abordagem aos antibióticos - sebenta antibióticos - filipe araújo

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Filipe César P. P de Araújo 1 Abordagem Prática aos Antibióticos ABORDAGEM PRÁTICA AOS ANTIBIÓTICOS Filipe César P. P. de Araújo Assistente de Microbiologia Clínica da Faculdade de Medicina de Lisboa

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Filipe César P. P de Araújo

1 Abordagem Prática aos Antibióticos

ABORDAGEM

PRÁTICA AOS

ANTIBIÓTICOS

Filipe César P. P. de Araújo

Assistente de Microbiologia Clínica da Faculdade de

Medicina de Lisboa

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Filipe César P. P de Araújo

2 Abordagem Prática aos Antibióticos

Índice

Introdução 4

Definições 4

Mecanismos de Acção dos Antibióticos 5

Factores que determinam a eficácia dos Antibióticos 6

Principais Grupos de Antibióticos 7

Penicilinas 7

Penicilinas naturais 8

Aminopenicilinas 9

Isoxazolilpenicilinas 10

Carboxi e ureidopenicilinas 11

Amidinopenicilinas 11

Cefalosporinas 12

Cefalosporinas de 1ª Geração 12

Cefalosporinas de 2ª Geração 13

Cefalosporinas de 3ª Geração 13

Cefalosporinas de 4ª Geração 14

Monobactâmicos 14

Carbapenemes 14

Glicopéptidos 15

Macrólidos 16

Tetraciclinas 18

Cloranfenicol 19

Clindamicina 20

Estreptograminas 21

Oxazolidinonas 21

Aminoglicosídeos 22

Sulfonamidas e associação com Trimetoprim 23

Quinolonas 24

Metronidazol 26

Glicilciclinas 27

Quadros e Tabelas úteis sobre Antibióticos 28

Eliminação e ajuste posológico de alguns Antibióticos 28

Tratamento de Infecções da Pele e Tecidos Moles 29

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Filipe César P. P de Araújo

3 Abordagem Prática aos Antibióticos

Tratamento da Endocardite Infecciosa 30

Tratamento Empírico das Infecções Urinárias 31

Tratamento Empírico das Pneumonias da comunidade 32

Tratamento Empírico das Meningites 33

Tratamento dirigido das Meningites 34

Tratamento de Vaginites e Vaginoses 35

Tratamento de Uretrites 35

Bibliografia 36

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Filipe César P. P de Araújo

4 Abordagem Prática aos Antibióticos

I. Introdução

1. Definições

Antibióticos são substâncias químicas que provocam a morte ou a inibição do

crescimento de bactérias. Podem ter origem em outras bactérias ou fungos, ou podem

ter origem totalmente sintética. Desde a sua introdução na década de 40 do passado

século XX, os antibióticos permitiram o combate a todo o tipo de infecções e assim

melhorar a esperança de vida do ser humano, no entanto a emergência de estirpes

resistentes é hoje em dia uma realidade preocupante. As grandes companhias

farmacêuticas desenvolvem novos princípios activos com o propósito de combater o

vasto leque de infecções e agentes etiológicos envolvidos, contudo o uso excessivo e

muitas vezes inapropriado de tais substâncias exerce pressão selectiva que elimina as

estirpes sensíveis mas selecciona as resistentes. É da responsabilidade dos

profissionais de saúde o uso criterioso dos antibióticos que devem ser prescritos de

acordo com o tipo de doente, o local de infecção, o agente causador, a eficácia,

segurança e custo do fármaco.

Uma das principais regras de boa utilização dos antibióticos é a prescrição de

antibioticoterapia de primeira linha. O antibiótico de primeira linha é o antibiótico de

menor espectro de actividade que é eficaz para uma determinada infecção, ou seja,

interessa-nos usar um antibiótico que seja específico e adequado contra apenas um ou

contra o menor número possível de microrganismos. Por exemplo, ao tratarmos uma

amigdalite bacteriana por Streptococcus pyogenes vamos querer utilizar o antibiótico

eficaz que actue estritamente contra este agente sem afectar os restantes

microrganismos da flora comensal do doente. A utilização de antibióticos de primeira

linha, para além de tratar a infecção, permite:

evitar selecção de estirpes resistentes, já que tem um espectro de acção

que se limita praticamente a um microrganismo específico;

evitar efeitos adversos no doente, já que antibióticos de primeira linha

são geralmente menos tóxicos que os fármacos de largo espectro;

evitar destruição da flora comensal, o que impede infecções por

microrganismos patogénicos (a flora comensal é essencial pois

esconde receptores de ligação às células do hospedeiro e compete

com os microrganismos patogénicos pelos nutrientes disponíveis);

No entanto, existem situações clínicas em que não é possível nem recomendável

utilizar antibióticos de espectro reduzido. Por exemplo, num doente em que a suspeita

clínica de meningite é muito forte e logo após colhidos os produtos biológicos (líquor e

sangue) deve iniciar-se um antibiótico ainda antes de se conhecerem os resultados das

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Filipe César P. P de Araújo

5 Abordagem Prática aos Antibióticos

culturas destas amostras. Por conseguinte, este antibiótico deverá cobrir todos os

agentes que possam ser causadores de meningite naquele indivíduo, ou seja, deverá

ser um antibiótico de largo espectro. Esta terapêutica de largo espectro que é iniciada

antes de se conhecer o agente etiológico da infecção denomina-se de

antibioticoterapia empírica. Em determinadas situações a antibioticoterapia empírica

pode envolver dois ou mais antibióticos. Uma vez conhecido o agente causador da

infecção o antibiótico empírico pode ser suspenso e pode iniciar-se a terapêutica com

um antibiótico de menor espectro que seja eficaz contra aquele microrganismo. Estas

terapêuticas de largo espectro são utilizadas quando é necessário assegurar um

controlo precoce da situação clínica do doente e evitar complicações. A escolha do

antibiótico empírico vai depender do tipo de doente, da gravidade da situação, da

existência de co-morbilidades, do local de infecção e do padrão de resistências aos

antimicrobianos dos prováveis agentes causadores da doença (determinado por

estudos epidemiológicos da região).

2. Mecanismos de acção dos antibióticos

Os vários antibióticos existentes possuem diferentes mecanismos de acção através

dos quais exercem os seus efeitos bacteriostáticos ou bactericidas. Esses mecanismos

são:

- inibição da síntese da parede celular bacteriana, por exemplo as penicilinas, as

cefalosporinas, a vancomicina ou a bacitracina;

- alteração da permeabilidade da membrana celular com extravasamento dos

compostos intracelulares, por exemplo a polimixina e o colistimetato;

- inibição ou alteração da síntese proteica pela ligação às subunidades 30S e 50S

dos ribossomas, por exemplo tetraciclinas, macrólidos, aminoglicosídeos, linezolide,

cloranfenicol ou clindamicina;

- compromisso do metabolismo dos ácidos nucleicos, por exemplo rifamicinas ou

quinolonas;

- bloqueio de etapas metabólicas específicas (antimetabolitos), por exemplo

trimetoprim ou sulfonamidas;

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Filipe César P. P de Araújo

6 Abordagem Prática aos Antibióticos

3. Factores que determinam a eficácia dos

antibióticos

A eficácia de um anitibiótico depende de múltiplas variáveis. Uma das principais é

a concentração de fármaco no local de infecção, que deve ser suficiente para inibir o

crescimento bacteriano (efeito bacteriostático) ou destruir as próprias bactérias (efeito

bactericida), mantendo-se abaixo dos níveis tóxicos para as células humanas. Quando

a concentração necessária para inibir ou matar o microrganismo é maior do que a

concentração que pode ser atingida com segurança (limiar de toxicidade) o

microrganismo é considerado resistente ao antibiótico. A resistência aos antibióticos

pode ser adquirida por mutação espontânea, transferência horizontal (a partir de uma

célula dadora) ou transferência vertical (passada à descendência).

