abril 2012

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O CENTRO ARRUINADO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS O CENTRO ARRUINADO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS Por: Igor Isídio e Yulgan Tenno UM INFORMATIVO INOVADOR PARA NOVOS TEMPOS Saber Direito Criminal Internacional “(...) Em meio à preparação das comemorações dos 60 anos da Faculdade de Direito, deve subsistir a vergonha de brin- dar à nossa Casa de Ensino enquanto ela, literalmente, desa- ba sobre nossas cabeças”. P.8 , P.9. Iniciativa doa estudantes de Direito da Universidade Federal da Paraíba. Maior –Junho (modificada). Ano 1. N 2. UM INFORMATIVO INOVADOR PARA NOVOS TEMPOS P.6 P.4. P.11 PEDRO LENZA A pedido da TRIBUNA, um dos maiores autores em Direito Constitucional do Bra- sil, Pedro Lenza, comenta o caso Manoel Mattos à luz da constitucionalidade da EC.45 e sua repercussão para o meio jurí- dico. Além de atentar para o novo espaço de aplicação dos direitos sociais frente a jurisprudência do STF. P1O. 10%, ilegal ou imoral? Saiba qual o grau de lega- lidade na cobrança dos 10% nos restaurantes e bares da capital e para onde vai o excedente. POR MATHEUS CHAVES. JOSÉ TARGINO MARANHÃO ―Eu cumpri meu dever, fiz o que era possível e importante‖ O ex-Governador da Paraíba dá sua primeira entrevista após as eleições de 2010. Em meio a um espetáculo de confissões, Maranhão comenta o Golpe Militar de 64, sua posições políticas e ideológicas e fala da gratidão de fazer parte da construção histórico-política do Estado da Paraí- ba. P8 , P.9. Direito vs Direito Veja as opiniões opostas de dois grandes juristas a respeito da decisão do STF em aplicar a lei do “Ficha Limpa” nas elei- ções de 2010. Por: LEO- NARDO WRIGHT. A morte de Osama Bin Laden marca o início de uma nova era para a hu- manidade. Estamos a salvos do terrorismo in- ternacional? A análise dos fatos: TERRORIS- MO. Por JAN MARCELL. Infiltrações no teto da Faculdade de Direito JP (UFPB).

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Page 1: Abril 2012

O CENTRO ARRUINADO DE CIÊNCIAS JURÍDICASO CENTRO ARRUINADO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS Por: Igor Isídio e Yulgan Tenno

UM INFORMATIVO INOVADOR PARA NOVOS TEMPOS

Saber Direito Criminal

Internacional

“(...) Em meio à preparação das comemorações dos 60 anos

da Faculdade de Direito, deve subsistir a vergonha de brin-

dar à nossa Casa de Ensino enquanto ela, literalmente, desa-

ba sobre nossas cabeças”. P.8 , P.9.

Iniciativa doa estudantes de Direito da Universidade Federal da Paraíba. Maior –Junho (modificada). Ano 1. N 2.

UM INFORMATIVO INOVADOR PARA NOVOS TEMPOS

P.6

P.4.

P.11

PEDRO LENZA

A pedido da TRIBUNA, um dos maiores

autores em Direito Constitucional do Bra-

sil, Pedro Lenza, comenta o caso Manoel

Mattos à luz da constitucionalidade da

EC.45 e sua repercussão para o meio jurí-

dico. Além de atentar para o novo espaço

de aplicação dos direitos sociais frente a

jurisprudência do STF. P1O.

10%, ilegal ou imoral?

Saiba qual o grau de lega-

lidade na cobrança dos

10% nos restaurantes e

bares da capital e para

onde vai o excedente. POR

MATHEUS CHAVES.

JOSÉ TARGINO

MARANHÃO

―Eu cumpri meu dever, fiz o que era

possível e importante‖

O ex-Governador da Paraíba dá sua primeira

entrevista após as eleições de 2010. Em meio a

um espetáculo de confissões, Maranhão comenta

o Golpe Militar de 64, sua posições políticas e

ideológicas e fala da gratidão de fazer parte da

construção histórico-política do Estado da Paraí-

ba. P8 , P.9.

Direito vs Direito

Veja as opiniões opostas

de dois grandes juristas a

respeito da decisão do

STF em aplicar a lei do

“Ficha Limpa” nas elei-

ções de 2010. Por: LEO-

NARDO WRIGHT.

A morte de Osama Bin

Laden marca o início de

uma nova era para a hu-

manidade. Estamos a

salvos do terrorismo in-

ternacional? A análise

dos fatos: TERRORIS-

MO. Por JAN MARCELL.

Infiltrações no teto da Faculdade de Direito JP (UFPB).

Page 2: Abril 2012

CONSELHO CONSULTIVO

CONSELHO EDITORIAL

ISÍDIO

IGOR

Dr. Delosmar Mendonça Dr. Marcílio Franca Dr. Solon Benevides Leia TRIBUNA, promova JUSTIÇA

@tribunajustica

2

HENRIQUE LENON IGOR ISÍDIO MIGUEL CÂMARA PEDRO ATAÍDE YULGAN TENNO

“Como sempre colocam que os números são irrefutáveis, eu

gostaria de apresentar um número composto por três algarismos ape-

nas, (...) que é o número do meu salário: um nove, um três e um zero.

Novecentos e trinta: meu salário-base. (...) Certamente esse salário não

é suficiente para pagar nem a indumentária que os senhores e as se-

nhoras utilizam para poder frequentar esta Casa.”

Foram estas as primeiras palavras do depoimento da professo-

ra Amanda Gurgel, proferido em audiência pública da Assembléia Le-

gislativa do Rio Grande do Norte, sobre o cenário

real da educação naquele estado. Diante do silenci-

oso constrangimento dos parlamentares, ela inter-

rogou: “Estão me colocando dentro de uma sala de

aula com um giz e um quadro para salvar o Brasil,

é isso?” O vídeo do discurso, postado no Youtube há apenas três sema-

nas, já foi assistido por quase dois milhões de internautas. Não só por

ser mais um dos muitos “virais” que alçam desconhecidos à fama com a

instantaneidade de um clique, o depoimento da professora potiguar

chama a atenção por evidenciar um fenômeno recente, potencializado

pelo avanço das ferramentas de comunicação: o ativismo político onli-

ne.

Tuitado e retuitado milhares de vezes - na mesma velocidade

com que estes novos verbos foram absorvidos - o vídeo deflagrou a

campanha que atualmente reúne assinaturas para uma petição pública

em favor do aumento de recursos destinados à educação. A mobilização

em muito nos lembra a que levou à aprovação da “Lei da Ficha Limpa”,

iniciada com um projeto de lei de iniciativa popular, fortalecido pela

reunião de mais de dois milhões de assinaturas. Tamanha força acelerou

sobremaneira a tramitação do projeto, em ambas as Casas do Congresso

Nacional, que em menos de um ano passou a vigorar como Lei Comple-

mentar nº 135/2010. E a grande maioria dos signatários tomou conheci-

mento, aderiu e deu suporte à campanha através da internet.

Ainda são escassos e incipientes os estudos da Ciência Políti-

ca brasileira sobre esse tipo de ativismo político, conhecido internacio-

nalmente como cyberativismo (ou E-activism), mas o fenômeno já é

estudado há quase uma década por pesquisadores europeus e norte-

americanos. Desde 2002, por exemplo, o havardiano Pippa Norris já

dizia que, “em suma, as tecnologias digitais facilitam a maior das redes

sociais, que deve ser o ambiente onde a sociedade civil e a esfera

pública florescem.” Em termos de mobilização política, a grande rede

tem hoje um poder de contaminação tão proeminente que já existem

empresas especializadas em canalizar esse potencial. É o caso da Avaaz,

uma organização de mobilização online, atuante em 193 países, que

ganhou espaço no Brasil após coordenar a bem-sucedida campanha pela

aprovação da Lei da Ficha Limpa. Utilizando-se da velocidade de

comunicação típica da web para catalizar suas ações, a organização

trabalha basicamente com a coleta de assinaturas e envio de petições

aos congressistas. Em seu site, acessado mundialmente por mais de

nove milhões de pessoas, conclama a adesão dos internautas brasileiros

a campanhas como “Proteja o Brasil do Bolsonaro” ou “Pare Belo

Monte - Não à Mega Usina na Amazônia”.

As novas tecnologias na comunicação vêm contribuindo,

sobretudo, no fortalecimento da sociedade civil organizada perante o

Legislativo. A vontade popular manifesta-se agora de forma mais orga-

nizada, pois interesses semelhantes rapidamente se aglutinam e se mo-

bilizam a partir do ambiente virtual, exercendo sobre as ações dos parla-

mentares uma pressão, por uníssona, mais homogênea. Pode parecer

assustador àqueles que ainda não internalizaram os sentimentos de de-

mocracia, mas, no frenético ritmo da atualidade, o postar de um simples

vídeo no Youtube ou de um texto em um blog passou a ter tanta relevân-

cia política quanto qualquer pronunciamento nas sessões solenes do

Congresso Nacional. Um anônimo (mesmo uma professora primária)

pode, instantaneamente, tornar-se político; os internautas, organizados,

podem ser verdadeiros legisladores; um simples clique, reverberado no

gigantesco universo da internet, passou a ser um ato político tão impor-

tante quanto transformador.

AMANDA GURGEL E OS INTERNAUTAS LEGIFERANTES

IGOR ISÍDIO. Acadêmico da Faculdade de Direito

em João Pessoa (UFPB).

―(...) um simples clique, reverberado no gigantesco universo

da internet, passou a ser um ato político tão importante

quanto transformador‖

Page 3: Abril 2012

AO LEITOR

CARTA

A TRIBUNA E A JUSTIÇA ENTRE TRADIÇÃO E INOVAÇÃO

3

DIRETOR-GERAL

YULGAN TENNO [email protected]

DIRETORIA COMERCIAL

VINICIUS PAIVA [email protected]

DIRETORIA DO TESOURO

ILDECI TAVARES [email protected]

DIRETORIA EXECUTIVA

PEDRO ATAÍDE E RAFAEL MENEZES [email protected]

[email protected]

DIRETORIA DE REDAÇÃO

IGOR ISÍDIO

Vice: MATHEUS CHAVES [email protected]

DIRETORIA DE REPORTAGEM

NAYANNA SABIÁ [email protected]

Redator: Guilherme Anacleto;

Colunistas: Caroline Falcão, Danilo Moura, Heitor Toscanos, Jan Marcel, Matheus Chaves, Rafael Menezes;

Repórteres: Ítalo Di Lucena; Uane Junilhia;

Consultores Comerciais: Thiago Lima, Ygor Fernandes, Yure Tenno;

Colaboraram nesta edição: Larissa Maranhão, Leonardo Wright, Nathan Wanderley, Ingride Ferreira, Luana Vas-

conelos,

Fotografia: Yulgan Tenno

COMISSÃO

JORNALÍSTICA

Tribuna da Justiça é uma

publicação dos estudantes

de Direito da UFPB.

