del lenguaje en perspectiva

intercultural.

Uno de los pilares de la obra de Vygotsky es el concepto de mediación,

entendido como proceso de intervención de un elemento intermedio en una relación

(OLIVEIRA, 2010, p. 28). Todas las relaciones del hombre en y con el mundo son

mediadas por medios o herramientas. El lenguaje, en esa perspectiva, es un mediador

por excelencia, pues carga los conceptos generalizados y elaborados por la cultura

Page 50: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

50

humana (REGO, 2011, p. 42). La capacidad de crear herramientas y adaptar medios es

una característica del ser humano, algo que lo distingue de otras especies.

Según Vygotsky, la relación del hombre con el mundo no es directa, sino

mediada. Esta idea da cabida a que consideremos la educación del lenguaje como medio

o herramienta entre el mundo del alumno y el mundo representado por la lengua-cultura

meta. Así, una educación del lenguaje que objetive la promoción de la interculturalidad

actúa como mediadora en el proceso de desarrollo de las actitudes y posturas que nos

permiten “ser” y “estar” en la lengua-cultura meta.

Considero que el concepto de mediación propuesto por Vygostky es

fundamental para la perspectiva de formación docente que defiendo pues, el foco de la

acción se da a través de la cooperación. El profesor de lenguas como mediador

intercultural se constituye como un mediador entre culturas apto a actuar en diferentes

contextos sociales y mediar conflictos. Complementa la idea lo expuesto por Giroux,

Os/ as educadores/ as não poderão ignorar no próximo século as difíceis

questões do multiculturalismo, da raça, da identidade, do poder, do

conhecimento, da ética e do trabalho que, na verdade as escolas já estão

tendo de enfrentar. Essas questões exercem um papel importante na definição

do significado e do propósito da escolarização, no que significa ensinar e na

forma como os alunos/ as estudantes devem ser ensinados/ as para viver em

um mundo que será amplamente mais globalizado, high tech e racialmente

diverso que em qualquer época da história (GIROUX, 2008, p.88).

Otro punto destacable en los objetivos de este trabajo es la perspectiva del

Letramento Intercultural (DOMINGO, 2015), entendido como la capacidad de leer al

Otro e interactuar a partir de esa lectura. La literacidad a que se refiere el concepto de

Letramento Intercultural objetiva el dominio de los códigos lingüísticos, discursivos,

culturales y sociales que pautan las interacciones entre individuos. El concepto fue

pensado inicialmente para la enseñanza en contextos fronterizos (DOMINGO, 2015),

pero también puede ser considerado en la enseñanza y el aprendizaje de lenguas

próximas, caso del español a lusohablantes y del portugués a hispanohablantes. La

proximidad entre las dos lenguas requiere experiencias pedagógicas situadas y

culturizadas que permitan la construcción y el mantenimiento de espacios donde los

sujetos puedan reconstruir y resignificar cuestiones identitárias y lingüísticas.

Page 51: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

51

El Letramento Intercultural como perspectiva para la enseñanza de español a

brasileños puede estimular la capacidad de reflexión crítica sobre el contacto entre los

dos idiomas y sobre los efectos de dicho contacto en sus procesos de aprendizaje,

requiriendo, por lo tanto, una postura autoreflexiva tanto académica como

profesionalmente. El ejercicio de reflexión crítica sobre el contacto entre dos idiomas

próximos y aspectos culturales compartidos demanda la inclusión y discusión sobre los

procesos históricos, sociales y culturales marcados por relaciones hegemónicas y

asimétricas que remontan a la llegada de los europeos al continente americano, algo que

nuestras limitaciones institucionales y materiales, en muchos casos, nos impiden

considerar.

La adopción de los dos puntos destacados en esta sección del trabajo

representan el primer paso en el desarrollo de la formación de mediadores

interculturales, ya sea en la educación básica o en los profesorados. Pero además de

conjugar dichos puntos reconozco la necesidad de mencionar acciones puntuales en lo

que a la enseñanza se refiere. De este modo, entiendo que en las dinámicas y actividades

didácticas propuestas en las clases de lengua, además de integrar los saberes escolares y/

o académicos con los saberes que circulan en la sociedad y en el entorno de los

aprendientes, se deben considerar los siguientes principios:

(i) la participación de los estudiantes en el proceso de aprendizaje, sus experiencias en

lengua materna y otras lenguas, bien como sus expectativas con relación al aprendizaje

del español;

(ii) la representación autentica de la lengua que pretendemos enseñar utilizando

muestras reales y con contenido significativo;

(iii) aspectos de la cultura de origen del aprendiz, mención a lugares y grupos sociales

de su entorno y contexto de origen;

(iv) las diferentes variedades lingüísticas de la lengua meta, así como expresiones de las

muchas culturas que la componen.

El aprendizaje de español a partir de la conjugación de los principios

presentados anteriormente permite la activación de conocimientos previos, permitiendo

nuevas descubiertas a través de la construcción de sentidos entre la lengua-cultura de

salida y la lengua-cultura meta. Ese proceso permite la comprensión de que tanto la(s)

Page 52: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

52

cultura(s) como las relaciones sociales son creadas, mantenidas y reproducidas en un

vaivén constante: la actividad interaccional.

PARA TERMINAR

Aturdido con tantas ideas, me imagino que nuestro Don Quijote necesitará un

tiempo para recomponerse del asombro. El mundo ha cambiado mucho desde que

nuestro distinguido amigo manchego vivió su última aventura; enseñar lenguas ha

pasado por distintos momentos y métodos de enseñanza que influyeron y/ o

determinaron objetivos, metodologías y materiales didácticos. La propia idea de lengua

extranjera está en tela de juicio, pues, ¿quién es el extranjero en la era de las

comunicaciones?

Conviene que las propuestas y programas de enseñanza de español en Brasil

consideren el contexto porque, además de las razones expuestas anteriormente, en

muchas regiones del país, y debido a la situación de frontera y contacto con países

hispanohablantes, el concepto de extranjero y lengua extranjera son discutibles. Lo

expuesto por Almeida Filho (2007) nos hace reflexionar sobre esa realidad:

Uma língua estrangeira equivale a outra língua em outra cultura de um outro

país pela qual se desenvolve um interesse institucionalizado em conhecê-la.

Ensiná-la é viabilizar o conhecimento sobre (ou o estudo de) uma outra

língua num ambiente formal institucional mediante uma operação com

dimensões distintas orientada por uma abordagem/ filosofia vigente que pode

ser espontânea-tradicional, altamente explicitada e calcada em pressupostos

teóricos, ou em combinações intermediárias dessas duas posições polares. Ao

longo da história tem sido forte a tendência de promover o “estudo” formal

de aspectos sistêmicos da língua-alvo vestidos com roupagem situacional em

diálogos e reconhecíveis em pequenos textos. (ALMEIDA FILHO, 2007, p.

66)

De ese modo, es conveniente que la justificación para la oferta del idioma

español en nuestro territorio sea contextualizada, culturalmente situada. Lo mismo se

refiere a las políticas lingüísticas, planes de estudio y materiales didácticos adoptados.

Hablar de la actualidad no es una tarea sencilla, sino todo lo contrario. El

concepto de modernidad líquida propuesto por BAUMAN (2001) remite a la idea de

mundo líquido o mundo sin forma, algo complejo y sin duda bastante distinto a lo que

Page 53: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

53

vivió Miguel de Cervantes al brindarnos con la gran obra de la literatura occidental. No

cabe duda de que los cambios producidos en la sociedad de la información y de la

comunicación, la fluidez de las identidades y el flujo de individuos han cambiado el

panorama de nuestros salones de clases en las últimas décadas. Para hacerle frente a esta

realidad, es necesario replantear nuestra forma de enseñar, permitir y estimular otras

formas de aprender incorporando temáticas y dinámicas propias de la

contemporaneidad.

Las pautas sugeridas en este trabajo no pretenden agotar o delimitar la discusión,

sino contribuir a este ejercicio que, entiendo, debemos realizar en la enseñanza de

lengua española en Brasil. En el marco del Seminario Actualidades de la lengua del

Quijote, esta charla sobre la formación de mediadores interculturales en las clases de

español afianza el compromiso de sus participantes en luchar contra los molinos de

viento, o mejor dicho, de enfrentar los desafíos teóricos y prácticos necesarios para

seguir alimentando el debate.

REFERENCIAS

ALMEIDA FILHO, J.C.P. Linguística Aplicada. Ensino de Línguas e Comunicação. 2.

ed. Campinas: Pontes, 2007.

BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Traducción Plínio Dentzien. Rio de Janeiro:

Zahar, 2001.

DOMINGO, L.C. Letramento Intercultural: a formação de mediadores interculturais nos

Cursos de Letras. 2015. 206fls. Tese – doutorado. Universidade Católica de Pelotas,

Programa de Pós-Graduação em Letras.

GIROUX, H. Praticando Estudos Culturais nas Faculdades de Educação. In: SILVA,

T.T. Alienígenas na sala de aula. Uma introdução aos estudos culturais em educação. 7ª

ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008, p.85-103. (Coleção Estudos Culturais em Educação).

LÓPEZ, L.E. Desconexiones entre retórica y práctica en la educación intercultural

bilingüe indígena en Latinoamérica. In: NICOLAIDES, C.; SILVA, K.A.; TILIO, R.;

ROCHA, C.H. (Orgs.) Políticas e Políticas Linguísticas. Campinas, SP: Pontes

Editores, 2013, pp. 135-180.

Page 54: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

54

MENDES, E. Abordagem Comunicativa Intercultural (ACIN). Uma proposta para

ensinar e aprender língua no diálogo de culturas. 2004. 440fls. Tese – doutorado.

Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem.

MIGNOLO, W. El pensamiento decolonial: desprendimiento y apertura. In: CASTRO-

GÓMEZ, S.; GROSFOGUEL, R. (Comp.) El giro decolonial: reflexiones para una

diversidad epistémica más allá del capitalismo global. Bogotá: Siglo del Hombre

Editores; Universidad Central, Instituto de Estudios Sociales Contemporáneos y

Pontificia Universidad Javeriana, Instituto Pensar, 2007, pp. 25-46.

OLIVEIRA, M. K. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um processo sócio-

histórico. São Paulo: Scipione, 2010. (Coleção Pensamento e ação na sala de aula)

QUIJANO, A. Cuestiones y horizontes: de la dependencia histórico-estructural a la

colonialidad/ descolonialidad del poder. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: CLACSO,

2014.

______. Colonialidad del poder y clasificación social. In: CASTRO-GÓMEZ, S.;

GROSFOGUEL, R. (Comp.) El giro decolonial: reflexiones para una diversidad

epistémica más allá del capitalismo global. Bogotá: Siglo del Hombre Editores;

Universidad Central, Instituto de Estudios Sociales Contemporáneos y Pontificia

Universidad Javeriana, Instituto Pensar, 2007, pp. 93-126.

______. Colonialidad del poder, eurocentrismo y América Latina. LANDER, E. (Org.)

La colonialidad del saber: eurocentrismo y Ciencias Sociales. Perspectivas

Latinoamericanas. Buenos Aires: CLACSO, 2000, pp. 122-151.

REGO, T. C. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. 22ª ed.

Petrópolis, RJ: Vozes, 2011. (Educação e conhecimento)

SERRANI, S. Discurso e leitura na aula de língua. Currículo, leitura, escrita.

Campinas: Pontes, 2005.

TUBINO, F. La interculturalidad crítica como proyecto ético-político. In: Encuentro

continental de educadores agustinos. Lima, 24-28 de enero de 2005. Disponível em:

https://oala.villanova.edu/congresos/educacion/lima-ponen-02.html Acesso em: 10 out.

2015.

VEZ, J. M. El aula de lenguas extranjeras: umbral para una sociedad de la cultura. In:

VV.AA. Las lenguas extranjeras en el aula. Reflexiones y propuestas. Barcelona:

Editorial GRAO, 2006, pp. 13-23.

VYGOTSKY, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. Tradução Paulo

Bezerra. 2ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009. (Biblioteca pedagógica)

______. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos

Page 55: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

55

superiores. Organizadores Michael Cole [et al]. Tradução José Cipolla Neto, Luís

Silveira Menna Barreto, Solange Castro Afeche. 7ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

(Psicologia e pedagogia)

WALSH, C. Pedagogías decoloniales. Prácticas insurgentes de resistir, (re) existir y

(re) vivir. Tomo I. Serie Pensamiento Decolonial. Quito: Abya Yala, 2013.

______. Interculturalidad crítica y educación intercultural. In: WALSH, C.; VIAÑA, J.;

TAPIA, L. Construyendo Interculturalidad Crítica. Instituto Internacional de

Integración del Convenio Andrés Bello. Bolivia, 2010.

______. Interculturalidad, estado, sociedad: luchas (de) coloniales de nuestra época.

Quito: Universidad Andina Simón Bolívar – Ed. Abya-Yala, 2009.

______. Interculturalidad y colonialidad del poder. Un pensamiento y posicionamiento

“otro” desde la diferencia colonial. In: CASTRO-GÓMEZ, S.; GROSFOGUEL, R.

(Comp.) El giro decolonial: reflexiones para una diversidad epistémica más allá del

capitalismo global. Bogotá: Siglo del Hombre Editores; Universidad Central, Instituto

de Estudios Sociales Contemporáneos y Pontificia Universidad Javeriana, Instituto

Pensar, 2007, pp. 47-62.

______. GARCÍA LINERA, A.; MIGNOLO, W. Interculturalidad, descolonización del

estado y del conocimiento. 1ª ed. Buenos Aires: Del Signo, 2006.

______. La interculturalidad en la educación, Quito: Ministerio de Educación del Perú/

UNICEF, 2005.

_____. La interculturalidad y la educación básica ecuatoriana: propuestas para la

reforma educativa. Procesos, Revista Ecuatoriana de Historia, nº 12, 1998, pp. 119-128.

Page 56: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

56

LEITURAS DA CIDADE DO MÉXICO NA PROSA DE JOSÉ

EMILIO PACHECO

Antonio Ferreira da Silva Júnior (UFRJ, CEFET/RJ)

Introdução

A cidade é o cenário frequente das narrativas protagonizadas pelos personagens

de José Emilio Pacheco, escritor mexicano ganhador do Prêmio Cervantes 2009 de

Literatura. A estética (pós)moderna nos sinaliza uma cidade fragmentada, violenta e

caótica, onde os aspectos negativos dessa realidade são evidenciados, entre eles, a

violência, a miséria, a solidão, o medo e outros. Independente do gênero literário, a

literatura de Pacheco trata de uma cidade real, onde o conflito e a falta de comunicação

nas relações sociais acabam por gerar um sentimento caótico.

A figura central dos contos de Pacheco é o típico homem mexicano em suas

múltiplas facetas. Pacheco demonstra, através de sua narrativa, as inquietações e

agonias do indivíduo advindas da chamada (pós) modernidade. O escritor mexicano,

herdeiro do estilo de Juan Rulfo, envolve o leitor na sua teia narrativa de modo que o

mesmo no ato da leitura questiona, interroga e busca explicações para as questões

problematizadas por seus personagens.

Neste artigo, por meio dos conceitos de “cidade caótica” (GOMES, 2008) e

“cidade videoclip” (GARCÍA CANCLINI, 1999), busca-se analisar como o escritor

retrata a Cidade do México em romance curto Las Batallas en el desierto (1981). A

proposta do artigo está em analisar o olhar nostálgico e pessimista de Pacheco sobre o

espaço citadino mexicano, em busca de desvendar suas vozes silenciadas, tendo em

vista o crescimento desmedido da capital mexicana. A história também tem presença

constante na obra de Pacheco. Não são poucos os estudos críticos que fazem referência

a essa vinculação. A nostalgia por uma antiga cidade habitável e inocente comparada à

atual e uma reflexão permanente sobre a identidade mexicana são algumas das hipóteses

que buscam explicar a presença da história na literatura de Pacheco.

O romance selecionado como material de análise para a reflexão deste artigo tem

como foco central as descobertas do narrador-personagem Carlos na imensidão da

Page 57: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

57

Cidade do México. O pano de fundo da narrativa é o processo de industrialização e de

modernização, iniciados no México a partir do governo do Presidente Miguel Alemán.

Pacheco demonstra a massiva presença do poderio norte-americano no contexto

mexicano, cujo poder afeta a economia, os costumes culturais locais e, principalmente, a

personalidade dos personagens da trama.

Para alcançar nosso objetivo, optamos, primeiro, por problematizar o conceito de

cidade e, após isso, exemplificar como Pacheco representa o crescimento da capital

mexicana em sua literatura em prosa.

1. De Tenochtitlán à Cidade do México: o olhar da crítica e de Pacheco

Tendo nossa reflexão neste artigo a intenção de tratar as nuances da capital

mexicana, espaço que Pacheco dedica quase toda sua obra literária, não podemos deixar

de considerar a sobreposição de espaços (templos, praças, ruas) e a perpetuação de um

imaginário indígena na construção da cidade contemporânea.

Ancoramo-nos em teóricos que pensam a cidade a partir de um olhar da

contemporaneidade, o qual pode resgatar certas imagens do passado. Para os modernos,

a cidade contemporânea é um inferno, uma paisagem sem vida, um problema, uma

utopia. Para Bauman (2009), a urbe é um espaço fragmentado, campo de batalha e a

variedade de vida existente é fonte de medo e de incerteza:

[...] viver numa cidade é uma experiência ambivalente. Ela atrai e afasta; mas

a situação do citadino torna-se mais complexa porque são exatamente os

mesmos aspectos da vida na cidade que atraem e, ao mesmo tempo ou

alternadamente, repelem (BAUMAN, 2009, p. 46-47)

O pesquisador brasileiro Renato Gomes (2008), em seu estudo sobre a

experiência urbana, visualiza a cidade a partir de um olhar pós-utópico. Para o ensaísta

brasileiro Paulo Sérgio Rouanet (1986, p. 39), o homem moderno não idealiza o futuro

porque só tem a “dimensão do presente – um presente monstruoso, avassalador”. A

visão de Rouanet da atualidade assemelha-se a de Gomes.

As cidades, em nosso contexto, as mexicanas, não existem somente como espaço

físico, mas sim, desde sua fundação, em leituras mediante relatos da literatura oral dos

povos pré-colombianos ou das cartas dos conquistadores ou dos jesuítas, que foram

construindo, pouco a pouco, o cotidiano urbano das mesmas junto à presença do

Page 58: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

58

homem. As cidades surgem para substituir outras, mas nunca podemos dizer que todas

são iguais, porque cada uma delas possui uma história e cultura específicas que as

diferem.

Para o crítico Walter Benjamin (1994), uma cidade ajuda a compreender outra.

Porém, para Gomes (2008, p. 40) ler uma cidade é uma tarefa cuidadosa, já que é

necessário “reconstruí-la com cacos, fragmentos, rasuras, vazios, jamais restaurando-a

na íntegra”. Calvino (1990, p. 34) defende que todos trazem consigo um modelo de

cidade que é constantemente revisitado por outras ao expor “confirma-se a hipótese de

que cada pessoa tenha em mente uma cidade feita exclusivamente de diferenças, uma

cidade sem figuras e sem forma, preenchida pelas cidades particulares”.

A obra de Pacheco evidencia um verdadeiro caos inserido nas relações sociais da

vida contemporânea. A primeira ideia de caos aparece na Bíblia, no livro do Gênesis (1:

2), onde se descreve a seguinte imagem: “a terra estava vazia e vaga, as trevas cobriam

o abismo, o espírito de Deus paraiva sobre as águas”. Tal passagem alude à imagem do

vazio e da desorganização das coisas. Ao mesmo tempo em que as trevas cobrem o

abismo, simbolizando a realidade, refletem também a imaterialidade.

A palavra “caos” provém do grego e descreve uma idéia ou qualquer situação

onde haja confusão ou desordem. Também encontramos associação do termo à noção de

“escuridão” e, inclusive, “trevas do inferno”.

Segundo o Dicionário de símbolos de Chevalier e Gheerbrant (1995, p. 193),

temos na expressão hebraica “tohu wa bohu” e nos ideais da sociedade greco-romana a

personificação do caos como a imagem do vazio e da desordem das formas anteriores à

criação do mundo. Essa imagem da não-ordenação encontra-se em sociedades como a

egípcia, a chinesa e a céltica, que compreendem o caos como origem da criação do

mundo e uma constante força da coexistência de formas.

Pacheco comenta sobre a imagem do caos em sua literatura:

No soy el inventor de la disolución y el caos. Además la poesía no es un

manual de autoayuda. Más bien sirve para llamar la atención sobre las cosas

menos agradables del mundo. Me parece asombrosa la capacidad de Neruda

para celebrar lo grato y lo placentero. La dicha y el placer son mudos. Sólo la

desgracia y el sufrimiento hablan (BRAVO VARELA, 2009, p. 67)

Page 59: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

59

Pacheco reconhece a carga fatalista de seus textos, pois não há como renegar a

realidade ao redor16

. Reconhece, ainda, sua dificuldade em criar uma literatura mais

musical, como relata:

[...] He escrito muy pocos versos rimados y nunca he hecho un buen soneto,

pero defiendo estas cosas con base en mi experiencia de haber vivido en el

puerto de Veracruz, donde hasta hoy se hacen décimas perfectas incluso por

autores que no saben leer ni escribir. Mi trabajo debe mucho a mis años de

Veracruz y a la cultura del verso oral (BRAVO VARELA, 2009, p. 71)

A cidade da obra de Pacheco é a Cidade do México real, a dos mapas

geográficos, a altamente populosa e poluída, a monstruosa, a violenta, a caótica, a

múltipla, a cantada por alguns escritores como a “ciudad perra”, “ciudad famélica”,

“ciudad lepra y cólera hundida”, “ciudad del fracaso ansiado” ou “ciudad con tres

ombligos”.

Sabemos que a maioria das grandes urbes na modernidade acaba por refletir, em

seus habitantes, as tensões políticas e econômicas. A visão romântica da maior parte das

cidades européias, presa à tradição, ao passado glorioso, não é retratada por Pacheco em

sua obra, mas sim o imaginário de uma cidade indígena. Segundo o crítico uruguaio

Fernando Aínsa (1998, p. 167-168), a imagem das cidades latino-americanas da

contemporaneidade é a de crescimento acelerado e muitas contradições, como ele

coloca:

Aparecen como un caos inhumano hecho de marginalidad y pobreza, de

barrios que diferencian drásticamente las clases sociales. Las capitales

latinoamericanas crecen en forma arbitraria, ruidosa y confusa” […] “La

ciudad aúna rascacielos y barrios marginales, villas miserias y ‘ghetos’ de

ricos protegidos por barreras, códigos y guardias privadas. Tráfico

congestionado, dificultades de transporte, contaminación y degradación del

medio ambiente.

Recorremos a Aínsa porque ele defende a Cidade do México, distinta de todas as

demais capitais latino-americanas, como a única que oferece uma imagem literária

apocalíptica. Os arranha-céus, o trânsito e a contaminação são nítidos exemplos da

cidade moderna transformada pela visão capitalista. Para o crítico, essa leitura está

presente na obra de diversos escritores mexicanos e pode ser explicada por sua intensa

16

No discurso de recebimento do Prêmio Cervantes, Pacheco (2009) mantém a visão caótica para o

mundo ao expressar: “Nada de lo que ocurre en este cruel 2010 – de los terremotos a la nube de ceniza, de

la miseria creciente a la inusitada violencia que devasta a países como México – era previsible al

comenzar el año. Todo cambia día a día, todo se corrompe, todo se destruye. Sin embargo en medio de la

catástrofe, al centro del horror que nos cerca por todas partes, sigue en pie, y hoy como nunca son capaces

de darnos respuestas, el misterio y la gloria del Quijote”. No discurso de ingresso ao Colegio Nacional de

México, em 1986, o escritor já demonstrava sua leitura do caos urbano ao comentar: “[...] Nos rodean una

ciudad y un país en ruinas. Por dondequiera vemos la devastación y la miseria” (PACHECO, 1986, p. 60).

Page 60: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

60

pluralidade cultural e por acontecimentos trágicos da história, como os terremotos de 19

e 20 de setembro de 1985. Outro teórico, Richard Sennett (1998) já anunciava que as

metrópoles são espaços de proliferação e de abundância, onde os sujeitos são

massacrados pelo excesso de imagens.

A cidade da obra de Pacheco não difere da anunciada por Aínsa. O escritor

mexicano retrata uma cidade a caminho da modernização, que não esqueceu seu

passado marcado de dor pelo encontro com outras culturas e que se revela caótica e

infernal a partir de vozes ou de personagens, que retratam o medo e a agonia de habitar

tais espaços.

As cidades da contemporaneidade são o reflexo do mito de Babel, já que a

confusão, o caos e a falta de entendimento predominam na vida moderna. Faz-se difícil

harmonizar e homogeneizar a pluralidade de vozes que habitam o espaço urbano para

construir um sentido, como foi a intenção da globalização. Tal visão é corroborada por

Renato Cordeiro Gomes (2008, p. 84-85) ao mencionar:

Esta crise do mundo urbano esboçada [...] em traços largos gera imagens

apocalípticas de moldura bíblica. Se esta já havia informado o tratamento da

cidade no século XIX e persiste no XX, acentua agora uma tendência a

retomar os mais velhos arquétipos como base para as novas imagens que, em

sua intermitência, experimentam ler a cidade ilegível [...] Essas metáforas

[...] conflitantes e do inferno projetam-se ainda na imagem da grande cidade

– confusão, esfacelamento da comunidade, não-comunicação,

individualidade exarcebada, indiferença – lida como Babel, o caos urbano

original, que parece materializar-se nas megalópoles de hoje.

As palavras de Gomes (2008) denunciam perfeitamente que o mito bíblico ecoa

nas grandes metrópoles modernas como sinal da impossibilidade de comunicação, do

esfacelamento do tempo e do espaço, da urbanidade. A releitura do mito de Babel na

grande urbe explica-se ao depararmo-nos com sujeitos diversos em busca de poder e de

vaidades, num cruel processo de diminuição da presença do outro e, ao mesmo tempo,

de vozes solitárias na imensa multidão.

A literatura de Pacheco forma um painel que tenta dar conta da Cidade do

México, mas que não representa sua totalidade, pois esta é impossível de ser captada.

Para a literatura, é difícil representar a permanente mudança do espaço geográfico e

suas constantes, sejam físicas ou sociais, já que a cidade de hoje não é necessariamente

a de amanhã, assim como a própria Modernidade é um eterno desconstruir para

reconstruir (IANNI, 1993).

Page 61: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

61

2. Cidade do México e suas múltiplas urbes

Antes de retratar o modo como Pacheco simboliza a capital mexicana no

romance selecionado para este artigo, resolvemos discutir a leitura proposta por García

Canclini (1999) para a capital mexicana em seu livro Imaginarios urbanos. A obra

reune três conferências ministradas pelo crítico argentino em 1996 na Universidad de

Buenos Aires sobre a desintegração da modernidade, a hibridização cultural, a

globalização do continente americano e os espaços públicos. Nossa opção pelo teórico

explica-se porque o mesmo centra seus estudos na capital mexicana a partir de uma

análise de filmes e fotos17

, que, ao mesmo tempo em que são corpus estáticos e

fragmentam o espaço da cidade, recebem uma crítica leitura aos olhos do antropólogo.

García Canclini parte do exemplo mexicano para tentar compreender o processo

de formação das cidades latino-americanas, cujo passado se vê implicado em processos

históricos e políticos. Para ele, conforme tratamos no início deste artigo, a cidade

esconde através de seu conjunto arquitetônico, diversos discursos, porque o espaço

urbano é, sem dúvida, um local de intercâmbio de informações, principalmente, as

culturais.

O crítico vê, na globalização política e cultural, uma explicação para a pouca

interação entre as nações e a presença de espaços de exclusão nos grandes centros. Na

primeira parte do livro, o autor vai reabrir um debate sobre a modernidade, porque

entende que o conceito de cidade evoluiu a partir da vida moderna.

Em seu livro Culturas híbridas, García Canclini apresentava a oscilação entre os

termos modernidade e pós-modernidade no sub-título de sua obra. Para o teórico, a

questão central dessa problemática não seria descobrir se o nosso continente americano

é moderno ou pós-moderno, mas como essa modernidade híbrida alcançada através das

relações sociais está se perdendo na mão de pequenos grupos que detêm o poder ou,

ainda, na posição ocupada por alguns países e seu desenvolvimento internacional.

Na obra, o ensaísta debate sobre as cidades multiculturais e as contradições da

modernidade. García Canclini defende a existência de três tipos de cidade dentro da

Cidade do México e, ao final do texto, emprega um termo de modo a sintetizar todas as

17

García Canclini (1999) analisou um total de 52 fotos contrastando presente e passado da Cidade do

México.

Page 62: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

62

outras denominações. A primeira cidade é a ‘histórico-territorial’, já que a Cidade do

México ergueu-se sobre as ruínas de uma cidade indígena, ou seja, sobre a arquitetura

de Tenochtitlán, capital do Império Asteca, fundada em 1325. O pesquisador ressalta a

presença visível de uma sobreposição de imaginários ao percorrer suas ruas e visualizar

seus edifícios e construções arquitetônicas.

A segunda cidade recebe o nome de ‘industrial’, porque a capital do país é uma

cidade que surge com o intuito de apagar os limites da cidade real, devido ao seu

crescimento industrial, à expansão de suas fábricas, à presença de bairros para

trabalhadores, aos transportes e aos serviços. Essa cidade modifica os usos do espaço

urbano, ou seja, a cidade passa a apresentar múltiplos centros. Perde-se o único centro

histórico. Um desses novos centros, por exemplo, passa a ser o shopping center.

Conforme García Canclini, temos, devido a esta descentralização, cada vez mais

a ideia de não sabermos os verdadeiros limites da cidade: onde começa, onde termina,

onde estamos. Tal fator é o responsável pela perda da coletividade e solidariedade nos

espaços sociais; o sujeito deixa de pertencer a uma comunidade. A necessidade de

compreender a crise urbana e a desagregação do espaço social levou o teórico a

visualizar uma terceira cidade.

A terceira cidade nomeada de ‘informacional’ ou ‘comunicacional’, como o

próprio nome revela, é a cidade que se comunica com diversos outros espaços; conecta-

se dentro de si mesma e com o estrangeiro, não somente através dos transportes

terrestres e aéreos, do correio e do telefone, mas também pelo cabo, fax, satélites e

internet. Essa cidade caracteriza-se pela automatização do homem, que, aos poucos,

perde sua identidade nacional. A industrialização deixa de ser o agente econômico mais

dinâmico do desenvolvimento das cidades. Apesar de visualizar a capital como a cidade

da informação, o crítico também expõe que a interação se faz cada vez mais difícil

devido aos problemas da mesma.

Em síntese, García Canclini resume as classificações para a Cidade do México

na chamada “ciudad videoclip”, ou seja, “La ciudad que hace coexistir en ritmo

acelerado un montaje efervescente de culturas de distintas épocas” (GARCÍA

CANCLINI, 1999, p.88). O conceito do ensaísta argentino também encontra

semelhança nas palavras do escritor Ítalo Calvino (1990, p. 30-31):

Page 63: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

63

Algumas vezes cidades diferentes sucedem-se no mesmo solo e com o

mesmo nome, nascem e morrem sem se conhecer, incomunicáveis entre si.

Às vezes, os nomes dos habitantes permanecem iguais, e o sotaque das vozes,

e até mesmo os traços dos rostos; mas os deuses que vivem com os nomes e

nos solos foram embora sem avisar e em seus lugares acomodaram-se deuses

estranhos.

Portanto, na cidade vídeo-clip coexistem todas as demais cidades com suas

culturas individuais, sendo essa uma característica imposta pela modernidade. A

pluriculturalidade tratada por Canclini comprova-se com a presença de todas essas

cidades dentro da mega cidade. Conforme García Canclini, a Cidade do México

constitui-se num espaço híbrido, cujo sujeito, ao analisar o seu redor, é capaz de

perceber a superposição, o contraste e a mescla de diferentes imaginários no espaço

físico da urbe.

Após debruçarmos sobre diferentes representações pela crítica para a Cidade do

México, resolvemos defender a imagem dessa cidade como um ‘quebra-cabeça’ ou,

também, ‘cidade de espelhos’. Pela espacialidade física da capital mexicana, podemos

sintetizá-la como um grande labirinto urbano formado por ruas, praças e rios que se

interpenetram, dispersando o homem que não consegue se libertar dessa estrutura. Além

do mais, as mega-cidades latino-americanas são poli-nucleadas (SARLO, 2004),

contribuindo, ainda mais, para a imagem da cidade moderna como um labirinto.

3. A Cidade do México representada no romance Las Batallas en el desierto

O romance curto Las Batallas en el desierto18

exemplifica de modo simples o

posicionamento do escritor diante da sociedade, tendo em vista que a história ocupa um

papel fundamental na obra de Pacheco. Carlitos e Jim, personagens centrais da trama,

estudam na mesma escola, mas pertencem a classes sociais distintas: o uso do inglês, os

costumes diários e os produtos, por exemplo, constroem a imagem da influência norte-

18

Sobre esta obra, Pacheco comenta: “El ambiente es real pero la historia es por completo imaginaria. No

tuve una adolescencia como la de Carlos, su protagonista. En toda actividad humana hay algo de horrible

y en este caso es que ya no puedo disculparme ante mis padres porque muchas personas que me hacen

favor de leer el libro creen que fueron como los padres de Carlos, cuando en realidad eran todo lo

contrario”. O escritor aborda, ainda, o momento histórico de inspiração para a narrativa quando

menciona: “Tal vez para escribir ese libro fue necesaria otra de las muchas muertes de la ciudad de

México: la apertura en 1977-1978 de los llamados ‘ejes viales’ que no sirvieron sino para enriquecer aún

más a los ladrones que en aras de la codicia han hecho de verdad inhabitable este lugar”. (BRAVO

VARELA, 2009, p. 69).

Page 64: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

64

americana na sociedade mexicana. A trama gira em torno da história de Carlitos, cujo

destino é ser repudiado pela hipócrita sociedade ao se apaixonar pela mãe de seu melhor

amigo. O caso é relatado após muitos anos do possível incidente, por isso o narrador/

protagonista já adulto recupera imagens de sua memória. O sujeito da enunciação e a

história já não são mais os mesmos, o próprio tempo encarregou-se de dar um novo

sentido a essas histórias.

Me acuerdo, no me acuerdo: ¿qué año era aquél?” Desse modo, inicia o romance

demarcando uma incerteza cronológica em relação à época enunciada pelo narrador do

texto. Mesmo sem uma exatidão do contexto referido por Pacheco, o autor retrata o

México do avanço econômico alcançado pelo primeiro civil a chegar à presidência,

Miguel Alemán Valdés, que governou entre 1946 e 1952. Apesar de todo crescimento

na economia, o governo também foi acusado por esquemas de corrupções e excesso de

poder:

La cara del Señorpresidente en dondequiera: dibujos inmersos, retratos

idealizados, fotos ubicuas, alegorías del progreso con Miguel Alemán como

Dios Padre, caricaturas laudatorias, monumentos […] Qué importa […] si

bajo el régimen de Miguel Alemán ya vivimos hundidos en la mierda

(PACHECO, 1981, p. 10)

O narrador introduz desde o início da narrativa as imagens de suas recordações

do passado e da história. Ao mesmo tempo em que parece fornecer uma informação

precisa, em seguida acaba por mudar de opinião. Acreditamos que esse recurso funcione

como uma forma de mostrar a oscilação das suas lembranças. Sua memória consegue

resgatar muitos detalhes e trazer para o momento da leitura as imagens daquele passado:

os objetos e produtos em uso nos anos quarenta, as referências à Guerra, a derrota

eleitoral de Miguel Henríquez Guzmán e outros detalhes, cuja função permite ao leitor

compartilhar uma visão do passado com informações precisas de acontecimentos locais,

nacionais e estrangeiros.

A partir de uma linguagem simples, o narrador adulto revela a complexidade da

vida na Cidade do México. Retrata as transformações ocorridas em seu país e em sua

cidade como o processo acelerado de industrialização, a expansão da infraestrutura

física e de serviços, o crescente processo de transculturação e a mudança de mentalidade

e valores dos habitantes. O período retratado também é o do pós-guerra evidenciado em

algumas passagens do texto.

Page 65: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

65

O discurso de Carlos adulto está impregnado de críticas e de referências

históricas, como por exemplo, a dor causada pela explosão da bomba atômica. Pacheco

retrata com tanta naturalidade as imagens do México daquele momento que os leitores

dos anos quarenta podem acabar comprovando a veracidade ou não das referências

históricas da obra. O leitor encontra em suas páginas marcas de produtos comerciais,

nomes de filmes e programas de rádio, costumes, dados e outros. Nesse cenário, o

narrador descreve a influência externa dos domínios da urbe e seu processo de

modernização tecnológica: o excesso de propagandas de produtros de outros países, a

circulação de veículos americanos, o crescente uso do spanglish pela classe média e

outros, além dos surtos de poliomielite.

A reflexão sobre o sentido da história também está presente no romance. Se por

um lado, o autor apresenta certos dados como precisos e verdadeiros, por outro conduz

o leitor a duvidar de algumas referências do passado, inclusive, porque não expressa de

modo direto a data dos acontecimentos. Essa atitude crítica de retratar fatos do passado

é uma característica constante no conjunto da obra de Pacheco (VERANI, 1994),

independente do gênero. Claro que a presença desses dados históricos na obra de

Pacheco não se explica como uma mera recordação, mas sim, principalmente, com o

interesse de reforçar o papel do leitor como crítico do seu próprio meio.

O acontecimento histórico principal da obra de Pacheco está no processo de

modernização industrial ocorrido com o alemanismo. Antes dos anos quarenta do século

XX, sob o comando de José de la Cruz Porfirio Díaz, também se encontrou um esforço

em prol do desenvolvimento do país. Díaz também se empenhou em contribuir para o

crescimento da indústria, do aumento dos serviços públicos e da comunicação interna,

decorrentes da tarefa modernizadora do país. O narrador retrata a lembrança da cidade

dos tempos de Porfirio Díaz:

La plaza Ajusco adonde me llevaban recién nacido a tomar sol y en donde

aprendí a caminar. Sus casas porfirianas, algunas ya demolidas para construir

edificios horribles. Su fuente en forma de trébol, llena de insectos que se

deslizaban sobre el agua (PACHECO, 1981, p. 33)

Carlos, já envolto pela atmosfera da vida numa cidade moderna e com inúmeros

agravantes, narra com saudade da capital do país antes da mudança sofrida pelo espaço

com a construção de arranha-céus e a falta de zelo com o patrimônio público. Após

Porfirio Díaz, os vestígios da luta armada para fortalecer os objetivos da Revolução

Mexicana e os desdobramentos da Segunda Guerra Mundial não contribuíram para a

Page 66: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

66

manutenção do desenvolvimento industrial do país. Alemán ocupou a cadeira

presidencial após o final da Segunda Guerra e devido à proximidade com o país

vencedor, os Estados Unidos, converteu-se no “mister amigo” por facilitar negociações

e compartilhar certos ideais.

Os cenários da narrativa são descritos com precisão de modo a permitir ao leitor

a reconstrução exata de certas imagens do México daqueles anos; a nostalgia perpassa a

obra. O trabalho de linguagem de Pacheco parece fotografar a realidade daquele período

de maneira a aproximar o leitor da mensagem do relato. O narrador enuncia, a partir de

seu presente, o contexto de uma cidade que se transformou numa mega-cidade e por

isso sofre as consequências dessa transformação, observadas na falta de comunicação

entre seus habitantes, na crescente solidão, na mudança de valores sociais e na

ineficiência das instituições sociais.

As consequências da vizinhança com os Estados Unidos e a modernização do

país são as questões centrais do romance de Pacheco, evidentes na própria vida do

protagonista e narrador da história. Carlos sofre preconceito, na casa de Harry Atherton,

com quem estabelece uma breve relação de amizade, por conta de seu comportamento

no jantar:

Voy a darte un consejo: aprende a usar los cubiertos. Anoche comiste filete

con el tenedor del pescado. Y no hagas ruido al tomar la sopa, no hables con

la boca llena, mastica despacio trozos pequeños (PACHECO, 1981, p. 25)

Este ato simboliza, na narrativa, a subordinação perante o norte-americano,

enquanto que em sua amizade com Jim (filho de um norte-americano e uma mexicana),

o autor destaca a inferioridade de Carlitos diante de um compatriota, mas que teve

acesso à cultura do norte.

O próprio sistema capitalista é quem dita os moldes culturais a que os sujeitos

devem se encaixar. Quando isso não ocorre, sofrem os preconceitos da sociedade

moderna que aparenta pregar a liberdade do homem. Para o sociólogo alemão Georg

Simmel (1998), o dinheiro tem um papel decisivo no sistema capitalista, porque seria

um facilitador entre o homem e seus desejos; uma espécie de “Deus da modernidade”.

Ainda de acordo com o pesquisador, “forma-se a idéia de que toda a felicidade e toda

satisfação definitiva na vida são ligadas, intrinsecamente, à posse de certa forma de

Page 67: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

67

dinheiro” (SIMMEL, 1998, p. 33). O dinheiro permite a independência do sujeito e

torna-se o mediador das relações sociais. Há uma crítica de Carlos adulto em relação ao

provincianismo de sua mãe.

O protagonista retrata, na primeira parte da narrativa, sua recordação da época

chamada como o “mundo antiguo”, lugar da enunciação, aquele em cuja infância

também já anunciava sinais de degradação, como percebemos em sua leitura, a qual

estava muito influenciada pela opinião de seus pais:

Era el mundo antiguo. Los mayores se quejaban de la inflación, los cambios,

el tránsito, la inmoralidad, el ruido, la delincuencia, el exceso de gente, la

mendicidad, los extranjeros, la corrupción, el enriquecimiento sin límite de

unos cuantos y la miseria de casi todos. (PACHECO, 1981, p. 10-11)

Esse retrato traçado pelo personagem pode ser entendido como o estado em que

se encontrava o país antes do governo de Alemán. O narrador também critica a posição

ditatorial da escola e, mais uma vez, acaba por levantar aspectos de transformação do

espaço físico:

Escribíamos mil veces en el cuaderno de castigos: debo ser obediente, debo

ser obediente, debo ser obediente con mis padres y con mis maestros. Nos

enseñaban historia patria, lengua nacional, geografía del DF: los ríos (aún

quedaban ríos), las montañas (se veían las montañas). (PACHECO, 1981, p.

10)

O passado modela a nossa vida no presente e somos o que somos por conta disso

e das informações recuperadas pela memória, corroborada pela escritura. As

informações prestadas pela memória de Carlos permitem ao leitor construir certa

fidelidade entre o real e a narração, pois somos capazes de reconhecer coerência em

suas imagens e o fato ocorrido.

Pacheco expressa em sua narrativa o crescimento de Carlitos e o da própria

cidade, onde ambos são arrastados pelas mudanças impostas pela modernização e pela

globalização neoliberal:

Sólo en el confinamiento entendemos que vivir es tener espacio. Hubo un

tiempo feliz en que podíamos movernos, salir, entrar y ponernos de pie o

sentarnos. Ahora todo cayó (PACHECO, 1981, p. 64)

Page 68: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

68

A globalização acaba por romper as relações entre os sujeitos da cidade, as

relações entre a família, os gestos mais humanos como um simples carinho ou um beijo

desaparecem. A metrópole tenta sobreviver na constante mutação de suas formas e

novos discursos em seu interior. A racionalidade é a única arma de defesa. Ao final do

relato, o discurso do narrador resume a indiferença da vida cotidiana e a vontade de

apagar da memória o passado de incerteza, dor e angústia:

Qué antigua, qué remota, qué imposible esta historia. Pero existió Mariana,

existió Jim, existió cuanto me he repetido después de tanto tiempo de

rehusarme a enfrentarlo. Nunca sabré si el suicidio fue cierto. Jamás volví a

ver a Rosales ni a nadie de aquella época. Demolieron la escuela, demolieron

el edificio de Mariana, demolieron mi casa, demolieron la colonia Roma. Se

acabó esa ciudad. Terminó aquel país. No hay memoria del México de

aquellos años. Y a nadie le importa: de ese horror quién puede tener nostalgia

(PACHECO, 1981, p. 67-68)

Ao mesmo tempo em que o narrador revela uma leitura de um país repleto de

problemas, projeta uma imagem de esperança de novos tempos, período marcado no

discurso do narrador por meio de um ano específico, o de 1980. Vale ressaltar que um

ano após foi a data de publicação da primeira versão da obra. O narrador revela sua

imagem de cidade do futuro, que talvez fosse aquela esperada após o período de

Alemán no poder:

Para el impensable 1980 se auguraba – sin especificar cómo íbamos a

lograrlo – un porvenir de plenitud y bienestar universales. Ciudades limpias,

sin injusticia, sin pobres, sin violencia, sin congestiones, sin basura. Para

cada familia una casa ultramoderna y aerodinámica (palabras de la época). A

nadie le faltaría nada. Las máquinas harían todo el trabajo. Calles repletas de

árboles y fuentes, cruzadas por vehículos sin humo ni estruendo ni

posibilidad de colisiones. El paraíso en la tierra. La utopía al fin conquistada

(PACHECO, 1981, p. 11)

O discurso do narrador adulto esconde uma dimensão crítica e um forte

desengano, características do homem moderno, já que o contexto mexicano retratado

era o da multiplicação dos meios de comunicação de massa e a sociedade de consumo.

A visão retratada do futuro por Carlos assemelha-se à da propaganda, tanto política

como publicitária, sendo essa última aquela dos sonhos de moradia ideal difundida

pelos jornais e revistas, além da importação do modelo de vida dos Estados Unidos.

A cidade no decorrer da narrativa vai assumindo sua posição como um

personagem, demonstrando seu crescimento rumo a ser uma mega-cidade. As forças de

Page 69: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

69

produção capitalista, a promessa de novos empregos e de melhores serviços públicos

são pontos positivos vislumbrados no discurso do narrador. A classe média tenta se

adaptar ao processo de modernização e à inserção cada vez mais intensa de empresas

norte-americanas. No entanto, a presença de camadas marginais na cidade ainda

permanece:

Si vas a Romita, niño, te secuestran, te sacan los ojos, te cortan las manos y la

lengua, te ponen a pedir caridad y el Hombre del Costal se queda con todo.

De día es un mendigo; de noche un millonario elegantísimo gracias a la

explotación de sus víctimas. El miedo de estar cerca de Romita. El miedo de

pasar en tranvía por el puente de avenida Coyoacán: sólo rieles y durmientes;

abajo el río sucio de La Piedad que a veces con las lluvias se desborda

(PACHECO, 1981, p. 14)

Essa dupla permanência é notória na vida daqueles que habitam a cidade

contemporânea, gerando um sentimento de medo. O pensamento da mãe de Carlitos

expressa o medo da classe média urbana ao se deslocar dentro de “sua” cidade. A cidade

no decorrer da narrativa vai assumindo sua posição como um personagem,

demonstrando seu crescimento rumo a ser uma mega-cidade. As forças de produção

capitalista, a promessa de novos empregos e de melhores serviços públicos são pontos

positivos vislumbrados no discurso do narrador. A classe média tenta se adaptar ao

processo de modernização e à inserção cada vez mais intensa de empresas norte-

americanas. No entanto, a presença de camadas marginais na cidade ainda permanece:

Si vas a Romita, niño, te secuestran, te sacan los ojos, te cortan las manos y la

lengua, te ponen a pedir caridad y el Hombre del Costal se queda con todo.

De día es un mendigo; de noche un millonario elegantísimo gracias a la en

tranvía por el puente de avenida Coyoacán: sólo rieles y durmientes; abajo el

río sucio explotación de sus víctimas. El miedo de estar cerca de Romita. El

miedo de pasar de La Piedad que a veces con las lluvias se desborda

(PACHECO, 1981, p. 14)

Essa dupla permanência é notória na vida daqueles que habitam a cidade

contemporânea, gerando um sentimento de medo. O pensamento da mãe de Carlitos

expressa o medo da classe média urbana ao se deslocar dentro de “sua” cidade. De

acordo com Magatti (2009, p. 8-9),

[...] enquanto os bairros centrais são valorizados e tornam-se objeto de

grandes investimentos urbanísticos, outras áreas são corroídas pela

degradação e tornam-se marginais. Quem possui recursos econômicos ou tem

condições de deslocar-se tenta se defender criando verdadeiros enclaves.

Page 70: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

70

Os principais medos presentes no imaginário coletivo são decorrentes da própria

humanidade. Num mundo social idealizado, na busca contínua pela segurança e pela

proteção, os sofrimentos humanos surgem da própria fragilidade dos nossos corpos e do

convívio com os demais. Conforme Bauman (2009, p. 55), “a segurança pessoal tornou-

se muito importante, talvez o argumento de venda mais necessário [...] o ‘capital do

medo’ pode ser transformado em qualquer tipo de lucro político ou comercial”.

A cidade moderna constrói-se a partir da necessidade de proteção individual.

Segundo Bauman (2009, p. 42), a proposta desses espaços vetados “é a de claramente

dividir, segregar, excluir, e não criar pontes, convivências agradáveis e locais de

encontro, facilitar as comunicações e reunir os habitantes da cidade”. O medo

transforma-se numa fonte do capitalismo em nossa sociedade. Ao explorá-lo, os

veículos de comunicação acabam por reforçar a sensação de caos em nossas atitudes.

Não há como manter uma relação de convívio sem que o medo se expresse, porque o ser

humano é alimentado, em grande parte, por diferentes emoções. O medo acompanha-

nos e garante nossa sobrevivência física desde o início do percurso histórico e

evolutivo. Por ser uma emoção, o medo não resulta de uma experiência obtida de modo

passivo, mas sim da resposta do organismo provocada pela consciência de um perigo

iminente ou presente, provocada pela vivência num espaço coletivo.

Considerações finais

A cidade e seus constituintes são grande força motriz no estabelecimento das

relações entre os sujeitos que se reconhecem nesses espaços. Ao mesmo tempo, leva-os

a uma recordação de toda a história dos seus antepassados, e essa estará sendo

reconstruída dia a dia, a partir do momento em que o indivíduo visualiza o ambiente ao

seu redor, e esse ambiente, de certa maneira, também o observa em suas ações e seus

posicionamentos.

A vinculação de Las Batallas en el desierto com a história reflete as

ambiguidades típicas de uma obra literária, que dificilmente retrata de modo fidedigno a

Page 71: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

71

realidade. O trabalho de criação artística de Pacheco demonstra a necessidade de

envolver o leitor na reconstrução do passado e a presença do mesmo no romance.

Pacheco não poupa o uso de referências históricas para corroborar seu projeto literário e

a tessitura do retrato sociológico da metrópole mexicana. Através da história e da

realidade visível, o escritor mostra a aparição do neoliberalismo no cenário político e a

evolução das comunicações nos anos oitenta do México. Tal política neoliberal encontra

mais facilidades de propagação numa sociedade globalizada e homogênea, por isso, o

interesse em anunciar a transculturação proposta pelo consumismo norte-americano.

A cidade no decorrer da narrativa vai assumindo sua posição como um

personagem, demonstrando seu crescimento rumo a ser uma mega-cidade. O romance

de Pacheco permite o leitor repensar inúmeras questões e verificar como o autor critica

a sociedade, a partir do momento em que trata alguns temas, entre eles: a uniformização

do modo de vida do mexicano, o crescimento desordenado da urbe, a industrialização

excessiva, o idealismo pelos objetos da modernidade, o consumismo, o poder, o

mercantilismo e a corrupção. A mudança de costumes, a rápida ascensão social da

família de Carlitos e a corrupção política são críticas diretas do autor ao avanço norte-

americano sobre a cultura mexicana.

Referências

AÍNSA, Fernando. Del espacio mítico a la utopía degradada: los signos duales de la

ciudad en la narrativa latinoamericana. Em: Cânones & contextos: anais. Congresso

ABRALIC. Rio de Janeiro: Reproarte, 1998, v.1, p. 165-175.

BAUMAN, Zygmunt. Confiança e medo na cidade. Trad. Eliana Aguiar. Rio de

Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2009.

BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e

história da cultura. Trad. Sérgio Paulo Rouanet. 7ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.

BRAVO VARELA, Herán. Nuevo elogio de la fugacidad. Una conversación con José

Emilio Pacheco. Em: Revista Letras Libres. Espanha: Universidad de la Rioja, jun.

2009

CALVINO, Ítalo. As cidades invisíveis. Trad. Diogo Mainardi. São Paulo: Companhia

das Letras, 1990.

Page 72: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

72

CHEVALIER, Jean & GHEERBRANT, Alain. Diccionario de símbolos, 5ed.,

Barcelona: Editorial Herder, 1995.

GARCÍA CANCLINI, Néstor. Imaginarios urbanos. 2ed. Buenos Aires: Editorial

Universitaria de Buenos Aires, 1999.

------. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. Trad. Ana

Regina Lessa e Heloísa Pezza Cintrão. 3ed. São Paulo: EDUSP, 2000.

GOMES, Renato Cordeiro. Todas as cidades, a cidade. Literatura e experiência

urbana. Rio de Janeiro: Rocco, 2008.

IANNI, Octavio. O labirinto latino-americano. Rio de Janeiro: Vozes, 1993.

KIDNER, Derek. Gênesis. Introdução e comentário. Trad. Odayr Olivetti. São Paulo:

Vida nova, 1979.

MAGATTI, Mauro. Bauman e o destino das cidades globais. Em: BAUMAN,

Zygmunt. Confiança e medo na cidade. Trad. Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Jorge

Zahar Editor, 2009.

PACHECO, José Emilio. Las Batallas en el desierto. México: Ediciones Era, 1981.

------, A 150 años de la Academia de Letrán – Discurso de ingreso al Colegio

Nacional el 10 de julio de 1986. 1986. Disponível em: <

http://www.colegionacional.org.mx>. Último acesso em: 08 nov. 2015.

------. Discurso do Premio Cervantes 2009. 2009. Disponível em:

<http://www.abc.es/gestordocumental/uploads/Cultura/pacheco.pdf>. Último acesso

em: 11 nov. 2015.

ROUANET, Sérgio Paulo. A verdade e a ilusão do pós-moderno. Em: Revista do

Brasil. Literatura Anos 80. FUNARJ, Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 1986, p.

28-53.

SARLO, Beatriz. Cenas da vida pós-moderna: intelectuais, arte e videocultura na

Argentina. 3ed. Trad. Sérgio Alcides. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2004.

SENNETT, Richard. O declínio do homem público: as tiranias da intimidade. Trad.

Lygia Araújo Watanabe. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

SIMMEL, Georg. O dinheiro na cultura moderna. Em: SOUZA, Jessé & OELZE, B.

(orgs.). Simmel e a Modernidade. Brasília: Editora UnB, 1998, p. 23-40.

VERANI, Hugo. (sele. y pról..). La hoguera y el viento. José Emilio Pacheco ante la

crítica. México: Ediciones Era, 1994.

Page 73: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

73

EL SURREALISMO EN AMÉRICA

Ruben Daniel Méndez Castiglioni - UFRGS, CNPq

En primer lugar, quiero agradecer a la organización de este evento, en

especial a la profesora doctora Adriana de Borges, por la invitación. Quiero agradecer a

la Universidade do Estado da Bahia por esta posibilidad que me ofrece de estar aquí,

reunido en un congreso de esta naturaleza, con brillantes conferencistas y expositores

que comparten su entusiasmo y conocimientos. Deseo también felicitarles por los diez

años del curso de español.

He sido generosamente convidado para presentar la investigación que

estamos realizando en la Universidade Federal do Rio Grande do Sul19

. Nuestro

proyecto es sobre el surrealismo, uno de los movimientos culturales más importantes del

siglo XX - tal vez el más importante por su influencia en la poesía y en las artes.

Nuestra intención es investigar la recepción, penetración, difusión e influencia que tuvo

en España y en América, especialmente en Argentina, pues fue en ese país donde por

primera vez se formó un grupo surrealista fuera de Francia.

El proyecto consiste, específicamente, en estudiar la producción

literaria de Eugenio Granell, Pablo Picasso y Salvador Dalí, autores españoles que,

aunque sean más conocidos por sus trabajos en las artes plásticas y, en el caso de Dalí,

también en el cine, se destacan por sus escritos, los cuales tienen una interesante

recepción. Para el caso americano estamos estudiando la producción literaria de Aldo

Pellegrini, pionero del surrealismo en América Latina y justamente el fundador del

primero grupo surrealista fuera de Francia. La idea inicial era buscar manifestaciones

surrealistas en nuestro continente y el nombre de Pellegrini surgió después de una

19

Este artículo está basado en un capítulo del libro recientemente publicado: Surrealismo Aldo

Pellegrini, el pionero en América y es una versión levemente modificada y substancialmente

abreviada de algunos puntos que abordamos.

Page 74: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

74

memorable conversación en la casa de Ernesto Sábato, que fue su amigo. Y será de él de

quien hablaremos ahora.

El espíritu nuevo

Como es sabido, el puerto de Buenos Aires tuvo un papel relevante

como centro de desembarque de novedades del viejo continente. Con la

industrialización, la entrada en el escenario internacional por medio de grandes

inversiones nacionales y extranjeras y de un considerable aumento de la población

debido a la inmigración en el período de 1910 a 1940, hubo una reafirmación de la

originalidad cultural en las letras hispanoamericanas. Se originaron nuevas

posibilidades de expresión que abarcaron la realidad político-social. De esa manera,

según Jorge Schwartz (2002), en el caso de las vanguardias, estas buscaban lo “nuevo”.

En efecto, y no por casualidad, Guillaume Apollinaire designaba a las

vanguardias de “espíritu nuevo”, nombre con el cual bautizó la importante revista

francesa L’esprit nouveau. Esa búsqueda de los poetas por la renovación no renegaba a

las vanguardias europeas, sino que las abarcaba en sus propuestas. En realidad, América

tradujo la vanguardia europea sobre todo para dar cuenta de los cambios en la ciudad y

del frenesí urbano. Vicente Huidobro,20

que convivió con Juan Gris, Max Jacob, Paul

Dermée, Pablo Picasso, Diego Rivera, Jean Cocteau, Apollinaire, entre otros

(SCHWARTZ, 2002, p. 96), lanzó el primer manifiesto vanguardista de América,

intitulado “Non serviam”. En él, proclamaba:

Y he aquí que una buena mañana, después de una noche de preciosos sueños

y delicadas pesadillas, el poeta se levanta y grita a la madre Natura: Non

serviam. [...] Ese non serviam quedó grabado en una mañana de la historia

del mundo. No era un grito caprichoso, no era un acto de rebeldía superficial.

Era el resultado de toda una evolución, la suma de múltiples experiencias

(HUIDOBRO en SCHWARTZ, 2002, p. 100).

20

Vicente Huidobro, de acuerdo con Schwartz (2002, p. 95), es “el fundador de las vanguardias

europeas”.

Page 75: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

75

Y Pellegrini se transformó en uno de los nombres decisivos porque

pensó y estableció el surgimiento de la lectura y escritura en Argentina, no diría de las

vanguardias, pero sí de nuevas ideas por medio de la traducción, de sus ensayos, de sus

piezas de teatro, de sus conferencias. La traducción al español, principalmente de las

obras en francés de André Breton, Antonin Artaud, Louis Aragon, Maxime Alexandre,

Marcel Duchamp, Paul Éluard, Benjamin Péret, Philippe Soupault, René Crevel, Robert

Desnos, Jean-Pierre Duprey, Jacques Prévert, Maurice Blanchard, Francis Picabia,

Raymond Queneau, Lautréamont, entre otros nombres cardinales del movimiento,

influenciaron una generación de jóvenes sedientos por cambios en el dominio de las

artes.

Quién fue Aldo Pellegrini

Pellegrini nació en el año 1903 en Rosario, provincia de Santa Fe,

donde pasó toda su infancia. Estudió medicina en Buenos Aires, aunque su vocación fue

siempre la de las letras, el arte y, agregamos, de las polémicas intelectuales. En 1926

fundó el primer grupo surrealista de lengua española y, dos años más tarde, la revista

surrealista Qué. A partir de entonces su nombre aparece relacionado a diversas revistas

argentinas de cuño surrealista o influenciadas por el surrealismo: Ciclo (1948), A partir

de cero (1952), Letra y línea (1953), Boa (1958) y La Rueda (1967). Colaboró en varias

publicaciones identificadas con la renovación estética y, particularmente, en la

presentación y orientación de grupos de artistas de vanguardia. Fue uno de los primeros

a apoyar las diferentes corrientes artísticas modernas que aparecieron en Argentina en el

período comprendido entre los años 1940-1960, destacándose como teórico y orientador

de la renovación del arte, lo que tan bien retrata su libro Artistas abstractos argentinos

(1956).

Su obra poética está reunida en cinco tomos: El muro secreto (1949),

La valija de fuego (1952), Construcción de la destrucción (1957), Distribución del

silencio (1966) y Escrito para nadie, que fue publicado tras su muerte (1989).21

Hoy en

día su poesía es considerada por los especialistas como una de las más significativas

21

Recientemente su hijo Mario publicó La valija de fuego - Poesía Completa.

Page 76: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

76

realizaciones de la poética argentina. También publicó la elogiada Antología de la

poesía surrealista de lengua francesa (1961), reconocida por André Breton como el

estudio más completo sobre el tema, y la Antología de la poesía viva de Latinoamérica

(1966), donde mostró sus indiscutibles cualidades como crítico.

Su Teatro de la inestable realidad se remonta al año 1964, y el ensayo

Para contribuir a la confusión general, a 1965. De sus traducciones destacamos la que

hizo de las obras completas de Lautréamont (1964), precedida por un importante

ensayo, la de los Manifiestos del surrealismo, de André Breton (1965), la de Antonin

Artaud, con un estudio previo (1967), así como la de la obra del poeta austríaco Georg

Trakl (1972). Como crítico de arte, su labor se completó con Panorama de la pintura

argentina y con Nuevas tendencias de la pintura (1966). Aldo Pellegrini también fue

catedrático de Historia del Arte en la Universidad de Chile, en 1971, durante el gobierno

de Salvador Allende.

Descubrimiento del surrealismo y formación del grupo argentino

Sabemos que sus primeros estudios los cursó en la ciudad en que

nació y que se trasladó a Buenos Aires para entrar en la Facultad de Medicina alrededor

de 1921-1922. Podemos suponer que, en la línea de su generación, la referencia poética

tras los tanteos iniciales fuese la poesía modernista, dominada por la figura de Rubén

Darío (1867-1916) y, por supuesto, sus expresiones argentinas. A partir de ahí, Aldo

Pellegrini probablemente buscó un nuevo concepto de poesía que estuviese en sintonía

con los ritmos y características de los tiempos modernos, con los experimentos que se

estaban realizando en Europa y en la propia América Latina, y fundamentalmente con

las ansias de su generación.

Durante sus años de estudiante, por lo menos a partir de 1923 o 1924,

tuvo acceso a la revista francesa Littérature, a través de la cual conoció a André Breton

y a sus compañeros (BACIU, 1974, p. 17). Conoció las obras de Alfred Jarry, a quien

“admiraba” (PELLEGRINI en BACIU, 1974, p. 17) y de Guillaume Apollinaire, por

quien se “interesaba especialmente” (PELLEGRINI en SOLA, 1967, p. 111), compartió

sus conocimientos, informaciones y gusto poético con algunos de sus compañeros de la

Page 77: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

77

Facultad de Medicina que, desde el punto de vista literario “sólo estimaba[n] a Oliverio

Girondo y a Macedonio Fernández” (PELLEGRINI en SOLA, 1967, p. 111), muy

probablemente porque se sentían atraídos por el humor presente en la obra de estos dos

escritores que ya anticipan, de alguna manera, el surrealismo. Girondo y Macedonio

Fernández tenían un sentido del humor asociado a lo poético, próximo a Jarry y

Apollinaire. Es decir, en la búsqueda de Pellegrini y sus amigos por una poética más

avanzada era más que probable que se topasen con el surrealismo.

En una carta a la crítica literaria Graciela de Sola, Pellegrini dijo que

el diario Crítica de Buenos Aires, teniendo como motivo la muerte del escritor francés

Anatole France (Premio Nobel de Literatura de 1921 y que falleció en octubre de 1924),

publicó un número completo en homenaje al escritor, que por entonces “parecía tener

una importancia similar a la de [Víctor] Hugo” (PELLEGRINI en SOLA, 1967, p. 111).

En este número dedicado a France había también un telegrama de París con el anuncio

de la publicación de un panfleto contra el escritor francés que era especialmente

virulento: los surrealistas, entre los cuales se destacaban Soupault, Éluard y Breton,

acusaban a France de ser “miedoso”, “conciliador”, “necio”; y a sus libros de ser

“precarios”, “vacíos”, y a su arte de ser la representación del “puro genio francés”

(NADEAU, 1970, p. 65). Los términos usados en el panfleto le deben haber parecido

muy adecuados a Pellegrini, a quien “la falta de pasión y el escepticismo barato de

France” le parecían “la caricatura del verdadero inconformismo” (PELLEGRINI en

SOLA, 1967, p. 111).

Pellegrini envió la lista de los firmantes del panfleto a la editora

Gallimard (que por aquel entonces le proveía de libros franceses), pidiendo que le

mandasen lo que de ellos hubieran publicado. De esta manera le llegó el Manifiesto del

surrealismo, de Breton, y el primer número de la revista La Révolution Surréaliste,

ambos surgidos en París a fines de 1924 (en octubre y diciembre, respectivamente). Al

recibir los textos del grupo surrealista de París, probablemente antes del segundo

semestre de 1925, Aldo Pellegrini se “deslumbró” (BACIU, 1974, p. 17) y comenzó a

divulgar estas ideas entre algunos de sus compañeros de estudios. Así, tras algunos

meses de trabajo de catequesis (como el mismo Pellegrini expresó), fue fundado el

primer grupo surrealista de América Latina, que “comenzó a preparar una revista”

(BACIU, 1974, p. 17), que fue publicada en noviembre de 1928.

Page 78: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

78

[...] les hablé con entusiasmo a mis compañeros David Sussmann y Marino

Cassano, y después a Elías Piterbarg, quien trajo a su hermano Ismael y a

Adolfo Solari. Todos formamos una especie de fraternidad surrealista, la que

realizaba experiencias de escritura automática. La actividad de este grupo,

totalmente desvinculado de las corrientes literarias de entonces [...] culminó

con la publicación de los dos números de la revista Qué (SOLA, 1967, p.

111).

Fue de esa manera que fue fundado el primer grupo surrealista fuera de Francia, el cual

realizó diversas publicaciones y actividades y mantuvo su espíritu hasta, por lo menos,

la muerte de su fundador.

Hacia una definición del surrealismo22

El entusiasmo, la dificultad y también la claridad de comprensión del

movimiento surrealista por parte de Pellegrini (PELLEGRINI, 1950, p. 298) aparecen

en sus escritos. Como sabemos, el surrealismo no tiene un cuerpo unitario de doctrina

para su descripción. Los manifiestos de Breton sirven apenas como punto de partida

inicial, y si lo que se pretende es llegar a construir una idea integral sobre el asunto,

deben ser estudiadas las innumerables actividades de los desiguales integrantes del

grupo.

Fue en agosto de 1920 que André Breton utilizó por primera vez el

término surrealismo en un artículo. Con él denominaba las creaciones espontáneas en el

lenguaje producidas por el inconsciente (particularmente en la escritura automática)

(PONGE, 1994, p. 13). Aldo Pellegrini juzgó necesario iniciar sus análisis con la

siguiente advertencia: “En primer término hay que destacar claramente que el

surrealismo no es un mero movimiento literario o estético” (PELLEGRINI, 1950, p.

299). No se trata de un desatino de Pellegrini, sino de una de las posiciones

22

Para esta parte, además de la bibliografía citada, recurrimos también a “Un grito del espíritu”, artículo

todavía inédito de Robert Ponge, a “Mais Luz!”, del mismo autor (1991) y a “L´Être ou le paraître

surréaliste”, de Claude Courtot (1994).

Page 79: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

79

fundamentales del grupo que, según el propio Pellegrini, se negaba “a ser considerado

una escuela literaria y artística” (PELLEGRINI, 1950, p. 299). En efecto, se puede, por

ejemplo, leer en la Declaración [colectiva] del 27 de enero de 1925:

1º) Nosotros nada tenemos que ver con la literatura. Pero somos, en

caso necesario, muy capaces de servirnos de ella lo mismo que todos.

2º) El surrealismo no es un mecanismo de expresión nuevo o más

fácil, ni tampoco una metafísica de la poesía (PIERRE, 1980, p. 34).

Otras afirmaciones en el mismo sentido pueden ser encontradas con la

firma de Aragon, Breton, Péret y otros (PONGE, 1994, p. 334-335). Inclusive, en su

discurso de apertura del coloquio Surrealismo Nuevo Mundo, realizado en Buenos

Aires en 1992, el poeta surrealista argentino Enrique Molina subrayó que el surrealismo

“no es un movimiento estético como el impresionismo o el cubismo y, en el plan

literario, el simbolismo, el futurismo y el ultraísmo, o tantas otras escuelas de

vanguardia” (MOLINA,1999, p. 23-24).

Pellegrini dijo que el surrealismo es un “movimiento espiritual”, o, en

otros términos, un “estado de espíritu”, o, aún, una “ideología”, un “método de vida”,

una “concepción del mundo” (PELLEGRINI, 1950, p. 297-299). Breton no decía nada

diferente cuando - además de hablar de “un estado de espíritu”- se refería al surrealismo

como un “modo de pensar”, una “manera de ver y de sentir”, una “actitud poética,

social, filosófica” (PONGE, 1994, p. 336). Según el autor argentino:

[...] el surrealismo aparece como un intento de búsqueda de los valores

esenciales y permanentes del hombre, a través de todas las contingencias, y

de la exacta ubicación de esos valores en el plano social del presente.

Precisando aún más, el surrealismo está ubicado en la corriente del hombre

que se busca a sí mismo, que indaga su sentido, que descubre en la hondura

del hombre lo universal, que ha pensado al hombre como microcosmos

(PELLEGRINI, 1950, p. 298).

Esta declaración, que se puede reconocer como justa y correcta, no

resuelve la cuestión. En un artículo de 1951, Aldo Pellegrini se encarga de precisarla

Page 80: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

80

para matizar los objetivos y móviles del surrealismo. Tuvo la buena idea de basarse en

la frase de la cubierta del primer número de La Révolution Surréaliste: “Es necesario

llegar a una nueva declaración de los derechos del hombre” (PELLEGRINI, 1951, p.

643). De esta sentencia, Pellegrini concluye que “la preocupación fundamental del

surrealismo, la razón por la cual se negaba a aparecer como una pura escuela literaria o

estética”, es que el surrealismo se propone a la tarea ambiciosa de liberar al hombre

(PELLEGRINI, 1951, p. 643-644). Inclusive la Declaración del 27 de enero de 1925

dejaba explícito en su punto número dos que el surrealismo “es un medio de total

liberación del espíritu y de todo lo que pueda parecérsele” (PIERRE, 1980, p. 34).

