abra alas 7 - a gentil carioca

15
1 ABRE ALAS 7

Upload: biblioteca-virtual-blog-daniela-name

Post on 20-Mar-2016

221 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

Catálogo da 7a edição da exposição coletiva, voltada para novos talentos, organizada pela Galeria A Gentil Carioca. Curadoria de Daniela Name, Bernardo Mosqueira e Bob N.

TRANSCRIPT

Page 1: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

1

ABRE ALAS7

Page 2: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

2 3

abre alas 7

O Abre Alas é uma das iniciativas de mapeamento principais da boa arte carioca, brasileira e planetária surgidas nos últimos 7 anos. Curiosamente somos uma galeria de arte, ao invés de um salão ou iniciativa pública. Não nos valeria somente um mercado ávido e pensante colecionando boa arte, mas aquilo que não se explica, a tremenda poesia, o prazer gentil de participar de um momento inaugural na carreira de muitos artistas.

Pelo Abre Alas já passaram estrelas brilhantes que são e serão referências na cultura do país.

Nos últimos dois anos optamos por convidar sempre três pessoas de reconhecida sensibilidade (artistas, críticos, curadores e etc) para optarem, entre tantos projetos aplicados, pelo Abre Alas 2011: Daniela Name, Bob N e Bernardo Mosqueira. A eles agradecemos pela enorme gentileza.

Àqueles artistas que ainda não se apresentaram com seus portifólios e aos que ainda, mesmo apresentando, não foram escolhidos, que perseverem, para que possamos fazer ainda incontáveis Abre Alas, afinal, a festa da arte não pode parar!

Esperamos que o respeitável público se delicie!

Sejam bem-vindos!

A Gentil Carioca

5 Abel Duarte

6 Alessandro Sartore

7 Anton Steenbock

8 Bruna Lobo

9 Caroline Valansi

10 Claudia Hersz

11 Cristiana Miranda

12 Daniela Antonelli

13 Danielle Carcav

14 Fabiano Araruna

15 Jesus Roman

16 Julia Pombo

17 Julio Lucio

18 Luciana Knabben

19 Matias Mesquita

20 Pedro Moreira Lima

21 Raphael Perret

22 Siri

23 Xulio Rodríguez

Page 3: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

4 5

Ninguém agüenta mais aqueles textos de arte cheios de jargão, sejam criativos usem conversas, poemas, e-mails, qualquer outra coisa.

Até mesmo um texto cheio de jargão.( Isso não! )

Foi ótimo todo mundo junto.Cada um se apresenta?Vamos fazer uma reunião com os artistas que estiverem no Rio!Pra quê?Para rolar o amor e a gente comer biscoito!Rolou!

20, 19, 18? O espaço é pequeno. Melhor menos com mais.

Ok. Mas não gritem. No amor, gente; no amor, por favor.

Vai ter que dar. Vai dar!

E se a gente tiver pouquíssimo tempo para escolher até 20 artistas em cerca de 350 portfolios?

Reunião no Bairro Peixoto, 191, 3º andar, às 10h. 12h. 11h. Avisa pra Tati?

Queridos, e para curadores do Abre Alas 2011 Daniela Name, Bernardo Mosqueira e Bob N?

E aí, como é que vai ser?

Vamos fazer daquele jeito mesmo?Apostar na polifonia.

E se Dante chegasse ao Abre Alas para pular carnaval? Carnaval, carne-vale, folia total? Eu sou da Lira! A escada pode dar uma direção para a curadoria. O douradão ambíguo pode ser a transição entre mun-dos, temperaturas. Ressonância dos artistas. Caminho de subir e de descer. Cadência e des-cadência. Pleno em sobreposições de ruídos.A galeria como um convite ao silêncio e à introspecção. Tudo branco no céu. Uma sala que fizesse doer a vista: chão, parede, tudo branco.Adorei a viagem! Branco sobre branco aqui - enquanto as salas no Hélio Oiticica abrigariam os trabalhos mais infernais: sem nenhum juízo moral nesta divisão.

(1) É verdade, certo e muito verdadeiro:(2) O que está embaixo é como o que está em cima e o que está em cima é como o que está embaixo, para realizar os milagres de uma única coisa.(3) E assim como todas as coisas vieram do Um, assim todas as coisas são únicas, por adaptação.

Ou não.

Beleza. Então, vamos almoçar. A conta a gente manda pro Marcio.

O carnaval combina e alterna o sagrado com o profano, o elevado com o baixo, o grande com o pequeno, o sábio com o tolo etc.Acho que poderíamos criar um fluxo, uma nuvem de trabalhos que justapusesse o céu, o purgatório, o inferno. Com o carnaval ligando e alternando.

O inferno são (nós) os outros: a Saara e o espaço do HO como esta divina perturbação da cidade, da diversidade, da carne, dos desejos. A galeria (em atributo de extensão e expressão) como germinação de sonhos e de projetos: o encantamento das potências em ativação.

Como “desenho”?!

O paraíso não como um fim, apático, mas como ponto de partida.