[email protected]

@TribunaJustica

Fundadores:

Henrique Lenon e Yulgan

Tenno

Projeto Gráfico:

Sérgio Sombra

Tiragem Mensal:

Mil exemplares

Leia TRIBUNA, promova JUSTIÇA

Este informativo, como espaço de difusão de ideais e

de instrução acadêmica, acende o farol da justeza em uma cultura

mundial de novidade. Os povos se inserem, há algum tempo, em uma

cadeia de progresso ordenado, que tem a inovação como regra.

Essa pulverização do novo só é possível por meio da

difusão do indivíduo, que hoje com-

põe, nas palavras de Rodriguez Ibarra,

uma “sociedade invisível” – além da

institucionalizada – e, para nós, quebra

as barreiras da invisibilidade social.

Usando o Twitter, o Facebook e o

Google, Um com Outro provam que a

liderança não está apenas configurada no corpo social subordinado,

pelo contrato político, a representantes constituídos. Líderes emergem

da população-em-si; pactos e acordos institucionais renovam-se; criam

-se novas linguagens e tecnologias do poder.

Se, nas sociedades feu-

dais, a individualização estava apenas

nas regiões altaneiras da autoridade –

sendo sua medida –, atualmente, a indi-

vidualidade volta a acompanhar o po-

der, desta maneira: cada indivíduo po-

de, a partir de si, inovar e transformar. Esse foi o exemplo das recen-

tes revoluções árabes, que obedeceram à potência virtual do Eu e de

seus Followers.

Por outro lado, também a política ocidental se recons-

trói. O nacionalista Humala vence no Peru, reforçando uma aliança

continental, e o PSD português – tendo um homônimo brasileiro em

gestação acelerada – toma dos socialistas o Governo luso. A nova

direita francesa, com Marie Le Pen, advoga o fim da globalização,

enquanto a esquerda acadêmica propõe a construção de uma contra-

hegemonia dentro do sistema globalizado.

Nesses novos tempos, reforçar bens tradicionais, como

o “justo”, parece contraditório, mas não embarcamos na estática esté-

tica do valor imutável, e sim na dinâmica que busca um conceito. A

tradição nos envolve e dela absorvemos o que é necessário, porquanto

a estrutura de nossa perspectiva é cognitiva.

Afinal, a proposta da Tribuna da Justiça não é a verti-

calidade travestida de vanguardismo libertador, mas a horizontalidade

dos que se submetem coordenadamente a pressupostos de investiga-

ção da verdade. Se o sujeito social é um ponto de convergência de

direitos, cada indivíduo é também um ponto de emergência de opini-

ões próprias e soberanas. Eis por que os autores dos textos que publi-

camos têm liberdade ideológica e desembaraço criativo.

Entre tradição e inovação, este informativo firma-se

sob o signo duplo da competência e da independência. Nestas páginas,

falam

nomes

históricos

da Paraí-

ba, como

Ronaldo

Cunha

Lima e José Maranhão, alternam-se juristas consagrados, como Dr.

Genival Veloso e nossos conselheiros, e publicam-se escritos de estu-

dantes universitários. Promovemos ainda debates com figuras inova-

doras do cenário nacional, como Maria Berenice Dias e Marianna

Chaves,

membros

do Insti-

tuto Bra-

sileiro de

Direito de

Família.

Nesse sentido, é alvissareiro sermos procurados por

acadêmicos e por profissionais do direito, por leigos e por mestres, os

quais querem colaborar, ou trabalhar conosco. Nosso trabalho busca a

mudança, mas não renegamos princípios, tampouco nos subordinamos

integralmente a eles. Nosso norte é a grandeza, sem a arrogância do

século XX.

HENRIQUE LENON FARIAS GUEDES

Presidente do Conselho Editorial

―Nosso trabalho busca a mudança,

mas não renegamos princípios...‖

―Nosso norte é a grandeza, mas sem a

arrogância de outrora.‖

Page 4: Abril 2012

INTERNACIONAL

4

Os atentados terroristas de 11 de setembro, nos Estados Unidos, trouxeram um sentimento de

vulnerabilidade em nível internacional. A tolerância

dos países diminuiu, consideravelmente, em especial, a norte-americana, o que levou o presidente George

W. Bush a declarar guerra a todos os grupos terroris-

tas. A primeira atitude do governo norte-americano foi planejar a derrubada do regime Talibã, no Afega-

nistão, e capturar Osama Bin Laden.

Em consequência do conhecimento adqui-rido em outras experiências no oriente médio, a

política norte-americana objetivou melhorar sua

imagem no exterior e ter uma relação pública de combate aos terroristas. Conforme aponta Fraser

Cameron, em sua obra sobre a Política Externa Ame-

ricana no Pós-Guerra Fria, em 2003, os estaduniden-ses, apoiados no patriotismo e na opinião pública,

fizeram com que o olhar do mundo para o país se

tornasse uma forma de cooperação contra possíveis ameaças terroristas.

Nesse contexto, é importante lembrar que

o terrorismo não é um fenômeno novo. Enquanto expressão política, por exemplo, o termo “terror”

surgiu com a Revolução Francesa, em seu período de

maior violência. No entanto, nos últimos tempos, pelos impactos provocados, esse termo vem ganhan-

do maior destaque. Embora haja a percepção de que,

cada vez mais, o tema é estudado e debatido, ainda

não há um consenso acerca de sua definição oficial.

Segundo Raymond Aron, no livro “Paz e Guerra entre as Nações”, em 1962: “Uma ação violenta é

chamada de terrorismo quando os seus efeitos psico-

lógicos são desproporcionais ao seu resultado pura-mente físico”. Ou seja, os efeitos psicológicos dos

atentados de 11 de setembro, entendidos como contra

todo o povo norte-americano ou até a civilização ocidental, foram bem maiores que os efeitos físicos

(Ataque às duas torres gêmeas do World Trade Cen-

ter, ao Pentágono e a morte de aproximadamente 3000 pessoas).

Com a eleição de Barack Obama, em

2009, oposição ao governo de Bush, há uma pressão por uma nova estratégia política contra o terrorismo.

Contudo, Obama manteve alguns nomes da gestão

do governo anterior, como o secretário de Defesa, Robert Gates. Conseqüentemente, Gates foi respon-

sável por uma estratégia de continuidade e ruptura

com a gestão de Bush, objetivando o controle do Afeganistão e da região fronteiriça com o Paquistão.

Em 2011, em um momento de contestação ao gover-

no Obama, essa estratégia consolidou a morte do terrorista Osama Bin Laden, no Paquistão, e repercu-

tiu no fortalecimento da campanha de Barack Obama

a reeleição.

Um inimigo a menos: análise e críticas à ofensiva

norte-americana

Na madrugada do dia 2 de maio de 2011,

Obama anunciou a morte do principal idealizador do terrorismo internacional, responsável pelo atentado

de 11 de setembro de 2001 e líder da rede terrorista

Al-Qaeda. Através de uma articulada ofensiva da força armada norte-americana, tropa Seal, melhor

tropa de operações dos EUA, os militares invadiram

o complexo que abrigava Bin Laden, na cidade de Abbotabad, Paquistão. Em confronto direto, ao che-

garem ao quarto do terrorista, os norte-americanos

atiraram contra Bin Laden e sua esposa. Segundo informações norte-americanas, o

terrorista morreu com um tiro na cabeça e outro no

peito. E, ao se colocar a frente do marido, a esposa do terrorista foi ferida com um tiro na perna. Após

exames de DNA, o corpo do terrorista foi sepultado e

atirado ao mar, seguindo tradições islâmicas. No entanto, como aponta Noam Chomsky, em artigo

para a revista “Guernica”: “em sociedades que pro-

fessam certo respeito pela lei, os suspeitos são deti-dos e passam por processo justo”. A morte do terro-

rista, realizada de forma planejada pelos norte-

americanos, fere diversas normas de Direito Interna-

cional. Por ter sido uma ofensiva em solo paquista-

nês sem a autorização desse país, viola principalmen-te o princípio da soberania dos Estados.

Como membro da ONU, outra infração

norte-americana foi o não respeito às normas de Direitos Humanos, cujo princípio básico é o direito à

vida, como bem destaca Paulo Luiz de Toledo Piza,

professor da GVLaw. Para ele, o direito ao julga-mento também é violado pelos norte-americanos.

Contudo, o Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon,

declarou que: "A morte de Osama Bin Laden, anun-ciada pelo presidente Obama, na última noite, é um

momento divisor de águas em nossa luta global

comum contra o terrorismo". Na mesma linha, serviu de alívio e reafirmação para diversos representantes

internacionais.

Ao mesmo tempo, a ofensiva norte-americana contra o terrorista traz uma problemática

maior do que os princípios da lei, pois envolve patri-

otismo, a moral e a ética não só do povo estaduni-dense, mas também da civilização ocidental. Ou seja,

a morte de Bin Laden nos mostra ainda a fragilidade

de normas de Direito Internacional. Em matéria do site Consultor Jurídico, o presidente da Comissão

Nacional de Relações Internacionais da Ordem dos

Advogados do Brasil, Cezar Britto, releva que há a predominância da concepção da “Teoria Bush”, cuja

idéia é que: “para combater crime, tudo é possível,

inclusive violações a normas internacionais”. Ele ainda conclui que: "a não submissão à legislação dos

tribunais internacionais e o ato patriótico formam um

sistema de auto-proteção dos EUA". A decisão de não divulgação de imagens da

morte do terrorista, como exemplo do auto-sistema

norte-americano, gerou ceticismo de grande parte do mundo, principalmente do Oriente Médio. Com a

justificativa de não incitar grupos terroristas, o go-

verno dos EUA aumentou a insatisfação quanto à arbitrariedade das suas decisões, como de declarou

Ismail Haniyeh, líder do movimento palestino Ha-

mas: "Se esta notícia é verdade, pensamos que se trata da continuidade da política de opressão ameri-

cana baseada no derramamento de sangue dos árabes

e dos muçulmanos". Já o padre Frederico Lombardi, porta-voz do vaticano, criticou a polêmica comemo-

ração dos norte-americanos à morte do terrorista.

Para ele, não deviam se alegrar, pois há a "responsabilidade de cada pessoa perante Deus e

homens". Espera ainda que: "não seja uma ocasião

para mais ódio, mas para paz." A segurança internacional vive um momen-

to problemático, pois se questiona como será a reper-

cussão da morte do principal articulador do Terroris-

mo Internacional. Em pronunciamento oficial após a

morte de Bin Laden, Obama fala ao povo norte-americano como se a morte do terrorista fosse um

ato derradeiro do terrorismo internacional. Contudo,

o ato do governo americano pode incitar outras célu-las da Al-qaeda a promover atentados contra seu

próprio território e aliados. A imprevisibilidade do

terrorismo, portanto, põe em xeque o futuro da segu-rança internacional.

ANÁLISE DOS FATOS: MORTE DE OSAMA BIN LADEN E O TERRORISMO

INTERNACIONAL NO PÓS-11 DE SETEMBRO

JAN MARCELL . Mestrando em Relações Interna-

cionais (UEPB ) e acadêmico da Faculdade de

Direito em João Pessoa (UFPB).