Pero, ¿cómo se consigue esta liberación? André Breton respondió a

esta pregunta definiendo el “pacto surrealista” como una tarea de tres fases: “ayudar, en

toda la medida de lo posible a la liberación social, trabajar sin cesar para la

desincrustación integral de las costumbres, rehacer el entendimiento humano”

(BRETON, 1979, p. 105, subrayado por el autor). El surrealismo se vale o se valía de la

acción política para realizar el primer objetivo. Pero, ¿y los otros dos? En Arcano 17,

Breton dio una respuesta concisa y clara: “La revuelta, y solamente la revuelta es

creadora de luz, y esta luz no puede tomar sino tres caminos: la poesía, la libertad y el

amor” (BRETON, 1965, p. 121).

Es decir, en primer lugar, el surrealismo es una revuelta, el

disconformismo absoluto (BRETON, 1992, p. 69, subrayado por el autor), el estar en

contra de las convenciones, las prohibiciones y toda la dimensión opresiva de la

sociedad.

Esta revuelta busca la libertad en todo y en todos los momentos. “Lo

único que todavía me exalta es la palabra libertad”, dijo Breton (1992, p. 20). O como

tan bien sintetizó el surrealista Jean Schuster: “En la galaxia surrealista, la idea de

libertad tal vez sea la única estrella fija” (SCHUSTER, 1991, p. 31).

Si el surrealismo habla de libertad, es porque siente concretamente su

ausencia y los frenos impuestos a su expresión. En el terreno político y social, el

surrealismo “denunci[a] y combat[e] todas las opresiones en las cuales se apoya el

sistema social tal como funciona [...] en el mundo entero” (SCHUSTER, 1991, p. 32).

Pero el surrealismo considera que la terrible realidad de la opresión política y social no

puede hacer olvidar que existen otras formas, más sutiles y astutas, de cercenar la

Page 81: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

81

libertad, por ejemplo, a través de los modos de pensar y de expresarse. Jean Schuster lo

explica con nitidez:

El surrealismo afirmó categóricamente que el combate contra las diferentes

figuras de opresión social era inseparable de una acción continúa contra el

racionalismo y el realismo, sin darle prioridad, a no ser táctica o

circunstancial, a una de esas formas de lucha sobre la otra. Esa idea está en el

cerne de la exigencia surrealista (SCHUSTER, 1991, p. 32).

Uno de los valores esenciales para encontrar esta ansiada libertad,

para luchar por ella y cambiar la vida, es el amor. Pellegrini explica:

El amor es para los surrealistas la pasión que exalta todos los mecanismos de

la vida, aquella en que la función de vivir adquiere todo su sentido. Ellos ven

en el amor la unión de lo físico (la vida inmediata) con lo metafísico: es al

mismo tiempo cumplimiento y trascendencia. De este modo se establece una

fusión entre el concepto romántico del amor sublime y el erotismo

(PELLEGRINI, 1981, p. 20).

Otro camino para alcanzar la libertad según esa concepción, es la

poesía:

Afirmando el principio de libertad, toda poesía -como dice René Crevel-

incluye un espíritu de revuelta, pues incita a romper las cadenas que atan el

ser a la roca convencional. Con igual claridad, Breton y Éluard, en sus “Notas

sobre la poesía”, afirman que “el lirismo es el desenvolvimiento de una

protesta (PELLEGRINI, 1891, p. 19)

Es decir, para los surrealistas la poesía encarna la coartada que

convida a protestar y excita el deseo de libertad porque, al ser portadora de lo

maravilloso y de la belleza, revela la realidad de una perspectiva diferente.

Una de las principales armas de la poesía como espíritu de revuelta es

el humor, uno de los valores claves del surrealismo. Aldo Pellegrini supo sintetizar el

análisis de esta característica en unas pocas líneas, que merecen ser reproducidas casi

por extenso:

Page 82: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

82

El humor representa la protesta contra el orden convencional. Es la

manifestación más neta del inconformismo. Revela la máxima acción

corrosiva del espíritu sobre la máscara de un mundo artificioso, hipócrita y

convencional, a la que desintegra y anula. Frente al humor se resquebrajan

normas y principios que parecían inconmovibles, poniendo en evidencia el

sistema de falsos valores que nos rige. El humor actúa sobre la seguridad del

espectador conmoviendo todos sus fundamentos. En su categoría extrema, el

“humor negro” adquiere aspectos de ferocidad y crudeza inigualables. De

todos los valores -manifiesta Breton- el humor es el que revela un ascenso

constante. Es, sin lugar a dudas, la característica más específica de la

sensibilidad moderna. Se alimenta de todas las formas de lo arbitrario y de lo

absurdo, y puede decirse que en una u otra forma no hay texto poético

auténticamente surrealista que no lo contenga (PELLEGRINI, 1891, p. 27-

28).

Enrique Molina, que perteneció al grupo surrealista argentino y fue

amigo de Aldo Pellegrini, en un ensayo para el catálogo de la exposición Surrealismo

Nuevo Mundo, realizado en Buenos Aires, en 1992, en la Biblioteca Nacional de la

República Argentina, definió el surrealismo de esta manera:

[...] una concepción total del hombre y de sus relaciones con el universo, un

esfuerzo del conocimiento para liberar el ser, para liberar la conciencia de las

presiones que la dividen entre la razón y la intuición, la vigilia y el sueño, un

esfuerzo para alcanzar, así, una realidad profunda, sin fracturas ni

compartimientos estancados. (...) que quiere revelar el lado secreto de las

cosas, de profundizar una síntesis del sueño y de la realidad sensorial, de lo

objetivo y de lo subjetivo, dejar libre el espíritu de los dogmas religiosos,

morales, estéticos, etc., que se oponen a su libre expresión al emplear la

escritura automática, para asumir en el terreno artístico el mundo del

inconsciente, por su disposición para entrar en lo maravilloso de nuestro

entorno fuera del orden estrictamente utilitario con que la razón lo estratifica

y sobre todo, por su invocación a la poesía como una energía capaz de

transformar la miseria moral al exigir la absoluta identidad de la poesía, de la

libertad y del amor, el surrealismo abre una ardiente esperanza de liberación

(MOLINA, 1999, p.24).

Una buena síntesis de lo que fue expuesto anteriormente y que

muestra que después de casi 70 años las ideas de Pellegrini y su grupo todavía eran

debatidas en Buenos Aires.

Mismo con una actuación brillante en las actividades que emprendió,

Aldo Pellegrini fue menospreciado. Sufrió el silencio por parte de la crítica

especializada de Buenos Aires e inclusive, cuando algunos escritores importantes se

Page 83: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

83

referían a él y a sus amigos (como es el caso de Jorge Luis Borges y Bioy Casares), lo

hacían con cruel ironía.

La comprensión y valorización de la labor de Pellegrini y su grupo

puede ser rastreada apenas a partir de 1964, cuando Juan José Ceselli publicó la obra

intitulada Poesía argentina de vanguardia: surrealismo e invencionismo, editada por el

Ministerio de Relaciones Exteriores y Culto, y por lo tanto con presupuesto del Estado.

Juan José Ceselli se refiere a Pellegrini como inspirador de un grupo surrealista que

resultó cohesivo y vigoroso, con una personalidad definida. Agrega que se podría

resumir la crónica del surrealismo en un sólo individuo: Aldo Pellegrini (CESELLI,

1964, p. 14), opinión que puede resultar un poco exagerada.

El año de 1967 nos proporciona otra prueba significativa del

reconocimiento que Aldo Pellegrini estaba teniendo en su país. El Centro de Artes

Visuales del importante Instituto Torcuato Di Tella, de Buenos Aires, le encargó la

organización de la exposición “Surrealismo en Argentina”, y el prólogo del catálogo.

Ese mismo año, la investigadora Graciela de Sola publicó un estudio sobre literatura

argentina en el que reconoce la relevancia que el surrealismo tuvo en la transformación

de la literatura y del arte, sus aportaciones en la psicología y la filosofía y su influencia

en las relaciones humanas. En el libro, intitulado Proyecciones del surrealismo en la

literatura argentina, Sola busca localizar a los precursores de la revuelta

hispanoamericana y ubicar los posibles antecedentes de una visión surrealista en nuestro

continente. En la obra también se encuentran datos sobre el grupo surrealista argentino y

el reconocimiento de la importancia de Aldo Pellegrini. Según la autora:

La intensidad de su sentir poético, la hondura de su pensamiento y la

significación ética de su actitud, largamente sostenida, hacen de Aldo

Pellegrini una de las figuras más interesantes, no sólo del surrealismo sino

del ámbito expresivo total del país (SOLA, 1967, p. 138).

En 1974, el profesor rumano Stefan Baciu publicó su Antología de la

poesía surrealista latinoamericana, e incluyó en su obra, publicada en México, un

contacto epistolar con Aldo Pellegrini en el que éste realiza un cómputo de las

actividades surrealistas en su país. Baciu subraya la constancia de Aldo Pellegrini,

aseverando que “sólo quienes conocen las dificultades con las cuales deben luchar las

Page 84: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

84

editoriales latinoamericanas, comprenderán la importancia de una labor como aquella

desarrollada por Pellegrini por más de cuatro décadas, tanto en la literatura como en las

artes plásticas” (BACIU, 1974, p.78). Baciu hace hincapié, además, en la promoción de

escritores hecha por Pellegrini, entre los que se encontraban algunos de los más

importantes de la poesía argentina como Enrique Molina, Julio Llinás, Juan Antonio

Vasco, Francisco Madariaga, Carlos Latorre y Juan José Ceselli (BACIU, 1974, p. 78-

79).

Finalmente, Baciu reconoce que Pellegrini desarrolló un trabajo que

atrajo a numerosos artistas plásticos a la corriente surrealista:

En ningún otro país de Latinoamérica, con la excepción de México, han sido

tan numerosos y tan personales los artistas plásticos integrados a la corriente

surrealista. El hecho se debe, tal vez, a la influencia de la pintura surrealista

de Europa y, también al trabajo desarrollado por Aldo Pellegrini. Como

crítico de arte, organizador de exposiciones y galerías de arte, autor de notas

críticas y presentaciones de catálogos de pintura, ha ejercido una labor

multifacética e importante, cuyos resultados son visibles tanto en la obra de

los pintores integrados en el pasado al surrealismo, como en las influencias

surrealistas existentes en las pinturas de artistas de todas las generaciones

(BACIU, 1974, p. 80).

Octavio Paz - poeta y teórico del surrealismo, Premio Nobel de

Literatura en 1990 - en la revista mexicana Plural nº 35 (1974), también se refiere a la

“inteligencia”, “sensibilidad” y al “fervor” de ese “notable” poeta que fue Aldo

Pellegrini “el fundador del primer grupo surrealista de lengua castellana” (PAZ, 1999,

p. 164-165). Como manifestó su compañero de aventuras Enrique Molina, fue “un gran

lujo” (MOLINA, 1974, s/p), y gracias a él se puede hablar de un auténtico movimiento

surrealista en América Latina que realizó obras de gran calidad, tanto pictóricas como

literarias.

El surrealismo fue una actitud vital, total, ética y estética que se

expresó en la acción y en la participación (PAZ, 1999, p.164-165). Y debemos recordar

que Brasil también tuvo vínculos explícitos, basta leer a Jorge de Lima, Murilo

Méndes, Cicero Dias o ver las publicaciones de Antropofagia, que decía tener la

"língua surrealista". Perú tuvo representantes de la calidad de César Moro y Emilio

Adolfo Westphalen. En Haití se destacan Aimé Césaire y Magloire-Saint-Aude; en

Page 85: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

85

México, Leonora Carrington, Remedios Varo, Octavio Paz y tantos otros. En Chile, el

grupo compuesto por Braulio Arenas y Enrique Gómez-Correa, Jorge Cáceres y

Teófilo Cid, quienes publicaron la revista Mandrágora dónde escribió justamente

Huidobro, al cual citábamos al inicio. Y ese grupo chileno fue valiente porque enfrentó

a los conservadores de la Iglesia y sus milicias, a los estalinistas y a Pablo Neruda.

Muchos nombres deben ser recordados, pintores como el cubano Wifredo Lam, el

chileno Roberto Matta, los mexicanos Frida Kahlo, Gunther Gerzso, Alberto

Gironella... y tantos otros.

Para finalizar quiero decir que los Manifiestos del surrealismo fueron

traducidos y publicados en Brasil apenas en 1985 y que, a partir de esa fecha, han

surgido aqui cada vez más investigaciones y publicaciones sobre el movimiento y sus

manifestaciones en América Latina. La historia del surrealismo continúa siendo escrita.

BLIOGRAFIA

Sobre el surrealismo

BACIU, Stefan. Antología de la poesía surrealista latinoamericana. Valparaíso:

Ediciones Universitarias de Valparaíso, 1974.

BRETON, André. Conversaciones (1913-1952). Traducido por Leticia Hulsz Piccone.

México, D.F.: Fondo de Cultura Económica, 1987.

_____. Manifiestos del surrealismo. Traducción y notas de Aldo Pellegrini. Buenos

Aires: Argonauta, 1992.

_____. Qu´est-ce que le surréalisme? Cognac: Le temp qu´il fait, 1986.

_____. La clé des champs. París: Sagittaire,1979.

_____. Antología del humor negro. Barcelona: Anagrama, 1997.

CASTIGLIONI, Rubén Daniel Méndez. Surrealismo en América. Porto Alegre,

UFRGS, 2015.

Page 86: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

86

CESELLI, Juan José. Poesía argentina de vanguardia. Surrealismo e invencionismo.

Buenos Aires: Ministerio de Relaciones Exteriores y Culto, 1964.

COURTOT, Claude. L´Être ou le paraître surréaliste. Organon. Porto Alegre,

UFRGS, n.22, p. 13-21, 1994.

LAFLEUR, Héctor René; PROVENZANO, Sergio D. (orgs.) Las revistas literarias.

Selección de artículos. Buenos Aires: Centro editor de América Latina, 1993.

LATELLA, Graciela María. Le surréalisme d´Aldo Pellegrini. (Tesis). París, Université

de la Sorbonne Nouvelle, 1976.

MASTRONARDI, Carlos. El movimiento de “Martín Fierro”. En La historia de la

literatura argentina. Buenos Aires: Centro Editor de América Latina, s/f.

MOLINA, Enrique. Surrealismo Nuevo Mundo. Traducido por Lara Oleques de

Almeida. En: PONGE, Robert (Org.) Surrealismo e Novo Mundo. Porto Alegre:

UFRGS, 1999.

_____. El gran lujo. En: Aldo Pellegrini. In memoriam. Buenos Aires, Imagen, 1974.

NADEAU, Maurice. Historia del surrealismo. Altamira, 1970.

PAZ, Octavio. La búsqueda del comienzo. Madrid: Fundamentos, 1974.

_____. Sobre o surrealismo hispano-americano: o fim do papo-furado. Traducido por

Robert Ponge. En: PONGE, Robert (Org.). Surrealismo e Novo Mundo. Porto Alegre:

UFRGS, 1999. p. 163-167.

PELLEGRINI, Aldo. Para contribuir a la confusión general. Buenos Aires: Nueva

Visión, 1965.

_____. Lo maravilloso de la muerte. Crisis, Buenos Aires, n.13, p.64, 1974.

_____. El movimiento surrealista. Cursos y conferencias. Buenos Aires, 1950.

_____. Nacimiento y evolución del movimiento surrealista. Cursos y conferencias.

Buenos Aires, 1951.

_____. Distribución del silencio. Buenos Aires: Argonauta, 1966 a.

_____. Escrito para nadie. Buenos Aires: Argonauta, 1989.

_____. Antología de la poesía viva latinoamericana. Barcelona: Seix Barral, 1966 b.

_____. El conde de Lautréamont y su obra (Prólogo). En: LAUTRÉAMONT, Conde

de. Conde de Lautréamont. Obras completas. Buenos Aires: Argonauta, 1986.

_____. Prólogo. En: BRETON, André. Manifiestos del surrealismo. Buenos Aires:

Argonauta,1992. p. 7-12,.

Page 87: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

87

_____. (Org.) Lautréamont 100 años. Buenos Aires: Galería de arte Gradiva, 1970.

_____. Antología de la poesía surrealista de lengua francesa. Barcelona: Argonauta,

1981.

_____. Panorama de la pintura argentina contemporánea. Buenos Aires: s/e, s/f.

_____. El muro secreto. Buenos Aires: Argonauta, 1949.

_____. La valija de fuego. Buenos Aires: Americalee, 1952.

_____. Teatro de la inestable realidad. Buenos Aires: Carro del Tespis, 1964.

_____. La conquista de lo maravilloso. Ciclo, Buenos Aires, n.2, p. 51-70, 1949.

_____. Catálogo de la exposición del Centro de Artes Visuales del Instituto Di Tella.

Buenos Aires: junio, 1967.

_____. Antonin Artaud el enemigo de la sociedad. En: ARTAUD, Antonin. Van Gogh

el suicidado por la sociedad. Buenos Aires: Argonauta, 1987.

_____. Nuevas tendencias en la pintura. Buenos Aires: Muchnik, s/f.

_____. Antología de la poesía viva latinoamericana. Barcelona: Seix Barral, 1966.

_____. Oliverio Girondo. Antología. Buenos Aires: Argonauta, 1964.

PICHON-RIVIÈRE, Marcelo. El surrealismo argentino: A un año de la muerte de Aldo

Pellegrini. Buenos Aires, Crisis, n.13, 1974.

PONGE, Robert (Org.) O surrealismo. Porto Alegre: UFRGS, 1991.

_____. Mais Luz. O surrealismo. Porto Alegre: UFRGS, 1991. p. 15-29.

_____. A crítica de Aldo Pellegrini: o elogio ao Ilustre Desconhecido. En:

CARVALHAL, Tania Franco. O discurso crítico na América Latina. Porto Alegre:

Instituto Estadual do Livro, 1996. p. 163-176.

_____. Surrealismo e Novo Mundo. Porto Alegre: UFRGS, 1999.

_____. Un grito del espíritu. (Inédito).

SARLO, Beatriz Sabajanes. Martín Fierro (1924-1927). Antología y prólogo. Buenos

Aires: Carlos Pérez, 1969.

SOLA, Graciela de. Proyecciones del surrealismo en la República Argentina. Buenos

Aires: Culturales Argentinas, 1967.

_____. Surrealismo y religiosidad. Testigo, Buenos Aires, Sudamericana, n.5, 1970.

SCHUSTER, Jean. Surrealismo e liberdade. En: PONGE, R. (Org.) O surrealismo.

Page 88: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

88

Porto Alegre: UFRGS, 1991. p. 31-37.

SCHWARTZ, Jorge. Vanguardas Latino-Americanas. Polêmicas, manifestos e textos

críticos. São Paulo: Iluminuras, 1995.

______. Las vanguardias latinoamericanas. Textos pragmáticos y críticos.Traduccón

de Estela dos Santos. México: Fondo de Cultura Económica, 2002.

Page 89: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

89

LA LENGUA ESPAÑOLA EN SUS DICCIONARIOS

Félix Valentín Bugueño Miranda, UFRGS

Guillerminæ Mirandæ Barrazæ, matri amatissimæ*

1.Introducción

Entre la primera y la segunda edición de Don Quijote de La Mancha, se publicó

en España TesLCE, (1611 [1943])23

. A propósito de este hecho central para la

lexicografía hispánica, y, no sin razón, Weinrich (1979) sostenía que cada época tiene

su diccionario. La concepción que se tenía de la lengua en el s. XVII no era otra que la

de su legitimación en directa relación con las lenguas clásicas, particularmente con el

latín. De allí que aquello que hoy llamamos de comentario etimológico (cf. BUGUEÑO

MIRANDA, 2004) cobra una importancia insoslayable en el artículo léxico. De la

misma forma, TesLCE (1611) le confiere también un sitial destacado a la variación

ortográfica. Evidentemente, hoy no le conferimos (lamentablemente) la misma

importancia a la etimología, pero la ortografía sigue constituyendo una preocupación

tanto para la lexicografía como para los usuarios de diccionarios. Como corolario cabe

perfectamente decir que así como la preocupación de los lexicógrafos del s. XVII difiere

claramente de la de nuestros días, por otro, la lexicografía hispánica ofrece

indudablemente también una solución de continuidad.

Mirado el problema desde la contemporaneidad, resulta perceptible que

hoy la lexicografía tiene entre sus preocupaciones más inmediatas el diseño de

diccionarios de aprendices (learner´s dictionaries). El español cuenta con pocos

diccionarios de esta clase: DSal (1996) y DELEB (2000). Ambos, sin embargo, son

insuficientes para auxiliar al aprendiz de español24

. Otra exigencia de la hora actual de

*(1927-2015) 23

Siguiendo la tendencia de la metalexicografía europea, las obras lexicográficas aparecen mencionadas

por siglas. En las referencias se indica el autor y el nombre por extenso. 24

En lo que se refiere a DSal (1996), GUTIÉRREZ CUADRADO (2000) le concede a la obra varios

méritos, pero su análisis soslaya, por ejemplo, que ya hace más de veinte años que existe el consenso en

metalexicografía sobre la estricta monofuncionalidad de la obra lexicográfica. Además de eso, la

selección macroestructural cualitativa no se restringe al español contemporáneo, que es lo que se espera

en un diccionario de aprendices, sino que se lematizan también muchas unidades léxicas de poco uso o

simplemente anticuadas. VILLARRUBIA ZÚÑIGA (2013) ofrece también un análisis de DSal (1996)

resaltando las supuestas bondades del diccionrio. No es éste el contexto para trabar una polémica sobre el

particular, pero los aspectos escogidos para el análisis nos son aquellos que prioritariamente deben

considerarse como parámetros de evaluación. Una análisis sobre su adecuación como auxilio en la

enseñanza-aprendizaje de español se encuentra en ARMANI (2105). En relación a DELEB (2000), cf.

Page 90: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

90

la lexicografía es la preocupación por ofrecer el potencial de combinación que las

palabras tienen. En lo que respecta a la lexicografía hispánica, ésta se encuentra

claramente rezagada en relación a otras tradiciones (cf. BUGUEÑO MIRANDA, 2008 y

2009b para un análisis de la lexicografía alemana, así como BUGUEÑO MIRANDA;

REOLON JARDIM, 2010 para un análisis de los diccionarios de aprendices del inglés).

En función de ello, el objetivo de este trabajo es ofrecer un panorama de los

diccionarios del español y cómo éstos son potencialmente útiles para el estudiante

brasileño de español, considerando la ausencia de obras lexicográficas que atiendan

específicamente a este usuario.

2. El diccionario hoy

No hay acuerdo entre los especialistas si la redacción de un diccionario se

encuentra (o debería estar) amparada por una teoría. ATKINS; RUNDELL (2008, p. 4),

por ejemplo, afirman enfáticamente que “no creemos que tal cosa [i.e. una lexicografía

teórica] exista25

”. Más recientemente, RUNDELL (2012) volvió a cuestionar este

hecho. Sin embargo, una lectura atenta de estos dos trabajos revela que estos autores sí

se amparan en constructos teóricos para su trabajo lexicográfico (cf. BUGUEÑO

MIRANDA, 2013a para una discusión sobre esta cuestión). En este sentido, y en plena

consonancia con nuestra posición al respecto, PIOTROWSKI (2015, p. 314), sostiene

que una teoría de la lexicografía debe estar constituida por tres componentes: uno

sintáctico (forma), uno semántico (contenido) y uno pragmático (usuario). Por nuestra

parte, juzgamos que una teoría que fundamente la concepción y diseño de una obra

lexicográfica se puede representar de la siguiente forma: Por un lado, ha de anclarse en

una taxonomía de las obras lexicográficas disponibles para una dada comunidad

idiomática26

; por otro lado, deberá buscar sus subsidios tanto en la lengua objeto, como

en el metalenguaje de primer grado (hablar sobre la lengua), así como en el

metalenguaje de segundo grado (la metodología de la lingüística); finalmente, no puede

dejar de considerar al usuario potencial de los diccionarios. El esquema ad infra ilustra

esta relación.

BUGUEÑO MIRANDA (2006) para un análisis crítico. Baste aquí señalar que esta obra no ofrece

subsidios confiables y sistemáticos ni siquiera para calcular padrones sintácticos básicos del español. 25

[we don´t belive that such a thing exists]. 26

Para más detalles sobre la fundamentación teórica de uma taxonomia, cf. BUGUEÑO MIRANDA

(2014).

Page 91: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

91

lengua

diccionario

taxonomía usuario

1 El diccionario hoy

3. Cómo se organiza una lengua

Una de las consecuencias directas de establecer una relación entre el diccionario

y su época es concebir el diseño de obras lexicográficas a la luz de teorías lingüísticas.

Esta base teórica constituye lo que se podría llamar de “formalismos irreductibles”27

. En

este ámbito se debe a COSERIU (1992) la ya clásica formulación de las tres

dimensiones que le corresponden a toda lengua natural: una universal (el saber hablar),

una histórica (cada lengua natural) y una individual (su uso concreto en cada individuo).

Para efectos de este trabajo, interesa especialmente lo que COSERIU (1992) llama de

“norma”, esto es, la manera corriqueira, como se diría en portugués, en que una

comunidad realiza su lengua. Esta modalidad se denomina “norma real”. Esta noción es

fundamental, pues la tarea del diccionario es ir registrando cómo cada comunidad

ejecuta regularmente una lengua28

. Es necesario destacar también, sin embargo, que

existe en toda comunidad aquello que ZANATTA (2010) llamó de “anseio normativo”,

o sea, la necesidad que tiene una comunidad de buscar orientación de cómo usar la

lengua de manera más esmerada en determinadas circunstancias. Esta modalidad

corresponde a la “norma ideal”. Si por un lado se ha afirmado que un diccionario debe

reflejar la lengua tal como ésta realmente se usa, por el otro, cabe resaltar también que

el diccionario es también un instrumento de orientación de uso.

El modelo de COSERIU (1992) se puede representar de la siguiente manera:

27

Ejemplos de aplicación de formalismos irreductibles se pueden encontrar en MATTES; BUGUEÑO

MIRANDA (2015); BUGUEÑO MIRANDA (2015) y BUGUEÑO MIRANDA (2016). 28

Cf. las consideraciones sobre este particular en el acápite “Por qué un diccionario no puede contener

toda la lengua”.

Page 92: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

92

diafásico - diastrático

diacrónico

sistema

diatópico ideal

norma

real

habla = Texto (hic et nunc)

2 Modelo de la lengua (COSERIU, 1992)

En otro ámbito cabe preguntarse también qué dimensiones del lenguaje son

susceptibles de tratamiento lexicográfico. HENNE (1982, p. 115-116) estableció un

total de siete niveles de organización para una lengua natural. La lexicografía puede

tratar el nivel fónico / ortográfico29

, el nivel de las “palabras”30

, el nivel morfemático31

,

29

Si bien es cierto que la lengua española presenta una alta correspondencia entre los fonemas y las letras

que los represesentan, casos como el grupo vocálico /ia/ admiten tanto su realización como diptongo o

como hiato. Cf., por ejemplo, DUE (1996 s.v.) “ dionisíaco [-iaco], -a. De Dionisios”. 30

Si bien a primera vista pareciera que constituye una obviedad referirse ex professo a este nivel, es

pertinente recordar que al tratar lexicográficamente las palabras hay que distinguir entre las palabras

sobre cuyo contenido se puede realizar una predicación (mar amb. Gran masa de agua salada que cubre la

mayor parte de la Tierra, SoLEsp (1965, s.v.)) y aquellas sobre las cuales solo se puede informar cómo se

usan (hiper prep. Palabra que antepuesta a outra indica superioridad o exceso, DIlEsp (2003, s.v.). Cf.

BUGUEÑO MIRANDA (2009) sobre esta distinción. 31

La clasificación de HENNE (1982) estaba pensada para satisfacer los requisitos de descripción

estructural del alemán, que no se corresponden necesariamente con los hechos estructurales del español.

De allí que este nivel pueda parecer irrelevante para fines lexicográficos. Sin embargo, no puede dejar de

mencionarse la tendencia a lematizar afijos que muchos diccionarios del español presentan, una decisión

teóricamente equivocada, ya que las opciones de derivación, composición y parasíntesis que los

respectivos comentários semánticos presentan corresponden muchas veces opciones de sistema, pero no

necesariamente de norma (cf. BUGUEÑO MIRANDA, 2007 para una discusión más exhaustiva). Con

cierta restricción se podría pensar que los casos de nichos léxicos satisfacen este nível de organización:

apiñar tr. y pr. Agrupar estrechamente personas o cosas ||deriv.:apiñamiento, DAtEsp (1992, s.v.).

Page 93: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

93

el nivel sintagmático32

y, parcialmente, el nivel oracional33

. La lexicografía no puede

tratar ni el nivel de los segmentos textuales34

ni el nivel textual35

propiamente dicho.

4. Por qué un diccionario no puede contener toda la lengua

Suele ser una crítica bastante común afirmar que los diccionarios son

instrumentos altamente imperfectos porque no serían capaces de contener (y describir)

toda la lengua. Para intentar demostrar la falacia intrínseca de esta afirmación, se

presentarán una serie de principios36

.

La lengua como enérgeia y érgon. Según HUMBOLDT (1836 [1979]), toda

lengua es a la vez enérgeia e érgon. La dimensión enérgeia es la dimensión creativa que

tiene una lengua natural, esto es, su poder creador a partir de los propios medios de que

dispone. Por ejemplo, en español existe el verbo moralizar y su antónimo desmoralizar.

Analógicamente, existe el adjetivo moral y su antónimo inmoral. Hasta ahora, y no

obstante que existen los medios formales para ello, no se han generado ni las formas

*inmoralizar ni *desmoral. Estas formas potenciales, aunque no realizadas, corresponde

a la dimensión enérgeia de toda lengua natural. La dimensión enérgeia equivale al

sistema propuesto por CSOSERIU (1992). Por otro lado, érgon equivale al producto de

la actividad lingüística37

. Todo neologismo arraigado en una lengua natural es una

manifestación de la dimensión érgon de la misma. Equivale a la norma de COSERIU

(1992). El diccionario, por lo tanto, no puede responder a la dimensión enérgeia de una

lengua, sino que solamente a la dimensión érgon. No puede, pues, describir aquello que

todavía no existe en una lengua, como tampoco aquello que se ha manifestado, pero que

todavía no se ha convertido en hecho de norma38

.

32

Para más detalles sobre este particular, cf. ad infra a propósito de las diversas manifestaciones del

discurso repetido. 33

Para más detalles sobre este particular, cf. ad infra a propósito de los diccionarios con énfasis en el

significado. 34

Por “segmentos textuales” se entiende, por ejemplo párrafos y capítulos. Cf. La nota 10 para más

detalles. 35

El nivel textual corresponde a los textos propiamente tales. Todo texto es una ocurrencia comunicativa

completa. Como tal, se la considera como un acto de habla hic et nunc. Por ello, por ser único e

irrepetible, no es tratable lexicográficamente, ya que no es un hecho de norma, sino que, repetimos, de

habla. Por esta razón, tampoco se puede tratar lexicográficamente ni los párrafos ni los capítulos. 36

Principio se entiende aqui a la luz de la lógica de La ciencia, o sea, una relación de fundamentación,

que sienta las bases metodológicas y de contenido de una disicplina (cf. REHFUS, 2003. s.v. Prinzip). 37

No debe confundirse érgon con habla. Érgon corresponde al producto social del hablar (por eso su

correspondencia con la norma). El habla es La realización hic et nunc, única e individual. 38

Juzgar como hecho de norma un fenómeno idiomático que se ha manifestado en la actividad lingüística

de una comunidad, pero que todavía no alcanza una irradiación masiva, constituye un desafio, por

Page 94: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

94

El diccionario nunca va a priori fijando la lengua39

, sino que va a posteriori

registrándola (BUGUEÑO MIRANDA (2009)). Si los diccionarios deben registrar

hechos de norma, en consecuencia, jamás pueden ir “adelantándose” a la lengua, sino

que siempre van a la zaga de ésta, registrando todo hecho idiomático que se juzga como

regular y continuo. Sin embargo, es necesario destacar que la obra lexicográfica “fija” la

lengua, aunque desde una perspectiva completamente distinta. Esto acontece como una

consecuencia de un factum ontologicum totorum glossariorum, que no es otro que el

efecto normativo que una obra lexicográfica tiene. Es pertinente destacar que la

normatividad de la obra lexicográfica es explícita o implícita. Sobre todo, cuando la

normatividad es explícita, el diccionario “fija” la lengua, ya que propone una norma

ejemplar. Ejemplar quiere significar “que sirva de ejemplo” en determinas situaciones

comunicativas. Esa norma ejemplar -es necesario recalcarlo- sólo será ejemplo, modelo

si los hablantes se identifican con ella. En función de lo anterior, la prescripción ex

nihilo es una falacia. Por todo lo expuesto aquí, la norma que el diccionario ofrezca

(real o ideal, explícita o implícita) será siempre menor que todo lo que la lengua sea.

5. De la lingüística teórica al perfil de usuario del estudiante brasileño de español

Una vez que se han establecido las coordinadas básicas de cómo concebir y qué

esperar del diccionario como instrumento que refleja y describe la lengua, cabe ahora

preocuparse con el potencial usuario de la obra lexicográfica. WIEGAND (1977, p. 59)

se refiere al usuario como “el ilustre desconocido” [al. der bekannte Unbekannte]. Han

pasado treinta y siete años desde que se lo denominó así, en virtud de lo poco que se

sabía sobre el destinatario final de la obra lexicográfica. En BUGUEÑO MIRANDA

(2016) se propone que hay dos variables que ayudan a determinar ese perfil. Por un

lado, están las demandas de resolución de problemas que llevan al potencial usuario a

ejemplo, para la lingüistica de corpus. Paulatinamente, en la literatura comienza a usarse el término

ocasionalismo [al. Okkasionalismus] (cf. WANZECK, 2010, p.24) para referirse a este fenómeno.

Analógicamente, existen palabras que conocemos, pero que parecen no figurar en muchas

manifestaciones textuales a las que un hablante tiene acceso. A este fenômeno se lo denomina

disponibilidad [al. Disponibilität] (cf. SCHAFROTH, 2014, p.17). 39

Conviene tener en cuenta que la expresión fija acompaña a la lexicografia hispánica desde los albores

de La Real Academia Española, ya que el lema de la institución (y por consecuencia de sus diccionarios)

es “Limpia, fija y da esplendor a La lengua”.Fijar se usa con la misma significación que se le da en el

presente trabajo.

Page 95: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

95

consultar un diccionario. Por otro, están sus habilidades para consultar la obra

lexicográfica [look-up strategies]40

.

Como primera consecuencia de las consideraciones expuestas ad supra cabe

señalar que la lengua española que el estudiante universitario brasileño de español

aprende corresponde a una norma sincrónica, con proyección diatópica y parcialmente

diafásico-diastráticamente restrictiva. El aprendizaje de lenguas extranjeras obedece a la

variedad contemporánea de la lengua en cuestión en función de la competencia

comunicativa (o capacidad de interacción, dirían otros) que se debe desarrollar en el

aprendiz. En relación a la variedad diatópica, esta variable se torna insoslayable en una

lengua como el español (cf., por ejemplo, ANDIÓN HERRERO; GIL BURMANN,

2013). Finalmente, debe considerarse también la variable diafásico-diastrática. La razón

estriba en el hecho de Brasil tener fronteras inmediatas con países de lengua española,

de modo que existe una razonable probabilidad de que este estudiante tome contacto

con estas variedades, no sólo determinadas diatópicamente, sino que también diafásico-

diastráticamente. Es evidente que todavía faltan trabajos que aborden de una manera

integral este aspecto de la enseñanza-aprendizaje del español en Brasil.

En segundo lugar, el proceso de enseñanza-aprendizaje de español al que el

estudiante brasileño se somete comporta todos los niveles de organización de la lengua.

El marco curricular obedece al Plano Curricular Cervantes (PCC). Ello se debe a que la

mayor parte de los materiales didácticos a su disposición de diseñan de acuerdo al

PCC41

.

Finalmente, hay que considerar también que tanto el estudiante de Licenciatura

en Letras Español como el de Traducción deben confrontarse con el español como

lengua objeto, como metalenguaje de primer nivel y como metalenguaje de segundo

nivel42

(cf. BALDINGER, 1977).

40

En relación a las look-up stretegies, es pertinente señalar que hay un acuerdo en la literatura sobre la

relevancia de este tipo de estrategia de aprendizaje. Sin embargo, los resultados de las investigaciones

empíricas no siempre son satisfactorias. 41

Cf., por ejemplo, IMMICH (2015) sobre este particular. 42

Cf. el párrrafo dedicado al “Diccionario hoy” para más detalles.

Page 96: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

96

6. Los diccionarios del español a disposición del estudiante brasileño de ELE

Para efectos de exposición, se sigue el modelo propuesto en BUGUEÑO

MIRANDA (2014).

La primera clase de diccionarios a exponerse es la clase “diccionario

ortográfico”. Cabe destacar en relación a este nivel de organización de la lengua la

afirmación de DURÃO (1999, p. 88), quien señala que “la progresión comunicativa del

alumno no siempre coincide con dicha progresión en la expresión escrita”, incluso

considerando que no cabe duda sobre la extrema correspondencia entre fonema y letra

que caracteriza al español. En lo referente a doctrina ortográfica, es de público

conocimiento la labor de orientación que ejerce en este ámbito la Real Academia

Española (RAE), tanto a través de la ORTOGRAFÍA (2010), como a través de DPD

(2005). No obstante lo anterior, las obras disponibles para este ámbito de la lengua no

siempre convergen en lo que se refiere a una doctrina ortográfica. Las razones varían

desde el apego a normas ortográficas que después la RAE altera o modifica hasta la

adopción de decisiones que no parecen seguir siempre un padrón con alguna

fundamentación que se pueda reconocer. A continuación se ofrecen dos ejemplos.

acedia v. acedía f. (…)

acoitar tr. desus. acuitar (…)

acornar tr. acornear (…)

cablote m. Hond. caulote (…)

crocodilo m.p.us. cocodrilo

demoniaco v. demoníaco (…)

kiosco m. quisco (…)

kivi tb. quivi 1. kiwi (…)

video tb. vídeo en acps. 1-4 Esp. (…)

DRAE 2014 (s.v.)

coctel cóctel cruasán

demonia co, ca

demonía co, ca mahonesa (...) adj-f (salsa) Que se hace mezclando (...) Como substantivo, la Real Academia Española prefiere la forma mayonesa. DELEB (2000, s.v.)

3 Diccionarios ordenados por el significante

DRAE (2014) orienta al usuario basado en múltiples criterios, tales como el

diacrónico (acoitar / acuitar), el diatópico (cablote / caulote), de frecuencia (crocodilo /

cocodrilo), y el diaintegrativo (kiosco / quisco), optando por establecer formas

preferenciales (type) frente a no preferenciales (token)43

, como s.v. acedia, en que se

remite a la forma preferencial acuitar, o aceptando dos formas preferenciales (video ,

vídeo). En DELEB (2000), por otro lado, es posible constatar dos errores graves de

43

Para os conceitos de type e token cf. BUGUEÑO MIRANDA (2007).

Page 97: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

97

orientación. En primer lugar, y como comentado ya en la nota 6, el español presenta

cierta tendencia a realizar encuentros vocálicos como diptongos o hiato. En este caso,

las formas demoniaco y demoníaco son legítimas, pero en el caso de la variante con

hiato, DELEB (2000, s.v.) no marca la separación silábica correspondiente. En relación

a mahonesa (s.v.), y no obstante que en un post comentario de forma se indica que la

forma preferencial para la RAE es mayonesa, se insiste en la lematización de una forma

no preferencial (mahonesa). Con esto se está orientando al usuario, estudiante brasileño

de español, que ésta es la forma type, cosa que DELEB (2000) se encarga de demostrar

que no es. Para este ámbito, y considerando lo expuesto ad supra, es aconsejable seguir

la doctrina de orientación ortográfica que emana de las obras de la RAE.

Por falta de espacio, no será posible presentar y evaluar otras clases de

diccionarios organizados por el significante. Baste aquí señalar las clases y algunos de

sus exponentes: diccionario de fonética (DFonDescr, 2007), diccionario de la rima

(DSinIdAfRima, 1994), diccionario inverso (DInv, 1987; DInvAula, 1987). En relación

al diccionario de fonética, tanto el alto grado de correspondencia entre fonema y letra,

como se comentó ya, como el hecho de poseer el sistema fonológico del portugués un

inventario más variado que el del español tornan el cálculo del respaldo fónico del

español una competencia de adquisición no compleja para el estudiante brasileño44

. En

lo que se refiere al diccionario de la rima, es evidente que su utilidad para efectos

prácticos en la enseñanza del español es muy limitada. En una situación un poco

diferente se encuentran DInv (1987) y DInvAula (1987). Las informaciones que esta

clase de diccionarios ofrecen son extremadamente útiles al momento de diseñar

materiales didácticos. Al haber una alta correspondencia genética y tipológica entre las

lenguas española y portuguesa, las fórmulas canónicas en posición final absoluta no

constituyen un problema prioritario. La situación cambia, sin embargo, cuando el

aprendiz de ELE es hablante nativo, por ejemplo, de lenguas de la familia eslava o fino-

hungárica.

En relación al discurso repetido, se ofrece el siguiente conjunto de ejemplos:

44

Piénsese, por ejemplo, que la nasalización de las vocales, que constituye un hecho fonológico en

português, es un hecho alofónico en español. En relación a la interdental, fricativa, sorda, oral /θ/,

recordamos que no se trata de un hecho fonológico general del español. DURÃO (1999, p. 101-108), sin

embargo, presenta un conjunto de fenómenos de interferencias que adscribe AL ámbito de ló fonológico.

Sin embargo, creemos que La consulta de um diccionario puede perfectamente subsanarlos, pues a través

de la representación escrita, el estudiante puede calcular el respaldo fonológico.

Page 98: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

98

laurel descansar/dormir(se) u.p. en/sobre los laureles (f.) Abandonarse, cejar después de haber logrado algún triunfo o éxito: «Cuando era joven escribía casi un libro todos los años; ahora parece que se ha dormido sobre los laureles y se contenta con algún que otro artículo ». DFrasEM (2004)

3215 disputas

dares y tomares dimes y diretes disputas 1: disposición frente a la disputa

actitud defensiva 3216 ·dispuesto a defenderse a la defensiva como gato panza (o: boca) arriba estar (o: ponerse) en guardia estar en la brecha 3217 ·disponerse a reñir Cortarse las uñas con alguien

Dfrhechas (2011)

4 Diccionarios de discurso repetido I

empujón ♦ brusco60, contundente, decisivo,

definitivo, económico, final, financiero, fuerte,

importante, inicial, ligero, necesario, pequeño, súbito,

violento ♦ aguantar dar228, esquivar, necesitar,

pegar15, propinar, recibir, resistir, sufrir Véase

también: golpe (de), impulso.

Hasta los huesos loc.adv. Se combina con…

A VERBOS QUE DENOTAN LA ACCIÓN O EL PROCESO DE

MOJARSE: 1 calar(se) + +: Cuando llegó a la meta,

calado hasta los huesos, fue explícito tratando de abrirse

paso en busca del autobús de Banesto, eme050796 2

mojar-se(se) +: … la multitud que se mojó hasta los

huesos para quedarse a revolotear el poncho con ella no

se puede anotar como una derrota…cla140199 3

empapar(se):…los únicos que se empaparon hasta los

huesos fueron quienes habían pagado las entradas más

caras…eme 070796 4 enfangar-(se) -: Lo hacían

enfangados hasta los huesos en costas habitadas por

cerca de 400.000 personas…epe301299

B OTROS VERBOS; POSIBLES USOS

ESTILÍSTICOS: …pero aún así nos conmovimos hasta

los huesos con el llanto de Anthony

Hopkins…eme240594; … hace que un país esquilmado

hasta los huesos rumie una rabia sorda e impotente…

eme180394

Véase también: hasta el cuello, hasta el tuétano,

hasta las cejas.

DCEC (2004, s.v.)

ABSTENER. v. a) Refrenar, tener á raya (trans.) (muy

raro). «Enfrene su lengua de toda parlería, y abstenga

sus ojos de mirar á todas partes.» Gran. Guía, 2. 15, § 2

(R. 6. 1441). (…) b) Refl. Mantenerse á distancia de

alguna cosa, no tocarla ó probarla; negarse uno la

ejecución, goce ó disfrute de algo que está á su alcance

ó arbitrio. (En esta forma es muy usual.) «Nos privamos

de lo propio; nos abstenemos de lo que está á nuestros

alcances. El buen padre se abstiene de ir al teatro por

asistir á su hijo enfermo; (…) » Mora, Sinón. p. 4. — a)

Con de y un infin. «No tengo sufrimiento para me

abstener de adorar tan alta empresa.» Celest. 6 (R. 3.

311). (…) b) Con de y un nombre. «Aquel gran sabio

Salomón --- determinó abstenerse del vino, por

entregarse del todo al estudio de la sabiduría.» Gran.

Orac. y consid. 3. 2. 1, § 5 (R. 8. 1822). (…) g) Absol. «Los

temerosos como los amorosos honran á Dios,

allegándose por amor, y absteniéndose por temor.»

Gran. Sermón contra escándalos, § 6 (R. 11. 53 (…) Etim.

Port. abster, ant. abstener; cat., mall. abstenir; val.

abstindre; prov. abstener, abstenir, estener; fr.

s'abstenir; ital. astenersi: del lat. abstinere, comp. de

abs, lo mismo que ab, que expresa separación, y tenere,

tener. En el lugar de Herrera citado arriba dicen las

ediciones astiene; acaso se omitiría la b como en

italiano. V. ABSOLVER. Conjug. La misma que tener:

abstengo, abstienes, abstiene, abstenemos, abstenéis,

abstienen; abstení-a, as etc.; abstuv-e, iste etc.;

abstendr-é, ás etc.; abstendría, as etc.; absteng-a, as

etc.; abstuvies-e, es etc.; abstuvier-a, as etc.; abstuvier-

e, es etc.; abstente, absteneos; absteniendo; abstenido.

DCR (1872-1994)

5 Diccionarios de discurso repetido II

En relación al discurso repetido, tanto DFrasEM (2004) como

Dfrhechas (2011) lematizan aquellas unidades pluriverbales que normalmente reciben el

Page 99: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

99

nombre de oraciones o frases. La diferencia fundamental entre las dos obras es la

perspectiva del acto de comunicación. DFrasEM (2004) está concebido desde la

perspectiva semasiológica, es decir, de recepción. Dfrhechas (2011), por el contrario,

está concebido para satisfacer la perspectiva onomasiológica, es decir, de producción.

En otras palabras, el primer diccionario está para que el estudiante lo consulte cuando

no entienda una frase hecha del español; el segundo, cuando necesite expresarse en

español y necesite usar para ello también una frase hecha. Esto es lo que SVENSÉN

(2009, p. 197) llama de “aceso semasiológico” [ingl. semasiological access] y “acceso

onomasiológico” [onomasiological access], respectivamente. (para la relación solidaria

entre semasiologia y onomasiologia y su proyección sobre la lexicografía,

particularmente sobre el comentario semántico, cf. BUGUEÑO MIRANDA, 2009a, p.

248-251; también BUGUEÑO MIRANDA, 2014)).

Otra forma de discurso repetido la representa DCR (1872-1994), que se titula a

sí mismo de “diccionario de construcción y régimen”. Sobre esta obra cabe hacer las

siguientes ponderaciones. No pasa desapercibido el hecho de haberse extendido su

redacción por más de cien años. Esto tiene una repercusión directa sobre el ámbito que

se pretende describir, que no es otro que el régimen preposicional. Como es de público

conocimiento, el régimen preposicional en el español contemporáneo es un fenómeno

en un estado acelerado de cambio, de modo que la orientación que se ofrezca en este

sentido no siempre corresponderá a un hecho de norma real. Cada artículo está dotado

de una aparato crítico de alto provecho, capaz de informar sobre la frecuencia de uso

(“muy raro”), de padrones sintáctico (“abstener + de + infinitivo”) y, naturalmente,

sobre las opciones de construcción del verbo con preposiciones. La parte final del

artículo está reservada a un comentario etimológico. Sin duda alguna que las mayores

dificultades que un estudiante tiene al consultar DCR (1872-1994) son la extensión y

densidad de las informaciones, así como su capacidad para decodificar e interpretar los

diversos segmentos informativos que componen cada artículo.

En una situación un tanto diferente se encuentra DCEC (2004, s.v.). Se trata de

un diccionario “tres en uno”, ya que describe padrones colocacionales, regímenes

preposicionales y el potencial combinatorio de las palabras. En relación al primer

aspecto, cabe señalar que el español no cuenta todavía con un diccionario de

colocaciones45

. Las indicaciones sobre regímenes preposicionales, por otro lado,

45

Si bien no fue diseñado ex professo con este objetivo, DUE (1998) ofrece de manera asistemática

algunos padrones colocacionales. Por otro lado, DiCE (2010) aspira a llenar este sensible vacío. Sin

Page 100: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

100

obedecen a los padrones de la norma real del español. Es necesario, sin embargo, no

perder de vista lo comentado sobre este tema en el párrafo anterior. Finalmente, el

aspecto más innovador de DCEC (2004, s.v.) son las informaciones referentes a los

padrones combinatorios de las palabras. No obstante el esfuerzo que se despliega en el

extenso prólogo para explicar qué se debe entender por “combinatoria léxica”, no

resultan del todo claro las explicaciones dadas. Además de las colocaciones (en relación

a las cuales se hace un esfuerzo enorme por distinguirlas de las combinaciones léxicas,

aunque las explicaciones no resulten del todo convincentes), un análisis de varios

artículos hace pensar que se trataron también padrones coligacionales46

. S.v. empujón,

por ejemplo, aparecen todos los colocados posibles, distinguidos por categoría

morfológica (N + adj: empujón brusco, empujón contundente, V + N: aguantar un

empujón, dar un empujón.). S.v. hasta los huesos, por otra parte, se explicita el

contenido del verbo que se construye con la locución adverbial (calarse hasta los

huesos). Al final del artículo (apartado B), se habla de “posibles usos estilísticos”,

citándose como ejemplo, “(…) nos conmovimos hasta los huesos”. En estos casos, el

ejemplo parece corresponder más a un padrón coligacional (para un análisis más

detallado cf. BUGUEÑO MIRANDA, 2013b, p. 201-201). Su utilidad para el

estudiante de ELE es evidente e inmediata. Dos observaciones críticas son necesarias,

sin embargo: por un lado no cabe duda que DCEC (2004) requiere, parcialmente, de un

uso más intenso de sistemas semióticos alternativos para que el usuario pueda percibir

mejor las variados tipos de información que cada artículo suministra; por otro lado, el

prólogo requiere de una intensa simplificación. Sólo de esta forma su consulta se

convertirá en la heurística necesaria para interpretar las informaciones; finalmente, es

necesario también que se entrene a los estudiantes para aprender a consultar

diccionarios.

Sin ligar a dudas, cuando se piensa prototípicamente en “diccionario”, se piensa

fundamentalmente en diccionarios de orientación semasiológica, esto es, diccionarios

embargo, y según consta en la página respectiva en internet, hasta ahora solo el campo semántico de los

nombres de sentimiento está publicado. 46

La discusión sobre lo que son coligaciones es relativamente reciente em lexicologia y lexicografia. Las

coligaciones son las relaciones gramaticales y léxicas que se establecen entre las palabras. Estas abarcan

desde los objetos directos, indirectos y algunos casos de incrustación obligatoria de circunstantes (cf.

LEGALLOIS (2012) para esta concepción de coligación) hasta las palabras con las que otras palabras

acostumbran a aparecer juntas, como por ejemplo, maracujá, asociado con suco en portugués, en cuanto

que el equivalente passion fruit, que en inglés se asocia con tea (cf. BERGEROVÁ, 2013, p. 15-16) para

esta vertiente de investigación).

Page 101: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

101

que ofrecen definiciones47

. Tal como se explica en BUGUEÑO MIRANDA (2013), es

conveniente distinguir entre una lexicografía oficial (léase, oriunda de la RAE) y otra no

oficial, a cargo de la iniciativa editorial privada. Esta distinción se basa en los objetivos

con los que se concibe un diccionario. Tarea del DRAE en sus diversas ediciones es

ofrecer una imagen del vocabulario que se considera consagrado en español. En este

sentido DRAE cumple el papel de un cartório, como se diría en portugués. La tarea de

esta notaría lingüística es registrar ortografía, significado e imputación diatópica. En

otros ámbitos, tales como la sintaxis, DRAE ofrece escasas informaciones. La

lexicografía no oficial, por otra parte, además de los ámbitos antes citados, le ofrece al

potencial usuario una riqueza mayor en dimensiones como la sintaxis y la combinación

de las palabras.

exhaustivos: DHist (1960 - )

dic. diasistémicamente lex. oficial: DRAEe (2014)

inclusivos

α exhaustivos DUEAEe (2004)

lex. no oficial Gr.DVoxe (2004)

DEA (1999)

6 Diccionarios desde la perspectiva semasiológica

El único diccionario hispánico que pretende reflejar todo el léxico de la lengua

es el DHIst (1960 - ), obra de larguísimo aliento y de conclusión todavía incierta. En

todos los demás casos se habla de diccionarios α exhaustivos, o sea, diccionarios que

limitan el número de ejes y/o la extensión de cada uno de ellos. Como se expuso ya ad

supra, la distinción entre lexicografía oficial y no oficial se torna fundamental para el

análisis.

47

En tradiciones lexicográficas como la inglesa o la alemana se habla de defining dictionary y de

Definitionswörterbuch, respectivamente. Lamentablemente, en la terminologia metalexicográfica

hispânica no se cuenta com uma designación análoga.

Page 102: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

102

En relación a DRAEe (2014)48

y como comentado ya, se trata de un diccionario

que orienta ofreciendo la representación ortográfica que se juzga canónica, así como el

conjunto significaciones atinentes a un dado signo lingüístico. Es fundamental tener en

cuenta que el aggiornamento del DRAE, en sus diversas ediciones y no obstante los

recursos computacionales de que se dispone hoy, es bastante lento. Esto significa decir

que es necesario trabajar complementariamente entre DRAE y CREA y CORPES XXI,

éstos últimos son los dos corpus del español contemporáneo. Salvo aquellas palabras

ampliamente conocidas, la lematización de muchas formas así como las respectivas

imputaciones diatópicas mueven muchas veces a duda. Ello no se debe al descuido o

inercia de la Academia, sino que a la difícil transición entre el “peso” de la tradición de

DRAE y la evidencia empírica numerosísima que sirve confirmación o refutación a las

afirmaciones del diccionario49

. De esta forma, la consulta al DEAEe (2014) siempre

debe hacerse concomitantemente con la confirmación de los datos en CREA y CORPES

XXI.

En lo tocante a la lexicografía no oficial50

, cabe mencionar DUEAEe (2004), ya

que se reara de un diccionario que se declara abierto a la variedad diatópica. No está

demás mencionar que la lematización de americanismos sigue constituyendo un arduo

problema, tanto para la dialectología como para la lexicografía. Todavía hoy las

palabras de LIPSKY (2005, p. 33) sin válidas cuando afirma que “casi todos los

diccionarios y glosarios regionales contienen palabras consideradas únicas y

pintorescas”. Esta afirmación, que se refiere fundamentalmente a los diccionarios y

glosarios de argentinismos, chilenismos, paraguayismos, peruanismos51

, etc., se aplica

también a las obras α exhaustivas, incluyendo las comentadas aquí. De esta forma, la

sola mención de la inclusión de unidades léxicas del español en América no constituye

a priori un rasgo necesariamente cualitativo de una dada obra lexicográfica, sino que se

está profiriendo una declaración de buenas intenciones en lo que se refiere a la inclusión

48

En los casos em que se cita La version electrónica de un diccionario, al final de la sigla se acrecienta

una e. 49

Tanto la lematización como los diferentes segmentos informativos en un diccionario constituyen

afirmaciones sobre un hecho de lengua. Por ejemplo, DREAe (2014, s.v.) lematiza chácara como variante

de chacra (“extensión de tierra cultivada”). Sin embargo, ninguna de las cuatro ocurrencias disponibles

en CREA o en CORPES XXI, que ni siquiera reconoce la forma, confirman esa afirmación. En el plano

microestructural, por otra parte, la indicación ortográfica, la valencia o la propia definición son también

todas afirmaciones que equivalen a decir “La palabra x se escribe así, se comporta sintácticamente de tal

manera o significa y”. 50 En razón de la limitación de espacio, no se tratará Gr.DVoxe (2004). Esta obra parece corresponder al

mismo diseño de DUEAEe (2004). 51

Notables excepciones en este panorama lo constituyen el DECh (1984-1987) y los diccionarios que se

redactaron al alero del denominado “Proyecto de Augsburgo”, que, lamentablemente, quedó inconcluso.

Page 103: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

103

del léxico del español en sus variedades extra peninsulares. Además de la atención que

se le presta al léxico diatópicamente diferenciado, un rasgo sobresaliente de DUEAEe

(2004) es un pci más rico que aquel presente en DRAE (2015), como lo demuestra el

ejemplo siguiente: baldío, -día

adjetivo | nombre masculino

1 [terreno] Que no se cultiva ni se labra: ej la orden de 1767 de repartir los territorios baldíos favoreció a los

labradores más poderosos; subió a la explanada, rala como un baldío. sin: erial.

adjetivo

2 [esfuerzo, empeño] Que resulta inútil porque no ofrece ningún resultado: ej todo esfuerzo se había demostrado al

final baldío.

adjetivo | nombre masculino

3 RPlata, Colomb, Guat, Méx [terreno, solar] Que está sin edificar en zonas urbanas o suburbanas y que

generalmente está abandonado: ej en la esquina de mi casa hay un terreno baldío; unos cuantos baldíos de la zona

fueron expropiados como consecuencia de las inversiones de empresas constructoras para levantar modernos

edificios.

7 Diccionario α exhaustivo: DUEAEe (2004)

En primer lugar, cabe destacar el énfasis que se da a los casos de alternancia de

clase morfológica posibles para esta unidad léxica, y lo que es más importante, a la

ejemplificación ofrecida (por ejemplo, la ac. 1 y la posibilidad de realización der baldío

como substantivo o adjetivo). En segundo lugar, es un mérito que DUEAEe (2004)

ofrezca las restricciones de atribución, esto es, con qué unidades léxicas nominales el

adjetivo baldío se puede construir. En el caso de esfuerzo / empeño baldío, hay dos

hechos que destacar. Por un lado, la combinación empeño baldío no pudo ser

documentada en el CREA, lo que puede llevar a equívocos de norma; por el otro, la

combinación esfuerzo baldío parece corresponder a una colocación, aunque nos falta

evidencia empírica para validar esta hipótesis. Finalmente, se podrá observar que hay

una clara acepción diferencial entre el uso peninsular (ac.1) y las imputaciones para el

Río de la Plata, Colombia, Guatemala y México (ac. 3).

Para el final de esta sección ha quedado un diccionario especialmente útil para el

hispanista brasileño in spe. DEA (1999) le brinda una importancia fundamental a la

sintaxis, un rasgo estructural básico de la competencia (o falta de ella) del español como

lengua extranjera. Una muestra:

dar I v (conjug 7) A tr a normal 1

Hacer que [alguien o algo (ci)] pase

a tener [algo (cd)] o a disponer [de

ello (cd)] | Delibes Príncipe 19:

Tengo mucha tela que cortar; déme

la leche y luego el Santines que me

suba esto. Zunzunegui Camino 448:

Dame una toquilla, que tengo frío

(…) b) ser dado. Ser permitido. |

PRivera Discuro 10: En ninguna

Page 104: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

104

circunstancia es dado pararse (…)

c) de comer [a alguien].

Proporcionar[le] alimento, a veces

acercándoselo a los labios (…). d)

de comer aparte → comer.

2 Repartir [las cartas] Más frec.

abs (…). 3… 62

II loc adv 63 para y tomar

(col) En gran abundancia (…).

8 Diccionario α exhaustivo: DEA (1999)

Hay dos hechos que es fundamental destacar. En primer lugar, DEA (1999) es

un diccionario que refleja exclusivamente los usos del español contemporáneo. En

segundo lugar, la variedad del español corresponde también rigurosamente al español

peninsular. A propósito de los niveles de organización de la lengua tratados ad supra,

cabe señalar que el nivel sintáctico es uno de los que sufre menos variación, de modo

que la sintopía no constituye un problema

Ya en BUGUEÑO MIRANDA (2013b, p. 200-201) se destaca que concita la

atención del usuario el esfuerzo consciente de este diccionario por ofrecer de forma

exhaustiva las informaciones referentes a los actantes que se activan con el verbo dar.

Además de la ya tradicional abreviatura tr, que poco o nada revela sobre cómo se

comportan sintácticamente éste y muchos otros verbos, hay una marca de uso (normal),

que constituye otro hecho de nota, y que debe evaluarse e interpretarse a la luz de las

informaciones que vienen a continuación. En primer lugar, la propia paráfrasis

explanatoria de la acepción 1, por medio de la inserción de los indicadotes estructurales

“[a alguien (ci)]” y “[algo (cd)]” y seguida del ejemplo previsto en el programa

constante de informaciones52

(“deme la leche”), es una instrucción para el usuario que

se podría formular de la siguiente manera: “El verbo dar se suele usar normalmente en

español tanto con objeto directo (o acusativo) como con objeto indirecto (o dativo)”. En

la acepción 2, por otra parte, la marca de uso (“más frec. abs.”) está indicando que con

esta significación es posible elidir el objeto directo (= estado absoluto).

facultativo, va. adj. Perteneciente a una facultad. Se dice del acto que libremente se puede hacer u

omitir. Médico o cirujano.

facha. f. Aspecto, traza fam. Mamarracho.

facultar. tr. Conceder facultades para hacer

algo. Autorizar.

facundia. f. Facilidad de palabra.

facundo, da. adj. Que tiene facundia.

faena. f. Trabajo corporal o mental.

52

“Programa constante de informaciones” es el total de segmentos informativos definidos para la

microestructura abstracta de una determinada categoría morfológica (cf. BUGUEÑO MIRANDA;

FARIAS, 2011).

Page 105: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

105

faena. f. Trabajo corporal. fig. Trabajo mental

Quehacerú.m.en pl. (faenas rurales) fig. Servicio que se hace a una persona.

DEscBill (1995)

faenar. tr. Matar y carnear reses.

DEscAt (2007)

9 Diccionario escolar

Una clase recurrente en la consulta de diccionarios es el diccionario escolar. Su

aparente simplicidad parece constituir un sinónimo de consulta eficiente para el usuario

aprendiz de ELE. Es necesario, sin embargo, señalar que la mayoría de estos

diccionarios presenta fallas análogas a las de muchas otras obras lexicográficas, sobre

todo, en segmentos de la microestructura. Así, por ejemplo, en DEscBill (1985, s.v.

facultativo), la primera acepción (“perteneciente a la facultad”) es la menos frecuente.

En la tercera, por otra parte, se incurre en un vicio extendido en la práctica

lexcicográfica, que no es otro que el uso de un elemento disyuntivo (“médico o

cirujano”), que obliga al usuario a tomar un decisión basada en el implícito de que

ambas expresiones serían intensionalmente equivalentes, cuando, de facto, no lo son.

Una situación similar acontece en la segunda acepción, solo que en este caso la

diferencia entre las opciones propuestas es diafásica. Un segundo aspecto a ser

destacado es la circularidad de las paráfrasis explanatorias, como en DescAt (2007 s.v.

facundo). El usuario, motu proprio, debe ejecutar una operación medioestructural para

interpretar la paráfrasis (“que tiene facundia”), ya que facundia constituye el artículo

anterior. En tradiciones lexicográficas más desarrolladas que la hispánica, para los casos

en que un elemento de una paráfrasis pueda resultar poco claro, se indica por medio de

un indicador no estructural (una flecha, por ejemplo) que el usuario deberá procurar esa

unidad léxica en otro punto del diccionario. En función de lo expuesto, el uso de

diccionarios escolares es recomendable con reservas.

A diferencia de lo que acontece en Brasil, la lengua española tiene una relación

mucho menos compleja con el uso de extranjerismos. Las dudas a este respecto se

pueden subsanar as través de la consulta de DPD (2005). Tal vez sea por ello que la

presencia de diccionarios de extranjerismos sea discreta en la lexicografía hispánica.

Sólo para fines de ilustración, se ofrece un ejemplo de Dangl (1997):

frame [fréim]

m, tel Imagen completa formada por dos semiimágenes o campos explorados por

Page 106: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

106

separado. Sin: cuadro.

Pero muchos otros no consiguen tolerarle un solo

«frame», [El Mundo 8-11-92, 77].

Dentro de la filosofía del programa -«tratamos de cada frame como un cuadro con

una importancia absoluta al sonido, que es el auténtico protagonista», según Collazo-,

Metrópolis emite en agosto tres programas que acogen a 27 artistas [Telepaís, 1-8-93,

6].

franela f, text, frec Tejido fino de lana o algodón cardado.

Etim: francés franelle, id < ingl. flannel, id.

10 Diccionario de extranjerismos

No es posible no trazar una correlación entre diccionarios de lengua española y

la orientación en el uso de la lengua, sobre todo cuando el diccionario constituye una

heurística en el proceso de enseñanza-aprendizaje. Con una cuidadosa transposición y

extensión de los términos, la normatividad forma parte del ethos del diccionario. En el

apartado 3 (“Cómo se organiza una lengua”) nos hemos referido a este aspecto,

asumiendo la distinción entre norma real e norma ideal53

. Esa distinción se puede

proyectar perfectamente sobre la lexicografía hispánica. Un ejemplo de diccionario de

norma real es DEspMod (1979), que no será analizado aquí no obstante su mérito. En

el ámbito de los diccionarios de norma ideal, DUE (1998), es, sin lugar a dudas, su

mejor exponente. He aquí un ejemplo:

costumbre (…) («Adoptar,

Adquirir, Coger, Contraer,

Tomar; Pegarse; Tener c., Tener

la c. de, Tener por costumbre;

(…)»; expresiones de costumbre

se forman con «a» ´a la

española´). Práctica repetida

regularmente de una acción (…)

Particularmente, práctica de

esa clase, tradicional en un

pueblo o región: ´Costumbres

montañesas´(…).

pararrayo o pararrayos (…).

permanecer (…) Estar en un

sitio durante cierto tiempo (…)

Estar todavía de cierta

manera: ´La situación permanece

indecisa´(V.: «*Conservarse,

*durar, *estabilizarse,

*estacionarse, ficar, (…) Día y

noche (…), seguido, *siempre

*Arraigado, asentado, (…)

Asiento, *estación, estada, (…),

53

Para una discusión más detallada sobre la normatividad en, cf. BUGUEÑO MIRANDA (2013a, p. 31-

32).

Page 107: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

107

estancia, (…) *Durar, *estar,

*quedar, *Seguir» (…).

rebuscar (tr. o absol.) *Buscar

minuciosa o escrupulosamente:

´Está rebuscando datos para

escribir la historia de…(…)

Rebusca hasta que encuentra lo

más barato´. Buscar y

*recoger ciertas cosas:

´Rebuscar las cetas´ (…).

11 Diccionario de norma ideal: DUE (1998)

La orientación normativa se puede observar, por ejemplo, en la lematización

doble de pararrayo / pararrayos, con lo que se informa al usuario que ambas formas

son igualmente apropiadas. Afirmar, sin embargo, que DUE (1998) es nada más que un

diccionario de norma ideal es restarle mérito. También es, al mismo tiempo, un

diccionario de norma real, pero entendiendo norma real no sólo como una descripción

del español, sino que también como una descripción de cómo las palabras se combinan

en la lengua. Después de lema costumbre, se notará que se ofrece una serie de verbos

(adoptar, adquirir, coger, contraer, tomar), que son palabras con las que costumbre

suele construirse. De manera intuitiva, sin duda alguna, lo que DUE (1998) ofrece son

los padrones colocacionales que se construyen con la base costumbre. Es necesario

recordar que este segmento informativo se encontraba ya en la edición 1966-1967 de

DUE, de modo que no es arriesgado afirmar que este diccionario se adelantó

precozmente a la discusión sobre el tema y todavía más al tratamiento lexicográfico de

este fenómeno54

. En este mismo sentido, y sólo comparable a DEA (1999), DUE (1988)

es de los pocos diccionarios de lengua española que explicita las posibilidades de

explicitación o elisión del complemento directo, como se puede apreciar s.v. rebuscar,

en que después del lema figura la siguiente indicación: “tr. o abs.”, que no significa otra

cosa que afirmar que en este verbo se puede explicitar o eliminar su objeto directo.

Informaciones así son esenciales para el aprendiz brasileño de español, ya que en este

ámbito, así como en otros, y no obstante la indudable filiación genética, tipológicamente

hay claras situaciones de divergencia entre las lenguas. Finalmente, DUE (1998)

pretende también servir como un diccionario onomasiológico. Es necesario precisar, sin

embargo, que esta función quedó ostensiblemente reducida en la segunda edición

(1998), cuando se eliminó el principio del cono léxico, que era el principio ontológico

54

Cf. nota 23 del presente trabajo.

Page 108: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

108

por el que se ordenaba el léxico. La razón para ello era la complejidad de entender su

organización. DUE (1998) mantuvo un segmento informativo llamado “catálogo de

voces”, que va precedido del símbolo , y cuya función es ofrecer un conjunto de

opciones analógicas para el contenido sémico que se expresa por medio de la paráfrasis,

como s.v. permanecer. No se puede soslayar el hecho de que el estudiante de ELE

carece de un diccionario que lo auxilie en sus tareas de producción textual y que esté

mínimamente a la altura de LLA (1996)55

, de modo que DUE (1998) suple esta

carencia, aunque su potencial usuario –es pertinente reconocerlo- requiera tanto de una

competencia lingüística como metalingüística ya desarrollada.

Para el final ha quedado uno de los temas más polémicos de la lingüística

hispánica, que no es otro que el de los americanismos56

. Citamos tres ejemplos:

gambuso, -a

I.1. adj. ES Referido a

persona, listo.

game (Voz inglesa)

I.1. Mx, CR, Pe, Bo, Ar, En

tenis, cada una de las partes en

que se divide un set. ► estar en

el ~

gamela I.1. f Pe, Ch Balde, artesa,

palangana.

gamelotal I.1. Ve terreno plantado de

gamelote.

gamelote I.1. Ve guinea, pasto. ►

hablar ~ DAm (2010)

cantero m Lugar delimitado

en un parque o jardín y dispuesto

con un fin decorativo para el

cultivo de flores y plantas

pequeñas [E: cuadro]

cantidad: cualquier ~ a) coloq Gran cantidad »de algo«

[E, Arg: un montón]. b) coloq

Mucho [E,Arg: un montón]

cantina f OBS 1. Bar,

generalm. en un establecimiento

de enseñanza o en club

deportivo, en el que se pueden

comprar y consumir bebidas

ligeras 2. Restaurante de estilo

italiano.