E discute-se sobre esta cidade, hoje? Está sendo gerida pela lógica da commodity ou de uma grande casa de festas que deve aprender com algum modelo importado de organização. É uma perigosa tentativa de assassinato a imposição deste choque anafilático de ordem. Emoldura-se o espontâneo, o exercício da liberdade criativa de cultura, de conteúdo, de quem sempre teve muito o que mostrar.

É.

Estes trabalhos mudaram, mas ficaram melhores do que a proposta inicial, vocês não acham?Como diria Nelson Rodrigues: óbvio ululante! A promiscuidade sempre foi a melhor forma de afeto! Então a gente se divide para conversar de forma mais profunda e direcionada com os artistas.

Page 4: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

6 7

Abel Duarte

abel pinto duarte abraçou o modelo morto.

Page 5: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

8 9

Anton SteenbockAlessandro Sartore

Jeda ist ein Künstler - Berlin / Rio de Janeiro, 2011

Alessandro Sartore é artista desde 1972.

Quem pensa que o inferno são os outros se engana. O inferno está mesmo é dentro de nós.

Cada um carrega consigo vida afora – do nascimento até a morte – seu próprio inferno, povoado por seus medos, angústias, obsessões, inseguranças, loucuras... Ao final, somos todos realmente infernais.

O inferno de Alessandro é sua vaidade, é sua solidão, é sua criatividade. Acima e antes de tudo, é não ser compreendido, é não conseguir expurgar o que lhe queima por dentro. Se vira tempestade, raio e trovão, é porque suas chamas não lhe dão trégua, queimam-no lentamente, carbonizando-o para transformá-lo em cinzas, e para que das cinzas ele possa renascer através da arte.

Raquel Sarinho, ex-namorada

O que dizer de Alessandro... Para mim, é como disse Mae West: “Quando é bom, é muito, muito bom. Quando é mau, é melhor”.

Silene Sartore, mãe

Page 6: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

10 11

Caroline ValansiBruna Lobo

Caroline Valansi faz parte do coletivo Opavivará! e é uma garota de família(s) - as tantas que faz por aí, em seu estilo de vida sempre coletivo.

Ana Hupe gosta de acompanhar a produção de Caroline de perto e a olha com paixão. Faz parte do coletivo OPAVIVARÁ!

De: bruna lobo <[email protected]> Assunto: Re: Couraças invertidas Para: “Pedro Victor Brandão” <[email protected]> Data: Segunda-feira, 3 de Janeiro de 2011, 2:04

Não é final, o que acha?se tiver sugestões, escreve em vermelho.bjo Couraças invertidas

De uma evocação mística para o choro (vem da concentração, ela diz – louca! Logo eu, rainha da falta de foco), Bruna Lobo traz suas imagens recentes. A cria-ção de um drama exagerado leva essa personagem, sozinha no ateliê, a vestir-se e maquiar-se para em seguida chorar bastante, e numa dissolução cosmética, decalcar a própria cara desfigurada num papel. Uma performance individual que deixa um resíduo. É um trabalho fotográfico e pictórico ao mesmo tempo, com um processo estranho, entre monotipia (pintura) e impressões de contato (fotografia). Esses choros sem título são códigos das fantasias cotidianas de Bruna. Maquiagem superficial, choro profundo, contraste-pathos no papel branco.

Lembro aqui da primeira versão do projeto ApArtamento, na Sílvio Romero, entre a Lapa e Santa Teresa; um dos quartos era uma instauração caótica. No armário, vazio, havia um vídeo. Nele, Bruna embebia o rosto com seu fluxo menstrual no banheiro do próprio apartamento. Pelo chão e pela cama, uma montanha de roupas espalhadas. Durante os dias da ocupação, visitantes se vestiam e se trocavam lá, deitavam-se, faziam-se. Desconhecidos, inclusive. Foi, na época, uma partilha íntima levada às últimas conseqüências dentro de casa. Hoje deve dar para ver com outros olhos. (como? Fiquei curiosa...) Do seu corpo e da relação natural ou fantasiosa com os próximos vem a necessidade de Bruna se expressar em imagens, ações e deleites emocionais. (da intimidade braba para máscaras cotidianas, também).

Colocar parte dessa experiência fora de casa, na rua, é o caminho (fazer do meu intimo, público) dessa busca e apreensão (acho que na verdade seria uma dispersão no espaço delas...) de roupas-dejeto que, descartadas por uma sociedade consumista, ganham o significado de ethos-coleção. É um estoque de carnavalização reciclada e mútua que pode ao mesmo tempo ser um brechó, o figurino de um filme, uma coleção de moda ou um exercício especial de colagem. E de transformação, de en-carnação em um personagem, disfarce, máscara.

Eloy Machado e Liza Machado, Lucia Santalices (e outros, mas principalmente a Liza Machado, que está junto pensando a parada.o projeto é conjunto.é nosso.) também partilham dessas jornadas, em que vestir e expor os amigos e os agentes do sistema de arte com peças desse acervo de afetos emerge em uma coletividade que inverte condições de moda esperadas em espaços sociais, (figurinos no dia-a-dia, no trabalho, em porta da boate! Decadance avec elegance!) no caso aqui, a abertura da exposição. Surpresa vintage. Vem aí uma contra-costura!