Por: Jan Marcell

Page 5: Abril 2012

5

IMAGEM DO MÊS @TRIBUNAJUSTICA

CAVALCANTI

RAMON

O utilitarismo é o princípio hegemônico na contemporaneidade. Com o estabelecimento do primado da técnica, depois da Revolução Industrial,

o valor dos objetos, das ideias e das pessoas passou a ser determinado, em

grande medida, pela utilidade e pela aplicabilidade imediata. Nesse contexto, a Literatura, como a Filosofia e as demais artes, foi, sistematicamente, desafiada

a justificar sua existência e sua continuidade, com fundamento em algum uso

objetivo, verificável pelos métodos tecnocientíficos. O literário, em sentido amplo, nunca deixou de ser buscado pelas pessoas, como uma necessidade,

apesar das contestações utilitaristas. A obra literária é um constructo que, por

meio, principalmente, de sua estrutura e de seu significado, exerce poderosa função humanizadora nos indivíduos.

Malgrado a Literatura consista, ao mesmo tempo, em uma forma de

expressão e em um meio de conhecimento, o aspecto que define o literário é sua condição de constructo, com uma estrutura e com um significado integra-

dos. A obra literária pode comportar qualquer conteúdo, desde que esse esteja

ordenado e articulado de maneira particular, caracterizada pela exploração intensa dos meios expressivos de uma língua. Diferentemente do que muitos

pensam, o objeto da obra literária não é, necessariamente, a ficção, como é

possível verificar em obras memorialistas, como Minha formação e Baú de ossos, ou em ensaios, como Os sertões e Casa-grande & senzala, todos, de

modo inequívoco, detentores de um nível elevado de literariedade, em decor-

rência da maneira como são estruturados. Concebido de forma ampla, o literário pode manifestar-se não ape-

nas por meio dos gêneros tradicionais, como conto, romance, poesia, mas tam-

bém por filmes, por telenovelas, por músicas ou por outros modos. De acordo com a opinião expressa por Antonio Candido, no ensaio “Direitos humanos e

literatura”, embora não se deixem de reconhecer as especificidades de cada linguagem, há literariedade nessas manifestações, inclusive, porque usam, em

sua elaboração, a palavra organizada. O teatro, de forma geral, filmes como

Laranja mecânica, em que há intensa estilização da linguagem verbal, assim

como músicas de compositores como Caetano Veloso, Chico Buarque e Arnal-

do Antunes, corroboram a ideia de que o literário permeia, além da Literatura

em sentido estrito, outras formas de expressão humana. A Literatura, em todas as suas maneiras de existência, humaniza as

pessoas, mormente por causa da estrutura que a caracteriza, daquilo que Anto-nio Candido denomina “força da palavra organizada”. A obra literária, como

objeto construído, transfigura a realidade e permite aos indivíduos que travam

contato com ela experimentar algo que poderia ser chamado de experiência concentradora de vida. Não menos importante, na efetivação da função

humanizadora da Literatura, é a contribuição dela à capacidade de os

seres humanos representarem e comunicarem suas subjetividades, bem

como a realidade, conforme eles a assimilam. A Literatura humaniza, por-

que, ao mesmo tempo, potencializa a vida e porque torna mais acessível a

complexidade do real. Em virtude do efeito humanizador exercido pela Literatura, Antonio

Candido considera que o acesso a ela deveria ser um direito humano. Na medi-

da em que a busca do literário, da fabulação, é uma necessidade perceptível em todos os seres humanos, a fruição da Literatura deve ser garantida. Essa busca

comum a todos é explicável, pelo fato de que a ampliação da capacidade de

representação da realidade e de apreensão da complexidade da existência con-fere às pessoas meios essenciais à consecução da felicidade. Essa proposta

coaduna-se com a tendência de reconhecimento de que o que deve ser concebi-

do como necessidade humana primordial ultrapassa os aspectos meramente materiais que possibilitam a sobrevivência do organismo biológico do ser hu-

mano.

As possibilidades que o contato com a Literatura oferece aos indiví-duos, as quais apresentam riscos e perigos, como a vida de que ela é imagem,

são inúmeras. Sem distinção de classe social ou de idade, a experiência do

literário, em suas amplas possibilidades de manifestação, é uma necessidade dos seres humanos, o que decorre do efeito humanizador que a obra literária,

como objeto construído, provoca neles, por meio de sua forma de estruturação. O referido efeito, por constituir um meio essencial à realização plena do ser

humano, deve ser considerado um direito fundamental, garantido a todos indis-

tintamente.

Ramon Limeira Cavalcanti de Arruda. Bacharel em Filosofia pela

UFPB. Oficial de Chancelaria.

O DIREITO À LITERATURA

Matar só não é desumano quando a vida sacri-

ficada menos desumana for.

Ele merecia ter sido julgados pelos seus cri-

mes e não ser motivo de festa por sua morte...

A morte de Osama Bin Laden é um exemplo

típico de se fazer um mal necessário a fim de

assegurar um bem maior.

“Olho por olho, World Trade Center por Bin

Laden. É ou não é uma guerra de símbolos?”

A alegria regada de sangue, deixa de lado os

D.Humanos, fato lamentável.

além da arbitrariedade do ato, é revoltante a

felicidade burra do povo mostrada na imagem.

ACESSO: 09 DE JUNHO DE 2011

Page 6: Abril 2012

DIREITO

SABER

MATHEUS CHAVES. Acadêmico da Faculdade de

Direito em João Pessoa (UFPB).

6

João pessoa, 11 de abril de 2011

Idas a bares e restaurantes são momentos, em geral, marcados

pela descontração e tranquilidade. Entretanto, algumas práticas nestes

locais despertam dúvidas e questionamentos, a exemplo da cobrança

de gorjeta, taxa de serviço, ou o popular "10%", bem como a sua obri-

gatoriedade.

As gorjetas encontram previsão legal no caput do artigo 457

da Consolidação das Leis do Trabalho, que destaca que

"compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efei-

tos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador,

como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber". O parágra-

fo terceiro do referido artigo também destaca que é considerada

"gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao

empregado, como também aquela que for cobrada pela empresa ao

cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada à

distribuição aos empregados".

Analisando os citados dispositivos legais, a doutrina do direito

do trabalho entende que por opção de política legislativa a gorjeta é

considerada como parte do salário, mais precisamente da remuneração.

Entende-se também que esse artigo é importante na proteção do direito

dos trabalhadores, entretanto, não vincula, nem obriga o consumidor a

pagar gorjeta, mas se este o fizer, diretamente a quem o atender ou

indiretamente por meio de cobrança do estabelecimento, esta gratifica-

ção deve pertencer aos empregados e não aos empregadores.

Quanto à cobrança obrigatória aos consumidores, entende-se

que há ofensa clara ao princípio da legalidade, inscrito no inciso II, do

artigo 5º da Constituição Federal, que manifesta que "ninguém será

obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de

lei". Tal cobrança também é considerada abusiva, implicando em in-

compatibilidade como Código de Defesa do Consumidor que veda

práticas e cláusulas abusivas nas relações de consumo.

No que diz respeito ao salário dos trabalhadores que recebem

pagamento variável, sejam por comissões, porcentagens, prêmios ou

gorjetas, a Constituição Federal de 1988 trouxe como inovação para a

ordem jurídica nacional: o inciso VII do artigo 7º que estabelece a

"garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem

remuneração variável". Ou seja, os empregados, ainda que não tenham

salário fixo, possuem uma garantia mínima salarial.

Corroborando a não obrigatoriedade do pagamento das gorje-

tas pelos consumidores, inúmeras decisões judiciais ratificam estes

entendimentos. Nestas circunstâncias, reforçamos a não obrigatorieda-

de do pagamento de gorjeta aos garçons pelos consumidores. Entretan-

to, sendo possível, exercitemos nossa cortesia e façamos sim o paga-

mento das taxas de serviço, pois é delas que se valem os funcionários

de bares e restaurantes para complementar seu (geralmente ínfimo)

salário.

A NÃO OBRIGATORIEDADE DA GORJETA E OS GARÇONS

Tenho acompanhado toda essa discussão sobre o corte de investi-

mento por parte da secretaria de cultura da Paraíba, capitaneada por

Chico César, ao São João de Campina Grande e os tais “forrós de

plástico”. Mais do que observado, tenho me espantado com alguns

posicionamentos de parte da imprensa paraibana, principalmente no

meio eletrônico. Decerto que poucos são os segmentos comunicativos

que gozam de imparcialidade, contudo há de se resguardar um míni-

mo de bom senso para avaliar a questão.

Muita gente falou que o secretário/músico catoleense queria impor,

tal qual um ditador, o gosto dos paraibanos, reforçando a ideia de que

essa intransigência acarretaria em uma diminuição do potencial lucra-

tivo do evento.

É importante lembrar que o governo não pronunciou que vai deixar

Campina Grande e seu maior evento cultural, que gera gordas rendas

através do turismo, à míngua. Somente foi dito que o parco dinheiro

de nosso pobre Estado não será utilizado para contratar bandas de

“forró” que se distanciam bastante do grave do zabumba e do agudo

do triângulo e cobram valores exorbitantes por cada apresentação.

A produção musical brasileira, em tempos negros de censura e

opressão, resistiu poeticamente, propagando os mais belos ideais de

liberdade. O tempo passou, a Constituição veio e a liberdade tão so-

nhada está aí. Mas e agora? O Estado deve ser absenteísta a ponto de

não se importar com a identidade cultural do seu povo? Sinceramente,

não é possível entender a opinião de quem carrega a bandeira dessa

liberdade musical desenfreada e desse “new forró”, que faz apologias

descaradas à coisificação da mulher e ao alcoolismo. São apenas pas-

tiches dessas bandas estrangeiras, que estão bem distantes do nosso

forró verdadeiro.

A tese do respeito aos mais diversos estilos é válida e essencial

para a consolidação do ideal democrático da sociedade. Todavia, o

Estado não pode fechar os olhos para a sua cultura e tem todo direito

de direcionar seus investimentos no sentido da valorização do seu

povo, das suas raízes e tradições.

Antes que se monte um cavalo-de-batalha em torno desse corte,

atitude corrente de uma oposição tradicionalmente panfletária e plas-

tificada tal qual o forró em questão, é bom lembrar-se da difícil situa-

ção financeira em que se encontra nosso orçamento. Não é só a preo-

cupação com a preservação cultural que está em jogo, mas sim a vida

financeira de um Estado que não anda lá bem das pernas.

Foi anunciado que o FENART, evento realizado anualmente no

Espaço Cultural (que em 2010 homenageou Sivuca) foi cancelado

para esse ano. Motivo: o governo passado não quitou a dívida com os

artistas que fizeram os shows do evento. Se nem mesmo um soldado

de reserva cultural mais tradicional como é o FENART não vai ser

realizado devido a questões financeiras, quem dirá patrocinar as ban-

das de forró plastificado/estilizado que, além de publicar o total desa-

pego às raízes, nos brinda com belíssimos versos como:

“Cachaça, cachaça, cachaça eu te amo

Cachaça, cachaça, cachaça eu te adoro

Cachaça, cachaça você é meu vício

Preciso te dizer que sem você eu não vivo.”