OBS: En E, con la primera

acepción, menos frecuente.

nDArg (1993)

ensalada chilena nf Ch =

ensalada de tomate y cebolla

tomato and onion salad

ensopar vt = empapar

||…sentado en un banquillo en el

centro del patio ensopado por el

chaparrón (H.Hediger, 1977:

245-246)

to drench

entierrar vt fam Ch = ensuciar

(zapatos) ||… los zapatos

nuevos…Cuidado con

entierrarlos (v. Urbistondo, Ch,

287)

to dirty (shoes)

brDAm (1999)

11 Diccionarios de americanismos

Los tres ejemplos presentados ad supra reflejan tres tendencias que se pueden

observar en esta clase de diccionarios. En primer lugar, DAm (2010) constituye un

esfuerzo de la Asociación de Academias de la Lengua Española por ofrecer un registro

de las variedades léxicas en el continente americano. Sin embargo, y recordando las

palabras de LIPSKY (2005) a propósito del tratamiento de los americanismos en los

diccionarios disistémicamente inclusivos, DAm (2010) también incurre en la tendencia

55

Para un análisis de la “familia” Language Activator, cf. LUNKES (2014). 56

Sobre el estado de la cuestión, además de LIPSKY (2005), cf. También FRAGA GARCÍA; FRANCO

FIGUEROA (2003).

Page 109: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

109

de incluir unidades léxicas exóticas o de escasas frecuencia. Tal es el caso de gamela.

Una consulta al CREA no reveló ninguna documentación y en lo tocante al CORPES

XXI, sólo se encontraron tres documentaciones: una imputación de uso en Chile y dos

en España. No hay registro alguno para el Perú. De esta forma, y como ya se mencionó

en otro lugar, cada imputación de uso requiere siempre una comprobación. En una

situación completamente diferente se encuentra nDArg (1993). Esta obra corresponde a

una volumen más del lamentablemente inconcluso Proyecto de Augsburgo, cuyo

objetivo primigenio era la redacción de un diccionario de Americanismos. A lo largo de

la ejecución del proyecto se tornó evidente que tanto el estado de la dialectología

latinoamericana como de la teoría metalexicográfica aplicada a diccionarios diatópicos

no permitirían que se pudiera concluir un diccionario con el objetivo propuesto. Por

ello, se decidió que se redactarían diccionarios que circunscribieran el levantamiento

léxico rigurosamente dentro de las fronteras políticas. Además, cada una de las unidades

léxicas sería contrastada con los usos peninsulares. Con ello sería posible ofrecer un

conjunto de datos que permitiría establecer le real extensión de los usos léxicos (lo que

podría evitar la imputación de uso de gamela para el Perú, por ejemplo). Además, los

usos léxicos se podrían cotejar tanto con designaciones análogas dentro del propio

espacio geográfico-político como con España. Así, por ejemplo, en nDArg (1993, s.v.

cantidad: cualquier) se informa que esta expresión cuantificadora de carácter coloquial

posee tanto dentro del territorio argentino como en el territorio peninsular una forma no

marcada: un montón. De esta forma, es posible afirmar que cualquier cantidad se usa

en Argentina (se usa también en Chile), pero no se puede afirmar que sea un

argentinismo. Además, si bien es coloquial, los hablantes de aquel país disponen

también de la forma un montón, que es la misma que se usa en España. Con esto se

evita la falsa asunción de que los usos diferenciales sean exclusivos de uno o más países

y que estén en una relación privativa en relación al español peninsular. De esta forma, la

lexicografía de americanismos incorporó en esta obra una concepción que se aproxima

de la pluridimensionalidad dialectológica. Las diferencias no ocurren sólo

diatópicamente, sino que también diafásico-diastráticamente, así como también

diafrecuentemente (por ejemplo, el pos comentario s.v. cantina, que informa que la

primera ac. se registra también en España, aunque es menos frecuente). Para el final ha

quedado un tercer diccionario de americanismos que, en cierta medida, difiere de los

anteriores, ya que no soslaya su una inclinación a la equivalencia entre lenguas. No

puede afirmarse que brDAm (1999) sea un diccionario bilingüe, aunque la disposición

Page 110: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

110

de las informaciones lo asemeja al diccionario bilingüe pasivo. No obstante que esta

obra ha recibido una crítica adversa57

, aporta informaciones útiles, tal como ensalada

chilena, ya que, a lo que parece, la designación está circunscrita al espacio geográfico

de Chile. También es pertinente la lematización de ensopar, frecuente en Chile, por

ejemplo, pero que con bajísima representación en el CORPES XXI.

No obstante que el modelo de BUGUEÑO MIRANDA (2014) prevé la opción

genotípica de diccionarios de orientación onomasiológica, esta clase de diccionarios no

será tratada en este trabajo. El corto espacio todavía disponible para esta comunicación

la complejidad intrínseca del tema aconsejan soslayarlo. Cabe señalar, sin embargo, que

el diseño de un diccionario onomasiológico constituye todavía un desiderátum para la

lexicografía hispánica, no obstante que tales obras existen. La cuestión central es

general una ontología de fácil acceso y comprensión para el usuario, así como redefinir

el conjunto de segmentos informativos para tal obra.

Conclusiones

La ausencia de un espectro de obras especialmente diseñado para el aprendiz

universitario brasileño de español obliga a que se procure por soluciones alternativas. El

análisis presentado a lo largo de la exposición demuestra que la tradición lexicográfica

hispánica cuenta con un espectro variado y rico de obras de referencia. Este espectro

permite acceder a un panorama de la mayoría de los diferentes hechos idiomáticos que

caracterizan al español en todos aquellos niveles del lenguaje que se pueden tratar

lexicográficamente. Indudablemente que hay sensibles vacíos que requieren de una

atención inmediata, y que abarcan desde el diseño de un diccionario de aprendices

realmente eficiente para el estudiante brasileño de ELE, pasando por una tención mayor

al poder de combinatoria de las palabras y no dejando de lado a los diccionarios

onomasiológicos. Un aspecto que aquí se silenció, porque escapaba al tema inmediato

de la exposición, pero que requiere también la máxima atención es la preparación de los

alumnos de Licenciatura en lengua española para saber seleccionar y consultar un

diccionario de acuerdo a sus necesidades. Demás está decir que una formación en

lexicografía de este alumno tendría un poder multiplicador, ya que el alumno de hoy

será el profesor de mañana.

57

Cf., por ejemplo FUENZALIDA (2000).

Page 111: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

111

Referências bibliográficas

ANDIÓN HERRERO, Ma. Antonieta; GIL BURMANN, María. Las variedades del

español como parte de la competencia docente: qué debemos saber y enseñar en

ELE/L2 (2013). Em: Actas del I Congreso Internacional de Didáctica de Español

como Lengua Extranjera. Instituto Cervantes de Budapest (2013). p. 47-59.

Budapest: Centro Virtual Cervantes. Disponível em:

http://cvc.cervantes.es/ensenanza/biblioteca_ele/publicaciones_centros/PDF/budapest_2

013/06_andion-gil.pdf. Accesado em: 30.12.2015, p. 47-59.

ARMANI, Diógenes (2015). Avaliação do Diccionario Salamanca no ensino -

apredizagem de Espanhol para Estudantes Brasileiros. Trabalho de Conclusão de

Curso, Graduação em Letras Português e Espanhol, Universidade Federal do Rio

Grande do Sul. Porto Alegre.

ATKINS, Sue; RUNDELL, Michael (2008). The Oxford Guide to Practical

Lexicography. Oxford: Oxford University Press.

BALDINGER, Kurt (1977). Teoría semántica. Hacia una semántica moderna. Madrid:

Alcalá.

BERGEROVÁ, Hanna (2013). Emotionswortschatz: (lerner)lexikographisch und

korpuslinguistisch. Fallbeispiel: Kollokationen des Typs Verb + Adverb. Em:

BERGEROVÁ, Hanna; SCHMIDT, Marek; SCHUPPENER, Georg (Hrsgn.).

Lexikologie und Lexikographie. Aktuelle Entwicklungen und Herausforderungen. p.

13-34 (Aussiger Beiträge. Germanistische Schriftreihe aus Forschung und Lehre, Band

7). Ústi nad Labem: Tisk´parna L.V. Print.

brDAm (1999). STEEL, Brian. Breve Diccionario Ejemplificado de Americanismos.

Madrid: ArcoLibros.

BUGUEÑO MIRANDA, Félix (2016). A fundamentação da classificação de obras

lexicográficas de uma L2. Em: NADIN, Odair Luiz; ZAVAGLIA, Cláudia (org.).

Estudos do léxico em contextos bilíngues. São Paulo: Mercado das Letras [no prelo].

________ (2014). Da classificação de obras lexicográficas e seus problemas. Proposta

de uma taxonomia. Em: ALFA, v. 58/1, p. 215-231.

________ (2103a). Balanço e perspectivas da lexicografia. Em: Cadernos de

Tradução, v. 32, p. 15-37.

________ (2013b). Tradición y novedad en la lexicografia hispánica. Em: Anuario

Brasileño de Estudios Hispánicos, v.XXIII, p. 193-206. Disponível em:

http://www.mecd.gob.es/brasil/dms/consejerias-exteriores/brasil/2014/publicaciones/

abehxxiii .pdf. Accesado em: 09.01.2016.

________; REOLON JARDIM, Carolina (2010). Os learner´s dictionaries do inglês e os

Lernwoerterbuecher do alemão: uma simples transposição de nomes?. Em:

Contingentia, v. 5, p. 41-67.

Page 112: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

112

________ (2009a). Para uma taxonomia de paráfrases explanatórias. Em: ALFA, v.

53/1, p. 243-260.

________ (2009b). Sobre a microestrutura em dicionários semasiológicos do alemão.

Em: Contingentia, v. 4, p. 60-72.

________ (2008). Panorama da lexicografia alemã. Em: Contingentia, v. 3, p. 89-110.

________ (2007). O que é macroestrutura no dicionário de lingua?. Em: ISQUERDO,

Aparecida Negri; ALVES, Ieda Maria. (Org.). As ciências do Léxico: Lexicologia,

lexicografia e terminologia, p. 261-272. São Paulo: Humanitas, v. III.

________ (2004). La etimología en el diccionario de la lengua. Em: Revista Letras, v.

64, p. 173-188.

CORPES XXI. Corpus del Español del Siglo XXI. Disponível em:

http://web.frl.es/CORPES/view/inicioExterno.view;jsessionid=620ED20003CCE7F710

5B462474388D9B Accesado em: 18.01.2016.

COSERIU, Eugenio (1992). Einführung in die Allgemeine Sprachwissenschaft.

Freiburg: Francke.

CREA. Real Academia Española. Corpus de Referencia del Español Actual.

Disponível em: http://corpus.rae.es/creanet.html Accesado em: 18.01.2016.

DAm (2010). Asociación de Academias de la Lengua española. Diccionario de

Americanismos. Madrid: Santillana.

DAtEsp (1992). Diccionario El Ateneo de La Lengua Española. Buenos Aires: El

Ateneo.

DCEC (2004). BOSQUE, I. Redes. Diccionario Combinatorio del Español

Contemporáneo. Madrid: SM.

DCR (1972-1994). CUERVO, Rufino José. Diccionario de Construcción y Régimen

de la Lengua Castellana. Herder: Barcelona (cd-rom: ed. 1.00).

DEA (1999). SECO, Manuel; ANDRÉS, Olimpia; RAMOS, Gabino. Diccionario del

Español Actual. Madrid: Aguilar.

DECh (1984-1987). MORALES PETTORINO, Félix; QUIROZ, Óscar; PEÑA

ÁLVAREZ, Juan. Diccionario Ejemplificado del Español de Chile. Valparaíso:

Academia superior de Ciencias Pedagógicas.

DEscAt (2007). Diccionario Escolar El Ateneo. Buenos Aires: El Ateneo.

DEscBill (1995). Diccionario Escolar Billiken. Buenos Aires: Billiken.

DEspMod (1979). ALONSO, M. Diccionario del español moderno. Madrid: Aguilar.

DIlEsp (2003). Diccionario ilustrado de La Lengua Española. Santiago: Zig-Zag.

DFonDescr (2007). GUTIÉRREZ, Mariano de Andrés. Diccionario fonético de la

lengua espanola. Madrid: Fundación Universitaria española.

Page 113: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

113

Dfrhechas (2011). RODRÍGUEZ-VIDA, Susana. Diccionario de frases hechas.

Madrid: Octaedro.

DFrasEM (2004). VARELA, Fernando; KUBARTH, Hugo. Diccionario fraseológico

del español moderno. Madrid: Gredos.

DiCE (2010). ALONSO RAMOS, Margarita. Diccionario de Colocaciones del

Español. Coruña: Facultade de Filoloxia Universidade da Coruña. Disponível em:

http://www.dicesp.com/paginas. Accesado em : 04.01.2015.

DInv (1987). BOSQUE, Ignacio; FERNÁNDEZ, Manuel. Diccionario inverso de

langua. Madrid: Gredos.

DInvAula (1987). DE LA CAMPA, Hermenegildo. Diccionario inverso del espanol.

Su uso en el aula. Madrid: Narxea, 1987.

DPD (2005). Real Academia Española. Dicionario Panhispánico de Dudas. Madrid:

Santillana.

DRAEe (2014). Real Academia Española. Diccionario de la Lengua Española

(versión en línea). Madrid: Espasa-Calpe. Disponível em: http://dle.rae.es/ Accesado

em: 10.01.2014.

DSinIdAfRima (1994). Diccionario de sinónimos, ideas afines y de la rima. Madrid:

Paraninfo.

DUE (1998). MOLINER, María. Diccionario de Uso del Español. Madrid: Gredos.

DUEAEe (2004). Diccionario de Uso del Español de América y de España (versión

en cd-rom). Barcelona: Vox.

DURÃO, Adja Balbino de Amorim Barbieri (1999). Análisis de errores e interlengua

de brasileños aprendices de español y de españoles aprendices de portugués.

Londrina: Editora UEL.

FRAGA GARCÍA; Juan Antonio; FRANCO FIGUEROA, Mariano (2003). El español

de América. Cádiz: Servicio de Publicaciones de la Universidad.

FUENZALIDA, Mauricio (2000). Reseña a STEEL, Brian. Breve Diccionario

Ejemplificado de Americanismos. Madrid: ArcoLibros (1999). Em: BFuch, v.

XXXVIII, p. 393-410. Disponível em:

file:///C:/Users/ILETRAS116%20TRES/Downloads/19559-59735-1-PB%20(1).pdf.

Acessado em: 03.03.2016.

Gr.DVoxe (2004). Gran Diccionario Vox de la Lengua Española (versión en cd-

rom). Barcelona: Vox.

GUTIÉRREZ CUADRADO, Juan (2000). El Diccionario Salamanca de Santillana,

cinco años después. Em: Actas del XI Congreso de ASELE, p. 124-134. Zaragoza:

Centro Virtual Cervantes. Diponível em: http://cvc.cervantes.es/ensenanza/biblioteca_

ele/asele/pdf/ 11/ 11_0123.pdf. Accesado em: 29.12.2015.

Page 114: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

114

HENNE, Helmut (1982). Die Berufung wird stattgegeben: Plädoyer für die

Entwicklung von Sprachgefühl. Em: GAUGER, Hans-Martin et alii. Sprachgefühl?

Vier Antworten auf eine Preisfrage, p.91-137. Heidelberg: Lambert Schneider.

HUMBOLDT, Wilhelm von (1836 [1979]). Über die Verschiedenheit des

menschlichen Sprachbaus und ihren Einfluss auf die geistige Entwicklung des

Menschengeschlechts (hrsg. von Andreas Flitner und Klaus Giel). Stuttgart: J.G.

Cotta´sche Buchhandlung

IMMICH, Maica (2015). Estudo sobre a adequação entre o Marco Comum Europeu

de Referência para as Línguas, o Plano Curricular Cervantes e os livros didáticos

do espanhol. Trabalho de Conclusão de Curso - Graduação em Letras - Português e

Espanhol, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre.

LEGALLOIS, Dominique (2012). La colligation: autre nom de la collocation

grammaticalle ou autre logique de la relation mutuelle entre syntaxe et sémantique ?

Em : Corpus. Nice, v 11, p.1-14.

LIPSKY, John M. (2005). El español de América. Madrid: Cátedra.

LLA (1996). Longman Language Activator. London: Longman.

LUNKES, Diego (2014). Longman Language Activator (2002) e Longman Essential

Activator (2006) como ferramentas para a Produção Textual nas Aulas de Inglês como

Língua Estrangeira. Em: CIPPUS - Revista de Iniciação Científica da UNILASALLE,

v. 3, p. 93-108.

nDArg (1993). HAENSCH, Günther; WERNER, Reinhold. Nuevo diccionario de

argentinismos. Bogotá: Instituto Caro y Cuervo.

ORTOGRAFÍA (2010). Real Academia Española. Ortografía de la Lengua Española.

Madrid: Espasa-Calpe.

PIOTROWSKi, Tadeusz (2015). A theory of lexicography – Is there one? Em:

JACKSON, Howard (ed.) The Bloomsbury Companion to Lexicography, p. 303-320.

London; New York: Bloomsbury.

REHFUS, Wulf (Hrsg.) (2003). Handwörterbuch Philosophie. Göttingen / Oakville:

Vandenhoeck & Ruprecht.

RUNDELL, Michael (2012). It works in practice but will it work in theory?’ The

uneasy relationship between lexicography and matters theoretical. Em: VATVEDT

FJELD, Ruth; TORJUSEN, JULIE MATILDE (eds.). Proceedings of the 15th

EURALEX International Congress, p. 47-92. Oslo: Department of Linguistics and

Scandinavian Studies, University of Oslo. Disponível em:

http://www.euralex.org/elx_proceedings/Euralex2012/pp47-92%20Rundell.pdf Acceso

en: 01.01.2016.

SCHAFROTH, Elmar (2014). Französische Lexikographie. Einführung und

Überblick. Berlin: de Gruyter.

SoLEsp (1995). Rances. Diccionario ilustrado de la lengua española. Barcelona:

Sopena.

Page 115: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

115

SVENSÉN, Bo (2009). A Handbook of Lexicography. The Theory and Practice of

Dictionary-making. Cambridge: Cambridge University Press.

TesLCE, (1611 [1943]). Covarrubias, Sebastián de. Tesoro de la Lengua Castellana o

Española (ed. por Martín de Riquer). Barcelona: Horta.

ZANATTA, Flávia (2010). A normatividade e seu reflexo em dicionários

semasiológicos de língua portuguesa. Dissertação de Mestrado – Programa de Pós-

Graduação em Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

VILLARRUBIA ZÚÑIGA, Marisol (2013). Diccionarios monolingües de ELE vs.

diccionarios normativos. Em: Marco ELE. Revista Didáctica Español como Lengua

Extranjera, v. 17, p. 1-12. Disponível em: http://marcoele.com/descargas/17/villarrubia-

diccionarios_ele.pdf. Accesado em: 29.12.2015.

WANZEK, Christiane (2010). Lexikologie. Göttingen: Vandehoeck & Ruprecht.

WEINRICH, Harald (1979). A verdade dos dicionários. Em: VILELA, Mário (org.).

Problemas de Lexicologia e Lexicografia, p.314-337. Porto: Livraria Civilização.

WIEGAND, Herbert Ernst (1977). Nachdenken über Wörterbücher: Aktuelle Probleme.

Em: DROSDOWSKI, Günther (Hrsg.). Nachdenken über Wörterbücher, p. 51-102.

Mannheim: Bibliographisches Institut.

Page 116: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

116

CORTESIA E ESTRATÉGIAS DE ATENUAÇÃO EM ESPANHOL E

PORTUGUÊS SOB UM OLHAR INTERCULTURAL

Camilla Santero Pontes, UFBA

Cecília Aguirre, UFBA

1. Introducción

Este trabajo presenta resultados parciales referentes al proyecto de investigación

denominado “Estrategias de atenuación en situaciones cotidianas: un estudio de las

variedades del español de Santiago de Chile, de La Plata, Argentina, y de aprendices de

español como lengua extranjera en nivel avanzado, Universidad Federal de Bahía,

Brasil”, desarrollado en el marco del grupo de investigación de Descripción y análisis

linguístico del español, Instituto de Letras, UFBA.

El trabajo se inscribe dentro del ámbito de la Pragmática Sociocultural,

disciplina que aborda el estudio de la cortesia en lengua española a partir de

interacciones inter e intra culturales. La Pragmática Sociocultural concibe a la lengua

como un fenómeno social, el cual parte de una cultura de la que se nutre y a la que

retroalimenta. Bravo (2004, p. 19) parte de la noción de “comunidad sociocultural” para

definir a un grupo de personas que comparten la misma comunidad de lengua, una

misma identidad de grupo y sentimiento de pertenencia cultural, y reconoce la

existencia de relaciones “inter-socioculturales”, esto quiere decir, entre generaciones,

entre géneros o entre regiones geográficas de un mismo pais, así como entre paises

diferentes, apuntando a la grande heterogenenidad intra e inter cultural y a la serie de

conflictos que esa interrelación entre grupos socioculturales diferentes puede acarretar,

objetivo de estudio de la pragmática inter-sociocultural.

El objetivo de este trabajo es describir y comparar las estrategias corteses y

tácticas de atenuación utilizadas por brasileños, argentinos y chilenos, relacionándolas

con la noción de ethos cultural de (KERBRAT-ORECCHIONI, 2004, p. 50), según

descripto por Celada (2002a, p. 216); CELADA (2002b s/p) y Boretti (2003, p. 113) y

Puga (1997, s/p), respectivamente, con la intención de demonstrar que el perfil

Page 117: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

117

comunicativo brasileño se aproxima al de las culturas de acercamiento, a pesar del uso

frecuente que los hablantes hacen de la atenuación.

KERBRAT-ORECCHIONI (2004, p. 50) define ethos como el conjunto de

representaciones y valores de una determinada lenguacultura58

, el cual determina su

perfil comunicativo. Kerbrat-Orecchioni (1992, p. 257) distingue tres dimensiones en la

interacción interpersonal: una dimensión horizontal, representada por el eje de

proximidad versus distancia comunicativa; una dimensión vertical, con un eje de

dominación versus submisión, y por último, una dimensión afectiva, que se manifiesta

en el eje de cooperación versus conflicto.

Con respecto a estas tres dimensiones, entendemos que la interacción

interpersonal en la cultura brasileña se inscribe dentro de la dimensión afectiva, una

vez que tiende al consenso y a la cooperación, para evitar de todas formas el conflicto.

Su reacción al medio es de defensa ante una posible amenaza o ante el rechazo, que se

pone de manifiesto en la dificultad de dar y recibir una negativa. El perfil comunicativo

brasileño se caracteriza por el uso frecuente de diversas tácticas de atenuación. De

acuerdo con Celada (2002a, p. 216) la subjetividad del brasileño se identifica con la

oralidad, libre de restricciones, y se distancia de la norma impuesta. Así, acepta el error,

evita la formalidad y acorta la distancia de la interlocución, favoreciendo la

aproximación al otro como semejante. Para Celada (2002b, p. 3) la ética del brasileño -

el ethos según Kerbrat Orecchioni (2004, p. 50)- es de fondo emotivo.

Ya el perfil comunicativo de los argentinos se define como más directo, más

frontal, más cortante. De acuerdo con Boretti (2003, p. 113), el argentino se autoestima,

reconoce su valor y su forma de actuar, ratificando en la interacción sus buenas

cualidades y originalidad. La autora reconoce en esta actitud una posible fuente de

modos de acción directos y frontales, los cuales permiten que el individuo se confirme

socialmente. El argentino se preocupa por demostrar afecto, tolerancia, sinceridad y

desinterés en vínculos de intimidad familiar, de amistad y formales, y también otorga y

busca la reciprocidad y la confianza del otro, con base en el mutuo conocimiento y en

acuerdos implícitos. Briz (2006, p. 250) coloca este perfil a un alto grado en la escala de

las culturas de acercamiento y describe su discurso como cortés, marcado por el uso

58

Término acuñado por Fantini (1997 citado por Siqueira, 2011) para marcar la completa asociación entre

lengua y cultura.

Page 118: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

118

frecuente de intensificadores. De esta forma, entendemos que el perfil comunicativo del

argentino se ubica en la dimensión horizontal, cercana al polo de proximidad.

Según Puga (1997) el perfil comunicativo del chileno se caracteriza por una

mayor deferencia hacia el interlocutor, deferencia que se manifiesta mediante la

“cortesía señor-criado” resultante de la marcada estratificación social chilena. Por esto,

entendemos que el perfil comunicativo chileno se ubica en la dimensión vertical,

próximo al polo de submisión. Su discurso está marcado por una alta frecuencia en el

uso de la atenuación. Briz (2006, p. 250) coloca el ethos cultural chileno en un grado

inferior al de los argentinos en la escala de las culturas de acercamiento.

Adoptamos en este trabajo la definición de atenuación según Briz (2006) como

categoría pragmática fundamentada en el principio de cortesía:

“En concreto es una estrategia conversacional vinculada a la relación

interlocutiva, que mitiga la fuerza ilocutiva de una acción, el papel del sujeto y

objeto de la enunciación o la fuerza significativa de una palabra, de una

expresión para lograr la aceptación del otro, el objetivo previsto”. (BRIZ,

2006, p. 244)

Es decir, la atenuación es un recurso estratégico de la cortesía, táctico y eficaz,

para la negociación y el acuerdo en la interacción.

Haverkate (1996, p. 46) y Briz (2006, pp. 247-248) explican las diferencias

culturales en los usos sociolingüísticos de la atenuación cortés mediante la distinción

entre culturas orientadas hacia la cortesía positiva o culturas de acercamiento y culturas

orientadas a la cortesía negativa o culturas de distanciamiento. Según la definición de

Briz, (2006, p. 247), las primeras manifiestan una tendencia a la cercanía social, al

estrechamiento de los espacios interpersonales, a la intervención directa en la esfera

privada del otro y al establecimiento de puentes de relación y confianza entre los

interlocutores; mientras que las segundas se caracterizan por un marcado respeto al

ámbito y espacio personal de los demás y por mantener la deferencia y precaución en

las relaciones sociales. Para Briz (2006, p. 249) la distinción entre culturas de

acercamiento y de distanciamiento no se define por oposición, sino que estas

constituyen dos extremos de un continuum gradual.

Albelda y Briz (2010, p. 249) afirman que la expresión formal y la frecuencia de

uso de la atenuación difieren según la variedad geográfica del español. Y acrescentan

que las peticiones y ruegos suelen ser más atenuados en Latinoamérica. Destacan que

Page 119: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

119

en la cultura chilena, mexicana y costarricense se valora el respeto y la deferencia hacia

los espacios personales de los demás, lo que se manifiesta mediante una mayor

presencia de formas de cortesía normativa (peticiones de permiso y agradecimientos

frecuentes), mayor número de atenuantes, de disculpas, etc. Los autores afirman que la

presencia de atenuantes verbales y de cortesía pone en evidencia la existencia de

distancia social entre los interlocutores, puesto que la atenuación se usa

estratégicamente para compensar dicha distancia. De acuerdo con Briz (2006, p. 249)

una cultura de acercamiento favorece la menor frecuencia de atenuantes; por otro lado,

una cultura de distanciamiento hace del uso frecuente de la atenuación cortés una

estrategia de aproximación al otro.

De esta primera descripción se deduce que el perfil comunicativo de brasileños y

chilenos se caracteriza por el uso frecuente de tácticas de atenuación, de acuerdo con su

ethos cultural; mientras que el perfil de la cultura argentina se caracteriza por el uso

frecuente de la intensificación y escasa atenuación. De acuerdo con lo expuesto por Briz

(2006), y Albelda y Briz (2010), y considerando los resultados del análisis, entendemos

que en la situación propuesta, los hablantes de la cultura chilena y de la brasileña

protegen la imagen ajena como un intento de lograr sus fines comunicativos. De este

modo el uso frecuente de la atenuación cortés no busca subsanar el distanciamiento con

el otro, sino más bien disminuir el riesgo de una respuesta negativa a su petición. Por

otro lado, los hablantes argentinos presentan un bajo uso de atenuantes debido a las

motivaciones subyacentes a la propia imagen – comprometidos con la palabra, con la

seriedad y moral de los hechos.

Desde esta perspectiva, el presente trabajo propone un análisis cualitativo del

uso de la atenuación en una situación de predominante cortesía negativa, es decir, una

situación en la que el hablante comete un acto amenazador a la imagen negativa – el

territorio material o patrimonial – del destinatario. Para la descripción se toman como

base las distintas estrategias corteses propuestas por Brown & Levinson (1987, citado

por ALBELDA, 2010, p. 241) y las tácticas generales de atenuación (ALBELDA y

BRIZ, 2010, p. 246). Estas estrategias son analizadas a la luz del ethos cultural

(KERBRAT-ORECCHIONI, 2004, p. 50) de brasileños (CELADA, 2002a), argentinos

(CELADA, 2002b; BORETTI, 2003) y chilenos (PUGA, 1997, s/p) para después

comparar las distintas estrategias corteses y tácticas de atenuación observadas en las tres

culturas.

Page 120: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

120

2. El ethos cultural y la atenuación

Kerbrat Orecchioni (2004, p. 48) afirma que el comportamiento de cortesia varía

tanto cuantitativa como cualitativamente de una sociedad a otra. Observa que desde el

punto de vista cuantitativo, varía la frecuencia de uso de los procedimientos corteses;

desde el punto de vista cualitativo, o bien el mismo acto de habla puede ser realizado de

diferentes formas, por ejemplo, se puede expresar agradecimiento mediante una

bendición o una disculpa; o bien una misma fórmula o procedimiento cortés puede

expresar diferentes valores pragmáticos.

La autora destaca que estas diferencias revelan, por un lado, las distintas

concepciones acerca de lo que se considera una amenaza o un refuerzo a la imagen, y

por otro lado, las distintas situaciones en las que se espera un acto cortés y aquellas en

que la cortesía sería inadecuada. Así, concluye que la noción de mal entendido o de

inadecuación pragmática surge al proyectar sobre usos extranjeros nuestras propias

normas de cortesía.

Los fenómenos de atenuación y cortesía se ubican dentro del área de la

Pragmática y de la Sociopragmática, pero también dentro de la Pragmática Lingüística y

Sociocultural (BRAVO, 2004) y del Análisis del discurso oral coloquial (BRIZ, 2004).

Placencia (2010, p. 10) reconoce la afinidad que existe entre los análisis contrastivos y

de comunicación intercultural con los estudios sobre cortesia de la lengua española. Las

definiciones de atenuación y cortesía tienen su origen en los estudios de (GOFFMAN,

1967), donde se presentan las nociones de imagen (positiva o negativa) y de territorio,

corporal, material, espacial, temporal, cognitivo, etc. de las personas como seres

sociales. La teoría más clásica y más cuestionada sobre cortesía es la de Brown &

Levinson (1987, p.68), quienes en Politeness: Some Universals in Language Usage

retoman las nociones de Goffman para definir el acto amenazador de la imagen (FTA,

face threatening act, en inglés). Desde esta teoría, la mayoría de los actos de habla

realizados son potencialmente amenazadores para una u otra imagen. Según Kerbrat

Orecchioni (2004, p. 42), esta propiedad amenazadora, constitutiva de los actos de

habla, va en contra de la necesidad universal de imagen y coloca en riesgo el suceso de

la interacción. Es entonces cuando interviene el trabajo de imagen, concepto de

Goffman (1967) que designa todo lo que una persona intenta para conseguir que sus

acciones no le hagan perder la imagen a ninguno de los interlocutores.

Page 121: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

121

Para concluir, como afirma Kerbrat-Orecchioni (2004, p. 50), la cortesía positiva

implica incursiones sistemáticas en el territorio del otro, con manifestaciones de

simpatía y de interés, preguntas, cumplidos, regalos, ofrecimientos, invitaciones;

mientras que la cortesía negativa supone evitar toda ingerencia o transgresión al

territorio personal del otro. Concebido para colocar en evidencia ciertos principios

universales del uso del lenguage, (aquellos que permiten la gestión armoniosa de las

relaciones interpersonales), gracias a los cuestionamientos apuntados y junto a la

adecuación propuesta por Kerbrat-Orecchioni (2004, p. 43-44) 59

, el modelo de cortesía

de Brown & Levinson (1987, pp. 101-210) permite esclarecer ciertas diferencias en el

funcionamiento de la cortesía de una cultura a otra. Estas diferencias culturales revelan,

según la autora, una lógica cultural subyacente a los comportamientos de cortesía y

constituyen la parte emergente de un conjunto de valores y representaciones de una

determinada sociedad, es decir, su ethos, que puede ser igualitario o, al contrario,

jerárquico (cortesía de tipo deferencial); ethos de proximidad o de distancia; ethos de

privilegio consensuado a la cortesía positiva o, en su defecto, a la negativa.

2.1 Descripción del ethos de brasileños, argentinos y chilenos.

Entendemos que intentar explicar el uso de la atenuación a partir de las distintas

identidades lingüístico-culturales constituye un objetivo de estudio muy complejo, que

debe ser abordado de forma multidisciplinar. Por ese motivo recurrimos a diversos

estudios dentro del área del Análisis del Discurso que describen el ethos cultural de

brasileños, argentinos y chilenos.

Concordamos con Boretti (2003, p. 110) en que los fenómenos de variación

cultural e identidad constituyen la base de diversos aspectos relacionados con el modo

de hablar de los grupos socioculturales, como un conjunto de preferencias colectivas.

Coincidimos también con la definición de Geertz (citado por BORETTI, 2003,

p. 110) que define cultura como

“un esquema históricamente transmitido de significaciones representadas en

símbolos (objeto, acto, hecho, palabra, gesto), un sistema de concepciones

heredadas y en formas simbólicas, a través de medios por los que los

hombres comunican, perpetúan y desarrollan su conocimeinto y sus actitudes

frente a la vida”

59

La autora propone acrescentar al modelo de Brown & Levinson la noción de actos valorizantes,

“agradadores” de la imagen del otro (face flattering acts, en inglés), como actos que equilibran sutilmente

la presencia de actos amenazadores en la interacción.

Page 122: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

122

2.1.1 El ethos brasileño

De acuerdo con Celada (2002a, p. 215) la subjetividad del brasileño se identifica

con la oralidad, libre de restricciones y se distancia de la norma impuesta, del escribir y

del hablar difícil. Esta identificación se ve legitimada por una oralidad que acepta el

error, evita la formalidad y acorta la distancia de la interlocución, favoreciendo así la

aproximación al otro, como semejante.

Para la autora, la cordialidad brasileña no guarda relación con mantener las

formas de la civilidad, significado que la colocaría en relación a la cortesía como

estrategia de defensa ante hechos de habla potencialmente amenazadores. Por el

contrario, la ética – el ethos del brasileño según Kerbrat Orecchioni (2004, p. 50) es de

fondo emotivo y su forma de convivio social es contraria a la noción de cortesía puesto

que no tiene una noción ritualista de la vida (CELADA, 2002a, p.217). Esta ética

constituye, al igual que la metáfora del portuñol como extensión de la propia lengua,

otra forma de decirse brasileño.

2.1.2 El ethos cultural del argentino

Autores como Serrani (1994), Celada (2002b), Boretti (2003), Briz (2006)

coinciden al afirmar que el perfil comunicativo del argentino se caracteriza por la

abrupción, la directividad, la necesidad de autoafirmación y de confianza entre los

miembros del grupo, que manifiesta a través de comportamiento amistoso, sincero y

generoso.

Celada (2002b, p. 6) también reconoce en la variante rioplatense del español una

discursividad que vincula la palabra con la verdad y sus marcas de responsabilidad,

necesidad, seriedad, moral de los hechos, peso de lo real60

. Por eso se espera, además de

la palabra, un gesto que asegure su realidad o su realización. La autora concluye que

probablemente, ese rigor, ese grado de exigencia con respecto a la palabra sea la razón

por la que se establece una relación más tensa con el interlocutor.

Para Boretti (2003, p. 112-113) el perfil comunicativo argentino es parte de una

construcción colectiva del discurso identitario ampliamente extendido en la sociocultura

60

En realidad la autora parafrasea a Ricardo Piglia (2011) en el artículo “La lectura enemiga” publicado

en Página 12, domingo 18 de septiembre de 2011: “... La eficacia de la palabra está ligada a la verdad,

con todas sus marcas: responsabilidad, necesidad, seriedad, la moral de los hechos, el peso de lo real...”

Page 123: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

123

nacional: el individuo se afirma demostrando las cualidades que lo hacen creíble ante

los demás, a partir de la confianza ganada en el seno del grupo. Por eso reconoce que es

frecuente el uso de formas imperativas rotundas, sin atenuación, que demuestra un trato

interpersonal sin rodeos, según las motivaciones subyacentes a la imagen del grupo. Por

otra parte, la autora destaca que los usos convencionales o indirectos para la petición no

siempre implican distancia interpersonal ni neutralización de los riesgos de la

interacción, puesto que su uso responde a una función afectiva, siendo que la

afectividad es un componente identitario importante del perfil comunicativo argentino.

2.1.3 El ethos cultural chileno

En el capítulo Atenuación, distancia y situación comunicativa, Puga (1997)

explica los distitos distanciamientos que el hablante chileno realiza mediante la

atenuación. Este necesita tomar distancia de sí mismo, del mensaje, del receptor o del

tiempo del enunciado. Al distanciarse de sí mismo, el hablante reduce el papel propio y

el de su interlocutor con lo dicho, por ejemplo, mediante el uso de la segunda o tercera

persona para impersonalizar sus enunciados. Se distancia del mensaje, al atenuar

órdenes y pedidos, sobre todo cuando la jerarquía de su interlocutor ocupa un nivel

superior, o sea están en relación de asimetría social. En una sociedad marcadamente

estratificada como la chilena, las personas de clase alta pueden llegar a no considerar

interlocutores válidos a personas en una jeraquía social inferior. Por eso la necesidad de

distanciamiento del emisor: existe una distinción entre la atenuación utilizada entre

miembros de la misma jerarquía social y la atenuación que se realiza entre

interlocutores de distinta jerarquía social. Así, el hablante de menor jerarquía deberá

hacer uso de una grande variedad de tácticas de atenuación para conseguir su propósito

comunicativo, puesto que la atenuación opera pricipalmente de abajo hacia arriba. El

hablante chileno también se distancia del presente, cuando este tiempo de la

enunciación se recubre de cierta carga o dureza, mediante otros tiempos verbales o

mediante el uso del subjuntivo y condicional.

Entre las razones que explican la abundante atenuación en el habla chilena, Puga

(1997) destaca precisamente la marcada estratificación social y la rígida distancia social,

motivos por los cuales la cortesía se caracteriza como cortesía “señor-criado” y cortesía

“obsequiosa y servil”. De esta forma el hablante chileno le deja mayor libertad de

acción a su interlocutor, que puede no cosiderarlo un interlocutor válido por causa de su

Page 124: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

124

posición social. Por esto, entendemos que el perfil comunicativo chileno se ubica en la

dimensión vertical, próximo al polo de sumisión y consecuentemente, su discurso estará

marcado por una alta frecuencia en el uso de la atenuación. Briz coloca al ethos cultural

chileno en un grado inferior al de los argentinos en la escala de las culturas de

acercamiento.

3. Marco metodológico y descripción de los datos

La atenuación y la cortesía son categorías pragmáticas que permiten identificar

las diferencias culturales entre las tres comunidades socioculturales investigadas. Al

mismo tiempo que reflejan rasgos culturales, la atenuación y la cortesía posibilitan una

reflexión sobre cuál es el lugar que ocupan los hablantes de español como lengua

adicional61

– en este caso, brasileños. Incluimos los brasileños, estudiantes de español

en nivel avanzado, en esta investigación, porque entendemos que los hablantes no

nativos de español poseen un lugar que les es propio – el lugar de usuario competente

de lengua española, con marcas lingüísticas características de su cultura.

Para este estudio se realizaron diez entrevistas orales, grabadas en el año de

2014, con cinco hombres y cinco mujeres de cada una de las variedades de habla

investigadas – Santiago de Chile (Chile), La Plata (Argentina) y Salvador de Bahia

(Brasil); en total 30 entrevistas en las que se les plantea una situación para que puedan

construir una respuesta. Los informantes son jóvenes de edades entre 19 y 33 años,

todos universitarios. En la situación propuesta, el informante se encuentra con el

propietario del piso en que vive para decirle que no va a poder pagar el alquiler en la

fecha combinada. Los informantes fueron identificados con códigos como M5A23, en el

que primero se menciona el sexo (hombre o mujer), segundo, el número del entrevistado

en el corpus, tercero, el país de origen y cuarto la edad.

La orientación metodológica parte del corpus, por tanto a medida que vamos

descubriendo a los hablantes a través de su discurso, hacemos uso de diferentes

herramientas de análisis para interpretar los datos. Instrumentos como la noción de

ethos cultural de Kerbrat-Orecchioni (2004, p.50), las estrategias corteses (Brown y

Levinson, 1987, pp. 101-210) y las tácticas de atenuación (Briz y Albelda, 2010, p. 246)

61

El término lengua adicional (Jordão, 2014, p.15) se refiere a situaciones de uso entre hablantes de más

de una lengua, con la doble intención de resaltar el carácter plurilingüe de las sociedades reconocidas

como monolingües, y de valorar usos locales del español en países como Brasil.

Page 125: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

125

resultaron muy eficaces en la elucidación de las especificidades del corpus. Otra

herramienta metodológica que contribuyó con el análisis cuantitativo y cualitativo fue el

cálculo de la frecuencia relativa del total de palabras del corpus. Con el objetivo de

identificar las estrategias atenuadoras utilizadas por los informantes, adoptamos la

clasificación de tácticas generales de atenuación de Briz y Albelda (2010, p. 246).

Como en este trabajo presentaremos los resultados parciales obtenidos hasta el

momento, focalizaremos entonces la descripción y análisis de las estrategias corteses y

tácticas de atenuación utilizadas por los hablantes con relación al ethos cultural que los

caracteriza.

Según los autores, los procedimientos de atenuación lingüística pueden ser:

A) Indeterminación de la calidad o cantidad de lo dicho: Son mecanismos que

difuminan el contenido semántico de lo dicho, por medio de la

indeterminación de la calidad o disminución de la cantidad. Para ello se

puede encontrar usos diminutivos, minimizadores (un poco, sólo),

aproximativos (en plan, más o menos), difusores significativos (algo, algo

así), eufemismos (tercera edad por anciano), etc.

eh sabe quee/señor /no tengo para pagarle en este momento/ así que voy a tener

que pagarle un poco después (Hombre chileno, 19 años)

B) Expresión de duda o incertidumbre: Expresiones lingüísticas que representan

falta de certeza o seguridad sobre lo dicho, para no responsabilizarse tanto

con lo que se enuncia. En general se utilizan estructuras verbales o

adverbiales de creencia o de incertidumbre (parecer, ser posible, imaginar,

etc.).

yy no sé qué haremos ahora / mira discúlpame no sé que qué podemos hacer

(Mujer brasileña, 33 años)

C) Expresión de restricciones en la opinión o en la petición: El hablante

restringe su opinión a si mismo (para mí, en mi opinión, a mi modo de ver,

Page 126: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

126

etc.) o a un determinado espacio o ámbito (por lo menos, por ahora, etc.).

También se limita la opinión o la solicitación a través de estructuras

condicionales o temporales (si no te importa, si te parece bien, etc).

le complica mucho a usted quee retrase el pago porque en este minuto no le

puedo pagar (Mujer chilena, 20 años).

D) Justificación y explicación: Justificaciones del propio comportamiento o de

lo expresado para paliar el compromiso de los hablantes con ello. Suelen

emplearse construcciones como es que, porque, como, etc.

la empresa donde trabajo en la empresa hubo un problema y queee por ese

motivo ah como es una empresa pública los sueldos están retrasados yy de esa

manera no podré (Hombre brasileño, 20 años)

E) Corrección y reformulación: El hablante intenta restaurar el orden en la

interacción y minimizar el desacuerdo. Reformula y se corrige, haciendo uso,

de marcadores discursivos como bueno, pues, etc. También las risas y la

petición de disculpas suelen ejercer el oficio de reparación de una amenaza a

la imagen.

no voy a poder / cumplir con lo que prometí iii que me disculpe por supuesto eee

(Mujer argentina, 23 años)

F) Concesión: Son procedimientos que contrarrestan desacuerdos y

discrepancias, previstos o patentes, con el interlocutor. Se emplean diversas

estructuras sintácticas concesivas en las que, o bien primero se establece la

concesión y después se expresa la disconformidad (sí, pero; de acuerdo,

pero), o al contrario.

te voy a retrasar un poco el pago pero siempre lo he hecho justamente...sé que

voy a alcanzar una solución intermedia paraaa (Hombre chileno, 24 años)

G) Implicación del interlocutor en lo dicho por el hablante: Se atenúa lo dicho

compartiendo la responsabilidad de lo dicho (lo opinado, lo propuesto) con

el interlocutor. El hablante involucra al oyente a través de fórmulas fáticas de

Page 127: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

127

pregunta como ¿no?, ¿vale?, etc. También puede lograr este mismo objetivo

si deja el enunciado sin acabar, suspendido.

sabe que soy un hombre responsable que pagaa/ que paga puntualmente el

arriendo (Hombre chileno, 19 años)

H) Formulación indirecta de actos de petición o de solicitud: No se formula

directamente lo que se solicita, pero quien escucha, recibe, se supone,

suficientes pistas para reconocerla. Frecuentemente se realizan preguntas en

lugar de emplear imperativos (¿Me ayudarías?), se niega el supuesto de lo

que se quiere pedir o preguntar (Supongo que no te quedará café), o se

incluye en la petición la improbabilidad de que se le conceda lo que solicita

(Me imagino que a estas horas ya no será posible, pero ¿tendrías café?)

siii no me daría la posibilidad / de que se lo pague más adelante (Mujer

argentina, 23 años)

I) Despersonalización de elementos de la enunciación: Se difumina la persona

o la fuente de la enunciación. En este sentido, se emplean, por ejemplo,

pronombres impersonales (uno, tú general, nosotros inclusivo, se),

estructuras lexicalizadas (según cuentan, por lo que dicen, por lo visto, al

parecer, presuntamente, etc.). No se encontró en los corpus la

despersonalización como estrategia atenuadora.

El pedido para atrasar con el pago del alquiler es un acto amenazador al

territorio del interlocutor (propietario del piso), porque lo obliga a reaccionar; todo

pedido exige un esfuerzo del que recibe la petición. La invasión de territorio se da por la

necesidad que el interlocutor tiene en posicionarse, sea aceptando la solicitud, sea

rechazándosela. El aceptarla puede significar un cambio de planes, puesto que no va a

recibir el dinero en la fecha prevista. Utilizamos el modelo de Briz y Albelda (2010)

como herramienta para controlar los mecanismos lingüísticos más frecuentes en las tres

variedades de habla analizadas, con el propósito de no sólo mostrar los procedimientos

Page 128: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

128

de atenuación característicos de esas comunidades, sino también discutir los usos bajo

aspectos culturales y de enseñanza-aprendizaje de lenguas.

4. Análisis de los datos

Tomando en cuenta la clasificación de tácticas generales de atenuación de Briz y

Albelda (2010, p. 246), las estrategias corteses (BROWN y LEVINSON, 1987, pp. 101-

210) y el ethos de cada una de las comunidades que componen la encuesta, presentamos

el siguiente análisis parcial.

4.1 Informantes de Salvador de Bahia – Brasil

En la elaboración del acto que tiene como finalidad conseguir que el propietario

del piso consienta el atraso del alquiler, tres de los diez informantes brasileños (dos

mujeres y un hombre) recurren a estrategias de cortesía negativa y positiva a la vez.

Cuando la táctica de atenuación generaba un distanciamiento marcado, intentaban

recuperar la aproximación con una táctica de cortesía positiva. Al expresar el tema del

atraso, que representa una amenaza a la imagen del propietario, ellos incluyen al

interlocutor en la actividad para demostrar que cooperan (1) y le prometen que no van a

retrasar el pago nuevamente (2).

(1)

que siempre pago en tiempo ¿no? (…) lo que puedo hacer es:: pagar por

adelantado en el mes que viene (M3B23)

(2)

entonces quería decirte que no va a pasar más otros meses pero en ese mes no

tengo como pagar en la fecha:: que siempre pago (H4B26)

Sin embargo, los usos de cortesía negativa predominaron en todo el corpus,

porque según Brown y Levinson (1987, pp. 101-210) son estrategias que buscan reparar

la amenaza realizada a la imagen negativa del interlocutor. Las diferentes formas

lingüísticas de mitigar los efectos del pedido de atraso del alquiler fueron clasificadas

según el modelo de Albelda y Briz (2010). Tanto en las entrevistas femeninas como en

las masculinas, dos tácticas predominaron, una es la justificación y explicación y la otra

es la formulación indirecta de actos de petición o solicitud. Todos los hablantes las

Page 129: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

129

utilizaron como mecanismo atenuador. Veamos el mecanismo de justificación y

explicación introducido por “es que” en (3):

(3)

sé que estoy un poco atrasada con el pago de este mes del alquiler pero es que

estoy pasando unas situaciones un poco complicadas (M4B29)

(4)

este mes ee /me pasó algo yyy/ bueno/ y el tema es que no tengo plata para

pagarte (H3B23)

Al hacer uso de esta táctica se observó que ocho de los diez informantes

brasileños justifican el atraso antes de hacer el pedido de postergación del pago. En

general, utilizan las narraciones para explicar el motivo del atraso. Las dos entrevistadas

que no siguieron el orden, explicación pedido, presentan circunstancias distintas, en (5)

el hablante introduce su conversación hipotética con el propietario del piso en que vive

como si ya estuviera en atraso con el alquiler:

(5)

lo siento muchísimo muchísimo, yo sé que estoy un poco atrasada con el pago

de este mes del alquiler pero es que estoy pasando unas situaciones un poco

complicadas (M4B29)

La segunda informante, le propone al dueño del piso otra fecha para pagarle el

alquiler atrasado, o sea, ella actúa como si ya le trajera una solución. A través de su

propuesta, se sobrentiende que ella solicita otro plazo para pagar el alquiler:

(6)

Yo hablaría con él que yo no podría pagar en la fecha que nosotros teníamos eh

ha sido una combinación y le diría una posible fecha que yo eh pagase este

dinero a él (M5B27)

Otra táctica que aparece como estrategia para 100% de los informantes

brasileños es la formulación indirecta de actos de petición o solicitud. Todos realizan lo

que se puede considerar como una condición preparatoria para el pedido, pero no lo

concretan, es como si dejaran el enunciado sin acabar, suspendido, esperando la

reacción del interlocutor. Las diez intervenciones de esta variedad de habla exigen del

interlocutor la interpretación de las pistas contextuales (Gumperz, 1982, 2002, p.152),

Page 130: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

130

que se realizan por implicaturas conversacionales, o sea, el hablante emite señales y el

interlocutor interpreta cuál es la actividad que se entabla en dada interacción:

(2)

es que me pasó una cosa en el trabajo / y ese mes no voy a recibir en la fecha

que siempre recibo / entonces que me voy a retrasar un poco el pago entonces

quería decirte que no va a pasar más otros meses pero en este mes no tengo

como pagar en la fecha:: que siempre pago (H4B26)

Los hablantes recurren a diferentes narraciones, una para justificar el atraso y

otra para recordarle al propietario del piso su historial de buen pagador. La cantidad de

palabras en el corpus de Salvador de Bahia (820) demuestra la diversidad de historias,

bien como la indirectividad de esos informantes que evitan de diferentes formas un

posible rechazo por parte de su interlocutor hipotético. En un intento de alcanzar su

objetivo comunicativo, en este caso el consentimiento del propietario para recibir el

dinero después, los hablantes brasileños – hombres y mujeres – formulan historias

apelativas con temas sociales que puedan sensibilizar al interlocutor. Esta actitud refleja

el ethos emotivo de los brasileños que hacen uso de una estrategia que funcionaría con

ellos si fuera al revés. Explotar el recurso de la emoción es una estrategia muy eficaz

entre los brasileños cuando se pretende lograr las metas deseadas en la comunicación.

(7)

ocurrió algo este mes con nosotros, con mi/con:: mi marido y yo y estamos sin

dinero, nuestra hija va a hacer una/ una cirugía y estamos sin dinero y estoy

sintiéndome muy mala porque no vamos a poder pagarlo, yy no sé qué haremos

ahora (M2B33)

(8)

Yo soy universitario entonces no tengo mucho dinero y podría explicarlo

porque todos los meses anteriores yo había pagado hasta mismo antes de la

fecha del día del pagamiento entonces yo le diría que este mes no tenía dinero

pero que él podía pensar un poco en los meses anteriores que yo iba a pagar

cuando conseguir el dinero (H1B22)

La táctica de concesión aparece en el habla de cuatro mujeres y tres hombres,

con el propósito de evitar posibles desacuerdos con el interlocutor. En el ejemplo (7), la

informante construye su discurso con muchos rodeos. Primero relata una historia sobre

Page 131: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

131

la enfermedad de su hija, después confiesa no saber qué hacer, enseguida le hace la

concesión al propietario e inmediatamente expresa lo que puede generar el desacuerdo.

(7)

qué cosas podemos hacer, mira voy a pagarlo ¿sí? pero no puedo pagarlo ahora

en el día que nosotros siempre pagamos (M2B33)

(4)

yo siempre pago todos los alquileres justos pero/este mes eee me pasó algo

yyy/ bueno (H3B23)

Los mecanismos menos frecuentes fueron los de corrección y reformulación,

implicación del interlocutor en lo dicho por el hablante y expresión de restricciones en

la opinión o en la petición. Cada uno de estos procedimientos fue utilizado en el habla

de dos o tres informantes de ambos sexos. El ejemplo (2) representa una estrategia de

Corrección frente a la imagen amenazada del dueño del piso:

(2)

entonces quería decirte que no va a pasar más otros meses pero en ese mes no

tengo como pagar en la fecha:: que siempre pago (H4B26)

En (1) se puede observar la implicación del interlocutor en lo dicho, puesto que

la entrevistada involucra al interactante por medio de la fórmula fática – ¿no?. Esta

fórmula es una marca de interacción que busca demostrar que ambos interlocutores

comparten la información vehiculada, en este caso la de que la inquilina nunca atrasa

con el alquiler.

(1)

// yo nunca tengo problemas con eso, que siempre pago en tiempo ¿no? pero

que este mes tuve problema serísimo con mi familia, de salud y que no puedo

(M3B23)

4.2 Informantes de Santiago de Chile

En cuanto al uso de las estrategias corteses, los chilenos hicieron uso

exclusivamente de las tácticas de cortesía negativa. De acuerdo con Puga (1997) el

español de Chile es bastante eufemístico, lo que justifica la incidencia de estrategias

atenuantes como una acción reparadora del territorio del interlocutor, que desea

asegurar su libertad para actuar. Nueve de los diez informantes chilenos reemplazan el

Page 132: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

132

pedido directo de atraso del alquiler por formulaciones indirectas. Considerando que la

situación es hipotética y los informantes no están interactuando directamente con el otro

participante del acto comunicativo – el dueño, en (9) el hablante realiza un pedido

directo.

(9)

y que me espere un poco/ que me de un plazooo/fijo/ y que yo se lo voy a pagar

y voy a cumplir con ello (H3C20)

Semejante a los resultados encontrados para el corpus brasileño, las tácticas más

frecuentes en las entrevistas chilenas fueron la de justificación y explicación y la de

formulación indirecta de actos de petición o solicitud. La primera aparece en el habla de

los diez informantes y la segunda en el habla de nueve de ellos. Veamos el ejemplo (10)

en el que los distintos problemas justifican el atraso con el alquiler y el (11) en el cual la

informante realiza el pedido en forma de pregunta.

(10)

esta vez por distintos problemas no voy a poder eh cancelarle en la fecha que/

en la fecha estipulada (H1C19)

(11)

le quería preguntar/ se que eh es muy/ le complica mucho a usted quee retrase

el pago (M1C20)

Otra característica común al corpus brasileño y chileno es el uso mayoritario de

las explicaciones/justificaciones antepuestas a la información de atraso del alquiler.

Entre los diez hablantes de Chile, seis usaron la táctica de la justificación como

condición preparatoria para la petición. De los cuatro informantes que introdujeron su

discurso mediante la presentación del problema, tres son mujeres. Aunque la táctica de

la justificación predominó en ambas las comunidades, el contenido de las explicaciones

y justificaciones brasileñas fue mucho más extenso que el de la misma táctica en la

variedad chilena. Eso se comprueba por la cantidad de palabras del corpus chileno

(432), poco más de la mitad de la muestra brasileña (820).

Diferente de los hablantes brasileños que prácticamente no indeterminan la

cualidad o cantidad de lo dicho, los chilenos realizan abundantemente esta táctica. En el

Page 133: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

133

corpus de Santiago de Chile, tres mujeres y cinco hombres la utilizaron. En (12), el

modificador “un poco” no deja claro cuándo será el pago, pero minimiza la fuerza

ilocutiva del pedido al mismo tiempo que disminuye el riesgo de una negativa por parte

del propietario.

(12)

Eh sabe quee/señor /no tengo para pagarle en este momento/ así que voy a

tener que pagarle un poco después/ disculpe la molestia (H2C19)

Según Puga (1997), el ethos chileno se ubica en la dimensión vertical, en la

extremidad opuesta a la del poder. En la muestra de Santiago de Chile, la posición de

sumisión justifica los usos atenuantes en una actividad comunicativa en la cual quien

detiene el poder de decisión es el propietario del piso alquilado. En una cultura como la

chilena, en la que naturalmente se considera más a la imagen ajena que a la propia

(Puga, 1997), una situación de petición pone de relieve este rasgo cultural a través de la

manifestación de una serie de estrategias de la atenuación cortés.

4.3 Informantes de La Plata – Argentina

En el corpus argentino encontramos resultados bastante particulares que lo

diferencian sobremanera de las demás muestras en diversos aspectos. Los diez hablantes

realizan estrategias de cortesía negativa, sin embargo, si consideramos una escala que va

desde la estrategia más indirecta hasta la más directa, los argentinos se ubicarían en el

polo más cerca de la directividad. La primera razón que justifica una menor

indirectividad está en la cantidad de palabras del corpus de La Plata (298), menos

palabras menos rodeos. Los brasileños, hablaron dos veces más que los chilenos y tres

veces más que los argentinos.

Otra prueba del grado de directividad de los encuestados de Argentina es la

incidencia de pedidos indirectos, nótese que en las muestras anteriores, la mayoría de

los hablantes ni siquiera realiza una petición, sino que le provee al interlocutor pistas

contextuales sobre su objetivo comunicativo. En la muestra argentina, cinco hablantes

(tres mujeres y dos hombres) concretamente le hacen el pedido al propietario del piso,

muchos de ellos utilizan el verbo poder en la petición propiamente dicha:

Page 134: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

134

(13)

Que / que me disculpeee que no llego a pagarle aaa término / que siii no me

daría la posibilidad / de que se lo pague más adelante (M5A23)

(14)

Sí, buenoo y que en el momento no puedo pagarle, si por favor, me podía

esperar unos días más. (H1A21)

(15)

Y le diría que tengo un problema / si me puede esperar porque / eee / nooo no

tengo la plata en ese momento y que preciso de un tiempo para que no me deje

en la calle/ (H3A20)

En (13), (14) y (15), la petición se aproxima al polo de directividad si tomamos

en cuenta las condiciones de la entrevista, o sea, una propuesta hipotética que les fue

planteada y una respuesta que formularon a partir de cómo reaccionaría cada informante

en esa situación. En el extremo más directivo de la escala se ubica el (16), único

hablante argentino que realiza un pedido directo:

(16)

Trato de buscar ayuda / y le digo queee estipule estipule un plazo en el que le

pueda llegar a pagar / trato de hacer un acuerdo (H5A29)

En cambio, cuatro encuestados producen enunciados con estrategias de cortesía

negativa, como en el ejemplo (17), en el que el hablante intenta reparar el daño que el

acto le causa a la imagen del interlocutor. La reparación busca mantener la relación de

confianza, dándole al propietario la garantía de que, pese a no poder cumplir ahora con

lo prometido, sin duda lo hará después:

(17)

Page 135: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

135

Eee tratooo de la mejor maneeera de decirle queee / no voy a poder / cumplir

con lo que prometí iii que me disculpe por supuesto eee […] le voy a pagar

(M1A23)

Observamos en este corpus, que las tácticas de atenuación más frecuentes son

las mismas de las variedades de habla chilena y brasileña. Los hablantes hacen uso de

los mecanismos de justificación y explicación en nueve de las diez entrevistas (cuatro

mujeres y cinco hombres). Otro procedimiento frecuente en el habla argentina es el de

la formulación indirecta de actos de petición o solicitud, también nueve entrevistados lo

usaron, pero la distribución entre ambos sexos cambia – cinco mujeres y cuatro

hombres. En (18) se puede comprobar la justificación como atenuación de un acto

amenazante:

(18)

Eee no queee económicamente / estoy en una situación complicada / y queee

no voy a podeeer pagarle / en tiempo y forma (H4A26)

El hablante (18) justifica el atraso del alquiler por la situación complicada que

vive. Los informantes argentinos anteponen la justificación al pedido en cinco de las

diez intervenciones. Este resultado equilibrado difiere de los otros corpus en los que

prevalece la anteposición de la táctica de justificación y explicación al pedido. Este dato

puede dar señales del ethos argentino, que se caracteriza por la necesidad de

autoafirmación y confianza. Según Celada (2002b, p.6), el discurso de la variedad

rioplatense vincula la palabra a la verdad, bien como a marcas de responsabilidad. De

este modo, el hablante no juzga necesario hacer uso de muchas explicaciones para

hacerse creíble. La justificación en el corpus argentino parece, más bien, indicar la

afectividad hacia su interlocutor, pues, según Boretti (2003), la función afectiva es un

importante componente identitario del perfil comunicativo argentino.

En un continuum que ubica las estrategias atenuantes, encontramos los

hablantes brasileños en el polo positivo (atenúan más) y los argentinos en el polo

negativo (atenúan menos). En la mitad de la escala se sitúan los chilenos.

Page 136: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

136

5. Discusión de los resultados

Las estrategias corteses hasta aqui consideradas, surgen mayoritariamente por

necesidades de cortesía negativa, minimizando la amenaza de una petición. Al rebajar la

fuerza ilocutiva del pedido de atraso con el pago del alquiler, los hablantes intentan

reducir el grado de amenaza a la imagen del interlocutor y, en consecuencia, alcanzar la

meta comunicativa. Cuanto menos expuesto se sienta el interlocutor, más a gusto estará

para la toma de decisiones.

Como se pudo comprobar a través de los resultados obtenidos, las estrategias de

cortesía negativa predominaron en todos los corpus, sin embargo, la frecuencia de uso

de atenuantes, bien como los tipos de tácticas difirieron bastante según la variedad

geográfica de habla española. En el caso particular del corpus de Brasil, la cantidad de

recursos atenuadores utilizados señala la oposición de los brasileños a reconocer la

negativa o el rechazo como una posibilidad en la interacción. Es evidente que los

hablantes de las tres variedades de habla necesitan la aceptación del propietario del piso,

pero los datos brasileños revelan una fuerte preocupación por evitar el desacuerdo. La

actividad de imagen en el corpus brasileño está directamente relacionada a la cantidad

de palabras enunciadas (820).

El cálculo de la frecuencia relativa del número de tácticas por cantidad de

palabras de cada muestra, indica que los hablantes chilenos son los que más utilizan

atenuadores en la situación comunicativa de petición (10 mecanismos de atenuación a

cada 100 palabras), enseguida aparecen los argentinos (8 procedimientos de atenuación

a cada 100 palabras) e en tercer lugar están los brasileños (5 a cada 100 palabras). Sin

embargo, las extensas narraciones de los brasileños que aparecen como táctica de

justificación y explicación son el motivo del aumento del número de palabras, lo que

modificó la frecuencia relativa. Se nota que la táctica de la justificación fue la más

frecuente en todas las variedades de habla, pero si observamos el contenido de las

justificaciones y explicaciones, identificamos rasgos culturales propios de cada una de

las comunidades. La profundidad del contenido de las justificaciones gradualmente se

hace más superficial a medida que cambia de una variedad a otra. Mientras los

brasileños relatan casos de enfermedad en la familia, sueldos atrasados (19) entre otras

Page 137: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

137

cosas, los chilenos simplemente mencionan haberles ocurrido algo (20) y los argentinos

no siempre comentan sobre el motivo del pedido de atraso (21):

(19)

Le explicaría queee la empresa donde trabajo/ en la empresa hubo un

problema y queee por ese motivo ah como es una empresa pública los sueldos

están retrasados yy de esa manera no podré darle el pago el día que estaba

previsto (H2B20)

(20)

Pucha le diría así como/ le pediría disculpa primero/ así como:: / si tuve

problemas le diría que tuve ciertos problemas y que por eso le pagaría lo antes

posible/ lo faltante ¿no? (H4C20)

(21)

Le pediría si me hace el favooor de bancaaarme el tiempo que sea necesario

hasta que le pueda pagar / para no quedar en la calle (M2A27)

La frecuencia de usos atenuantes en el corpus de Salvador de Bahia podría

llevarnos a creer que los brasileños constituyen una cultura de distanciamiento, pero los

temas personales que aparecen en las justificaciones demuestran lo contrario. Según

Briz (2007, citado por Albelda y Briz, 2010, p. 249), la atenuación es un rasgo que

contribuye a definir una cultura de + o – acercamiento. De acuerdo con el autor, cuanto

más acercamiento, menos atenuantes, sin embargo, la cultura brasileña llena todos los

demás requisitos de una cultura de acercamiento (+ cortesía valorizante, +

intervenciones colaborativas, + habla simultánea, + cercanía física al hablar etc.),

excepto el de la atenuación. No queremos con eso cuestionar la eficacia del continuum

propuesto por Briz (2007, citado por Albelda y Briz, 2010, p. 249), sino resaltar la

diversidad cultural, en la que cada cultura asume una dinámica propia que resiste a

sistematizaciones. Las culturas no se pueden encuadrar en un marco inmutable porque

Page 138: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

138

toman distintas formas de acuerdo con el movimiento de los individuos fragmentarios

que las componen.

6. Conclusión

El análisis del discurso de 30 hablantes de español de diferentes variedades

reveló formas de atenuación que pueden situarse dentro de la cortesía, porque se

pretende conseguir la colaboración del interlocutor del evento comunicativo y mitigar

un desacuerdo. La atenuación en los corpus, desempeñó funciones corteses cuando el

hablante intentaba proteger la imagen ajena mediante tácticas como la indeterminación

de la cualidad o cantidad de lo dicho, las expresiones de restricción en la opinión o

petición, las promesas, entre otras.

Se observó en las muestras el uso predominante de dos tácticas de atenuación, la

justificación y explicación y la formulación indirecta de actos de petición o de solicitud.

Sin embargo, la justificación y explicación en el corpus de Brasil confirman el ethos

emotivo de los brasileños que relatan historias con la finalidad de apelar a las emociones

del interlocutor. La presencia de 10 atenuadores a cada 100 palabras en el corpus

chileno ratifica el ethos de sumisión de esta variedad que privilegia al interlocutor. Y en

el caso argentino, el ethos de + confianza se evidencia en intervenciones más directas.

En cuanto al grado de directividad en los corpus investigados, los resultados

coinciden con estudios previos que retratan la cultura argentina con un grado de

directividad superior al de los chilenos y brasileños. De este modo, los hablantes

argentinos ejemplifican una cultura de acercamiento al paso que los chilenos

representan las culturas de distanciamiento. Con respecto a los brasileños, se verificó

un alto grado de indirectividad debido al uso frecuente de narraciones para atenuar la

amenaza a la imagen del interlocutor. Eso no significa que se deba considerar la cultura

brasileña como de distanciamiento, pues las justificaciones y explicaciones están

constituidas por relatos personales que exponen la intimidad de los hablantes.

Consideramos un corpus brasileño para esta investigación porque defendemos el

reconocimiento del español de los hablantes no nativos. Esta postura responde al

imperativo de una sociedad globalizada que no reconoce límites geográficos ni

lingüísticos, sino identidades que se manifiestan a través de la lengua en uso.

Page 139: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

139

REFERENCIAS

ALBELDA M. M; BRIZ, Antonio. (2010) Cortesía y atenuantes verbales en las dos orillas a

través de muestras orales. En: ALEZA I; Milagros y ENGUITA UTRILLA, J. M. (coords.):

La lengua española en América: normas y usos actuales, Universitat de València,

Valencia, pp. 237-260. Recuperado de <http://www.uv.es/aleza>. Accesado en 10/01/2015.

ANDRADE, O. de. (1928-1976) Manifesto antropófago e Manifesto da poesia Pau

Brasil. Recuperado de http://www.ufrgs.br/cdrom/oandrade/oandrade.pdf. Accesado en

28/02/2015.

BORETTI, S. (2003) Cortesía, imagen social y contextos socioculturales en la variedad del

español de Rosario, Argentina. En BRAVO, D (ed) (2003) Actas del Primer Coloquio del

Programa Edice: la perspectiva no etnocentrista de la cortesia: Identidad sociocultural

de las comunidades hispanohablantes. Estocolmo, Programa Edice. Recuperado de

Programa Edice, www.edice.org Accesado en 21/04/2015.

BRAVO, D. (2004) Tensión entre universalidad y relatividad en las teorías de la cortesía.

En BRAVO, D; BRIZ, A. (eds) Pragmática sociocultural: estudios sobre el discurso de

cortesia en español. Barcelona: Editora Ariel, pp. 39-53. Accesado en 15/07/2015.

BRIZ, A. Grupo Val. Es. Co. (2006) Atenuación y cortesia verbal en la conversación

coloquial: su tratamiento en la clase de E/LE. Recuperado de

http://cvc.cervantes.es/ensenanza/biblioteca_ele/publicaciones_centros/PDF/munich_2005-

2006/02_briz.pdf Accesado en 25/08/2015.

BRIZ, A. (2013) A atenuação e os atenuadores: estratégias e táticas. Trad. de SILVA, L.A;

ANDRADE, A. M; BLANCO, R. En: Linha d’Água, n. 26 (2), p. 281-314. Recuperado en:

http://www.revistas.usp.br/linhadagua/article/viewFile/64415/71564. Accesado en

04/008/2015.

BROWN, P.; LEVINSON, S.C. (1987) Politeness: Some Universals in Language Usage.

Cambridge, CUP. Accesado en 15/06/2015.

CELADA, M. T. (2002a) O espanhol para o brasileiro. Uma língua singularmente

estrangeira. Campinas: São Paulo. Recuperado de

http://dlm.fflch.usp.br/sites/dlm.fflch.usp.br/files/Tese_MaiteCelada.pdf Accesado en

Page 140: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

140

22/08/2015.

CELADA, M. T. (2002b) Sobre certas formas de se dizer brasileiro. En Proceedings of

the 2. Congreso Brasileño de Hispanistas, 2002, San Pablo, Brazil) 2002. Recuperado de

http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=MSC00000000120020

00100042&lng=en&nrm=iso Accesado en 02/08/2015.

ERLAUER, N. Z. (2011) Cómo se ve a sí mismo el hombre chileno. La tercera.