A penetração dos fármacos em locais infectados depende quase sempre do

processo de difusão passiva. Assim, a taxa de penetração é proporcional à

concentração de fármaco livre no plasma ou líquido extracelular (antibióticos que se

ligam extensamente a proteínas não penetram com a mesma eficácia e têm actividade

reduzida). O pús, consistindo de fagócitos, detritos celulares, fibrina e proteínas, liga-se

aos aminoglicosídeos e à vancomicina e reduz a sua actividade antimicrobiana, o

mesmo acontecendo com a hemoglobina de hematomas infectados em relação à

penicilina e tetraciclinas. O pH de abcessos, espaço pleural, líquor e urina é baixo,

resultando em ineficácia antimicrobiana de aminoglicosídeos, eritromicina e

clindamicina. Condições de anaerobiose inibem a actividade dos aminoglicosídeos. A

penetração de antibióticos em abcessos é também reduzida pelo facto de estes serem

pouco vascularizados. Por tudo isto, o tratamento de abcessos passa, em regra, pela

drenagem cirúrgica. A presença de corpos estranhos (próteses valvulares cardíacas ou

articulares, pacemakers, shunts do SNC, entre outros) em locais infectados reduz

grandemente o sucesso de qualquer terapêutica antibiótica o que se deve à actividade

fagocítica reduzida nestes materiais e à produção de um revestimento glicoproteico

por algumas estirpes bacterianas denominado de slime ou biofilme, que envolve e

adere os microrganismos ao corpo estranho. Em geral, o êxito da terapêutica passa

pela remoção deste material.

O estado funcional dos mecanismos de defesa celular e humoral do hospedeiro

são fundamentais para o sucesso do tratamento antibiótico. Com frequência, o êxito

no tratamento de infecções no imunocompetente pode ser atingido interrompendo a

multiplicação das bactérias (efeito bacteriostático). No entanto, esta atitude é

inadequada quando as defesas do indivíduo estão comprometidas, tornando-se

essencial a utilização de agentes bactericidas.

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7 Abordagem Prática aos Antibióticos

II. Principais grupos de Antibióticos

1. Penicilinas

As penicilinas são classificadas como fármacos beta-lactâmicos devido ao anel

beta-lactâmico (Figura 1) da sua estrutura central. As penicilinas partilham

características químicas, mecanismos de acção, efeitos clínicos e farmacológicos com

os restantes antibióticos beta-lactâmicos: cefalosporinas, monobactâmicos,

carbapenemes e inibidores das beta-lactamases.

O mecanismo de acção de todas as penicilinas é a inibição da síntese da parede

celular (exclusiva das bactérias) através da ligação às proteínas PBP (penicillin-binding

protein), cuja função é transportar e ligar as subunidades de peptidoglicano,

constituintes fundamentais da parede. Ao inibir esta função, a parede celular deixa de

ser renovada e a bactéria entra em sobrecarga osmótica por entrada de água livre,

seguida de turgescência celular e por fim lise da bactéria. As penicilinas são, por

conseguinte, antibióticos bactericidas.

A resistência das bactérias às penicilinas pode ocorrer por:

- modificação das PBP, que são geralmente alteradas de forma a terem afinidade

reduzida para os antibióticos;

- produção de beta-lactamases, enzimas que clivam o anel beta-lactâmico e

inactivam estes antibióticos;

- redução da permeabilidade aos antibióticos, por modificação dos poros da parede

bacteriana;

Figura 1 – A estrutura química da penicilina, com o anel beta-lactâmico a vermelho

no centro (B).

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8 Abordagem Prática aos Antibióticos

1.1 Penicilinas naturais

As penicilinas naturais são a Penicilina V e a Penicilina G (também denominada de

benzilpenicilina). São eficazes contra: cocos Gram positivo, como Staphylococcus

aureus e epidermidis não produtores de beta-lactamases (<20% dos casos),

estreptococos (incluindo S. viridans), pneumococos e algumas estirpes de enterococos;

alguns bacilos Gram positivo, como Corynebacterium diphtheriae, Bacillus anthracis e

Listeria monocytogenes; alguns cocos Gram negativo, como Neisseria meningitidis e

gonorrhoeae; alguns bacilos Gram negativo, como Haemophilus influenzae; alguns

anaeróbios, como Clostridium; e outras bactérias como Treponema pallidum,

Actinomyces e Borrelia. Assim, as penicilinas naturais são utilizadas para tratar algumas

infecções como faringites ou amigdalites estreptocócicas, otites médias, endocardites

estreptocócicas, meningite meningocócica e pneumocócica e pneumonia

pneumocócica.

As principais reacções adversas passam por reacções de hipersensibilidade como

choque anafiláctico, mas também febre, urticária, dores articulares, trombocitopénia e

leucopénia.

A Penicilina V, penicilina natural oral, não existe actualmente no mercado nacional.

A Penicilina G (ou benzilpenicilina) é de administração intra-muscular ou

endovenosa (aquosa). Existe sob a forma de benzilpenicilina sódica (e.v.: 1-3 milhões

de unidades a cada 2 ou 4 horas; i.m.: 600.000 – 1.200.000 UI de 12-12h ou 24-24h) ou

benzilpenicilina potássica (e.v.: 300.000 – 1.200.000 UI de 3-3h ou 4-4h). É de uso

exclusivamente hospitalar.

A Penicilina benzatínica (Lentocilin S®) é de administração i.m., 1.200.000 UI ou

2.400.000 UI uma a três vezes por semana, e está indicada no tratamento de infecções

a Streptococcus pyogenes, sífilis e profilaxia da febre reumática.

A Penicilina procaínica é semelhante à benzatínica, existe para administração i.m.

de 600.000 a 1.200.000 UI de 12-12h ou 24-24h.

1.2 Aminopenicilinas

As aminopenicilinas são penicilinas semi-sintéticas cujo espectro de acção é mais

alargado que o das penicilinas naturais. Para além disso resistem ao pH ácido do

estômago, permitindo administração por via oral. Em Portugal podemos encontrar:

- amoxicilina – espectro semelhante ao das penicilinas naturais mais algumas

bactérias Gram negativo, como Haemophilus influenzae, algumas estirpes de E. coli

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Filipe César P. P de Araújo

9 Abordagem Prática aos Antibióticos

(resistência é hoje em dia muito significativa), Proteus mirabilis, Salmonella e Shigella.

São resistentes os estafilococos produtores de beta-lactamases, Klebsiella,

Enterobacter, Serratia, Yersinia e Pseudomonas. É de administração oral com

biodisponibilidade de 80%, não sendo alterada pela presença de alimentos no

estômago. O metabolismo hepático representa 10% e a excreção renal representa 70%

da eliminação. A amoxicilina é utilizada para tratamento de otites, infecções urinárias,

gonorreia, profilaxia de endocardite bacteriana e erradicação de Helicobacter pylori

(em associação a outros fármacos). A posologia é 250 – 1000 mg per os, a cada 8

horas, 500 mg a cada 8 horas i.m. e 500 – 1000 mg a cada 6 ou 8 horas e.v. (na

erradicação de H. pylori e na profilaxia da endocardite os esquemas são diferentes). As

formulações existentes são: orais líquidas e semi-sólidas de 250 mg/5 ml e 500 mg/ 5

ml (p.e. genérico, Clamoxyl®, Amplamox®, Oraminax®), orais sólidas de 500 mg (p.e.,

genérico, Amplamox®, Clamoxyl®, Cipamox®, Oraminax®, Flemoxin Solutab®) e orais

sólidas de 1000 mg (p.e., genérico, Amplamox®, Cipamox®, Flemoxin Solutab®,

Moxadent®, Oraminax® e Penamox®). A nível intra-hospitalar encontramos também

Clamoxyl® 500 mg para administração e.v. ou i.m.

- ampicilina – existe para administração oral, e.v. ou i.m., embora a baixa

biodisponibilidade e a absorção reduzida com a ingestão de alimentos limitem a via

oral (sendo a amoxicilina preferida). A posologia é 500 – 1000 mg a cada 6 ou 8h per

os, 1 – 2g cada 4 ou 6h por via e.v. Reduz a absorção oral de contraceptivos e atenolol.

O metabolismo hepático representa 10% e a excreção renal representa 70% da

eliminação. As formulações existentes são: orais líquidas e semi-sólidas de 50 mg/ml e

100 mg/ml (Hiperbiótico®), orais sólidas de 250, 500 e 1000 mg (Hiperbiótico®) e

parentéricas de 250 mg/ 2 ml e 500 mg/ 2 ml (Hiperbiótico®).