Pedro Victor Brandão love u – muito agradecida!bru Pedro escrevi em vermelho. E se a gente publicasse assim? Bem assim. Não vou nem voltar ao inicio do texto pra não ficar me julgando, me censurando. Que tal se vc quiser escrever algo sobre, adotar uma terceira cor?! Aguardo sua resposta. Hobo fashion, homeless chic

Bruna Lobo é artista.

Pedro Victor Brandão artista, fotógrafo e integrante do coletivo OPAVIVARÁ!

frames de video com acervo, 2009

DE TERRA E FORA DE óRBITA

Caroline Valansi é, além de artista, amiga. O convite para escrever sobre o trabalho dela se deu em seu ateliê, num sobrado no Centro do Rio, espaço que ando fre-qüentando bastante, dividindo ideias, compartilhando desejos.

Ela combinou um encontro na casa de sua irmã, no Arpoador. Não por acaso, o apartamento onde viveu até o fim da adolescência. Fizemos o tradicional tour pela casa – Caroline cultiva esses rituais protocolares. Conheci o quarto de sua infância, o terraço das brincadeiras e nos sentamos na sala, com o mar verde ao fundo para conversar. Fica claro que as memórias e a família são mais do que parte importante na vida da artista, são matéria de trabalho. Numa tentativa de universalizar o pes-soal – sorriso de todo artista? - Caroline se apropria de lembranças dos outros e as inventa também.

A série Memórias inventadas em costuras simples (2006-2008) - em que fotos antigas de anônimos, como as simbólicas e obrigatórias imagens de casamento, são rasgadas e reconstruídas com linha vermelha de costura - funcionam como indício de ques-tões que perpassam sua mente: a fragilidade da família nuclear, das relações afeti-vas? Em Inventário I (2011), volta à mesma perturbação mais amadurecida. Da terra, renasce um montante de portas-retratos, slides, garfos, facas, colheres. A mesa rode-ada de cadeiras, também feitas da terra, marcam o local do encontro, do diálogo à hora das refeições. Os bens familiares reunidos sobre a mesa são a troca na hora do jantar.

A herança que a família deixa em cada indivíduo, uma pergunta sobre o que será dessa instituição, um quê de nostalgia. Visitar a instalação é como passar as páginas de um álbum de fotos, suvenires da vida cotidiana capturados, ritos sociais em ima-gens. Inventário I não é feita de objetos isolados que falam por si só, como as fotogra-fias, mas um desafio novo: a construção de um ambiente inteiro com um material primitivo, como a terra misturada à cola. A terra é a base, onde estão fincadas as raízes. O trabalho traz os nossos legados, o chão, nosso primeiro engatinhar, nossas primeiras referências agindo sobre nós.

Caroline costuma dizer que prefere estar cercada de arte do que ela própria ser a arte; que a arte está em seu cotidiano, mas que ela precisa também do vácuo, de estar longe deste universo todo de repente; que a arte é uma possibilidade, mas não é tudo. É por isso que o que está em volta é tão importante no todos os dias dela. Parece que quanto mais mundo, mais vida, mais lembranças, mais estímulos há mais arte também, como conseqüência. Somente andando por caminhos diferentes do status quo que a rotina mental do artista torna-se única, expressão que ela usou no nosso papo.

Ana Hupe

Registro do caderno da artista

Page 7: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

12 13

Cristiana MirandaClaudia Hersz

Claudia Hersz vive e trabalha no Rio de Janeiro.

Carmen Molinari escreve.

IDÍLIO

Idílio? Esquece. Do Big Bang para cá tudo o que existe é uma imensa ânsia de expansão.

Visceralidades, malícias, danças do acasalamento atravessando épocas numa sucessão vertiginosa de diferentes retratos e paisagens, como que lançados num superacelerador de partículas.

O que está é o que sempre esteve.

Esquece o idílio. Na calçada, o gato sonha de olhos abertos em degustar um suculento pássaro fresco. E os pássaros, estes animais sacanas (sim, esquece tudo

Palimpsesto, circa 1750 – circa ? / circa 1960 – 2010 / tapeçaria em fios de lã e algodão, gobelin, metal e borracha / 105 x 135 cm

o que você aprendeu com a Branca de Neve), dão rasantes cada vez mais baixos e cantam, cantam, dão rasantes e cantam sacanamente sobre o gato, que sonha na seca com idílios.

Na beira de um rio em Paris cresceu Louise Bourgeois, tingindo e lavando lãs para o restauro de tapeçarias. Tapetes tecidos, desfeitos, reconstruídos como cidades no pós-guerra, com lãs de ovelhas diversas trabalhadas por gerações diversas em países diversos.

Atravessamentos.

Ao levar seus filhos para conhecer o local, tinham en-canado o rio.

Esquece o idílio.