Recuperado dehttp://diario.latercera.com/2011/03/05/01/contenido/tendencias/26-61283-9-

como-se-ve-a-si-mismo-el-hombre-chileno.shtml Accesado en 15/07/2015.

FANJUL, A. P. (2011). Policêntrico e Pan-Hispânico: Deslocamentos na vida política da

língua espanhola. En LAGARES, X; BAGNO, M. (Org.). Políticas da norma e conflitos

linguísticos. São Paulo: Parábola Editorial, pp. 299-330.

GOFFMAN, E. (1967) On facework. En GOFFMAN, Erving. Interaction Ritual. New

York: Doubleday. pp. 05-45. Ritual. Recuperado de

http://web.stanford.edu/~eckert/PDF/GoffmanFace1967.pdf. Accesado en 20/07/2015.

GUMPERZ, J. J. (2002) Convenções de contextualização. En: GARCEZ, P. M.; RIBEIRO,

B. T. (Orgs.). Sociolinguística Interacional. 2.ed. São Paulo: Loyola, pp. 149-182

Accesado en 29/07/2015.

HAVERKATE, H. (1996). Estrategias de cotesía. Análisis intercultural. Recuperado de

http://cvc.cervantes.es/ensenanza/biblioteca_ele/asele/pdf/07/07_0043.pdf Accesado en

13/08/2015.

_______________ (2004) El análisis de la cortesía comunicativa: categorización

pragmalinguistica de la cultura española. En BRAVO, D y BRIZ, A. (eds) Pragmática

sociocultural: estudios sobre el discurso de cortesia en español. Barcelona: Editora Ariel,

pp. 55-65.

JORDAO, C. M. (2014). "ILA - ILF - ILE - ILG: Quem dá conta?". RBLA, v.14, n.1, pp.

13-40.

KERBRAT-ORECCHIONI C. (1992) Les interactions verbales. Vol 2. Paris: Colin.

KERBRAT-ORECCHIONI C. (2004) ¿Es universal la cortesía? En BRAVO, D; BRIZ, A.

(eds) Pragmática sociocultural: estudios sobre el discurso de cortesia en español.

Barcelona: Editora Ariel, pp. 39-53.

PIGLIA, R. (2011) La lectura enemiga. Página 12. Recuperado de

Page 141: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

141

http://www.pagina12.com.ar/diario/suplementos/libros/subnotas/4408-494-2011-09-18.html

Accesado en 13/01/2015.

Placencia, M. E. (2010). (Des)cortesía, migración y comunicación intercultural. In F. Orletti

& L. Mariottini (Eds.), (Des)cortesía en español.Espacios teóricos y metodológicos para

su estudio (pp. 399-430). Roma:Universidad Roma Tre - Programa EDICE. Recuperado de:

http://www.edice.org/descargas/4coloquioEDICE.pdf. Accesado en 13/08/2015.

PUGA, J. (1997) La atenuación en el castellano de Chile: un enfoque

pragmalinguistico. Universitat de Valencia. Recuperado de

http://www2.udec.cl/pragmatica/atenuacion/libro/ Accesado en 13/01/2015

Page 142: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

142

APROXIMAÇÕES ENTRE O QUIXOTE E O JOGO DA

AMARELINHA62

Adriana de Borges Gomes

UNEB

Introdução

É notório que O jogo da amarelinha (1963) é o romance mais expressivo de toda

a produção literária de Julio Cortázar63

. Isso equivale dizer que a obra corresponde às

expectativas das diversas seções que conformam o recinto literário. O romance tornou-

se emblemático para leitores de algumas gerações; significativo para autores

importantes na amplitude de literaturas diversas e um representativo objeto de análise da

crítica literária. Ou seja, um importante legado da literatura latino-americana.

A crítica argentina Ana María Berrenechea, no mesmo ano da publicação do

romance, em 1963, escreveu um ensaio sobre o livro de Cortázar que foi publicado em

1964 na revista Sur, de Buenos Aires, cujo comitê editorial era composto, entre outros

nomes, por Jorge Luis Borges, Eduardo González Lanuza, Eduardo Mallea, Ezequiel

Martínez Estrada, Silvina Ocampo e Adolfo Bioy Casares. As palavras inicias de Ana

María Barrenechea sobre O jogo da amarelinha declararam que o romance era já

esperado pelo leitor cortazariano, desde o conto «El perseguidor», e situaram o livro de

Cortázar na «mejor» tradição romanesca, a de Miguel de Cervantes:

Cortázar ha escrito la gran novela que esperábamos de él, la que anunciaba

«El perseguidor» (la intensa nouvelle de Las armas secretas). Rayuela es un

libro complejo y rico, situado en la mejor tradición que abre la novelística

desde sus comienzos – aunque él insista en que quiere realizar una

antinovela, escribir antiliteratura –. Digo en la mejor tradición novelística

62

Recorte da minha tese de doutorado, intitulada Um tal Morelli, coautor do Quixote: a leitura como

poética da escritura (2014). 63

No entanto, vale ressaltar que as críticas argentinas Ana María Barrenechea (nas articulações de sua

análise) e Beatriz Sarlo (mais incisivamente clara), por exemplo, coincidem na eleição do romance 62/

Modelo para armar (1968), como o melhor livro do escritor. Beatriz Sarlo, ao afirmar que O jogo da

amarelinha é um romance de deriva em trânsito espacial, no qual a própria ficção espacializou-se;

observa de maneira elogiosa que este processo de espacialização da ficção culmina em 62/ Modelo para

armar: «En esta novela, la más difícil, la más discutible y la más perfecta de Cortázar, todo se juega en

el tránsito entre espacios reales (referenciales) y espacios virtuales» (SARLO, 2007, p. 265).

Page 143: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

143

porque es la que instaura con Cervantes, la que al abrir la novela a la vida

la incluye en su totalidad: los hombres con sus acciones y sus pasiones, con

sus problemas y sus imaginaciones, y también los productos de lo que

imaginan, la literatura y el arte, sin olvidar el análisis, la pasión o la burla

sobre ese mundo de hechos y de objetos mágicos que su actividad creadora

ha producido (BARRENECHEA, 1964, p. 69-73).

Em 1973, dez anos da publicação do romance, Davi Arrigucci Jr. proporcionava

à crítica brasileira um conhecimento globalizante da produção literária cortazariana,

desde sua contística, passando pelo veio poético do escritor, culminando na substancial

análise d’O jogo da amarelinha. O título do estudo de Arrigucci, O escorpião

encalacrado – a poética da destruição em Julio Cortázar, é muito representativo,

porque captura o centro da discussão franqueada no romance do escritor argentino, com

uma imagem retirada do próprio texto do romance, no capítulo 28 «El alacrán

clavándose el aguijón, harto de ser un alacrán pero necesitado de alacranidad para

acabar con el alacrán» (CORTÁZAR, 1995, p. 181). Antonio Candido, que prefaciou a

primeira edição deste estudo, publicado pela editora Perspectiva, observou com precisão

que o tema de Arrigucci não é exclusivamente a poética de Cortázar:

[...], pois pode ser lido também como se o seu assunto fosse a crise dos meios

tradicionais do que se chama a expressão literária. [...]. Não se trata, portanto,

de suicídio, mas de consequência natural do desenvolvimento e alteração dos

meios expressivos, como se dizia. Este é o problema central do livro de Davi

Arrigucci Júnior, na medida em que o encaramos do ângulo da teoria

literária. [...]. Mas o fato é que Davi Arrigucci Júnior vai e volta entre o caso

concreto e o problema geral, indo voltando entre Cortázar e o nosso ciclo de

cultura (CÂNDIDO, 1973, p. 9-10).

Divisando que O jogo da amarelinha parece ter “reaprendido a voracidade das

origens”, Arrigucci (1973, p. 289) associa o romance de Cortázar com a tradição

humorística do Quixote, sobretudo, no que se refere à técnica cervantina da mescla de

gêneros literários, que compõe o conjunto romanesco do livro do século XVII, como “o

marco inicial das violações possíveis, o primeiro grande romance, que já é também o

primeiro anti-romance” (1973, p. 289). Para Arrigucci, o Quixote de Cervantes, como

obra paradigmática, é um fecundo ponto inicial para analisar O jogo: “Rayuela [...]

herdou, com efeito, a contundência crítica e autocrítica, a virulência humorística da

tradição hispânica, a que nega ou parodia a tradição: a pança pantagruélica do Dom

Page 144: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

144

Quixote, [...]”(1973, p. 289). O teórico brasileiro pontua, ainda, uma peculiaridade do

romance de Cortázar:

Aqui não importa sobretudo o que se nega e o que se busca a partir da

negação: Rayuela é uma narrativa que projeta ser e fundamenta esse projeto –

[...] – na desmontagem irônico-crítica da própria narrativa. [...]. Já não é

preciso insistir no panorama, para se dar uma ideia da radicalidade de

Rayuela no conjunto da produção literária contemporânea; é suficiente

lembrar que, no âmbito hispano-americano, nem a obra de Borges chegou a

um tal extremo de consciência na liquidação de fórmulas literárias

(ARRIGUCCI, 1973, p. 288-289).

O crítico argentino Jaime Alazraki também antevê uma aproximação entre o

Quixote de Cervantes e O jogo da amarelinha de Cortázar: «Con Rayuela tenemos los

latinoamericanos lo que el Quijote había sido para España en el siglo XVII»

(ALAZRAKI, 1994, p. 179). A enunciação de Alazraki está correlacionada com a

concepção que o escritor norte-americano Courtlandt Dixon Barnes Bryan tem do

romance cortazariano; de que se trata da mais poderosa enciclopédia de emoções e

visões que já havia sido produzida pela geração internacional de escritores do pós-

guerra (BRYAN apud ALAZRAKI , 1994, p. 179). Em seu artigo «Rayuela», de 1994, (10

anos após a morte de Cortázar), Jaime Alazraki assinala que o tema do romance é

também o tema de grande parte da literatura contemporânea, que estava preocupada

com o naufrágio cultural e o ‘extravio’ do homem:

Rayuela no es la búsqueda de un modelo político, cultural o social, sino la

articulación de una nostalgia por esa inocencia primera en que el hombre

vivió conciliado con el mundo. Pero para tocar esa armonía primordial

Rayuela desanda todos los caminos en cuyo curso se ha formado el hombre

occidental tal como hoy lo conocemos y en cuyo curso ha perdido su

dirección originaria. Mucha de la literatura de este siglo traza el mapa de

ese extravío o comunica el grito desgarrado del hombre perdido en la selva

de sus propias fabricaciones. Basta pensar en Camus, Musil o Beckett para

comprobar de inmediato que la desnaturalización y alienación del hombre

moderno es la preocupación dominante de un buen segmento de la ficción

contemporánea. […]. Rayuela no es novela argentina en lo que Argentina

tiene de accidental y efímero; lo es en esa dimensión intrínseca desde la cual

todo argentino, que piensa, se reconoce. […], lo que parecía europeizante en

Cortázar es lo europeo, la influencia europea que tiene Buenos Aires (p. 175-

176)

Também em 1994, o crítico Saúl Yurkievich publicou o livro intitulado Julio

Cortázar: mundo y modos (mencionado no capítulo 1), no qual afirma que a clave

Page 145: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

145

central d’O jogo está fundamentada em uma aspiração poética. Segundo Yurkievich, a

função narrativa consiste bem mais no fomento para a celebração de ápices poéticos,

revelados pela composição contrastiva e pela dissonância entre discurso prosaico e

arrebatamento lírico, do que no relato mesmo da história (YURKIEVICH, 2004, p. 196).

A técnica de collage do romance, apostada nesse entrelace da linguagem cotidiana e

usual com a poética, tem aí o seu auge, tornando-se referência literária para narradores

hispano-americanos:

Rayuela consuma la aclimatación del collage a la narrativa en lengua

española. Nutrida es la lista de los narradores hispanoamericanos

tributarios de este modelo; ella crece sin cesar. […]. El collage pone en

evidencia la verdad íntima de todo lenguaje: la disparidad y la rivalidad

básicas. […]. El collage da pleno pie al placer de manejar simultáneamente

toda laya de fuentes, citas, inyecciones y contaminaciones (p. 143-144).

O escritor e crítico Carlos Fuentes, no ensaio «Julio Cortázar y la sonrisa de

Erasmo» (2011) afirmou que O jogo é um convite à recreação da linguagem da

modernidade da América espanhola. Fuentes considerou, ainda, que «Julio Cortázar y

Rayuela colocan a la novela hispanoamericana en el umbral mismo de la novela

potencial: la novela del por venir de un mundo culturalmente insatisfecho y diverso»

(FUENTES, 2011, p. 222). Beatriz Sarlo, crítica argentina, escreveu que o romance

passou a ser o livro esperado por todos na década de sessenta do século XX,

convertendo-se, assim, «en la novela que todos reconocieron como el experimento

narrativo que ponía la literatura latinoamericana a la altura de los tiempos» (2007, p.

239). Sarlo observou, ainda, que o romance foi, de certa forma, oportuno, porque estava

em consonância com os eventos histórico-sociais do momento:

Rayuela pasó a ser el libro esperado por todo el mundo. Conectaba

perfectamente con el aire de los tiempos: liberación sexual, refutación de la

autoridad, incluso, como poco después los Beatles, algo de orientalismo.

(…). Provocó, en pocos años y hasta hoy, verdaderas montañas de artículos,

ensayos, tesis, polémicas. Adorada por el público y respetada por los

escritores, fue traducida en casi todo el mundo. Forma parte del primer

contingente de libros que inicia el proceso de internacionalización de la

literatura latinoamericana (p. 239).

O jogo da amarelinha, então, é um livro de vultoso relevo da literatura hispano-

americana, que em 2013 completou cinquenta anos de existência influente. O crítico e

tradutor brasileiro Ari Roitman prefacia a edição especial 50 anos de publicação do

Page 146: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

146

romance, pela editora Civilização Brasileira. Roitman salienta, entre outros temas

discutidos, que a gênese do livro é própria da improvisação criativa do escritor

argentino, lembrando a declaração de Cortázar de que havia começado a escrever algo

que lhe parecia inicialmente um conto, mas que ao mesmo tempo era muito extenso

para o gênero64

. Para o crítico brasileiro, não há dúvida de que “os apreciadores de bons

livros” agradecem a Julio Cortázar pela escritura do romance, pois que O jogo é um

livro que seguirá eternamente marcando gerações:

Há livros que marcam a sua geração. Há livros que se tornam marca dessa

geração aos olhos das seguintes. E há livros que nascem para ser eternos.

Este, como poucos, pertence às três categorias. Publicado nos já míticos anos

60, O jogo da amarelinha teve imediatamente uma recepção extraordinária

nas mais variadas línguas e latitudes. Vivia-se um tempo de rupturas. Na

política, nas artes, nos costumes, por toda parte o novo forçava passagem

para substituir ao velho, subvertendo os parâmetros civilizatórios vigentes. E

por toda parte este livro capturou, com sua ousadia formal, com seus

personagens inesquecíveis, com sua visão de mundo complexa e sensível, a

atenção de multidões de leitores, principalmente de jovens leitores. [...].

Percorrer as páginas de O jogo da amarelinha é penetrar num caleidoscópio

verbal minuciosamente inventado, elegantemente construído, [...].

Empreender sua leitura – [...] – é uma experiência, mais que literária,

existencial (ROITMAN, 2013, p. 5-9).

A atmosfera de comemoração de «Rayuela 50 años» expandiu-se à celebração

da data simbólica do aniversário de nascimento de Julio Cortázar, que completaria cem

anos se estivesse vivo. Algumas manchetes em periódicos vinculados na web haviam

anunciado desde 2013 que a Argentina (assim como outros dois países) celebraria, em

2014, «El año Cortázar65

»:

64

Ver PREGO, Omar. Julio Cortázar: la fascinación de las palabras. Montevideo: Trilce, 1990. Pp. 151-

153: «En realidad, Rayuela es un libro cuya escritura no respondió a ningún plan. […]. Los personajes

estaban curiosamente muy definidos y el personaje principal de eso que yo pensé que iba a desembocar

en un cuento,se llamaba sin ninguna vacilación Horacio Oliveira y era alguien de quien yo tenía la

impresión de conocer desde muy adentro». 65

25 de junio de 2013 - Año Cortázar 2014: Cien años con Julio: La Secretaría de Cultura de la

Presidencia de la Nación, la Televisión Pública, el Museo Nacional de Bellas Artes, la Biblioteca

Nacional, el Museo del Libro y de la Lengua, y el Municipio de Chivilcoy invitan al lanzamiento del Año

Cortázar 2014, que se realizará como parte de la inauguración de la muestra "Rayuela. 50 años". La cita

es el viernes 28 de junio de 2013 a las 17.30, en el hall central de la Televisión Pública (Av. Figueroa

Alcorta 2977, Ciudad de Buenos Aires). En el acto, (…), se anunciarán una serie de actividades a

realizarse a propósito del año homenaje: exposiciones de fotografías, jornadas internacionales de

literatura, un concurso de guiones y videojuegos, la edición de un libro de historietas, y la inauguración

de un centro cultural en Chivilcoy, entre otras propuestas. (…). La exposición cuenta con curaduría y

diseño de la Casa Nacional del Bicentenario, de la Secretaría de Cultura de la Presidencia de la Nación,

Page 147: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

147

El 2014 será sinónimo de Cortázar. Este año se celebrarán los 100 de su

nacimiento, ocurrido el 26 de agosto de 1914, con exposiciones, encuentros y

libros en Argentina, México y Francia. Es un eco aumentado del año que

recién pasó, cuando se celebraron los 50 años de Rayuela, su más famosa y

atrevida novela. En 2014 hay incluso otra fecha en juego: Cortázar murió el

14 de febrero de 198466

, hace casi 40 años67

.

Traços adjacentes entre as poéticas de Borges e Cortázar

Jaime Alazraki, crítico que organizou a Obra Crítica v.2, de Cortázar, publicou

o livro Hacia Cortázar: aproximaciones a su obra, em 1994, pela Editorial Anthropos,

de Barcelona. No livro, Alazraki dedica dois capítulos que discutem aproximações e

distanciamentos entre as obras de Borges e Cortázar: «Dos soluciones al tema del

compadre en Borges y Cortázar» e «Tres formas del ensayo contemporáneo: Borges,

Paz, Cortázar».

No artigo que aborda o tema do compadre, o crítico observa que, a partir do

código de honra que rege a categoria «del tipo compadrito argentino de barrio», as

distâncias e variantes de aproximação do relato de Cortázar em relação ao de Borges se

producción de la Televisión Pública y apoyo de la Fundación Internacional Argentina (FIA).El Año

Cortázar 2014 está organizado por la Secretaría de Cultura de la Presidencia de la Nación, la Televisión

Pública, el Museo Nacional de Bellas Artes, la Biblioteca Nacional, el Museo del Libro y de la Lengua, y

el Municipio de Chivilcoy. Así, el Estado nacional rinde homenaje a uno de los más célebres escritores

argentinos a un siglo de su nacimiento y a cincuenta años de la publicación de una de las obras

fundamentales de la literatura universal. Disponível em http://www.cultura.gob.ar/noticias/ano-cortazar-

2014-cien-anos-con-julio/. Acesso em 20 de janeiro de 2014. Ver também: EL PAÍS – CULTURA - 8

DE ENERO DE 2014 “2014, el año de Octavio Paz y Julio Cortázar - En 2014 se conmemoran los

centenarios de nacimiento de dos de los escritores hispanohablantes más importantes del siglo XX

Biografías, libros sobre sus obras y recuperaciones de títulos, más múltiples homenajes especialmente en

México y Argentina También son los centenarios de Bioy Casares y Nicanor Parra, y 50 años de la

muerte de Luis Martín-Santos”.

Disponível em http://cultura.elpais.com/cultura/2014/01/05/actualidad/1388908964_340104.html. Acesso

em 20 de janeiro de 2014. 66

A informação da data da morte de Cortázar está equivocada. Ele faleceu em 12 de fevereiro de 1984.

Ver PREGO, Omar. Julio Cortázar: la fascinación de las palabras. Montevideo: Trilce, 1990. p. 11:

“Murió el domingo 12 de febrero, poco después del mediodía y lo enterramos el martes 14 en el

cementerio de Montparnasse a las once y media de la mañana, en la tumba de su mujer, Carol Dunlop,

muerta en noviembre de 1982”. 67

Ver Roberto Careaga C. (15/01/2014) “México, Francia y Argentina celebrarán los 100 años de

Cortázar Con libros y exposiciones recordarán al autor de Rayuela, nacido en 1914.” Disponível em

http://www.latercera.com/noticia/cultura/2014/01/1453-560832-9-mexico-francia-y-argentina-celebraran-

los-100-anos-de-cortazar.shtml. Acesso em 20 de janeiro de 2014.

Page 148: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

148

mostram evidentes. Para Alazraki, a eleição do mesmo tema por dois escritores oferece

ao crítico a hipótese mais propícia para estabelecer a originalidade de um diante do

outro: «Es aquí donde comienza a definirse un estilo que en cada uno de los dos cuentos

ofrece un microcosmo de la estética de sus autores» (p. 76). O conto de Borges

analisado foi «Hombre de la esquina rosada», do livro Historia de la infamia universal

(1935), e o de Cortázar foi «El móvil», do livro Final de fuego (1956). Em ambos os

relatos, os narradores, em primeira pessoa, propõem-se a reparar uma injustiça, assim

como insistem no caráter inverossímil da narração, comparando-a com a literatura. Ou

seja, os escritores enfatizam a condição ficcional dos fatos: «Parece cuento» (Borges);

«y háganse de cuenta que están leyendo el conde de montecristo» (Cortázar)

(ALAZRAKI, 1994, p. 77).

O conto de Borges difunde o código da coragem que rege o destino do

compadre, pois o escritor entende que a figura do compadrito argentino se acerca a um

mito em que expressa «la dura y ciega religión del coraje, de estar listo para matar o

morir» (BORGES, 1965, p. 155). E, assim, tendo como princípio esse código da

coragem, Borges outorga forma literária a seu conto, recriando a fala dos compadres de

1895 na produção oral de uma textura linguística dessa época, mesclada a seu estilo de

escritor. A essa reprodução da linguagem dos compadres da época, na qual acontece a

história no conto, Alazraki entende que é semelhante ao pastiche artificial que José

Hernández usou na criação do Martín Fierro (1872), recurso criticado pelo próprio

Borges no estudo que fez da obra.

O argumento do tema também segue o código da conduta do compadre quando a

narrativa apresenta a tensão em dois conflitos: o primeiro é a humilhação do bairro

quando um compadre se acovarda diante de um forasteiro; o segundo é gerado pelo

primeiro quando o sentimento de vingança cresce. A punhalada já não deverá ser

desferida exatamente pelo covarde, para que este se repare de uma afronta pessoal, mas

sim poderá ser desfraldada por qualquer outro punhal, motivado pelo escárnio de todo o

bairro. O insulto a um homem se torna um insulto coletivo, num efeito de causalidade

bairrista.

No conto de Cortázar, porém, o compadre assume características mais

contemporâneas, em que o compadrito argentino não é mais uma figura mítica que se

encontra engessada a um código de honra coletivo: «El personaje de Cortázar tiene

Page 149: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

149

mucho de compadre, pero tiene también mucho de un tipo porteño muy actual para

quien el país no se reduce a la ‘villa’ o ‘barrio’» (ALAZRAKI, 1994, p. 86). Em vez de

usar os jargões exclusivos dos compadres, Cortázar trabalha com uma linguagem que

está mais próxima dos argentinos em geral: «Las referencias al cine indican que estamos

ya en una Argentina más contemporánea» (p. 86).

Neste caso, o escritor buscou cinzelar o tom da narrativa mais adequado à

intenção que almejava para o tratamento do tema. O argumento do conto de Cortázar68

organiza-se em torno de dois triângulos amorosos: o primeiro, ocorrido há vinte anos,

quando um amigo do narrador (homodiegético) foi assassinado com um tiro pelas

costas, provavelmente por ter se envolvido com a mulher de outro homem; o segundo

triângulo ocorre no tempo presente da narração, em que o narrador pede auxílio à

mulher com quem está envolvido para descobrir se a identidade do assassino do seu

amigo (no passado) corresponde ao homem de quem ele (agora) suspeita. Mas ocorre de

esta mulher se apaixonar justamente pelo suspeito.

A técnica que Cortázar utiliza na narrativa é a de alusões, e o narrador não tem

certeza se os fatos ocorrem exatamente daquela maneira. Então, somente quando se

forma o segundo triângulo amoroso, o narrador percebe que a morte do amigo pode não

ter sido totalmente injusta. O envolvimento da mulher do segundo triângulo com o

suspeito pretende desfazer as suspeitas do narrador, que continua desconfiado.

Entretanto, comprova-se que era outro o assassino. O narrador se encontra, então, num

dilema: sente-se traído e deseja matar o homem que lhe roubou a mulher, mas precisa

vingar o amigo morto, isto é, matar outro homem, que não aquele que lhe roubou a

mulher. Contudo, ele se vê agora no lugar do homem traído, coincidindo com o lugar do

assassino de seu amigo.

Dessa forma, matar o assassino de seu amigo implicaria aceitar a conduta do

homem que lhe tirou a mulher. E o contrário, matar o velhaco que lhe tirou a mulher

seria aceitar a conduta do assassino de seu amigo. A opção do narrador é por matar o

homem envolvido em seu triângulo amoroso, e não no do seu amigo. O narrador

escolhe vingar a si, em vez de vingar o amigo. Cortázar, então, desarma o argumento do

conto de Borges, no qual o código de honra do compadre prevalece, substituindo-o por

68

Percebo aqui a veracidade da previsão de Borges ao dizer que corremos o risco de suprimir algo

importante ao tentarmos resumir o argumento dos textos de Cortázar.

Page 150: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

150

outra ordem, embora seu ponto de partida tenha sido aquele código. Por isso, a

diferença da unidade temporal nos dois contos é importante, pois ela determina o perfil

dos compadres. Quando o narrador opta pela sua vingança pessoal, abandonando o

sentimento de ultraje coletivo, do “um por todos e todos por um ‘do bairro’”, por

considerar mais importante seu próprio ultraje, Julio Cortázar imprime o câmbio do

coletivo pelo particular, do todo pelo indivíduo, desbancando o ideal bairrista que

conformava a figura do compadrito:

El cuento de Cortázar parte también de la aceptación de ese código, para

mostrarnos luego, mediante un inesperado vuelco, una doble perspectiva

desde la cual el código del compadre, como todo código, se relativiza

subordinando-se a las necesidades más próximas a nuestro ego (ALAZRAKI,

1994, p. 83).

O mais importante que Alazraki discute em seu artigo é que, devido à

perspectiva do argumento, o tratamento do tema é configurado por decisões estéticas

que conformam as poéticas, tanto a de Borges como a de Cortázar. O crítico pontuou

que, no conto de Borges, o enigma se reduz a identificar o forasteiro que assassinou o

compadre covarde; já no conto de Cortázar, a incógnita é dupla e opera por inversão de

valores. É manifesto que Alazraki compara os procedimentos estéticos dos dois

escritores, na observância da originalidade de um diante do outro, como ele mesmo

havia dito, e conclui que a narrativa cortazariana promoveu inovações significativas

diante da narrativa borgiana.

Saúl Yurkievich69

é outro estudioso da obra de Cortázar que confrontou as

poéticas dos dois autores no ensaio «Borges\ Cortázar: mundos y modos de la ficción

fantástica» (2004). O crítico começa situando o espaço que melhor se ajusta à literatura

fantástica, que não seria às margens do Rio da Prata, como se pensou por algum tempo.

Ao contrário, a literatura fantástica se configuraria como um gênero urbano e

cosmopolita: «Los artífices de construcciones imaginarias proliferan allí donde la

conexión con lo metropolitano es mayor y más activa, en las capitales vinculadas al

intercambio internacional» (YURKIEVICH, 2004, p. 36). A exibição de um mundo

bonaerense ficcional, na apresentação de espaços mitificados, como o almacen, os

arrabales, o suburbio e a periferia, encontrou, segundo Yurkievich, nas produções

literárias de Borges e de Cortázar, sua mais fecunda expressão.

69

Súl Yurkievich organizou a Obra Crítica, V. 1, de Julio Cortázar, responsabilizando-se pela edição do

ensaio “Teoria do túnel” (1947).

Page 151: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

151

Entretanto os dois se situam em posições opostas: o fantástico de Borges é

ecumênico, cuja fonte é «La Gran Memoria» geral da espécie; em Cortázar, o fantástico

é psicológico e opera como irrupção de forças estranhas na ordem de efetuações

admitidas como reais (YURKIEVICH, 2004, p. 37). Essa diferença basilar na

concepção do fantástico de um e do outro escritor é crucial na conformação do jogo

narrativo em que vão se estruturar seus relatos. Yurkievich chama a atenção para uma

questão que nos interessa: os dois escritores, apesar de atuarem com sistemas

simbólicos diferentes, convergem quando apresentam o fantástico, noticiando a

precariedade e a fragilidade do nosso fulcro mental sobre a realidade.

Se Borges trabalha com a esfera simbólica, “apelando” (palavra usada por

Yurkievich) para as imagens tradicionais das metáforas cunhadas pela imaginação

ancestral, pressupondo uma correlação do que é humano com o que é natural, o campo

simbólico de Cortázar atua a partir do “real imediato” (expressão de Yurkievich). O

ambiente, os personagens e a linguagem são índices de atualidade que «prolongan en el

relato el hábitat del lector» (p. 39). Em geral, os protagonistas são uma espécie de alter

ego do emissor e do receptor do texto, em que o autor se remete a sua própria

personalidade para personificar a de seus personagens:

Cortázar utiliza el sistema figurativo del realismo psicológico (...), pone en

acción todos los recursos de acercamiento (caracterización casi costumbrista,

empeño en lo típico, coloquialismo social y geográfico a los actores,

introspección) para establecer de inmediato la mayor complicidad con el

lector. (…). Cortázar sitúa, singulariza, individualiza a sus personajes,

abunda en la indicación psicológica para que el retrato imponga una

presencia más vibrante (…), una encarnación que parece prolongarse más allá

de la letra, (…). Sus personajes son nuestros semejantes, prójimo familiar

(YURKIEVICH, 2004, p. 40).

Borges, ao contrário, não particulariza nem individualiza suas personagens,

relativiza-as quando anula suas identidades através de desdobramentos de gerações (“O

Sul”), multiplicações de destinos que se interconectam (“A morte e a bússola”) ou

reversibilidades (“O tema do traidor e do herói”). Dessa forma, considera o eu como

simulacro em que toda marca individual distintiva é trivial e fortuita, inclusive,

parodiando uma referência do escritor argentino Yurkievich, esclarece: «Todo hombre

es otro (todo hombre, en el momento de leer a Jorge Luis Borges, es Jorge Luis Borges),

todo hombre es todos los hombres, que es lo mismo que decir ninguno»

(YURKIEVICH, 2004, p. 42). Borges, então, na preferência do estilo clássico, procura

apresentar uma visão arcaizante mesmo quando o relato acontece num ambiente

Page 152: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

152

contemporâneo (“O outro”, “Pierre Menard, autor do Quixote”). Assim, o método de

Borges consiste em deslocar o leitor da sua ambiência para a da atmosfera do relato.

Saúl Yurkievich depreende que atravessar o gênero fantástico de Borges a

Cortázar é ser transladado do teológico ao teratológico, ou seja, passar da ordem do

sobrenatural para o campo das deformações orgânicas. O fantástico para Cortázar seria

parte do humanismo libertador, um agente de renovação; enquanto, para Borges, o

fantástico residiria no cruzamento entre o mito e a razão. Em coerência com Yurkievich,

o próprio Julio Cortázar, no ensaio “O estado atual da narrativa na América Hispânica”

(1976), noticia a diferença singular entre o relato de Borges “O milagre secreto”

(Ficções), que “se baseia mais uma vez na cristalização racional e erudita de algo que

outros só captaram em seu estado inculto”(CORTÁZAR, 2001, p. 94), e seu o conto “O

perseguidor” (Las armas secretas, 1959), que evidencia a pessoalidade da marca autoral

nas narrativas, perspectiva que Borges procurou dissimuladamente rechaçar:

O relato de Borges poderia pretender um simples artifício literário. Já

destaquei a frequente presença deste tema (introdução de um tempo

diferente) na literatura e nos sonhos e até o incluí numa passagem do meu

relato “O perseguidor”; mas no meu caso não tenho motivo algum para

obscurecer a autenticidade da minha experiência pessoal e criar a partir dela

uma engenhosa superestrutura de ficção (CORTÁZAR, 2001, p. 94).

Contudo, Davi Arrigucci Jr. destacou mais aproximações do que

distanciamentos entre as poéticas de Borges e de Cortázar, não apenas relacionadas ao

gênero fantástico, mas perpassando toda a produção literária dos escritores. Para

Arrigucci, a literatura tanto a de Borges como a de Cortázar revelam-se, sobretudo,

como um jogo. E partindo desse princípio, o crítico brasileiro elaborou sua discussão,

confrontando os projetos literários de Borges e de Cortázar, patenteando-os em

“Convergências, divergências: o círculo e a espiral”, capítulo do livro O escorpião

encalacrado: a poética da destruição em Julio Cortázar, de 1973. Arrigucci ressalta

que ambos os projetos confluem na simbiose de crítica e ficção no próprio âmbito da

ficção e acabam tematizando a literatura em si mesma: “Convergem a linguagem num

instrumento de indagação e crítica de si mesma e da própria realidade, tornando o

discurso literário também um registro de perplexidades metafísicas” (p. 167).

Com isso, Arrigucci lembra que a forma labiríntica da arte dentro da arte, da

obra dentro da obra, conforma a estética dos escritores como tema e método narrativos

centrais, remetendo-os a Cervantes, a Poe, a Flaubert, a Mallarmé e a Valéry, na

Page 153: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

153

tendência de a literatura ter aguda consciência de si mesma, apresentando a denúncia de

“suas próprias convenções, explicitar as regras do jogo, indagando acerca de seu próprio

ser” (p. 168). Para Davi Arrigucci, a visão de Octavio Paz70

sobre a obra de Borges e a

de Cortázar é precisa: a obra de Borges é edificada sobre o tema vertiginoso da ausência

de obra; a obra de Cortázar, como edificação semelhante, leva adiante o jogo de

espelhos.

É por este entendimento dos projetos literários dos dois escritores que

entrevemos a ponte ficcional borgiana “Pierre Menard, autor do Quixote”, unindo o

Quixote, de Cervantes, ao O jogo da amarelinha, de Cortázar. Arrigucci ressalta, ainda,

que a literatura de Borges é uma busca circular que começa e acaba no mito, onde “tudo

pode entrar, de fato, no círculo lúdico do estilo”; e que a literatura de Cortázar é também

invenção lúdica, mas em busca de espiral, numa “expansão constante, em que se arrisca

sempre” (p. 168). Dessa forma, as bifurcações dos campos simbólicos das poéticas de

Julio Cortázar (real imediato71

) e de Jorge Luis Borges (mito) partem de um mesmo

tronco (o jogo lúdico da invenção), cujo sustentáculo é o tripé ficção, realidade e obra.

Embora nossa discussão não privilegie nem objetive a comparação entre os dois

escritores, na inferência da superioridade de um em relação ao outro, faz-se pertinente,

de alguma maneira, a forma de análise dos críticos Alazraki e Yurkievich. Os artigos

nos permitem compreender melhor e reconhecer com mais precisão os percursos que

aproximam Cortázar a Borges, na discussão fecunda de suas estéticas, que

determinaram e direcionaram os rumos da literatura argentina e, de certa forma, os

rumos da literatura mundial. Estamos mais próximos, porém, da visão crítica de Davi

Arrigucci Jr., que visualiza pontos convergentes e divergentes da literatura de Cortázar

com a poética de Borges, sem, no entanto, sinalizar a superioridade ou a originalidade

de um sobre o outro. O traçado que fazemos da produção literária e dos procedimentos

estéticos dos dois escritores nos proporciona maior solidez em formular a nossa tese de

que em O jogo da amarelinha, de Julio Cortázar, podemos encontrar o segundo Pierre

Menard, evocado pelo narrador do conto de Borges.

70

Ver PAZ, Octavio. El arco y la lírica. México: Fondo de Cultura Económica. 1967 apud ARRIGUCCI

JR., Davi. O escorpião encalacrado: a poética da destruição em Julio Cortázar. São Paulo:

Perspectiva, 1973. p. 168. 71

Expressão de Yurkievich que indica a interação da obra de Cortázar com o ambiente real e imediato do

leitor. (Cf. YURKIEVICH, Saúl. Julio Cortázar: mundos y modos. Buenos Aires: Edhasa, 2004).

Page 154: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

154

É interessante, pois, delinear a ossatura do método edificado por esse segundo

Pierre Menard, procurando identificar até que ponto ele abrangeu e acatou o conselho

do amigo “autêntico” de Menard, em inverter o trabalho de escritura do Quixote, do

escritor francês do século XX. Vale salientar que Julio Cortázar registrou não ter sido

um leitor primoroso da literatura espanhola:

Cuando me hablan de eso siempre tengo vergüenza porque mi ignorancia de

la literatura española es realmente enciclopédica. Conozco algunos clásicos,

pero estoy lejos de haber leído, de literatura española, lo que he leído de

literatura francesa y anglosajona. (...). En la Argentina había elegido a

Borges. Pero en el momento en que Borges era el maestro del rigor

estilístico, usted abría La Nación o La Prensa y se encontraba con esos

chorros literarios de facundia española, con las interminables páginas de

Azorín y de Julián Marías, y de toda esa gente, que llenaba y llenaba

cuartillas, sin que supiera bien para qué (GONZÁLES BERMEJO, 1978, p.

111-112).

No capítulo 34 de O jogo da amarelinha, por exemplo, Cortázar insere

fragmentos de Lo prohibido, de Benito Pérez Galdós (1885), para criticar a escolha de

leitura da Maga, uma das personagens centrais do enredo: «Y las cosas que lee, una

novela, mal escrita, para colmo una edición infecta, uno se pregunta cómo puede

interesarle algo así” (CORTÁZAR, 1995, p. 216). A leitura de Cortázar mais fecunda de

autores espanhóis, que reverberou, de alguma forma, em sua literatura, encontra-se na

Generación del 27» (ALAZRAKI, 1994, p. 348). E ainda que não tenhamos encontrado

de fato registro de sua leitura do Quixote,72

Julio Cortázar seguiu de perto, como vimos,

a literatura de Borges, procurando as pistas da poética do escritor modelo (“Diário para

um conto”) para revitalizá-las e renová-las. Na tarefa quase fatal, como um destino

(propriedade borgiana), Cortázar aprimorara-se em espargir sua estátua consagrada para

que seguisse neste estágio de cânone, potencializando as palavras do seu escritor

exemplar, Borges: “eu quero morrer definitivamente”. Além disso, Cortázar almejara,

ele mesmo, tornar-se estátua, para dar continuidade à malha literária, a fim de que fosse

possível que um terceiro Pierre Menard viesse, a posteriori, reconstituir sua escritura:

72

Em Teoria do túnel, Cortázar cita o Quixote: “A passagem do romance narrativo ao sentimental prova

que, paralelamente ao decurso histórico das atitudes filosóficas, a literatura romanesca comporta uma

etapa prévia de interpretação e enunciação da realidade; aos eleatas corresponde Homero; a Tomás de

Aquino, Dante; a Descartes, Cervantes e Mme. de La Fayette; a Leibniz, Voltaire e Prévost. O acento

literário nessa primeira etapa equivale ao da filosofia em sua etapa metafísica, (...). Mesmo quando

expõe indivíduos (não há dúvida de que Amadis, Dom Quixote, Robinson, Manon ou Pamela são

tipos individuais não-intercambiáveis), o romancista só percorre os grandes músculos de sua

psicologia...”. Ver: CORTÁZAR, Julio. Teoria do túnel. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.

p. 52. (Obra Crítica, v.1)

Page 155: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

155

La mejor calidad de mis antepasados es la de estar muertos; espero modesta

pero orgullosamente el momento de heredarla. Tengo amigos que no dejarán

de hacerme una estatua en la que me representarán tirado boca abajo en el

acto de asomarme a un charco con ranitas auténticas. Echando una moneda

en una ranura se me verá escupir en el agua, y las ranitas se agitarán

alborozadas y croarán durante un minuto y medio, tiempo suficiente para que

la estatua pierda todo interés (CORTÁZAR, 1995, p. 493).

Cortázar, então, reanima Borges quando pereniza sua estátua em sua literatura,

fazendo com que as palavras do escritor prevaleçam: “Mi sepultura será el aire

insondable”. Borges, o minotauro cortazariano, permanece não mais somente através de

seus textos, de suas ficções, mas também na tessitura do texto de outro, em que o jogo

narrativo seja invertido, burlado, modificado, transfigurado. E esse outro é Julio

Cortázar, que, à imagem de Borges, vislumbrou o seu Minotauro:

Desde mi libertad final y ubicua, mi laberinto diminuto y terrible en cada

corazón de hombre, (...) No quiero llantos, no quiero imágenes. Solamente el

olvido. […]. Así quiero acceder al sueño de los hombres, su cielo secreto y

sus estrellas remotas, ésas que se invocan cuando el alba y el destino están en

juego (CORTÁZAR, 2004, p. 75).

Vale lembrar que Borges seguiu à risca o método de Menard em difundir, muitas

vezes, o inverso daquilo que pensava, isto é, «(...) la casi divina modestia de Pierre

Menard: su hábito resignado o irónico de propagar ideas que eran el estricto reverso de

las preferidas por él» (BORGES, 2011, p. 742). Dessa forma, devemos sempre

desconfiar de seus vaticínios, de sua imagem construidamente ficcional, assim como

devemos também sempre olhar de soslaio para as perspectivas dos temas no conteúdo

elaborado em suas ficções. Desconfiar, suspeitar e duvidar, talvez sim, porque esse

também é o exercício da crítica ao questionar e discutir a forma de construção literárias

dos escritores. Contudo, jamais se deve desconsiderar qualquer declaração borgiana,

pois, assim, o crítico correrá o risco de ingressar num labirinto invertido, guiado pelas

palavras do narrador.

Há também outras diversas coincidências entre as literaturas de Borges e

Cortázar. O duplo, por exemplo, é um tema constante em seus textos, e ambos

reconhecem a influência de Edgar Allan Poe. Assim como coincidem quando

conceituam a literatura: “(Não em vão rememoro essas inconcebíveis analogias, alguma

relação têm com o Aleph.) Os deuses não me negariam, talvez, o achado de uma

imagem equivalente, mas este informe ficaria contaminado de literatura, de falsidade”

Page 156: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

156

(BORGES, 1998, p. 695); «Nuestra verdad posible tiene que ser invención, es decir,

literatura...» (CORTÁZAR, 1995, p. 414).

Conclusão

Partindo dessas considerações, entrevemos que o conto “Pierre Menard, autor do

Quixote”, de Borges vislumbra mostrar-se um excelente itinerário para Cortázar na

leituraescritura do Quixote de Cervantes, sendo essa leitura marcada pela busca dos

princípios teóricos que conformam a obra clássica espanhola. Jorge Luis Borges não foi

um escritor de romance, como dito, mas engendrou na literatura um autor ficcional do

romance, que inaugura o gênero como romance moderno. Pierre Menard, assim como a

emblemática fogueira de livros, descrita no Quixote de Cervantes, queimou os

manuscritos do Quixote que escreveu, não deixando, portanto, nenhum registro de sua

obra inconclusa.

É justamente nessa cena tão representativa na literatura universal – a incineração

dos livros – que percebemos a similaridade literária entre o Quixote de Cervantes, o

“Pierre Menard, autor do Quixote”, de Borges e a obra emblemática de Julio Cortázar,

O jogo da amarelinha. Cortázar, que escreveu o romance em Paris, cria o escritor

Morelli, que rabisca em papéis avulsos concepções diversas sobre o projeto do romance

novo, que é o próprio romance, pretendendo, dessa forma, dar uma nova configuração

ao gênero. Entretanto, assim como a personagem de Borges, Morelli não conclui seu

romance, pois opera com o método análogo à escrita do Quixote por Pierre Menard,

excluindo a comprovação dessa sua escritura na obra publicada:

Morelli había pensado una lista de acknowledgments que nunca llegó a

incorporar a su obra publicada. Dejó varios nombres: Jelly Roll Morton,

Robert Musil, Dasetz Teitaro Suzuki, Raymond Roussel, Kart Scwitters,

Vieira da Silva, Akutagawa, Antón Webern, Greta Garbo, José Lezama

Lima, Buñuel, Louis Armstrong, Borges, Michaux, Dino Buzzati, Max Ernst,

Pevsner, Gilgamesh (¿), Garcilaso, Arcimboldo, René Clair, Piero di Cosimo,

Wallace Stevens, Izak Dinesen. Los nombres de Rimbaud, Picasso, Chaplin,

Alban Berg y otros habían sido tachados con un trazo muy fino, como si

fueran demasiado obvios para citarlos. Pero todos debían serlo al fin y al

cabo, porque Morelli no se decidió a incluir la lista en ninguno de los

volúmenes (CORTÁZAR, 1995, p. 388).

Esse fragmento indica, a nosso ver, um traço da correlação entre as obras de

Cervantes, Borges e Cortázar, quando os escritores, através de suas personagens,

Page 157: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

157

elaboram um catálogo de autores canônicos73

que darão suporte e legitimarão a suas

novas escritas no cenário literário. Contudo, acreditamos que a grande interseção entre

as obras reside na figura do leitor. Se por um lado, o “Prólogo” da I parte da obra de

Cervantes abre o romance com uma dedicatória ao leitor, “Desocupado leitor”, a

matéria do conto de Borges tem o foco no leitor, que se torna autor do livro que lê,

enquanto O jogo da amarelinha, de Cortázar, inicia com o “Tabuleiro de Direção”,

oferecido ao leitor: «A su manera este libro es muchos libros, pero sobre todo es dos

libros. El lector queda invidado a eligir una de las dos posibilidades siguientes...»

(CORTÁZAR, 1995).

À maneira clássica, a figura do leitor pressupõe o objeto que o torna assim

classificado: o Livro. No poema “Um livro”, de História da noite (1977), Borges diz

que um livro contém, ou pode conter, tudo o que se pode imaginar – paixões, guerras,

aventuras, situações fantásticas... – mas esse livro dorme na estante até que um leitor o

abra, leia-o e o faça retornar à vida, inicialmente ofertada pelo autor: “Apenas uma coisa

entre as coisas\ mas também uma arma. (...)\ Encerra som e fúria e noite e escarlate (...)\

quem diria que contém o inferno (...)\ Esse tumulto silencioso dorme\ (...) dorme e

espera” (BORGES, 2000, p. 199). E, assim, como numa ação simultânea e recíproca,

esse leitor também se alimenta da vida nova do livro, que ele acabou de despertar.

Essa é a ideia do “Pierre Menard, autor do Quixote”, o leitor-autor “de uma

imagem anterior de um livro não escrito”. Como se fosse uma experiência onírica, na

qual o leitor perde a noção de quem ‘realmente’ o escreveu, se ele próprio – leitor – ou

outrem, mas que, pela aplicação da nova técnica da arte rudimentar da leitura, termina

sendo ele mesmo. Em Borges, esse outrem, o autor, perde a importância como aquele

que trouxe à luz o livro. A ideia do leitor-autor configura-se uma das mais significativas

concepções da poética borgiana: o desvanecimento da marca autoral. No conto “Pierre

Menard, autor do Quixote”, o tempo é um elemento fundamental. O que faz do Quixote

de Cervantes uma obra contemporânea no século XX é a sua, digamos, reanimação

através da leitura: a obra não é a mesma, porque o leitor do século XX não é o mesmo

leitor do século XVII.

73

Vale pensar no “Prólogo” da I parte do Quixote, em que Cervantes no jogo ficcional se coloca como

personagem. Pensar também no elenco da caterva de nomes na retificação, pelo narrador-crítico, ao

catálogo elaborado por Madame Henri Bachelier da obra visível de Pierre Menard.

Page 158: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

158

Em O jogo da amarelinha, Cortázar dilui o elemento ‘tempo’ no leitor e no

autor, uma vez que para Cortázar o livro não dorme na estante, como acredita Borges.

Para Cortázar, o livro é apenas um objeto, um suporte literário,74

porque a escritura deve

ser sinônima do homem e da vida, ou seja, a escritura deve ser constituída por

movimentos constantes e imprevisíveis e, por congruência, a leitura também. Santiago

Juan-Navarro, embasando-se no conceito de que a leitura se constitui num ‘ponto de

visão móvel’75

, mostra que o romance de Cortázar pertence ao gênero de obras que

exigem novas releituras, porque o leitor precisa voltar sempre aos capítulos já lidos para

entender melhor o que vem ou virá, extraindo o leitor da sua posição confortável, de

uma leitura linear e tranquila:

Cortázar en su novela exige un tipo de lector que no es compatible con el

consumidor pasivo de la novela tradicional, ese “lector-hembra” que el

propio Morelli define como el “tipo que no quiere problemas sino soluciones,

o falsos problemas ajenos que le permiten sufrir cómodamente sentado en su

sillón, sin comprometerse en el drama que también debería ser el suyo”

(JUAN-NAVARRO, 2011).

Juan-Navarro ressaltou, no seu artigo, que O jogo da amarelinha já fora

analisado pela perspectiva do conceito de Iser,76

relacionado-o ao fato de as próprias

personagens do romance lerem a narrativa no mesmo instante em que sua escrita está

sendo feita pelo autor Morelli; e nós, leitores do agora, digamos, reproduzimos essa

dinâmica ao ler o romance de Julio Cortázar. Esta estratégia de leitura e de escrita

configura a eliminação da hierarquia e da ordem lógica na operação, não mais, pois

primeiro alguém escreve, para depois alguém ler. Isso acontece porque Morelli não é

autor de um livro já acabado e escrito, ele escreve folhas avulsas sobre como escreveria

um romance e, em outras folhas avulsas, o que estaria contido nesse romance: notas sem

explicação, listas de autores aleatórios, recortes de jornal, citações, bulas de remédio,

enfim um mosaico incongruente de coisas, um caleidoscópio.

Apenas na aparência, uma ordem hierárquica e lógica da operação

leituraescritura está presente no romance de Cervantes. Na primeira parte do livro,

74

“O Livro como objeto estético parece ficar às costas das consequências extraliterárias da obra”. Ver:

CORTÁZAR, Julio. “A crise do culto do Livro”. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998. p. 29.

(Obra Crítica, v.1) 75

Ver: ISER, Wolfgang. O ato da leitura: uma teoria do efeito estético – V. 2. São Paulo: Ed. 34, 1999.

(Coleção Teoria). 76

“La conexión entre una novela de Cortázar y la fenomenología de Iser ha sido establecida por Theo

D'Haen en su ensayo comparativo Text to Reader (1983)”. Cf: JUAN-NAVARRO, Santiago. Ibidem.

p. 13.

Page 159: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

159

Dom Quixote manifesta seu desejo de ver escritas as façanhas de suas aventuras com

Sancho Pança; na segunda parte do livro, Dom Quixote se depara com essa escrita,

desejo realizado. Mas, como veremos mais adiante, o jogo narrativo se configura mais

complexo. Edward Riley observa que a história do cavaleiro andante contada na

primeira parte se reverte, na segunda parte, em espécie de relato ditado pelo próprio

Dom Quixote.

No conto de Borges, podemos ver, também aparentemente, uma ordem lógica

hierárquica: Pierre Menard chega a desejar ser Cervantes e escrever o Quixote, mas, na

verdade, Pierre Menard passa por uma travessia de escritura na leitura do Quixote de

Cervantes. Primeiro, Menard deseja ser Cervantes, depois entende que o mais ‘difícil’ é

ele continuar sendo Pierre Menard e escrever o Quixote. Na verdade, é a sua única

opção: ser Pierre Menard e escrever o Quixote no século 20.

Na operação leituraescritura residem duas questões primordiais que perpassam

o Quixote (Cervantes), que é também matéria da poética borgiana, que Julio Cortázar

discute na narrativa de O jogo da amarelinha. A primeira questão é a relação entre o

tempo de escrita e o tempo de leitura (distanciamento temporal entre autor e leitor). A

segunda questão acontece na relação de distanciamento entre leitura e escritura, devido

ao status da marca autoral que as três obras imprimem. Essa é uma das questões

fundamentais que desenvolvemos na tese, porque é a partir da posição do autor que a

noção de leitor será deslocada e redimensionada.

Se, no conto de Borges, o leitor é autor da obra que lê; se no romance de

Cervantes, Dom Quixote torna-se personagem de histórias de cavalaria por imitar as

façanhas dos cavaleiros andantes lidas por ele nas madrugadas; e se em O jogo da

amarelinha, Horacio Oliveira existe, no momento em que Morelli o escreve, será

preciso, então, conhecer as direções que foram percorridas por Morelli, na escritura

inversa do Quixote, de Pierre Menard, diante de nossa suspeita de que Morelli venha a

ser o segundo Pierre Menard. Sendo o leitor a substância central, em torno da qual as

três narrativas em questão foram pensadas e construídas, expomos, então, as nossas

bases para a elaboração desta teoria. Procuraremos averiguar o alcance da tese que

acreditamos ser o “Pierre Menard, autor do Quixote”, uma ponte que une os extremos: o

Quixote ao O jogo da amarelinha.

Page 160: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

160

Referências

ALAZRAKI, Jaime. Hacia Cortázar: aproximaciones a su obra. Barcelona: Anthropos,

1994.

ARRIGUCCI JR., Davi. O escorpião encalacrado: a poética da destruição em Julio

Cortázar. São Paulo: Perspectiva, 1973.

BARRENECHEA, Ana María. «Rayuela, una búsqueda a partir de cero». Sur, Buenos

Aires, mayo-junio, nº 288, 1964, pp. 69-73.

BORGES, Jorge, Luis. «Magias parciales del Quijote». Otras inquisiones (1952).

Buenos Aires: Sudamericana, 2011. p. 49. (Obras Completas, v.2)

BORGES, Jorge Luis. «Tlön, Uqbar, Orbis Tertius». Ficciones (1944). Buenos Aires:

Emecé, 1989. p. 438. ( Obras Completas, v.1)

BORGES, Jorge Luis. «Pierre Menard, autor del Quijote». Ficciones (1944). Buenos

Aires: Sudamericana, 2011. p. 739. (Obras Completas, v.1)

BORGES, Jorge Luis. Evaristo Carriego. Buenos Aires: Emecé, 1965.

BORGES, Jorge Luis. «O Aleph». O Aleph. Trad. de Carlos Nejar. São Paulo: Globo,

1998. p. 695. (Obras Completas, v.1.)

BORGES, Jorge Luis. São Paulo: Globo, 2000. p. 199. (Obras Completas, v.3)

CERVANTES SAAVEDRA, Miguel de. Don Quijote de la Mancha. Madrid: Real

Academia Española, Alfaguara, 2004, p. 199. (Edición Conmemorativa del IV

Centenario).

CANDIDO, Antonio. “Prefácio”, in: ___________. ARRIGUCCI JR., Davi. O

escorpião encalacrado: a poética da destruição em Julio Cortázar. São Paulo:

Perspectiva, 1973. pp. 9-10.

CORTÁZAR, Julio. Rayuela. Buenos Aires: Alfaguara, 1995.

CORTÁZAR, Julio. Organização de Saúl Sosnowski. Tradução de Paulina Watch e Ari

Roitman. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. (Obra Crítica, v.3)

CORTÁZAR, Julio. Teoria do túnel. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998. (Obra

Crítica, v.1)

CORTÁZAR, Julio. Los reyes. Buenos Aires: Suma de Letras Argentinas, 2004.

FUENTES, Carlos. «Julio Cortázar y la sonrisa de Erasmo», in: _______. La gran

novela latinoamericana. Madrid: Santillana, 2011, p. 222.

GOMES, Adriana de Borges. Um tal Morelli, coautor do Quixote: a leitura como

poética da escritura. 2014, 384f. Tese (Doutorado em Teoria da Literatura) - Pontifícia

Page 161: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

161

Universidade Católica do Rio Grande do Sul/ Universidade do Estado da Bahia, Porto

Alegre, 2014.

GONZÁLEZ BERMEJO, Ernesto. Conversaciones con Cortázar. Barcelona: Edhasa,

1978.

ISER, Wolfgang. O ato da leitura: uma teoria do efeito estético – V. 2. São Paulo: Ed.

34, 1999. (Coleção Teoria).

JUAN-NAVARRO, Santiago. Un tal Morelli: teoría y práctica de la lectura en Julio

Cortázar. Disponível em: <www.sjuanavarro.com\files\O jogo da amarelinha.pdf>.

Acesso em: 25 jun. 2011.

MONEGAL, Emir Rodríguez. O leitor como escritor. In: ______. Borges: uma poética

da leitura. São Paulo: Perspectiva, 1980. (Coleção Debates, 140).

PAZ, Octavio. El arco y la lírica. México: Fondo de Cultura Económica. 1967.

PREGO, Omar. Julio Cortázar: la fascinación de las palabras. Montevideo: Trilce,

1990.

RICO. "Nota 14", in: CERVANTES SAAVEDRA, Miguel de. Don Quijote de la

Mancha. Madrid: Real Academia Española, Alfaguara, 2004. p. 87. (Edición

Conmemorativa del IV Centenario).

RILEY, Edward C. Tres versiones de la historia de Don Quijote. In: ______. La rara

invención: estudios sobre Cervantes y su posteridad literaria. Trad. de Mari Carmen

Llerena. Barcelona: Editorial Crítica, 2001. p. 133.

RIQUER, Martín. Cervantes y el Quijote. In: CERVANTES SAAVEDRA, Miguel de.

Don Quijote de la Mancha. Madrid: Real Academia Española, Alfaguara, 2004. p.

LXXI.. (Edición Conmemorativa del IV Centenario).

ROITMAN, Ari. “Prefácio”, in: CORTÁZAR, Julio. O jogo da amarelinha. [Edição

especial 50 anos de publicação]. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013.

SARLO, Beatriz. Escritos sobre literatura argentina. Buenos Aires: Siglo XXI

Editores Argentina, 2007, p. 239.

YURKIEVICH, Saúl. Julio Cortázar: mundos y modos. Buenos Aires: Edhasa, 2004,

VARGAS LLOSA, Mario. Una novela para el siglo XX (presentación). In:

CERVANTES, Miguel de. Don Quijote de la Mancha. Madrid: Real Academia

Española, Alfaguara, 2004. (Edición Conmemorativa del IV Centenario).

VIEIRA, Maria Augusta da Costa. A arquitetura narrativa. In: ______. O dito pelo não-

dito: paradoxos de Dom Quixote. São Paulo: EDUSP, 1998. p. 77. (Ensaios de Cultura;

14).

Page 162: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

162

POEMAS CAMONIANOS EM LÍNGUA ESPANHOLA

Carla da Penha Bernardo (UNEB)

A História de Portugal, desde sua origem, está estreitamente vinculada à da

Espanha. Como conseqüência, a língua e a cultura espanholas exerceram sempre forte

influência naquele país, tanto na modalidade escrita quanto na falada. Mais do que isso:

o espanhol chegou a ser usado entre autores tais que Gil Vicente, Sá de Miranda e Luís

de Camões como segunda língua, sobretudo entre os séculos XV e XVII. Não se trata,

neste caso, de traduções, mas de textos diretamente escritos em espanhol, como

veremos na leitura de alguns dos poemas camonianos.

Como escritor renascentista que é, Camões revisita a literatura da Antiguidade

greco-latina, adotando o ideal de imitação. Contudo, “imitação”, para o português,

assim como para os franceses da Pléiade (que defendiam a ideia de innutrition),

ultrapassa a cópia pura e simples, dizendo respeito, antes, a uma atualização de

escritores mais remotos, e, em certa medida, para nos referirmos à modernidade, ao

ideal brasileiro de antropofagia.

A poesia de Camões, no entanto, fará mais do que atualizar a da Antiguidade,

não demonstrando preconceitos por qualquer época, sequer pela medieval, por vezes

menosprezada durante o período clássico. Assim, se por um lado temos uma revisitação

do Antigo na épica ou no drama camonianos, em poemas tais que “Transforma-se o

amador na coisa amada,/ por virtude do muito imaginar” e “Pede-me o desejo, Dama,

que vos veja”, por outro, podemos ter a presença do elemento bíblico, como em “Sete

anos de pastor Jacó servia/ Labão, pai de Raquel, serrana bela.” Podemos igualmente

encontrar a revisitação da poesia medieval, em especial das cantigas de amor e de amigo

provençais ou ibéricas: “Posto o pensamento nele, / porque a tudo o Amor obriga,/

cantava, mas a cantiga/ eram suspiros por ele.” Encontra-se ainda a influência da poesia

humanista italiana tanto em Os Lusíadas quanto entre os mais afamados poemas

camonianos, como “O Amor é um fogo que arde sem se ver”.

Tão arraigado na literatura clássica é o ideal de imitação, que encontramos a

intertextualidade camoniana face a outros escritores, em especial a Petrarca – “Não

Page 163: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

163

tenho paz nem posso fazer guerra;/ Temo e espero e do ardor ao gelo passo”; “Tanto de

meu estado me acho incerto,/ que em vivo ardor tremendo estou de frio (Camões).

Também encontramos a intratextualidade de poemas do próprio Camões, como em

“Que dias há que na alma me tem posto/ Um não sei quê, que nasce não sei onde,/ Vem

não sei como, e dói não sei porquê” e o “Amor é um fogo que arde sem se ver.”

Além de trabalhar as tradições medievais, inclusive espanholas, Camões

antecipa a literatura, com seus paradoxos maneiristas e temas típicos do teatro barroco

espanhol – o mundo como teatro, o engano, o desengano, a inexorabilidade e a

efemeridade das coisas da vida, dentre outros. Sua poesia, mesmo a mais ortodoxamente

renascentista é, assim, mais instável e barroca avant la lettre do que a de seus

contemporâneos, apresentando a tendência que passaria a predominar no século XVII.

Ainda em relação aos temas, entre os mais presentes na lírica camoniana estão o

Amor, a mulher, a metalinguagem, a recepção da obra. Nenhum tema será mais

trabalhado do que o amor à mulher, em sua poesia. Neste ponto, mais uma inovação do

poeta (como se verá adiante), visto que seus contemporâneos tratavam de um modelo

feminino tipicamente europeu – da mulher da corte, alva, loura, de olhos claros e

indiferente, como usualmente se fazia também na poesia da Idade Média. Além disso,

seguindo os passos de Dante e Petrarca, sobretudo, o amor se mostrava de forma

platônica e o objeto do amor – a musa – era uma única mulher ao longo das obras.

Vale ainda ressaltar que a tradição das cantigas da Península Ibérica em muito

destoava do modelo francês, tão em voga à época, inclusive em Portugal. Os poetas da

Provença compunham poemas de amor, falando de uma mulher inacessível, a

«Senhora », porque casada com o senhor (o rei, o senhor feudal). Esta era também uma

mulher refinada, loura, delicada e pálida por seu enclausuramento na Corte e

completamente indiferente ao poeta, que a cantava sem nunca declarar sua identidade,

por mesura ou conveniência. Trata-se, pois, do amor cavaleiresco e platonizante, em

poemas nos quais o sujeito lírico masculino se dirige a uma musa idealizada e distante.

São as cantigas de amor.

A Península Ibérica, no entanto, apresentava características distintas da Provença

e uma economia mais fortemente baseada no aspecto rural. Desse modo, embora as

cantigas de amor tenham sido inseridas na literatura local, surge aí um tipo de canção

mais integrado aos povos ibéricos – a cantiga de amigo, em que o sujeito lírico passa a

Page 164: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

164

ser feminino. A mulher retratada é também de outro tipo, mesmo as louras, tendo em

vista que se passa a falar da mulher solteira e pobre, bronzeada pelo sol, uma vez que

necessita ajudar à mãe e que, para isso, tem atividades fora de casa, como lavar roupa

nos rios ou tirar leite das vacas. Essas saídas propiciam o encontro amoroso com o

namorado. A canção deste tipo é mais popular, muito plangente, e possui mais

repetições e rimas. Mais do que isso, existe uma correspondência amorosa entre a moça

e o namorado que não era possível nas cantigas de amor, tratando os poemas até mesmo

da fuga do namorado após encontros sexuais, tudo dito, é claro, de maneira bastante

enviesada, como nas cantigas do galego (?) Pero Meogo («Fostes, filha, eno bailar/ e

rompestes i o brial»).

Vale ainda lembrar uma categoria mista de poemas – as cantigas de

malmaridada – cujos sujeitos líricos são mulheres com certa liberdade, mas, ainda

assim, casadas com maridos escolhidos pelos pais. As canções falam de adultérios e

maldizem o marido traído e os pais que o escolheram.

Variando de forma ainda mais inovadora, Camões tratará do amor não por uma

só musa, não por um único típico físico, não pela mulher de uma única classe social.

Assim, falará da chinesa, que teria morrido no famoso naufrágio de que ele escaparia

com seus Lusíadas, de louras variadas, de damas da corte, de campesinas simples, da

negra Bárbara escravizada.

O Renascimento, para Camões, é portanto, a revisitação de temas, autores e

épocas variados, sem qualquer tipo de fronteira. Também por este motivo, além das

causas históricas e políticas, o poeta português irá não só se deixar tocar pela literatura

espanhola, mas também adotará a língua, demonstrando, de forma ainda mais

acentuada, sua admiração pelos escritores vizinhos.

Dentre os poemas camonianos em espanhol, destacam-se as formas calcadas nas

cantigas trovadorescas, em geral peças que glosam um mote próprio ou alheio.

Os poemas de Camões não recebem título, por isso, seguindo a praxe, a eles nos

referiremos pelo primeiro verso, não levando em conta os da citação epigráfica.

Visto esse breve retrospecto, podemos fazer a leitura de alguns poemas

camonianos em espanhol.

Page 165: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

165

Exemplo de poema que revisita o Trovadorismo é “Mi nueva y dulce querella”:

CANTIGA

a este moto alheio:

De dentro tengo mi mal,

que de fuera no hay señal.

VOLTA

Mi nueva y dulce querella,

es invisible á la gente;

el alma sola la siente,

que el cuerpo no es dino della.

Como la viva centella

se encubre en el pedernal

de dentro tengo mi mal.

A cantiga trata do recorrente tema de amor compreendido como guerra que leva

a sentimentos contraditórios, daí tratar-se de uma “dulce” “querella”. Neste ponto, vem

à lembrança do leitor o célebre “Amor é um fogo que arde sem se ver”, aqui

reapresentado com uma imagem ao mesmo tempo singela e original: “Como la viva

centella/ se encubre en el pedernal/ de dentro tengo mi mal”.

Page 166: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

166

O pedernal nada mais é do que a pedra de fogo usada em construções, que, uma

vez tocada por outro objeto igualmente resistente, libera faíscas. As comparações típicas

das obras renascentistas se pautavam sobretudo na mitologia greco-latina; em Camões,

portanto, também as imagens mais simples se incorporam ao literário, sobretudo em um

poema medievalizante e, pois, de cunho mais popular do que outros em que, por

exemplo, o platonismo ou o petrarquismo é revisitado.

Somente a alma sente a doce querela por não haver correspondência da mulher

amada, tal qual nas cantigas de amor. Ora, neste caso, como em tantos poemas de

Camões, a musa cantada era uma senhora distante pelo matrimônio e pela condição

social, impossibilitada, por isso, de sujeitar-se à paixão do trovador, daí sentir-se o eu

lírico um pedernal cuja dor é resguardada, neste caso, por conveniência ou mesura: “de

dentro tengo mi mal”.

Semelhante a este, porém mais desenvolvido é “Para que me dan tormento”.

Uma vez mais, tem-se aí um mote alheio, cujo cerne é “Perdido, mas no tan loco/ que

descubra lo que siento”. Mostra-se o desconcerto entre o sentimento do eu-lírico e o

desprezo da mulher “/..../ quanto más me lo dan [afán, neste caso, obstáculo]/ tanto

menos siento del”. Quanto maior o desprezo, mais redobrado se faz o desejo do eu-

lírico, o qual deixa de ser declarado de forma explícita tanto pela conveniência,

anteriormente citada, quanto pela própria ação de Cupido, que evita o esgotamento do

amor: “Sepan que me manda Amor,/ que de tan dulce querella, a nadie dé,/ parte della,/

porque la sienta mayor”. Neste sentido, Camões reúne, em um mesmo poema, a tradição

medievalizante do impedimento feminino e do consequente silenciamento do eu-lírico e

a tradição platonizante do amor enquanto perfeição apenas no domínio da ideia e, por

isso mesmo, a aversão em concretizá-lo e, por conseguinte, esgotá-lo, como se vê

também em um dos melhores sonetos camonianos em português: “Não há cousa, a qual

natural seja,/ Que não queira perpétuo o seu estado./ Não quer logo o desejo o desejado,/

por que nunca falte onde sobeja.”

Mais comum em Camões, contudo, parece ser a atualização do ideal platônico,

marcando o poeta seu próprio tempo, o renascentista, em que o humano toma o espaço

do divino e se volta ao conhecimento e à experimentação em todos os níveis, inclusive o

amoroso, conforme se lê em um de seus sonetos: “Ó vós que Amor obriga a ser sujeitos/

a diversas vontades! Quando lerdes/ num breve livro casos tão diversos, // verdades

Page 167: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

167

puras são, e não defeitos.../ E sabei que, segundo o amor tiverdes,/ tereis entendimento

de meus versos”. Por isso mesmo, o amor misto é mais presente do que o platônico em

sua poesia: “É este amor tão fino e tão delgado,/ que quem o tem não sabe o que

deseja.// Mas este puro afeito em mim se dana; que, como a grave pedra tem por arte/ o

centro desejar da natureza,// assi o pensamento (pola parte/ que vai tomar de mim,

terrestre [e] humana)/ foi, Senhora, pedir esta baixeza.”; “e o vivo e puro amor de que

sou feito,/ como a matéria simples busca a forma”.

O poema se fecha, como de praxe em Camões, não com uma síntese da tese e da

antítese antes trabalhadas, mas com considerações em aberto que mantêm as

contradições do amor e as reações do indivíduo diante dele, ressaltando-se “no coração

humano a amizade”: “Es tan dulce mi tormento/ que aún se me antoja poco;/ y si es

mucho, quedo loco/ de gusto de lo que siento”.

O poema “Sepa quién padece” trata de alguns dos melhores e mais recorrentes

temas da lírica camoniana que dialogam com o espírito barroco peninsular – o mundo

ao mesmo tempo desconcertado e mutável, o sujeito gauche e desesperançado para o

qual a mudança é sempre do mal para o pior:

CANTIGA

a este moto:

¿Dó la mi ventura?

Que no veo alguna.

VOLTAS

Sepa quién padece

que en la sepultura

Page 168: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

168

se esconde ventura

de quién la merece.

Allá me parece

que quiere fortuna

que yo halle alguna.

Nasciendo mezquino,

dolor fué mi cama;

tristeza fué el ama;

cuidado el padrino.

Vestióse el destino,

negra vestidura;

huyó la ventura.