- amoxicilina + ácido clavulânico – associação entra uma aminopenicilina e um

inibidor das beta-lactamases, o que aumenta o espectro de actividade às bactérias

resistentes por produção de beta-lactamases como Staphylococcus (excepto

meticilina-resistentes, vide abaixo), Neisseria gonorrhoeae, Haemophilus influenzae,

Escherichia coli, Proteus mirabilis e vulgaris, Klebsiella, Salmonella e Shigella. Esta

associação é utilizada no tratamento de infecções respiratórias, bronquite crónica,

otite média, sinusite e infecções urinárias. A posologia é: 250 – 500 mg + 100 – 200 mg,

cada 8h ou cada 12h, por via oral; 1 – 2g + 100 – 200 mg cada 6h ou cada 8h, e.v. A sua

absorção não é afectada por alimentos. Alguns efeitos adversos comuns são náuseas,

diarreia, erupções cutâneas e hepatite colestática. As principais formulações são: orais

líquidas e semi-sólidas de 125mg/5ml + 31,25mg/5ml (p.e., genérico, Augmentin®,

Betamox®, Clavamox®, Clavepen®), de 250mg/5ml + 62,5mg/5ml (p.e. genérico,

Augmentin Forte®, Betamox®, Clavamox® 250, Clavepen Forte®), de 400mg/5ml + 57

mg/5ml (p.e., genérico, Augmentin Duo®, Betamox Plus 400®, Clavamox DT 400®) e de

600mg/5ml + 42,9mg/5ml (Augmentin ES®), orais sólidas de 500 mg + 125 mg (p.e.

genérico, Augmentin®, Betamox®, Clavamox® 500, Penilan®), de 875 mg + 125 mg

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Filipe César P. P de Araújo

10 Abordagem Prática aos Antibióticos

(p.e., genérico, Augmentin Duo®, Betamox® Plus, Clavamox® DT, Penilan® DT) e

parentéricas (Augmentin®) de 500 mg/10 ml + 50 mg/10 ml, 1000 mg/20 ml + 200

mg/20 ml, 2000mg + 200mg.

1.3 Isoxazolilpenicilinas

As isoxazolilpenicilinas são penicilinas semi-sintéticas cujo anel beta-lactâmico se

encontra protegido e assim não é inactivado pela maioria das beta-lactamases. Como

tal, as isoxazolilpenicilinas (como a meticilina, a dicloxacilina, a cloxacilina, a

flucloxacilina, a nafcilina, a oxacilina e a temocilina) são activas contra Staphylococcus

aureus produtores de beta-lactamases, mas são menos activas contra outros cocos

Gram positivo e negativo e são inactivas contra Enterococcus. As estirpes de

Staphylococcus aureus sensíveis a estas penicilinas são denominadas de Methicillin

Sensitive Staphylococcus Aureus (MSSA) pois a meticilina foi historicamente a primeira

isoxazolilpenicilina a ser desenvolvida e a ser utilizada, estando actualmente reservada

a uso laboratorial pela sua nefrotoxicidade. As estirpes resistentes denominam-se de

Methicillin Resistent Staphylococcus Aureus (MRSA). As isoxazolilpenicilinas são

utilizadas para tratar otites externas, pneumonias, impétigo, celulite, infecções da pele

e tecidos moles, osteomielites e endocardites estafilocócicas. Alguns importantes

efeitos adversos são hepatite colestática, aumento das transaminases e necrose

hepática. Os dois fármacos desta classe existentes em Portugal são:

- dicloxacilina – administrada apenas por via oral, 250 - 1000 mg de 6 em 6 horas

(Diclocil®, orais sólidas de 500 mg). Tem 95% de ligação a proteínas e é eliminada 10%

no fígado e 60% no rim. Os alimentos diminuem a sua absorção, daí que deva ser

administrado 1h a 30 minutos antes das refeições.

- flucloxacilina – existente para administração por via oral 250 – 1000 mg a cada 6

horas (Floxapen®, orais líquidas e semi-sólidas 250 mg/5 ml, orais sólidas 500 mg) e

parentérica (Floxapen®, 500 mg/ 2 ml) podendo ser administrada i.m. (250 – 500 mg a

cada 6 horas) ou e.v. (1 – 2 g cada 4 ou cada 6 horas). Quando per os deve também ser

administrado 1h a 30 minutos antes das refeições.

1.4 Carboxi e ureidopenicilinas

As carboxipenicilinas (carbenicilina e ticarcilina) e as ureidopenicilinas (piperacilina,

mezlocilina e azlocilina) são denominadas de penicilinas anti-pseudomonas. Em

Portugal existe comercializada apenas a piperacilina, que é activa contra cocos e

bacilos Gram-negativo (activa contra a maioria das Enterobacteriaceae), Neisseria,

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Filipe César P. P de Araújo

11 Abordagem Prática aos Antibióticos

Haemophilus influenzae, anaeróbios e algumas espécies de Acinetobacter spp. Estirpes

produtoras de beta-lactamases (como Staphylococcus aureus, N. gonorrhoeae,

Haemophilus influenzae, Enterobacteriaceae) são resistentes a estas penicilinas. A

piperacilina deve ser administrada 2 – 4 g por via e.v. a cada 6 ou 8 horas e deve ser

utilizada em infecções graves, em infecções intra-hospitalares, em infecções mistas de

aeróbios e anaeróbios, no tratamento de sépsis (em associação a aminoglicosídeos),

infecções abdominais e em doentes neutropénicos.

A associação entre piperacilina e o inibidor das beta-lactamases tazobactam

(piperacilina + tazobactam, denominado de Tazobac®) é muito utilizada a nível

hospitalar (por vezes até de forma excessiva), e tem todas as indicações referidas para

a piperacilina isolada mais S. aureus e bacilos Gram negativo produtores de beta-

lactamases. Deve ser administrado por via e.v., 4,5 g (4 g de piperacilina + 500 mg de

tazobactam) de 6 em 6 ou de 8 em 8 horas.

1.5 Amidinopenicilinas

A única amidinopenicilina comercializada em Portugal é o pivmecilinam (Selexid®,

orais sólidas de 200 mg). Deve ser administrado 400 a 800 mg/dia, em 2 a 4 doses

diárias. O seu espectro de acção são bactérias Gram negativo (como E. coli,

Enterobacter, Klebsiella, Salmonella, Shigella e Yersinia), tendo pouca actividade contra

bactérias Gram positivo. É inactivado por beta-lactamases e está indicado no

tratamento de infecções urinárias.

2. Cefalosporinas

As cefalosposrinas são antibióticos beta-lactâmicos estrutural e

farmacologicamente relacionados com as penicilinas. São bactericidas pois actuam da

mesma forma que as penicilinas, inibindo a síntese da parede celular. São eliminados

por via renal, requerendo ajuste da dose em doentes com clearance da creatinina < 50

ml/min. Existem consideráveis diferenças entre o espectro e o grau de actividade das

várias cefalosporinas, podendo dividi-las em gerações: 1ª, 2ª, 3ª e 4ª Gerações. As

cefalosporinas de 1ª Geração têm maior actividade contra bactérias Gram positivo e à

medida que vamos avançando nas gerações aumenta o espectro de bactérias Gram

negativo mas perde-se actividade contra as Gram positivo. Nenhuma das

cefalosporinas é activa contra Enterococcus ou MRSA.

As principais reacções adversas incluem intolerância GI (náuseas, vómitos, diarreia

e dores abdominais), eosinofilia, neutrofilia, trombocitopénia, aumento das

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Filipe César P. P de Araújo

12 Abordagem Prática aos Antibióticos

transaminases e icterícia colestática. Tal como com as penicilinas podem surgir

reacções de hipersensibilidade (exantema, urticária, prurido, artralgias, anafilaxia).

Cerca de 10% dos doentes com hipersensibilidade à penicilina desenvolvem

hipersensibilidade às cefalosporinas, pelo que estas estão contra-indicadas nesta

situação.

2.1 Cefalosporinas de 1ª Geração

As cefalosporinas de 1ª Geração possuem espectro de actividade contra cocos

Gram positivo, incluindo estafilococos produtores de beta-lactamases. A sua

actividade contra Gram negativos é limitada mas pode ser útil contra E. coli, Klebsiella,

Proteus, Salmonella, Shigella, Fusobacterium e Bacteroides (excepto B. fragilis). São

usadas no tratamento de amigdalites, faringites, sinusites, infecções urinárias,

infecções respiratórias e infecções da pele e tecidos moles. Alguns exemplos são:

- cefadroxil – por via oral, 1 a 2 g /dia de 12 em 12 horas ou em dose única (nas ITU);

(orais líquidas e semi-sólidas 50 mg/ml: Ceforal®; 100 mg/ml: genérico, Cefacile®,

Ceforal®; orais sólidas 500 mg: genérico, Cefacile®, Ceforal®; orais sólidas 1000 mg:

genérico, Cefacile®, Ceforal®);

- cefatrizina – por via oral, 750 mg a 1500 mg por dia de 8 em 8 ou de 12 em 12 horas

(orais líquidas e semi-sólidas de 50 mg/ml e orais sólidas de 500 mg, Macropen®);