Aceitar novas tendências não significa virar refém de um único

estilo musical. Todos os ritmos que agradem podem ser aceitos. Mas

o Estado tem direito sim de forjar o aperfeiçoamento cultural do pró-

prio povo, como forma de educá-lo. Como bem falou Ariano Suassu-

na, quando perguntado sobre a polêmica: “hoje em dia, o papel do

Estado equivale ao papel da Igreja, no sentido de criar condições para

os verdadeiros artistas.‖

Caso contrário, em breve esqueceremos nomes como Domingui-

nhos, Santana, Flávio José, Geraldo Azevedo, Os Três do Forró,

Nordestinos do Ritmo, Aldemário Coelho, Alcymar Monteiro,

Aleijadinho de Pombal, Pinto do Monteiro, entre outros.

CHICO CÉSAR, A PROTEÇÃO DA CULTURA E OS DISCURSOS PLASTIFICADOS

REGIONAL

HEITOR HENRIQUES . Acadêmico da Faculdade

de Direito em Guarabira (UEPB).

Por: Matheus Chaves

Por: Heitor Henriques

Page 7: Abril 2012

ORDEM

7

YURE

TENNO

A relação política e pública entre dois sujeitos políticos que

representam interesses, pontos de vista e ideologias antagônicas ou

diferentes, que dividem o mesmo espaço público, de onde emanam as

decisões, torna-se deficiente quando ocorre o fechamento de um sujei-

to em relação ao outro, fenômeno esse conhecido como “reificação”

entre os sujeitos políticos que compõem o debate público.

Isso ocorre quando o sujeito “A” não reconhece o sujeito “B”,

não tenta compreender nem entender as razões e contrarrazões das

propostas. O sujeito “B” torna-se para o sujeito “A”, opaco e incom-

preensivo. Axel Honnet concebe esta relação como um estado de au-

tismo: pois assim, como no mundo dos autistas, o outro não é visto

com a devida empatia humana, de seres que se reconhecem como

iguais e que por isso possuem a mesma dignidade. Para ele “a reifica-

ção pressupõe que nós nem percebamos mais nas outras pessoas as

suas características que as tornam propriamente exemplares do gênero

humano: tratar alguém como uma “coisa” significa justamente tomá-la

(o) como “algo”, despido de quaisquer características ou habilidades

humanas.”

Esse modo de proceder cria a necessidade de segregação e a

tentativa de criar fronteiras bem definidas, como se nada fosse idênti-

co entre as duas perspectivas. É ilustrativa a predisposição que temos

de tentar colocar politicamente todo mundo no saco da esquerda ou da

direita. Em termos definitivos não temos critérios para a decisão, mas

os efeitos psicológicos da rotulação é sentido por quem sofre e por

quem age de acordo com a mesma.

A grande questão que defendo, é que o fechamento ao outro

também implica no fechamento de dimensões do diálogo que são de

extrema importância para as ponderações e os convencimentos, que

aquilatam as duas versões da história com o mesmo tratamento refle-

xivo. Significa o fechamento a uma perspectiva participante no diálo-

go.

Assim como um dado viciado tende a determinados resulta-

dos, também o diálogo entre os sujeitos reificados tende a certas con-

clusões. O discurso sofre uma interferência que se torna independente

das capacidades do orador. E isso é venenoso para a democracia, pois

decisões que independem (ao menos em parte) dos discursos são em

maior ou menor medida voluntarista. A democracia tem a vantagem

de proporcionar decisões politicas por meio do embate dos melhores

argumentos e dos argumentos moralmente adequados à comunidade.

E um reconhecimento apenas institucional, ou seja, a inclusão no de-

bate político ou o reconhecimento de voz no debate, não é uma garan-

tia de reconhecimento psicológico da comunidade (linguística), que

pode continuar surda ao argumento, ignorando-o. Significa está no

poder de argumentar, mas não com o poder de argumentar.

É necessário que se esclareça que na política podem ser trava-

das relações de força, ou simples negociações, sobre o qual é indife-

rente a figura reificada, mas há assuntos que necessitam de um trata-

mento diferenciado. Sobre isso, é ilustrativo o debate sobre as células

tronco, a pornografia, o terrorismo, o Estado de Bem-Estar etc. São

assuntos que pressupõem uma condição argumentativa não epistêmi-

ca, que é a possibilidade de se orientar pelos motivos do outro. O que

Honneth tenta deixar evidente é isso, que “nós só podemos assumir a

perspectiva do outro depois que previamente reconhecemos no outro

uma intencionalidade que nos é familiar – isto, como tal, não é um ato

racional, nem uma tomada qualquer de consciência de motivos, mas

realização pré-cognitiva do ato de assumir uma determinada postura.”

O mundo reificado por excelência é o mundo Hobbesiano,

pois ele afirmava: homo homini lúpus, já que, segundo ele, um sujeito

é opaco ao outro. As sujeições históricas que influenciaram a vida de

Hobbes corroboram com essa perspectiva. A Inglaterra de sua época

foi envolvida por uma práxis “reificantes”, como também foi à práxis

nacionalista do século XIX com as guerras de expansão napoleônicas.

Como assevera Honneth sobre o ideia de guerra: “a finalidade da des-

truição do adversário se autonomiza a tal ponto, que mesmo na per-

cepção de pessoas não participantes (crianças, mulheres) gradativa-

mente se perde toda a atenção para suas características humanas; no

final, todos os membros dos grupos que presuntivamente são atribuí-

dos ao inimigo são considerados apenas como objetos inanimados,

coisificados.”

Em um mundo reificado ocorre isso, não sabemos quem o

outro é, vemos o que ele faz, vemos se oporem contra nós, vemos eles

reagindo contra nossas ofensivas, mas não perguntamos, não nos en-

volvemos com sua humanidade e com a humanidade de nossas razões.

A afecção existencial possibilitada pelo reconhecimento elementar de

que nos fala Honneth impossibilita a atitude ética que deveríamos ter.

Fechar-se ao outro nos coloca na complicada situação de pre-

sunção sobre o outro, como não nos envolvemos pelas entrelinhas de

uma abertura existencial que seria compartilhada, não podemos fazer

outra coisa senão absorver as ações de uma “coisa”, presumindo todas

as razões, essa é a perspectiva do observador e não do partícipe. De-

mocracia se consolida com essa aprendizagem de participação, que só

se realiza na abertura existencial, na (re-)educação sentimental para o

discurso heurístico e não para o erística.

A presunção pode nos levar ao maniqueísmo improprio e des-

proporcional, que poderia ser resolvido apenas perguntando ao “auter”

quem ele é e o que propõe. Ocorre toda uma estruturação de pré-

conceitos (no sentido hermenêutico) sem que esses pré-conceitos se-

jam construídos com a participação desses sujeitos. É a figura do índio

descrita pelo europeu sem se perguntar o que o índio pode contribuir

para sua conceituação.

Em termos de danos à práxis democrática, o perigo se realiza

pelo déficit de racionalidade nas decisões, como foi dito. O déficit é

mehor compreendido com a perspectiva do problema da verdade. A

verdade lógica não coincide com a verdade psicológica. Para se con-

vencer alguém, não podemos usar apenas a lógica. Porque o homem

não é apenas feito de lógica, mas também de paixões. Então para con-

vencer o homem é necessário um envolvimento completo do ser. O

envolvimento do homem com seu mundo “se realiza no reconhecer

(Anerkennen) e conhecer (Erkennen), de tal modo que por

“reificação” devemos entender uma violação contra esta ordem de

precedência” (Honneth). A teoria do discurso retórico mantem sua

base não há apenas no logos, mas no Ethos e no Phatos. Assim, pode

ser incluído na dimensão discursiva o reconhecer, por meio da pers-

pectiva do Phatos e do Ethos, que são respectivamente uma atitude

ética em relação a uma abertura participativa da mensagem e uma

atitude ética sobre o sujeito que discursa, ambas posições complemen-

tares da abertura existencial da linguagem para uma perspectiva parti-

cipante sobre o texto. Seria necessária uma explanação maior sobre as

relações não-epistêmicas com o Texto, que abrem variações interpre-

tativas em nível epistêmico (locucional) e não-epistêmico

(ilocucional). Essas variações ou desentendimentos têm potenciais

perigosos na democracia.

Em termos de política democrática a perda do elemento racio-

nal da democracia, a luta dos melhores argumentos, traz a perda de

sua legitimidade, que acarretaria num voluntarismo das decisões da

maioria e de seus representantes. E essa forma de governo tem outro

nome, ela se chama Plutocracia, e isso independe do grupo que esteja

governando. Portanto, as reflexões apontadas indicam um caminho

único de que em democracia não se pode esquecer o adversário, mas

compreender sua posição diferente e fazer com que o outro também o

compreenda, de modo a abrirem-se ambos, para as opiniões diferentes

que a retórica politica poderá permitir.

PRATICANDO A ―INCLUSÃO DO OUTRO‖: UMA OBSERVAÇÃO QUANTO A

RETÓRICA DOS DEBATES POLÍTICOS

YURE TENNO: Acadêmico da

Faculdade de Direito em João

Pessoa (UFPB).

Page 8: Abril 2012

ESPECIAL

REPORTAGEM

I. ISÍDIO & Y. TENNO

8

A tradicional Faculdade de Direito da Paraíba

responde hoje pelo nome de Centro de Ciências Jurídicas da

UFPB e aninha dois cursos: um no campus I da Universida-

de, em João Pessoa, outro no

“campus virtual” de Santa Rita,

que funciona provisoriamente no

Centro de nossa capital. Estes

dois cursos conseguem, de ma-

neira muito peculiar, fundir histó-

ria e contemporaneidade, tradici-

onalismo e inovação. Mas hoje há

uma marca por ambos comparti-

lhada com tristeza: a má conser-

vação de suas instalações.

Situado por quase 60 anos na Praça dos Três Po-

deres, em João Pessoa, o curso de Direito foi transferido para

o campus I da Universidade Federal da Paraíba, no qual

passou ocupar um majestoso edifício, projetado em linhas

arquitetônicas visivelmente modernas, de uma beleza sóbria, elegante-

mente emolduradas pelos vestí-

gios da Mata Atlântica. Mas a

beleza das linhas modernas e o

frescor da construção – motivo

de admiração aos transeuntes –

conspiram para esconder os

graves problemas estruturais

por que passa o edifício.

Muito mais do que os

corredores estreitos ou o péssi-

mo isolamento termoacústico

das salas, outros problemas

parecem mais graves aos olhos

do corpo discente, usuário mais

direto e cativo das instalações.

Há não muito, o ventilador de

uma das salas caiu em cima de

uma carteira, pegando fogo. Na

ocasião, ninguém saiu ferido: o

estudante que comumente ocupava a carteira, por sorte, havia faltado

à aula. Mas não são apenas os eventos imprevisíveis que põem risco à

integridade física dos estudantes. As últimas chuvas revelaram vaza-

mentos em diversos pontos do teto, fragilizando as placas de gesso

que, úmidas, rachadas e emboloradas, ameaçam desabar. Os alunos,

felizmente, agora não correm mais tantos riscos: uma funcionária –

designada especialmente para este fim – posiciona-se no pátio e, vez

por outra, prestimosamente alerta um estudante: “Ei menino, saia daí

que o teto vai cair!” Ainda assim, o transeunte continua a admirar as

invejadas linhas modernas do novíssimo prédio: “Esses juristas são

mesmo privilegiados...”