No se halló tormento,

que alli no se hallase;

ni bien que se pasase,

sino como viento.

!Oh, que nacimiento,

que luego en la cuna

me seguió fortuna!

Esta dicha mia,

que siempre busqué,

buscandola, hallé

que no la hallaría;

que quién nace en dia

Page 169: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

169

d´estrella tan dura,

nunca halla ventura.

No puso mi estrella

más ventura en mi;

así vive en fin

quién nace sin ella.

No me quejo della;

quéjome que atura

vida tan escura.

“No se halló tormento,/ que alli no se hallase;/ ni bien que pasasse,/ sino como

viento./ !Oh, que nacimiento, que luego en la cuna/ me seguió fortuna.”

Este drama em gente é representado de forma intensa pelo sujeito em outros

poemas, como em um dos que atribuem a Camões:

O dia em que nasci/ moura e pereça

/..../

A luz lhe falte, o sol se [lhe] escureça,

mostre o mundo sinais de se acabar,

nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,

a mãe ao próprio filho não conheça.

/..../

Ó gente temerosa, não te espantes,

que este dia deitou ao mundo a vida

mais desgraçada que jamais se viu!

Page 170: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

170

No poema espanhol, no entanto, o desconsolo é ainda maior do que em tantos

poemas em português de Camões, pois que sequer na esperança se fia o sujeito: “Esta

dicha mia,/ que siempre busqué,/ buscandola, hallé/ que no la hallaría”. O clímax da

desesperança e a solução única que se delineia a este sujeito exacerbam a dramaticidade

inicial e final do poema e, portanto, cíclica e insuperável: “Sepa quién padece/ que en la

sepultura/ se esconde ventura/ de quién la merece.”; “No puso mi estrella/ más ventura

en mi;/ así vive en fin/ quién nace sin ella./ No me quejo della;/ quéjome que atura vida

tan escura.”

Outro poema que merece lida é a cantiga seguinte :

Cantiga

A este moto:

Irme quiero, madre,

á aquella galera,

con el marinero

a ser marinera.

VOLTAS

Madre, si me fuere,

dó quiera que vó,

no lo quiero yo,

que el Amor lo quiere.

Aquél niño fiero

hace que me muera,

por un marinero

á ser marinera.

Page 171: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

171

Él, que todo puede,

madre, no podrá,

pues es alma vá,

que el cuerpo se quede.

Con él por quién muero,

voy, porque no muera;

que, si es marinero,

seré marinera.

Es tirana ley,

del niño Señor,

que por un amor

se deseche un Rey:

pues desta manera

quiere, yo me quiero

por un marinero

hacer marinera.

Decid, ondas, ¿cuando

vistes vos doncella,

siendo tierna y bella,

andar navegando?

[Pues] más no se espera

daquel niño fiero,

vea yo quién quiero,

sea marinera.

Page 172: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

172

O poema é uma glosa a um mote alheio – «Irme quiero, madre,/ á aquella

galera,/ con el marinero/ á ser marinera.» Há relação com a cantiga de amigo, neste

caso. Lembre-se que, nestas, havia um diálogo que podia ser travado com elementos da

natureza, a amiga ou a mãe.

A referência ao «marinero» evoca a cantiga marinha ou barcarola, que se refere

à partida do namorado para a guerra e pelo qual a moça chora e se lamenta em refrães

recorrentes, pois não sabe se o namorado está vivo ou morto em virtude da guerra em

que estará lutando ou se ele simplesmente a abandonou (como na célebre cantiga de D.

Dinis «Ay Deus, e u è ?»).

Ocorre que, nestas antigas canções, a moça não vai além do lamento – nem o

pode –, visto não ter informações sobre o amigo nem certeza de seu possível retorno.

Além disso, lembre-se, não há liberdade para a moça, que namora às escondidas, visto

que os pretendentes eram escolhidos pelos pais. O moto glosado por Camões, no

entanto, aponta para uma moça moderna e ativa, que se não contenta em aguardar o

namorado, mas que deseja segui-lo e o diz de forma corajosa e direta à mãe.

«Ser marinera» é recusar o papel que era atribuído à jovem solteira, o que se dá

por ação do fero e cego Cupido. Divide-se, assim, a jovem em matéria – que fica – e

alma, marinheira, que segue com o namorado. A seguir, pode parecer, à primeira vista,

afirmar-se que o rapaz pretende desistir de sua partida, quebrando, assim, a lealdade ao

rei em razão da força do Amor: «Es tirana ley,/ del niño Señor,/ que por un amor/ se

deseche un Rey». A ideia, contudo, é bem diversa, ainda porque as leis humanas não

permitiriam que o «Rey» fosse desconsiderado sem que houvesse culpabilidade e

castigo (como no caso de Tristão, penalizado com a morte). O ‘Rei a ser desfeiteado’ é a

lei familiar representada pelo Pai da moça, o que pode ser ratificado com a última

estrofe – não importa se em pensamento ou com ações. A pena aí também existe, pois a

infração, mesmo que tenha sido apenas imaginária, é cometida, logo, sendo seguida do

castigo – a coyta amorosa da jovem.

Ainda na última estrofe, surge uma pergunta que tanto pode ser atribuída a uma

intervenção da mãe quanto a uma questão retórica da própria moça em embate íntimo

consigo mesma ou em diálogo com as personificadas ondas. A resposta já é

antecipadamente apontada desde a epígrafe do poema: «Decid, ondas, ¿cuando/ vistes

Page 173: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

173

vos doncella,/ siendo tierna y bella,/ andar navegando ?/ [Pues] más no se espera/ daquel

niño fiero,/ vea yo quién quiero,/ sea marinera.»

«Ser marinheira» pode representar não a partida física, mas sim em espírito e,

ainda assim, uma moça menos subserviente e estática naquela sociedade. Por outro lado,

pode indicar também o desejo de assumir o sentimento amoroso não com um possível

namorado imposto familiarmente, mas com o «marinheiro», com que o coração da moça

efetivamente já se encontra de forma marinheira: «vea yo quién quiero».

Camões trata, pois, de uma moça solteira de forte personalidade, que apresenta

um discurso de afrontamento em relação às rígidas leis da sociedade de então, em

especial as familiares. Não apenas deseja, mas afirma enfaticamente que quer ser

marinheira, e não permanecer em terra firme, ou seja, que quer fazer suas próprias

escolhas sentimentais. Camões é, assim, uma vez mais, inovador, ao, de modo mais ou

menos oblíquo, apontar para a necessidade do fim da imposição paterna e para a

possibilidade de a mulher solteira renascentista querer e poder fazer sua opção amorosa.

Camões defende, assim, não o casamento por interesse, mas sim por amor, defesa que

hoje pode nos parecer representar muito pouco, mas que, com certeza, significava muito

para um mundo que acabara de sair da segunda Idade Média e que vivia ainda tempos

de Inquisição e de falta de liberdade para os homens (inclusive os escritores) e, ainda

mais, para as mulheres, tantas vezes focadas pelo poeta renascentista com uma

verdadeira e diversa humanidade.

*

* *

Talvez a aceitação e popularidade da escrita camoniana além do limite português

e de seu tempo tenha se dado por uma própria característica moderna de certos autores,

intensificada por Camões – a presença marcante e atualizada da literatura de qualidade,

independente de quaisquer fronteiras de tempo e espaço. Talvez também por isso, nós,

lusófonos, devamos visitar a literatura de nossos países produzida tanto em português

quanto em língua estrangeira com o mesmo sem preconceito com que os autores a

produziram e continuam a produzir, o que nos oferece um quadro mais completo de

suas produções e da afinidade de nossa própria cultura com outras, como a de língua

espanhola, no caso camoniano.

Page 174: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

174

Camões é o poeta que assinala a modernidade do português, com sua epopeia, e

o maior escritor de língua portuguesa. Por isso mesmo, ainda que Renascentista, ele não

abandona as origens medievais e ibéricas de sua terra, dialogando com a língua e a

cultura da Espanha. A Ibéria foi sempre um território particular em relação ao restante

da Europa. Sobretudo devido à ação prolongada da Inquisição e à peste negra, que

eliminou 1/3 da população europeia, o Renascimento ibérico teve suas peculiaridades,

vinculando-se o homem de então mais fortemente às questões religiosas. A esse

homem, não restava senão a fé, espontânea ou forçosamente. Por isso mesmo, em vez

do equilíbrio e da certeza renascentistas, a obra camoniana apresenta a ‘incertitude’ e

tantos dos temas típicos do Barroco (em especial o espanhol) com que dialoga de perto.

É exatamente ao revisitar os humanistas italianos que Camões se antecipa ao Barroco,

que já respirava de algum modo na Península, e que ele acaba por fazer uma poesia

singular, em que destoa dos modelos clássicos, mostrando-se um poeta moderno,

integrado também a seu tempo, conquanto revisitando os antigos e todas as tradições

por ele conhecidas.

Camões é fundamentalmente um infiel – ao fazer uma poesia vária na forma e

no conteúdo, ao tratar de musas de distintas classes e de diferentes aspectos físicos, ao

se desviar do cânone, atualizando-o, ao utilizar uma língua que não a portuguesa da qual

é o marco maior... Se se leva em conta o cânone de então e o nacionalismo distanciado

de seu tempo, sim, ele é infiel. Mas já afirmava ele, antecipando-se a nossos

julgamentos, que, ‘segundo o amor tivermos, teremos entendimento de seus versos’. E o

amor, aí, significa experiência, lato sensu. Camões está muito mais próximo de nós do

que hoje pensamos, ao clamar pelo direito de a mulher escolher seus parceiros, por

exemplo, como se viu, e ao falar de um Portugal e de seu povo de forma muito mais

próxima do real do que de um autor se esperaria então, mostrando, pois, a complexa e

amalgamada diversidade da cultura portuguesa, em especial, dialogando com a cultura

espanhola, qual Quixote e Sancho, em forma do célebre quiasmo garrettiano.

REFERÊNCIAS

Page 175: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

175

AZEVEDO FILHO, Leodegário (1987). Literatura portuguesa. História e emergência

do novo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro; Niterói: EDUFF.

CAMÕES, Luís Vaz de (1982). Camões. Lírica. Introd. de Aires da Mata Machado

Filho. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EDUSP.

LAGARDE, A. & MICHARD, L. (1962). XVIe siècle. Paris: Bordas.

MACEDO, Hélder (1980). Camões e a viagem iniciática. Lisboa: Moraes.

MARTINS, Cristiano (1981). Camões. Temas e motivos da obra lírica. Belo Horizonte:

Itatiaia.

SARAIVA, A. J. & LOPES, Óscar (s.d.). História da literatura portuguesa. Porto:

Porto.

Page 176: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

176

POESIA NAS AULAS DE E/LE: PROPOSTAS DIDÁTICO-

CULTURAIS

Jeferson Mundim de Souza

Professor da Educação Básica da

Prefeitura Municipal de São Francisco do

Conde e Escolas Privadas de

Salvador/Bahia

A poesia como estratégia didática

O presente artigo pretende ressaltar a potencialidade da poesia como estratégia

didática nas aulas de Espanhol como Língua Estrangeira (ELE). Para isso, dividimos

nossos escritos em perspectivas teóricas, nas quais desenvolveremos algumas reflexões

sobre a exploração didática em textos desse gênero, espanhóis e hispano-americanos

para níveis iniciais e intermediários e outra parte prática, na qual exploraremos alguns

poemas de autores como Gloria Fuertes, Mario Benedetti e Pablo Neruda.

Nosso objetivo é estabelecer relações entre a teoria e a prática, já que muitos

autores têm tratado a poesia em diferentes perspectivas. No entanto, antes mesmo de

começarmos a apresentar tais diferenças, devemos iniciar com uma pergunta, ou seja,

quais são as características do poético; aquilo que diferencia estes textos de outros que

temos como possibilidade de usar em sala, nas aulas de espanhol? Certamente, definir

com riqueza de detalhes o que vem a ser a poesia não é o objetivo deste artigo, mas é

talvez nos aproximarmos de uma definição, na tentativa de limitarmos o objeto de

estudo.

Octavio Paz, em seu ensaio El arco y la lira, define a poesia da seguinte forma:

La poesía es la revelación de la inocencia que alienta en cada hombre, en

cada mujer y que todos podemos recobrar apenas el amor ilumina nuestros

ojos y nos devuelve el asombro y la fertilidad. Su testimonio es la revelación

de una experiencia en la que participan todos los hombres, oculta por la

rutina y la diaria amargura. Los poetas han sido los primeros que han

revelado que la eternidad y lo absoluto no están más allá de nuestros sentidos,

sino en ellos mismos. Esta eternidad y esta reconciliación con el mundo se

producen en el tiempo y dentro del tiempo, en nuestra vida mortal, porque la

poesía y el amor no nos ofrecen la inmortalidad ni la salvación. Arte de

hablar en una forma superior, lenguaje primitivo. […] Enseñanza, moral,

Page 177: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

177

ejemplo, revelación, danza, diálogo, monólogo. Voz del pueblo, lengua de los

escogidos, palabra del solitario […]

(PAZ, 1992, p. 13).

Portando, segundo Paz, a função da poesia, em um mundo vazio, porém

tecnologicamente dinâmico, serve de muito e ainda não alivia, nem corrompe, mas

purifica. Para ele não tem mais ideologia que uma alma e um espírito em constante

confronto com tudo aquilo que o rodeia. “Vivemos com os olhos abertos, porém cegos

diante das premonições que são anunciadas” (PAZ, 1992, p.14). Para o autor mexicano

o poético está intimamente entrelaçado nas relações do ser humano e nas possibilidades

da linguagem, sendo uma forma de expressão que dificilmente poderemos encaixar

dentro de uma definição. No entanto, cada poema e a relação que este estabelece com os

diferentes leitores é única, e esta pluralidade é uma das características essenciais do

poético. Como conseqüência, devemos ter claro que quando falamos de poesia em sala

de aula de ELE estamos nos referindo a um conjunto de textos extremamente extensos e

heterogêneos, onde durante décadas as novas metodologias para o ensino de línguas

estrangeiras recusaram o uso da poesia em seu conjunto, considerando-a uma estratégia

didática pouco produtiva para a aula.

Para responder ao por que desta postura, faz-se necessário fazermos uma breve

revisão histórica do uso da literatura e o uso da poesia em sala de aula de espanhol.

Encontros e desencontros no ensino da poesia nas aulas de ELE

A poesia vem desenvolvendo seu papel dentro da proposta de contexto a partir

do ensino-aprendizagem de língua estrangeira espanhol, variando de maneira paralela

aos diferentes enfoques metodológicos que surgiram nos últimos quarenta anos. Cada

um desses enfoques tem buscado transmitir uma maneira de entender como se constitui

a língua e como se concebe a aprendizagem. O valor que se dará ao texto poético é por

conta dessas concepções e interesses.

Até a segunda metade do século XX a literatura no ensino de línguas tinha um

papel predominante dentro dos enfoques tradicionais ou de gramática e tradução, pois

Page 178: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

178

essa concepção pedagógica, inspirada no ensino do latim e do grego, se baseava em

procedimentos como memorização, tradução ou a imitação, convertendo a literatura no

centro de sua proposta de ensino. Os textos literários eram mostras da língua, cuja

autoridade como modelos de propriedade e adequação linguística os convertiam no

principal suporte para o trabalho em sala de aula.

Nos anos quarenta e cinquenta, o desenvolvimento e implantação na Europa e

nos Estados Unidos dos fundamentos do Estruturalismo se concretizavam em uma série

de novos enfoques metodológicos de base estrutural. A língua será considerada como

um conjunto de estruturas ordenadas por hierarquia. Isso se unirá à influência

condutivista da aprendizagem que leva à repetição mecânica de estruturas com o

objetivo de fixar hábitos linguísticos na aprendizagem. Logo, a poesia era considerada

desnecessária por sua complexidade e sua escassa rentabilidade comunicativa, sendo

substituída por textos elaborados didaticamente mais atrativos.

Nos anos setenta se desenvolveram os programas nociofuncionais e com eles a

importância dos aspectos relacionados com o uso social da língua, onde a língua é um

sistema instrumentalizado e a organização dos conteúdos e dos expoentes gramaticais se

realizam com um critério de agrupação em contextos de uso e funções comunicativas.

Nessa perspectiva, mais uma vez, os textos poéticos não cabiam nessa proposta. Apenas

é possível encontrar algumas propostas de poesia no final das unidades didáticas como

um complemento cultural dos objetivos programados.

O verdadeiro rompimento dos planejamentos sobre a aquisição de novas

línguas chega aos anos oitenta com o enfoque comunicativo. Mesmo parecendo

paradóxico será com este modelo que a literatura se incorpora progressivamente ao

ensino-aprendizagem de Língua Estrangeira. Paradóxico porque o caráter utilitário do

enfoque comunicativo centraliza sua atenção de tudo aquilo que tenha um propósito

prático e a língua poética se vê como uso da linguagem distanciado das expressões

utilizadas na comunicação diária. No entanto, por outro lado, a recuperação da poesia no

âmbito de LE vem associada a sua revalorização como mostras culturais da língua e

como documentos autênticos muito mais motivadores para o aluno que os textos

elaborados com uma finalidade didática. Ainda assim, nos últimos anos sua presença

nos materiais didáticos, ainda que cada vez mais integrada e relevante dentro das

unidades didáticas, continua sendo escassa.

Page 179: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

179

O esquema que surge, após o exposto anteriormente, revela por algumas

razões o motivo da poesia ter ficado ausente das aulas de ELE:

A associação inconscientemente do texto literário aos enfoques

metodológicos mais tradicionais dos que as novas tendências queriam se

distanciar.

A consideração da língua poética como uma linguagem distanciada da

comunicação diária e, portanto, pouco útil desde uma perspectiva comunicativa.

Pensa-se que são textos de uma excessiva complexidade que, em todo

caso, somente poderiam ser utilizados com níveis avançados.

Recusa-se seu uso da linguagem por ter um excessivo significado

explícito (sugestão e conotação) e uma finalidade eminentemente estética e não

informativa.

O modelo comunicativo como apresentado anteriormente, é o enfoque que

mudou este ponto de vista, e dentro deste modelo o enfoque por tarefas tem uma

especial relevância neste processo de revalorização da literatura. Nele o texto está

considerado como ponto de partida de uma atividade, cujo objetivo é promover a

comunicação. Desta maneira, o material utilizado deve ativar processos que produzam

uma resposta vivencial do aprendiz. A partir dessa perspectiva, a natureza do texto não

será tão importante como a maneira de explorar-lo didaticamente. No entanto, a

pergunta que devemos fazer é evidente e necessária: a poesia é um tipo de texto capaz

de provocar atos de comunicação no aluno?

Principais dificuldades na apreciação da poesia pelos estudantes de ELE

Dificuldades de compreensão de vocabulário, em particular de

codificação das conotações.

Dificuldades de índole temático ideológica, em particular as referentes

a natureza e a cultura .

Dificuldade derivada do desconhecimento da métrica, medida do

verso, as pausas na leitura, a rima, os tipos estróficos, as licenças poéticas, etc.

Page 180: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

180

Dificuldade vinculada com a compreensão dos recursos expressivos,

similares, metafóricos, simbólicos e outras figuras literárias. Exemplos: Ironia,

retórica, etc.

Dificuldade com o processo de análise: descrição; valoração, em

particular, dar juízo e critérios pessoais.

Para que o aluno possa superar essas dificuldades, faz-se necessário a atenção do

professor, oferecendo de maneira dosada, obras, fragmentos e textos representativos das

diferentes etapas da poesia, revelando assim o tratamento com a poesia e seu próprio

ideal pessoal, produto de uma realidade somente experimentada por aqueles que vivem

parte dessa história.

Uma eficaz apreciação destas obras remeterá necessariamente o estudante a um

estudo não somente linguístico, mas contextual, ideológico e sociocultural.

A poesia a partir do enfoque comunicativo

Como material para as aulas de ELE, o texto poético reúne características

evidentemente positivas e aproveitáveis. A poesia tem como ferramenta essencial a

língua e possui todos os elementos que convertem sua leitura em um ato de

comunicação, sendo observado que há um emissor – escritor, que na sequência tem uma

mensagem – o poema, havendo sempre um receptor – leitor (a), que será apresentado

em um canal de comunicação – livro, que partirá de um código – língua a partir de

determinado contexto.

Sendo assim, a poesia é uma fonte inesgotável de textos que possuem dois

atributos básicos que os convertem em materiais susceptíveis de serem usados em uma

aula de línguas: a poesia é linguagem e é comunicação em um determinado contexto

cultural.

Este ato de comunicação que é a poesia, além do mais, tem característica

específica que a faz, em minha opinião, especificamente produtiva em uma exploração

didática baseada em um enfoque comunicativo, visto que vão tratar de temas

motivadores e normalmente universais; sendo material autêntico o aprendiz sabe o que

Page 181: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

181

está lendo e que esse mesmo texto lêem outros falantes nativos; provocam um alto grau

de afetividade que pode ser aproveitada para a interação e o intercâmbio de ideias; a

plurissignificação do texto poético permite a interpretação pessoal e motiva a

negociação de significados; são textos que estimulam a criatividade, a imaginação e o

jogo associados ao uso da linguagem; desenvolvem a competência intercultural. A

poesia se configura como ponto de (des) encontro cultural, de reconhecimento das

diferenças e pontos em comum.

Para aproveitar didaticamente todos estes aspectos potencialmente positivos para

as aulas de ELE, o professor deve ter presente que um dos pontos fundamentais para a

exploração didática destes textos é conseguir facilitar o encontro entre leitor e poesia. A

respeito desse encontro Octavio Paz comenta:

A poesia é uma possibilidade aberta a todos os homens, qualquer que seja seu

temperamento, seu ânimo ou sua disposição. Mais atenção: a poesia é senão

isso: possibilidade, algo que somente se anima estando em contato com um

leitor ou ouvinte. Existe algo em comum entre todas as poesias, onde sem a

qual não seria poesia: a participação (PAZ, 1992, p. 25)

Conseguir essa participação, esse contato do estudante com o texto poético, é

conseguir uma conexão na qual o aprendiz completa a poesia a partir do seu ponto de

vista, desde suas circunstâncias vitais e culturais. O que surge desse encontro é uma

matéria prima valiosíssima para a aula de espanhol. Para conseguir aproveitar esse

contato, que será gerador de produção na aula, o professor deve conseguir construir uma

ponte entre o estudante e a poesia, daí a importância de atividades e estratégias didáticas

prévias à leitura com a função de favorecer uma contextualização que evite os

obstáculos que puderam existir para a compreensão a um nível linguístico e

sociocultural.

A retomada da literatura às aulas de língua estrangeira se fez, portanto, a partir

de uma inversão de termos: o texto poético já não era um modelo de língua para o

falante como ocorria nos enfoques metodológicos tradicionais nem tampouco era

unicamente uma fonte de léxico e estruturas linguísticas. Na atualidade a importância do

texto poético reside em seu valor como mostras culturais de língua e como documento

autêntico breve, autônomo, motivador e capaz de gerar atos de comunicação, cuja

autenticidade não está desconectada do contexto de sala de aula. Maley explica de

maneira clara:

Page 182: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

182

A poesia é linguisticamente autêntica. É também emocionalmente autêntica

e, portanto, provoca uma resposta no leitor igualmente autêntica [...] Também

pode implicar ao estudante em uma discussão e negociação autênticas.

(MALEY, 1987, p. 107)

Esta autenticidade na resposta da qual fala Maley deve estar sob potência e aproveitada

ao longo da exploração didática do texto. A presença da poesia nas aulas é cada dia

maior, graças a esta mudança de perspectiva na qual, desde um enfoque comunicativo,

seu uso como ferramenta didática tem um sentido pleno.

Uso de textos literários nas aulas de ELE

O uso e seleção de textos para as aulas de ELE exigem um longo e árduo

trabalho por parte do professor e uma reflexão prévia para adequar as atividades ao

contexto didático no qual será usado. Conseguir aproveitar as vantagens das quais

sinalizamos anteriormente, dependerá da seleção e atividades elaboradas pelo professor.

Algumas etapas de estratégias didáticas para o uso e alcance de objetivos em

textos literários, segundo (ACQUARONI, 2007, p. 127):

a. Etapa de contextualização e preparação – ativação de

conhecimentos prévios (linguísticos e/ou socioculturais) do aprendiz;

proporcionar informação pertinente para a compreensão posterior do texto;

favorecer a retomada de posição cultural e/ou pessoal do aprendiz.

b. Etapa de descoberta e compreensão - aplicação e reconhecimento

durante a leitura o já tratado na etapa anterior; localizar vocabulário

durante a leitura; reter vocabulário após a leitura em voz alta; estabelecer

relação entre partes do texto com outros textos; avaliar o grau de

compreensão; organizar a informação inferida do texto; tomar consciência

das estratégias adotadas ao longo da leitura; aprender, refletindo sobre

aspectos literários; extrair um fragmento ou informação do texto para

discutir ou ampliar em sala de aula; propor atividades que impliquem uma

abordagem gramatical a partir do contexto.

Page 183: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

183

c. Etapa de expansão – dependerá dos objetivos marcados e as

características concretas do grupo de aprendizes a quem estão dirigidos;

dinâmicas e procedimentos que unifiquem e integrem as atividades

realizadas nas etapas anteriores; elaboração e proposta de atividades de

reforço, ampliação e consolidação; desenvolvimento de atividades

comunicativas de expressão e interação oral e/ou escrita.

A parte prática das propostas didático-culturais

Propomos a partir daqui explorar didaticamente tipologias textuais de gênero

poético, espanhóis e hispano-americanos para níveis iniciais e intermediários, nos quais

exploraremos praticando, através de atividades de aprendizagem, demonstrando como

podemos utilizar a poesia de maneira produtiva para as aulas de ELE, fazendo uso da

seleção de alguns poemas de autores como Gloria Fuertes, Mario Benedetti e Pablo

Neruda. Todas as atividades têm como ponto de referência o texto e as diferentes

possibilidades que o mesmo oferece para o desenvolvimento das mais variadas

competências comunicativas, analisando sempre as diferentes respostas e reações que a

poesia poderá produzir no aluno.

As atividades propostas estão direcionadas à negociação, discussão, no uso

criativo da linguagem e na potencialidade intercultural que advém delas.

TEXTO 1: “LOS MESES”, DE GLORIA FUERTES Proposta didática

NIVEL: A2- B1 INTERMEDIO

DURACIÓN: 2 h.

A. ¿Sabes definir POESÍA?

A continuación te proponemos algunas definiciones. Marca la (s) que más se acerca

(n):

( ) La poesía describe emociones de todo tipo, desde el placer al dolor…

( ) En la poesía el poeta transforma la realidad…

Page 184: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

184

( ) La poesía se centra en el exterior de las personas y no en el interior…

( ) Lo más importante de la poesía es el tema que trata…

( ) Lo que realmente importa en la poesía es cómo se dicen las cosas y no lo que se

dice…

( ) La poesía se acerca siempre a la realidad…

B. Compara tu elección con la de tu pañero y justifícala. Para ello fíjate en el

siguiente cuadro y recuerda diferentes formas con las que podemos expresar la

opinión:

Para mí – según mi opinión

(Yo) creo que; pienso que; opino que; (A mí) Me parece que… + presente de indicativo

Ejemplo: “Yo creo que la poesía describe emociones muy trágicas porque los poetas son

personas muy tristes y desgraciadas. Pienso que en un poema tiene que existir un

equilibrio entre la forma y el contenido, porque las dos cosas son igual de importantes”.

C. Escribe una redacción explicando las opiniones de tu compañero y

comparándolas con las tuyas.

Ejemplo: Mateo piensa que la poesía es muy bonita pero es imposible de entender. Yo

no estoy de acuerdo porque…

D. A continuación vas a escuchar a tres estudiantes de Literatura que hablan de sus

poetas favoritos. Escucha con atención y señala si las siguientes afirmaciones

son verdaderas o falsas:

Gloria Fuertes

a. Gloria Fuertes vivió en Madrid ( )

b. Le gustaban mucho los niños ( )

c. Colaboró tan solo en un programa de televisión, La cometa blanca ( )

d. Su voz era muy débil y tenía un gran sentido del humor ( )

e. Cultivó la poesía infantil y la poesía para adultos ( )

Mario Benedetti

a. Mario Benedetti tiene seis nombres ( )

b. El estudiante piensa que Mario es el nombre más original ( )

c. Vivió en Argentina, Chile y España ( )

Page 185: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

185

d. Es un autor que cultiva diferentes géneros literarios ( )

e. Intervino como actor en una película ( )

Pablo Neruda

a. Pablo Neruda era su verdadero nombre ( )

b. En 1981 ganó el premio Nobel de Literatura ( )

c. Debido a su compromiso político y a la situación de la época, tuvo que huir de

Chile ( )

d. Para salir de Chile se cambió de identidad pero no cambió su aspecto físico ( )

e. La obra Veinte poemas de amor y una canción desesperada está formada por

poemas románticos y tristes ( )

E. ¿Quién crees que es el autor de cada fragmento? Relaciona cada título con el

poema correspondiente y escribe debajo de cada uno de ellos quién crees que es

su autor.

1. Poema de amor no. 20

2. When you are smiling

3. Para dibujar un niño

A – ( ) (…) ocurre que tu sonrisa es la sobreviviente,

la estrella que en ti dejó el futuro, la memoria del horror y la esperanza,

la huella de tus pasos en el mar,

el sabor de tu piel y su tristeza.

When you are smiling

The whole World

Que también vela por tu amargura

smiles with you.

Autor/Autora _______________

Page 186: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

186

B – ( ) (...) hay que hacerlo con cariño.

Pintarle mucho flequillo,

_que esté comiendo un barquillo...

muchas pecas en la cara,

que se note que es um pillo

_pillo rima con flequillo

y quiere decir travieso...

Continuemos el dibujo:

redonda cara de queso (...)

Autor/Autora _______________

C – ( ) Puedo escribir los versos más tristes esta noche.

Escribir por ejemplo: “La noche está estrellada, y tiritan, azules, los astros, a lo lejos”.

El viento de la noche gira en el cielo y canta.

Puedo escribir los versos más tristes esta noche.

Yo la quise, y a veces ella también me quise (...)

Puedo escribir los versos más tristes esta noche.

Pensar que no la tengo, sentir que la he perdido.

Autor/Autora _______________

F. El poema utiliza el lenguaje de forma especial, dándole a las palabras

significados diferentes, jugando con el ritmo y la rima, es decir, llevándolo al

límite para conseguir emocionar al lector. Escucha los siguientes fragmentos de

algunos poemas de los autores anteriores dos veces y elige, entre las opciones

que se dan, cuál es la técnica poética que utilizan para conseguir sorprender y

emocionar.

Page 187: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

187

Poema 1: ( ) rima ( ) invención de palabras ( ) uso de extranjerismos

Poema 2: ( ) rima ( ) deformación del lenguaje ( ) uso de metáforas

Poema 3: ( ) rima ( ) repetición de estructuras y sonidos ( ) invención de

palabras

G. Las sílabas de las siguientes palabras están desordenadas. Ordénalas y

encuentra el adjetivo escondido.

Ejemplo: BLE – SI – SEN: Sensible

1. TIL – VER – SÁ: _______________________

2. TI – RO MÁN – CO: __________________________

3. PLI – DO – COM – CA: ____________________________

4. TO – AU – DAC – DI – CA: ______________________________

5. VEN – RE – RO – A – TU: __________________________________

H. Discute con tus compañeros cuáles de estos adjetivos describen a los poetas

anteriores y escribe en la columna adecuada. Recuerda que algún adjetivo puede

describir a más de un poeta:

Gloria Fuertes Mario Benedetti Pablo Neruda

____________________ _______________________ ____________________

____________________ _______________________ ____________________

____________________ _______________________ ____________________

I. Banco de datos biográficos

Gloria Fuertes – Nació el 28 de julio de 1917 en Madrid, en el seno de una familia

humilde; su madre era costurera y su padre conserje. A los tres años ya sabía leer y a los

cinco escribía cuentos y los dibujaba. Luego los cosía con hilos para encuadernarlos.

Su madre la matriculó en el Instituto de Educación Profesional de la Mujer en todas las

asignaturas que se consideraban en esta época apropiadas para una mujer: Cocina,

Bordados…, pero ella también se matriculó en Gramática y Literatura.

Page 188: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

188

En 1935 publicó sus primeros versos y dio sus primeros recitales de poesía en Radio

Madrid y Radio España. A partir de ahí no dejó de escribir y es autora de infinidad de

publicaciones de poesía, literatura infantil, teatro y música (canciones para niños)

Mario Benedetti - Nació en paso de los Toros – Uruguay, el 14 de septiembre de 1920.

Estudió periodismo y trabajo el semanario Marcha en Buenos Aires. En 1945 publicó

su primer libro de poemas. La víspera indeleble. En 1953 apareció Quién de nosotros,

su primera novela, pero es el volumen de cuentos Montevideanos (1959) – en los que

toman forma las principales características de la narrativa de Benedetti – el que supuso

consagración como escritor. Con su siguiente novela, La tregua (1960), Benedetti

adquirió proyección internacional; la obra tuvo más de un centenar de ediciones, fue

traducida a diecinueve idiomas y llevada al cine, al teatro, a la radio y a la televisión.

Su amplia producción literaria abarca todos los géneros, incluso famosas letras de

canciones, y suma más de setenta obras.

Pablo Neruda - Nació en Chile, en 1904. Aunque su nombre real fue Neftalí Reyes

Basoalto, desde 1917 adoptó el seudónimo de Pablo Neruda como su verdadero

nombre. Escritor, diplomático, político, premio Nobel de Literatura, premio Lenin de la

Paz y Doctor Honoris Causa por la Universidad de Oxford, está considerado como uno

de los grandes poetas del siglo XX. Militó en el partido comunista chileno y apoyó a

Salvador Allende.

De su obra poética, se destacan títulos como Crepusculario; Veinte poemas de amor y

una canción desesperada; Canto general; Extravagario, Confieso que he vivido, etc.

Intervenções após aplicação de proposta didática

As intervenções aqui percebidas estão basicamente propostas para inicialmente o

avivamento do conhecimento prévio linguísticos e socioculturais que o aluno possui. As

poesias são apresentadas e, através delas, estratégias de abordagem são feitas, tais como

perguntas relacionadas ao vocabulário, interferindo no mundo pessoal e cultural do

aprendiz. As propostas textuais poéticas nos possibilitam trabalhar com a competência

Page 189: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

189

intercultural de maneira simples, comparando elementos característicos de expressões e

formas de ver o mundo.

O professor deve também estar atento às motivações e respostas dadas por cada

aluno, sem fazer muita intervenção, visto que a leitura e acesso à poesia deve ser algo

livre e pessoal. Esta etapa deve favorecer a autenticidade do primeiro contato com a

poesia ou poesias propostas.

A dinâmica proposta anteriormente foi a de querer saber o que os alunos sabiam.

Agora o professor propõe novas estratégias, tais como: responder através de verdadeiro

ou falso a perguntas previamente elaboradas; a provocar o uso de conectivos de opinião;

a relacionar conhecimentos adquiridos e construídos com experiências interculturais; a

aprender a usar adjetivos para qualificar pessoas; a formar vocabulário específico

poético a partir de sílabas; a compartilhar suas experiências de ensino-aprendizagem

com os companheiros de sala; desafios de buscas, construções e formação de conceitos.

O professor deve ser uma ponte entre o aluno e a poesia, porém permitindo que a

ambiguidade e multiplicidade de significados cheguem ao aluno. Ou seja, o professor

pode até dar o significado das palavras, mas nunca os do verso do poema. Essa será

nossa estratégia para provocar o debate, a discussão entre outros elementos que virão

desse contato.

O aluno terá compreendido que seu conhecimento e motivação estão firmes a

partir da proposta do professor como etapa final, onde ele é direcionado a realizar uma

tarefa com os demais companheiros, encontrando adjetivos necessários a cada um dos

três poetas, porém serão alertados de que muitos daqueles adjetivos podem se encaixar a

qualquer um deles. Então, a atenção, troca de saberes e aprendizagens se darão como

elemento sociocultural. Eles poderão, inclusive, fazer uso das fichas biográficas

presentes no “Banco de datos biográficos” para melhorar seu desempenho.

Sendo assim, nos deteremos sobre um dos poetas e propor algumas possíveis

intervenções e propostas didático-culturais (Pablo Neruda):

La poesía de Pablo Neruda "Puedo escribir los versos... “es probablemente una

de las más tristes sobre el amor, da mucho material para la discusión e inspira para

hacer traducciones. Es interesante también desde el punto de vista de la gramática. Así

Page 190: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

190

el verbo "querer" se emplea ora en indefinido, ora en imperfecto. Vamos a ver estos

momentos:

1. Puedo escribir los versos más tristes esta noche. Yo la quise, y a veces ella también

me quiso.

2. Ella me quiso, a veces yo también la quería.

3. Ya no la quiero, es cierto, pero cuánto la quise.

La poesía está impregnada de sentimientos, emociones, recuerdos, no se trata de

hechos o acciones pero los estudiantes pueden imaginar y reconstruir la historia de este

amor infeliz y les inspira este tipo de trabajo.

Considerações finais

Ao propormos “Poesia nas aulas de ELE: Propostas Didático-Culturais”

desejamos refletir em torno das teorias e práticas disseminadas por referenciais teóricos

ao longo dos séculos, bem como analisar metodologias e propostas didáticas para o

ensino e valorização da poesia. Percorremos caminhos que nos direcionaram a reflexão

sobre as produções e materiais didáticos propostos e lições para traçarmos

objetivamente trajetos a serem percorridos para o futuro. Ao concluirmos essa etapa,

confirmamos que é possível e faz-se necessário recorrer ao texto literário, mais

especificamente ao texto poético nas aulas de ELE, por serem eles textos autênticos,

com linguagem e formas específicas, favorecendo-nos diversas dinâmicas e

possibilidades didáticas. Os temas abordados, quase sempre de âmbito universal,

conferem ao texto poético sua aceitação em culturas e espaços diversos, demonstrando a

possibilidade de união entre o texto e o leitor.

O texto poético, pelo seu ritmo, musicalidade e recursos linguísticos que fazem

dele mais belo, é, por si só, um gênero que convida à leitura e à partilha de experiências

e impressões interculturais. Basta despertar e cultivar esta leitura e essa partilha através

de propostas didáticas e metodológicas motivadoras e inovadoras, despertando em cada

um de nós os sentimentos de empodeiramento sobre a poesia.

Page 191: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

191

Ao longo do processo, queremos destacar a grande dificuldade em encontrarmos

textos poéticos que, dentro do possível, pudessem fazer parte de nossas propostas

didático-culturais, mas com esforço e “garimpagem”, fomos encontrando e formando

nossas estratégias de alcance da poesia através do ensino de ELE. As adesões serão

sempre bem-vindas a partir dos objetivos e estratégias pensadas com antecedência, mas

nunca devamos nos esquecer de nos prepararmos para quem nos espera, o aluno. Esse

por sua vez, trás consigo cultura, costumes, saberes entre outros aprendizados que

podem fugir a nossas expectativas. Portanto, cuidemos para que nossos desejos não

sejam excessivos e frustrem nosso maior objetivo que é o de ensinar língua através da

poesia.

Finalmente, depois de teorias, apresentamos nossas propostas práticas sobre a

poesia como estratégias didático-culturais para o ensino de ELE. Elas não estão

acabadas em si mesmas, mas sugerem ao professor caminhos a serem seguidos,

avaliados e adequados a cada realidade, demonstrando que é possível fazer uso da

poesia como proposta didática metodológica, que visa levar o aluno a partilhar de seus

próprios saberes e se abrir para novos saberes, eliminando estereótipos e construindo

conceitos sobre a beleza de viver a poesia.

Referências

ALMANSA, Monguilot A. (1999), “La literatura española en un currículo de

lengua extranjera: algunas reflexiones”, Madrid: Mosaico.

ACQUARONI, Muñoz R. (2007), Las palabras que no se lleva el viento: literatura y

enseñanza de español como LE/L2. Madrid: Santillana.

MALEY, A (1987), “Poetry and song as affective language-learning activities”, en

Rivers W. (ed), Interactive Language Teaching, Cambridge: Cambridge University

Press.

MARTÍNEZ, Sallés M. (1999), “Los retos pendientes de la didáctica de la literatura

en ELE”, Madrid: Mosaico.

MENDONZA, Fillola A. (2009), “Los materiales literarios en la enseñanza de ELE:

funciones y proyección comunicativa”, redEle, 1. [20 de agosto de 2015].

Disponible en la web: http://educacion.es/redele/revista1/mendoza.shtml

NARANJO Pita, M. (1999), La poesía como instrumento didáctico en el aula de

español como lengua extranjera. Madrid: Edinumen.

Page 192: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

192

PAZ, O. (1992), El arco y la lira. México D.F.: Fondo de Cultura Económica.

SANZ Pastor M. (2006), “Didáctica de la literatura: el contexto en el texto y el texto

en el contexto”, Madrid: Carabela.

ZAPATA Lerga Pablo (1996). Proceso al gramaticalismo. La aventura de leer y

escribir. Madrid: Popular.

Page 193: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

193

LOS ANTIPOEMAS DE PARRA: MUNICIONES PARA UNA

INSURRECCIÓN HISTÓRICA Y LITERARIA

Antonio Martínez Nodal 77

PARFOR-UFPA/Instituto Cervantes-Salvador

1 INTRODUCCIÓN

Dialogar sobre el importante poeta chileno Nicanor Parra (1914), equivale

necesariamente a revelar la inaudita revolución literaria que causó la publicación de su

obra prima Poemas y Anti-poemas (1954) en el contexto literario e histórico-cultural de

mediados del siglo XX. Este poemario conquistó al público y a la perpleja crítica

literaria de entonces, ya que emergió al margen de cualquier patrón o modelo lírico

precedente en la literatura, tanto en la hispanoamericana como en el panorama de las

letras universal. La aparición de sus emblemáticos antipoemas se convirtió en baluarte

de la lírica neo-vanguardista y, su rechazo pleno, como tajantemente indica su título, a

todo lo que habitualmente era considerado como forma poética. Su pulso con la poesía

declamatoria precedente articulado en los citados antipoemas, influye, indudablemente,

en la “Generación del 45” y se convierte en base y referencia de la poesía coloquial o

conversacional ulterior (Retamar, 1995). Los antipoemas pudieron ser cuestionados

como género o discurso poético reconocible, pero fueron imprescindibles en relación a

su conexión con un público sediento de realidad y de un diálogo familiar.

El longevo poeta, Nicanor Parra, ganador del Premio Cervantes, a sus 101 años,

construye y desmiembra de forma incesante nuevos elementos poéticos integrados en

una realidad antipoética o cotidiana. Su inagotable búsqueda de nuevos caminos, a

través de la escritura, nos alcanza hasta la actualidad con sus Artefactos Visuales (2002),

que le han cimentado como una de las voces más auténticas, profundas, originales e

inclasificables de la literatura universal:

Nicanor Parra es el poeta de más viva significación en el momento actual de

la poesía chilena y una de las voces más originales de la lírica

hispanoamericana. Su poesía se sitúa en la generación siguiente a las de los

grandes poetas innovadores como Vicente Huidobro o Pablo Neruda.

77

Licenciado en el curso de Letras Portugués-Español en la Escuela Madre Celeste 2014 – ESMAC,

Belém/PA, y actuando como profesor del PARFOR-UFPA y del Instituto Cervantes de Salvador.

Posgrado en Enseñanza de la Lengua Española – UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES. Correo

electrónico: [email protected].

Page 194: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

194

Comenzaba a escribir cuando aquellos eran los poetas resonantes de Altazor

(1931) y Residencia en la tierra (1933). Su iniciación queda marcada por

Cancionero sin nombre (1937) (GOIC, 1992, p. 120).

Parra, aún en pie de guerra como hombre y poeta, fue indicado varias veces al

Premio Nobel, por ser acreedor de una obra transgresora, diversa, única, imprevisible y

rica. Su producción escrita oscila entre una lírica sencilla y popular, como así lo

demuestra su poemario La cueca larga (1958) hasta una lírica absolutamente

iconoclasta y rebelde como en sus Versos de salón (1962) o en Poemas y anti-poemas

(1954), objeto de estudio de esta propuesta de trabajo sobre el autor y punto referencial

en la obra de Parra y para los poetas posteriores hispanoamericanos y españoles.

2 UN CAUDAL PROFUNDO DE LIBERTAD EN LA LÍRICA CHILENA

En el panorama literario de letras hispánicas se suele considerar al escritor Pablo

Neruda (1904) y Vicente Huidobro (1893) como los pilares o modelos poéticos por

excelencia de la poesía Chilena del S. XX, aunque Nicanor Parra podría ser quién

realice el mayor logro entre los poetas chilenos, mediante una lírica rebelde, desnuda de

artificios, edificada con un afán transgresor en el texto y contexto poético

hispanoamericano.

No obstante, fue Gabriela Mistral (1889-1957), Premio Nobel de 1945, la

precursora de la poesía con mayúsculas chilena, previamente al surgimiento de los

antipoemas. Mistral se destacó a principios del S. XX como glorioso modelo a seguir,

debido a su poética sencilla, profunda e imperecedera, abriendo y delimitando una senda

o brecha insondable en la lírica autóctona. Pero, sobre todo, ofreciendo mediante su

obra, la sutil afirmación de la densidad hecha palabra y la palabra bendecida por la

poesía, la cual, muchos compatriotas poetas y lectores acogieron solícitos durante varias

décadas. El concepto de poesía que influyó en la poética chilena posterior es descrito en

palabras de la propia autora:

La poesía es en mí, sencillamente, un regazo: un sedimento de la infancia

sumergida: Aunque resulta amarga y dura la poesía que hago me lava de los

polvos del mundo y hasta de no sé qué vileza esencial parecida a lo que

llamamos el pecado original, que llevo conmigo y que llevo con aflicción.

Tal vez el pecado original no sea sino nuestra caída en la expresión racional y

arrítmica a la cual bajó el género humano y que más nos dude a las mujeres

por el gozo que perdimos en la gracia de una lengua de intuición y de música

que iba a ser la música del género humano (MISTRAL, 1965, p. 1-3).

I

Page 195: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

195

En otra línea de pensamiento y de conceptualización poética, Parra emprende

diversas lides armado de la palabra común. Se aleja de la óptica lírica de Mistral y

disputa con una realidad adversa, provista de un discurso directo, crítico-social e

desasosegante, fruto de un mundo moderno que le trastorna, desestabiliza y le impulsa a

rebelarse mediante los destacados antipoemas. El discurso hipercrítico y deformante se

encontraba hasta entonces oculto en las voces poéticas de la lírica de movimientos

vanguardistas o proclives al deleite poético previos: desde el “creacionismo”78

de

Vicente Huidobro y la poesía humana al servicio de las ideas, liderada por la voz

inmensa del Nobel Pablo Neruda (1904). A pesar de las diferencias, nunca

irreconciliables, como demuestra la admiración mutua entre Neruda y Parra, la poesía

chilena del S. XX a grandes rasgos apunta caracteres comunes que conviene apuntar:

[…] su ánimo rupturista, que consiste en rechazar las formas mitológicas de

contención a partir de un entendiendo de la crisis del concepto de realidad, de

un restablecimiento de las anécdotas trascendentes como formas de expresión

del mundo, borrando paulatinamente las fronteras entre el yo y las cosas. No

son menos importantes otros rasgos definitorios tales como la afirmación de

lo coloquial, en oposición a un lenguaje a menudo vanilocuente que sus

practicantes y adeptos consideraron un valor en sí. A partir de allí solían ver

algunos la poesía como una suerte de reprochable desorden del conocimiento

(CALDERÓN, 1970, p. 8).

Hay una ruptura con los géneros literarios y construcciones anquilosadas,

herméticas o impregnadas de voces uniformes, quebrándose tabús y barreras de género

que ceden paso a la verdad, el grito, el canto y la libertad poética: “La interpretación de

los géneros literarios, mediante una destrucción de lo lírico como mera tradición

inferida y obligatoria, es una actitud constante en la verdadera poesía nacional”

(CALDERÓN, 1970, p. 7-8). La antipoesía supone una ruptura que conlleva inevitables

confrontaciones literarias, algunas de las cuales nos disponemos a analizar a

continuación.

3 ANTIPOEMAS, ANTI-NERUDA Y EL PASO A LA POESÍA COLOQUIAL

A el radical bautizo de Parra de su novedoso ejercicio poético denominándolo

“antipoema”, rápidamente, tras su publicación, se le añadió el epíteto o símil de “anti-

Neruda”, por ser Parra el primer gran poeta en Chile, que se opone a la venerada forma

78

Denominada así porque al exponerla su promotor había insistido en que “la primera condición del

poeta es crear, la segunda crear, y la tercera, crear (HUIDOBRO, 1914 apud GONZALO, 1999, p.32).

Page 196: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

196

lírica preponderante marcada durante años por Pablo Neruda. Paradójicamente, Neruda

admira y ensalza la obra de Parra, cuyo tono, y procedimientos de la antipoesía adoptó

en una obra posterior tras la eclosión de los antipoemas, específicamente, en su libro

Estravagario (1958). A pesar de sus distancias evidentes de estructura y contenido en la

obra de ambos autores, los dos escritores también poseen en común un romanticismo

furioso y desaforado, aunque la inspiración de sus musas y objetivos poéticos no puedan

ser más dispares. Cuando Parra es instigado a declarar una opinión sobre Neruda, su

respuesta es simple: “Admiración y respeto religioso por el hombre y por su obra”

(TEILLER, 1968, p. 78-80). Ante la insistente declaración de poesía nacida como

oposición a la palabra incontestable de Neruda, Parra responde, esclareciendo esta

discusión en una entrevista realizada por BENEDETTI (1971, p. 303).

[…] Neruda está allí como un marco de referencia. Más tarde la cosa ha

cambiado. Neruda no es el único monstruo de la poesía; hay muchos

monstruos. Por una parte hay que eludirlos a todos, y por otra, hay que

integrarlos, hay que incorporarlos. De modo que si esta es una poesía

antiNeruda, también es poesía antiVallejo, es una poesía antiMistral, es una

poesía antitodo, pero también es una poesía en la que resuenan todos estos

ecos; de modo que no sé si es realmente justo decir que en la actualidad la

antipoesía se puede definir exclusivamente en términos de Neruda.

Si algo distancia la antipoesía del maestro Neruda es la ausencia de aspectos

figurativos, simbolistas, grandes imágenes de tierra, naturaleza y desaforados

sentimientos, que el gran poeta no puede evitar revivir y que abundan e inundan la

poesía profusa del escritor de Veinte poemas de amor y una canción desesperada

(1924). Esa perspectiva sobredimensionada o trascendental de Neruda se aleja de Parra,

puesto que

La antipoesía se define como tal, en primer lugar, por su antiretoricismo.

Rechaza la imagen visionaria y la visión características de la vanguardia

poética que dan al lenguaje de la lírica la condición de una lengua especial. Si

llega a emplearlas les confiere dos dimensiones particulares: una, que

conduce a lo cómico y, otra, la paradoja y el sinsentido […] Desde la

expresión literaria o científica, hasta el improperio vulgar, caben en la

selección lexical abierta de la antipoesía (GOIC, 1992, p. 120-122).

Lo más importante es no tomar demasiado en serio la etiqueta de antipoema

ideada por Parra, puesto que la negación evidente de su prefijo no se opone de ningún

modo a la expresión poética, ni intenta, como el mismo autor confiesa, crear un

enfrentamiento poético o ideológico con Neruda u otras formas clásicas de la lírica

precedente. Si realizamos un análisis morfológico elemental del término acuñado por

Page 197: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

197

Nicanor Parra (1954) como “antipoesía”, llegaríamos a la conclusión de que esta

demarcación no tiene razón alguna de existencia, dado que, en su carácter terminológico

impreciso y ligeramente incoherente, radica la partícula negativa previa señalada con su

prefijo –anti, anteponiéndose a su raíz, “poesía”, por lo que de forma evidente estamos

declarando entonces la inexistencia de la lírica como tal, algo fuera de toda lógica, al

tratarse este experimento literario de un nuevo concepto y ejecución de la poesía del S.

XX. El autor, solo intenta abrir nuevas posibilidades al lenguaje poético, nuevas líneas o

cauces significativos, próximos a la realidad no explorados hasta entonces.

Pero por el mero hecho de ser, ninguna poesía es antipoesía: la única

verdadera antipoesía no se escribe. Sin embargo, la antipoesía, como en su

caso la antinovela, es anticierto tipo de poesía. Con respecto a Parra, como

varios autores vieron desde el primer momento, se trata de la poesía

antiNeruda. Eso quiere decir que no se entiende del todo la función de la

poesía de Parra si no se está algo familiarizado con la poesía caudalosa,

pretenciosa de Pablo Neruda, que en la época era el poeta sobreviviente más

importante de la generación vanguardista en nuestra lengua (RETAMAR,

1995, p. 163).

Es conveniente, sin embargo, esclarecer las convergencias esenciales de estas

dos perennes voces chilenas. Las principales diferencias entre uno y otro radican en que

el héroe Nerudiano es superlativo, excepcional, solemne, grandioso, trágico, un ego

creador, terrestre y angustiado. Por el contrario, el personaje de los antipoemas de Parra

es “antiheróico”, no ser revela como centro del mundo, su posición vital se ha

relativizado, es un hombre cualquiera que hace uso de un diálogo cercano. El mundo de

Neruda es “acultural” e anti-intelectual, siempre es parte de la tierra, naturaleza que lo

envuelve, evocación constante, padecimiento que le sobrepasa y una pasión que

impregna cada palabra de su poesía. El mundo de Parra, por el contrario, se nutre de su

espíritu luchador, situación en contextos determinados y reconocibles, donde emergen

hombres del mundo cotidiano con una lucidez esquizofrénica y la conciencia

esencialmente humana en sus antipoemas. Ajenos a comparaciones, la antipoesía,

Este “nuevo tipo de amanecer poético” consistía en introducir en el lenguaje

poético el lenguaje de la conversación, desacralizar la figura del poeta y usar

la ironía y la risa de forma sarcástica. El autor chileno invita a los poetas a

bajarse del Olimpo para habitar en el mundo cotidiano y escribir con el

lenguaje de todos los días (ALEMANY, 1997, p. 35).

Y ese descenso a una realidad cotidiana, coloquial y tan familiar nos instiga a

discutir sobre los encuentros y desencuentros entre la poesía conversacional y los

Page 198: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

198

antipoemas (RETAMAR, 1995) que evidencian la importancia y confluencia de la obra

de Parra en la poesía contemporánea actual.

4 ANTIPOESÍA VERSUS POESÍA CONVERSACIONAL

La poesía coloquial o conversacional no se trata de un mero desencadenante de

generaciones o tendencias anteriores, ya que posee un sentido definitorio y crítico

propio que libera y proyecta un mensaje exclusivo, natural, cercano, acompañando a su

búsqueda constante y de deliberada experimentación:

[…] la poesía coloquial no radica en una mera continuación o desarrollo de

las manifestaciones poéticas señaladas anteriormente, ni puede reducirse a un

simple instrumento, pues, lo cierto es que rompe con los moldes

preestablecidos, como es el caso de la creación de "artes poéticas" muy

personales. Es otra forma de escritura fundada en la exploración del potencial

lingüístico que no convierte al mensaje en único foco de atención sino que

activa otros factores de la comunicación, básicamente el referente y el

receptor y en este sentido, fractura el canon poético establecido

(JAKOBSON, 1975 apud ANDRADE, 2010, p. 188, 189).

Es imprescindible apuntar que el grupo de poetas que componen este esfuerzo

conversacional de escribir una novedosa lírica de calidad, aunque, mediatizada por su

evidente lenguaje popular, fue rico y heterogéneo. Formado por un conjunto de literatos

ilustre, del cual participaron autoridades poéticas de diversas nacionalidades de

Hispanoamérica, apropiándose de un lenguaje osado e inclasificable, valiente y

personal; ya que en él mismo tienen cabida lo erótico, humorístico, espontáneo y

comunicante.

Estos escritores, Sabines, Dalton, Cardenal, Benedetti, Salazar Bondy,

Gelman, Urondo, Fernández Retamar, Cisneros, etc., buscan en última

instancia la revelación de la realidad, un efecto poético espontáneo que sin

escapar de la estética hable con voz propia de la inmundicia; la poesía se

viste de humilde decencia cotidiana para manifestarse contra la injusticia, sin

renunciar por ello a una cuidada elaboración formal y a temas cargados de

intimidad (ALEMANY BAY, 2006, p. 161).

Sin embargo, este movimiento, realmente comienza a manifestarse hacia finales

de la década de los años cincuenta, emergiendo plenamente en la década del 60. Entre

los poetas del llamado conversacionalismo lírico se destacan: el chileno Enrique Lihn

(1929), el argentino Juan Gelman (1930) o el poeta y crítico cubano Fernández Retamar

(1930); y del conversacionalismo más objetivo y documental con tres libros del

reconocido autor nicaragüense Ernesto Cardenal (1925), que pueden servir como

Page 199: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

199

exponentes de su irrupción lírica desmitificadora: Hora cero (1960), Epigramas (1961),

y Oración por Marilyn Monroe (1965). Pero, anteriormente, se debe subrayar otra

vertiente enfrentada en la lírica, como ya mencionamos, la denominada “antipoesía” del

chileno Nicanor Parra, quien creó y desarrolló una poética en oposición al maestro

universal de la poesía, el célebre chileno Pablo Neruda (1904) y su reconocible tono

solemne y eminente, con sus Poemas y anti-poemas (1954). Parra aglutina la llamada

“antipoesía”, que puede considerarse como una variante reveladora del

conversacionalismo, aunque de ninguna manera sean corrientes poéticas equivalentes.

Ambas no están exentas de puntos comunes y, del mismo modo, de reconocibles

diferencias formales y expresivas, por lo cual, sus encontrados caracteres poéticos

deben consecuentemente ser esclarecidos.

Decisivamente, todos los aspectos previos discutidos nos estimulan a reflexionar

en relación con la ponderación discursiva básica de que la antipoesía confronta a la

poesía conversacional, a pesar de sus caracteres adyacentes.

Evitar el discurso polémico con relación a estas dos líneas literarias puede

resultar harto complicado, pero lo indudable es el carácter de primicia de las sendas

poéticas en la década del 50 que tendrá continuidad y su confirmación poética en la

década siguiente. Para dar inicio a este cuestionamiento es preciso determinar el

parentesco y la división de estos revolucionarios modos de ver y ejercer la poesía, “dos

vertientes de una cosa, quizá constituyan la novedad más visible de la poesía

hispanoamericana desde hace diez o quince años” (RETAMAR, 1995, p. 159). En

palabras del poeta, la definición de antipoesía de forma general consistiría en:

La antipoesía es una lucha libre con los elementos, el antipoeta se concede a

sí mismo el derecho a decirlo todo, sin cuidarse para nada de las posibles

consecuencias prácticas que pueden acarrearle sus formulaciones teóricas.

Resultado: el antipoeta es declarado persona no grata. Hablando de peras el

antipoeta puede salir perfectamente con manzanas, sin que por eso el mundo

se vaya a venir abajo. Y si se viene abajo, tanto mejor, ésa es precisamente la

finalidad última del antipoeta, hacer saltar a papirotazos los cimientos

apolillados de las instituciones caducas y anquilosadas (BENEDETTI, 1969,

p. 108).

Esta negación ambigua e intencionadamente sediciosa del propio concepto de

poesía es obviamente una falacia, ya que realmente su definición será revelada en el

enfoque de su propuesta textual, ensayo en la perspectiva intima que el poeta ofrezca a

su palabra y, en consecuencia, a sus antipoemas. “Sin embargo, negación de poesía es el

Page 200: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

200

mundo que ve el poeta, no su mirada. Parra inventa el antipoema para flagelar el mundo

con sus propias armas, para lidiar con él en su terreno” (BENEDETTI, 1969, p. 111).

La antipoesía de alguna forma se contrapone a las vanguardias anteriores e

intenta escapar de conflictos coherencia o significado. Podemos, sin embargo, reconocer

como característica general de esta, el “prosaísmo” y la introducción del elemento

coloquial, que como ocurre con la citada línea poética y con la conversacional, tiene

semejanzas claras e, igualmente, diferencias axiomáticas.

[…] “son los "prosaismos", los momentos en que la poesía se acerca

voluntariamente a la prosa, o al coloquio, que no es lo mismo: la prosa es

también una forma de escribir; el coloquio, la conversación, es lo que

hablamos habitualmente” (RETAMAR, 1995, p. 168).

Para Fernandez Retamar, la antipoesía es la base o el espejo donde se reconoce

la poesía conversacional, esta última de carácter posmodernista, si nos atenemos al

periodo literario que la antecede. La poesía conversacional parte de un carácter

eminentemente positivo y productivo en su discurso poético; primera diferencia notable

con la antipoesía, demarcando solo la primera de otras muchas discrepancias que

pasamos a enumerar a continuación:

[…] En segundo lugar, la antipoesía tiende a la burla, al sarcasmo; la poesía

conversacional tiende a ser grave, no solemne, aunque no excluye el humor.

En tercer lugar, la antipoesía tiende al descreimiento ("escéptica", decía

Ángel del Rio, era la poesía de Campoamor: ¿y qué decir de la de Parra?). La

poesía conversacional tiende a afirmarse en sus creencias, que en algunos

casos son políticas y, en otros, religiosas, o ambas. En cuarto lugar, aquellas

características (burla, descreimiento) dan a la antipoesía un sentido

demoledor, con el cual se vuelve con frecuencia al pasado; en la poesía

conversacional (aunque también, llegado el caso, es crítica del pasado) hay

evocaciones con cierta ternura de zonas del pasado y, sobre todo, es una

poesía que es capaz de mirar al tiempo presente y de abrirse al porvenir. En

quinto lugar, la antipoesía suele señalar la incongruencia de lo cotidiano; la

poesía conversacional suele señalar la sorpresa o el misterio de lo cotidiano.

En sexto lugar, la antipoesía tiende a engendrar una retórica cerrada sobre sí

y fácilmente transmisible; la poesía conversacional, por su parte, es más

difícilmente encerrable en formulas, y por ahora no parece tender tanto a

encerrarse sobre si, sobre su propia retórica, sino a moverse hacia nuevas

perspectivas (RETAMAR, 1995, p.174).

La lírica de la transgresión de textos universales es lo que representa la

antipoesía. Su carácter se torna destructivo, combativo, inverosímil y anti tradicional

“consiste en presentar un texto positivo, quizás hermoso, sagrado y consagrado, y

Page 201: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

201

prolongarlo en tal forma que resulta contradicho o alterado real o aparentemente su

sentido” (BRUNET, 1994, p. 17).

El anti-poeta es primordialmente un luchador, un púgil de la palabra, el

provocador nato que hace uso y desuso del poema sin obstáculos o interferencias

lingüísticas o temáticas, afrentando al poema y su sentido lírico, añadiendo humor a

mansalva en su discurso, con plena libertad en sus formulaciones, explosivo en sus

valientes propósitos y despropósitos poéticos.

La ironía y el absurdo, por consiguiente, se adhieren a una burla hacia lo sagrado

y a una desmitificación de las grandes hazañas pasadas. Géneros cultos son

ridiculizados de manera vergonzante, como sucede con las odas79

, normalmente escritas

y declamadas como alabanzas a alguien o algo. El poder y divinidad se alteran y

desacreditan de tal forma que alcanzan matices ilógicos, altamente humorísticos,

insólitos en el contexto de la lírica, hasta llegar a límites paródicos.

Es un proceso de degradación que lleva incluso a la supresión del Yo lírico,

entendido como sujeto estructural del poema […] Es un juego de aceptación

(aparente) y de rechazo (real) de lo recién aceptado y hasta propuesto como

ideal. Ello desconcierta, sorprende, causa risa, irrita, hace pensar al lector

[…] El poeta, en fin, cansado de la poesía en uso, destruye el lenguaje

convencional y propone un texto alterador de la escritura normal e

inteligible” (BRUNET, 1994, p. 19-21).

La antipoesía emerge como la antítesis de la poesía transcendental, cuyo gusto

por lo místico y metafísico es inherente a su carácter poético definitorio, tan

característica de los poetas post-vanguardistas, como ejemplifica el autor cubano José

Lezama Lima (1910), que poseen:

[…] la voluntad de crear o fabular una realidad transcendente […] Los poetas

más puramente trascendentalitas tratan de expresar la realidad sin

interpretaciones lógicas ni sentimentales, no tratan de desentrañarla, sino de

presentarnos su misterio, de ahí que el resultado produzca un hermetismo casi

total (GONZALO, 1999, p. 60).

Uno de los caracteres propios que más acercan la antipoesía a la poesía

conversacional se refiere a la búsqueda constante del ingrediente lírico (con la dificultad

que conlleva encontrar un halo bucólico, en por ejemplo, “unos huevos pasados por

79

“Qué divertidas son Estas palomas que se burlan de todo, Con sus pequeñas plumas de colores Y sus

enormes vientres redondos. Pasan del comedor a la cocina Como hojas que dispersa el otoño Y en el

jardín se instalan a comer Moscas, de todo un poco, Picotean las piedras amarillas O se paran en el lomo

del toro: Más ridículas son que una escopeta O que una rosa llena de piojos” (PARRA, 1954, p. 62).

Page 202: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

202

agua”) en la vida diaria, el suceso cotidiano, para de ese modo aproximar a la lengua

tradicional el lenguaje poético. Una lectura global clave de esta nueva dimensión lírica

consistiría:

En primer lugar en el anti-retoricismo*. Para él la lengua poética no es una

lengua especial. El hace de toda clase de discurso poético. Ningún elemento

lingüístico (adjetivos, verbos, palabras sugerentes) cobra especial relieve en

la lengua antipoética. La unidad lingüística predominante es la oración

enunciativa con sus elementos dispuestos siempre en el mismo orden: Sujeto

– Verbo – Predicado, lo que provoca una premeditada monotonía. Otro rasgo

distintivo es la asociación libre de oraciones, frases hechas y estereotipos del

lenguaje en general. En cuanto al plano del sonido, el ritmo sólo destaca en la

poesía neo-popular de La cueca larga (1958). Por lo que se refiere al léxico,

en la antipoesía caben desde la expresión literaria o científica (sometidas a la

parodia o la burla) hasta el improperio vulgar (GONZALO, 1999, p. 62).

Al imponerse la desproporción como pauta devastadora creativa, se opta por un

tipo de lucha inaudita frente al orden establecido, un rechazo radical en el contexto

internacional, tanto en Europa como en Norteamérica, revolución que algunos

denominaron como “contracultura”80

, que intenta fervorosamente unir lo popular y

culto, los criterios poéticos convencionales frente a una creación estética bizarra:

Hay una singular conexión entre la antipoesía de Parra y los intentos por

desterrar el lenguaje poético como algo aparte del cotidiano en el que se

empeñaron los miembros de la generación beat norteamericana, Con Allen

Ginsberg y Lawrence Ferlinghetti a la cabeza. En su viaje a Chile de 1962,

invitado al Encuentro Internacional de Escritores de Concepción organizado

por Gonzalo Rojas (20.1.4), Ginsberg conoció a Parra y se interesó por su

poesía: era, en español, algo similar a lo que él y sus compañeros estaban

intentando en inglés (OVIEDO, 2002, p. 144).

La afinidad entre ambas tendencias radica en su profunda repugnancia y rechazo

hacia los valores del siglo XX, su decadencia y a una crisis de valores acuciante. La

diferencia principal entre los antipoemas y los poetas beatnik reside para BENEDETTI

(1969) en que los antipoemas son destructivos, flagelan al mundo con su apuesta lírica,

son “negadores universales”, lo provocan y lo reivindican con veracidad y humorismo y

burla. De forma opuesta, el poeta beatnik, se auto-flagela, su tono es desalentador, su

80

[...] contracultura abarca toda una serie de movimientos y expresiones culturales, usualmente juveniles,

colectivos, que rebasan, rechazan, se marginan, se enfrentan o trascienden la cultura institucional. Por otra

parte, por cultura institucional me refiero a la dominante, dirigida, heredada y con cambios para que nada

cambie, muchas veces irracional, generalmente enajenante, deshumanizante, que consolida el status quo y

obstruye, si no es que destruye, las posibilidades de una expresión auténtica entre los jóvenes, además de

que aceita la opresión, la represión y la explotación por parte de los que ejercen el poder, naciones

corporaciones, centros financieros o individuos (AGUSTÍN, 1996, p. 126).

Page 203: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

203

poesía es amarga, impotente, se muestran ya vencidos ante esa realidad que tanto

detestan.

Previo a las conclusiones de este estudio, conviene apuntar o conocer algunos de

los antipoemas más celebres e ilustres de la obra de Nicanor Parra (1954), cabe

destacar: “El túnel”, “La víbora”, “La trampa” y “Soliloquio del individuo”, que

representan el melodrama cotidiano de una forma brutal. Debido a la extensión y densa

interpretación de las poesías referidas, nos limitaremos a considerar el final del primer

poema señalado, “El túnel”, poema o antipoema sumamente importante en esta esencial

obra, porque refleja con su discurso avasallador una crítica deformante del poder

burgués, mandato establecido y representado en el texto por las parientes del propio

autor, unas terribles ancianas tácitamente desvalidas con quienes vivió sometido a su

autocracia durante cuatro años. “El túnel”81

simboliza esos pavorosos años de miseria

existencial. El poeta sufre las decisiones de esos maquiavélicos seres, los cuales traman

decisiones en su cuarto interior de la casa, que aísla y discrimina de la infectada realidad

al joven familiar, espacio simbólico de “las brujas” disfrazadas de frágiles señoras,

caracteres maquiavélicos que dirigen todas sus argucias mediante el uso constante de su

relación sanguínea, que se valen de padecimientos intolerables como falsa moneda de

cambio, aprovechándose así de la benevolencia de joven crédulo y, provocando

intencionadamente en el proceso, el sufrimiento de su desvalida víctima y sobrino: “[…]

Aquellas matronas se burlaron miserablemente de mí/ Con sus falsas promesas, con sus

extrañas fantasías/ Con sus dolores sabiamente simulados […]”.

Ya convertido casi en un peón, enredado en la tela de araña de esas tres arpías,

casi de cuento gótico, el anti-héroe kafkiano se convierte en su “animal de carga”,

penitente y solícito. El joven e inocente universitario renuncia a su libertad de

movimiento y raciocinio, se convierte en su vasallo, morando bajo su dominio absoluto:

“[…] Lograron retenerme entre sus redes durante años/ Obligándome tácitamente a

trabajar para ellas/ En faenas de agricultura /En compraventa de animales […]”.

El engaño se mantiene durante largo tiempo, hasta que un día “mirando por la

cerradura” el velo de la verdad cae instantáneamente y el sobrino descubre el cruel

engaño al cual fue sometido al finalizar el poema. El acto de mirar a través del ojo de la

cerradura, metáfora axiomática del “ojo de la realidad”, pone al descubierto a unas

mujeres ajadas y perversas, seres aparentemente indefensos, que realmente fingían

81

PARRA, N. Poemas y anti-poemas. Santiago de Chile: Nascimento, 1954, p. 114–120.