Quando as luzes do Aterro começam a se acender, à maresia se misturam odores humanos, e os gatos e os pássaros sacanas dormem.

Íbis incrustada na pedra, a imagem dessa capital nunca vai apodrecer.

Cidade feniciana, felliniana, fellacciana, o Rio de Janeiro atravessa,

e me arrebenta.

Carmen Molinari

Artista visual nascida no Rio de Janeiro, Cristiana Miranda utiliza a matéria fílmica como matéria estética, afirmando a dimensão temporal e efêmera da imagem cinematográfica.

Hernani Heffner é curador e pesquisador de cinema e Conserva-dor da Cinemateca do MAM RJ. O sal da lua, 2010 / fotograma do filme

STOP MOTION + FILME VENCIDO + VELOCIDADE = FLUTUAçõES

Grão, pigmento, semente, esperma... De que são feitos os sonhos?Óvulo fecundado, fertilizado, inundado, ressecado... Para onde caminham os enigmas?Se ficássemos em solo etéreo, não encontraríamos O sal da terra.Se buscássemos as respostas, nos escaparia O sal da Lua.

Cristiana Miranda faz seus espectadores mergulharem nas dobras e entredobras, mais os vincosinvertidos e espelhosdesencarnadosdomeldaface.

Egressa de uma turma sem geração, travessa e avessa ao mundo terreno, investiga o contato, revestido em superfícies, rasgadas barbaramente em texturas, sabendo que o ungüento não existe mais. O que começou nas ampliações fotográficas está agora em suspenso nos planos cinematográficos.

O que uma mãe esguia procura nos desvãos da graça? Dádiva perdida porque chegamos tarde na Lua temperada? Maldição adquirida porque nos refestelamos na Lua tropical?

O grão, nobre descendência: man ray, norman mclaren, bruce conner, antonioni (ampliado con permiso e sem a verdade ontológica). Todos muito contidos diante da radicalidade de Miranda. Expressionismo abstrato em movimento, com suas pulsa-ções, imperfeições, ligações, mutações, inscrições, ... vestido oriental vermelho (não é, mas o sentimos assim). O que há de fato é uma manipulação inédita da imagem, tanto pelo efeito técnico quanto pelo resultado visual e estético. Não é o que parece: trivial.

Mulheres violentas e grotescas. Cocteau as acha imprescindíveis. Propõem enigmas iridescentes (só para fugir dos avatares e dos grãos cósmicos que nos atormentam).

O que há na Lua? Poeira.

Com carinho

Hernani

Page 8: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

14 15

Danielle CarcavDaniela Antonelli

sem título, 2010 / naquin sobre papel vegetal / 48 x 48 cm

GA

BI

CA

RR

ER

A

Um traço chama o outro. Ponto, linha, plano.Repetir. Desfazer. Entender.Abordar o desenho. Cor. Preenchimento. Equilíbrio entre razão e intuição. Poeira que atrai e repele.Pensar a arte como exercício da mente, alquimia, es-tudo.Registro do passar do tempo.

Daniela Antonelli, Mario Vitor e Rodrigo Linares

Daniela Antonelli, 1981 / RJDanielle Carcav é potiguar mas mora e trabalha no Rio de Janeiro desde 2008.

ACALMA TEMPO CALMA

O olho pára o mar. Ausência de tudo. O tempo conta até o infinito e volta outra vez.Por um segundo, eu sou descoberta.Alguém gritou e correu:- Para todas as coisas o tempo é cura e enfermidade! O segundo após o primeiro perde o momento para nunca mais voltar.E nunca mais é mais tempo do que posso prever para retornar e falar sobre ausência.

Danielle Carcav

Acalma tempo calma, 2010 / flores, gaiola de madeira, terra, linhas e agulha de costura / 200 cm de largura, 80 cm de comprimento, altura variando de 180 cm a 250 cm

Page 9: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

16 17

Jesus RomanFabiano Araruna

Série AJUDA, 2008/2009 / internet / 30 x 30 cm

Fabiano Araruna é graduando do curso de Artes Visuais da UERJ.Seu trabalho gira em torno de questões ligadas à Arte e Tecnologia e à imaterialidade do espaço virtual.