Nos últimos dias, alunos desse mesmo curso também foram

surpreendidos pela repentina retirada de dezenas de volumes da bibli-

oteca. Ficaram sabendo depois, por vias trans-

versas, que os livros retirados tinham como

destino a biblioteca do curso-irmão de Santa

Rita, no qual seria realizada, muito em breve,

uma visita de avaliadores do MEC (Ministério

da Educação e Cultura). Um dos objetivos da

visita seria conferir se as instalações do curso

(incluindo a biblioteca) obedecem a condições

mínimas de funcionamento.

Do já minguado acervo com o qual se

contentava o estudante de Direito de João Pes-

soa saíram, pois, vários livros. Eles foram “emprestados” à ainda mais

precária biblioteca do curso santa-ritense. Alguns deles teriam sido,

aliás, comprados havia quase dois anos, tendo como destino a referida

biblioteca, mas lá não haviam chegado devido à falta de um ambiente

adequado para abrigá-los. Em síntese: a biblioteca do curso de João

Pessoa ficou ainda menor, para que a de Santa Rita pudesse ao menos

começar a existir. E não obstante os estudantes de lá já tivessem pas-

sado quase dois anos prejudicados pela sua inexistência, a biblioteca

tinha que existir – ao menos agora, aos olhos criteriosos

dos avaliadores do MEC.

Tornar-se-ia maçante a escrita ou leitura de um longo texto

que versasse sobre a fundamental importância das boas

bibliotecas nos cursos de Direito. Análogo a este seria o

trabalho de um agrônomo que resolvesse tecer considera-

ções a respeito da importância da água nas plantações de

abobrinha. Eis a ululante obviedade em tintas de compara-

ção grosseira: a leitura está para o bom jurista assim como

a água está para o vegetal. A nossa Faculdade de Direito,

como centro de construção jurídico-intelectual de qualida-

de, deve ter sua biblioteca tal qual um santuário: um espaço amplo

onde seja possível o acesso silencioso aos melhores títulos da doutrina

nacional e estrangeira. A cada visita às nossas bibliotecas, seja em

João Pessoa ou em Santa Rita, o estudante de Direito da UFPB pode,

com tristeza, constatar a abissal diferença entre o dever ser e o ser. Ao

som de discussões exaltadas, vozes incessantes e um concerto de ruí-

dos que oscila de uma tranquila sonoridade vinda das estantes a um

agudo som do balançar das mesas e cadeiras, os alunos são obrigados

a buscar por conhecimento em meio ao escasso e antiqüíssimo acervo

bibliográfico que não corresponde com a demanda doutrinária moder-

na. E todas as reivindicações por melhorias na educação - sejam elas

pela educação básica ou superior, feitas a qualquer patamar da admi-

nistração – até aqui têm recebido uma mesma resposta: abobrinhas.

O CENTRO ARRUINADO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

SORTE:

Cardeira

queimada

após a

queda de

ventilador

DESCASO: Teto da

Faculdade de Direito de

João Pessoa com

infiltrações sérias depois

de menos de dois anos de

inauguração .

REPENTINO:

Ação de retirada dos

livros da biblioteca

do CCJ de João

Pessoa, no início da

manhã. Foto: Luana

Page 9: Abril 2012

9

João Pessoa, 28 de abril de 2011

Ao nascer, o curso de Santa Rita herdou o antigo prédio da

Faculdade de Direito, uma construção em que se respira história. Por lá

passaram grandes nomes da jurisprudência, da cultura, da política

(alguns raros, de todas estas), tais como Luiz Augusto Crispim, Tarcísio

Burity, Ronaldo Cunha Lima, José Maranhão, Dorgival Terceiro Neto,

Carlos Coelho e uma vasta lista de notáveis. Em visita recente às instala-

ções do novo curso de Direito, pôde-se constatar que, ao menos na anti-

ga biblioteca, não se pode mais respirar história. Aliás, lá não se pode

respirar: as goteiras, em pingar constante por sobre centenas de livros

históricos, formam uma poça que toma todo o chão da sala. Alguns

exemplares já se apresentam completamente tomados pelo bolor; outros,

depois de tanta resistência ao tempo e de tanto serviço prestado a tantos

muitos valorosos juristas, jazem ali, condenados pela umidade, pelo ar

miasmático, pela indiferença

de uma má administração.

O curso de Direito de

Santa Rita, como já se perce-

be, guarda algumas caracterís-

ticas bem diversas de seu

“irmão mais velho” pessoense. Nascido há apenas dois anos, deveria

funcionar em um campus na cidade vizinha, Santa Rita, cuja construção

ainda não saiu do papel. Não deixou, entretanto, de oferecer vagas aos

vestibulandos – nas linhas do Plano de Reestruturação e Expansão das

Universidades Federais (REUNI) – e passou a funcionar, provisoriamen-

te, no antigo prédio da Faculdade de Direito. Cerca de três meses antes,

porém, este mesmo prédio havia sido desocupado, por falta de condições

estruturais, pelos estudantes do curso que passou a funcionar no campus

I da UFPB.

Um dos principais objetivos pretendidos com a criação de um

curso jurídico em Santa Rita foi o de descentralizar as atividades educa-

cionais da capital, bem como facilitar o acesso - sobretudo dos santa-

ritenses – a um curso geralmente tido como “elitizado”. Seja pela maior

oferta de vagas, seja pela

melhor distribuição geográ-

fica delas, uma quantidade

bem maior de alunos teria a

oportunidade de cursar Di-

reito em uma respeitada e

bem avaliada instituição

federal. Até o momento, a

implantação do curso pas-

sou ao largo de um dos seus

objetivos primordiais, pois

em muito pouco vem bene-

ficiando a cidade para a

qual foi projetado. Dos

alunos atualmente matricu-

lados no curso, menos de

cinco por cento são de Santa

Rita. Apesar de contraditó-

rio, o número não represen-

ta um problema tão grave,

uma vez que não é comum

nem desejável destinarem-

se todas as vagas a estudan-

tes de uma mesma naturali-

dade. O problema está em

negar à cidade de Santa Rita

todos os benefícios sociais,

educacionais e econômicos

que a implantação de um

campus universitário traria

consigo. Não se trata apenas

de poder ostentar o belo brasão da Universidade Federal da Paraíba, mas

sim de ter a população contemplada, por exemplo, pelos projetos de

extensão desenvolvidos pela Academia e pelo próprio florescimento

intelectual que a acompanha.

O prédio onde funcionará o curso, quando for finalmente

transferido para a sua cidade-sede, teve sua construção iniciada recente-

mente – quase dois anos após a admissão da turma pioneira. A falta de

instalações adequadas não foi empecilho à oferta de vagas aos vestibu-

landos, feita a toque de caixa para dar prosseguimento à política do

REUNI e atingir as metas por ele traçadas. Dentre estas metas, reside a

intenção de frear a atual explosão de cursos superiores, grande parte de

baixíssima qualidade, por que passa nosso país. Até aqui, muito deve-

mos ao rigor, felizmente mantido, dos concursos públicos e dos vestibu-

lares, pois não fosse o notável engajamento e qualificação do corpo

docente do novo curso de Direito, somados às potencialidades de seu

alunado, o REUNI teria indubitavelmente falhado em seu propósito de

barrar tal explosão. E pior, auxiliaria o nefasto fenômeno ao criar um

curso de qualidade questionável sob a justificativa de ampliar, a todo

custo, a oferta de vagas em universidades federais.

O primeiro curso de Direito da Paraíba, vetusta Faculdade

donde frutificaram os mais ilustres juristas de nossa terra, está prestes a

atingir a emblemática marca de 60 anos. Em meio à preparação das

devidas solenidades e eventos comemorativos, deve subsistir a vergonha

de brindar à nossa Casa de Ensino enquanto ela, literalmente, desaba

sobre nossas cabeças. Há também a esperança de que as vozes miúdas,

vindas da indignação do corpo discente de hoje, possa reverberar em

vozes mais fortes, igualmente indignadas, do corpo discente de ontem.

IGOR ISÍDIO E YULGAN TENNO: Acadêmicos da Faculdade de Direito em

João Pessoa (UFPB).

Fotografia: YULGAN TENNO

―SE VIRA‖ "Problemas das mais diversificadas

naturezas deixam a uniformidade do

prédio comprometida, somado à inani-

ção intelectual que a nossa biblioteca,

infelizmente, nos proporciona. Este

último problema causa certa indignação

por parte dos discentes, que se vêem

obrigados a disputar os pouquíssimos

livros lá existentes ou buscar outros

meios para suprir um serviço que deve-

ria ser prestado, com eficiência, pela

biblioteca setorial do nosso CCJ, a qual

ainda “compartilha” sua defasagem com

o curso de Santa Rita. E o problema não

se resume apenas à falta de livros, por-

que a própria acessibilidade física (ou

ausência dela) não nos oferece condi-

ções. Mas como fica a situação daquele

que não tem condições financeiras para

comprar livros? Como fica a situação

daquele que não tem acesso aos livros

de outras instituições? É, o famoso “se

vira” cabe bem ao nosso decorrer aca-

dêmico."

NATHAN WANDERLEY: Acadêmico da

Faculdade de Direito em João Pessoa

(UFPB).

I. ISÍDIO & Y. TENNO

REPORTAGEM

ESPECIAL

―(...) não fosse o notável engajamento e qualificação do corpo docente do curso

de Direito de Santa Rita, somados às potencialidades de seu alunado, o REUNI

teria indubitavelmente falhado em seu propósito‖

INDIFERENÇA: Livros da antiga biblioteca de Santa Rita (foto

acima) embolorados no ambiente úmido do local, onde centenas de

exemplares se encontram da mesma forma. Embora uma nova bi-

blioteca provisória tenha sido instalada na Faculdade, os livros

históricos continuam perecendo nessa condição.

Page 10: Abril 2012

OPINIÃO

10

TRIBUNA—Recentemente, foi aplicado o Incidente

de Deslocamento de Competência (IDC) da Justiça

comum para a Justiça Federal ao caso Manoel Mat-

tos, reavivando a discussão sobre a constitucionalida-

de do IDC. Qual sua opinião sobre o assunto?

Realmente o caso do IDC é bastante emblemá-

tico e relevante em termos de concretização desse novo

instituto, na análise dos fatos que caracterizaram o ho-

micídio de Manoel Bezerra de Mattos Neto, advogado e

Vereador pernambucano, que foi assassinado, o que leva

a crer, em razão de sua pública e conhecida atuação

contra os grupos de extermínio.