- cefradina – outra indicação (para além das referidas) é profilaxia cirúrgica. Por via

oral 250 a 500 mg de 6 em 6 horas ou 500 mg a 1 g de 12 em 12 horas; por via i.m. ou

e.v. 500 mg a 1 g de 6 em 6 horas (orais líquidas e semi-sólidas de 250 mg/ 5 ml e 500

mg/ 5 ml: Cefradur®; orais sólidas de 500 mg e 1000 mg: genérico e Cefradur®);

- outros exemplos de cefalosporinas de 1ª Geração: cefalotina, cefazolina, cefapirina

e cefalexina;

2.2 Cefalosporinas de 2ª Geração

As cefalosporinas de 2ª geração são activas contra os mesmos microrganismos

que as de 1ª geração mas ainda mais contra as Gram negativo, incluindo Haemophilus

influenzae. A cefoxitina, o cefotetano, cefmetazol e cefamandol são activas contra

Bacteroides fragilis. Tal como as de 1ª geração são usadas no tratamento de

amigdalites, faringites, sinusites, infecções urinárias, infecções respiratórias e

infecções da pele e tecidos moles. Alguns exemplos são:

- cefaclor – por via oral, 250 a 500 mg de 8 em 8 horas (orais líquidas e semi sólidas de

250 mg/ 5 ml e 375 mg/ 5 ml: Ceclor®; orais sólidas de 500 mg: genérico, Ceclor®;

orais sólidas de 750 mg: Ceclor® Retard);

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Filipe César P. P de Araújo

13 Abordagem Prática aos Antibióticos

- cefeprozil – por via oral, 250 a 500 mg de 12 em 12 ou de 24 em 24 horas (orais

líquidas e semi-sólidas de 250 mg/ 5 ml: Procef®, Radacefe®; orais sólidas de 500 mg:

Procef®, Radacefe®);

- cefonicida – via i.m. ou e.v., 1g por dia (parentéricas de 1000 mg/ 2,5 ml: Monocid®);

- cefuroxima – por via oral, 250 a 500 mg de 12 em 12 horas (cefuroxima axetil), ou

por via i.m. ou e.v., 750 mg de 6 em 6 ou de 8 em 8 horas (orais líquidas e semi-sólidas

125 mg/ 5 ml e 250 mg/ 5 ml: Zipos® e Zoref®; orais sólidas de 250 mg e de 500 mg;

genéricos, Zipos®, Zoref®; parentéricas de 750 mg: Curoxime®);

2.3 Cefalosporinas de 3ª Geração

As cefalosporinas de 3ª Geração são menos activas contra estafilococos mas

têm um espectro muito mais alargado para bactérias Gram negativo quando

comparadas com as cefalosporinas de 1ª e 2ª Geração (todas as Gram negativo destas

mais Citrobacter, Enterobacter, Morganella, Serratia, Neisseria, Bordetella,

Aeromonas, entre outras). A ceftazidima é a única cefalosporina de 3ª Geração com

actividade contra Pseudomonas aeruginosa. Cefetamet pivoxil, cefixima, cefpodoxima,

ceftibuteno e cefditoreno têm administração oral. A cefotaxima, a ceftriaxona e a

ceftizoxima têm boa difusão no Sistema Nervoso Central. Alguns exemplos existentes

em Portugal são:

- Cefditoreno – orais sólidas de 200 mg, Spectracef® 200; 200 a 400 mg de 12 em 12

horas durante 10 a 14 dias;

- Cefetamet – via oral, 500 mg a 1 g de 12 em 12 horas em infecções respiratórias, 2 g

por dia no tratamento de infecções urinárias. Disponível apenas a nível intra-

hospitalar;

- Cefixima – orais líquidas e semi-sólidas 20 mg/ml: genérico, Cefimix®, Tricef®; orais

sólidas de 400 mg: genérico, Cefimix®, Neocef® e Tricef®. A posologia deverá ser 200 a

400 mg por dia ou de 12 em 12 horas. Para além de infecções urinárias e infecções

respiratórias pode também ser usado no tratamento de otites médias.

- Cefodizima – exclusivamente parentérico, 1000 mg/ 4 ml e 2000 mg/ 10 ml

(Modivid®); 1 a 4 g/dia e.v. ou i.m. em dose única ou de 12 em 12 horas;

- Cefotaxima – exclusivamente parentérico, 1000 mg/ 4 ml (Ralopar®); 1 a 2 g de 8 em

8 horas (até 2 g de 4 em 4 horas). É usado em infecções graves sobretudo por

bactérias Gram negativo multirresistentes;

- Ceftazidima – exclusivamente parentérico (Cefortam®), 1 g de 8 em 8 horas (2 g de 8

em 8 horas nas infecções graves). É usado em infecções graves, sobretudo por

bactérias Gram negativo multirresistentes e infecções por Pseudomonas aeruginosa;

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Filipe César P. P de Araújo

14 Abordagem Prática aos Antibióticos

- Ceftriaxona – exclusivamente parentérica, 250 mg/ 2 ml e 500 mg / 2 ml (genérico,

Rocephin®), 250 mg/ 5 ml (genérico), 500 mg / 5 ml (genérico), 1000 mg/ 3,5 ml, 1000

mg / 10 ml e 2000 mg (genérico, Rocephin®). Deve ser administrado 1 g/ dia ou 2 a 4 g

de 12 em 12 horas nas infecções graves;

2.4 Cefalosporinas de 4ª Geração

As cefalosporinas de 4ª Geração apresentam espectro alargado contra

bactérias Gram negativo comparando com cefalosporinas de 1ª e 2ª Geração. São

activas in vitro contra Pseudomonas aeruginosa e Enterobacteriaceae. A Cefepima

(Maxipime®, 1000 mg e.v. ou i.m.) tem actividade semelhante à ceftazidima para P.

aeruginosa e é mais activa que as cefalosporinas de 3ª geração contra

Enterobacteriaceae produtoras de beta-lactamases. Tal como as restantes

cefalosporinas são inactivas contra enterococos e estafilococos meticilina-resistentes.

3. Monobactâmicos

Os monobactâmicos inibem a síntese da parede bacteriana. O Aztreonam

(Azactam®, parentérico de 1000 mg/ 3 ml) é o único representante desta classe e é

activo contra bactérias aeróbias Gram negativo (incluindo Enterobacteriaceae, P.

aeruginosa, Yersinia, Pasteurella, Plesiomonas, Aeromonas, H. influenzae e Neisseria)

independentemente da produção de beta-lactamases. A posologia é 1 g de 8 em 8

horas ou 2 g de 12 em 12 horas (nos casos graves podem ser usados 2 g de 6 em 6 ou

de 8 em 8 horas). Pode originar elevação moderadas das aminotransferases, do Tempo

de Protrombina e do Tempo Parcial de Tromboplastina Activado.

4. Carbapenemes

Os carbapenemes são antibióticos beta-lactâmicos que incluem o Imipenem

(Tienam®, 500 mg e.v. de 8 em 8 horas; 1 g e.v. de 8 em 8 horas se infecção grave), o

Meropenem (Meronem®, 500 mg a 1 g e.v. de 8 em 8 horas) e o Ertapenem (Invanz®,

1 g e.v./ dia). Os carbapenemes actuam pela inibição da síntese do peptidoglicano

bacteriano por ligação às PBP (o imipenem liga-se às PBP 1 e 2 e o meropenem liga-se

às PBP 2 e 3). A ligação preferencial às PBP permite uma lise rápida das bactérias. Do

ponto de vista farmacocinético, o imipenem é metabolizado pela enzima dehidro-

peptidase I das células tubulares renais em metabolitos altamente tóxicos para o rim.

Como tal, o imipenem é administrado em combinação 1:1 com a cilastina, inibidora da

enzima que assim neutraliza a toxicidade renal deste fármaco. O meropenem também

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Filipe César P. P de Araújo

15 Abordagem Prática aos Antibióticos

é excretado por via renal mas não é metabolizado pela enzima em metabolitos tóxicos,

não precisando por isso de cilastina. Alterações da função renal afectam a cinética de

eliminação destes fármacos. Estes fármacos são também metabolizados a nível

pulmonar. Os carbapenemes têm boa penetração no tecido pulmonar, no Sistema

Nervoso Central e líquor, no humor aquoso, nas vias biliares e vesícula, líquido intra-

peritoneal e diferentes tecidos inflamados.