MODULO DE RESISTENCIA: PRIMERO

Cuando el maestro en piezas de acrílico –era la tercera generación en el oficio- re-cibió en 2007 el pedido de hacer una caja de 30x35x50 centímetros, no entendió para qué la utilizaría ella. Pensó en una lámpara; un hormiguero; insectario; ter-rario; pero no logró dar con un sentido que lo complaciera del todo. Lo mismo le ocurrió a la gente que se encontró con ella durante el primer viaje de la caja (los peatones no entendían por qué llevaba con tanta delicadeza 52.500 centímetros cúbicos de vacío), así como a la vendedora que después de unos minutos de dis-cusión con ella, aceptó finalmente que se quisiera llevar solamente las plumas y no la funda de la almohada.Una vez que se reunieron las piezas (caja, plumas, soquete, ampolleta, cables) y se ensambló el artefacto, la caja devino en obra y el desconcierto fue mayor para quienes lo veían por la calle en su segundo viaje, hacia su primer lugar de ex-hibición: el Museo de Artes Visuales de Santiago. Estuvo exhibida durante un mes y medio ajustándose como objeto a los conceptos curatoriales de la muestra, tales como “la electricidad como material capaz de adquirir forma, la levedad de la luz, transparencia, metáfora de la conducción y del conducto” (Gonzalo Arqueros).Dentro de los espectadores, un crítico y marxista empedernido, al ver la obra pensó en la demoledora crítica a la burguesía que se evidenciaba en la suavidad encerrada de las plumas, siendo metáfora de la lucha de clases y la dominación capitalista. Una crítica lacaniana no dejó de pensar en que el inconsciente estructurado era el acrílico que encerraba la posibilidad de la suavidad exhibida y privada para quien se enfrenta a ella, reprimiendo las pulsiones más básicas del hombre. Una autora feminista vio cómo el erotismo y sensualidad -mediante el estereotipo de la pluma- era contraído por el falocentrismo circundante, representado por la contención/violencia invisible de la sociedad patriarcal; y en la revista teológica de Santiago el crítico cristiano dijo que esas eran las plumas de un ángel, por lo que se evidenciaba la falta de espiritualidad que arreciaba en la sociedad contemporánea nacional. Un señor pensó en que representaba una almohada imposible y recordó lo suave que era dormir en su infancia y la mala calidad de los productos actuales.Tras ese momento de gloria y absoluto sentido artístico, la obra volvió al taller-hog-ar donde vivían ella y él. Despojada ya de todo significado superior, la obra se con-virtió en un velador: al lado de las almohadas estaría cuidando el sueño de ella y él, sosteniendo libros, vasos, pastillas, cremas, ceniceros y monedas. Para el círculo más íntimo de ella y él, el desplazamiento desde la sala de museo a la pieza los obligaba pensar en el arte y las posibilidades de relocalizar/resemantizar su significación. Para el resto parecía una reserva de plumas de emergencia para la medianoche. En 2008 la caja fue trasladada del taller-hogar a un nuevo hogar-taller de él y ella, donde continuó cumpliendo sus labores de mueble. Cada cierto tiempo era encen-dida en un homenaje genealógico. En 2009 volvió al museo, pero ahora en calidad de velador, siendo exhibida con los objetos que sustentaba en una exposición llamada “La vida es sueño” de la Trienal de Arte de Chile. Ahí una renombrada artista había pedido esta obra para insta-larla junto a otros veladores, evidenciándose su identidad forzada, móvil, trunca: al compararse con los otros muebles exhibidos, se veía que no funcionaba para esos propósitos. Tras este tiempo de exhibición, vuelve a casa con una pequeña y miste-riosa trizadura.A principios de 2010 realiza otro viaje a un nuevo hogar. Aquí es exhibida junto a otros objetos en el living de la casa. Recupera así, en parte su sentido primero y pierde su función anterior: permanece desafiando a los invitados/espectadores que visitan el hogar de él y ella. En diciembre de ese mismo año la galería “A Gentil Carioca” solicita la caja en su calidad de obra para la exposición Abre Alas. Ella no puede llevar su obra ni estar presente en la inauguración porque está trabajando día y noche en otra exposición. De manera azarosa justo él debe viajar por primera vez a Río de Janeiro. Inmediatamente ella comienza a restaurar la obra, limpiando algunos de sus sentidos previos y reinstalando su identidad: plumas, cables, limpieza y rearme se ejecutan.

Para poder transportar tan frágil objeto deben construir un contenedor de madera que aumenta su peso, volumen y rigidez, elementos necesarios para iniciar el viaje. La caja de acrílico se declara en la aduana como una lámpara y las plumas se ex-traen del interior para rellenar un simulacro de almohada, renegando de toda la historia que acompañó a estos elementos.El hombre del check-in del aeropuerto no mostró ninguna extrañeza por la caja al momento de entregar el equipaje.El funcionario de aduana que vio pasar el cajón vacío relleno de una caja vacía tampoco se escandalizó. Cuando vio que él llevaba su propia almohada, recordó su propio insomnio y encontró lógico que alguien se desplace con un trozo de sueño donde viaja.El único con sospechas era él, que pensó que la política comunicacional de seguri-dad ha hecho mejor trabajo en si mismo que en las instituciones.Tras ser reensamblada en Brasil, nadie sabe que verán en la obra los que imaginan en portugués.

Dante Sepúlveda / Martín Centeno

Jesús Román es Licenciada en Artes Visuales de la Universidad de Chile y candidata a Magíster de la misma Universidad. Trabaja como Profesor ayudante de la cátedra de Pintura en la misma institución.

Dante Sepúlveda es Arquitecto titulado de la Universidad de Chile. Vive y trabaja en Santiago de Chile.

Martín Centeno es Licenciado en Literatura de la Universidad de Chile. Trabaja en el Ministerio de Educación y es editor en “Sangría”.