O que o Superior Tribunal de Justiça entendeu

foi que havia uma reconhecida incapacidade das autori-

dades locais, para oferecer respostas efetivas para a

apuração desse crime. Então, foi a primeira decisão de

deslocamento de competência. Esse instituto busca fazer

com que a Justiça brasileira, em especial, o Estado brasi-

leiro, dê respostas efetivas aos tratados internacionais de direitos hu-

manos, em que o Brasil se compromete a internamente punir a grave

violação a esses direitos.

Acontecia que o Brasil assinava tratados internacionais,

comprometendo-se, no plano global, a punir tais violações, e não ti-

nha, internamente, um instituto, para se fazer valer dessa situação.

Então, a Emenda n.45 de 2004 criou o IDC e permitiu que, havendo

inoperância da Justiça local, o deslocamento da competência se efeti-

vasse para a Justiça Federal.

Esse instituto é ainda analisado no Supremo Tribunal Fede-

ral, o que sustenta que o IDC seja inconstitucional, mas o que tem de

se verificar é o seguinte: para o STJ, a questão está superada. O IDC é

constitucional, porque ele conheceu, superou a preliminar e julgou o

mérito. O IDC número 2, julgado no dia 27 de outubro de 2010, é

então um tema muito recente e novo. O que é ainda analisado pelo

Supremo são algumas ADI’s, em que se alega que o IDC é inconstitu-

cional com relação a duas questões: primeiro, com relação ao princípio

do Juiz natural. Dizem que o IDC seria inconstitucional, porque se

desloca a competência do Juiz que julgaria aquela questão. Eu não

vejo problema algum no deslocamento, afinal, o Juiz Federal já é o

juízo pré-constituído, então, não há problema.

O que pode desembocar em um questionamento do Supre-

mo, que é muito delicado, é se haveria necessidade da definição do

que é “grave violação aos direitos humanos”. Qualquer homicídio é

violação a esses direitos, mas que é grave violação? Então, o que se

poderia discutir é se haveria alguma afronta ao princípio da estrita

legalidade penal.

O STJ superou essa questão, mas o Supremo não a define. É

um estudo com uma potência indiscutível, no sentido de proteção aos

direitos humanos. O que se faz não é mandar a questão, para o STJ

julgar, eventualmente avocar o processo para o STJ. Não. É, perceben-

do a inoperância da Justiça Local, deslocá-la para a Justiça Federal.

O IDC número 1, que envolvia a Dorothy Stang, não foi

julgado procedente pelo Supremo, porque não havia inoperância. Aí se

encontra a relevância do caso Manoel Mattos, já que foi o primeiro a

ser julgado procedente e requerido o deslocamento para a Justiça Fe-

deral do Estado da Paraíba. Então, realmente, o instituto ganha uma

força muito grande com a decisão do STJ, e resta aguardar a apuração

dos fatos.

TRIBUNA—Qual o espaço de efetivação dos direitos sociais frente

aos novos paradigmas da interpretação constitucional?

Hoje, fala-se muito na concretização dos direitos sociais e

especialmente na questão de implementação de políticas públicas. Nós

poderíamos observar que existia uma tendência, cada vez mais forte

do Supremo, de afastar as alegações dos Estados e dos governantes, ao

dizer que não implementam políticas públicas por uma questão de

falta de dinheiro. Fala-se muito em reserva do possível, reserva do

possível financeiro.

O que eu tenho sentido são algumas decisões do Supremo,

principalmente uma recente do Ministro Celso de Mello, no Recurso

Extraordinário 482611. Discutia-se um projeto no Município de Flori-

anópolis, chamado “Projeto Sentinela”, pelo qual o Município se com-

prometia a proteger, de forma integral, a infância e a juventude. O

projeto não se implementava, o Município não executava o que havia

sido estabelecido, principalmente na proteção de crianças e de adoles-

centes vítimas de abuso sexual.

A alegação do Município era que eles não poderiam atuar em

razão de inexistência de dinheiro. O Ministro Celso de Mello foi fir-

me, ao estabelecer que essa alegação não é razoável, que existe uma

necessidade de atuação do Estado, que este deve preservar a ideia de

mínimo existencial. Mesmo inexistindo uma norma de caráter cogente,

ele deve cumprir política pública, deve implementar direitos sociais,

especialmente diante do assunto do artigo 5º, parágrafo primeiro, que

diz que os direitos fundamentais têm aplicação imediata.

Portanto, o Supremo vem dando contribuições muito impor-

tantes, relacionadas às questões de políticas sociais e também relacio-

nadas a questões ligadas a saúde, que envolvem o fornecimento de

medicamentos. Há uma tendência a firmar uma responsabilidade soli-

dária entre os entes federativos, para que se evite que o Município

jogue a responsabilidade para o Estado, este, para a União, e ninguém

faça nada. Há uma proposta de Súmula Vinculante, para que se estabe-

leça a responsabilidade solidária entre os entes federativos e até o

bloqueio de verbas públicas para a implementação de políticas públi-

cas para o fornecimento de medicamentos sem a observância da regra

geral da Precatória. Então, a reproposta de Súmula Vinculante número

4, de 2008, nesse sentido, demonstra que, realmente, o Supremo vem

sendo muito firme com essas questões e surpreendendo, inclusive

determinando o pagamento de remédios caros, cirurgias até fora do

país, dentro dessa perspectiva de direito à saúde.

PEDRO LENZA FALA À TRIBUNA Um dos mais conceituados constitucionalistas do Brasil comenta a constitucionalidade do Incidente de Deslocamento de Compe-

tência no caso Manoel Mattos e demonstra sua opinião sobre a atual perspectiva dos direitos sociais na doutrina constitucional.

―O STJ reconheceu

a incapacidade das

autoridades locais,

na apuração do caso

Manoel Mattos‖

Entrevista por: YULGAN TENNO e LEONARDO WRIGHT.

Acadêmicos da Faculdade de Direito em João Pessoa

(UFPB).

Page 11: Abril 2012

DIREITO vs DIREITO

11

O Direito está longe de ser um mundo

de unanimidades. Diferente das ciências exatas,

nas quais a existência de uma resposta correta

condena ao erro todas as demais, a Ciência do

Direito acolhe todos os entendimentos que ve-

nham acompanhados de uma argumentação plau-

sível. Existe, a propósito, uma vasta discussão

sobre se o Direito pode ou não ser definido como

Ciência, com argumentos razoáveis em ambos os

lados. E, em um ramo do saber tão permeado

pelas divergências, a análise das construções ar-

gumentativas faz-se tão importante quanto o exa-

me puro do fato em questão.

É por isso que, nesta edição, a Tribuna da Justiça

traz a opinião espontânea de dois grandes consti-

tucionalistas - Dr. Solon Benevides e Dr. Vidal

Serrano Júnior – acerca da aplicabilidade da Lei

da Ficha Limpa, aprovada em setembro de 2010.

A mesma pergunta foi feita, de forma muito dire-

ta, aos dois juristas: “O SUPREMO ACERTOU

AO DECIDIR QUE A LEI DA FICHA LIM-

PA NÃO SERIA APLICÁVEL ÀS ÚLTIMAS

ELEIÇÕES?” Eis as respostas, tão bem funda-

mentadas quanto divergentes, dos dois entrevista-

dos

Solon Benevides*

“EU ACHO QUE A DECISÃO DO SUPREMO ESTÁ

CORRETÍSSIMA. O art. 16 da Constituição Federal é muito claro,

trata-se do principio da anterioridade da lei eleitoral. Se a lei altera o

processo eleitoral, ela só pode entrar em vigor um ano depois, e ela

alterou exatamente no ano da eleição, ferindo o principio da anterio-

ridade da lei eleitoral. O processo eleitoral citado na Constituição é

abrangente, mas muitos querem restringir esse conceito, limitando-o

a alguns aspectos do processo eleitoral. Entendo que ele é abrangen-

te. Para o Supremo, o processo eleito-

ral compreende desde a alteração de

requisitos para o registro de candidatu-

ra, até, por exemplo, a forma de se

apurar os votos. Compreende, portanto,

qualquer etapa do processo eleitoral.

Preciso deixar claro que sou a favor da

lei da ficha limpa. Todos desejam ex-

purgar da vida publica os maus políti-

cos, aqueles que cometeram ilícitos;

contudo não se pode rasgar a Constitui-

ção. Na minha linha de raciocínio: a lei de ficha limpa é útil? Sim!

Está correta a decisão do Supremo de aplicar o artigo 16? Sim, pela

abrangência do processo eleitoral.

Entendo que a Suprema Corte poderia dar interpretação

conforme a Constituição Federal, com redução ou sem redução de

texto, em alguns dispositivos. Por exemplo: sobre a regionalização

de uma decisão no sentido de que torna inelegível o cidadão já a

partir de uma decisão colegiada em 2º grau, acho que fere o princi-

pio de presunção de inocência, o duplo grau de jurisdição. Se a

Constituição diz que ninguém será considerado culpado até o trânsi-

to final - e esse conceito não existe só em matéria penal - então você

tem direito de percorrer as instancias superiores para rever essa

decisão. Se a matéria for constitucional, até o STF, se for matéria só

eleitoral, até o TSE, e assim por diante.

Retroação da pena é mais absurdo ainda. A não retroação

da lei é em campo de direito punitivo e se aplica em qualquer seara,

desde que seja direito punitivo. Dizem que a questão de aplicação

de penalidades pela lei eleitoral é condição de elegibilidade, mas

não é. A lei complementar 64, em seu artigo 22, inciso XIV, diz que

“julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação

dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e

de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes

sanção de inelegibilidade” e essa é a redação dada pela própria lei

de ficha limpa. E o que é sanção? Sanção é punição, é pena! E se

disser que isso é só condição de elegibilidade, está errado.”

*Doutor em Ciências pela USP, professor de Direito

Constitucional na UFPB, procurador do Estado da Paraíba e

advogado.

Vidal Serrano Júnior*

“EU ENTENDO QUE NÃO HÁ INCONSTITU-

CIONALIDADE ALGUMA NA APLICAÇÃO DA CHAMADA

―LEI DA FICHA LIMPA‖ EM 2010, portanto, creio que a posi-

ção vencedora no Supremo Tribunal Federal, com apenas um voto

de diferença, tenha sido equivocada. A lei da ficha limpa, na verda-

de trata de inelegibilidade; são condições para as eleições e não para

o processo eleitoral. Portanto, não tem como se cogitar a aplicação

do Art. 16 da Constituição Federal,

pois ele fala sim em anualidade, mas

para legislações que alterem o proces-

so eleitoral.

Inelegibilidade é lei que

regula o conteúdo, a substância. São

condições para que a pessoa possa

viabilizar a candidatura, então não me

parece que esse dispositivo constituci-

onal que tenha se deslocado possa

servir de pano de fundo para a não

aplicação da lei na última eleição.

O processo eleitoral que aparece no artigo 16 fala de as-

pectos procedimentais, relacionado às inscrições da candidatura, a

impugnação da eventual candidatura, a formação dos pleitos, a apu-

ração, a formação das chapas, enfim, aspectos relacionados ao pro-

cesso e não à substancia das eleições e à condição de elegibilidade.