Page 204: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

204

enfermedades y concebían ilusorias promesas como formas de coacción emocional o de

extorsión, esgrimiendo su debilidad en silencio, de puntillas, sabiamente, como un arma

de poder psicológica y dictatorial:

[…] Hasta que una noche, mirando por la cerradura

Me impuse que una de ellas

¡Mi tía paralitica!

Caminaba perfectamente sobre la punta de sus piernas

Y volví a la realidad con un sentimiento de los demonios.

El antipoema en su plano simbólico nos permite comprender que el espacio

vivencial, o más bien, de supervivencia ante un entorno adverso de “El Túnel” contiene

las relaciones primarias de nuestro propio espacio cotidiano, de nuestra

contemporaneidad.

Los valores, grandes valores de pequeños hombres, entonces se transmutan

frente a los sistemas de poder en una farsa que solo intenta controlar y someter al

individuo más débil, valiéndose de cualquier arma o estratagema. En este poema, la

tiranía filial o de sangre le relega hasta el último escalafón de la jerarquía familiar y

social:

En la medida en que la antipoesía implica un ataque frontal a las creencias

básicas en las que se apoya la civilización tal y como la conocemos, es una

forma de “poesía social”, pero con la diferencia de no propone alternativas:

es la tarea destructora de un petardista que está en contra de todo, incluso

contra sí mismo. La antipoesía es una subversión explosiva, sin militancia

(OVIEDO, 2002, p. 148).

Este posicionamiento tan afilado, su ironía, el profundo enfoque psicoanalítico,

la falta de respeto y matiz demoledor de su discurso, aunque represente solo una

caricatura, es lo que más le aleja de la poesía conversacional. Esta última,

contrariamente, evidencia una esencia constructivista, objetiva, tristemente luminosa,

una reiterada crítica social, pero, con un afán utópico de cambio, repleta de humor hacia

uno mismo y, por tanto, muy alejada de esa representación nihilista de la antipoesía.

[…] la antipoesía no consiste únicamente en adoptar un tono conversacional,

unas palabras de familia o el vocerío de la plaza pública. La antipoesía

consiste también en la incorporación de la “savia surrealista” que deja al

hombre abierto en canal sobre la mesa de disecciones. Intento que tampoco

es exclusivo de la tradición vanguardista latinoamericana, aunque sea tardía.

Jaques Prévert en Francia con su Paroeles, Hans Magnus Enzengsberger en

Alemania con sus Poesías para los que no leen poesías e incluso nuestra

Page 205: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

205

Gloria Fuertes, inmersa en el pos vanguardismo “postista”, constituirán

algunos ejemplos de proyectos poéticos muy cercanos al de nuestro poeta

chileno (SALVADOR, 2002, p. 104).

Siendo, aun así, indiscutible el uso de un lenguaje afín entre las dos tendencias,

como también fue mutua una esperanza transformadora; cada una, indudablemente,

ostenta una óptica particular, la conversacional, ejemplar, la antipoesía, deformante; la

primera hace uso de un discurso leve y la segunda tremendista, delimitando así los

caminos poéticos a seguir por ambas:

A pesar de las objeciones queremos dejar claro que sí existen diferencias

entre la antipoesía y la poesía conversacional, pero que éstas no son tan

sustanciales como para desestimar las relaciones evidentes entre la poesía de

los coloquiales y la de Nicanor Parra que señalábamos más arriba. Desde

nuestro punto de vista, Parra fue de alguna forma el precedente inmediato de

la poesía del “nuevo realismo” que se forja en los 60 y su obra, al menos la

publicada en los años 50 y 60, podría ser considerada como una variante de

ese nuevo realismo (ALEMANY BAY, 1997, p. 42, 43).

La base amoral y opción estética aúnan un mismo recorrido en la poesía

conversacional ante la posibilidad de leerse, mofarse de uno mismo, encontrarse por fin

en unas planas verdaderas de su experiencia diaria, en esta ocasión con un carácter

sorprendentemente poético. El elemento grotesco y paródico, la mirada siempre en el

presente, la visión humana de un protagonista insignificante en apariencia, por fin tiene

cabida en la poesía coloquial, favoreciendo a que el “yo” lírico se funda con el

sentimiento colectivo, esta vez, para quedarse.

5 CONCLUSION

Constatamos en esta investigación que Nicanor Parra, Premio Nacional de

Literatura (1969), fue un agente revulsivo y creador de múltiples líneas esenciales

puestas en práctica en la poesía actual, gracias, en parte, a sus antipoemas.

Mediante el análisis realizado en este estudio verificamos la posición esencial y

referencial de Parra entre las voces poéticas chilenas e hispanoamericanas. Y,

finalmente, al confrontar y realizar paralelismos esenciales entre la antipoesía y poesía

conversacional, verificamos que a través del uso de un lenguaje coloquial en las dos

tendencias (antipoesía/conversacional), confluye como acicate de una esperanza

transformadora; cada una, indudablemente, ostentando una óptica particular, la

conversacional, ejemplar; la antipoesía, deformante; la primera hace uso de un discurso

Page 206: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

206

leve; y la segunda tremendista, delimitando así los caminos poéticos a seguir por ambas

tendencias complementarias en el panorama literario contemporáneo.

Los antipoemas y los recursos innovadores que integran su valiente apuesta

lírica, son desenvueltos con tremenda lucidez por Parra en la obra fundamental del

presente estudio, Poemas y anti-poemas (1954), lo que nos lleva a esclarecer que

Parra fue de alguna forma el precedente inmediato de la poesía del “nuevo

realismo” que se forja en los 60 y su obra, al menos la publicada en los años

50 y 60, podría ser considerada como una variante de ese nuevo realismo

(ALEMANY BAY, 1997, p. 39).

Persona y personaje, poeta y anti-poeta, Nicanor Parra ha contribuido a

revitalizar y renovar profundamente los modelos y singularidades de la escritura

presente, desarrollando hasta sus posibilidades extremas algunas líneas abiertas (o

reabiertas) durante la eclosión de las vanguardias europeas y sudamericanas.

Su particular concepción de la lírica como “antipoesía” le ha permitido

practicar, satirizar, transformar y deslegitimar múltiples estilos, géneros,

temas procedimientos y autores reconocidos, en un vertiginoso proceso de

crítica y autocrítica incesante, a veces imposible de seguir por parte de los

lectores y de la crítica por la imprevisibilidad y variabilidad de sus

movimientos (CARRASCO, 1999, p. 10).

En la proclama del título del presente artículo, proveyendo la designación a los

antipoemas como “municiones para una insurrección histórica y literaria”, se acentúa el

resultado de un desafío febril emprendido por Parra más allá de una intencionada

revolución poética: “el antipoema es un conglomerado de artefactos a punto de

explotar” (PARRA, 1971, p. 302). Y, bajo esos campos de minas que en cualquier

momento inadvertidos podemos pisotear, se oculta la definición poética del autor

chileno, la palabra irreflexiva y rotunda que corrobora la fundamental imprevisibilidad

de los antipoemas, puesto que su escritura y lectura va desencadenado una explosión, la

convulsión verdadera y única que puede desatar la propia realidad inserida en un poema.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGUSTÍN, José (1996). La contracultura en México. México: Grijalbo.

ALEMANY BAY, Carmen (2006). Residencia en la poesía: poetas latinoamericanos

del siglo XX. n.13. Murcia: Cuadernos de América sin nombre.

Page 207: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

207

ALEMANY BAY, Carmen (1997). Poética coloquial hispanoamericana. Alicante:

Universidad de Alicante.

BENEDETTI, Mario (1971). Antología de la poesía chilena contemporánea. Apéndice:

Nicanor Parra o el artefacto con laureles. Santiago de Chile. Editorial Universitaria.

__________ (1969). Letras del continente mestizo. 2. ed. Montevideo: Arca.

BRUNET, Hugo Montes (1994). Int: Poesía y Antipoesía. Madrid: Castalia.

CALDERÓN, Alfonso (1971). Antología de la poesía chilena contemporánea.

Santiago de Chile: Editorial Universitaria.

CARRASCO, Iván (1999). Para leer a Nicanor Parra. Chile: Universidad Nacional

Andrés Belló.

GOIC, Cedomil (1992). Los mitos degradados. Ensayos de comprensión de la

literatura hispanoamericana. Amsterdam – Atlanta: Rodopi.

GONZALO, Carmen (1999). Iniciación a la literatura hispanoamericana del Siglo

XX. Madrid: Akal.

JAKOBSON, Roman (1975). Con respecto a los factores de la comunicación. vid.,

Ensayos de Lingüística general, trad. José M. Pujol y J. Cabanes. Barcelona: Seix

Barral.

MILLARES, Selena (2011). De Vallejo a Gelman: un siglo de poetas para

Hispanoamérica. n. 29. Alicante: Cuadernos de América sin nombre.

MISTRAL, Gabriela (1965). Páginas en prosa. Buenos Aires: Editorial Kapelusz, 2.

ed. p. 1-3.

OVIEDO, José, Miguel (2002). Historia de la literatura hispanoamericana 4. De

Borges al presente. Madrid: Alianza Universidad textos.

PARRA, Nicanor (1994). Poesía y Antipoesía. Madrid: Castalia.

__________ (1954). Poemas y Anti-poemas. Santiago de Chile: Nascimento.

__________ (1981). Antipoemas. Antología (1944-1969). 3. ed. Barcelona: Seix

Barral.

__________ (2002). Artefactos visuales. Chile: Universidad de Concepción.

RETAMAR, Roberto, Fernández (1995). Para una teoría de la literatura

hispanoamericana. Santafé de Bogotá: Publicaciones del instituto Caro y Cuervo.

Page 208: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

208

SALVADOR, Álvaro (2002). Espacios, estrategias, territorios. Algunas

aproximaciones a la literatura hispanoamericana del siglo XX. México, D, F:

Universidad Nacional Autónoma de México.

TEILLER, Jorge (1968). Antientrevista con Nicanor Parra: viaje por el mundo de

nicanor parra. En: Árbol de Letras. n. 8, p.78-80.

Page 209: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

209

GUÍA PRÁCTICA PARA SOBREVIVIR Y DISFRUTAR DEL

MUNDIAL DE BRASIL: ESTUDO DA ARGUMENTAÇÃO EM

PUBLICAÇÃO DO JORNAL ESPANHOL EL MUNDO

Carla Severiano de Carvalho

UNEB

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Alguns temas (realização de eventos esportivos mundiais, crises financeira e

política, epidemias sanitárias, entre outros) tem colocado o Brasil em evidência na mídia

internacional nos últimos tempos. São inúmeras as narrativas jornalísticas produzidas

em todo o mundo sobre o Brasil.

Na Espanha, tal repercussão não é diferente. Os principais formadores de

opinião daquele país (jornais como ABC, El País e El Mundo) vem publicando de forma

crescente nos últimos anos diversas notícias, crônicas e reportagens realizadas por seus

correspondentes no Brasil, retratando fatos, experiências e diferentes aspectos do país

sulamericano.

O presente artigo pretende, pois, analisar sob a ótica da argumentação a

construção discursiva sobre o Brasil em publicação do jornal espanhol El Mundo no ano

de 2014, ano de realização do Mundial de Futebol FIFA no Brasil. A publicação

intitulada Guía práctica para sobrevivir y disfrutar del mundial de Brasil, é uma

reportagem realizada pela jornalista espanhola Yasmina Jiménez e versa sobre algumas

recomendações para viajar ao Brasil durante o período do campeonato mundial de

futebol. (Ver anexo A).

Nessa perspectiva, o estudo da argumentação no artigo jornalístico referido

apoia-se principalmente nos postulados teóricos da Retórica Aristotélica e de sua

revisão, a Nova Retórica, desenvolvida por Perelman e Olbrechts-Tyteca (1958). As

reflexões teóricas concentram-se, portanto, nas técnicas argumentativas utilizadas pelo

orador do discurso e o na análise do seu grau de eficiência persuasiva e inevitavelmente

reflete sobre questões como: intencionalidade, dialogismo, gêneros discursivos e

jornalísticos.

Page 210: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

210

2 REFLEXÕES TEÓRICAS

As bases do discurso persuasivo foram analisadas na Antiguidade por

Aritóteles, Cícero e Quintiliano, referindo-se aos meios utilizados pelo orador

para estabelecer o contato com o auditório e persuadi-lo, por meio de discursos dotados

de credibilidade.

Aristóteles ([s.d.]1964, 2007) identifica três meios de persuasão fornecidos pelo

discurso: o ethos, o pathos e o lógos. O primeiro se dá através do próprio orador que,

pelo seu caráter e forma como discursa, nos consegue fazer pensar que é crível; no

segundo, a persuasão ocorre a partir das paixões que o orador é capaz de despertar no

seu auditório; e, no terceiro, a persuasão é feita através do próprio discurso, quando

prova uma verdade por meio dos argumentos adequados.

No início dos anos 1960, há uma retomada dos interesses e estudos acerca da

retórica, por meio de uma posição que, fincando as bases principalmente na tradição da

Antiguidade, se torna essencial para a reabilitação desse estudo que visa promover a

adesão dos espíritos: a Nova Retórica, a partir da perspectiva de Perelman e Olbrechts-

Tyteca (1958).

Perelman e Olbrechts-Tyteca ([1958] 2005) e a sua Nova Retórica conservam da

retórica tradicional aristotélica “a ideia mesma de auditório, que é imediatamente

evocada assim que se pensa num discurso”, esclarecem que “preocupam-se sobretudo

com a estrutura da argumentação” e propõem as chamadas “técnicas argumentativas”

que, em conjunto, contribuem para persuadir o interlocutor (ou “auditório”). São elas:

os argumentos quase-lógicos; os argumentos baseados na estrutura do real; ligações de

coexistência; a interação ato/pessoa; argumento de autoridade; técnicas de ruptura e

refreamento; ligações que fundamentam a estrutura do real; o raciocínio por analogia; e

a metáfora.

Considera-se, portanto, que a argumentação é inerente ao processo de

comunicação e está presente de maneira constitutiva na cadeia dialógica de enunciados,

pois, sabe-se, que comunicamos para fazer o outro fazer ou crer em alguma coisa.

(KOCH, 2004).

De acordo com Bakhtin (apud FIORIN, 2006), a simples escolha das palavras

que serão utilizadas nos gêneros/enunciados já determina uma intenção do enunciador.

Page 211: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

211

Logo, ao produzir um enunciado, o enunciador está, ainda que veladamente

argumentando, construindo discursos próprios que dialogarão ou entrarão em conflito

com os discursos do enunciatário, porque a produção de discursos é característica

própria a qualquer comunidade humana.

Desse modo, o corpus da presente pesquisa é atravessado pela argumentação,

dialogismo e intencionalidade, pois se trata de gênero jornalístico que manifesta o

posicionamento do seu locutor e do meio que o veicula, e cuja estrutura composicional

está em consonância com as intenções de quem escreve que, por sua vez, está inserido

em uma esfera social, corroborando com o discurso desta.

Torna-se mais fácil compreender esse ponto, ao observar como funciona a lógica

dos discursos jornalísticos espanhóis sobre o Brasil: o que os discursos veiculados

objetivam é a adesão do povo espanhol, e só pode obtê-la mostrando-lhe que tal adesão

está justificada, por que será aprovada pelos seus fatos e pela opinião pública (ethos).

Para conseguir seus fins, os periódicos não partirão de algumas verdades até outras

verdades a demonstrar, mas sim de alguns acordos prévios até a adesão a obter (pathos).

A partir de então, ethos e pathos se integram e as operações persuasivas se estabelecem

por meio das representações que um faz do outro.

Assim como Perelman e Olbrechts-Tyteca ([1958] 2005), Guimarães (1987)

também acentua a relação entre locutor/alocutário. O locutor, conhecendo o manejo

da linguagem e procurando uma representação do seu alocutário, seleciona os

mecanismos que pode lançar para persuadi-lo. É justamente essa representação que

auxiliará o locutor na escolha dos componentes persuasivos.

a argumentação é vista como a busca da persuasão de um auditório

(alocutário) pelo locutor. Nesta perspectiva é que se pode dizer que a

relação locutor/alocutário é constitutiva da enunciação, no sentido de que

esta se faz na procura de procedimentos próprios para persuadir o

alocutário. Ou seja, a representação do alocutário constitui o próprio modo

de argumentar (GUIMARÃES, 1987, p. 24).

Desse modo, e considerando a cena enunciativa na qual está inserida a

publicação do jornal El Mundo aqui em análise, pode-se estabelecer os elementos que

garantem a persuasão de modo a propiciar, ao jogo argumentativo dos periódicos, o seu

caráter probatório.

Por cena enunciativa, refere-se à situação comunicativa apreendida no interior

do enunciado. Em outras palavras, reporta-se ao conceito de Maingueneau (2004) para

identificar a fundação ou a atualização de um já dito e a legitimação, a validação

Page 212: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

212

daquilo que funda ou atualiza os periódicos nas suas notícias através do ethos, pathos e

logos e das técnicas argumentativas nelas presentes.

A partir da análise da publicação que compõe o corpus do presente estudo,

identificam-se as técnicas argumentativas mais utilizadas pelos seus oradores a fim de

caracterizar o seu fazer argumentativo. Ressalta-se, para tanto, a possibilidade de que

um mesmo argumento possa ser compreendido e analisado diferentemente por

diferentes ouvintes (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, [1958] 2005, p. 221).

3 ESTUDO DA ARGUMENTAÇÃO: ANÁLISE DO CORPUS

A publicação intitulada Guía práctica para sobrevivir y disfrutar del mundial de

Brasil, data do dia 09 de junho de 2014, 3 dias antes do início da Copa do Mundo de

Futebol da FIFA Brasil 2014, este é portanto, o momento da sua enunciação.

A Copa do Mundo de Futebol da FIFA é uma competição esportiva de enorme

importância social, cujas consequências transcendem as linhas do campo de jogo,

tornando-se mesmo questões de Estado. A veiculação de informações que se

relacionavam de alguma maneira com o evento sustentava toda a mídia naquele

momento: cada emissora de rádio, jornal, revista ou rede de televisão “comerciais”

produziam em 2014 discursos diversos que tinham por palavras-chave FIFA, Futebol,

Brasil.

No processo de construção da argumentação, a partir dos conceitos de Perelman

e Olbrechts-Tyteca ([1958] 2005), pressupõe-se que na busca pela adesão do auditório é

necessário estabelecer objetos de acordo. O orador parte de uma base, espécie de terreno

de acordo que ele supõe possuir em comum com o auditório e que, por si só, já constitui

parte da persuasão. A seleção desse enquadramento é decisiva no discurso jornalístico,

sobretudo no título, centro do campo retórico que explicita a escolha adotada pelo

orador.

É por meio do título Guía práctica para sobrevivir y disfrutar del mundial de

Brasil que se dá o acordo da publicação espanhola com o seu auditório, no caso, o

leitor. Os termos guía e sobrevivir transformam em fatos os temas abordados pela

publicação e pressupõe acordo universal, sem controvérsias, a necessidade da sua

leitura, garantindo-lhe assim poder persuasivo à publicação. Além dos interesses

Page 213: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

213

editoriais e empresariais, o acordo é necessário não só na busca por maior número de

leitores, mas também na credibilidade, que é importante elemento de persuasão.

Yasmina Jiménez, jornalista espanhola, correspondente internacional da versão

digital do jornal El Mundo no Brasil, autora da reportagem, é a locutora/oradora do

discurso, aquela que assume o papel do “eu” na cena enunciativa. A jornalista Yasmina

Jiménez fala com a autoridade que lhe é concedida pela empresa editorial El Mundo e

representa a sua ideologia política e editorial.

El Mundo, anteriormente denominado formalmente El Mundo del siglo XXI, é

um jornal espanhol diário e pago. A sua sede está em Madrid, na Espanha. O jornal

define a sua linha editorial como liberal. É habitualmente crítico com o Partido

Socialista Operário Espanhol (PSOE) e os nacionalismos periféricos e próximo

(sobretudo na política espanhola) ao Partido Popular, partido conservador espanhol. O

jornal possui edição impressa em âmbito nacional e edições regionais e locais. Além

destas, possui uma edição aberta na Internet denominada elmundo.es. Os conteúdos da

edição online não são exatamente os mesmos da edição impressa, embora a partir do seu

portal se possa acessar a versão digital da edição impressa a través de um link virtual

específico.

O cidadão espanhol que viajará ao Brasil motivado pela Copa do Mundo de

Futebol, para quem o locutor/orador transmite o discurso é o alocutário/auditório, o

“tu”: Si ya tiene el billete para ser una de las tres millones de personas que se

movilizarán para asistir al Mundial, quizás le interese conocer algunos detalles que

faciliten su estancia.

Um relatório divulgado no início de 2014 pelo TripAdvisor, site especializado

em viagens, revelou que os espanhóis são os viajantes com maior interesse em visitar o

Brasil durante a Copa do Mundo de 2014. Expectativa comprovada pelos dados do

Ministério do Turismo do Brasil que registrou a entrada de 6.429.852 turistas

internacionais dos quais os espanhóis representam 5% dos que assistiram a pelo menos

uma partida do torneio no país.

Os receptores previstos pela locutora/oradora que poderiam ter acesso à leitura

da notícia (cidadãos espanhóis que não viajarão ao Brasil, por exemplo), e os receptores

não-previstos pela jornalista, como, por exemplo, qualquer leitor do mundo que possa

ter acesso à reportagem, também formam parte do auditório.

A espanhola chama de “guia” a publicação veiculada e constrói o seu fazer

persuasivo em concordância com a função da obra que dá indicações práticas sobre algo

Page 214: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

214

e, portanto, faz uso predominantemente do argumento pragmático (causa-

consequência).

Os guias de viagem conjugam diferentes elementos em combinações muito

distintas; respondem aos interesses intelectuais do público mais culto e atendem às

necessidades de assessoramento do turista, guiando-o; se afastam da vertente mais

literária do livro de viagem substituindo a visão pessoal por uma visão pretendidamente

objetiva. De fato, a elaboração de um guia pressupõe a experiência da viagem que, no

entanto, permanece oculta permitindo a infinita repetição do mesmo itinerário; ainda

satisfazendo a demanda de informação, os guias cumprem uma função

fundamentalmente prescritiva (KERBRAT-ORECCHIONI, 2004; ANTELMI, HELD Y

SANTULLI, 2007 apud CALVI, 2010).

Para a adesão do auditório à tese da necessidade de unas recomendaciones

básicas y un poco de sentido común para convertir la visita a Brasil en una experiencia

única, a oradora fundamenta sua argumentação num fato: é interessante conhecer alguns

detalhes que facilitam a estadia no país.

A locução quizás le interese conocer algunos detalles que faciliten su estancia

en el país de la samba, del Carnaval y, ahora sobre todo, del fútbol reforça ao

auditório, através de estruturas de identidade relacionadas historicamente com o Brasil,

a ideia de que o guia oferecerá mais que as ideias estereotipadas sobre o Brasil.

Na sequência, a oradora organiza a sua construção textual a partir de tópicos

considerados de interesse sobre o Brasil, a saber: Climas, Documentación, Sanidad,

Dinero y Precios, Transportes, El tráfico, Seguridad, Idiomas, Gastronomía, Fiestas e

Otros.

A oradora inicia o seu guia tratando da documentação exigida pelo Brasil aos

turistas espanhóis, a oradora argumenta a partir reciprocidade existente entre os países:

“Brasil exige a los españoles lo mismo que exige España a los brasileños para entrar

en nuestro país”. O argumento de reciprocidade vale-se da aplicação do mesmo

tratamento a duas situações simétricas, correspondentes.

As questões sanitárias no Brasil, item seguinte do guia, são apresentadas a partir

do argumento de autoridade da Organização Panamericana da Saúde e suas

recomendações sobre as vacinas necessárias segundo a região de visita: La

Organización Panamericana de la Salud recomienda vacunarse contra la fiebre

amarilla si se va a zona de selva. O argumento de autoridade ou palavra de honra

Page 215: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

215

depende da opinião que temos sobre a honra do agente. Quanto mais importante a

autoridade, mais sério o testemunho e mais persuasivo o discurso.

No tópico Dinero y precios do guía, a oradora esclarece o tema de forma

pragmática: Si no quiere sufrir abusos en restaurantes y bares pregunte antes de pedir.

O argumento pragmático permite apreciar se um todo acontece consoante suas

consequências favoráveis ou desfavoráveis. Inclusive, a interpretação ou valorização

será diferente conforme a ideia que se forma do caráter deliberativo ou involuntário das

consequências. Na prática, há uma interação entre objetivos perseguidos e os meios

empregados para realizá-los.

A sua tese é sustentada a partir da apresentação de uma contraditória situação do

Brasil: La mayoría de las veces sentirá que está en España: Brasil tiene precios

europeos con un salario base que no llega a los 300 euros. A contradição faz parte dos

argumentos quase-lógicos e induz à leitura unívoca de dois fatos, fazendo ver neles uma

única interpretação.

Sobre os transportes, a oradora utiliza uma analogia ao alertar o turista espanhol

para o seu uso: Una vez dentro, sujétese bien, los conductores tratan de emular a los

pilotos de la F1 en un intento de cumplir con el número de vueltas y pasajeros que se

les exige por jornada laboral. A analogia, na argumentação, A analogia implica uma

semelhança de estruturas, onde “A” está para “B” assim como “C” está para “D” tal que

se “A” e “B” são o tema “C” e “D” são o foro. Em vez de ser uma relação de

semelhança é uma semelhança de relação.

Ainda sobre o mesmo tema, outro alerta, desta vez, sustentado pelo recurso de

um trágico exemplo: En Rio de Janeiro evite usar las furgonetas que ofrecen distintas

rutas por la ciudad, hay muchas ilegales y en la zona sur y el centro de la ciudad fueron

prohibidas la mayoría de las líneas después de que violaran a una turista. O exemplo é

um caso particular, ou sequência de casos, que aparece sob certa lógica. A tendência é

concluirmos outro caso particular. Se um caso é invalidante de uma regra é o único

meio de explicitar uma regra ainda implícita.

O tema da segurança no país é destacado, pelo orador, como o mais relevante do

guia: Ha sido una de las grandes preocupaciones durante la preparación del Mundial y

con sobrada razón. No entanto, suavizado através da argumentação pelo desperdício, a

qual se refere à execução de algo em função do seu aproveitamento: Pero si sólo va a

pensar uno en eso, mejor quedarse en casa y rezar para que su destino sea morir de

viejo. Si pese a todo, decide venir hay que seguir unas recomendaciones básicas y usar

Page 216: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

216

el sentido común. O argumento do desperdício segundo o qual faz-se certa coisa ou

função de seu aproveitamento, relaciona-se com ideias como a do voto útil e da

necessidade de terminar o que se começa.

A oradora conclui o seu “guia”, minimizando o sacrifício que supõe sobreviver

no Brasil, argumento sustentado (ora implícita, ora explicitamente) ao longo de alguns

trechos do seu texto: Y dicho todo esto, solamente queda añadir que disfrutar de este

país es la tarea más sencilla del mundo. Os argumentos de sacrifício revelam a

disposição do sujeito a “sujeitar-se” para obter o que deseja. Neste tipo de

argumentação, o sacrifício deve medir o valor atribuído àquilo que se sacrifica.

A argumentação é concluída com um conselho, que reproduz as polêmicas

palavras da ministra da Cultura Marta Suplicy, então ministra do Turismo (mais um

argumento de autoridade utilizado pela oradora), sobre a crise aérea no Brasil no ano de

2007, resignificando-as no novo contexto sobre a visita de turistas espanhóis ao Brasil

durante o Mundial de 2014: Relájese y goce.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo propôs-se a uma brevíssima reflexão teórica sobre a

argumentação retórica e o fazer argumentativo dos discursos jornalísticos. Em

articulação com a teoria apresentada, realizou o estudo da argumentação do artigo

jornalístico Guía práctica para sobrevivir y disfrutar del mundial de Brasil publicado

pelo jornal espanhol El Mundo no ano de 2014.

Com a intenção explorar a construção discursiva da imprensa espanhola na

formação de discursos que ora reforçam, ora inauguram imagens sobre o Brasil no

cenário internacional, confrontou-se aqui as reflexões teóricas e a análise do corpus.

O estudo permite concluir que as estratégias argumentativas de que nos falam

Perelman e Olbrechts-Tyteca ([1958] 2005) são recursos utilizados em discursos

jornalísticos, reforçando a ideia de que historicamente não há isenção e imparcialidade

nos meios de comunicação e de que não há discurso que não esteja dotado de

intencionalidade. Esses discursos são, pois, construídos para conduzir o leitor a

determinadas conclusões ou a determinado ponto de vista e, principalmente, persuadi-

lo.

Por fim, levando-se em consideração esses aspectos, espera-se com o

desenvolvimento da análise aqui proposta colaborar com investigações que propõem a

Page 217: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

217

análise de discursos midiáticos e comprovar as palavras de KOCH (2003), a respeito da

construção discursiva e o caráter persuasivo dos artigos jornalísticos: “até mesmo

aquele que se diz neutro, já institui um viés argumentativo: o da própria neutralidade”.

REFERÊNCIAS

ARISTÓTELES (1964). Arte Retórica e Arte Poética. Rio de Janeiro: Tecnoprint S.A.

ARISTÓTELES (2007). Retórica. Trad.: Marcelo Silvano Madeira. São Paulo: Rideel.

CALVI, Ma. Vittoria (2010). Los géneros discursivos en la lengua del turismo: una

propuesta de clasificación. Em: Revista Ibérica, n. 9, págs. 9-32.

GUIMARÃES, Eduardo (1987). Texto e argumentação: um estudo de conjunção

do português. Campinas/SP: Pontes.

KOCH, Ingedore (2003). Argumentação e Linguagem. 12 ed. São Paulo: Cortez.

KOCH, Ingedore (2004). Linguagem e Argumentação. São Paulo: Cortez.

PERELMAN, Chaïm; OLBRECHETS-TYTECA, Lucie (2005) Tratado da

Argumentação: a nova retórica. Tradução de Maria Ermantina Galvão G. Pereira. São

Paulo: Martins Fontes.

FIORIN, José Luíz (2006). Introdução ao pensamento de Bakhtin. São Paulo: Ática.

Page 218: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

218

ANEXO A - EL MUNDO: Guía práctica para sobrevivir y disfrutar del Mundial de

Brasil

Guía práctica para sobrevivir y disfrutar del Mundial de Brasil

YASMINA JIMÉNEZ São Paulo

Actualizado: 09/06/2014 18:32 horas

Si ya tiene el billete para ser una de las tres millones de personas que se movilizarán

para asistir al Mundial quizás le interese conocer algunos detalles que faciliten su

estancia en el país de la samba, del Carnaval y, ahora sobre todo, del fútbol. Mucho se

ha hablado de la parte negativa del evento, pero basta seguir unas recomendaciones

básicas y un poco de sentido común para convertir su visita a Brasil en lo que debe ser:

una experiencia única.

Clima

Es lo que vende, pero este país no es sólo playas kilométricas y calor tropical. Cuando

empiece a preparar la maleta no olvide que en el país está finalizando el otoño y a

punto de empezar el invierno austral. Las temperaturas varían mucho de norte a sur y

es recomendable consultar el clima para acertar con la ropa. Si va a zona de calor,

incluya el bikini pero siempre completo por muy pequeño que sea. La FIFA tuvo que

retirar un artículo en el que daba consejos tirando de tópicos nacionales por miedo a

ofender a los brasileños, pero algunas de esas recomendaciones son oportunas: el 'top

less' está prohibido y está penalizado con multa.

Documentación

Brasil exige a los españoles lo mismo que exige España a los brasileños para entrar en

nuestro país. En la práctica, no suelen pedir tanto pero pueden hacerlo y negarle el

ingreso. Vaya preparado! Según nuestro Ministerio de Asuntos Exteriores, usted

necesita:

1. Pasaporte con validez de al menos seis meses.

2. Justificación del propósito del viaje: si alega que su intención es asistir al

Mundial, debe presentar la entrada a algún partido.

3. Justificación de medios de vida: aproximadamente 80 euros al día.

(Presentando su tarjeta de crédito y el límite que tiene, suele servir).

4. Justificación de alojamiento: reserva del hotel confirmada o carta de invitación

de un amigo o familiar registrada en notaría brasileña. Algunas aerolíneas

solicitan esta carta para autorizar el embarque si se aloja en domicilio

particular.

Page 219: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

219

Sanidad

La Organización Panamericana de la Salud recomienda vacunarse contra la fiebre

amarilla si se va a zona de selva (esto para los que van a Manaos o Cuiabá, puerta de

acceso al Amazonas), el sarampión y la rubeola, aunque no es obligatorio. Meta en la

maleta el repelente de mosquitos, hubo recientemente un brote de dengue y se han visto

afectadas las ciudades más importantes del país. Viajar con seguro médico siempre es

una buena idea.

Dinero y precios:

Puede cambiar euros en el país sin problemas y pagar con tarjeta prácticamente en

cualquier lugar, a veces incluso los vendedores ambulantes la aceptan. Y tampoco

encontrará dificultades para sacar dinero en cualquier cajero de los bancos más

importantes. Otra historia son los precios, que se han incrementado muchísimo de cara

a la Copa, ya lo ha habrá notado por la tarifa de su hotel, ahora le falta lidiar con el

consumo en la calle. Si no quiere sufrir abusos en restaurantes y bares pregunte antes

de pedir. La mayoría de las veces sentirá que está en España: Brasil tiene precios

europeos con un salario base que no llega a los 300 euros. Sólo se puede regatear con

los vendedores ambultantes si el coste le parece excesivo, aunque siendo extranjero es

difícil que funcione.

En todas las ciudades con sedes del Mundial se han colocado carpas para que todo el

mundo pueda disfrutar de los partidos al aire libre en un ambiente lúdico y festivalero,

conocido como FIFA Fan Fest. Lo malo son los precios que se cargan la diversión: un

tercio más de lo habitual. Además, la venta ambulante estará prohibida en varios

kilómetros a la redonda de los estadio, con lo cual el asistente al partido estará

obligado a consumir dentro por precios bastante elevados incluso para Brasil. Una

guía elaborada por el gobierno asegura que el consumidor también tiene derechos en

este país no lo olvide y pinche aquí si lo necesita: Guía del consumidor para turistas

Transportes

Cuando llegue al aeropuerto use los taxis de las empresas oficiales, normalmente

ubicadas dentro del aeropuerto. Compare precios y elija su mejor opción. Pueden

resultar más caro, pero sin duda es más seguro. En aeropuertos como el de São Paulo,

el turista dispone de dos servicios de autobús, uno más caro (unos 15 euros) y cómodo

que hace varias paradas por el centro de la ciudad; y otro más barato (unos dos euros),

que le deja en una estación de metro, una buena opción para moverse en esta urbe.

El transporte público en Brasil funciona, especialmente si no tiene prisa, pero debe

saber que las marquesinas de los buses carecen del itinerario de las líneas y que

debería informarse en el hotel o a través de internet del número de autobús que le va

bien. Y recuerde, además, que una vez dentro del bus no puede pagar con billete

grande: pocas veces tienen cambio.El precio del pasaje ronda el euro, en unas ciudades

más; en otras, un poco menos. Una vez dentro, sujétese bien, los conductores tratan de

emular a los pilotos de la F1 en un intento de cumplir con el número de vueltas y

pasajeros que se les exige por jornada laboral. En Rio de Janeiro evite usar las

furgonetas que ofrecen distintas rutas por la ciudad, hay muchas ilegales y en la zona

Page 220: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

220

sur y el centro de la ciudad fueron prohibidas la mayoría de las líneas después de que

violaran a una turista.

El tráfico

Si quiere llegar a tiempo a los partidos, no olvide que el tráfico es mucho y poco fluido.

Además los conductores respetan poco a los peatones, ni siquiera en los pasos de

cebra, no lo olvide a la hora de cruzar. Las señalizaciones no son todo lo exactas que

deberían, si se pierde y el GPS de su 'smartphone' no responde, los brasileños siempre

están dispuestos a echar una mano. Pregunte y listo.

Seguridad

Ha sido una de las grandes preocupaciones durante la preparación del Mundial y con

sobrada razón. Esta tierra no se anda con chiquitas: en la lista de las 50 ciudades más

peligrosas del mundo, 15 son brasileñas. Pero si sólo va a pensar uno en eso, mejor

quedarse en casa y rezar para que su destino sea morir de viejo. Si pese a todo, decide

venir hay que seguir unas recomendaciones básicas -cada país ha preparado su propia

guía- y usar el sentido común. Alemania sugiere a sus ciudadanos que lleven dinero

para los ladrones; Reino Unido advierte sobre los amigos de lo ajeno y el mal estado

de las carreteras; Francia y Australia van más allá y alertan sobre los secuestros

exprés en Brasilia. Lo cierto es que es aconsejable llevar dinero en diferentes partes

por si le roban la cartera que pueda regresar al hotel con el billete que se guardó en

los calcetines, por ejemplo. El resto, puro sentido común: eludir los barrios peligrosos

y las calles desiertas tanto de día como de noche, no lleve objetos ostentosos encima y

si tiene la mala suerte de ser robado, no se resista ni discuta, aquí suelen ir armados.

Idiomas

Brasil no es Portugal y los brasileños no son portugueses. La mayoría no sabe español,

aunque son serviciales y hospitalarios, lo que facilitará la comunicación. Aun así,

siempre es recomendable manejar algunas frases básicas y tener cuidado con los 'falsos

amigos' del idioma: muchas palabras españolas tienen un significado completamente

diferente en portugués y al revés. No use exquisito para referirse a una comida

deliciosa porque el brasileño entenderá que está rara, por ejemplo. El inglés, sólo en

algunos hoteles, determinados locales de zonas turísticas y los puntos de información

de Turismo

Gastronomía

Brasil ocupa buena parte de Sudamérica y está habitado por más de 190 millones de

personas. Su comida es tan variada como su diversidad cultural. Disfrute de este

abanico de sabores y apunte en su lista de degustaciones obligatorias la feijoada, la

coxinha, la tapioca, el açai o la pamonha, entre otras muchas. La venta de alimentos en

la calle está desaconsejada en cualquier guía de viajes y en prácticamente cualquier

país del Sur, pero en Brasil es una opción rica en abundancia, sabor y color. Guarde

las precauciones mínimas, como observar el estado de la comida.

Sobre las bebidas, la variedad de zumos es inimaginable siendo baratos y naturales.

Sepa, además, que acaba de llegar al país que más cerveza consume en el mundo y su

Page 221: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

221

bebida por excelencia es este zumo de cebada bien frío, aunque bastante suave. La

cachaza -aguardiente de la caña de azúcar- es para los máscarteleses, pero entre lo

más flojo y los más fuertes, el visitante puede relajarse con distintos cócteles.

Fiestas

Si le quedan fuerzas entre partido y partido, el país celebran las fiestas Junina o fiestas

de los santos durante todo el mes de junio. Podrá disfrutar de música, comidas y

bebidas cerca de las iglesias si asiste a alguna 'quermesse'. Pregunte en su hotel por las

populares. Por otro lado, recuerde que está en un país que lo vive todo a través de la

música, escucharla en directo es tan fácil como tomarse una cerveza.

Otros

Como curiosidad relacionada con el Mundial, cada cuatro años muchos brasileños con

motivo del evento deportivo engalanan sus calles para competir en un concurso que

premia la mejor apuesta urbana en nombre del deporte estrella.

Y dicho todo esto, solamente queda añadir que disfrutar de este país es la tarea más

sencilla del mundo. Y haga lo que haga la selección española, le aconsejo lo que ya

dijera la ministra de Cultura brasileña: "Relájese y goce".

Disponível em:

http://www.elmundo.es/america/2014/06/09/5394becbca4741e82a8b457d.html

Page 222: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

222

“LA FIESTA DE LOS EXCLUIDOS” DA COPA DO MUNDO DE 2014:

UMA ANÁLISE DISCURSIVA.

Máira Barboza de Oliveira Coelho (UNEB)

1 INTRODUÇÃO

Este presente artigo versa sobre a construção discursiva sobre o Brasil, a partir

da seleção e análise de 1 texto jornalístico na sua versão online de um dos três

principais periódicos em circulação pela Espanha (El País), durante a Copa do Mundo

de Futebol no Brasil de 2014.

A Copa do Mundo FIFA de 2014 é a vigésima edição deste evento esportivo, um

torneio de futebol masculino internacional organizado pela Federação Internacional de

Futebol, A edição de 2014 é a quinta realizada na América do Sul. O Brasil foi a última

sede do torneio mundial escolhida através da política de rodízio de continentes, que foi

iniciada a partir da escolha da África do Sul como a sede da Copa do Mundo de 2010.

Vivemos, portanto, um contexto de intensos debates nas mídias sociais,

brasileira e internacional, motivados pelo grande momento da realização do capital do

espetáculo que envolve a Copa do Mundo no ano de 2014.

A partir da busca sobre o Brasil na Copa do Mundo e depois sobre uma temática

mais especifica realizado nos buscadores do site web do referido periódico online, pelas

palavras-chaves “manifestaciones”, no período que compreende o início de junho de

2014 a 13 de julho de 2014, agrupado na temática sobre a segurança pública, opta-se

pela eleição do seguinte texto jornalístico:

1. El País: La fiesta de los excluidos, texto de Talita Betineli (Ver

anexo A).

A análise do texto desenvolve-se sob a orientação dos aportes teóricos da

Retórica Aristotélica e de sua revisão, a Nova Retórica, desenvolvida por Perelman

e Olbrechts-Tyteca (1958), além de outras teorias subsidiarias para a análise de

discursos.

Trabalho Orientado pela Professora Ms. Carla Severiano de Carvalho (UNEB)

Page 223: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

223

Deste modo, articulam-se reflexões sobre a composição textual em língua

espanhola, as técnicas argumentativas utilizadas pelos oradores dos discursos e o

grau de eficiência persuasiva nos discursos da imprensa da Espanha, a qual

oferece diversas e amplas narrativas sobre Brasil e as situam dentro de contextos

sociais definidos, envolvidos em estruturas culturais e ideológicas específicas.

Visando fomentar a leitura crítica das discussões propostas pela mídia e difundir os

aportes teóricos dos estudos retórico-argumentativos, através de pesquisa que explora

referências ao Brasil no gênero discursivo das notícias publicadas na Espanha, durante

a realização do campeonato mundial de futebol no país sul-americano.

2 EMBASAMENTO TEÓRICO

Para alicercear a análise argumentativa do texto jornalístico selecionado, como

corpus dessa investigação, faz-se necessário uma breve introdução sobre a retórica,

considerando que está acabou assumindo sentidos bem diversos e divergentes no

decorrer dos séculos, e que, durante muito tempo, o senso comum era de que a retórica

assumia um sentido pejorativo, falso e artificial. No livro Introdução à Retórica,o

filósofo francês especialista em retórica e em filosofia da educação, Olivier Reboul,

propõe a definição da retórica como a arte de persuadir pelo discurso.

Entende-se que por discurso toda uma produção verbal, escrita ou oral,

constituída por uma frase ou por uma sequência de frases, contendo começo e fim e

apresente uma unidade de sentido, ao assumir essa definição, é possível perceber que a

retórica não é aplicada a todos os discursos, e sim, a aqueles que visam a persuadir.

Apesar de a retórica antiga restringir o sentido da palavra discurso, Reboul apresenta

que é possível ampliar o objeto da retórica sem a trair. Ao explicar que persuadir é levar

alguém a crer em alguma coisa, e que, apesar de alguns estudiosos distinguirem

rigorosamente “persuadir” de “convencer”, com dualidade: crença vs. Razão, o teórico

assume a postura que renuncia a essa distinção entre convencer e persuadir.

A retórica nasce na Sicília grega, por volta de 465, após a expulsão dos tiranos.

Em uma época que não existiam advogados, os cidadãos despojados pelos tiranos

reclamavam por seus bens e era preciso dar aos litigantes um meio de defender sua

causa. Então, a retórica tem sua a origem judiciária e não na literária. Nesse sentido, a

retórica não argumentava a partir do verdadeiro, mas a partir do verossímil (eikos), que

Page 224: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

224

buscava “transformar o argumento mais fraco no mais forte”, assumindo o slogan que

dominava toda essa época.

No entanto, é Aristóteles que vai repensar a retórica, configurando-a em outra

retórica, integrando-a em um sistema filosófico divergente a dos sofistas e depois a

transformando em sistema. Sendo assim, a retórica é a arte de defender-se

argumentando em situações nas quais a demonstração não é possível. Para o autor,

Aristóteles salva a retórica ao atribuir um papel modesto, mas indispensável num

mundo de incertezas e conflitos, partindo do pressuposto de que a retórica é a

contraparte da dialética e, considerando que os métodos dialéticos são necessários para

encontrar a verdade em questões teóricas.

Sendo assim, Aristóteles identifica três meios de persuasão fornecidos pelo

discurso: o ethos, o pathos e o logos. O Ethos vai ser a argumentação que é centrada no

orador, ou seja, vai ser a técnica que o orador deve assumir para inspirar a confiança do

auditório. A persuasão vai ser obtida quando o discurso é proferido de maneira que o

auditório fique com a impressão de que o caráter do orador o torne digno de fé e

credibilidade. E para inspirar confiança, o orador deve revelar uma inteligência prática,

caráter virtuoso e boa vontade, para assim mostrar que tem credibilidade. Se conseguir

tais objetivos terá mais probabilidades de persuadir um auditório, pois, se o auditório

ficar convencido da índole e da moral do orador a probabilidade do público aderir a sua

tese aumenta.

O Pathos é o conjunto de emoções, paixões e sentimentos que o orador deve

suscitar no auditório com seu discurso, neste caso, a argumentação pode basear- se no

estado emocional do auditório para obter a persuasão. Ao argumentar por via das

emoções, elabora-se uma tese baseada no pathos, fazendo com que suscite no auditório

um estado de espírito favorável à aceitação de ideias do orador. Diferentemente do

ethos, que é o caráter moral do orador e diz respeito ao orador, o pathos é centrado no

auditório. Então, com esta técnica argumentativa, o emissor deverá ser capaz de

produzir um discurso que empolgue e impressione os ouvintes, e que assim, mobilize os

seus sentimentos e emoções (alegria, tristeza, orgulho, desejo etc).

O Logos vai ser o tipo de argumentação que vai valorizar os argumentos. É a

argumentação centrada na tese dos argumentos, deve-se ser bem estruturado do ponto

de vista lógico-argumentativo, para que assim a persuasão posa ser obtida e que o

auditório creia que a perspectiva do orador é a correta. Então, pode se afirmar, que o

logos é o tipo de argumentação mais objetiva, já que o discurso deve obedecer a uma

Page 225: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

225

racionalidade lógica e possuir rigor e coerência, pois é pelo discurso e pelos argumentos

que se tenta valorizar uma tese e se procura a adesão dos ouvintes.

Em suma, os argumentos convincentes fornecidos através do discurso são de três

espécies: 1) a persuasão é conseguida através do próprio orador que, pelo seu caráter e

forma como discursa faz parecer que sua tese é crível; 2) é quando a persuasão ocorre a

partir das paixões que o orador é capaz de despertar no seu auditório; 3) a persuasão é

feita no próprio discurso, quando prova uma verdade por meio dos argumentos

adequados e bem estruturados. Em outras palavras, são as relações entre esses três

componentes (ethos, pathos e logos), organizados em polos complementares, que, em

um discurso ou uma de suas seções garantem os seus movimentos argumentativos.

No inicio dos anos 60, retomam os estudos acerca da retórica com bases na sua

tradição da Antiguidade Clássica, mas promovendo a adesão dos espíritos sendo assim

concebida como: Nova Retórica. E é com a publicação da obra Tratado da

Argumentação, A Nova Retórica, de Chaim Perelman e Lucie Obrechts- Tyteca, que

marca esse retorno. Logo na introdução deste exemplar, os tratadistas afirmam que o

tratado só versará sobre os recursos discursivos para se obter a adesão dos espíritos:

apenas a técnica que utiliza a linguagem para persuadir e para convencer será

examinada a seguir.82

No decorrer da obra, os autores demonstram várias técnicas que podem ser

utilizadas para se persuadir os seus respectivos auditórios, destacando então, o

condicionamento do auditório mediante o discurso, como os estudiosos afirmam:

Mas, quando se trata de argumentar, de influenciar, por meio do discurso, a

intensidade de adesão de um auditório a certas teses, já não é possível

menosprezar completamente, considerando-as irrelevantes, as condições

psíquicas e sociais sem as quais a argumentação ficaria sem objeto ou sem

efeito. Pois toda argumentação visa à adesão dos espíritos e, por isso mesmo,

pressupõe a existência de um contato intelectual. (PERELMAN;

OLBRECHTS-TYTECA, 2002, p 16.)

Em suma, para que exista a argumentação, faz-se necessário, em algum

momento, que uma comunidade afetiva dos espíritos se realize, para que assim possa

haver condições previas para que o objeto da argumentação se realize. E nessa formação

de uma comunidade afetiva dos espíritos exige-se a existência de uma linguagem em

82

Estudioso que escreve o prefácio.

Page 226: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

226

comum e assim estabelecer um contato entre o orador e o seu auditório, e desse modo,

despertar o interesse e a atenção, como os autores estabelecem:

Esse contato entre o orador e seu auditório não comcerne unicamente às

condições prévias da argumentação: é essencial também para todo o

desenvolvimento dela. Com efeito, como a argumentação visa obter a adesão

daqueles a quem se dirige, ela é, por inteiro, relativa ao auditório que procura

influenciar. (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 2002, p 21.)

Dentro dessa perspectiva, os autores reelaboram o conceito de “acordo”, na

noção retorico-dialético, de acordo prévio. Os Acordos prévios são determinadas

proposições incontroversas que já se encontram aceitas pelo auditório antes do início do

discurso. E é através dessas proposições que o orador baseará o seu discurso para

conseguir a adesão do auditório em relação aos acordos prévios até a sua tese. E esse

procedimento será efetuado mediante as técnicas argumentativas.

As técnicas argumentativas servem como ferramentas para auxiliar a discernir

um esquema argumentativo, tendo o discurso por objeto. Especialmente, no que toca

aos argumentos baseados na relação da pessoa do orador com seu discurso e no que toca

à consideração do discurso como expediente oratório, sendo indispensável essa reflexão

sobre o discurso, como os tratadistas comentam:

É levando em conta essa sobreposição de argumentos que se conseguirá

explicar melhor o efeito prático, efetivo, da argumentação. Toda análise que a

preterisse estaria, pensamos, condenada ao fracasso. Contrariamente ao que

se passa numa demonstração na qual os procedimentos demonstrativos

ocorrem no interior de um sistema isolado, a argumentação se caracteriza por

uma interação constante entre todos os seus elementos. (PERELMAN;

OLBRECHTS-TYTECA, 2002, p 241)

O levantamento dessas técnicas argumentativas podem ser divididos da seguinte

forma: 1) Argumentos quase-lógicos: Estruturas Lógicas (contradição, identidade) e

Relações Matemáticas (transitividade, sacrifício); 2. Argumentos baseados na

estrutura do real: Ligações de Sucessão (pragmático, desperdício, direção e superação)

e Ligações de Coexistência (a pessoa e os seus atos e autoridade); 3. Ligações que

fundamentam a estrutura do real: Caso particular (exemplo, ilustração, modelo e

antimodelo) e Analogia e Metáfora.

São essas técnicas argumentativas, que são desenvolvidas nos argumentos a

partir dos acordos prévios (paixões e valores admitidos), que o orador constrói o seu

ethos – a imagem que pretende projetar de si. A imagem do orador, construída a partir

Page 227: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

227

da imagem que ele tem do seu auditório, provoca a adesão pelo pathos que exerce a

função de agente do “eu” que fala. E através dessas técnicas que se torna possível

observar como funciona a lógica dos discursos periodísticos espanhóis sobre A Copa do

Mundo do Brasil de 2014. Então, o que a notícia veiculada objetiva é a adesão do povo

espanhol, e só pode obtê-la mostrando-lhe que tal adesão está justificada, por que será

aprovada pelos seus fatos e pela opinião pública (ethos). Para conseguir seus fins, o

periódico não partirá de algumas verdades até outras verdades a demonstrar, mas sim de

alguns acordos prévios até a adesão a obter (pathos).

Nessa perspectiva, a cena enunciativa na qual está inserido o texto selecionado

sobre as manifestações e/ou sistema de segurança pública no período da Copa do

Mundo de Futebol no Brasil de 2014, na versão online do periódico El País, pode-se

estabelecer os elementos que garantem a persuasão de modo a propiciar ao jogo

argumentativo dos jornais o seu caráter probatório. Por cena enunciativa, nos referimos

à situação comunicativa apreendida no interior do enunciado nos reportamos ao

conceito de Maingueneau (2004) para identificar a fundação ou a atualização de um

discurso já dito e a legitimação, a validação daquilo que funda ou atualiza o periódico,

no seu texto, através do ethos, pathos e lógos e das técnicas argumentativas neles

presentes.

3 ANÁLISE DO CORPUS ARGUMENTATIVO

A partir da análise do texto periodístico que compõem o corpus do presente

estudo, identificam-se as técnicas argumentativas mais utilizadas pelo seu orador a fim

de caracterizar o seu fazer argumentativo na construção da imagem do Brasil na

Espanha. As técnicas argumentativas servem como ferramentas para auxiliar a discernir

um esquema argumentativo, tendo o discurso por objeto. Ressalta-se então, a

possibilidade de que um mesmo argumento possa ser compreendido e analisado

diferentemente por diferentes ouvintes (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, [1958]

2005, p. 221).

Page 228: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

228

3.1 LA FIESTA DE LOS EXCLUIDOS (EL PAÍS)

O “locutor/orador”, aquele que assume o papel do “eu”, neste contexto, é a jornalista

brasileira Talita Bedinelli, escreve para o El País, sendo correspondente do periódico

espanhol no Brasil.

A cena enunciativa é o povo espanhol, sendo identificados como o

“alocutário/auditório” para quem a locutora/oradora vai transmitir o texto jornalístico na

versão digitalizada do El País, na seção de deportes. Salienta-se, que também existem

os receptores não alocutário, que são os receptores previstos, e os receptores não

previstos pelo locutor/orador, que podem ser qualquer leitor do mundo que possa ter

acesso ao texto digital.

O “aqui” da enunciação é o lugar social de onde o “eu” fala, a correspondente

Talita Bedinelli fala com a autoridade que lhe é concedida como correspondente do

editorial El País, representando a sua ideologia política e editorial: inicialmente uma

linha editorial independente e progressista. Contudo, quando o editorial mudou de

direção, sua linha e posicionamento ideológico também mudaram, adotando posturas

mais conservadoras e contraditórias do que era antes, assumindo um posicionamento

liberal.

O “agora” (momento da enunciação) é o dia 13 de junho de 2014, 1 dia após a

festa de abertura da “Copa do Mundo da Fifa Brasil 2014” no estado de São Paulo.

Mediante as festividades que o período da Copa do Mundo propicia, a jornalista intitula

o seu texto jornalístico como “La fiesta de los excluídos”, e logo em seguida ao seu

título a frase de chamada do texto, utiliza do argumento da contradição para destacar

que a festa do Mundial de futebol do Brasil não era para todos, para então despertar a

incoerência da festividade: “En el estreno de Brasil, los controles policiales dejan

aislados a los pobladores de una favela cercana al estadio de São Paulo”, afinal, como

eles podem estar perto(cercana) das comemorações do Mundial e ao mesmo tempo

estarem isolados (aislados) destas comemorações?

A oradora introduz o texto com a estratégia de coexistência, utilizando do tipo

de argumentação sobre a pessoa e seus atos, relacionado ao caráter/imagem de alguém.

Neste primeiro caso, traz a imagem de um grupo de pessoas jovens, que também são o

publico alvo das festividades da Copa de Mundo e não podem passar pelo bloqueio

policial: “Tainá Salustiano y cinco amigos más, con edades de entre diez y 17 años de

edad”. No segundo caso da utilização de técnica, a repórter, destaca o líder da

Page 229: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

229

comunidade que foi isolada: “Washinton Gleydson, de 31 años, un líder vecinal de la

favela de La Paz”, e de um outro jovem que teve acessibilidade cerceada: “Rafael Silva,

de 29 años”.

Em contrapartida, à argumentação a pessoa e o seus atos, a autora, segue a

construção argumentativa baseada no argumento de autoridade ao destacar a fala de um

policial (representação militar do estado): “Es una cuestión de seguridad”, aseguraba

uno de estos policías” e nesse mesmo trecho, a autora utiliza do argumento de

generalização, buscando estabeler uma regra a partir de um caso concreto: “Si se dejase

a todo el mundo pasar, esto se convertiría en un follón”, añadió”, para justificar o por

quê do bloqueio policial.

Na sequência, para continuar justificando a sua tese, a oradora, utiliza da

argumentação pragmática para validar e persuadir ao público, que apesar dos

transtornos causados por conta dos bloqueios policiais, a comunidade obteve ganhos:

“El bloqueo policial tuvo una ventaja: una de las calles principales del barrio quedó

libre de tráfico y se convirtió en el escenario perfecto para ver el partido, con puestos

de perritos calientes y de bebidas incluidos.”.

Dando continuidade à argumentatividade do texto, utiliza-se da técnica de

direção para apontar metas, nesse caso, seria a promessa que a comunidade ganhou

junto à prefeitura de conseguirem residência própria: “En un principio se les informó de

que serían desplazados de la zona, pero tras batallar con la prefectura, consiguieron

que esta les prometiera una vivienda, que, al final, no llegará hasta 2015”, na

sequência, a argumentação faz uso da técnica do sacrifício para estabelecer o valor de

algo ou de uma causa pelos sacrifícios que são ou serão feitos por eles: “a cambio de

dejar libre el terreno. “Nuestra casa no está lista porque se gastaron todo en los

estadios”, decía una de las vecinas.”

Por fim, a oradora finaliza seu texto utilizando da técnica de desperdício, para

assim dizer que: uma vez que já se foi aceito o “sacrificio” tudo foi resolvido na

comunidade: “decidieron hacer las paces con la Copa del Mundo por un día y

adornaron las ventanas de sus casas con banderas brasileñas y las calles con cintas

verdes y amarillas. Luego colocaron en la calle los televisores, montaron barbacoas y

animaron a su selección, que jugaba a pocos metros al lado”, nessa linha de raciocínio,

faz-se parecer que, independentemente, dos problemas e dos transtornos causados pela

medida de segurança de isolar a área, tudo vira festa. Reforçando-se assim, o estereótipo

de que “no Brasil, tudo vira carnaval”.

Page 230: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

230

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observa-se então, que a partir do estudo da argumentação retórica e da análise

das técnicas argumentativas presentes no texto do periódico espanhol selecionado é

possível perceber que os discursos midiáticos espanhóis oferecem marcas persuasivas

seculares, que nem sempre estão explícitas na superfície textual, mas se revelam

também implicitamente nas entrelinhas dos processos de construção argumentativa.

A análise dos argumentos permitiu que se identificassem as técnicas

argumentativas mais utilizadas para a construção da persuasão, que foram as pessoas e

seus atos, sendo apoiadas pelo o argumento da autoridade, e assim validar as ações de

isolamento da comunidade em questão. E, por fim, o a técnica do desperdício, para se

reforçar a ideia de que, independentemente dos transtornos causados, no Brasil os

problemas viram festas.

Em suma, ao analisar o presente estudo, percebe-se que ainda há muito material

para se investigar sobre os efeitos persuasivos causados pelo discurso, tendo em vista

que, esses tipos de narração provocam reflexões e, consequentemente, envolvem

sentidos vindos de outros discursos, situados em contextos históricos, sociais, culturais

e afetivos em que o auditório se insere. Apesar de todo esse contingente de material

textual jornalístico a se analisar, espera-se que o presente estudo possa suscitar reflexões

a respeito do uso das técnicas argumentativas nos discursos espanhóis sobre o Brasil.

REFERÊNCIAS

ARISTÓTELES. Retórica (2007).São Paulo: Rideel.

KOCH, Ingdore. “Discurso e argumentação”. Argumentação e Linguagem. (2000).

São Paulo: Cortez.

MAINGUENEAU, Dominique. Análise de Textos de Comunicação. (2004). São

Paulo: Cortez Editora, 2004.

PERELMAN, Chaim; OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tratado da argumentação: a

nova retórica. (2002).São Paulo: Martins Fontes.

Page 231: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

231

REBOUL, Olivier. Introdução a Retórica.(2004). São Paulo: Martins Fontes.

BEDINELLI, Talita. (2014) La fiesta de los excluídos. Em El País: Deportes.

Disponível em:

http://deportes.elpais.com/deportes/2014/06/13/mundial_futbol/1402680457_667539.ht

ml. Acessado em 15/06/2014..

ANEXO A- EL PAÍS: La fiesta de los excluidos

La fiesta de los excluidos

Talita Betineli/ SP Brasil

Dia:13/06/2014

En el estreno de Brasil, los controles policiales dejan aislados a los pobladores de

una favela cercana al estadio de São Paulo

Tainá Salustiano y cinco amigos más, con edades de entre diez y 17 años de edad,

caminaron casi durante cuarenta minutos desde el centro de Itaquera (barrio pobre al

Este de São Paulo de 600.000 habitantes y 300 favelas) hasta la avenida Doutor Luís

Aires, a menos de un kilómetro del estadio Arena Corinthians. Hasta allí querían llegar.

Su objetivo era ver el Brasil-Croacia con el que se inauguró el Mundial en una pantalla

gigante que, según varios rumores que habían circulado entre los chicos del barrio, se

iba a instalar en los alrededores del campo. A mitad del camino se toparon con un

contingente de policías que bloqueaba el paso y que impedía el acceso al estadio a

cualquiera que no tuviese una entrada.

“Es una putada. Es la única oportunidad de estar cerca de un partido de Brasil”, se

lamentaba la chica. Con todo, este grupo no fue el único al que se le impidió el paso. Al

contrario: se sucedían las historias de vecinos que no podían salir de su barrio. De

hecho, Itaquera quedó aislado a base de bloqueos policiales. “Es una cuestión de

seguridad”, aseguraba uno de estos policías. “Si se dejase a todo el mundo pasar, esto se

convertiría en un follón”, añadió.

Washinton Gleydson, de 31 años, un líder vecinal de la favela de La Paz, la más

próxima al estadio, aseguró que los controles policiales se montaron alrededor de las

ocho de la mañana, nueve horas antes de que comenzase el partido y dificultaron,

incluso, la salida al trabajo de los habitantes del barrio que se desplazan diariamente en

metro. Muchos tuvieron que dar una vuelta de más de media hora. “Esta mañana, un

señor cargado de maletas necesitaba llegar hasta el metro pero no le dejaron pasar”,

añadía Gleydson.

“Qué guay lo de la Copa del Mundo, ¿eh?", ironizaba Rafael Silva, de 29 años, al oír

que debería dar una vuelta por todo el barrio para llegar a su casa. Decidió, al final,

atajar, aún a costa de internarse en una zona peligrosa de tráfico de drogas.

Page 232: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

232

El’ bloqueo policial tuvo una ventaja: una de las calles principales del barrio quedó libre

de tráfico y se convirtió en el escenario perfecto para ver el partido, con puestos de

perritos calientes y de bebidas incluidos. Muchos de estos vecinos, que residen casi al

lado del estadio, han vivido en estos últimos cuatro años pendientes de las evoluciones

de la construcción del campo. En un principio se les informó de que serían desplazados

de la zona, pero tras batallar con la prefectura, consiguieron que esta les prometiera una

vivienda, que, al final, no llegará hasta 2015, a cambio de dejar libre el terreno.

“Nuestra casa no está lista porque se gastaron todo en los estadios”, decía una de las

vecinas.

Sin embargo, los vecinos de esta zona desfavorecida a la que el Mundial solo ha traído

desgracias hasta ahora, decidieron hacer las paces con la Copa del Mundo por un día y

adornaron las ventanas de sus casas con banderas brasileñas y las calles con cintas

verdes y amarillas. Luego colocaron en la calle los televisores, montaron barbacoas y

animaron a su selección, que jugaba a pocos metros al lado.

Disponivel em:

http://deportes.elpais.com/deportes/2014/06/13/mundial_futbol/1402680457_667539.html

Page 233: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

233

ANÁLISE DAS RELAÇÕES DE GÊNERO EM PANTALEÃO E AS

VISITADORAS

Viani da Silva Soares83

UNEB

1 Introdução

Jorge Mario Vargas Llosa é um dos escritores peruanos mais conhecidos no

mundo. Iniciou sua carreira muito jovem, como jornalista, e em seguida formou-se em

Literatura, na Universidade de São Marcos, em Lima. Mudou-se para a Europa,

trabalhou em rádio e televisão, mas sempre escrevendo novos livros. Participou do

“boom” latino-americano, junto com Gabriel García Marques, Julio Cortázar e Carlos

Fuentes. Agraciado com o prêmio Nobel de Literatura em 2010, é muito conhecido por

suas obras de ficção, autobiográficas e de cunho político, entre elas Pantaleão e as

Visitadoras, lançado em 1973.

Nesta obra, escrita em 1973, Vargas Llosa conta a história da organização de um

serviço de visitadoras no exército peruano, detalhando os impactos que este tipo de

serviço gera na sociedade local e os conflitos pessoais dos personagens, narrados de

forma dinâmica, com humor irônico e técnicas literárias muito próprias. A insólita

relação entre exército e o corpo de visitadoras torna-se tema central da análise deste

trabalho, abrindo caminho para o entendimento das relações de poder no que se refere à

questão de gênero, considerando os padrões de masculinidade e de feminilidade,

estabelecidos pelos soldados do exército e pelas visitadoras.

2 A dinâmica da história da obra

A obra Pantaleão e as Visitadoras traz a história de Pantaleão Pantoja (Panta),

capitão do exército peruano, que devido à sua grande capacidade organizacional é

escolhido para uma desafiadora missão: implantar um serviço secreto de visitadoras que

atendesse os militares da floresta amazônica.

83 Graduanda do curso de Letras Língua Espanhola e Literaturas da Universidade do Estado da Bahia,

Campus I. Trabalho orientado pela Profa. Carla Severiano Carvalho - Universidade do Estado da Bahia.

Page 234: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

234

O desenvolvimento da trama tem início quando são feitas várias denúncias de

violência sexual contra as mulheres da região, cometida pelos soldados do exército que,

por passarem longos períodos em campana e sem contato com o sexo oposto acabam

cometendo delitos graves, inclusive casos de bestialismo, colocando em risco a imagem

institucional do exército perante a sociedade. O crescente número de casos gera

preocupação aos altos escalões do exército, que propõem, então, a organização de um

serviço interno de prostituição como estratégia eficaz para aplacar a ânsia sexual dos

soldados na mata, evitando a exposição da instituição.

Para coordenar os trabalhos, Pantaleão Pantoja “organizador nato, senso

matemático da ordem, capacidade executiva” (LLOSA, 2007, p. 13) é convocado e logo

mergulha no submundo da boemia. Junto com a família, muda de cidade, renuncia ao

uniforme, usa roupas comuns, começa a beber e frequentar bares noturnos, buscando

arregimentar novas trabalhadoras e mudando completamente de atitude, para que seu

disfarce seja mantido e a missão obtenha êxito. Sua dedicação é tanta que Pantaleão faz

experiências sobre os efeitos dos produtos afrodisíacos no aumento do apetite sexual,

criando situações inusitadas para si e a esposa Pochita, que desconhece a natureza da

missão do marido.

No processo de montagem da equipe de assessoria do serviço de visitadoras

Pantaleão conhece Leonor Curinchila, mais conhecida como Chuchupe, e Porfírio

Wong, popular China Porfírio, que o auxiliam na seleção das visitadoras. Por se tratar

de uma missão secreta, todo o contato de Pantaleão com seus superiores é realizado por

cartas, que registram todos os procedimentos e custos da operação, assegurando em

vários trechos uma narrativa jocosa dos acontecimentos, a exemplo do cálculo do

quantitativo de visitadoras necessário para o bom atendimento dos pelotões, tomando

como base o número de prestações por mês e o tempo médio do ato sexual para cada um

dos soldados, chegando-se à conclusão de:

(...) Que o signatário quer registrar o entusiasmo, a celeridade e a eficácia

com que os oficiais das guarnições, postos e acampamentos responderam ao

teste em questão (apenas uns 15 postos não puderam ser consultados por

obstáculos na comunicação provocados por defeitos no equipamento de

transmissão, mau tempo etc.), o que permitiu constituir o seguinte quadro:

número potencial de usuários do Serviço de visitadoras: 8. 726 (oito mil,

setecentos e vinte e seis); número de prestações mensais (média ambicionada

por usuário): 12 (doze); tempo de prestação individual (média ambicionada):

30 minutos. (LLOSA, 2007, p. 37)

Page 235: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

235

Desta forma, a projeção inicial de prestações para o Serviço de Visitadoras para

Guarnições, Postos de Fronteira e Afins (SVGPFA) é de 104.712 (cento e quatro mil,

setecentos e doze), número assustador, se considerado o fato de que não foram incluídos

os postos intermediários, os suboficiais. Diante de tal quadro, mas reconhecendo os

limites iniciais da empreitada, Pantaleão recruta quatro visitadoras, momento em que

outra narrativa bem-humorada é revelada:

Das oito, a maioria devia ter ultrapassado os 25 anos, mas este cálculo é

incerto (...), pois a casa Chuchupe é pobremente iluminada, por falta de

recursos técnicos ou, talvez, por malícia, pois a penumbra é mais tentadora

que a claridade e, se me permitem uma piada, também porque, como dizem,

“na sombra todos os gatos são pardos”. A maioria delas, pois, avançando

para os 30 anos, quase todas com uma boa média, se avaliadas com o critério

funcional e sem refinamentos, quer dizer, corpos atraentes e arredondados,

sobretudo nos quadris e seios, membros que tendem a ser generosos neste

canto da Pátria, e caras apresentáveis, embora, na proximidade, aqui seja

possível notar mais defeitos, não uma feiura de nascença, mas adquirida por

acne, varíola e perda de dentes, acidente este último bem frequente na

Amazônia, pelo clima debilitante e as insuficiências dietéticas. (ibid, p. 38-

39)

Vencida a etapa inicial do recrutamento e instalação do centro logístico do

SVGPFA, o serviço de visitadoras se configura, atendendo a uma demanda crescente, e

em pouco tempo exige a contratação de novas trabalhadoras, mais que triplicando o

número de prestadoras. Tal sucesso passa a ameaçar o sigilo necessário à atividade.

Com isso, Pantaleão passa a ser constantemente ameaçado pela imprensa local, um

programa de rádio intitulado “A voz do Sinchi”, cujo locutor, o próprio Sinchi,

chantageia-o pedindo-lhe dinheiro em troca do seu silêncio.

- Não existe nada sólido o bastante em toda a Amazônia que A voz do Sinchi

não possa derrubar – dá um piparote no vazio, sopra, se estufa o Sinchi. –

Modéstia à parte, se eu o puser na berlinda, o Serviço de Visitadoras não dura

uma semana e o senhor vi ter que sair às carreiras de Iquitos. É a triste

realidade, meu amigo.