Os carbapenemes são os antibióticos de espectro de acção mais alargado, sendo

eficazes contra bactérias Gram negativo e positivo, aeróbias ou anaeróbias, e sendo

altamente resistentes à hidrólise provocada pela maioria das beta-lactamases. Os

agentes resistentes são apenas Xanthomonas maltophilia, Burkholderia cepacia,

Acinetobacter e enterococos. P. aeruginosa tem resistência variável. O principal

mecanismo pelo qual se dá esta resistência consiste na perda de canais de porina da

superfície bacteriana, diminuindo a penetração do antibiótico. Não origina resistência

cruzada com outros beta-lactâmicos.

Em relação às indicações clínicas, os carbapenemes devem ser utilizados em

monoterapia no tratamento de situações clínicas graves ou muito graves, sobretudo as

que não responderam anteriormente a antibioticoterapia. Não devem ser usados

profilacticamente. Devem ser usados no tratamento de infecções intra-abdominais e

obstétricas/ ginecológicas (que são provocadas maioritariamente por bacilos Gram

negativo, aeróbios e anaeróbios), infecções do tracto respiratório inferior (não é

terapêutica de primeira linha, devendo ser usados de imediato se pneumococos

altamente resistente à penicilina ou pneumonia nosocomial a S. aureus ou P.

aeruginosa), infecções em doente neutropénico febril, meningites bacterianas agudas

(mais uma vez não são usados como primeira linha; o imipenem-cilastina é contra-

indicado pelo potencial epileptogénico).

Os carbapenemes têm bom perfil de segurança. O meropenem não apresenta

toxicidade renal. O imipenem apresenta potencial epileptogénico, mais acentuado na

doença pré-existente do SNC e em doses mais elevadas. Raramente surgem náuseas,

vómitos ou diarreia. Os efeitos sobre a flora comensal intestinal são mínimos devido à

baixa penetração dos fármacos no intestino.

5. Glicopéptidos

Os glicopéptidos são uma classe de antibióticos que inclui a vancomicina e a

teicoplanina e que actua através da inibição da síntese da parede celular bacteriana,

embora de forma diferente da verificada nos beta-lactâmicos. O mecanismo de acção

consiste assim na ligação à terminação D-ALANINA-D-ALANINA do pentapéptido da

subunidade de peptidoglicano bacteriano, o que inibe a formação de novas ligações

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Filipe César P. P de Araújo

16 Abordagem Prática aos Antibióticos

cruzadas entre as subunidades. A camada de peptidoglicano fica enfraquecida e

susceptível a lise.

Os glicopéptidos são utilizados para tratar infecções graves por microrganismos

Gram-positivo (estafilococos, pneumococos) como sépsis ou endocardites. Os

microrganismos Gram-negativo são naturalmente resistentes a estes fármacos pela

incapacidade destes em penetrar na parede bacteriana. Podem ainda ser usados na

alergia à penicilina. Tanto vancomicina como teicoplanina podem ser administrados

oralmente mas apenas no tratamento de colite pseudomembranosa por Clostridium

difficile, já que têm pouca absorção intestinal e assim atingem concentrações eficazes

no cólon (no entanto, são preteridos em relação ao metronidazol já que provocam o

surgimento de enterococos resistentes no intestino grosso).

A resistência aos glicopéptidos deve-se a uma modificação no seu alvo nos

peptidoglicanos, ou seja, a terminação D-ALANINA-D-ALANINA passa a D-ALANINA-D-

LACTATO, que assim deixa de ser reconhecida pelos antibióticos. Esta resistência pode

ser encontrada em alguns estafilococos e enterococos e é codificada pelo gene van A.

As reacções adversas são pouco frequentes e incluem alergia (febre, exantema,

eosinofilia) e nefrotoxicidade (em particular com administração simultânea de

aminoglicosídeo, anfotericina B, ciclosporina ou furosemido).

- teicoplanina (Targosid® 200 mg i.m. ou e.v.), 400 mg e.v. ou i.m. de 12 em 12h

seguidos de dose única diária. Excreção maioritariamente renal. Tem maior actividade

contra enterococos que a vancomicina;

- vancomicina (Glipep® LP, genérico), 1g de 12 em 12 horas dissolvida em 100 –

250 ml de 5% dextrose em água ou solução salina, ou 125 – 500 mg per os a cada 6h.

Excreção maioritariamente renal. É bacteriostático contra enterococos mas torna-se

bactericida se associarmos um aminoglicosídeo;

6. Macrólidos

Os macrólidos são um grupo de antibióticos cujo protótipo é a eritromicina, sendo

a claritromicina e a azitromicina derivados semi-sintéticos. Actuam todos da mesma

forma, através da inibição da síntese proteica bacteriana por ligação à subunidade 50 S

do ribossoma, bloqueando assim a junção das duas subunidades.

A eritromicina (orais líquidas e semi-sólidas de 250 mg/ 5 ml, 500 mg/ 5 ml e de

1000 mg: Eritrocina®; orais sólidas de 500 mg: ESE® 500) deve ser administrada per os

250 a 500 mg de 6 em 6 horas ou e.v. 500 mg a 1000 mg de 6 em 6 horas. É eficaz

contra bactérias Gram positivo (como estreptococos, estafilococos, pneumococos e

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Filipe César P. P de Araújo

17 Abordagem Prática aos Antibióticos

corinebactérias), Mycoplasma, Legionella, Chlamydophila trachomatis, C. psittaci e C.

pneumoniae, Helicobacter, Listeria, algumas micobactérias (M. kansasii e

scrofulaceum), Neisseria, Bartonella (henselae e quintana), Bordetella pertussis,

Treponema pallidum, Campylobacter e algumas Rickettsiaceae. Assim, as principais

indicações clínicas da eritromicina são infecções por corinebactérias (difteria, sépsis,

eritrasma), infecções respiratórias, neonatais, oculares ou genitais por Chlamydia, e

pneumonias adquiridas na comunidade (por cobrir pneumococos, Mycoplasma e

Legionella). Pode ser usada na alergia à penicilina. O surgimento de resistência em

estirpes de estreptococos beta-hemolíticos do grupo A e em pneumococos tornaram a

eritromicina menos atractiva para tratamento de amigdalites, infecções de tecidos

moles e pneumonia por estes agentes.

A resistência à Eritromicina surge por três mecanismos: 1) diminuição da

permeabilidade da membrana celular ou efluxo activo, 2) produção de esterases que

hidrolizam os macrólidos, 3) modificação do alvo (ribossoma) por mutação

cromossómica ou metilase. A produção de uma metilase (que vai alterar a subunidade

50 S tornando-a irreconhecível para o antibiótico) confere resistência contra outras

classes de antibióticos como a clindamicina e as estreptograminas B (fenótipo de

resistência MLSB, codificado pelo gene erm). Resistência à eritromicina confere

resistência aos outros macrólidos.

Como efeitos adversos, a eritromicina pode provocar náuseas, vómitos, diarreia

quando administrada oralmente o que se deve ao seu efeito estimulante gastro-

intestinal. Pode provocar ainda hepatite aguda colestática. Muito importantes são as

interacções medicamentosas da eritromicina que inibe o citocrómio P450 e aumenta a

concentração de teofilina, anticoagulantes orais, ciclosporina, metilprednisolona, entre

muitos outros.

A claritromicina (orais líquidas e semi-sólidas de 25 mg/ ml e 50 mg/ ml – Klacid®

e genérico; orais sólidas de 250 mg e de 500 mg – Klacid® e genérico) é um derivado

semi-sintético da eritromicina e deve ser administrado por via oral 250 mg de 12 em

12 horas ou 500 mg de 12 em 12 horas nas infecções graves, e por via e.v. 500 mg de

12 em 12 horas. É activo contra todas as bactérias enunciadas para a eritromicina e

ainda Mycobacterium avium e leprae e Toxoplasma gondii. Apresenta boa penetração

e a dose deve ser reduzida se clearance de creatinina for inferior a 30 ml/min.

Apresenta menor intolerância gastrointestinal que a eritromicina e administração

menos frequente (12 em 12 horas VS 6 em 6 horas), contudo é mais cara.

A azitromicina (orais líquidas e semi-sólidas 40 mg/ ml: Azitrix®, Unizitro®,

Zithromax®, genérico; orais líquidas e semi-sólidas de 200, 300 e 400 mg: Zithromax®;

orais sólidas de 500 mg: genérico, Zithromax®) é também um derivado semi-sintético

da eritromicina e deve ser administrado por via oral, 500 mg a cada 24h durante 3 dias

(1 g em dose única nas infecções genitais a Chlamydia), e por via e.v. 500 mg/ dia. O

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Filipe César P. P de Araújo

18 Abordagem Prática aos Antibióticos

espectro de acção é semelhante ao da claritromicina sendo mais activo contra

Haemophilus influenzae. Tem administração única diária e duração curta de

tratamento. Deve ser administrado uma hora antes ou duas horas depois das

refeições. Não interfere com o citocrómio e assim não apresenta as interacções

medicamentosas verificadas com a eritromicina e claritromicina.