Na questão da elegibilidade, temos várias condições colo-

cadas pelo texto Constitucional, como, por exemplo, a idade, e de-

pois se criou mais algumas condições, que é a questão da ficha lim-

pa, a não condenação por colegiados, a não renuncia para se escapar

de eventual processo de perda do mandato. Há, na verdade, um

elastecimento do rol de causas que impedem as eleições.

A posição minoritária dos cinco ministros que perderam a

votação é a posição mais adequada. Como nas próximas eleições já

vai ter passado mais de um ano e o artigo 16 não poderá mais ser

aplicado, existirão cogitações de outra natureza. O principal argu-

mento daqueles que são contra a aplicação da lei da ficha limpa é a

questão da presunção de inocência. Eu acho inadequado tal argu-

mento, pois temos uma disposição específica, que é o artigo 14, §

9º, segundo o qual deve existir uma lei complementar que crie con-

dição de inelegibilidade considerando a vida pregressa do candidato.

Diante de tal disposição que autoriza esse tipo de legislação, não há

que se cogitar o uso das formas de inconstitucionalidade.”

*Doutor em Direito pela PUC-SP, professor de Direito

Constitucional na mesma casa e promotor de justiça em São

Paulo.

X

Entrevista por: LEONARDO WRIGHT. Acadêmicos

da Faculdade de Direito em João Pessoa (UFPB).

APLICAÇÃO DO FICHA LIMPA: A FAVOR OU CONTRA?

Page 12: Abril 2012

ENTREVISTA

12

JOSÉ TARGINO MARANHÃO:

CONFISSÕES DE UMA HISTÓRIA

Sendo de Araruna, como foi sua vinda para a Capital?

É uma decorrência natural as pessoas virem, especialmente na

minha época, porque você não tinha nem Ensino Médio no interior, apenas

em algumas cidades polos da Paraíba, como Patos, Souza, Cajazeiras. Na

região do Brejo, Bananeiras e Guarabira, havia um colégio de Ensino Mé-

dio só para mulheres e a Escola Técnica Agrícola, em Bananeiras. Areia

tinha também uma Escola Técnica Agrícola que depois se tornou Faculda-

de de Engenharia Agronômica e acho que também de Veterinária. Então,

como a gente não tinha condições de prosseguir estudando no interior, ia

para a Capital. Eu fui aluno interno do colégio de Manuel Neri, Colégio

Monsenhor Valfredo. Depois fui aluno do Pio X aqui, em João Pessoa, e,

em Natal, no Santo Antônio, que também era Marista. Voltei para Recife e

vim para João Pessoa. Recife era o caminho de todos os estudantes que

queriam chegar ao curso superior. Foi assim que eu cheguei a João Pessoa.

Que elementos bons a Paraíba manteve e quais perdeu, desde aquela

época?

Acho que todos nós temos um pouco de saudosismo. Na realidade,

a Paraíba cresceu. A Paraíba de hoje não é mais a Paraíba da minha infân-

cia. O que tinha de bom na Paraíba era a maior proximidade entre as pes-

soas. O Estado como um todo, João Pessoa especialmente, era um núcleo

social pequeno e as pessoas podiam se dar o luxo de conhecer e de fre-

quentar os mesmos ambientes sociais, os mesmos clubes sociais. Hoje não

tem clubes sociais mais. Acabou. A vida estudantil era muito cordial, mui-

to próxima... É essa a diferença positiva.

No mais, eu acho que a cidade cresceu. O Estado cresceu. A eco-

nomia, hoje, apesar de alguns percalços que sofreu, muitas mudanças es-

truturais mesmo, hoje é mais uma economia centrada na atividade industri-

al e no setor de serviços. Naquela época, nós tínhamos uma vida econômi-

ca centrada sobretudo na agricultura e na pecuária. Na agricultura, nós

tínhamos um tripé: era o algodão, o sisal e a cana-de-açúcar. O algodão e o

sisal se inviabilizaram inteiramente por fatores diferentes um do outro,

mas o resultado é que acabou a cultura do algodão e a cultura do sisal na

Paraíba, os quais eram os dois esteios principais, porque elas se estendiam

por quase todo o território.

Naquela época, a cultura de cana-de-açúcar ia desde o litoral até o

brejo. No brejo, os engenhos e as poucas usinas que tinham fecharam com-

pletamente. A cultura da cana-de-açúcar hoje ficou só na região litorânea.

Em função disso, a economia da Paraíba direcionou-se para o setor indus-

trial e para o setor de serviços. Então, a paisagem econômica hoje é intei-

ramente diferente da minha juventude, da minha infância.

Na Faculdade de Direito, como foi o contato com o professor Flóscolo

da Nóbrega?

Ingressei na Faculdade, em 1954. Eu gostava muito dele, mas ele

era ensimesmado. Nós tínhamos professores que se relacionam bem com

os alunos, que criam um ambiente social bom. Não, ele não era homem de

amizades. Ele era muito reservado, até meio tímido, de poucas palavras,

mas uma pessoa muito boa. Como mestre, eu o achava excelente, e o livro

dele, Introdução à Ciência do Direito, uma obra com uma pedagogia muito

boa.

Qual foi a contribuição da Faculdade de Direito para sua vida?

Acho que não há um curso mais universal, em termos de conheci-

mento, que o curso de Direito. É interessante que eu não pretendia fazer

Direito, mas Engenharia Aeronáutica, pois sempre gostei de tudo que se

relacionava à aviação. No ano que eu ia fazer o vestibular em São Paulo,

aconteceu uma crise política com minha família em Araruna. Fui surpreen-

dido com a ideia de ser candidato a Deputado Estadual.

Meu pai era um líder político e teve uma frustração com o Prefeito que

elegeu, então, mobilizou todos, para uma reação contra a candidatura dele.

Então, o objetivo do grupo era não deixar Celso ser o Deputado de Araru-

na. Acho que era muito mais isso, que eleger um Deputado. Eu não sei se

eles acreditavam muito que eu pudesse ser.

Eu não sei se fluiu naturalmente. Foi uma grande surpresa. Daí eu

ter mudado o curso para Direito, porque eu não podia fazer Engenharia

Aeronáutica em São Paulo e ser Deputado na Paraíba. Como eu fui eleito,

fui fazer Direito. Quando você é estudante e participa de política estudan-

til, o caminho natural é o curso de Direito, mas não me julgava com voca-

ção para o curso.

Quais eram suas posições políticas à época?

Sempre fui fiel a meus ideais. Como todo jovem idealista, a minha

posição era, naquela época, a defesa de um Estado brasileiro soberano e

independente e o confronto com o imperialismo americano. Isso era tema

recorrente na cabeça da grande maioria dos jovens brasileiros. Fundei,

aqui, na Paraíba, a Frente Parlamentar Nacionalista. Isso depois me valeu a

cassação, quando eclodiu o golpe militar de 64, que era, na verdade, não

um movimento nacional, mas um movimento antinacional. Era um movi-

mento de subordinação, de submissão aos interesses da política colonialis-

ta americana. Então, aquelas ideias nacionalistas passaram a ser mal vistas

pelo regime. Alguns foram cassados imediatamente. Outros foram cassa-

dos com o advento do AI-5, o Ato Institucional nº 5.

Então, quando foi editado o AI-5, eu já estava com dois ou três

IPMs (Inquérito Policial Militar) por conta dos manifestos que nos tínha-

mos feito na Paraíba. Aí eu não sobrevivi mais. Eu ainda fui candidato na

eleição de 66. Em 64, eu já era Deputado, estava no meio do mandato e,

em 66, houve a renovação, e eu fui novamente eleito. Em 69, fui cassado,

com o AI-5.

Eleito quatro vezes Deputado Estadual, três vezes Deputado Fe-

deral, três vezes Governador do Estado da Paraíba, além de Senador da

República, José Maranhão é um homem cuja atuação política perpassa

meio século de vida paraibana. Suas posições políticas, no entanto, identi-

ficam-no não só com o jovem José de 1955, o deputado estadual mais

jovem do Brasil, ou com o deputado estadual de 1969, cujo mandato foi

cassado pelo regime militar, mas com o político da vida inteira. Araru-

nense e graduado em Direito pela Universidade Federal da Paraíba, nota-

bilizou-se pela vida de político e empresária, sendo um grande adminis-

trador moderno no gerenciamento da coisa pública. Dentre suas grandes

contribuições como político no Estado da Paraíba, destacam-se o Plano

das Águas, contemplando todas as regiões do Estado com barragens,

açudes, adutoras além da interligação de bacias hidrográficas, atendendo

às carências das regiões mais vulneráveis ao problema da seca; a expan-

são do Porto de Cabedelo; a criação do Hospital de Trauma; duplicação

da BR-230 e a construção da PB-008.

―(...)não há um curso mais universal, em ter-

mos de conhecimento, que o curso de Direito‖

Fo

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1)

Page 13: Abril 2012

ENTREVISTA

HENRIQUE LENON, LARISSA MARANHÃO, PEDRO

ATAÍDE E YULGAN TENNO. Acadêmicos da Faculdade

de Direito em João Pessoa (UFPB).

13

Eu estava no PTB. Era o grupo nacionalista da política nacional.

O que aconteceu depois do golpe de 64 é que quase todo mundo se con-

verteu, aderiu aos militares por covardia, por oportunismo, essas coisas

que ainda hoje vigoram na política nacional.

José Américo já estava fora da política, mas tinha um filho, o

General Reinaldo Almeida, que era um dos líderes do golpe militar e do

golpe de 64. Na UDN, estavam João Agripino, Ernani Sátiro e os satélites

desse grupo. Do nosso lado, Humberto Lucena, Rui Carneiro.

Rui Carneiro nunca foi um político de posições ideológicas. Ele

era um político que tinha um grande conceito, porque gostava de fazer

favores, tinha muito boa índole, bom caráter, mas não gostava de enfren-

tar dificuldades. Ele ficou no PMDB, porque um amigo dele, que era Pre-

sidente do Brasil, Castelo Branco, mandou um recado para ele: “Diga a

Rui que ele pode ser muito mais útil no MDB, que indo para

uma sublegenda da Arena.” Mas, não era isso. O problema é

que João Agripino era o cacique da Arena e não permitia

que Rui, seu arquiinimigo político no Estado ficasse no mes-

mo partido que ele.

Humberto Lucena é também outro companheiro do

PTB, mas não chegou a ser cassado. Pedro Gondim estava na Arena, foi

um dos que aderiu, mas muitos que aderiram terminaram cassados. A vida

política naquela época, com esses arranjos que colocaram, do mesmo

lado, pessoas que sempre se enfrentaram, gerava um clima indesejado, de

intrigas, de denunciação.

No dia em que eclodiu o golpe de 64, nós íamos fazer, em Cruz

das Armas, um discurso em defesa da democracia, porque já era evidente

que aconteceria o golpe, e as forças populares de todos os Estados se or-

ganizaram. Nós organizamos um grande comício em Cruz das Armas.