- Ou seja, veio me ameaçar – se endireita Pantaleão Pantoja. (ibid, p. 110)

Pantaleão inicialmente recusa, mas acaba cedendo à chantagem, destinando parte

do seu soldo ao jornalista, pois reconhece que a exposição do SVGPFA pode colocar

em risco a reputação daquilo que mais ama na vida: o exército. Contudo, isto não

impede que sejam feitos ataques públicos à figura do capitão e do serviço de visitadoras,

Page 236: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

236

intitulado “Pantolândia”. Ao final, além de tornar-se de conhecimento público, ocorre a

denúncia do trabalho do capitão, o que provoca o fim do casamento de Pantaleão.

Outro ponto crucial para a dissolução do seu casamento é o envolvimento

amoroso de Pantaleão com uma das visitadoras, a Brasileira, nome de Olga Arellano,

que com sua beleza marcante, se destaca das outras, caindo nas graças do capitão e

recebendo tratamento diferenciado. Torna-se a estrela das visitadoras, ajudando o

serviço a tornar-se conhecido por toda comunidade local, tornando-se um risco, já que

começam a ser registrados ataques de moradores das localidades aos comboios de

visitadoras. “(...) – O caso é muito simples. Nestes, toda vez que chega um comboio de

visitadoras é uma loucura. A simples ideia faz todos os galinhos de briga da vizinhança

ficarem de esporão duro. E às vezes, cometem disparates”. (ibid., p.176)

Num desses ataques, o barco de transporte das visitadoras é invadido e Brasileira

é violentamente assassinada. Seu sepultamento, organizado por Pantaleão, é realizado

com todas as honras de um militar, o que chama a atenção da sociedade e dita o fim das

atividades do SVGPFA, pois é uma declaração visível da ligação do exército com este

serviço clandestino.

Paralelo a estes acontecimentos o autor aborda a questão religiosa, seja através

da presença da Igreja Católica, na figura do comandante e chefe do corpo de capelães

militares, que após demonstrar a insatisfação pela existência do SVGPFA, pede o

desligamento da corporação, ou ainda, por apresentar a disseminação da seita do irmão

Francisco, tocando a fundo na questão do fanatismo religioso.

Por fim, após o assassinato da bela Brasileira e de seu sepultamento pomposo, o

exército dissolve o SVGPFA. Pantaleão, negando categoricamente o pedido de baixa do

serviço militar, é então enviado para a Guarnição de Pomata, lugar distante, quase

esquecido, mantendo-se afastado por pelo menos um ano, de modo que possa se redimir

do mal que causou e para que todos esqueçam as histórias do famoso capitão e seu

exército de visitadoras.

2.1 Breve análise da narrativa da obra

A análise da narrativa desta obra requer conhecimento prévio sobre algumas

estratégias de escrita presentes nas obras de Mario Vargas Llosa. Neste sentido, o

próprio autor elucida os leitores explanando no livro “Cartas a um joven novelista”

Page 237: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

237

(LLOSA, 1997) as técnicas narrativas que utiliza, dentre elas, a opção pelo

entrelaçamento de histórias.

O entrelaçamento permite que além da trama central, em torno da formação do

serviço de visitadoras pelo exército, transcorrem paralelamente outras histórias, a

exemplo dos acontecimentos envolvendo a seita de irmão Francisco e seus discípulos.

Sobre esta técnica Llosa (1997) discorre:

Permítame que le refresque la memoria sobre la articulación de las historias

entre sí. Para librarse de ser degollada como les ocurre a las esposas del

terrible Sultán, Scheherazade le cuenta historias y se las arregla para que,

cada noche, la historia se interrumpa de tal modo que la curiosidad de aquél

por lo que va a suceder —el suspenso— le prolongue la vida un día más. Así

sobrevive mil y una noches, al cabo de las cuales el Sultán perdona la vida

(ganado para la ficción hasta extremos adictivos) a la eximia narradora.

¿Cómo se las ingenia la hábil Scheherazade para contar de manera enlazada,

sin cesuras, esa interminable historia hecha de historias de la que pende su

vida? Mediante el recurso de la caja china: insertando historias dentro de

historias a través de mudas de narrador (que son temporales, espaciales y de

nivel de realidad)84

. (LLOSA, 1997, p. 74)

Dessa forma, para o escritor peruano contar uma história não é um ato linear,

com direção única. Para ele as histórias devem ser contadas como “caixas chinesas”,

daquelas em que cada vez que uma é aberta outra menor aparece em seu interior. Com

as histórias ocorre o mesmo, de uma principal são geradas outras que transcorrem

paralelamente, proporcionando uma sequência ambígua e complexa. A possibilidade

desse entrecruzamento de histórias suscita o aparecimento de outros personagens além

daqueles do núcleo principal da trama e muitas vozes podem ser percebidas, ganhando o

texto características polifônicas e dialógicas.

A polifonia, que inicialmente surgiu para designar um tipo musical marcado pela

presença de várias vozes que se sobrepõem simultaneamente, tornou-se conceito

importante na discussão de Bakhtin (1875-1975), teórico soviético, que analisando a

obra de Dostoievsky a reconhece como estratégia discursiva, extensiva a todo gênero

romance, em que vários pontos de vista e vozes são apresentados. “Assim, para Bakhtin,

84

Deixe-me refrescar sua memória sobre a articulação das histórias entre si. Para se livrar de ser

degolada, como acontece com as esposas do terrível Sultão, Scheherazade conta histórias e as interrompe

de tal modo, a cada noite, que a curiosidade sobre o que vai acontecer, o suspense, é estendido até o outro

dia. Assim sobrevive mil e uma noites, tempo em que o Sultão a perdoa e poupa a vida da exímia

contadora de histórias (ganhou a ficção até extremos aditivos). Como engenhosamente faz a hábil

Scheherazade para contar de maneira entrelaçada, sem cesuras, esta interminável história cheia de

histórias, de que depende sua vida? Através do recurso da caixa chinesa: inserindo histórias dentro de

histórias, através de mudanças de narrador (que são temporais, espaciais e em diferentes níveis de

realidade). (Llosa, 1997, p. 74)

Page 238: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

238

a polifonia é parte essencial de toda enunciação, já que em um mesmo texto ocorrem

diferentes vozes que se expressam, e que todo discurso é formado por diversos

discursos”. (PIRES, TAMANINI-ADAMES, 2010, p. 66).

Ainda tomando as considerações de Bakhtin, a discussão deste autor sobre

dialogismo também se torna importante para análise da narrativa de Vargas Llosa. Para

o filósofo soviético, o diálogo constitui-se na essência da linguagem, pois a palavra

possui movimento constante, é heterogênea. O discurso é construído a partir do discurso

do outro.

Esses dois conceitos dão fundamentos para compreensão da narrativa de

Pantaleão e as visitadoras, pois no texto constantemente ocorre à intercalação de falas

de personagens que nem sempre compartilham o mesmo tempo e espaço físico, como

no trecho a seguir:

- Dez mil semanais? – franze a testa o general Scavino. – É um exagero

delirante, Pantoja.

- Não, general – se colorem as bochechas do capitão Pantoja. – Uma

estatística científica. Veja estes organogramas. (...)

- É verdade que o pobre anjinho ainda sangrava nas mãozinhas e nos

pezinhos, dona Leonor? – balbucia, arregala os olhos e a boca Pochita (...)

- Vou ter uma síncope – ofega o padre Beltrán – Quem botou na sua cabeça

uma aberração dessa? Quem lhe disse que a “plenitude viril” só se atinge

fornicando?

- Os mais destacados sexólogos, biólogos e psicólogos, padre – abaixa os

olhos o capitão Pantoja. (LLOSA, 2007, p. 36).

É possível ver os diálogos entrelaçados, apresentando uma sequência de falas de

personagens que não têm contato entre si. As diferentes vozes que viabilizam discursos

diversos cumprem funções específicas na obra de Llosa (2007) como a de assegurar a

coexistência de pontos de vista e ideias contraditórias, proporcionando um texto

heterogêneo e dinâmico, com episódios que ocorrem em tempos, espaços e níveis

distintos, unidos numa totalidade narrativa, onde cada um tem significação, o que não

aconteceria se narrados separadamente. A esta técnica Llosa chama “vasos

comunicantes”, pois os diálogos estabelecidos superam a mera justaposição, o aspecto

determinante é que estabeleçam comunicação, mesmo que mínima.

Tal formatação pode, inicialmente, trazer ao leitor certa inquietação, exigindo

leitura atenta e não linear. Neste sentido, Barros (1997) comenta que num texto

polifônico chama à atenção a multiplicidade de significados e mecanismos de

manifestação das diferentes vozes, num contexto. Portanto, tal texto exige uma leitura

Page 239: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

239

múltipla, “(...) porque ocorre neles um estilhaçamento temático e uma mistura de vários

tipos de discurso que desencorajam a leitura homogeneizadora”. (BARROS, 1997, p.

78)

A narrativa composta pela intercalação de diálogos também impõe ao leitor uma

percepção diferente em relação ao tempo e espaço. Estes dois componentes são

trabalhados de modo a considerar a existência de um tempo cronológico e outro

psicológico. Llosa (1997) lembra que existe um cronológico medido pelo movimento

dos astros no espaço e preside a curva da vida, mas também um tempo psicológico do

qual somos conscientes em vista do que fazemos ou deixamos de fazer, gravita de

acordo com nossas emoções. Por isso, o tempo da literatura parte do psicológico, um

tempo subjetivo, que estimula a criatividade e autonomia do autor.

Se estas marcas constituem a escrita de Llosa, outras duas caracterizam a

narrativa de Pantaleão e as visitadoras: o uso de cartas, como elemento comunicativo

entre personagens e o humor sarcástico, que não perde de vista a crítica social. Sobre o

primeiro ponto, é perceptível que as cartas cumprem finalidades específicas: além de

demonstrar estado psicológico das personagens, a exemplo da carta de Pochita à sua

irmã, contanto suas angústias e impressões sobre o trabalho do marido constituem

também a forma como Pantaleão comunica aos seus superiores os procedimentos de

implantação e gestão do SVGPFA, permitindo uma descrição detalhada e uma

informalidade, dentro de uma instituição extremamente forma e hierarquizada como o

exército.

Informe número três (...)

1. Que em toda a Amazônia existe a crença de que a variedade vermelha do

boto (espécie de golfinho dos rios amazônicos) é um animal de

considerável potência sexual, o que o induz, com a ajuda do demônio ou

de espíritos malignos, a raptar qualquer mulher disponível a fim de

satisfazer seus instintos, adotando para isso uma forma humana tão

varonil e elegante que nenhum ente feminino lhe resiste. Que, devido a

essa crença, generalizou-se esta outra: que a manteiga de boto

incrementa o ímpeto viril e torna o homem irresistível à fêmea, sendo

por isso um produto de enorme demanda em lojas de mercados.

(LLOSA, 2007, p. 71)

Neste mesmo trecho é perceptível outro traço da escrita de Llosa, presente em

outras obras85

, que é o humor. É de conhecimento dos estudiosos da obra do escritor a

influência sartreana em seu pensamento. Contudo, em alguns pontos divergia do

85

A exemplo de Tia Julia e o escrevinhador (1977), A festa do bode (2000), A cidade e os cães (1963).

Page 240: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

240

filósofo francês e a utilização do humor na escrita era um desses pontos. Para Llosa,

literatura era feita com humor e, sobretudo, com certa dose de irracionalidade, de modo

que pudesse abarcar a grandiosidade da vida humana, permeada de fantasias, loucuras e

imprevistos.

É por isso que no prólogo do livro, o próprio escritor confessa que tentou contar

a história de forma séria descobrindo, no entanto, tal impossibilidade. “Descobri que era

impossível, que ela exigia a paródia e a gargalhada. Foi uma experiência libertadora,

que me revelou – só então! – as possibilidades da brincadeira e do humor na literatura”

(LLOSA, 2007, p.10).

Além da marca humorística em Pantaleão e as visitadoras, estão presentes

discussões sobre questões muito sérias. Como marca da escrita de Llosa percebe-se de

imediato seu engajamento político com as questões sociais do seu tempo. Para ele, o

compromisso do escritor, não uma obrigação, está em denunciar a realidade social,

evitar a irresponsabilidade na hora de escrever e engajar-se no combate às injustiças.

Seguindo nesta direção, em Pantaleão e as Visitadoras, a questão central da

relação exército e serviço interno de prostituição, também alimenta a discussão sobre

outras questões, que transcorrem paralelamente, envolvendo religiosidade e o fanatismo,

o papel das mulheres na visão de uma instituição extremamente masculinizada, como o

exército, e a corrupção e jogos de interesses na mídia. Considerando estas temáticas,

elas serão a base das discussões proferidas nos próximos capítulos deste trabalho.

3 A perspectiva de gênero da obra

As teorias críticas, a exemplo do marxismo, centralizaram suas análises da

sociedade na divisão de classes e domínio do poder econômico. Deram valiosas

contribuições para o entendimento das relações de poder no âmbito da infraestrutura,

revelando também o papel fundamental das ideologias.

No entanto, com o avanço das chamadas teorias pós-críticas86

, a análise isolada

do viés econômico demonstrou ser insuficiente para compreensão de outros aspectos

que compõem a sociedade. Colaborou também neste sentido, a arrefecida atuação dos

chamados “movimentos das minorias”, que principalmente nos anos 60 do século XX,

86

Tais como a fenomenologia (em linhas gerais, se refere ao estudo da experiência humana consciente na

vida diária) ou o multiculturalismo (movimento que tem como objetivo a elevação e valorização de meios

formativos étnicos diferentes). Ver: JOHNSON, Allan. G. Dicionário de Sociologia: guia prático da

linguagem sociológica. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997.

Page 241: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

241

trouxeram à tona discussões voltadas para os direitos dos negros e das mulheres,

assegurando visibilidade a estes grupos. Desde então, a discussão sobre o papel das

mulheres na sociedade ganhou espaço acadêmico e destes estudos configurou-se uma

nova categoria de análise, que procura investigar as questões relacionadas ao universo

feminino, mas também do mundo masculino, visto que é impossível dissociar um do

outro.

Considerando esta categoria de análise, Pantaleão e as visitadoras coloca como

inevitável a discussão sobre gênero, constatando que as personagens centrais da obra

representam papéis sociais em torno de padrões de masculinidade e de feminilidade,

sobretudo quando se contrapõe os papéis desempenhados pelas duas mulheres centrais:

Brasileira, a amante, e Pochita, a esposa.

3.1 História das mulheres e a constituição do gênero como categoria de análise

social

A história do movimento feminista e da luta das mulheres por um maior espaço

de atuação social é antiga e abriu precedentes para o atual reconhecimento da categoria

gênero. Na antiguidade existiam muitas sociedades matriarcais, pois elas eram

responsáveis pela coleta e proteção da prole, sendo atribuído a elas a descoberta da

agricultura, justamente pela necessidade de observação das plantas e sua produção de

alimentos.

Porém, a luta proporcionada pela produção de alimentos e por terras mais férteis

fez surgir lideranças guerreiras que pudessem proteger seus clãs, advindo daí a figura de

homens fortes, conquistadores e protetores, símbolos de uma sociedade patriarcal. A

partir de então, a vida das mulheres se voltou para os “domínios do lar”, subserviente ao

marido. Obviamente, a história é permeada de exemplos de mulheres transgressoras

desta ordem.

Por volta de 350 d.c. Hypatia de Alexandria, astrônoma, professora de filosofia e

primeira matemática documentada. Realizou estudos na área da álgebra e aritmética

sendo muito respeitada em sua época, contudo num momento de expansão do

cristianismo e, como defensora do pensamento livre, Hypatia foi considerada uma

herege, despida, apedrejada, esquartejada e seus restos mortais queimados. Outro

exemplo de transgressão e também de repressão feminina é da poetisa mexicana Juana

Inés de la Cruz. Conhecida como “ A fênix da América”, desde criança teve contato

Page 242: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

242

com os livros da biblioteca de seu avô e não deixou mais de estudar, tornando-se freira

para poder dedicar-se mais ao exercício da leitura. Sua erudição e crítica ao tratamento

destinado às mulheres, a colocaram como primeira feminista das Américas e provocou a

ira nos homens de seu tempo e, particularmente de seu confessor. Obrigada a desfazer-

se de sua biblioteca pessoal, falecendo doente logo em seguida.

Também se registra, ainda na antiguidade, a existência de civilizações onde as

mulheres exerciam importante papel social, como na cretense ou minóica. A religião se

baseava, principalmente, no culto à Deusa-mãe, divindade responsável pela fertilidade

da terra e pela fecundidade e, por isso, as mulheres tinham o direito de exercer as

mesmas atividades que os homens cretenses. Muitas assumiam a função de sacerdotisas.

Contudo, este não era o modelo definido pela maioria das sociedades antigas, ao

contrário, prevaleceu a ideia de passividade e recato femininos.

Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas. Vivem pros seus

maridos, orgulho e raça de Atenas. Quando amadas, se perfumam, se banham

com leite, se arrumam, suas melenas. Quando fustigadas não choram se

ajoelham, pedem, imploram. Mais duras penas. Cadenas. (HOLANDA, 1976)

A canção Mulheres de Atenas, acima retratada, composição de Chico Buarque e

Augusto Boal, retrata a vida das mulheres na sociedade Ateniense, no período clássico,

ressaltando sua figura submissa, papel desejado para elas dentro da organização daquela

sociedade. A composição revela como a conhecida democracia Ateniense, era exercida

por pequena parcela da população, ricos e homens.

Às mulheres atenienses cabia o mundo doméstico, cuidar da casa, servir ao

marido e criar os filhos. Sua educação era realizada nos gineceus (espaço na casa

destinado às mulheres) através de uma instrução rudimentar. Aprendia a cozinhar, coser,

bordar e cantar, pouco aparecia em público, comparecendo apenas nas festas religiosas.

Seu papel fundamental era o de mãe dos cidadãos que governavam a democracia da

cidade.

No entanto, o modelo de educação feminina Ateniense não era o único na Grécia

Antiga, pois o tratamento feminino na sociedade Espartana era um pouco diferente.

Apesar de ser negada a cidadania e não possuírem propriedades, nesta reconhecida

sociedade militarizada, a mulher era responsável por gerar guerreiros fortes e corajosos.

Assim, elas recebiam educação atlética, sendo comum que se dedicasses aos jogos

esportivos, e também controlavam as finanças da casa e podiam participar de reuniões

Page 243: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

243

políticas públicas. “Também as mulheres, em Esparta, deviam robustecer o próprio

corpo com a educação física – ‘suportar bem a gravidez’ e para desenvolver os ‘nobres

sentimentos da virtude e da glória’, nota ainda Plutarco”. (CAMBI, 1999, p. 83)

O declínio grego e a ascensão romana trouxeram um novo panorama político,

mas manteve a organização social e classes desiguais e poucas possibilidades de

mobilidade. Para as mulheres, o papel de esposa e mãe persistia. A educação dos filhos

era confiada aos pedagogos e as meninas casavam-se cedo, em casamentos arranjados

de acordo com os interesses financeiros do pai, provedor familiar.

Já a expansão do cristianismo altera a formação familiar, redefinindo os vínculos

parentais, antes baseados na autoridade paterna e agora baseados em laços amorosos.

Desta forma, a manutenção da Sagrada família redefine os papéis de seus componentes

delegando ao pai o papel de guia, a mãe como sua auxiliar e os filhos submissos e

respeitosos. Sobre a cultura cristã opõe dois modelos: o de Eva, figura pecaminosa; e de

Maria, pureza virginal.

(...) Quanto à mulher, o cristianismo – embora oscilando entre os modelos

opostos de Eva, a corruptora, emblema do feminino como pecado, e de

Maria, a co-redentora, a mãe de Cristo, a advocata peccatorum, a Virgem,

que resgata e exalta o feminino na família e na Igreja – liberta a mulher de

antigas cadeias, sublinha sua igualdade em relação ao homem (igualdade

sobretudo diante de Deus) e lhe atribui um papel se não central pelo menos

de presença constante na vida religiosa (ibid., p. 134)

Estes mitos já existiam nas culturas antigas, a exemplo de Hera (Deusa do

casamento, do compromisso de esposa), arquétipo da mulher incompleta sem um

companheiro; de Deméter (Deusa das colheitas, nutridora, mãe), que representa o

instinto maternal na gravidez, ou mesmo Afrodite, conhecida como Deusa do amor,

beleza e sexualidade. Contudo, é no período medieval e com o estabelecimento dos

ideais dicotômicos cristãos, que opõe o bem e o mal, a matéria e o espírito, o céu e o

inferno, que os modelos da santa e da pecadora se estabelecem no imaginário social.

Contribuíram para isso a instituição do celibato, pois os clérigos deveriam viver longe

das mulheres e do pecado carnal e, por outro lado, o casamento, que fortaleceu a

imagem de esposa e boa mãe.

Para Cambi (1999) na Idade Média são retomados dois modelos, que valorizam

a mulher: as santas e o “amor cortês”. As primeiras são consideradas heroínas

femininas, desenvolvem a capacidade de amar e comunicar-se com Deus; já o amor

Page 244: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

244

cortês cria um código cavalheiresco, no qual o amor irrealizável, leva à idealização da

mulher, musa inspiradora, imagem ideal do feminino.

Outra personalização feminina importante está no papel das bruxas, mulheres

que possuíam conhecimentos sobre ervas medicinais e cura de algumas enfermidades,

eram consideradas organizadoras de rituais pecaminosos. Para a Igreja Católica eram

hereges, faziam pactos demoníacos e por isso eram caçadas e condenadas à fogueira. A

caça às bruxas é um capítulo da Idade Média. Acredita-se que as bruxas eram parteiras

ou mesmo enfermeiras, que conheciam o emprego de ervas medicinas e muitas vezes

eram a única possibilidade de atendimento médico das populações mais pobres.

Detentoras de grande conhecimento foram vítimas de grande campanha, pelos senhores

feudais e também pela Igreja Católica, que as acusava de fazer bruxaria.

Findado o período medieval, a modernidade para as mulheres não trouxe

grandes modificações já que seguia vivendo em reclusão e sendo alicerce da família.

Preparadas para o casamento arranjado, nos quais o elemento motivador era a

possibilidade dos dotes oferecidos. Nas famílias pobres as moças eram obrigadas a

trabalhar ou em pequenas fazendas, ou no trabalho doméstico nas casas da cidade.

A educação das meninas, nesse período, era realizada em pequenas escolas ou

conventos, mas principalmente em casa. Isso não impediu que surgissem movimentos

de mulheres, sobretudo na Inglaterra, defendendo uma melhor educação para as jovens,

argumentando inclusive que seria um fator de enriquecimento do casamento, pois mais

preparadas teriam melhores condições de apoiar os maridos. Nesses movimentos insere-

se a célebre obra “A vindication of the rights of woman”87

(Uma defesa dos Direitos da

Mulher) de Mary Wollstonecraft, lançado em 1792 e considerada obra precursora dos

movimentos feministas.

Além dos primeiros movimentos feministas na Inglaterra, registra-se forte

atuação na França, como o de Olympe de Gouges, revolucionária que, em 1759, lançou

a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, e que por sua ousadia foi condenada e

decapitada. Além dela, a participação das mulheres na Revolução Francesa foi

importante componente para a mudança de perspectivas sobre a atuação social feminina.

A presença delas foi decisiva a exemplo do episódio em que 7 mil mulheres, lideradas

por vendedoras de peixe, foram até Versalhes, protestando contra o preço do pão. Tal

87

Em 1832, a professora potiguar Nísia Brasileira Floresta lança a tradução livre desta obra, com o título

“Direitos dos homens, injustiças para as mulheres”. A referida professora é uma das pioneiras do

movimento feminista e abolicionista no Brasil, defendendo e concretizando ações de acesso à educação

para as mulheres.

Page 245: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

245

pressão forçou o Rei a mudar-se para Paris, enfraquecendo seu poder e novos rumos

foram dados à Revolução.

Porém, acontecimento histórico decisivo para emancipação feminina foi, por

volta dos séculos XVIII e XIX, a ocupação de postos de trabalho provocada pela

Revolução Industrial. A separação do trabalho doméstico do trabalho assalariado rompe

com a perspectiva da mulher dona de casa, abrindo a possibilidade de ocupação de

novos espaços sociais. Tal orientação é fortalecida por duas grandes guerras mundiais,

ocorridas na primeira metade do século XX. A saída dos homens para o campo de

batalha e a necessidade de produção industrial em grande escala decreta definitivamente

a entrada das mulheres no mundo do trabalho, até então reino masculino. Porém sua

ocupação não foi fácil, baseada em exaustivas jornadas de 16 horas ao dia, péssimas

condições de trabalho e salários menores que dos homens. Os movimentos em defesa

dos direitos das mulheres eram fortemente reprimidos.

Também no final dos séculos XIX e início do XX o movimento Sufragista

americano reuniu lideranças femininas, inicialmente em defesa da abolição e

posteriormente com a o voto para as mulheres. Este movimento foi responsável pela

criação das primeiras associações femininas em defesa do sufrágio até conquistarem,

em 1919, uma emenda constitucional que garantia o direito de voto independente de

raça ou sexo.

Na virada do século, as manifestações contra a discriminação feminina

adquiriram uma visibilidade e uma expressividade maior no chamado

“sufragismo”, ou seja, no movimento voltado para estender o direito do voto

às mulheres. Com uma amplitude inusitada, alastrando-se por vários países

ocidentais (inda que com força e resultados desiguais), o sufragismo passou a

ser reconhecido, posteriormente, como “a primeira onda” do feminismo.

(LOURO, 1997, p. 14-15)

Todos esses acontecimentos precedem um marco histórico na literatura

feminista: o lançamento de “O segundo sexo”, em 1949, escrito pela filósofa francesa

Simone de Beauvoir. Obra referencial, o livro de Beauvoir faz uma análise sobre a

construção histórica, biológica e psicossocial da mulher, demonstrando que os papéis

desempenhados por elas foram construídos ao longo do tempo e sua submissão foi uma

condição culturalmente disseminada.

Com a descoberta do cobre, do estanho, do bronze, do ferro, com o

aparecimento da charrua, a agricultura estende seus domínios. Um trabalho

intensivo é exigido para desbravar florestas, tornar os campos produtivos. O

homem recorre, então, ao serviço de outros homens que reduz à escravidão.

Page 246: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

246

A propriedade privada aparece: senhor dos escravos e da terra, o homem

torna-se também proprietário da mulher. Nisso consiste "a grande derrota

histórica do sexo feminino". Ela se explica pelo transtorno ocorrido na

divisão do trabalho em consequência da invenção de novos instrumentos. "A

mesma causa que assegurara à mulher sua autoridade anterior dentro da casa,

seu confinamento nos trabalhos domésticos, essa mesma causa assegurava

agora a preponderância do homem”. (BEAUVOIR, 1970, p. 74)

Com esta obra, a filósofa francesa tornou-se um ícone para as feministas e

leitura obrigatória nos movimentos organizados nos anos posteriores, inaugurando o que

se costumou chamar a segunda onda do movimento feminista. Neste sentido, os anos 60

do século XX, foram particularmente especiais, tendo seus efeitos estendidos até os

anos 80, sendo registrados acontecimentos marcantes, sobretudo nos Estados Unidos e

Europa, como o famoso episódio da “queima dos sutiãs”88

e o surgimento de vários

slogans como “Women’s Liberation” (Libertação das mulheres). Em 1963, Betty

Friedan escreve a “A mística feminina”, obra em que observa a mistificação da dona de

casa e mãe zelosa, após Crise de 1929, como modelo essencial para o país. A educação

da mulher era pautada nestes termos, o que gerava, com o passar do tempo, frustração e

descontentamentos de diversas ordens, provocando depressão e o consumismo

feminino.

Outro acontecimento que provocou verdadeira revolução assegurando a

liberalização da mulher e o poder de decisão sobre seu próprio corpo foi, em 1960, a

criação da pílula anticoncepcional. Se antes um dos papéis essenciais atribuídos à

mulher era o da reprodução, o contraceptivo oral representou uma mudança radical no

exercício da sexualidade feminina, pois agora ela poderia usufruir de prazer, sem

preocupação com uma possível gestação.

É portanto, neste contexto de efervescência social e política, de contestação e

de transformação, que o movimento feminista contemporâneo ressurge,

expressando-se não apenas através de grupos de conscientização, marchas e

protestos públicos, mas também através de livros, jornais e revistas. Algumas

obras hoje clássicas – como por exemplo, Le deuxiéme sexe, de Simone de

Beauvoir (1949), The feminine mystique, de Betty Friedman (1963), Sexual

politics, de Kate Millett (1969) – marcaram esse novo momento. Militantes

feministas participantes do mundo acadêmico vão trazer para o interior das

universidades e escolas questões que as mobilizavam, impregnando e

“contaminado” o seu fazer intelectual – como estudiosas, docentes,

pesquisadoras – com a paixão política. Surgem os estudos da mulher.

(LOURO, 1997, p. 16)

88 Em verdade, não houve queima de sutiãs. As ativistas do grupo Women´s Liberation Moviment,

planejaram, em protesto atear fogo em objetos como sutiãs, maquiagens e espartilhos no local onde

estavam realizando o concurso Miss América, em sinal de protesto contra o que chamavam de ditadura da

beleza.

Page 247: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

247

O trabalho e atuação intelectual destas feministas, na década de 90, iniciam a

terceira fase do movimento, o feminismo acadêmico. Nele, algumas definições da

segunda onda são contestadas. É o período de olhar crítico sobre o movimento, no qual

se ressalta a micropolítica, pois dentro do movimento existiam grupos que não se viam

contemplados, a exemplo das mulheres negras. Como discurso construído

eminentemente por mulheres brancas de classe média alta também passou a ser

questionado enquanto “fala totalitária”, ou seja, a universalização do sujeito mulher.

Dessas discussões deriva-se a perspectiva atual de gênero, conceito que refuta o

determinismo biológico que distingue os sexos e reconhece o caráter social das

construções em torno destas diferenças, em outras palavras, parte da análise das

características dos sexos para compreender suas representações no âmbito social.

Assim, assumindo a perspectiva de gênero, busca-se compreender os constructos sociais

em torno da mulher, mas também do ser homem, admitindo um caráter relacional para a

categoria. Além disso, superando os ditames biológicos e ratificando as análises dos

aspectos sociais, o movimento feminista admite outra via que é a inclusão da

representação de algumas especificidades, como das mulheres trans, lésbicas e outras

possibilidades de identidade sexual. Para tanto se fala em teoria Queer, perspectiva que

busca romper com a análise binária da categorização do sexo ou gênero, analisando

outras possibilidades identitárias.

3.2 Os papéis sociais e o triângulo amoroso: Pantaleão, Brasileira e Pochita

O exército é instituição formada eminentemente por homens, que representam o

modelo de força e imponência próprios para a defesa de uma nação. Os primeiros

registros da formação de exércitos, ligados ao desenvolvimento da agricultura e

formação de centros urbanos, datam do Egito e Mesopotâmia. Os exércitos prontamente

se tornaram essenciais para garantir a conquista de terras, riquezas e domínio de outros

povos, assegurando a mão-de-obra para o trabalho escravo. Com isso, não só o

desenvolvimento de armas, mas o treinamento dos homens eram procedimentos

fundamentais. Assim, os homens a serviço dos exércitos precisavam ser fortes, ágeis,

disciplinados e resistentes. Deviam refletir o padrão de masculinidade esperado.

Page 248: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

248

Como já comentado, no decorrer da história da humanidade dois modelos sociais

foram construídos em torno da definição dos sujeitos homem e mulher. Para eles, o

padrão de masculinidade impõe características, tais como racionalidade, força e

virilidade. Para elas, são atribuídas a emotividade, subjetividade, delicadeza e

fragilidade. Além disso, as mulheres convivem com o dilema de reconhecer-se em dois

papéis: a da esposa, responsável pela reprodução e manutenção da família; a da

prostituta; aquela que dá prazer sexual aos homens. Na obra em questão, os três

modelos sociais estão representados através dos personagens Pantaleão Pantoja, sua

esposa Pochita e da visitadora Brasileira.

Pantaleão é um capitão do exército, figura ilustrativa do padrão de

masculinidade dos homens da instituição. Além disso, suas habilidades no campo da

matemática e administração são também características pertinentes aos homens e,

particularmente, aos que exercem algum tipo de poder. Quando escolhido para a missão

de implantação do SVGPFA, mesmo passando por conflitos pessoais, aceita-a por não

admitir quebrar regras e desobedecer a hierarquia da instituição. “Na verdade coronel,

não tenho ideia como – engole saliva o capitão Pantoja. – Mas farei o que me

ordenarem, naturalmente”. (LLOSA, 2007, p. 17)

A disciplina de Pantaleão e sua imagem de bom soldado e marido são colocadas

em xeque quando inicia o contato com o universo que cerca as prostitutas. Começa a

beber, chegar tarde em casa e isso coloca em risco seu casamento, pois sua esposa sem

saber qual a missão a que foi destacado lhe questiona com frequência sobre essa

mudança de hábitos. Contudo, maior mudança é percebida quando começa a se envolver

com Brasileira e passar a fazer as entrevistas com as candidatas a visitadoras,

experimentando o serviço que elas oferecerão.

- Quantas vezes por semana, Pantita? - se levanta, enche recipientes, se lava

se enxágua, se veste a Brasileira. – Mais do que uma visitadora, na certa. E

quando há exame de candidatas, nem se fala. Com esse costume que você já

pegou na, como se chama?, revista profissional? Sacana você é.

- Isso não é diversão, é trabalho – se espreguiça, senta no beliche, toma

coragem, arrasta os pés para o banheiro, urina Panta. – Não ria, é verdade.

Além disso, a culpa é sua, foi você que me deu a idéia quando fiz seu exame

de ingresso. Antes não tinha pensado nisso. Acha que é brincadeira? (ibid.,

p.172)

Neste trecho além de se verificar a mudança de comportamento de Pantaleão,

passando de homem de família para amante insaciável, percebe-se a tendência de se

Page 249: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

249

vitimar culpando Brasileira pela atitude tomada. A história de Adão e Eva remonta essa

ideia, na qual a mulher é considerada culpada por levar o homem a pecar, utilizando

para isso meios sedutores. Desde então, um dos papéis atribuídos à mulher é o da

sedutora que remete ao pecado. Neste sentido, a igreja católica tratou de reforçar as

duas personalidades femininas: a santa e a prostituta. Para a primeira tratou de cobrir o

corpo, tornando-a assexuada, símbolo da castidade, submissão e obediência. A Virgem

Maria pura e casta. Por outro lado, Madalena, a pecadora arrependida, representando os

pecados do mundo.

Contudo, mais uma vez é na sociedade capitalista que o corpo da mulher torna-

se símbolo de prazer e pecado, agora não mais por motivações religiosas, mas

influenciado pela ideologia de mercado, que através da publicidade, destaca a

sensualidade como elemento despertador do desejo e do consumo. Não de forma

desinteressada a propaganda explora a imagem feminina, desnudando seu corpo. A

Brasileira é por sinal, o símbolo dessa configuração: o próprio pecado em forma de

mulher, com atributos físicos que despertam o desejo alheio e perturbam o pensamento

dos homens, alterando sua conduta.

- Ela continua tão bonita ou já piorou um pouco? – diz Chuchupe. Não a vejo

desde que foi para Manaus. Na época não se chamava Brasileira, só

Olguinha.

- Bonita de cail pla tlás, e além dos olhos, dos peitinhos e das pelnas, que a

vida toda folam de tilal o chapéu, agola está com uma bunda magnífica –

assobia, apalpa o ar o China Porfírio. – Dá pla entendel pol que dois calas se

matalam pol ela. (ibid., p. 92)

Em contrapartida, oposto ao papel de Brasileira aparece Pochita, esposa recatada

e voltada para o lar. Acompanhando o marido, muda de cidade e estilo de vida,

renunciando a alguns privilégios destinados às famílias dos militares. No decorrer da

história engravida, dando à luz Gladyzinha, única filha do casal. Em sua inocência é a

última a saber do trabalho que o marido executa e ciente da natureza da atividade

abandona-o, rompendo a harmonia familiar.

Reafirmando a natureza masculina, Pantaleão cumpre o papel de provedor,

sustentando a família (esposa, filha e mãe) e também reservando parte do seu soldo a

Brasileira. No entanto, o valor é insuficiente para o sustento da visitadora e ele lhe

permite uma cota de visitações por mês, alegando que o regulamento do SVGPFA

obriga o cumprimento mínimo de dez visitas ao mês por trabalhadora e sendo um

regulamento criado por ele mesmo, jamais poderia descumpri-lo.

Page 250: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

250

- Todos os oficiais sabem e acham perfeito que você tenha uma garota. (...) –

mas ninguém entende esse seu sistema. É compreensível que não ache graça

nenhuma vendo a tropa comer a sua fêmea. Para que então esse formalismo

ridículo? Dez fodas é a mesma coisa que cem, meu irmão.

- Dez é o que o regulamento obriga. (...) – Como vou violar o regulamento?

Fui eu mesmo que fiz. (ibid, p. 175-176)

Mas esse triângulo amoroso não se sustenta por muito tempo, encerrado pelo

abandono do lar por Pochita e, principalmente, pelo assassinato violento de Brasileira.

Envolvido emocionalmente com a visitadora, Pantaleão realiza cortejo fúnebre com

honras militares escandalizando a todos, sobretudo as altas esferas do exército. Isso

decreta o fim do serviço de visitadoras e a punição do capitão Pantaleão, que para não

ser expulso da corporação, é obrigado a servir num grupamento bem distante, até que

todos tenham esquecido o SVGPFA.

Tanto a morte de Brasileira como o exílio de Panta funcionam como punição dos

personagens. Ela, como pecadora e destruidora de lares, é morta e pregada numa cruz.

Ele ameaçado de ser expulso do que mais ama, retoma sua vida anterior assegurando

sua família. Este caráter punitivo ratifica o papel de instituição legitimadora de poder de

Estado do exército, que utiliza o serviço de visitadoras e os sujeitos envolvidos,

enquanto eles são úteis aos seus interesses e elimina-os quando estes passam a

incomodar ou não mais servir.

- O grande problema é que não há castigo suficientemente grave para a

monstruosidade que cometeu lá em Iquitos – cruza os braços sobre o peito o

Tigre Collazos. – Fez tanto mal ao Exército com esse escândalo que nem o

fuzilamento seria uma desforra à altura. (ibid., p. 243)

Esse caráter dúbio do exército que ao mesmo tempo fomenta a prostituição e em

seguida a destitui é comum quando se trata deste tipo de serviço. Historicamente a

prostituição serviu a todas as classes sociais, mas em relação aos que exercem algum

tipo de poder é um serviço que precisa permanecer “invisível”. Na Idade Média eram

excomungadas, mas eram toleradas, quase um mal necessário. Neste sentido, Sor Juana

Inés de la Cruz em seu texto “Hombres necios” descreve a natureza duvidosa da

dominação masculina sobre a mulher, pois os homens por um lado acusam as mulheres

e por outro a incitam ao mal, deixando-as escravizadas.

Hombres necios que acusáis

Page 251: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

251

A la mujer sin razón,

sin ver que sois la ocasión

de lo mismo que culpáis:

si con ansia sin igual

solicitáis su desdén,

¿por qué queréis que obren bien

si las incitáis al mal?89

. (DE LA CRUZ, s.d)

Além disso, nos períodos de conflito também é bastante comum o acionamento

de serviços de prostituição, como forma de controlar a libido masculina, tentando evitar

assim violações de todo tipo contra as mulheres de grupos dominados. Durante a

Primeira Guerra Mundial, por exemplo, na Alemanha e França os bordéis chegaram a

ser regulamentados.

No caso do serviço de visitadoras na obra de Llosa, verdadeiro exército

feminino, também cumpriu com sucesso o papel inicialmente planejado de controle do

ímpeto sexual dos soldados. Foi além, trouxe para si as atenções da sociedade local. Do

ponto de vista institucional, o SVGPFA tornou-se organismo que fugiu ao controle dos

militares, sendo alvo de críticas da “Voz do Sinchi” e foco das preocupações do alto

comando do exército, demonstrando o êxito administrativo do projeto.

Considerando a categoria de análise “relações de poder entre exército peruano e

exército de visitadoras” é possível destacar que o sucesso do SVGPFA se deve a alguns

elementos: a) a institucionalização do serviço; b) ao sentimento de segurança e

valorização desenvolvido nas visitadoras. Em relação ao primeiro item em trechos da

obra percebe-se que o serviço de visitadoras adquire características da instituição militar

tais como a adoção de fardamento, nas cores verde e vermelho, o primeiro

representando a riqueza da floresta amazônica e o outro a paixão, elemento

motivacional do serviço prestado. Além disso, ocorre uma mudança no comportamento

das visitadoras que começam a aceitar ordens, reconhecendo a hierarquia que move os

militares, a apresentarem-se de forma ordenada e em fileiras, ao cumprimento de

horários e à necessidade de sanções, como mecanismo disciplinador das atividades.

Essas mudanças demonstram à adequação à rigidez da vida militar, como também do

sentimento de pertencimento à instituição. Marca disso é a criação do hino das

visitadoras:

(...)

Servir, servir, servir

O exército da Nação

89

Homens tolos que acusam a mulher sem razão, sem ver que és o causador do mesmo que culpas: se

com ânsia inigualável, solicitas seu desdém, por que quereis que façam o bem se você as incita ao mal?

Page 252: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

252

Servir, servir, servir

Com muita dedicação

No chão, na rede, no capim

Do quartel ou acampamento

Damos beijos, abraços e afins

Quando o superior determina

Servir, servir, servir

O exército da Nação

Servir, servir, servir

Com muita dedicação

Cruzamos selvas, rios e vales

Nem do Jaguar, nem do puma nem da caça

Temos o menor temor

Porque nos sobra patriotismo

Fazemos gostoso amor (...) (LLOSA, 2007, p. 124)

Este tipo de ordenamento e a figura organizativa da instituição lhes assegura um

sentimento de proteção e segurança tanto financeira quanto física. Contudo, este

ordenamento e o sucesso alcançado tornam-se também a razão do seu infortúnio,

criando as bases para que seja encerrado.

4 Considerações Finais

Pantaleão e as Visitadoras é uma obra que permite ampla análise sobre as

relações de poder na sociedade, particularmente nas relações de gênero. Percebe-se que

diversos mecanismos de controle social são lançados sobre os personagens exercendo

coerção sobre seus comportamentos à medida que são percebidas mudanças no

comportamento das visitadoras.

Elas formam um grupo que vêem o SVGPFA como um espaço de proteção,

reconhecimento e valorização do seu trabalho. O processo de disciplinamento desse

grupo é percebido quando adotam fardamento próprio, aceitam cumprir ordens e

horários e criam o hino das visitadoras. Este ordenamento, longe de ser visto por elas

como ponto negativo, é responsável pelo fortalecimento de suas identidades, tanto que

participar do serviço de visitadoras passa a ser o “sonho” das prostitutas locais.

A despeito da possibilidade de transgressão das relações de poder, o livro deixa

bastante claro que aqueles que transgridam valores e princípios estabelecidos

socialmente, normalmente são punidos de algum modo. Quando é estabelecido o

triângulo amoroso entre Pantaleão, Pochita e Brasileira os papéis sociais relativos ao

Page 253: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

253

universo masculino e feminino ficam bastante representados: Pantaleão, capitão do

exército, homem racional, disciplinado, forte e provedor de suas duas mulheres;

Pochita, mãe de família, esposa fiel e companheira, a rainha do lar; Brasileira, a bela

amante, sexy e desejada pelos homens. O triângulo é desfeito quando Pochita, traída,

abandona Pantaleão e também do assassinato violente de Brasileira. Pelas transgressões

cometidas, Pantaleão e Brasileira são “punidos”, mecanismo de controle necessário para

a manutenção de princípios que regem a sociedade e a família. Percebe-se, então, um

constante processo de reprodução social.

Neste sentido, o próprio funcionamento do serviço de visitadoras sofre um

processo de punição. Começando como um modesto empreendimento, logo alcança

grande êxito, sendo o centro das atenções de toda comunidade local. Pelo caráter

adverso que o SVGPFA guarda em relação ao exército, sua ampliação torna-se uma

ameaça e precisa ser desfeito. Desta forma, a obra de Mario Vargas Llosa, traça um

panorama real da sociedade, suas instituições, interesses e mecanismo que conformam

os sujeitos, assegurando as ideologias que perpetuam a organização social vigente.

REFERÊNCIAS

BARROS, D. L. P. de. Contribuições de Bakhtin às teorias do discurso. In:. _______.

D. L. P. de FIORIN, J. L. (Org.). Dialogismo, polifonia e intertextualidade: em torno

de Mikhail Bakhtin. São Paulo: Edusp, 1997.

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo. 1970. Disponível em: < https://books.google.com.br/books?id=3pesCQAAQBAJ&pg=PA74&lpg=PA74&dq#v

=onepage&q&f=false>. Acesso em: jan. 2015.

CAMBI, Franco. História da pedagogia. São Paulo: ed. da UNESP, 1999.

CRUZ, Juana Inés de la. Hombres necios. Disponível em: < http://www.poesiademujeres.com/2011/05/hombres-necios.html>. Acesso em: jan.

2015.

HOLANDA, Chico Buarque de. Mulheres de Atenas. 1976. Disponível em:

http://www.letras.com.br/#!chico-buarque/mulheres-de-atenas. Acesso em: fev., 2015.

LLOSA, Mario Vargas. Pantaleão e as visitadoras. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007.

____. Cartas a un joven novelista. 1997. Disponível em:

http://img9.xooimage.com/files/8/9/b/vargas-llosa-mari...sta-pdf--2669103.pdf. Acesso:

jan., 2015.

Page 254: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

254

LOURO, Guacira Lopes. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-

estruturalista. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

PIRES, Vera Lúcia. TAMANINI-ADAMES, Fátima. Desenvolvimento do conceito

bakhtiniano de polifonia. In: Estudos Semióticos. São Paulo: 2010. v. 06, n. 02.

Disponível em:

http://www.fflch.usp.br/dl/semiotica/es/eSSe62/2010esse62_vlpires_fatamanini_adames

.pdf. Acesso em: jan.2015.

Page 255: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

255

O DESENVOLVIMENTO DA HABILIDADE LEITORA EM

ESPANHOL COM O USO DE “TIRAS”: um relato de experiência

Luzilene Cardoso de Souza90

1. INTRODUÇÃO

É inegável que as histórias em quadrinhos (HQs) têm se tornado um gênero

textual mais atrativo aos olhos do público infantojuvenil. E, utilizar este estilo para

instigar a aprendizagem da leitura do idioma espanhol é um artifício que vem sendo

adotado, inclusive, pelas editoras que têm colocado as tiras nos livros didáticos de

língua estrangeira.

Como diz Vergueiro (2012, p. 21), “(...) As histórias em quadrinhos aumentam a

motivação dos estudantes para o conteúdo das aulas, aguçando sua curiosidade e

desafiando seu senso crítico.”.

Nesse sentido, o presente artigo tem por objetivo verificar como é feita ou não a

associação das linguagens verbal e não verbal apresentadas em tiras hispânicas, por

alunos do nível médio de uma escola pública em Sergipe. Isso porque não se trata

apenas de leitura e tradução, mas também da compreensão da mensagem que o autor

quis passar, e somente com a leitura de todo o quadrinho isso é possível. O problema é

que muitas vezes o sentido real da tira se perde devido à falta de atenção aos detalhes

presentes em todo o quadro.

Para tanto, torna-se necessário compreender o conceito de leitura e seu processo

de aprendizagem que é feito, basicamente, com a decodificação da escrita unida à

imagem, como também através da motivação e experiência de vida do leitor, sendo que

o papel do professor é direcionar o aluno nesse processo. Ao trabalhar o

desenvolvimento da leitura com tiras em outra língua tanto pode aumentar o interesse

90 Licenciada em Letras Espanhol pela Universidade Estadual de Feira de Santana - UEFS. Fez

Especialização em Tradução, Ensino e Cultura de Língua Espanhola na Faculdade São Luís de França

Atualmente é professora de espanhol na Educação Básica da Rede Pública do Estado de Sergipe.

Page 256: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

256

dos alunos pelo hábito de ler, quanto pode tornar mais fácil aprender um segundo

idioma.

Torna-se viável, também, conhecer um pouco a história dos quadrinhos que,

segundo dizem surgiram como pinturas rupestres, e também já foram vistos como

leitura fútil e que desviavam a atenção dos estudos. Mas a situação mudou com o

tempo, passou de rechaçada pela sociedade a um instrumento atrativo para o mundo da

leitura. Além de apresentar os tipos diferentes de textos icônicos que parecem com os

quadrinhos, outro item trabalhado é a sua utilização no ensino do espanhol.

Desta forma, por meio dos fundamentos teóricos apresentados, a abordagem

feita sobre como a leitura dos quadrinhos em espanhol é desempenhada por alunos de

nível médio, torna-se relevante, na medida em que, faz-se uma análise de como é dado o

processo de leitura desse gênero multimodal, quais são as dificuldades enfrentadas pelos

alunos na compreensão das tiras, e a partir disso, é possível desenvolver mecanismos

que podem auxiliar numa melhor aprendizagem do espanhol mantendo o uso dessa

ferramenta tão atrativa que são as histórias em quadrinhos.

2. A LEITURA E O PROCESSO DE APRENDIZAGEM

A palavra “leitura” é originada do latim, Legere, que no início tinha um

significado direcionado à cultura, “colher, escolher e recolher”. Só passou a ter o

conceito de hoje depois das letras, por causa da habilidade em escolher as palavras para

expressar melhor o que pensava.

Existe uma expressão latina que define bem outro sentido à palavra Legere, com

relação aos dias atuais: Legere oculis – “colher com os olhos”. Isso porque o ato de ler

não está limitado à decodificação de textos, nós também lemos símbolos, imagens,

expressões corporais e faciais, lemos as mãos, e tudo o que implique em um significado

tirado da compressão visual do leitor.

Lembrando Paulo Freire, em Martins (2012, p.12), “ninguém educa ninguém,

como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão,

mediatizados pelo mundo.”. E Kleiman (2013) afirma que, todo leitor possui um

Page 257: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

257

conhecimento prévio necessário a compreensão do material a ser lido. E, dentro desse

conhecimento ficam o conhecimento linguístico (o conhecer o idioma do que está

escrito), e o conhecimento textual (um conjunto de noções e pré-conceitos sobre o

texto). Usar a experiência para compreender o que está diante dos olhos é basicamente o

significado de leitura.

Como exemplo para ilustrar o processo leitor a partir do uso do conhecimento

prévio, pode-se utilizar a seguinte charge:

Fonte: Disponível em: http://www.santaterezatem.com.br/wp-content/uploads/2015/06/reducao-da-maioridade-penal-4-por-

latuff-300x226.jpg. Acesso em: 27 set. 2015.

A intenção do chargista Latuff ao abordar a questão da maioridade penal é

compreensível. Um texto não verbal, mas que com o menor conhecimento dos assuntos

discutidos no Brasil ultimamente, pode-se lê-lo e compreendê-lo.

O processo de aprendizagem da leitura é dado a partir da compreensão de

palavras, frases, sentenças, intenção do autor, juntamente com as motivações e

experiências de vida do leitor.

Page 258: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

258

Segundo Martins (2012), estudos sobre a linguagem apontam que os professores

servem para orientar como decodificar o código linguístico, mas que nós aprendemos a

ler sozinhos, lendo.

Portanto, pode-se dizer que precisamos dos professores para aprender a decifrar

o sistema escrito, mas depois, de maneira solitária, fazemos uso da nossa vontade e

esforço para compreender um texto – além de fazer uso, é claro, dos conhecimentos

adquiridos em situações reais, que funcionam como fonte de consulta ou pré-conceitos

que podem auxiliar no entendimento do conteúdo a ser lido.

De acordo com o OCEM (2006, p. 151-152) - Orientações Curriculares para o

Ensino Médio,

deve-se considerar o desenvolvimento da compreensão leitora, com o

propósito de levar à reflexão efetiva sobre o texto lido: mais além da

decodificação do signo linguístico, o propósito é atingir a compreensão

profunda e interagir com o texto, com o autor e com o contexto, lembrando

que o sentido de um texto nunca está dado, mas é preciso construí-lo a partir

das experiências pessoais, do conhecimento prévio e das inter-relações que o

leitor estabelece com ele.

Ler e entender o que está escrito em um texto vai além da compreensão de um

código linguístico, também envolve experiência de vida, intenção do autor e motivação

do leitor para interpretar o que está sendo lido.

3. GÊNEROS TEXTUAIS

Outro fator importante abordado neste artigo é a questão dos gêneros textuais.

As HQs são um tipo de gênero textual que tem como foco principal a narrativa, mas que

também pode apresentar outros tipos textuais em um mesmo quadrinho.

Os gêneros textuais podem ser definidos basicamente como maneiras de

organizar informações linguísticas, orais ou escritas, de acordo com a finalidade do

texto, com o papel dos interlocutores e com a situação social. Isto é, para cada

necessidade e leitor existe um tipo de texto com sua própria linguagem. E por causa das

Page 259: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

259

infinitas necessidades dos humanos, também são infinitas as possibilidades de tais

gêneros.

Segundo Marcurchi (2015, p. 20), falando de forma resumida a respeito do

surgimento dos gêneros,

(...) numa primeira fase, povos de cultura essencialmente oral desenvolveram

um conjunto limitado de gêneros. Após a invenção da escrita alfabética por

do século VII a.C., multiplicam-se os gêneros, surgindo os típicos da escrita.

Numa terceira fase, a partir do século XV, os gêneros expandem-se com o

florescimento da cultura impressa para, na fase intermediária de

industrialização iniciada no século XVIII, dar início a uma grande ampliação.

Outro fator que merece destaque é quanto às diferenças existentes entre gêneros

e tipos textuais. Na primeira expressão o foco é a natureza funcional e interativa, já a

segunda privilegia o aspecto formal e estrutural da língua.

Como exemplos de gêneros textuais têm-se: cartas, propagandas, bulas de

remédios, receitas, poesias, editais de concursos, e-mails, chats, charges, histórias em

quadrinhos, etc. Já os tipos textuais seriam: narração, argumentação, exposição,

descrição, injunção, etc.

O que ocorre, normalmente, é uma ligação entre dois gêneros, ou um gênero em

um tipo, ou ainda, gêneros e tipos diferentes em um mesmo objeto textual. De acordo

com Marcuschi (2015, p.33),

A questão da intertextualidade intergêneros evidencia-se como uma mescla de

funções e formas de gêneros diversos num dado gênero e deve ser distinguida

da questão da heterogeneidade tipológica do gênero, que diz respeito ao fato de

um gênero realizar várias sequências de tipos textuais. (...)

(...) Resumidamente, em relação aos gêneros, temos:

(1) intertextualidade intergêneros = um gênero com a função de outro

(2) Heterogeneidade tipológica = um gênero com a presença de vários tipos.

Page 260: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

260

O objetivo dessa mistura de gêneros e tipos é proporcionar o estímulo sensorial e

visual do leitor para uma melhor inserção dele no mundo contemporâneo.

As OCEM (2006, p. 28) dizem que,

Nesse contexto, a ênfase que tem sido dada ao trabalho com as múltiplas

linguagens e com os gêneros discursivos merece ser compreendida como uma

tentativa de não fragmentar, no processo de formação do aluno, as diferentes

dimensões implicadas na produção de sentidos. Essa escolha também reflete

um compromisso da disciplina, orientado pelo projeto educativo em

andamento: o de possibilitar letramentos múltiplos.

Além de tornar a leitura mais envolvente ao aluno, trabalhar com mais de um

tipo e/ou gênero textual pode contribuir em uma melhor formação do leitor, e as HQs

são um exemplo disso.

4. HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

As histórias em quadrinhos (HQs) são, segundo definição apresentada por Cirne

(2000, p. 23-24), “(...) uma narrativa gráfico-visual, impulsionada por sucessivos cortes,

cortes estes que agenciam imagens rabiscadas, desenhadas, e/ou pintadas.”.

Além de, predominantemente, serem uma narrativa textual, as HQs também

podem apresentar sequências com características argumentativas (quando explica e

persuade o interlocutor, mostrando o ponto de vista do autor), e injuntivas (quando

indica como uma ação será realizada) utilizando uma linguagem simples e objetiva.

Há quem diga que tiveram início nas pinturas rupestres, e que na pré-história os

desenhos eram usados como forma de comunicação feita nas paredes. Alguns

estudiosos dizem que a primeira HQ a ser impressa foi uma história curta chamada de

M.” Vieux-Bois (O senhor Madeira-Velha), de Rudolph Tophffer em 1827. As falas

eram escritas no rodapé de cada quadro.

Page 261: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

261

Fonte: Disponível em: http://blogdogutemberg.blogspot.com.br/2011/07/as-estampas-de-rudolph-topffer.html. Acesso

em: 18 out. 2015.

Porém, de acordo com Ianonne e Ianonne (1994), a primeira história em

quadrinhos a trazer as falas não mais no rodapé, mas junto ao corpo dos personagens

para exprimir o que eles diziam foi Yellow Kid (Menino Amarelo), desenhado em 1895,

por Richard Felton Outcault, e publicada semanalmente no jornal New York World.

Fonte: Disponível em: http://quadrinharia.blogspot.com.br/2012/04/como-comecaram-as-historias-em.html. Acesso em: 18 out.15.

Por causa de uma disputa entre imprensas, Outcault resolve sair da New York

World e vai para a New York Journal. E, em 25 de outubro de 1896, pela primeira vez

são usados balões para alocar as falas dos personagens. Fonte: Disponível em:

https://iconografico.wordpress.com/2012/02/25/os-baloes-de-yellow-kid/. Acesso em: 18 out.15.

Page 262: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

262

Atualmente os balões não apresentam apenas as falas naturais dos personagens,

eles também indicam os pensamentos, a intensidade do que é dito, mostra se a fala é

direta ou se possui alguma barreira no som, ou se é feita por algum veículo de

comunicação.

Para cada intenção comunicativa do personagem existe um tipo de balão.

Vejamos os mais comuns:

Fonte: Disponível em: https://midiatividades.wordpress.com/2013/06/12/identificando-os-baloes-e-onomatopeias-2/. Acesso em: 29

ago.15.

Fonte: Disponível em: https://midiatividades.wordpress.com/2013/06/12/identificando-os-baloes-e-onomatopeias-2/. Acesso em: 29

ago.15

Outros recursos que também são usados para dar ideia de movimento e

sentimentos são as chamadas figuras cinéticas e as metáforas visuais, que são artifícios

que permitem o leitor compreender melhor a intenção do autor em cada quadrinho.

Segundo Vergueiro (2012, p.54):

Page 263: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

263

Para dar a sensação de movimento, os desenhistas de HQ lançam mão das

figuras cinéticas, em que traços, linhas e repetições de imagens servem para

representar deslocamentos, oscilações e impactos.

Já as metáforas visuais atuam no sentido de expressar ideias e sentimentos,

reforçando, muitas vezes, o conteúdo verbal. Elas se constituem em signos ou

convenções gráficas que têm relação direta ou indireta com expressões do

senso comum, como, por exemplo, “ver estrelas”, “falar cobras e lagartos”,

“dormir como um tronco” etc. As metáforas visuais possibilitam um rápido

entendimento da ideia.

Exemplo:

Fonte: Disponível em: http://www.taringa.net/post/humor/11800433/Gaturro-10-tiras-comicas.html. Acesso em: 01

nov.15.

Pelo exemplo acima, é possível perceber que há traços que indicam movimento

de queda do Gaturro, e também estrelas para dá ideia de dor.

No que se refere às onomatopeias, seja imitando ou representando um som

fazendo uso de caracteres alfabéticos, a maioria vem do inglês. Esse recurso é

amplamente utilizado, variando de autor para autor, e de acordo com a compreensão que

se tem dos sons.

Exemplo 1:

Page 264: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

264

Fonte: Disponível em: https://i.ytimg.com/vi/eePb52CYMLc/hqdefault.jpg. Acesso em:18 out.15.

Aqui temos as estrelas e traços próximos ao personagem Cebola representando a

dor; as nuvens direcionadas à Mônica dão a ideia de raiva; traços mais largos que

indicam direções; e, a expressão de batida PLOF, muito usada pelos autores de

quadrinhos brasileiros.

Exemplo 2:

Fonte: Disponível em: http://4.bp.blogspot.com/-d-lfFA40rn0/T_-

aG3sGmOI/AAAAAAAAHzo/8aT02n2yK1I/s1600/amanhecendo_47.jpg. Acesso em: 18 out 15.

Neste exemplo, o autor usa “HA” para expressar o riso ou a gargalhada que

costumam usar na escrita em português. Observe no exemplo abaixo que para

representar a gargalhada em espanhol utilizam o “JA”, isso por causa do som que a letra

J tem nesse idioma.

Page 265: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

265

Exemplo 3:

Fonte: Disponível em: http://weheartit.com/entry/group/22948815. Acesso em: 18 out 15.

4.1 Tipos de quadrinhos

Um fator muito importante que deve ser explanado aqui é sobre os tipos de

gêneros não verbais ou icônicos verbais parecidos com as HQs. Exemplos disso temos:

a caricatura, a charge, o cartum e as tiras. Para o cartunista Moretti em Mendonça

(2015, p.212), as diferenças existentes entre esses estilos são:

CARICATURA = deformação das características marcantes de uma

pessoa, animal, coisa ou fato.

CHARGE = quando um fato pode ser contado inteiramente numa forma

gráfica.

CARTUM = é uma forma de expressar ideias e opiniões, mas não faz

referência a nenhuma personalidade e é chamado de atemporal e

universal. Feito através de uma imagem ou uma sequência de imagens,

dentro de quadrinhos ou não, podendo ter balões ou legendas.

Exemplos dos estilos citados:

Page 266: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

266

CARICATURA

Fonte: Disponível em: http://image.slidesharecdn.com/caricatura-110517154435-phpapp01/95/caricatura-7-

728.jpg?cb=1305647142. Acesso em: 16 out 15.

CHARGE

Fonte: Disponível em: http://bradanovic.blogspot.com.br/2013/01/ladrones-itinerantes-y-ladrones.html. Acesso em: 16 out

15.

Page 267: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

267

CARTUM

Fonte: Disponível em: https://5ddigitalcomm.wordpress.com/2011/09/28/reflexiones-en-e-learning-%C2%BFpapa-que-usaban-

ustedes-en-la-escuela/. Acesso em: 18 out 15.

A diferença existente entre a Cartum e a HQ é a de que, apesar de nos dois ser

possível possuir um ou mais quadros com sequências narrativas, somente para a Cartum

essa sequência é opcional, visto que para as HQs a obrigatoriedade se dá por causa dos

personagens serem fixos.

No que se refere às Tiras, não comentadas anteriormente, elas são um subtipo de

HQ; mais curta (até 4 quadrinhos), sequenciais (narrativas maiores) ou fechadas (um

episódio por dia), e que, segundo Mendonça (2015, p. 214), podem ser dividias em dois

subtipos:

a) Tiras piada, em que o humor é obtido por meio das estratégias discursivas

utilizadas nas piadas de um modo geral, como a possibilidade de dupla

interpretação, sendo selecionada pelo autor a menos provável;

b) Tiras episódio, nas quais o humor é baseado especificamente no

desenvolvimento da temática numa determinada situação, de modo a

realçar as características das personagens.

Exemplo a:

Page 268: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

268

Fonte: Disponível em: http://tatidelrio.blogspot.com.br/2011/06/mafalda-1.html. Acesso em: 14 set15.

Exemplo b:

Fonte: Disponível em: http://atravesdemirecuerdo.blogspot.com.br/2013_03_01_archive.html. Acesso em: 16 out 15.

5. HISTÓRIA EM QUADRINHO NA SALA DE AULA

Atualmente, as HQs estão presentes nas provas de Enem, nos vestibulares e até

nos livros didáticos. Mas, essa “boa” relação escola-quadrinhos é algo recente.

Durante muito tempo, as HQs eram rechaçadas pelos pais, professores e por boa

parte da sociedade. Isso ocorria devido a grande influencia que o gênero literário

americano exercia em todo o mundo.

Os quadrinhos, que semanalmente eram impressos nos jornais norte-americanos,

eram cômicos e com desenhos satíricos e caricaturados. Tinham como público alvo os

migrantes. Quando passaram a ser diários, o enfoque mudou para as famílias, animais

Page 269: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

269

antropomórficos e figuras femininas. No entanto, essa tendência de publicar quadrinhos

em jornais para entreter toda a família se propagou pelo mundo.

No final dos anos 20 foram as histórias de aventuras com ar naturalista que

ganharam o público juvenil. Em seguida, com o fim da Segunda Guerra, vieram as

histórias de terror e suspense, o que levou os americanos a ficarem preocupados com a

influência desses gêneros sobre as crianças e adolescentes.

Tempos depois, um psiquiatra alemão chamado Frederic Werthan, baseado nos

pacientes que teve, lançou uma campanha contra os quadrinhos, alegando que as tiras

tinham um aspecto negativo e que deixavam os leitores juvenis com problemas

psicológicos.

E se antes já havia uma preocupação dos pais e educadores a respeito desses

quadrinhos, com a tal campanha do doutor Werthan, a situação agravou-se.

Em contrapartida, havia um grupo de editores que buscou defender as HQs,

parte porque não acreditavam nas acusações do psiquiatra, e parte por tentar defender a

indústria de revistinhas. Era a chamada Association of Comics Magazine.

Foi para garantir que as histórias em quadrinhos não iriam prejudicar o

desenvolvimento intelectual e moral dos jovens e adolescentes que essa associação

criou um código de conduta para os autores seguirem, e que dava um selo nas

publicações que cumprissem as normas contidas no Comics Code.

Se por um lado o nível das HQs, tido como negativamente influenciador,

acabou, por outro os quadrinhos passaram a ter um conteúdo sem muita criatividade e

sem nenhuma contribuição de aprimoramento intelectual. Esse desprestígio também

ocorreu em outros países.

De acordo com Vergueiro (2012, p.16),

Tinha como certo que sua leitura afastava as crianças de “objetivos mais

nobres” – como o conhecimento do “mundo dos livros” e o estudo de

“assuntos sérios” -, que causava prejuízos ao rendimento escolar e poderia,

inclusive, gerar consequências ainda mais aterradoras, como o embotamento

do raciocínio lógico, a dificuldade para apreensão de ideais abstratas e o

mergulho em um ambiente imaginativo prejudicial ao relacionamento social

e afetivo de seus leitores.

Page 270: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

270

Com isso, a visão que a sociedade da época tinha sobre os quadrinhos era de um

tipo de leitura que desvirtuava do que de fato era importante para os jovens e crianças

aprenderem.

Somente com o desenvolvimento da tecnologia nos meios de comunicação, por

volta da década de 80, é que as famílias passaram a analisar mais o conteúdo do que

viam, ouviam e liam. E nesse momento de análises, as HQs tiveram sua chance de

mostrar que não representavam tanta ameaça assim, e que podiam contribuir

positivamente no âmbito da literatura narrativa para práticas pedagógicas.

Não que as HQs sejam totalmente aceitas ou vistas como algo instrutivo por

todos os pais, mas o fato de termos as tiras nas avaliações para o ensino superior, e de

virem ilustradas em alguns livros didáticos já contribui muito no ensino de leitura e

interpretação de textos em sala de aula.

Como explica Vergueiro (2012, p.20):

A inclusão efetiva das histórias em quadrinhos em materiais didáticos

começou tímida. Inicialmente, elas eram utilizadas para ilustrar aspectos das

matérias que antes eram explicados por um texto escrito. Nesse momento, as

HQs apareciam nos livros didáticos em quantidade bastante restrita, pois

ainda temia-se que sua inclusão pudesse ser objeto de resistência ao uso do

material por parte das escolas. (...)

(...) a proliferação de iniciativas certamente contribuiu para refinar o

processo, resultando, muitas vezes, em produtos bem satisfatórios.

Atualmente, é muito comum a publicação de livros didáticos, em

praticamente todas as áreas, que fazem farta utilização das histórias em

quadrinhos para transmissão de seu conteúdo.

Aproveitar o interesse que os jovens e adolescentes têm pelos quadrinhos para

ensinar a ler e compreender os textos em espanhol é algo que pode ser feito para tentar

manter a atenção e motivação em aprender uma segunda língua. Entretanto, a

compreensão textual é algo que muitos alunos, principalmente do nível médio de

escolas públicas, precisam desenvolver tanto para conseguirem fazer um bom processo

seletivo como para aprenderem, neste caso, a ler um texto em outra língua.

Page 271: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

271

6. O ENSINO ESPANHOL UTILIZANDO AS HQs

A utilização das HQs em espanhol na sala de aula serve não só para trabalhar

vocabulários, conteúdos gramaticais, compreensão textual, expressões idiomáticas,

como também é possível trabalhar assuntos da atualidade, desenvolvendo a consciência

crítica e a fluência leitora em espanhol. Entretanto, para que o uso dos cómics seja

efetivo é preciso que o professor seja criativo para direcionar os quadrinhos de acordo

com os objetivos que quer atingir e de acordo com o público alvo.

Para o nível médio, - por se tratar de estudantes que estão saindo da adolescência

para a fase adulta, e por isso mais críticos e questionadores – o professor tem que tomar

cuidado com a linguagem verbal contida nas HQs que pretende levar para sala. Seja por

poder conter erros gramaticais, ou se o tema expresso manterá ou não a atenção, ou

ainda, se tem ou não alguma relevância na aprendizagem.

É válido ter em mente que os propósitos da utilização dos quadrinhos em

espanhol são o incentivo à leitura, dinamismo da aula e a possibilidade de desenvolver a

visão crítica dos alunos, visto que terão que associar a linguagem verbal (parte escrita)

com linguagem não verbal (imagens, símbolos, expressões faciais, etc.) para

compreender o que o autor quis dizer. Para Barbieri Durão (2003, p.1),

(...) al exponer los aprendices de español a ese género textual, de una forma

pedagógicamente planeada, ellos no solamente los leerán de un modo más

productivo, sino que también tendrán acceso a un input que fomentará su

interlengua en construcción en ese idioma de una forma motivadora y

agradable.

A linguagem verbal e a não verbal contidas nos quadrinhos formam um sistema

narrativo que faz com que a mensagem seja mais facilmente entendida. Vergueiro

(2012, p. 32 e 35) a respeito disso nas HQs fala,

Linguagem Verbal – (...) A fim de integrar a linguagem verbal à figuração

narrativa, os quadrinhos desenvolveram diversas convenções específicas à sua

linguagem, que comunicam instantaneamente ao leitor o “status” do enunciado

verbal.

Page 272: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

272

Linguagem Não Verbal (icônica) – A imagem desenhada é o elemento básico

das histórias em quadrinhos. Ele se apresenta como uma sequência de quadros

que trazem uma mensagem ao leitor, normalmente uma narrativa, seja ela

ficcional (um conto de fadas, uma história infantil, a aventura de um super-

herói etc.) ou real (o relato sobre fatos ou acontecimentos, a biografia de um

personagem ilustre etc.).