Outros macrólidos são a espiramicina (orais sólidas: Rovamycine® 500, 1g de 8 em

8 horas), roxitromicina (orais sólidas 150 mg: genérico, Rulide®; orais sólidas 300 mg:

Inferoxin®, Odontocina®, genérico; 150 mg de 12 em 12 horas durante 10 dias) e a

telitromicina (orais sólidas de 400 mg: Ketek®, 800 mg uma vez por dia durante 7 a 10

dias na pneumonia da comunidade e durante 5 dias nas restantes indicações). A

telitromicina é eficaz contra microrganismos que são resistentes aos restantes

macrólidos pela sua estrutura química única.

7. Tetraciclinas

As tetraciclinas são antibióticos bacteriostáticos de largo espectro qua penetram

na bactéria por difusão passiva e através de transporte activo. Uma vez no interior

ligam-se à subunidade 30 S do ribossoma bacteriano e impedem a junção de novos

aminoácidos ao péptido em crescimento. São eficazes contra muitas bactérias Gram

positivo e negativo, incluindo anaeróbios, Mycoplasma, Chlamydiaceae,

Rickettsiaceae, entre outras. As estirpes resistentes à tetraciclina podem permanecer

sensíveis à doxiciclina e minociclina pelo facto de estas serem menos rapidamente

transportadas pelas bombas de efluxo, principal mecanismo de resistência contra

tetraciclinas (codificada por plasmídeo). Dado este espectro de acção, as tetraciclinas

são o fármaco de escolha no tratamento de infecções por Mycoplasma pneumoniae,

Chlamydia (incluindo doenças sexualmente transmitidas por este agente),

espiroquetas, Vibrio (incluindo cólera), erradicação de Helicobacter pylori, infecções

parasitárias como Entamoeba histolytica (amebíase) e Plasmodium falciparum

(malária), doença de Lyme (Borrelia burgdorferi), leptospirose (Leptospira interrogans)

e algumas micobactérias não-tuberculosas. São ainda usadas no tratamento de acne

(minociclina), pneumonias da comunidade, exacerbações de bronquite crónica e

quando associadas a um aminoglicosídeo tularémia, peste e brucelose.

Existem algumas características farmacocinéticas importantes. A absorção oral é

máxima com a doxiciclina e minociclina e mínima com a clortetraciclina. Ocorre no

intestino delgado e é inibida pelos alimentos (excepto doxiciclina e minociclina),

catiões divalentes (cálcio, magnésio, ferro), derivados do leite, antiácidos e pH alcalino.

A doxiciclina, ao contrário das outras tetraciclinas, não é eliminada pelo rim e não se

acumula na insuficiência renal, sendo o fármaco de eleição nesta situação.

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Filipe César P. P de Araújo

19 Abordagem Prática aos Antibióticos

As principais reacções adversas são de natureza gastrointestinal com náuseas,

vómitos e diarreia por irritação directa do tracto GI. Para além disso as tetraciclinas,

como antbióticos de largo espectro, alteram a flora comensal com supressão dos

microrganismos coliformes (como E. coli) e sobrecrescimento de Pseudomonas,

estafilococos, Proteus, Clostridia e Candida, o que pode originar alterações funcionais

do intestino, candidíase ou colite pseudomembranosa. Outro efeito adverso

extremamente importante das tetraciclinas é a hipoplasia do esmalte dentário e a

deformidade óssea que resultam da ligação destes antibióticos ao cálcio de osso e

dentes em crescimento. Assim, as tetraciclinas são contra-indicadas em mulheres

grávidas e crianças com menos de 8 anos. Podem causar ainda alterações da função

hepática.

As formulações existentes em Portugal são:

- tetraciclina: orais sólidas de 500 mg (Ciclobiótico®), 250 a 500 mg de 6 em 6

horas per os;

- doxiciclina: orais líquidas e semi-sólidas de 100 mg (Actidox® e Vibramicina®),

orais sólidas de 20 mg (Periostat®) e 100 mg (Doxytrex®, Pluridoxina®, Sigadoxin®); 100

mg diários ou de 12 em 12 horas per os. Existe também para administração

parentérica, 100 mg cada 12 – 24 h e.v.;

- minociclina: orais sólidas de 100 mg (Minocin® e Minotrex®), 100 mg de 12 em

12 horas per os;

8. Cloranfenicol

O cloranfenicol é um antibiótico bacteriostático que actua pela inibição da síntese

proteica bacteriana através da ligação à subunidade 50 S do ribossoma. O seu espectro

de acção é muito largo, incluindo muitas bactérias Gram positivo e Gram negativo e

ainda anaeróbios. Algumas espécies bacterianas são: Corynebacterium diphtheriae,

Bacillus anthracis, Haemophilus influenzae tipo b, Haemophilus ducreyi, Bordetella

pertussis, Neisseria meningitidis e gonorrhoeae, Salmonella typhi, Campylobacter

jejuni, Bacteroides fragilis, Chlamydia trachomatis, Shigella sonnei, Francisella

tularensis, Rickettsiaceae, Coxiella burnetii, Pasteurella multocida, Listeria

monocytogenes, Leptospirae, Mycoplasma, entre outros. No entanto, nos países

desenvolvidos o cloranfenicol tem pouca utilização actualmente como fármaco

sistémico em virtude dos perigosos efeitos adversos, sendo maioritariamente utilizado

topicamente para tratamento de conjuntivites. Devido ao seu baixo preço, continuará

a ser um fármaco de eleição nos países subdesenvolvidos para tratamento de muitas

infecções, incluindo febre tifóide e cólera.

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Filipe César P. P de Araújo

20 Abordagem Prática aos Antibióticos

Tem administração oral, tópica mas também parentérica (i.m. e e.v.). Tem boa

penetração em múltiplos tecidos, incluindo fígado, baço, linfa, bílis, saliva, líquor e

líquidos pleural, ascítico, pericárdico e sinovial. É excretado no rim sob a forma

glicurono-conjugada (glicurono-conjugação no fígado).

Os efeitos adversos do cloranfenicol são graves e de natureza hematológica

(anemia aplásica irreversível, agranulocitose, trombocitopenia extrema). Mais

raramente podem surgir nevrite óptica, alopécia, intolerância gástrica, diarreia, colite

pseudomembranosa e hipersensibilidade cutânea. Nos recém-nascidos (sobretudo

prematuros) nunca se deve prescrever cloranfenicol pelo risco de Síndrome do Bebé

Cinzento, com hipotensão grave, cianose e elevada mortalidade. Esta síndrome surge

pela imaturidade enzimática do sistema de glicurono-conjugação hepático, o que leva

a uma muito maior quantidade de forma não conjugada, que é tóxica.

As posologias existentes são:

- aplicação tópica ocular (Clorocil®, Micetinoftalmina®)

- via oral, orais líquidas de 125 mg/ ml; orais sólidas de 250 mg; o cloranfenicol deve

ser administrado 750 mg de 6 em 6 horas;

- parentérico (i.m. ou e.v.), 100 mg;

9. Clindamicina

A Clindamicina é uma lincosamida que actua através da inibição da síntese

proteica bacteriana por ligação à subunidade 50 S do ribossoma. É eficaz contra

estreptococos, estafilococos, pneumococos e anaeróbios (Gram positivo e negativo).

Enterococos, Clostridium difficile e bactérias aeróbias Gram negativo são resistentes

(estas últimas por baixa permeabilidade da membrana externa). A clindamicina tem

então indicação para tratamento de infecções anaeróbias graves. Quando em

combinação com aminoglicosídeos ou cefalosporinas são ideais para tratar lesões

penetrantes do abdómen, infecções ginecológicas (como aborto séptico ou abcesso

pélvico) ou pneumonia de aspiração. Farmacocineticamente há a referir boa

penetração nos tecidos incluindo em abcessos. Os principais efeitos adversos são

náuseas, diarreia, exantema cutâneo, alterações da função hepática, neutropénia e

colite pseudomembranosa.