Nós fomos jantar e deveríamos chegar ao comício às 20h. Só começaria,

quando a gente chegasse. Nós atrasamos um pouco, porque apareceu um

grupo de companheiros que estavam divergindo sobre a oportunidade ou

não de fazer o comício, porque já era iminente o golpe. Isso foi no último

dia do mês de março, à noite. Então, nós chegamos às 20h30, e só tinha o

palanque. Foi uma surpresa para nós. Sempre havia aqueles bêbados de pé

de palanque que ficam por ali mais pela cachaça que pelo comício, e nós

os chamamos... “Aqui chegou a polícia e o Exército e prendeu todo mun-

do. Quem não correu foi preso.”

O golpe tinha vitoriado. Não houve reações fortes. Brizola no Rio

Grande do Sul reagiu, mas sem apoio das forças federais, e Miguel Arra-

es, aqui em Pernambuco. Já circulava a notícia de que ele estava preso.

Eles não respeitavam nem imunidade parlamentar. Se alguém

tinha posições independentes, era perseguido. Se não tinha posição inde-

pendente, eles não davam bola também. Muitos caras ficaram em situação

humilhante, rastejando aos pés deles. Na realidade, o regime era um regi-

me militar, e os civis tinham o papel de ficar denunciando, perseguindo.

Então, eu fiquei fora da política por força do AI-5, de 1969 até 1982. A

suspensão dos direitos políticos era por dez anos, mas acontece que, quan-

do terminou a suspensão, não tinha eleição. A minha suspensão, na verda-

de, foi de treze anos. Só haveria eleição três anos depois.

Como foi voltar para a política, depois desse período?

Não foi uma tarefa muito difícil, porque no Brasil, de um modo

geral, as pessoas tinham boa memória, e o comportamento daqueles que

reagiram, daqueles que lutaram, ficou registrado na memória do povo.

Então, uma das eleições mais fáceis que tive foi quando voltei, para ser

Deputado Federal. O golpe de 64 me cassou o mandato pelas minhas idei-

as democráticas, nacionalistas, etc. Se a História se repetisse, eu repetiria

a mesma posição, caminharia na mesma direção que caminhei. Então,

ainda hoje a minha posição é coerente. Na verdade, eu nunca saí do PTB.

Eu não podia me filiar a partido nenhum, porque eu não tinha direitos

políticos.

Sempre achei que da mesma forma que o regime de 64 não tinha

poderes para me tirar os direitos políticos, também não tinha para me

devolver. Eu, na realidade, considero que os meus direitos políticos foram

devolvidos agora, porque o Ministério da Justiça constituiu uma comissão

de revisão de todos esses processos e me reconcedeu os meus direitos

políticos. Houve até uma solenidade na OAB, e eu fiz um discurso dizen-

do que, a partir daquele momento, eu me considerava reintegrado dos

meus direitos políticos por quem tinha autoridade e legitimidade, para me

reconhecer os direitos políticos. Então, essa foi a luta.

Como o Senhor analisa as disparidades regionais no Brasil?

O movimento mais marcante, para solucionar esse problema, foi a

criação da SUDENE, que era um órgão federal, mas com bastante autono-

mia, porque tinha um conselho constituído por governadores nordestinos e

outras representações políticas cuja proposta era a formulação de políticas

nacionais, para diminuir as desigualdades sociais. Isso foi por água abai-

xo, porque o modelo constitucional não implementou a SUDENE com

poderes e com recursos financeiros, para fazer valer as suas deliberações.

Durante algum tempo, ela gozou de um certo prestígio institucional graças

à figura de Celso Furtado e à determinação de Juscelino Kubitschek, mas,

passado o Governo de

JK, a SUDENE en-

trou num processo de

desagregação e hoje

não presta para nada.

As últimas tentativas,

os últimos projetos de redenção do Nordeste foram no próprio Governo de

Juscelino.

O que ficou da SUDENE foi o despertar da consciência regional

em torno da defesa de projetos regionais para o seu desenvolvimento. Isso

fez com que a Universidade e o Nordeste, de forma geral, olhassem com

mais firmeza para a discussão dos problemas regionais e a formulação de

soluções, porque, até então, o Nordeste era fático em relação ao seu pró-

prio destino, em relação ao desenvolvimento de projetos regionais.

Como foi sua atuação no Senado?

Eu acho que eu cumpri o meu dever. Fiz o que era possível e importante.

A Comissão de Orçamento, para mim, foi uma grande experiência. Na

minha gestão como seu Presidente, ela evoluiu muito. Nós criamos um

regimento interno que não existia, e antes a comissão era sempre lembra-

da pelos escândalos. Durante o meu período de gestão, nós cumprimos

aquele regimento. Abrimos completamente todas as decisões que foram

feitas, com absoluta transparência, e digo que a transparência foi o grande

instrumento que nós encontramos, para evitar determinadas ações que

possam rolar nos bastidores e decisões que não tinham a participação e a

fiscalização da imprensa.

Como a educação e a tecnologia, através de projetos de desenvolvi-

mento científico e tecnológico, podem ser fundamentais, para que o

Brasil cresça em qualidade? Qual o papel que a Paraíba exerce, nesse

sentido?

Sou um defensor intransigente de investimentos em ciência e em

tecnologia no âmbito da Universidade e do Ensino Médio. Eu fiz mais de

dez discursos sobre isso, e há um projeto no Senado instituindo a obriga-

toriedade de investimentos da ordem de 5% do PIB nacional no desenvol-

vimento de projetos tecnológicos na Universidade. É uma observação

prática que salta aos olhos de todo o mundo. O Brasil hoje é a quinta ou

sétima economia do mundo, mas a nossa economia é uma economia ainda

frágil, porque nós estamos na dependência do setor primário na produção

de commodities. É um setor frágil. O Brasil já naufragou várias vezes,

nessa mesma nau. Vender soja, sem industrializar, sem agregar mão-de-

obra é um desastre para a economia nacional em um país com um contin-

gente de mão-de-obra extraordinário, com a potencialidade das nossas

empresas. Porque aquela força extraordinária das economias está exata-

mente no pequeno empresário. Está exatamente nessa gente. Nós temos

que investir na inteligência nacional.

―Nós temos que investir na

inteligência nacional.‖

Page 14: Abril 2012

SOCIAL

COLUNA 14

―EU QUERO, EU QUERO, PRA BRASÍLIA EU

QUERO IR‖

O professo de Luciano Mariz Maia, junto com o professor Eitel

Santiago de Brito Pereira, realizaram, no mês de maio, o projeto

“Constituição Viva”, uma viagem espetacular à Capital Federal, Brasí-

lia, com os alunos da Faculdade de Direito, principalmente da UFPB.

Contou com a participação de 46 estudantes (em curso), e 7 ex-

estudantes (6 dos quais com atuação profissional em Brasília).

Os discentes puderam vivenciar a experiência de conhecer a

atuação dos órgãos constitucionais incumbidos da produção e aplica-

ção do Direito. Visitaram instituições como o Supremo Tribunal Fede-

ral, o Superior Tribunal de Justiça, Congresso Nacional e a Câmara dos

Deputados.

Foi a primeira vez que um evento como esse ocorreu no CCJ,

justamente por isso gerou dúvida e desconfiança sobre o andamento do

projeto, no entanto tudo ocorreu perfeitamente bem, mostrando mais

uma vez a competência dos professores Luciano e Eitel. Para os que se

arrependeram de não ter ido, resta agora esperar a próxima edição do

evento.

Acadêmicas da Faculdade de Direito em João Pessoa (UFPB)

Texto: YULGAN TENNO

Foto: Prof. LUCIANO MAIA

TRIBUNA PROMOVE DEBATE SOBRE DE-

CISÃO UNÂNIME DO STF

O Conselho Editorial da "Tribuna da Justiça" promoveu,

com o Prof. Ms. José Baptista de Mello Neto, em 16 de maio, no

Auditório do Centro de Ciências Jurídicas, o debate "Novas famí-

lias e as uniões homoafetivas: reflexões sobre a recente decisão do

STF", com a presença da Desembargadora gaúcha aposentada, Ma-

ria Berenice Dias, e da Prof. Ms. Marianna Chaves, Doutoranda em

Coimbra. Para o Procurador-Chefe do Ministério Público do Traba-

lho na Paraíba, Eduardo Varandas Araruna, que esteve presente no

evento, "a iniciativa é importante, para que a sociedade reflita sobre

suas próprias incoerências e para demonstrar aos operadores do

Direito a sua importância como elemento transformador".

Texto: HENRIQUE LENON

Foto: ÍTALO DI LUCENA

CAMPANHA DA ACESSIBILIDADE

O DATAB, preocupado com os problemas que o defici-

ente encontra nos dias atuais e com a efetiva aplicação da legisla-

ção que assegura certos direitos a esta parcela da população, rea-

lizou o evento da Campanha da Acessibilidade no CCJ.

As atitudes são as mais simples: não obstruir os corredo-

res e a rampa principal de acesso ao CCJ, além de não estacionar

os veículos nas rampas ou que obstrua a passagem da mesma

para que pessoas que tenham problema de locomoção possam

utilizar a mesma, e por último não ocupar os banheiros destina-

dos aos deficientes. Atitudes como estas são de importância para

a cidadania e dignidade daqueles que necessitam ter acesso ao

nosso prédio e demais áreas, não só da faculdade, mas lugares

públicos em geral.

Texto: INGREDI FERREIRA

A editora Juruá lançou o livro,

da autora Marianna Chaves,

Homoafetividade e Direito.

Pode ser comprado nas melho-

res livrarias ou no site: http://

www.jurua.com.br

Page 15: Abril 2012

CULTURAL

SEÇÃO 15

Era mais um trabalho da universidade

Vi diante de mim uma oportunidade

E fiz dessa oportunidade uma ousadia:

Juntei a justiça: um ideal e inspiração,

Com versos: minha eterna paixão,

E ousei fazer do direito uma poesia!

Do pedido de desculpas à professora pela

feitura do trabalho em moldes diferentes:

Não é crime ser insubordinado,

Se muito, podemos dizer que é errado,

Crime mesmo é cometer pedofilia.

Foi me pedido um trabalho feito em prosa,

Desobedeci de uma forma não dolosa,

Com o intuito de dar ao tema mais alegria.

O Trabalho: Pedofilia

Não há ato de maior frieza:

Atentar contra uma alma indefesa

Que nem alcançou a puberdade.

Pedofilia não é só desvio sexual,

É uma grande praga social,

Uma prática de extrema gravidade.

Diante de um bem jurídico atacado,

Intervém de prontidão o Estado

Pra defender qualquer ofensa ou lesão.

Chama-se então o direito penal,

Que protege na esfera judicial

Aqueles bens que não podemos abrir mão.

No ordenamento jurídico nacional

Não existe dispositivo legal

Que especifique o termo pedofilia,

Mas apesar de não tipificado como crime

A lei enquadra e também reprime

Práticas que envolvam tal autoria.

Dessa forma, é um direito tutelado,

Pois encontramos ele desdobrado

E enquadrado em outros tipos penais.

Como também em legislação extravagante,

Que dá pena e sanção ao “meliante”,

Dando ao ato conseqüências criminais.

DANILO MOURA. Acadêmico da Faculdade de Direito em

João Pessoa (UFPB)

VERSOS NAS ENTRELINHAS

Direito Rimado

Por: Danilo Moura

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Page 16: Abril 2012