As revistinhas em quadrinhos, também chamadas de gibis aqui no Brasil, no

mundo hispanohablante elas possuem nomes diferentes. Por exemplo:

México = mono ou monitos

Cuba = muñequitos

España = tebeos

Venezuela = comiquitas

Otros países hipanoamericanos = historietas.

E como exemplos de HQs famosas e de origem hispânicas temos:

- MEMIN PINGUIN (1945 – México), de Yolanda Vargas Dulché;

- CONDORITO (1949 – Chile), de René Rios Boettiger, conhecido como Pepo;

- MORTADELO Y FILEMON (1958, Espanha), de Francisco Ibáñez Talavera;

- MAFALDA (1964 - Argentina), de Joaquín Salvador Lavado, conhecido como

Quino;

- TUREY EL TAÍNO (1989 – Porto Rico), de Ricardo Álvarez Rivón.

- GATURRO (1997 – Argentina), de Cristian Dzwonik, conhecido como Nik;

Algumas historinhas possuem repertórios críticos-sociais, seja sobre o país de

origem, ou problemas existentes no mundo, outros buscam tratar de situações do

cotidiano, mas o interessante é poder trabalhar a exploração da produção de sentidos

sobre o que encontram nos quadrinhos. Fazer os alunos pensarem sobre o que veem.

Page 273: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

273

Instigar a associação da linguagem verbal com a não verbal presentes nas HQs. Além é

claro, de poder trabalhar conteúdos gramaticais de forma contextualizada e lúdica.

Como disse Mendonça (2015, p. 219 apud Possenti 1998, p.46), “Qualquer que seja o

tópico (...), o que faz com que uma piada seja uma piada não é seu tema, sua conclusão

sobre o tema, mas uma certa maneira de apresentar tal tema ou uma tese sobre tal tema.”

7. ASSOCIANDO LINGUAGEM VERBAL COM A LINGUAGEM NÃO VERBAL

A ideia central do presente artigo veio do interesse em verificar se alunos do

ensino médio de uma escola pública estadual, localizada em São Cristóvão, Sergipe,

conseguiriam compreender todo o conteúdo existente em quadrinhos em espanhol que

lhes foram apresentados.

Tais quadrinhos foram escolhidos especialmente com a intenção de instigar os

alunos a fazerem uma leitura mais detalhada das imagens, de trabalhar a visão crítica ao

ler os balões de fala e interpretar as expressões faciais dos personagens através de

perguntas elaboradas para esse fim.

Foram entregues atividades para os alunos do 2º ano do nível médio, com tiras e

questões interpretativas.

Exemplo 1:

Fonte: Disponível em: http://infogayarul.blogspot.com.br/2013/02/blog-post.html. Acesso em: 13 set.15.

Questão 1: Descreva o que a mãe vê no primeiro quadro e qual foi o resultado

ilustrado no segundo.

Page 274: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

274

Aqui temos uma pergunta que trabalha a análise da linguagem não verbal. E

apesar de conter uma pergunta discursiva, sua resposta exige apenas o reconhecimento

do conteúdo dos quadros através de uma observação detalhada.

Expectativa de resposta: A mãe vê a sujeira e a bagunça, e logo PENSA em

castigar o filho.

Entretanto, quando não há uma análise dos detalhes em tiras onde não existe

fala, o que acontece é obter respostas parecidas com os exemplos abaixo, tirados da

turma trabalhada.

Aluno A: “Ela “ver” a maior “bagunsa” no sofá e começa a gritar com seu

filho e até bater e bate.”.

Aluno B: “Muita sujeira mãe grita com ele esgana e da com o livro na cabeça

dele.”.

Em ambos os casos o ato de PENSAR, indicado pelo balão com bolinhas em

direção à cabeça da mãe, é trocado pelo ato de GRITAR com o filho. Isso pode ter

ocorrido devido à falta de atenção com o detalhe do balão de pensamento ou ao

desconhecimento dessa característica.

Um exemplo de que a falta de atenção pode prejudicar a interpretação da tira

está nas respostas do aluno C, quando são comparadas as questões 1 e 3 no que se refere

aos balões de fala.

Aluno C: “Ver” muita sujeira e bagunça. No segundo ela pensando em bater,

gritar com ele.

Questão 3: Diante da reclamação da mãe, o homem

a) mandou o filho parecer surpreso.

b) aconselhou sua mulher a parecer surpresa.

c) pensou que era melhor ele fazer cara de surpresa.

d) ficou surpreso com a queixa da mulher.

Page 275: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

275

Expectativa de resposta: Letra C, porque o balão indica que não se trata de um

discurso direto, mas sim de um pensamento do pai.

Resposta do Aluno C: Letra B

Aqui a falta de atenção não foi somente quanto ao balão de fala dele, mas

também ao gênero do particípio SORPRENDIDO e da conjugação do verbo

INTENTAR, que está na segunda pessoa imperativo afirmativo (intenta tú), pois o

personagem está falando consigo mesmo, como um auto conselho.

Exemplo 2:

Diez años con Mafalda. QUINO , LUMEN,

2008

Questão 1: O que você acha que pode significar o termo

“DESPOTRICANDO”, usado por Susanita no segundo quadro?

Neste exemplo a ideia foi trabalhar a linguagem verbal fazendo com que os

alunos tentassem traduzir um termo, até então desconhecido por eles, usando o contexto

da fala da personagem Susanita.

A palavra “DESPOTRICANDO”, de acordo com o dicionário SEÑAS (2010),

significa: des-po-tri-car intr. fam. Protestar o hablar sin conderación ni cuidado. No

entanto, nesse contexto, respostas como: lutar contra, dizer ser contra, debater contra,

discursar contra também foram tomadas como certas.

Page 276: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

276

Questão 4: O que aconteceu no último quadro? E por quê?

Nesta questão, a maioria dos alunos respondeu que foi Mafalda que jogou a

lixeira em Susanita ignorando a linguagem verbal. Entretanto, aqui é fundamental

analisar não só a linguagem não verbal, mas também, a linguagem verbal contida na tira

para responder de forma mais precisa.

Os detalhes que merecem ser observados são:

1- Susanita pergunta o que houve com o pai de Mafalda, o que demonstra uma

surpresa com alguma ação dele e não da filha;

2- Mafalda está olhando na direção do seu pai;

3- A lixeira, que está na cabeça de Susanita, é a mesma que estava antes próxima

ao pai de Mafalda, que estava ouvindo a conversa das meninas.

Exemplo 3:

Diez años con Mafalda. QUINO , LUMEN, 2008

Questão 3: De acordo com a descoberta de Mafalda, para você, existe

DEMOCRACIA no Brasil? Por quê?

Para responder esta pergunta é necessário compreender o que aconteceu no

quadro 1, além de ter uma certa visão crítica a respeito da realidade brasileira.

As respostas ficaram divididas nesta questão. A metade que disse que NÂO

existe democracia no Brasil, explicou que o povo brasileiro não tem voz ou que seus

Page 277: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

277

direitos não são garantidos. Já a outra metade, afirmou que EXISTE democracia no

Brasil porque as pessoas ainda votam, elas têm livre arbítrio, e podem opinar sobre

várias coisas.

Neste caso, o que implica para ter uma resposta certa ou não é o nível de

informação, de compreensão de mundo, além é claro, da análise do quadrinho.

A tira mostra Mafalda vendo o significado da palavra DEMOCRACIA no

dicionário, e logo em seguida, ela tem uma crise de riso como se tivesse lido uma piada.

E para que um tema sério vire piada, ou é uma realidade que foge do normal, ou não é

algo real como é o caso na visão de Mafalda.

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho com quadrinhos em espanhol na sala de aula ajuda na aprendizagem

da língua estrangeira, visto que, este gênero já é muito conhecido pelo público

infantojuvenil. E fazer uso desta ferramenta para despertar o interesse pela leitura, além

de desenvolver uma visão crítica com a interpretação das HQs, este trabalho pode

estimular o aluno a querer aprimorar as outras habilidades.

Os estudos feitos neste artigo revelam que os alunos, em sua maioria, não

tiveram dificuldades com vocabulário da língua espanhola, mas sim na falta de atenção

em observar os quadrinhos como um todo, e que por isso, muitas vezes, erravam as

questões por interpretar somente o que estava escrito nos balões não se atentando para

as expressões ou para os detalhes que por vezes davam o sentido real que o autor quis

passar.

É provável que esse fato tenha acontecido devido ao costume da não observação

desses detalhes nos quadrinhos em português. Talvez por ser um gênero de leitura

rápida, talvez por estarmos em uma era onde tudo é imediato, desde os programas de

computador ao fast food na hora do almoço. Olhar detalhes para obter uma resposta

pode ser uma perda de tempo para os jovens e adolescentes que andam sempre com

pressa. No entanto, se os professores não tentarem trabalhar essa observação mais

detalhada nos assuntos, sejam didáticos ou da sociedade, essa geração da internet vai

passar pela vida sem se dar conta do que acontece ao seu redor.

Page 278: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

278

Sendo assim, o professor pode manter o uso das HQs no ensino de leitura do

espanhol, mas buscando sempre fazer com que os alunos analisem melhor cada quadro e

façam uma interpretação mais apurada do que leem. Ensinar não somente o idioma, mas

também, preparar, com isso, os alunos para serem leitores mais críticos. Leitores não

somente de textos escritos como também do meio em que estiverem inseridos.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Secretaria de Educação Básica (2006). Orientações Curriculares para o

Ensino Médio. Linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: MEC.

KLEIMAN, Angela (2013). Texto & Leitor: Aspectos Cognitivos da Leitura. São

Paulo: Pontes.

MARCUSCHI, L. A. (2015). Gêneros textuais: definição e funcionalidade. Em:

DIONISIO, A. P.; MACHADO, A. R.; BEZERRA M. A. (Orgs.). Gêneros textuais &

ensino. p. 19-38. São Paulo: Parábola.

MARTINS, Maria Helena (1997). O que é Leitura. Campinas - SP: Brasiliense.

MENDONÇA, Maria Rodrigues de Souza (2015). Um gênero quadro a quadro: a

história em quadrinhos. Em: DIONISIO, A. P.; MACHADO, A. R.; BEZERRA M. A.

(Orgs.), p. 209-224. Gêneros textuais & ensino. São Paulo: Parábola.

MICHAELIS. Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em:

http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/. Acessado em 26/10/2015.

VERGUEIRO, Waldomiro (2012a). Uso das HQs no ensino. Em: RAMA, A.;

VERGUEIRO, W. (Orgs.). Como usar as histórias em quadrinhos na sala de aula, p. 07-

31. São Paulo: Contexto.

________ (2012b). A linguagem dos quadrinhos: uma “alfabetização” necessária.

Em: RAMA, A.; VERGUEIRO, W. (Orgs.). Como usar as histórias em quadrinhos na

sala de aula, p. 31-65. São Paulo: Contexto.

Page 279: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

279

O ENSINO DE ESPANHOL E O AUXÍLIO DOS

DICIONÁRIOS

Laura Campos de Borba (UFRGS)91

Introdução

No Brasil, dentre os componentes curriculares presentes na Educação Básica,

estão as línguas estrangeiras. No tocante à disciplina de Língua Espanhola, mais

especificamente, sua oferta é obrigatória somente no Ensino Médio92

. Para o professor

de espanhol que atua no Ensino Médio, existem determinadas orientações que advêm do

Ministério da Educação, por um lado, e da própria instituição onde atua, por outro. O

Ministério da Educação fornece orientações através dos Parâmetros Curriculares

Nacionais: Ensino Médio (PCNEM, 2000) e do seu documento complementar (PCN+,

2002). Uma das principais diretrizes presentes nesses documentos diz respeito ao ensino

de língua estrangeira através de uma perspectiva comunicativa. Segundo os PCNEM

(2000), através das aulas de língua (tanto materna como estrangeira), os alunos

deveriam desenvolver uma competência comunicativa, ou seja, deveriam “saber utilizar

a língua, em situações subjetivas e/ou objetivas que exijam graus de distanciamento e

reflexão sobre contextos e estatutos de interlocutores” (PCNEM, 2000, p. 11). Em

outras palavras, o ensino de línguas deveria proporcionar o contato não apenas com os

recursos linguísticos dessas línguas, mas também com distintos contextos de produção

de enunciados, levando em conta seus participantes (interlocutores).

Por outro lado, a instituição de ensino na qual o professor está inserido fornece

orientações através do seu projeto político-pedagógico, previsto pela Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional (LDB). Dentre os elementos constituintes de um projeto,

está prevista uma relação de conteúdos curriculares, distribuídos entre as distintas etapas

(1º, 2º e 3º anos, no caso do Ensino Médio).

91

Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Letras da UFRGS. Bolsista de Mestrado CNPq. 92

Ainda que o ensino de espanhol na Educação Básica esteja previsto desde o 3º e o 4º ciclos do Ensino

Fundamental, a oferta da disciplina é de caráter facultativo nessas etapas. Em relação ao Ensino Médio,

por outro lado, a Lei Federal nº 11.161, de 05 de agosto de 2005, estipula que a oferta da disciplina deve

ser obrigatória, tanto nas instituições públicas como nas privadas.

Page 280: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

280

Considerando o exposto acima, é possível afirmar que o professor de língua está

incumbido da tarefa de ensinar uma determinada relação de conteúdos no marco de uma

perspectiva comunicativa. Para viabilizar a execução dessa tarefa, existem determinados

materiais didáticos, tais como os dicionários, que são potenciais ferramentas de auxílio

ao professor de espanhol. O presente trabalho tem como objetivo demonstrar o potencial

de eficiência que os dicionários de espanhol93

possuem como instrumentos mediadores

entre os conteúdos que o professor de espanhol precisa trabalhar em sala de aula e a

abordagem comunicativa. Para cumprir com o objetivo estabelecido, primeiramente,

serão analisados os documentos oficiais mencionados (PCNEM (2000) e PCN+ (2002))

a fim de analisar as orientações previstas a respeito do emprego de dicionários no

planejamento das aulas de espanhol. Nessa mesma oportunidade, serão comentados

ainda os resultados de uma busca por trabalhos acadêmicos que relacionam o emprego

de dicionários de espanhol em situações de ensino-aprendizagem. Em segundo lugar,

serão arroladas as funções comunicativas relacionadas ao ensino-aprendizagem de

espanhol como língua estrangeira, bem como os conteúdos (os recursos linguísticos,

mais especificamente) atrelados a essas funções. Em terceiro lugar, será apresentado um

estudo que estabelece uma relação entre classes de dicionários e níveis de aprendizagem

de espanhol, juntamente com uma proposta de panorama da lexicografia hispânica. Por

fim, em quarto lugar, será avaliado o tratamento atribuído a tais conteúdos por

dicionários monolíngues para falantes de espanhol.

1 Relação entre os PCNEM (2000) e PCN+ (2002) e o emprego de dicionários

Como mencionado acima, o dicionário é um instrumento passível de auxiliar o

professor de espanhol (cf. seção 4 para mais detalhes). Por sua vez, o professor que atua

na Educação Básica e que deseja empregar dicionários de língua espanhola para auxiliá-

lo no planejamento de suas aulas poderia recorrer aos PCNEM (2000) e aos PCN+

(2002) em busca de orientações.

Em primeiro lugar, é necessário salientar que, nos documentos analisados, há

poucas menções aos dicionários nas seções que se dedicam às línguas estrangeiras. Isso

significa que o emprego do dicionário como instrumento auxiliar nas práticas de ensino

de língua estrangeira (dentre as quais se inclui o ensino de ELE) ainda é pouco

93

Conforme será explicitado na seção 3, neste trabalho, para fins de análise, consideraremos os

dicionários monolíngues voltados para falantes de espanhol.

Page 281: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

281

explorado. Os PCNEM (2000) não apresentam nenhuma menção aos dicionários. Já os

PNC+ (2002), por outro lado, na condição de documento complementar aos PCNEM

(2000), ressaltam a importância do dicionário na prática docente em língua estrangeira.

No tocante à metodologia de ensino, o dicionário é mencionado como um instrumento

cuja familiaridade, “dentro e fora da sala de aula, é importante subproduto do

desenvolvimento do repertório vocabular” (PCN+, 2002, p. 105). Conforme o

documento, o professor deve planejar suas aulas de modo a propiciar aos alunos

atividades que envolvam:

a busca de palavras no dicionário e a escolha do sentido mais

adequado a cada contexto entre as diferentes acepções;

a busca, a partir de uma palavra em português, de seu significado mais

adequado, em língua estrangeira;

o desenvolvimento de técnicas de tradução e versão, partindo de

palavras-chave e de palavras-ferramenta (verbos, substantivos,

conjunções);

os diversos modos de, no dicionário bilíngüe, acessar phrasal verbs,

expressões idiomáticas, gírias, entre outros

a mobilização da competência de decodificação dos verbetes –

abreviações, símbolos fonéticos, palavras de uso específico,

distribuição das palavras e expressões por ordem alfabética na

descrição das acepções;

outras informações culturais ligadas à língua estrangeira que o

dicionário pode trazer (PCN+, 2002, p. 105).

Tais atividades podem ser resumidas em: a) busca de significados; b) tradução; c)

metodologias de busca e interpretação de informações; e d) aspectos culturais da língua

(tópico não muito bem aclarado pelo documento). Curiosamente, não se menciona a

possibilidade de propor atividades que ensinem aos alunos que o dicionário também

pode ajudar em relação aos recursos linguísticos atrelados a uma determinada função

comunicativa. Por exemplo: ao tratar da função comunicativa expressar desejos através

da expressão tener ganas, o professor pode ensinar aos alunos o comportamento do

substantivo ganas em relação ao número – já que se trata de uma unidade léxica usada

mais no plural. Nesse exemplo (o qual será tratado com mais detalhes na seção 4),

entender o comportamento da unidade léxica ganas em relação ao número é

fundamental para o uso adequado da expressão tener ganas em uma situação

comunicativa que requeira a função expressar desejos. Em suma, a busca e a

interpretação de informações relacionadas ao uso de recursos linguísticos consiste em

uma proposta de atividade com dicionários tão fundamental quanto a busca de

significados, por exemplo.

Page 282: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

282

Ademais de organizar atividades que envolvam o uso de uma obra lexicográfica

em sala de aula, o professor pode, por outro lado, se beneficiar das informações contidas

em um dicionário para planejar uma aula que requeira uma explicação mais acurada

sobre o comportamento de uma determinada unidade léxica. No já citado caso de ganas,

o professor poderia elucidar aos alunos a particularidade morfológica manifestada por

essa unidade.

Em segundo lugar, cabe observar que as menções em relação ao emprego de

dicionários, além de poucas, são também pouco aclaradoras. Por um lado, é necessário

considerar que não restam dúvidas de que o dicionário deve ser um material presente

durante o planejamento das aulas e na sala de aula. Na seção dedicada às orientações

sobre avaliação, os PCN+ (2002, p. 127) ressaltam que “fazer uso adequado do

dicionário e de outras fontes de consulta” forma parte das competências e habilidades a

serem avaliadas nas disciplinas de língua estrangeira. No entanto, por outro lado, o

documento carece de uma explanação mais aprofundada a respeito de como os

dicionários podem ser inseridos no ensino comunicativo; ou seja, faltam orientações que

relacionem o emprego dos dicionários ao ensino das diferentes funções comunicativas

em língua estrangeira. No que concerne às próprias funções comunicativas, os PCN+

(2002, p. 109) listam exemplos de funções, mas não oferecem maiores comentários a

respeito de cada uma, tampouco discriminam a etapa em que precisam ser ensinadas (1º,

2º ou 3º ano do Ensino Médio).

Apesar dos estímulos provenientes dos PCNEM (2000) e dos PCN+ (2002) em

relação a uma reforma na educação brasileira (através da proposta de uma nova

abordagem de ensino e de novas práticas pedagógicas), faltam ainda orientações ao

professor no que diz respeito à sistematização e à aplicação das novas propostas94

.

Cabe salientar ainda que a carência de orientações mais claras em relação ao

emprego de dicionários no ensino de ELE não é exclusiva dos PCNEM (2000) e do

PCN+ (2002). No âmbito acadêmico, são poucos os estudos que relacionam dicionários

de espanhol a situações de ensino-aprendizagem de espanhol como língua estrangeira

(doravante ELE). Prova disso é a carência de publicações sobre o tema em alguns dos

grandes veículos internacionais de divulgação da produção científica, tais como: as atas

da European Association for Lexicography (EURALEX); o International Journal of

94

Não se pode deixar de mencionar também a proposta realizada através da Nova Base Nacional Comum

Curricular (BNCC), a qual poderia auxiliar o professor de maneira mais efetiva na organização do

currículo e no planejamento das aulas da Educação Básica. No entanto, por estar em fase de elaboração,

não a consideramos neste trabalho.

Page 283: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

283

Lexicography (IJL); e as atas da Asociación para la Enseñanza del Español como

Lengua Extranjera (ASELE). Ao analisarem-se as publicações do período

compreendido entre 2000 e 2015, percebe-se, primeiramente, que, nas atas da

EURALEX, há apenas uma contribuição95

. No IJL, por sua vez, não há nenhuma. As

atas da ASELE, por outro lado, apresentam algumas produções sobre o tema; entretanto,

a maior parte das publicações não especifica o nível de aprendizagem dos estudantes de

ELE ao qual suas propostas estão destinadas96

.

A nível nacional, um dos principais veículos de divulgação da produção

científica na área de lexicografia é o Anuario Brasileño de Estudios Hispánicos

(ABEH). Contudo, no período 2000-2015, foi publicado apenas um trabalho que

relacionava dicionários de espanhol ao ensino de ELE97

.

Para demonstrar como o dicionário poderia ser inserido em um contexto de

ensino de ELE com viés comunicativo, na próxima seção será apresentada uma proposta

de sistematização da abordagem comunicativa.

2 Proposta de ensino de ELE sob a perspectiva comunicativa: o Plan Curricular del

Instituto Cervantes

No âmbito do ensino-aprendizagem de espanhol, existe um documento

direcionado ao ensino de ELE em contexto europeu. Trata-se do Plan Curricular del

Instituto Cervantes (PCIC, 2006). Esse documento consiste na aplicação das diretrizes

contidas no Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas (QECRL, 2001)

em relação ao ensino de ELE. O QECRL (2001), por sua vez, propõe uma escala de

níveis de referência para a proficiência em línguas estrangeiras, organizada em níveis

elementares (A1-A2), níveis independentes (B1-B2) e níveis proficientes (C1-C2).

Além da escala de níveis (composta, ainda, por uma série de descritores relacionados às

habilidades de compreensão e produção), o QECRL (2001) propõe uma abordagem de

ensino comunicativa, com enfoque para a ação através de meios linguísticos. Forma

95

Trata-se de Alonso Ramos (2008), a qual apresenta um estudo de caso sobre o uso de um dicionário de

colocações por aprendizes de ELE. 96

A única exceção é Borden et al. (2004), proposta que consiste em um conjunto de seis atividades a

serem subsidiadas por dicionários de espanhol. Os autores assinalam o(s) nível(is) de proficiência de cada

atividade utilizando a escala inicial/intermediário/avançado. 97

Trata-se de Izquierdo (2013), que contém uma proposta de ensino-aprendizagem de espanhol coloquial

na aula de ELE com o auxílio de dicionários.

Page 284: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

284

parte desses meios a competência linguística98

, a qual diz respeito à língua como

sistema e compreende os âmbitos lexical, gramatical, semântico, fonológico, ortográfico

e ortoépico. É possível estabelecer uma relação de convergência entre os elementos que

constituem a competência linguística e os elementos denominados pelos PCNEM

(2002) e PCN+ (2002) recursos linguísticos.

No que concerne ao PCIC (2006), propõe-se uma correspondência entre as

orientações contidas no QECRL (2001) e a língua espanhola. Os níveis da escala são

mantidos, sendo chamados, em espanhol, de niveles iniciales (A1-A2), niveles

avanzados (B1-B2) e niveles superiores (C1-C2). Para fazer referência a esses níveis,

será utilizada uma tradução ao português, resultando em níveis iniciais, avançados e

superiores (tradução nossa).

O PCIC (2006) estrutura-se em cinco grandes componentes, aos quais

correspondem um ou mais inventários de itens, distribuídos entre os diferentes níveis de

referência:

a) Componente gramatical (competência linguística). Inventários: gramática;

pronúncia e prosódia; ortografia.

b) Componente pragmático-discursivo (competência pragmática). Inventários:

funções; táticas e estratégias pragmáticas; gêneros discursivos e produtos

textuais.

c) Componente nocional (competência linguística). Inventários: noções gerais;

noções específicas.

d) Componente cultural (competência sociolinguística). Inventários: referentes

culturais; saberes e comportamentos socioculturais; habilidades e atitudes

interculturais.

e) Componente de aprendizagem (com procedimentos de autoavaliação por parte

do estudante sobre o seu próprio processo de ensino-aprendizagem).

Em função dos distintos componentes e inventários de itens, o PCIC (2006) pode ser

considerado como um documento poliédrico –e, dessa forma, passível de ser analisado a

partir de diferentes perspectivas. Embora o documento não estabeleça uma

correspondência direta entre os inventários, é possível relacioná-los, por exemplo, da

seguinte maneira: gêneros discursivos e produtos textuais > funções > gramática. Para

98

Além da competência linguística, compõem os meios linguísticos as competências sociolinguística e

pragmática. A competência sociolinguística contempla os marcadores linguísticos de relações sociais, as

normas de cortesia, as expressões de sabedoria popular, as diferenças de registro, o dialeto e o acento. Já a

competência pragmática se subdivide em competência discursiva e competência funcional.

Page 285: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

285

realizar uma tarefa através do uso da língua, é necessário estabelecer, primeiramente,

qual função (i. e., função comunicativa) se deseja executar. No PCIC (2006), o

inventário de funções está organizado através de 6 funções principais (às quais pode-se

chamar “macrofunções”): 1) dar e pedir informação; 2) expressar opiniões, atitudes e

conhecimentos; 3) expressar gostos, desejos e sentimentos; 4) influir no interlocutor; 5)

relacionar-se socialmente; e 6) estruturar o discurso. Tomemos como exemplo a

função de pedir informação, inserida na macrofunção dar e pedir informação. Para

executá-la, é necessário o emprego adequado de recursos linguísticos (presente do

indicativo, por exemplo), os quais aparecem organizados no inventário de gramática.

Por outro lado, tanto a função como os recursos linguísticos a ela atrelados são

produzidos através de um determinado gênero do discurso (conversas informais cara a

cara, por exemplo).

A partir da correlação proposta acima (gêneros discursivos, funções

comunicativas e recursos linguísticos), é possível estabelecer como um dicionário se

insere no ensino com viés comunicativo. O dicionário, na condição de material didático

de referência, pode ser empregado para auxiliar no tocante ao uso adequado de recursos

linguísticos para executar uma determinada função comunicativa, produzida em um

determinado gênero discursivo.

Após apresentar o PCIC (2006) como documento que orienta o ensino

comunicativo de ELE e ilustrar como o dicionário pode inserir-se nesse contexto de

ensino, a próxima etapa apontará quais classes de dicionários de espanhol existem na

lexicografia hispânica e qual a sua possível relação com o perfil do professor de ELE.

3 Panorama dos dicionários de língua espanhola

Os dicionários da lexicografia hispânica estão divididos, grosso modo, em três

grandes classes: monolíngues para falantes nativos99

, monolíngues para aprendizes e

bilíngues. É possível estabelecer uma relação entre essas três classes de dicionários e os

diferentes níveis de aprendizagem de espanhol contidos no PCIC (2006). Farias (2011),

por exemplo, propõe essa correlação, relacionando os dicionários bilíngues aos níveis

iniciais (A1-A2), os dicionários monolíngues para aprendizes aos níveis avançados (B1-

B2) e os dicionários monolíngues para falantes nativos aos níveis superiores (C1-C2). O

99

Para fins deste trabalho, será empregada a distinção falantes nativos, pois a mesma reflete o público-

alvo almejado pelos dicionários dessa classe (falantes de espanhol como língua materna).

Page 286: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

286

objetivo da autora é apontar que classes de dicionários de espanhol os aprendizes

brasileiros de diferentes níveis têm à sua disposição. Além de correlacionar classes de

dicionários e níveis de aprendizagem, Farias (2011) aponta também as limitações de

alguns dicionários disponíveis no Brasil.

Em primeiro lugar, os dicionários bilíngues se dividem entre os que se propõem

a auxiliar em tarefas de compreensão linguística (dicionários espanhol-português), por

um lado, e aqueles que se propõem a auxiliar em tarefas de produção (dicionários

português-espanhol). No entanto, consulentes de níveis iniciais de aprendizagem de

ELE poderão se beneficiar pouco dos dicionários bilíngues disponíveis no Brasil. A

razão apontada pela autora é a de que, em geral, essas obras não são claras ao tratar, por

exemplo, das equivalências e das informações gramaticais.

Em segundo lugar, os dicionários monolíngues para aprendizes estão disponíveis

em número consideravelmente limitado. No Brasil, é possível citar dois exemplos: o

Diccionario Salamanca de la Lengua Española (DSLE, 1996), para os estudantes de

ELE de um modo geral, e o Señas: diccionario para la enseñanza de la lengua

española para brasileños (DSELE, 2002), para os estudantes brasileiros de ELE.

Ambas as obras, sendo voltadas para estudantes de ELE, deveriam auxiliá-los tanto nas

atividades de compreensão e produção linguística como também através da oferta de

condições para que alcancem autonomia no seu processo de ensino-aprendizagem

(BUGUEÑO MIRANDA, 2006). Entretanto, algumas análises realizadas demonstram

que esse auxílio é consideravelmente deficitário (cf. FARIAS (2011) e BUGUEÑO

MIRANDA (2006) para maiores detalhes). Alguns dos principais problemas

encontrados, e que são comuns às duas obras, estão relacionados à apresentação de

definições confusas (que dificultam as atividades de compreensão) e à falta de clareza

no tratamento das informações sintáticas (que dificulta as atividades de produção). Estes

problemas afetam diretamente o exercício da autonomia no ensino-aprendizagem, na

medida em que não oferecem ao estudante as condições necessárias para que alcance as

respostas que precisa de maneira independente. Em suma, tanto o DSLE (1996) como o

DSELE (2002) não são obras capazes de auxiliar o estudante de ELE durante seu

processo de ensino-aprendizagem do espanhol.

Em terceiro lugar, Farias (2011) explicita que os dicionários monolíngues para

falantes nativos seriam as obras mais indicadas para os estudantes de ELE que já

possuem um grau considerável de proficiência em língua espanhola – ou, em outras

palavras, indivíduos que já estão em níveis avançados ou superiores. É sob esse perfil

Page 287: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

287

que se enquadrariam os professores de ELE licenciados em Letras-espanhol, na medida

em que possuem uma formação no Ensino Superior em língua espanhola (a qual poder-

se-ia considerar como mais avançada). Em razão de sua formação, esses professores

poderiam estar aptos a empregar dicionários monolíngues para falantes nativos durante

o planejamento de suas aulas.

Outro aspecto a se observar em relação aos dicionários monolíngues para

falantes nativos é a sua notável presença na lexicografia hispânica. É possível ter uma

noção mais ou menos aproximada dessa quantidade ao observar os resultados de uma

pesquisa acadêmica coordenada por Eres Fernández (2012), que trata da disponibilidade

de dicionários no mercado brasileiro. De acordo com os resultados apontados, há 252

dicionários espanhol disponíveis em nosso mercado. Ao analisar e filtrar esses dados,

observa-se que, desse total, 203 obras são dicionários de língua; o restante é composto

de dicionários terminológicos100

, títulos repetidos e outras obras cujo título não permitiu

aferir se eram dicionários ou não101

. A partir dessa filtragem, verificou-se que mais da

metade das obras listadas, (62,56% do total) eram dicionários monolíngues para falantes

nativos, seguidos dos dicionários bilíngues (34,48%) e dos dicionários monolíngues

para aprendizes (2,95%).

Os dicionários de espanhol monolíngues para falantes nativos foram alvo ainda

de estudos tais como o de Haensch e Omeñaca (2004), quem propõem uma classificação

de dicionários de língua espanhola. As classes e subclasses expostas são introduzidas

por um comentário breve e exemplificadas exaustivamente através de uma lista de obras

de referência correspondentes. No entanto, salienta-se que, por um lado, a densidade de

informações em Haensch e Omeñaca (2004) nem sempre favorece uma compreensão

global das obras de Lexicografia Hispânica listadas. Por outro lado, a exposição feita

pelos autores não oferece subsídios suficientes e que se possam aproveitar para a

avaliação de dicionários de espanhol do ponto de vista do ensino de ELE.

Além de Haensch e Omeñaca (2004), há outros trabalhos acadêmicos que tratam

dos dicionários monolíngues para falantes nativos. Alguns exemplos são Bugueño

Miranda e Borba (2015) e Borba (2014). Em Bugueño Miranda e Borba (2015),

sugerem-se como potenciais ferramentas de auxílio ao estudante brasileiro de espanhol

100

O Diccionario de Climatología (DC, 1998) é um dos dicionários terminológicos presentes nos

resultados. 101

A obra De uma a cuatro lenguas (SCHMIDELY, 2001) é um exemplo desse tipo de resultado.

Page 288: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

288

algumas das classes de dicionários para falantes nativos, tais como os dicionários gerais

de língua, e os dicionários de uso.

Em Borba (2014), por outro lado, é feita uma breve tentativa de classificação dos

dicionários de língua espanhola102

. Neste trabalho, apresenta-se um panorama de

dicionários monolíngues para falantes nativos, o qual é fruto da aplicação da proposta

de classificação de dicionários de Bugueño Miranda (2014) sobre os dicionários

monolíngues de espanhol. A Figura 1, na página a seguir, reproduz este panorama:

Figura 1 – Panorama da Lexicografia Hispânica (BORBA, 2014, p. 31)

Seguindo a proposta de Bugueño Miranda (2014), o panorama foi gerado sob um

modelo taxonômico de classificação. Isso significa dizer que o panorama se estrutura a

partir de um sistema de critérios, organizados a partir dos mais gerais aos mais

específicos através de ramificações. Tais critérios são, por um lado, de caráter

102

Dita proposta possui um caráter reduzido. Atualmente, estuda-se a possibilidade de ampliação do

panorama, atentando para obras disponíveis na internet. Além disso, existe a necessidade de atualização

do panorama, pois algumas obras incluídas já possuem edições mais recentes. Em vista desse cenário,

uma das propostas de nosso Projeto de Dissertação de Mestrado é elaborar um panorama da lexicografia

hispânica mais ampliado e atualizado.

Page 289: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

289

linguístico, por considerarem os seguintes parâmetros de imanência linguística: a) o

número de línguas (monolíngue / bilíngue); b) a forma de organização das palavras no

discurso (discurso livre / discurso repetido); c) a ênfase informativa, sob a perspectiva

do signo linguístico (plano do significante / plano do significado); d) a perspectiva do

ato da comunicação (semasiologia / onomasiologia); e e) a concepção diassistêmica da

linguagem (representação do léxico diassistemicamente inclusivo / representação do

léxico diassistemicamente restritivo)103

. Por outro lado, há também critérios de caráter

funcional, por considerar-se a função de ensino-aprendizagem (eixo diapragmático) e a

existência de distintas competências e tarefas segundo o público-alvo (falantes nativos /

falantes não-nativos).

Cada ramificação possui, em sua extremidade, os dicionários que obedecem à

somatória de critérios antecedentes. A obediência a esses critérios constitui um pré-

requisito para a inclusão de uma obra no panorama. Por essa razão, uma classificação de

viés taxonômico, como é o caso do panorama, possui caráter seletivo. Por exemplo:

para que um dicionário seja incluído na classe dos dicionários gerais de língua, o

mesmo precisa ser monolíngue, voltar-se para falantes nativos, refletir unidades léxicas

relativas ao discurso livre (expressões monolexemáticas), apresentar ênfase no

significado (definição) das unidades léxicas, apresentar ênfase semasiológica (função de

compreensão) e ser diassistemicamente inclusivo104

.

A partir dos dicionários elencados no panorama, na próxima seção

demonstraremos o potencial de eficiência dos dicionários monolíngues para falantes

nativos na função de auxiliar o professor de ELE no planejamento de suas aulas.

4 Os dicionários de espanhol a serviço do professor de ELE

103

Conforme Coseriu (1980), uma língua constituída historicamente (como é o caso da língua espanhola)

“não é bem um sistema linguístico e sim um diassistema, um conjunto mais ou menos complexo de

‘dialetos’, ‘níveis’ e ‘estilos de língua’” (COSERIU, 1980, p. 112). Em outras palavras, tratam-se de

“sistemas”, que variam a nível diatópico (espaço), diastrático (estrato sociocultural), diafásico (situação

de uso) e diacrônico (tempo). Ao aplicar a noção de diassistema à classificação de dicionários, obtém-se

um critério que diferencia entre os dicionários que buscam compilar o maior número possível de eixos do

diassistema de uma língua (dicionários diassistemicamente inclusivos, tais como os dicionários gerais),

por um lado, e os dicionários que buscam deter-se sobre algum(ns) eixo(s) específico(s) (dicionários

diassistemicamente restritivos, tais como os dicionários de estrangeirismos). 104

Apesar de ser diassistemicamente inclusivo, o dicionário geral de língua é α-exaustivo porque não

inclui todos os elementos relativos ao eixo diacrônico de uma língua, mas sim apenas algumas etapas da

diacronia.

Page 290: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

290

Nesta seção, algumas funções comunicativas em língua espanhola serão

correlacionadas com as informações contidas em dicionários monolíngues para falantes

nativos. Uma primeira tentativa de estabelecer uma correlação nesses moldes pode ser

encontrada em Borba (2014). Nessa oportunidade, elencaram-se algumas funções a

serem ensinadas em níveis inicias (A1-A2), correlacionando-se os recursos linguísticos

necessários para a execução dessas funções com as informações presentes em

dicionários monolíngues para falantes nativos.

O presente trabalho, por sua vez, pretende ampliar o escopo de análise para as

funções comunicativas a serem ensinadas pelos professores a estudantes de níveis

avançados (B1-B2). Para arrolar tais funções, bem como os gêneros discursivos nos

quais essas funções ocorrem, serão utilizados os inventários presentes no PCIC (2006a).

Dos dicionários elencados no panorama da seção anterior, limitamos o escopo de

análise para três obras, pertencentes a três classes distintas. São elas: 1) Diccionario de

la Lengua Española (DRAEe, 2014), da classe dos dicionários gerais de língua; 2)

Diccionario Panhispánico de Dudas (DPDe, 2005), da classe dos dicionários de

dúvidas; e 3) Diccionario de Uso del Español (DUE, 2001), da classe dos dicionários de

uso que refletem a norma ideal105

. Além desses dicionários, utilizaremos também uma

quarta obra: o Diccionario Clave de Uso del Español Actual (DiClave, 2012). Este

dicionário, assim como o DUE (2001), cumpre com a matriz de traços correspondente a

um dicionário de uso que reflete a norma ideal, sendo passível de ser incluído no

panorama da lexicografia hispânica106

.

4.1 Nível A2

Para este nível, dentre os gêneros do discurso arrolados pelo PCIC (2006a) estão

as conversas informais cara a cara (PCIC, 2006a, p. 288). Conforme o documento, há

outros gêneros relacionados, tais como as conversas informais por telefone e as cartas

105

Para efeitos deste trabalho, será adotada a noção de norma proposta por Coseriu (1980). Para o autor,

norma se refere ao que uma dada comunidade realiza em sua língua. Zanatta (2010), por sua vez, postula

que em toda comunidade linguística existe um anseio normativo, ou seja, uma necessidade de orientação

a respeito de como usar a língua com maior primor em certas circunstâncias. Em razão disse anseio, a

autora propõe que, a partir da noção de norma presente em Coseriu (1980), se distinga entre norma real

(realizações efetivas e corriqueiras de uma língua por parte de uma comunidade linguística) e norma ideal

(uma das normas reais de uma língua, elegida por uma comunidade linguística como parâmetro de

orientação para determinadas situações nas quais se deseja usar a língua com maior primor). 106

O acréscimo desta obra forma parte de uma das propostas em execução de nosso Projeto de

Dissertação de Mestrado.

Page 291: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

291

pessoais. Dentre as funções comunicativas que podem ser produzidas nesses gêneros,

está a função de expressar e perguntar por planos e intenções (PCIC, 2006a, p. 230),

inserida na “macrofunção” de expressar gostos, desejos e sentimentos. Em meio aos

recursos linguísticos necessários para executar essa função, está o uso da perífrase

incoativa ir a + infinitivo, a qual indica que uma ação está prestes a ser desenvolvida

(PCIC 2006a, p. 136). A partir desses dados, buscamos informações sobre esse caso

particular de perífrase nos quatro dicionários citados anteriormente.

Em primeiro lugar, s. v. ir (DRAEe, 2014), que está reproduzido parcialmente na

Figura 2, apresenta as seguintes informações:

Figura 2 – DRAEe (2014, s.v. ir)

O uso da perífrase ir a + infinitivo é definido na acepção 14. A informação linguística a

respeito da necessidade da preposição a é apontado nos exemplos, através do uso de

versalete. Já a necessidade de uso do infinitivo para formar essa perífrase, por sua vez,

teria de ser deduzida através dos verbos dos exemplos. Do ponto de vista lexicográfico,

cabe questionar o fato de que essas indicações estejam presentes somente nos exemplos,

de maneira indireta, pois transfere-se ao consulente a responsabilidade de identifica-las.

Outro aspecto a ser considerado é a possível dificuldade de leitura do verbete em virtude

de sua extensão –são as 38 acepções s.v. ir, além de uma lista de 49 locuções.

Em segundo lugar, as informações s.v. ir(se) no DPDe (2005) são as seguintes:

Figura 3 – DPDe (2005, s.v. ir(se))

Page 292: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

292

Na Figura 3, reproduziu-se o verbete ir(se) (DPDe, 2005) de maneira parcial,

restringindo-se à acepção 4. Já no início da acepção, as primeiras informações indicadas

(ir a + infinitivo) remetem aos recursos linguísticos que formam a perífrase de maneira

bastante clara. Após a definição e alguns exemplos e observações em relação ao uso, o

consulente é chamado a atentar para a necessidade de empregar, na norma ideal do

espanhol, a preposição a. Isso ocorre porque o DPDe (2005) é um dicionário que orienta

em relação aos usos da norma ideal do espanhol –sem, no entanto, ignorar outros usos,

indicados nos exemplos. Em suma, ao consultar o DPDe (2005), o professor de ELE

tem acesso a todas as informações necessárias sobre o emprego da perífrase incoativa ir

a + infinitivo.

Em terceiro lugar, o DiClave (2012, s.v. ir), após as acepções, apresenta as

seguintes notas:

Figura 4 – DiClave (2012, s.v. ir)

Através da parte 1 da nota sintaxis, o dicionário indica os elementos que formam a

perífrase, sua definição e um exemplo. Novamente, o professor de ELE tem acesso a

todas as informações de que precisa e, nesse caso em particular, de maneira objetiva.

Em quarto lugar, reproduzimos abaixo a acepção 13 do verbete ir do DUE

(2001):

Page 293: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

293

Figura 5 – DUE (2001, s.v. ir)

A indicação de uso da preposição a, do uso de ir na qualidade de auxiliar de um verbo

no infinitivo, aos quais se somam a definição e os exemplos, reúnem as informações

necessárias para compreender o significado e o comportamento da perífrase que vem

sendo tratada ao longo desta seção. Ainda que tais informações não sejam apresentadas

de modo tão objetivo quanto no DiClave (2012), por exemplo, e que, por isso, exijam

uma leitura mais atenta do verbete, o DUE (2001) cumpre com a sua função de orientar

em relação ao uso da língua.

4.2 Nível B1

Neste nível, um dos gêneros discursivos apontados são as cartas pessoais (PCIC,

2006b, p. 353). Dentre as funções comunicativas que podem ser produzidas nesse

gênero, destacamos a função de expressar e perguntar por desejos através da locução

tener ganas (de algo) (PCIC, 2006b, p. 220), inserida na “macrofunção” de expressar

gostos, desejos e sentimentos. Um dos recursos linguísticos necessários para executar

essa função consiste na unidade lexical ganas, cujo comportamento revela um uso

majoritário no plural (PCIC 2006b, p. 52). Outro recurso é o próprio uso de ganas com

o verbo tener (PCIC, 2006b, p. 220); trata-se de uma das relações possíveis que ganas

estabelece com certos verbos. A informações encontradas nos quatro dicionários estão

dispostas a seguir.

Primeiramente, o DUE (2001) apresenta as seguintes informações s.v. gana:

Page 294: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

294

Figura 6 – DUE (2001, s.v. gana)

Neste verbete, a grande contribuição do DUE (2001) diz respeito aos verbos com os

quais gana(s) se relaciona na língua espanhola. Conforme o dicionário, com o

significado arrolado na acepção 1 (desejo de fazer algo), é possível usar sentir gana(s),

tener gana(s), dar gana(s), entrar gana(s), venir gana(s) e perder gana(s). Já para

expressar o significado apontado na acepção 2 (vontade de comer), é possível usar os

verbos abrirse, despertarse, entrar, tener e perder. O único aspecto que o DUE (2001)

não esclarece é o uso majoritário do plural. Seria necessária uma consulta concomitante

a um dos outros três dicionários, tal como será explicitado mais adiante.

Em segundo lugar, o DiClave (2012) trata da questão do uso de ganas no plural:

Figura 7 – DiClave (2012, s.v. gana)

Na nota morfología, o dicionário indica claramente a particularidade do uso no plural,

além de apontar a regência através da preposição de, na nota sintaxis. A objetividade

com que trata do comportamento das unidades léxicas é, reiteramos, uma característica

bastante positiva do DiClave (2012).

O DPDe (2005), por sua vez, também indica o comportamento de ganas em

relação ao plural:

Page 295: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

295

Figura 8 – DPDe (2005, s.v. gana)

Ambos os dicionários, por outro lado, não tratam especificamente da relação tener

ganas (de algo) no tocante ao uso com o verbo tener. São apontados usos com o verbo

dar e a construção tener ganas (a alguien), no DiClave (2012), cujo significado difere

daquele que analisamos nesta seção.

Em terceiro lugar, o DRAEe (2014) apresenta, por um lado, informações

explícitas a respeito do comportamento de ganas em relação ao uso majoritário no

plural. Além disso, o dicionário aponta que, para efeitos de significado, não há diferença

entre gana e ganas. Por outro lado, na acepção 1, percebe-se que falta a inclusão do

padrão colocacional tener ganas. Reproduzimos na Figura 9, a seguir, o verbete gana

(DRAEe, 2014):

Page 296: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

296

Figura 9 – DRAEe (2014, s.v. gana)

Page 297: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

297

Destaca-se ainda o caráter confuso do tratamento atribuído às locuções. Parece

não haver nenhum princípio de ordenação além da progressão alfabética para tratar das

relações de gana e ganas com outras classes de unidades lexicais. A adoção de um

critério gramatical, como a separação entre os tipos de locuções (verbais, adverbiais,

etc.), ajudaria o consulente a ler o verbete e a interpretar o comportamento de gana e

ganas com outras unidades (os verbos dar, hacer e quedarse, por exemplo).

4.3 Nível B2

Neste nível, dois dos gêneros do discurso arrolados pelo PCIC (2006b, p. 330)

consistem nas cartas e e-mails pessoais. Algumas das funções comunicativas passíveis

de se produzir nesses gêneros são pedir informação (PCIC 2006b, p. 184), que está

inserida na “macrofunção” de dar e pedir informação, e a função de valorizar, expressar

aprovação ou desaprovação, presente na “macrofunção” de expressar opiniões, atitudes

e conhecimentos (PCIC 2006b, p. 196-197). Dentre os recursos linguísticos necessários

para executar essa função, está o acento diferencial que distingue o pronome relativo

que do pronome interrogativo/exclamativo qué (PCIC 2006b, p. 162). As informações

presentes nos quatro dicionários serão comentadas a seguir.

Em primeiro lugar, o DPDe (2005) lematiza dois verbetes, um para que e outro

para qué. Ambos estão reproduzidos abaixo, nas Figuras 10 e 11:

Figura 10 – DPDe (2005, s.v. que)

Figura 11 – DPDe (2005, s.v. qué)

Page 298: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

298

Nos dois verbetes, o DPDe (2005) apresenta os usos de que e qué nas orações

interrogativas e exclamativas diretas e indiretas, de maneira clara e completa (ainda que,

nas figuras acima, não tenhamos reproduzido os verbetes na íntegra). Os exemplos

fornecidos também auxiliam na compreensão dos usos dos pronomes com e sem acento

diferencial. Sem dúvida, a obra poderia ser empregada pelo professor de ELE para o

planejamento de suas aulas.

Em segundo lugar, em situação semelhante encontra-se o DiClave (2012). Assim

como no DPDe (2005), neste dicionário optou-se por incluir dois verbetes separados,

reproduzidos abaixo nas Figuras 12 e 13:

Figura 12 – DiClave (2012, s.v. que)

Figura 13 – DiClave (2012, s.v. qué)

As informações fornecidas nos dois verbetes do DiClave (2012) são suficientes para

compreender as particularidades de uso de que e qué. É necessário observar apenas que

as definições fornecidas nos dois verbetes poderiam ser mais simples, como “designar

algo ya mencionado o que se sobrentiende”, “preguntar por algo” e “exclamar algo”.

Em terceiro lugar, o DRAEe (2014) lematiza os seguintes verbetes:

Page 299: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

299

Figura 14 – DRAEe (2014, s.v. que)

Figura 15 – DRAEe (2014, s.v. qué)

O DRAEe (2014), ao contrário dos dicionários anteriores, oferece um exaustivo

panorama a respeito dos pronomes que e qué. A presença de exemplos nas acepções

ajuda na compreensão da definição. O professor de ELE, por sua vez, poderá encontrar

no DRAEe (2014) uma explanação bastante detalhada.

Page 300: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

300

Por fim, o DUE (2001) reúne as informações relativas aos pronomes que e qué

em um único verbete. Contudo, devido à sua extensão, reproduzimos abaixo somente

alguns trechos para análise.

Figura 16 – DUE (2001, s.v. que) parte 1

Figura 17 – DUE (2001, s.v. que) parte 2

Destaca-se a precisão da definição fornecida pelo dicionário, em especial na primeira

acepção, na qual atribui-se ênfase às funções explicativa e especificativa do pronome.

Os exemplos, por sua vez, são fundamentais para a compreensão, e estão bem

articulados com a definição. Somam-se a isso as informações sobre o uso das unidades

lexicais, como a observação da acepção 2, a respeito do uso familiar. Tais informações

poderiam contribuir para enriquecer o planejamento de aulas de um professor de ELE.

5 Conclusões

A análise apresentada permite concluir que os dicionários são instrumentos

capazes de auxiliar o professor de ELE da Educação Básica no planejamento de uma

aula de viés comunicativo.

Page 301: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

301

Neste trabalho, afirmou-se que um dicionário poderia ser inserido em um

contexto de ensino comunicativo na medida em que fosse capaz de auxiliar na

compreensão e emprego dos recursos linguísticos necessários para executar

determinadas funções comunicativas em um dado gênero do discurso. A análise

realizada, por sua vez, demonstrou que esse potencial de auxílio está presente nos

quatro dicionários. Todos apresentaram informações a respeito dos recursos linguísticos

que fazem parte da formação de estudantes de ELE de níveis iniciais e avançados. Em

algumas obras, o esforço exigido para interpretar as informações fornecidas é mínimo.

O DPDe (2005) e o DiClave (2012) são exemplos disso. Por outro lado, a interpretação

dos verbetes de certas obras exige um esforço maior, seja pela extensão, excesso,

complexidade ou pela falta de uma sistematização mais clara das informações

fornecidas. O DUE (2001) e o DRAEe (2014) se enquadram nesse segundo cenário.

Entretanto, não se pode quitar o mérito dessas obras, pois ambas oferecem informações

pormenorizadas que podem ajudar o professor de ELE que precisa analisar uma dada

unidade lexical de maneira mais aprofundada.

Subjaz a este trabalho o fato de que um panorama de obras lexicográficas é

fundamental para que o professor possa conhecer a gama de dicionários de espanhol

disponíveis. Existe uma diversidade de dicionários monolíngues de espanhol para

falantes nativos que, assim como os dicionários analisados aqui, também seriam capazes

de auxiliar o professor de ELE.

Page 302: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

302

Referências

ALONSO RAMOS, Margarita (2008). Papel de los diccionarios de colocaciones en la

enseñanza de español como L2. Em: Bernal, E.; DeCesaris, J. (eds.). Proceedings of

the XIII EURALEX International Congress. Barcelona: Universitat Pompeu Fabra,

p. 1215-1230. Disponível em: <http://www.euralex.org/proceedings-

toc/euralex_2008/>. Acesso em: 07 mar. 2016.

BORBA, Laura C. (2014). Panorama da Lexicografia Hispânica: subsídios para o

professor gaúcho de espanhol. 2014. 83p. Trabalho de Conclusão de Curso de

Graduação – Instituto de Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto

Alegre. Disponível em: <http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/115642>. Acesso em:

07 mar. 2016.

BORDEN, Matthew et al. (2004). El diccionario en la clase de español: actividades

prácticas para el nivel inicial, intermedio y avanzado. In: Actas del XV Congreso

Internacional de la ASELE. Sevilla, p. 943-945. Disponível em:

http://cvc.cervantes.es/ensenanza/biblioteca_ele/asele/asele_xv.htm. Acesso em: 07

mar. 2016.

BUGUEÑO MIRANDA, Félix Valentín (2006). Léxico e ensino: Señas (2000), um

dicionário para aprendizes do espanhol? Em: MARTINS, Evandro; CANO, Waldenice;

MORAES FILHO, Waldenor. (Org.). Léxico e morfofonologia: perspectivas e análise.

Uberlândia: EDUFU, p. 216-232.

________ (2014). Da classificação de obras lexicográficas e seus problemas: proposta

de uma taxonomia. Em: Alfa, São Paulo, p. 215-231. Disponível em:

<http://www.scielo.br/pdf/alfa/v58n1/09.pdf>. Acesso em: 07 mar. 2016.

________; BORBA, Laura C. (2015). Hacia una clasificación de obras lexicográficas

del español desde la perspectiva de su enseñanza. Em: Expressão, Santa Maria, n. 19,

p. 65-75.

COSERIU, Eugenio (1980). Lições de linguística geral. Rio de Janeiro: Ao Livro

Técnico.

DC (1998). OLCINA, Antonio. G. Diccionario de Climatología. Madrid: Acento.

DSELE (2002). Señas: diccionario para la enseñanza de la lengua española para

brasileños. São Paulo: WMF Martins Fontes.

DSLE (1996). GUTIÉRREZ CUADRADO, J. (dir.). Diccionario Salamanca de la

Lengua Española. Universidad de Salamanca. Madrid: Santillana.

DiClave (2015). SM Ediciones. Diccionario Clave de uso del español actual.

Disponível em: <http://clave.smdiccionarios.com/app.php>. Acesso em: 12 nov. 2015.

Page 303: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

303

DPDe (2005). REAL ACADEMIA ESPAÑOLA. Diccionario panhispánico de dudas.

Disponível em: <http://www.rae.es/recursos/diccionarios/dpd>. Acesso em: 12 nov.

2015.

DRAEe (2014). REAL ACADEMIA ESPAÑOLA. Diccionario de la Lengua

Española. Disponível em: <http://dle.rae.es/>. Acesso em: 05 nov. 2015.

DUE (2001). MOLINER, M. Diccionario de uso del español. Madrid: Gredos.

ERES FERNÁNDEZ, Gretel et al (2012). Materiais didáticos de espanhol: entre a

quantidade e a diversidade. 2012. 68f. Relatório final de pesquisa não financiada –

Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo. Disponível em:

<http://www4.fe.usp.br/wp-content/uploads/cepel/materiales-didacticos-de-espanol-

informe.pdf>. Acesso em: 12 set. 2015.

FARIAS, Virginia S. (2011). Subsidios lexicográficos para la enseñanza de lenguas

extranjeras: Qué diccionarios tienen a su disposición los aprendices brasileños de

español? Em: Revista Brasileira de Linguística Aplicada, Belo Horizonte, v. 11, n. 1,

p. 47-71.

HAENSCH, Günther; OMEÑACA, Carlos (2004). Los diccionarios del español en el

siglo XXI. Salamanca: Ediciones Universidad de Salamanca.

IZQUIERDO, Narciso M. C. (2013). Variación lingüística y ELE. El diccionario como

herramienta didáctica para la enseñanza del español coloquial. Em: ABEH, São Paulo,

p. 289-308, 2013. Disponível em: < http://www.mecd.gob.es/brasil/dms/consejerias-

exteriores/brasil/2014/publicaciones/abehxxiii.pdf>. Acesso em: 07 mar. 2016.

PCIC (2006). Plan Curricular del Instituto Cervantes. 3 vol. Madrid: Biblioteca

Nueva.

PCIC (2006a). Plan Curricular del Instituto Cervantes. Niveles A1 y A2. Madrid:

Biblioteca Nueva. Disponível em: < http://cvc.cervantes.es/Ensenanza/biblioteca_ele/plan_curricular/default.htm>. Acesso

em: 07 mar. 2016.

PCIC (2006b). Plan Curricular del Instituto Cervantes. Niveles B1 y B2. Madrid:

Biblioteca Nueva. Disponível em: < http://cvc.cervantes.es/Ensenanza/biblioteca_ele/plan_curricular/default.htm>. Acesso

em: 07 mar. 2016.

PCIC (2006c). Plan Curricular del Instituto Cervantes. Niveles C1 y C2. Madrid:

Biblioteca Nueva. Disponível em: < http://cvc.cervantes.es/Ensenanza/biblioteca_ele/plan_curricular/default.htm>. Acesso

em: 07 mar. 2016.

PCNEM (2000). BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e

Tecnológica. Parâmetros curriculares nacionais: Ensino Médio. Brasília. Disponível

em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/blegais.pdf>. Acesso em: 07 mar. 2016.

Page 304: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

304

PCN+ (2002). BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e

Tecnológica. PCN+ Ensino Médio: orientações educacionais complementares aos

Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília. Disponível em:

<http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/linguagens02.pdf>. Acesso em: 07 mar.

2016.

QECRL (2001). CONSELHO DA EUROPA. Quadro Comum Europeu de

Referência para as Línguas: aprendizagem, ensino e avaliação. Portugal: Edições Asa.

Disponível em:

<http://www.dge.mec.pt/sites/default/files/Basico/Documentos/quadro_europeu_comu

m_referencia.pdfr>. Acesso em: 07 mar. 2016.

SCHMIDELY, Jack (2001). (coord.). De una a cuatro lenguas. Madrid: Arcolibros.

Page 305: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

305

SOBRE OS AUTORES

Adriana de Borges Gomes

Doutora em Teoria da Literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande

do Sul (PUCRS). Mestre em Teorias e Crítica da Literatura e da Cultura pela

Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Bacharel em Letras com Língua Estrangeira

Espanhol pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Atualmente é Professora

Assistente da Universidade do Estado da Bahia (UNEB, Campus I), onde leciona

disciplinas de literaturas em língua espanhola e dedica-se à pesquisa em Estudos

Literários, Teóricos e Críticos da produção ficcional em literaturas de Língua

Espanhola.

CV: http://lattes.cnpq.br/2671657347281782

Antonio Ferreira da Silva Júnior

Doutor em Letras Neolatinas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Bacharel em

língua espanhola e em língua portuguesa pela UFRJ. Professor Adjunto de Didática e

Prática de Ensino de Português/Espanhol da Faculdade de Educação da UFRJ. Professor

do Curso de Especialização em Ensino de Línguas Estrangeiras e Professor Permanente

do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Relações Etnicorraciais do

CEFET/RJ. É coordenador de dois projetos de pesquisa: “Língua Espanhola na escola:

materiais didáticos, espaço escolar e o programa nacional do livro didático de língua

estrangeira” e “Neste Instituto Tecnológico se forma professor de Espanhol?

Concepções de ensino dos professores formadores”. É autor de diversos artigos e livros,

publicados no Brasil.

CV: http://lattes.cnpq.br/3288529999588353

Antonio Martínez Nodal

Possui graduação em Português - Espanhol pela Escola Superior Madre Celeste (2014),

Belém/Pará. Cursa especialização em Ensino da Língua Espanhola na Universidade

Cándido Mendes, (2015-). É ator profissional formado pelo "Estudio de interpretación

Juan Carlos Corazza", Madri (1999-2002). Ademais, é interprete de Língua de Sinais

Espanhola (LSE), formado pelo "Ciclo de Grado Superior', do Instituto Pio Baroja,

Madri (2005-2006). Atualmente é professor de espanhol no Instituto Cervantes de

Salvador e, também, de Língua e Literatura Espanhola no curso de Licenciatura em

Letras: Espanhol, do Plano Nacional de Formação de Professores (PARFOR - UFPA).

Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Língua Espanhola (I-V) e Literaturas

Espanhola e Hispanoamericana.

CV: http://lattes.cnpq.br/8003708937498480

Carla da Penha Bernardo

Possui Graduação em Português-Francês pela Universidade Federal do Rio de Janeiro

(1994), Licenciatura em Português-Literaturas pela Universidade Federal do Rio de

Janeiro (1992), Graduação em Português-Literaturas de Língua Portuguesa pela

Page 306: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

306

Universidade Federal do Rio de Janeiro (1990), Especialização em Francês (Tradução)

pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1995), Mestrado em Linguística e

Filologia (Filologia Românica) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1996) e

Doutorado em Letras Vernáculas (Literatura Portuguesa) pela Universidade Federal do

Rio de Janeiro (2001). Atualmente é professora adjunta da Universidade do Estado da

Bahia. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Literatura Portuguesa,

atuando principalmente nos seguintes temas: Romantismo português, identidade e

alteridade nos PALOP, edição de texto, diversidade linguística, indígenas no Brasil do

século XVII: história da língua, ortografia e História

CV: http://lattes.cnpq.br/2116893726676956

Camilla Guimarães Santero

Possui graduação em Português-Espanhol pela Universidade Federal do Rio de Janeiro

(2008) e mestrado em Letras Neolatinas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro

(2011). Atualmente é professor assistente da Universidade Federal da Bahia.

Doutoranda em Linguística Aplicada pela UFBA. Tem experiência na área de Letras,

com ênfase em Letras, atuando principalmente nos seguintes temas: pragmática, ensino

de ELE, interculturalidade e língua franca.

CV: http://lattes.cnpq.br/8930455384194117

Carla Severiano de Carvalho

Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagens (Universidade do

Estado da Bahia). Especialista em Língua Espanhola (Universidade Federal da Bahia).

Licenciada em Letras - Língua Espanhola e Literaturas de Língua Espanhola

(Universidade do Estado da Bahia). Possui Certificação Internacional "Diploma

Espanhol Língua Estrangeira" (DELE) Superior C2. Professora Auxiliar do

Departamento de Ciências Humanas da Universidade do Estado da Bahia (UNEB -

Campus I: Salvador) e do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia

(IFBa - Campus Santo Amaro). Dedica-se ao ensino de língua espanhola como língua

estrangeira para brasileiros e à formação de professores de língua espanhola e, ainda,

desenvolve pesquisas na área de estudos dos discursos em língua portuguesa e em

língua espanhola.

CV: http://lattes.cnpq.br/5178779049867374

Cecília Gabriela Aguirre Souza

É Doutora em Letras, Área de Concentração em Linguística Aplicada (2004), pelo

Programa de Pós Graduação em Letras e Linguística da Universidade Federal da Bahia.

Realizou Estágio de Doutorado na Universidade de Buenos Aires com Bolsa CAPES

PDEE (2003). Realizou Estágio Pós-Doutoral na Universidade de Buenos Aires com

Bolsa CAPES (2009-2010). Atualmente é professora Associada I da Universidade

Federal da Bahia. Atua nas áreas de Ensino de Língua Espanhola e Formação de

Professores de E/LE, com ênfase no ensino da língua espanhola e interculturalidade,

pragmática sociocultural e ensino de línguas pela modalidade a distancia.

CV: http://lattes.cnpq.br/4911181458180928

Page 307: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

307

Cristina Corral Esteve

Doutora em Linguística General pela Universidad de León (Espanha, reconhecido no

Brasil, UFPE). Possui graduação em Filología Hispánica – Universidad de

Salamanca(1996, revalidada no Brasil, UFPE), especialização em Ensino de Língua e

Literatura Espanholas (Curso de Adaptação Pedagógica, CAP) – Universidad de

Salamanca (1997) e Diploma de Estudos Superiores (D.E.A.) em Aspectos Linguísticos

y Literarios del Español – Universidad de León (1998). É autora de diversos livros

publicados no Brasil.

CV: http://lattes.cnpq.br/6538590603597590

Félix Valentín Bugueño Miranda

Doutor em Filologia Românica pela Ruprecht-Karls-Universität Heidelberg

(Alemanha). Licenciado em Língua e Literatura Hispânica pela Universidad de

Valparaíso (Chile). Professor Adjunto da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Membro de corpo editorial do Ao Pé da Letra. Membro de corpo editorial da Letras &

Letras (Online). Membro de corpo editorial da Cadernos do instituto de Letras e

Membro de corpo editorial do Expressão (Santa Maria/RS). Pesquisador CNPQ, na

coordenação do projeto de pesquisa “Para uma teoria metalexicográfica integral.

Manual de Lexicografia”. Tem diversos artigos publicados no Brasil e no exterior e é

autor de livros, publicados no Brasil.

CV: http://lattes.cnpq.br/8896923693053922

Isabel Gretel María Eres Fernández

Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo. Pesquisadora CNPQ. Membro

efetivo da Academia Internacional de Lexicografia. Atuou no Curso de Licenciatura de

Espanhol e na Pós-Graduação em formação de professores de espanhol da USP. É

autora de vários artigos, capítulos de livros e de diversos livros didáticos e paradidáticos

(em coautoria). Colabora com o Ministério da Educação e Cultura do Brasil,

especialmente nas consultorias das Orientações Curriculares do Ensino Médio Espanhol

(em particular as publicadas em 2006).

CV: http://lattes.cnpq.br/8478409042986335

Jeferson Mundim de Souza

Possui Licenciatura em Filosofia e Letras Português/Espanhol pela Universidade

Federal da Bahia (1997) e pela UNITINS (2011). Especializações em Filosofia (UEFS)

e em Língua Espanhola (PUC-MG). Mestrado em Educação pela UFBA. Aluno

Especial da Pós Graduação em Cultura e Sociedade - IHAC - UFBA, tendo cursado as

Disciplinas Cultura e Cidadania em 2014.2 e Cultura e Identidade em 2015.1.

Graduando do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades (UFBA). Tem experiência

nas áreas de Terminologias Ítalo Espanholas Aplicadas à Gastronomia, Espanhol

Instrumental - Fins específicos, Educação, Filosofia, Ética, Língua, Cultura e Literaturas

Espanhola e Hispano-americanas, presenciais e EaD. Trabalhou durante cinco anos no

curso de extensão - NEHIS - Núcleo de Estudos Hispânicos, vinculado a UNEB.

Page 308: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

308

CV: http://lattes.cnpq.br/3802535983548337

Laura Campos de Borba

Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Rio

Grande do Sul (UFRGS), na Linha de Pesquisa em Lexicografia, Terminologia e

Tradução - Relações Textuais (Bolsista CNPq). Possui graduação em Licenciatura em

Letras Português-Espanhol pela UFRGS (2014). Bolsista IC / UFRGS Voluntária

(2010), bolsista IC PIBIC/CNPq / UFRGS (2011-2014). Premiações e destaques: Salão

de Iniciação Científica (FAPA, PUCRS e UFRGS). Áreas de pesquisa: Lexicografia e

Metalexicografia; Língua Espanhola. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em

Metalexicografia e Lexicografia UFRGS - UFSC - UERJ / CNPq.

CV: http://lattes.cnpq.br/7269192040259743

Luciana Contreira Domingo

Mestre em Letras pela Universidade Federal da Bahia. Doutoranda em Letras pela

Universidade Católica de Pelotas/RS. Professora da Universidade Federal do Pampa, no

Curso de Língua Espanhola. Coordenadora da pesquisa “Interculturalidade e formação

docente: reflexões sobre a construção da competência comunicativa intercultural nos

Cursos de Letras”. É autora de diversos artigos, publicados no Brasil.

CV: http://lattes.cnpq.br/9087062279864112

Luzilene Cardoso de Souza

Possui graduação em Letras - Espanhol pela Universidade Estadual de Feira de

Santana(2004). Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Línguas Estrangeiras

Modernas.

CV: http://lattes.cnpq.br/7796385416203054

Maria Augusta Da Costa Vieira

Doutora em Letras/ Literatura Espanhola e Hispanoamericana pela Universidade de São

Paulo. Célebre cervantista brasileira, Maria Augusta é Professora Titular da Literatura

Espanhola da USP. É pesquisadora CNPQ da literatura espanhola nos séculos XVI e

XVII, em particular na obra de Miguel de Cervantes Saavedra. Autora de artigos

publicados no Brasil e no exterior. Finalista do Prêmio Jabuti com o livroDom Quixote:

a letra e os caminhos (2006). Vencedora do Prêmio Jabuti de 2013, com o livro A

narrativa engenhosa de Miguel de Cervantes: estudos cervantinos e recepção do

Quixote no Brasil. Presidiu o IX CINDAC – Congreso Internacional de la Asociación

de Cervantistas, pela primeira vez sediado em um país Sul-americano, na Universidade

de São Paulo – Brasil, em 2015.

CV: http://lattes.cnpq.br/8769804694444711

Page 309: actualidadesdelquijote.files.wordpress.com · Viaje del Parnaso, publicada no ano seguinte, traz uma declarada frustração cervantina por considerar que ele próprio não poderia

309

Máira Barboza de Oliveira Coelho

Graduanda do Curso de Licenciatura em Letras- Língua Espanhola e Literaturas em

Língua Espanhola - da Universidade do Estado da Bahia - UNEB / Campus I. Áreas de

interesse: Formação de Professores , Tradução, Prática docente, Cultura Afrolatina,

Línguas estrangeiras e Análise do Discurso.

CV: http://lattes.cnpq.br/6510443771863452

Rubén Daniel Méndez Castiglioni

Doutor em Letras/ Teoria da Literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio

Grande do Sul, com pós-doutorado pela Universitat de les Illes Balears (Espanha).

Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul na Graduação e Pós-

graduação. Pesquisador CNPQ, na coordenação de projetos na área de Literaturas de

Língua Espanhola. É membro honorário da Rede Brasileira de Direito e Literatura e

membro efetivo da Academia Rio-Grandense de Letras, ocupando a cadeira de número

31. Autor de diversos artigos e livros, publicados no Brasil.

CV: http://lattes.cnpq.br/9608563687857835

Viani da Silva Soares

Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal da Bahia (1998) e mestrado

em Educação pela Universidade Federal da Paraíba (2005). Atualmente é servidora do

Governo do Estado da Bahia e docente da União Metropolitana de Educação e Cultura.

Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Currículo, atuando

principalmente nos seguintes temas: Educação de Jovens e Adultos, Coordenação

Pedagógica e Currículo.

CV: http://lattes.cnpq.br/8355925974007301