- orais sólidas de 150 mg: Dalacin C®; 150 a 300 mg de 6 em 6 horas;

- parentéricas (i.m. ou e.v.): soluções de 150 mg/ ml, 600 mg de 8 em 8 ou de 12 em 12

horas;

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Filipe César P. P de Araújo

21 Abordagem Prática aos Antibióticos

10. Estreptograminas

As estreptograminas são usadas em associação: quinupristina (estreptogramina B)

e dalfopristina (estreptogramina A), numa razão de 30:70, respectivamente. A

dalfopristina liga-se à subunidade 50 S do ribossoma bacteriano, alterando a sua

conformação e aumentando a afinidade para a quinupristina. A ligação destes

antibióticos inibe a síntese proteica bacteriana. São activos contra cocos Gram

positivo, incluindo estreptococos multiresistentes, pneumococos resistentes à

penicilina, MSSA e MRSA, e Enterococcus faecium (mas não E. fecalis, que é

naturalmente resistente por produção de uma bomba de efluxo). Assim, as

estreptograminas são usadas para tratamento de infecções por E. faecium resistente à

vancomicina, pneumonias e bacteriémias por MRSA, estreptococos e pneumococos

resistentes à penicilina.

A eliminação é hepática. O efeito adverso mais comum é dor no local de

administração e síndrome mialgia-artralgia.

A formulação existente é parentérica para administração endovenosa, 500 mg a

cada 8 – 12 horas.

11. Oxazolidinonas

O linezolide é o membro desta classe de antibióticos sintéticos que actua por

ligação à subunidade 50 S do ribossoma bacteriano inibindo assim a sua síntese

proteica. Tem efeito bacteriostático. É eficaz contra microrganismos Gram positivo

incluindo estreptococos, estafilococos, enterococos, cocos anaeróbios e bacilos como

Corynebacterium e Listeria. O linezolide deve ser utilizado para tratar infecções graves

por microrganismos Gram positivo multiresistentes a nível intra-hospitalar, apenas.

Como efeitos adversos pode originar trombocitopénia ou neutropénia leves e

reversíveis; também náuseas, vómitos, diarreia, colite pseudomembranosa e

candidíase. As formulações existentes são:

- orais sólidas de 600 mg; devem ser administrados 600 mg de 12 em 12 horas;

- parentéricas: endovenosa, 600 mg de 12 em 12 horas;

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Filipe César P. P de Araújo

22 Abordagem Prática aos Antibióticos

12. Aminoglicosídeos

Os aminoglicosídeos são antibióticos bactericidas que actuam pela ligação à

subunidade 30 S do ribossoma bacteriano e inibição da síntese proteica bacteriana.

Isto provoca a incorporação de proteínas anómalas na membrana celular e efluxo de

moléculas e iões, destruindo a bactéria. São activos contra a maioria das bactérias

Gram negativo incluindo Pseudomonas aeruginosa. Na prática clínica, estes

antibióticos são associados aos beta-lactâmicos (pelo seu efeito sinérgico) no

tratamento de sépsis a bactérias Gram-negativo e no tratamento de endocardite a

enterococos e estreptococos. Para penetrarem nas células dependem de um

mecanismo oxidativo (à base de oxigénio), pelo que são ineficazes contra

microrganismos anaeróbios. Não são absorvidos quando administrados oralmente,

sendo usados parentericamente. Os aminoglicosídeos são eliminados por via renal

sendo necessário um ajustamento posológico (aumento do intervalo de administração)

nos doentes com insuficiência renal. Recomenda-se a monitorização das

concentrações séricas uma vez que são fármacos com uma margem terapêutica

estreita. A administração dos aminoglicosídeos em dose única diária parece ser tão ou

mais eficaz e tão ou menos tóxica que os regimes convencionais em doses múltiplas.

Em relação aos efeitos adversos, os aminoglicosídeos são nefrotóxicos (5 a 25%

dos casos) pois acumulam-se nas células tubulares e originam necrose tubular aguda.

Está contra-indicada a associação com outros fármacos nefrotóxicos como os

diuréticos ou alguns antibióticos. Por poderem bloquear a transmissão neuro-muscular

e provocarem paragem respiratória estão contra-indicados em doentes com miastenia

gravis ou hipocalcémia. Os aminoglicosídeos são ainda ototóxicos irreversíveis (5% dos

casos).

A resistência surge por impermeabilização da membrana externa, inactivação

enzimática ou alteração dos ribossomas.

Alguns dos fármacos desta classe são:

- gentamicina (Garalone®, genérico), parentéricas de 10 mg/ 1 ml, 20 mg/ 0.5 ml, 40

ml/ 1 ml, 80 mg/ 2 ml, 160 mg/ 2 ml; deve ser administrado 2 a 5mg/kg/dia, a cada 8

ou 12 horas ou preferencialmente em dose única diária;

- netilmicina (Netromicina®), parentéricas de 15 mg/ 1.5 ml, 50 mg/ 1 ml, 100 mg/ 1

ml, 150 mg/ 1.5 ml, 200 mg/ 2 ml; deve ser administrada i.m. ou e.v. 4 a 6 mg/kg/dia a

cada 8 ou 12 horas ou preferencialmente em dose única diária;

- tobramicina (Distobram®), parentéricas de 100 mg/ 2 ml ou 150 mg/ 3 ml; deve ser

administrado i.m. ou e.v. 3 a 5 mg/kg/dia a cada 8 horas ou preferencialmente em

dose única diária;

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Filipe César P. P de Araújo

23 Abordagem Prática aos Antibióticos

- outros fármacos: estreptomicina (usada como anti-tuberculoso e na brucelose;

pouca nefro e ototoxicidade); canamicina e neomicina (quando per os são úteis para

preparar cólon para cirurgia; a neomicina é usada para controlo da flora comensal do

cólon em doentes com encefalopatia hepática) e amicacina.

13. Sulfonamidas e associação com Trimetoprim

As sulfonamidas foram os primeiros antibióticos a ser utilizados na prática clínica.

Têm efeito bacteriostático. São activas contra bactérias Gram positivo (excepto

enterococos) e Gram negativo (como Neisseria, Haemophilus influenzae e

Enterobacteriaceae), Actinomyces, Nocardia, Chlamydia, Plasmodium e Toxoplasma

gondii.

O mecanismo de acção das sulfonamidas consiste na inibição da síntese de

tetrahidrofolato (essencial na síntese das purinas) através da ligação e inibição da

enzima dihidropteroato sintase (ver Figura 2).

Figura 2 – Mecanismo de acção das Sulfonamidas e do Trimetoprim.

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24 Abordagem Prática aos Antibióticos

Os principais efeitos adversos das sulfonamidas são: intolerância gástrica,

toxicidade hepática, leucopénia, trombocitopénia, agranulocitose, anemia hemolítica

ou aplasia medular. As sulfonamidas competem com vários fármacos pela ligação à

albumina, aumentando assim a actividade de anticoagulantes orais, sulfunilureias,

metotrexato, fenitoínas, entre outros. A única sulfonamida isolada comercializada em

Portugal é a sulfadiazina (Labdiazina®, 2 a 4 g na primeira toma, seguidos por 500 mg –

1 g cada 4 a 6 horas, per os ou e.v.).

Uma das mais utilizadas associações de antibióticos em Portugal consiste numa

sulfonamida, o sulfametoxazol, e no trimetoprim, na proporção 5:1. Esta associação

denomina-se de Co-trimoxazol. O trimetoprim vai actuar sinergicamente com as

sulfonamidas já que inibe outro passo fundamental da síntese do tetrahidrofolato ao

ligar-se à dihidrofolato reductase (ver Figura 2). A associação Sulfametoxazol –

Trimetoprim tem efeito bactericida. A afinidade destes antibióticos para as enzimas

humanas envolvidas na síntese do tetrahidrofolato é mínima, daí que a síntese das

purinas humanas não seja afectada.

Na prática clínica, são activos contra MRSA, Moraxella catarrhalis, Burkholderia

cepacia, Stenotrophomonas maltophilia, Listeria, Nocardia, Pneumocystis jiroveci,

Plasmodium spp. e algumas micobactérias atípicas. Esta associação é utilizada no

tratamento de pneumonias a Pneumocystis jiroveci, shigellose, doença invasiva por

Salmonella, infecções urinárias complicadas, prostatite e infecções por micobactérias

não tuberculosas. Actualmente 50% das estirpes de Shigella, Proteus e Haemophilus

são resistentes, assim como 30% das E. coli.

As formulações de co-trimoxazol existentes são:

- orais líquidas e semi-sólidas de 200 mg/ 5ml + 40 mg/ 5 ml (Bactrim®, Septrin®);

- orais sólidas de 400 mg + 80 mg (Septrin®) e de 800 mg + 160 mg (Bactrim® Forte,

Septrin® DS, genérico); deve ser administrado 1 a 2 comprimidos de associação a cada

12 horas;

- parentéricas (genérico) 400 mg/ 5 ml + 80 mg/ 5 ml, 960 mg de 12 em 12 horas;

14. Quinolonas

As quinolonas são antibióticos estruturalmente relacionados com o ácido

nalidíxico aos quais se adicionou um grupo fluor, passando assim a designar-se de

fluoroquinolonas. Estas quinolonas primordiais (ácido nalidíxico, cinoxacina) não

atingem boas concentrações sistémicas e como tal são apenas utilizadas no

tratamento de infecções urinárias baixas.