Módulo de resistencia: Primero, 2007 / acrílico transparente, plumas y tubo fluorescente blanco / 30x35x50 cm

CR

ISTó

BA

L P

RA

DO

Page 10: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

18 19

Julia Pombo Julio Lucio

Julio Lucio Martin é um artista que cria projetos de arte e tecnolo-gia, para que as pessoas possam jogar, interagir e se divertir. A partir de acontecimentos e avanços tecnológicos cria trabalhos de arte que buscam mostrar ao público como a tecnologia funciona e pode representar o comportamento da matéria e do universo.

Lucas Paraizo é roterista.

ARTISTA É O... (domínio público)

Adriane Galisteu. Antón Tchécov. Aristóteles. Bruno. Bárbara Paz. Caetano Veloso. Carla Perez. Carequinha. David Beckham. Diana. Emilinha Borba. Eu. Fátima Bernardes. Fiuk. Galisteu, Adriane. Guilherme de Pádua. Herbert Viana. Italo Calvino. Juliana Paes. Julio Lucio Martin (autor desta obra). Janelle Monáe. Jane Duboc. Kelly Key. Leonardo. Lula. Laís (minha vizinha que faz cerâmica). Michael Jackson. Madonna. Mick Jagger. Nelson Rodrigues. Dona Neném. Narcisa Tamborindeguy. Oprah. Oswaldo Montenegro. Pixinguinha. Roberta Close. Ricardo Amaral. Ritchie. Samuel Beckett. Sandra de Sá. Tiririca (riscar da lista - agora é deputado). Uri Geller. Você. Wanessa Camargo. Xuxa (ambos). Não tem nenhum com Y. Zélia Duncan.

Lucas Paraizo

Page 11: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

20 21

Luciana Knabben Matias Mesquita

A Lagarta e Alice se olharam por algum tempo em silêncio. Por fim, a Lagarta tirou o narguilé da boca e disse, dirigindo-se a Alice com uma voz calma e sono-lenta:- Quem é você?Não foi um modo muito encorajador de começar a conversa. Alice respondeu, um pouco acanhada:- Eu... Eu neste momento não sei muito bem, minha senhora... Pelo menos, quando acordei hoje de man-hã, eu sabia quem eu era, mas acho que depois mudei várias vezes...

sem título, 2010 / lantejoulas, paetês, miçangas, fio 10 e alfinetes / dimensões variáveis

Luciana Knabben é nascida em Blumenau, em 1978. Arquiteta, formada também em pintura e gravura, vive e trabalha no Bal-neário de Camboriú, Santa Catarina.

O britânico Lewis Carroll inventou Alice e suas aventuras no País das Maravilhas e Através do Espelho.

- O que você quer dizer com isso? – perguntou a Lagarta secamente. – Você não pode se explicar mel-hor?- Eu acho que não consigo me explicar, minha sen-hora, pois não sou mais eu mesma, como a senhora pode ver.- Não vejo nada... – disse a Lagarta.- Receio que eu não posso ser mais clara – respondeu Alice educadamente -, já que, para começar, eu mes-ma não consigo entender o que se passa. E, além do mais, ficar de tantos tamanhos diferentes num só dia é

uma coisa que deixa a gente muito confusa.- De jeito nenhum – disse a Lagarta.- Bem, talvez a senhora não tenha passado por isso ainda – disse Alice -, mas, quando a senhora tiver de se transformar numa crisálida e depois numa borbole-ta, como vai acontecer um dia, a senhora sabe, então acho que nesse dia a senhora vai achar a mudança um bocadinho esquisita, não vai?

Lewis Carroll, Alice no País das Maravilhas

Matias Mesquita (Rio de Janeiro, RJ, 1976) trabalha com desenho animado, é artista plástico e saiu para uma caminhada sem rumo...

Abre alas, 2011 / grafite s/ papel manteiga / dimensões variadas

Assim a rememoro. Na tarde que precedeu aquela noite, estive em Barracas: localidade que não tenho o cos-tume de visitar e cuja distância, das que depois percorri, já dera um sabor estranho àquele dia. A noite que se seguiu não estava programada: como era serena, saí para caminhar e recordar, depois jantar. Não quis dar rumo à caminhada; procurei uma máxima latitude de probabilidades para não cansar a expectativa com a obrigatória antevisão de uma única dentre elas. Realizei na má medida do possível isso que chamam caminhar a esmo; tendo por único plano consciente evitar as avenidas e ruas largas, aceitei os mais obscuros convites do acaso. Apesar de tudo, uma espécie de gravitação familiar me afastou para bairros de cujo nome quero sempre me lembrar, pois inspiram reverência a meu peito. Não quero me referir com isso a meu bairro, o preciso âmbito da infância, mas, sim, a suas ainda misteriosas imediações: limite que possuí inteiro em palavras e pouco na realidade, vizinho e mi-tológico a um só tempo. O reverso do conhecido, suas costas, são para mim essas penúltimas ruas, quase tão efe-tivamente ignoradas quanto o soterrado alicerce de nossa casa ou nosso invisível esqueleto. A marcha me deixou numa esquina. Aspirei noite, em sereníssima folga da atividade de pensar. A visão, sem dúvida nada complicada, parecia simplificada pelo meu cansaço. Tornava-se irreal por sua própria tipicidade. A rua era de casas baixas e, embora sua primeira aparência fosse de pobreza, a segunda era evidentemente de felicidade. Era uma coisa muito pobre e muito mais linda de se ver. Nenhuma casa se animava a chegar até a rua; a figueira dava sombra na es-quina; os portõezinhos – mais altos que as linhas compridas das paredes – pareciam feitos na mesma substância infinita da noite. A calçada era escarpada sobre a rua, a rua era de barro elementar, de barro da América, ainda não conquistado. No fundo, o beco, já meio pampa, se esboroava rumo ao Maldonado. Sobre a terra turva e caótica, uma taipa rosada parecia não abrigar a luz da lua, mas sim difundir luz íntima. Não haverá melhor ma-neira de dar nome à ternura do que aquele rosado.Fiquei olhando aquela singeleza. Pensei, seguramente em voz alta: Nada mudou em trinta anos... Imaginei essa data: época recente noutros países, mas já remota neste lado tão cambiante do mundo. Um pássaro talvez can-tasse e senti por ele um carinho pequenino, do tamanho dele; mas o mais provável é que naquele já vertiginoso silêncio não houvesse ruído algum a não ser o dos grilos, tão intemporal quanto o outro. Este pensamento fácil Es-tou em 1800 e tantos deixou de ser umas quantas palavras aproximativas para se aprofundar na realidade. Eu me senti morto, me senti percebedor abstrato do mundo; indefinido temor imbuído de ciência que é a melhor clareza da metafísica. Não acreditei, não, ter subido as águas do Tempo; antes, me supus possuidor do sentido reticente ou ausente da inconcebível palavra eternidade. Só mais tarde consegui definir aquela imaginação.Escrevo-a agora, desta forma: essa pura representação de fatos homogêneos – noite serena, paredezinha límpida, cheiro provinciano de madressilva, barro fundamental – não é meramente idêntica à que houve naquela esquina há tantos anos; é, sem semelhanças e repetições, a mesma. O tempo, se pudermos intuir essa identidade, é uma desilusão: a indiferença e a inseparabilidade de um momento de seu aparente ontem e de outro de seu aparente hoje bastam para desintegrá-lo.

Jorge Luis Borges, Nova refutação do tempo

Page 12: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

22 23

Pedro Moreira Lima

Pedro Moreira Lima; poeta-artista plástico-educador-membro do grupo de pesquisa ‘Juventude líquida: estética / educação / acontecimentos.

NOVACAÍNA - Entre, seja bem vindo, 2009 / videoperformance / 3’ e 42’’ (in looping)

ESPAçO RESERVADO PARA O SEU TEXTO CRÍTICO

Raphael Perret

Visiting Brazil in 2000, Raphael Perret was mesmerised by his capoeira master’s elegant and effortless jumps through space. Now he is completing the circle and returns the results of this source of inspiration to its origin.

Milton 10.2.1, 2009 / variable material / variable size / rendering by Vladimir Jankijevic

BODyCLOUD

“Empty space does not exist. On the contrary, space is a superabundance of simultaneous movements. The illu-sion of empty space stems from the snapshot-like per-ception received by the mind. What the mind perceives is, however, more than an isolated detail; it is a momen-tary standstill of the whole universe. Such a momentary view is always a concentration on an infinitesimal phase of the great and universal flux.” – Rudolf von Laban, Choreutics

During a visit in 2000 in Brasil, I was deeply impressed by the effortlessness of Mestre Corsico, master of my Capoeira club, who seemed to jump through the room in slow motion. I was mesmerized and perceived his movements as a single entity and materialized sculpture before my eye. The vision of his leaving the ground, twisting through the air and landing on his other foot had a lasting effect on me. Ultimately, this was my motivation to implement Project Bodycloud. It was my goal to bring the elegance and beauty of human expressiveness to live in form of a physical object in space.

Project Bodycloud is concerned with the materialization of human movements into a sculpture. Human move-ment space is defined as the space a person appropriates by means of his or her movement, a space that is con-stantly expanded as the person moves. I am interested in movement spaces because it reflects the personal usage of space. Despite its habitual and daily character, this process can be cultivated and developed according to a person’s talent and physical ability. Along these lines, the personal appropriation and design of space starts with one’s body. In order to visualize this constitution, I choose the process of materialization into a sculpture. Thereby, I render this essentially ephemeral movement space tangible.

By virtue of mapping a person’s movement space, a piece of time is frozen. This moment is reanimated in a dif-ferent time, in a differ- ent place, when it is transformed into a physical object. This new reality, consisting of space and time, refers to the past and tells the story of a human being in motion. This story is only tangible once the beholder and the sculpture meet physically. Thus, in a sense, the present meets the past and engage in a dia-logue.