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25 Abordagem Prática aos Antibióticos

As fluoroquinolonas são dos mais recentes e importantes antibióticos introduzidos

no mercado. Existem várias gerações destes fármacos (ver Quadro 1). Actuam através

da inibição da síntese de DNA bacteriano pela inibição de duas enzimas envolvidas no

relaxamento do DNA durante a sua replicação: a DNA girase e a DNA topoisomerase

IV. A inactivação destas duas enzimas leva à criação de tensões e lesão irreversível no

ácido nucleico bacteriano.

Quadro 1 – As diversas gerações de quinolonas.

As fluoroquinolonas têm acção contra bactérias Gram negativo e algumas contra

bactérias Gram positivo. A ciprofloxacina, a enoxacina, a lomefloxacina, levofloxacina,

ofloxacina e pefloxacina apresentam excelente acção contra bactérias Gram negativo

(Enterobacteriaceae, Pseudomonas, Neisseria, Haemophilus e Campylobacter) e

moderada a boa actividade contra as Gram positivo (MSSA). A ciprofloxacina é a mais

activa contra P. aeruginosa. A levofloxacina, gatifloxacina, moxifloxacina,

sparfloxacina e trovafloxacina têm actividade melhorada contra as Gram positivo,

incluindo Streptococcus pneumoniae e alguns estafilococos, mas menos contra as

Gram negativo. As fluoroquinolonas são ainda eficazes contra agentes atípicos de

pneumonia, como Mycoplasma e Chlamydia, Legionella, Mycobacterium tuberculosis e

avium.

As fluoroquinolonas podem ser usadas no tratamento de infecções urinárias,

mesmo quando provocadas por agentes multi-resistentes. Podem também ser usadas

no tratamento de diarreia por Shigella, Salmonella, E. coli enterotoxigénica ou

Campylobacter. A levofloxacina, a gatifloxacina e a moxifloxacina são denominadas de

quinolonas respiratórias devido ao facto de serem utilizadas no tratamento de

pneumonias da comunidade e bronquites crónicas agudizadas. Outras utilizações para

as fluoroquinolonas são infecções dos tecidos moles, osso, articulações, intra-

abdominais, infecções gonocócicas e uretrite a Chlamydia (cipro e ofloxacina). Podem

ainda ser usadas na legionelose e tuberculose.

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26 Abordagem Prática aos Antibióticos

Têm excelente absorção e distribuição após toma oral. A excreção é renal (excepto

trova e moxifloxacina).

São muito bem toleradas, podendo provocar náuseas, vómitos e diarreia. As

fluoroquinolonas podem lesar as cartilagens de crescimento causando artropatia.

Assim, não são recomendadas a menores de 18 anos e a grávidas. Podem causar

ainda tendinite com risco de rotura de tendão. As quinolonas respiratórias podem

causar prolongamento do intervalo QTc, não sendo recomendadas em doentes com

QTc prolongado, a tomar anti-arrítmicos classe I ou III, eritromicina ou antidepressivos

tricíclicos.

Algumas das formulações usadas são:

- ciprofloxacina: orais líquidas e semi-sólidas de 100 mg/ ml, 250 mg/ 2.5 ml, 500 mg/

5 ml (genérico); orais sólidas de 250 mg (Ciplox®, Ciproxina®, Nivoflox®, genérico);

orais sólidas de 500 mg (Ciplox®, Ciproxina®, Nivoflox®, Estecina®, Isino®, Keefloxin®,

genérico); orais sólidas de 750 mg (Ciplox®, Ciproxina®, Estecina®, genérico); a

posologia correcta é 250 a 750 mg de 12 em 12 horas; pode ainda ser administrada via

e.v., 200 a 400 mg de 12 em 12 horas;

- levofloxacina: orais sólidas de 250 mg e de 500 mg (Tavanic®, genérico); deve ser

administrada oralmente ou e.v., 250 a 500 mg de 12 em 12 horas ou uma vez por dia;

- lomefloxacina: orais sólidas de 400 mg (Maxaquin®); deve ser administrada por via

oral, 400 a 800 mg uma vez por dia;

- moxifloxacina: orais sólidas de 400 mg (Avelox®, Proflox®), devendo ser administrada

por via oral 400 mg uma vez por dia;

- norfloxacina: orais sólidas de 400 mg (Besflox®, Noroxin®, Uroflox®, genérico),

devendo ser utilizada por via oral 400 mg de 12 em 12 horas;

- ofloxacina: orais sólidas de 200 mg (Bioquil®, Megasin®, Oflocet®, Tarivid®, genérico)

e de 400 mg (Bioquil®), devendo ser administrada por via oral, 200 a 400 mg de 12 em

12 horas, ou por via e.v., 400 mg de 12 em 12 horas;

15. Metronidazol

O metronidazol é um antimicrobiano bactericida usado no tratamento de doenças

por anaeróbios e parasitas. O mecanismo de acção é a sua conversão num metabolito

tóxico após entrada no microrganismo, metabolito esse que vai lesar o DNA

irreversivelmente. Alguns dos anaeróbios que fazem parte do seu espectro de acção

são Bacteroides (incluindo B. fragilis), Prevotella, Selenomonas, Fusobacterium e

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27 Abordagem Prática aos Antibióticos

Clostridium. No entanto, é eficaz também contra Treponema pallidum, Gardnerella

vaginalis, Trichomonas vaginalis, Giardia lamblia, Entamoeba histolytica e

Helicobacter pylori. Como tal, o metronidazol é utilizado no tratamento de infecções

por anaeróbios no SNC, coração, ossos, articulação e tecidos moles, vaginose

bacteriana, tricomoníase vaginal, giardíase, colite pseudomembranosa e úlcera

péptica (em combinação com outros fármacos).

- orais sólidas de 250 mg (Flagyl®), devendo ser administrado oralmente 250 a 500

mg de 8 em 8 horas;

- parentérica (e.v.): 500 mg de 8 em 8 horas.

16. Glicilciclinas

O único representante desta muito recente classe de antibióticos é a tigeciclina,

derivado das tetraciclinas. É bacteriostático e actua pela inibição da síntese proteica.

Cobre bactérias Gram negativo (incluindo Acinetobacter baumanii, mas não

Pseudomonas) e Gram positivo (incluindo MRSA e pneumococos). É usado em

infecções complicadas intra-abdominais e da pele e tecidos moles. É exclusivamente

endovenoso, com dose de carga de 100 mg e depois 50 mg de 12 em 12 horas.

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28 Abordagem Prática aos Antibióticos

III. Quadros e Tabelas úteis sobre antibióticos

1. Eliminação e ajuste posológico de alguns antibióticos

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29 Abordagem Prática aos Antibióticos

2. Tratamento de Infecções da Pele e Tecidos Moles

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30 Abordagem Prática aos Antibióticos

3. Tratamento da Endocardite Infecciosa

(continua na próxima página)

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31 Abordagem Prática aos Antibióticos

4. Tratamento Empírico de Infecções Urinárias

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32 Abordagem Prática aos Antibióticos

5. Tratamento Empírico de Pneumonias da Comunidade

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33 Abordagem Prática aos Antibióticos

6. Tratamento Empírico das Meningites

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34 Abordagem Prática aos Antibióticos

7. Tratamento dirigido das Meningites

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35 Abordagem Prática aos Antibióticos

8. Tratamento de Vaginites e Vaginoses

9. Tratamento de uretrites

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36 Abordagem Prática aos Antibióticos

IV. Bibliografia

- Antunes, Francisco, Manual sobre Doenças Infecciosas, Permanyer Portugal, 1ª

Edição, 2003, Lisboa, páginas 25 – 116;

- Kasper, et al, Harrison’s Principles of Internal Medicine, McGraw Hill, 17th Edition,

2008, USA;

- Katzung, Bertram, Basic and Clinical Pharmacology, McGraw Hill, 9th Edition, 2004,

USA, pp. 733 – 781;

- Manual do 40º Curso da Clínica Universitária de Pneumologia, páginas 129 - 138;

- Prontuário Terapêutico 7, Junho de 2007, Infarmed, Ministério da Saúde, páginas 22 -

55;

- www.google.com

- www.uptodate.com