We are used to perceive the space a human being takes; however, we are unable to follow the movements for a longer time span. By analyzing materialized moving spaces we find a certain normality – provided by unmistak-ably human proportions – and a convulsion of the very same through the materialized spatial expansion. Due to the forms’ human origin, the process of analyzing and interpreting them is very fascinating. The sculptures har-bor an aesthetic that is made accessible through our knowledge of our bodies. Therefore the involvement between object and recipient is meant to be a visual as well as a physical encounter.

What’s to come: Both, the positive and the negative form of the sculpture in lifesize are of interest to me. The aforementioned negative form has to be seen as a monolithic bloc out of which the movement space has been re-moved, a space that one can physically enter. In the inversion’s midst the beholder is intended to put himself into the position of the dancer and feel the performer’s movement space. The experience, therefore, should not remain a merely visual encounter but turn into a physical experience where one’s own movement should utterly internal-ize the dancer’s previous experience. The negative movement space can thus become a perceptible playground, a cave of time and movement in which the generic experience is explored and repeated by simple changes in position. The story of an animated body continues to be told and is carried over through the participation of the recipients. Changing one’s position, then, also means to reenact different phases in time. Ultimately, the beholder is not free, but incorporated into a narrative corset.

Raphael Perret

Page 13: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

24 25

Siri Xulio Rodríguez

Peles dos instrumentos são substituí-das por falantes, transformando-os em caixas acústicas que repercutem sua própria voz.Instrumentos de samba (surdos, caixa, repique, caixas e tamborins), criam uma atmosfera de surround, convidando o espectador a uma ex-periência sonora única.Na abertura Siri faz performance to-cando ao vivo e interagindo com sua própria obra, tocando instrumentos e regendo a própria instalação.“...Nesta performance sou o maestro de músicos virtuais que usam instrumentos com vida própria”, afirma o artista.

Vozes do samba, 2010 / instalação sonora e perfor-mance / instrumentos de samba e falantes

O artista sonoro Siri aposta na convivência entre todas as formas de criação. Uma simultaneidade de expressões que nos liberta da cristalização de modelos estabelecidos pela indústria.

DEB

OR

AH

EN

GEL

Xulio Rodríguez é artista plástico, colecionador de memórias, nômade, residente da cidade do Juízo Final.

TERCEIRA MARGEM DO RIO (fragmento)

Sem fazer véspera. Sou doido? Não. Na nossa casa, a palavra doido não se falava, nunca mais se falou, os anos todos, não se condenava ninguém de doido. Ninguém é doido. Ou, então, todos. Só fiz, que fui lá. Com um lenço, para o aceno ser mais. Eu estava muito no meu sentido. Esperei. Ao por fim, ele apareceu, aí e lá, o vulto. Estava ali, sentado à popa. Estava ali, de grito. Chamei, umas quantas vezes. E falei, o que me urgia, jurado e de-clarado, tive que reforçar a voz: — “Pai, o senhor está velho, já fez o seu tanto... Agora, o senhor vem, não carece mais... O senhor vem, e eu, agora mesmo, quando que seja, a ambas vontades, eu tomo o seu lugar, do senhor, na canoa!...” E, assim dizendo, meu coração bateu no compasso do mais certo.

Ele me escutou. Ficou em pé. Manejou remo n’água, proava para cá, concordado. E eu tremi, profundo, de re-pente: porque, antes, ele tinha levantado o braço e feito um saudar de gesto — o primeiro, depois de tamanhos anos decorridos! E eu não podia... Por pavor, arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento desatinado. Porquanto que ele me pareceu vir: da parte de além. E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão.

Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele. Sou homem, depois desse falimento? Sou o que não foi, o que vai ficar calado. Sei que agora é tarde, e temo abreviar com a vida, nos rasos do mundo. Mas, então, ao menos, que, no artigo da morte, peguem em mim, e me depositem também numa canoinha de nada, nessa água que não pára, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro — o rio.

João Guimarães Rosa, Primeiras estórias

State of the nation (O estado da nação), 2010 / im-pressão em tela / 17,78 x 27,94 cm

Santo, 2010 / impressão em tela / 15 x 21 cm

Cristero, 2010 / impressão em tela / 17,78 x 27,94 cm

La fuckin’ patria, 2010 / impressão em tela / 27,94 x 17,78 cm

Page 14: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

26 27

coordenação editorial

A Gentil Carioca

equipe da galeria A Gentil Carioca

diretores Ernesto Neto, Laura Lima, Márcio Botner

produção Tatiana Bührnheim

administração Fabiola Neves

assistente de serviços gerais Inacio Ferreira da Silva

manutenção e montagem Gerardo Silva Filho

projeto gráfico e diagramação

Lili Kemper

Page 15: Abra Alas 7 - A Gentil Carioca

28

Publicado por ocasião da exposicão Abre Alas 7 realizada entre 05/02 e 19/03/2011 na galeria A Gentil Carioca com curadoria de Bernardo Mosqueira, Bob N e Daniela Name em gentil parceria com