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A VISÃO DA AAB PARA O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO ASSOCIAÇÃO AEROESPACIAL BRASILEIRA SÃO JOSÉ DOS CAMPOS SP, NOVEMBRO 2010

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  • A VISO DA AAB PARA O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO

    ASSOCIAO AEROESPACIAL BRASILEIRA SO JOS DOS CAMPOS SP, NOVEMBRO 2010

  • A VISO DA AAB PARA O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO

    ASSOCIAO AEROESPACIAL BRASILEIRA AAB

    DIRETORIA 2009-2011

    PRESIDENTE: PAULO MORAES JR.

    VICE-PRESIDENTE: HIMILCON DE CASTRO CARVALHO

    DIRETOR SECRETRIO: EDIRALDO BERNARDI CARVALHO

    DIRETOR TCNICO-CIENTFICO: JANIO KONO

    DIRETOR TESOUREIRO: JADIR NOGUEIRA GONALVES

    CONSELHO DELIBERATIVO

    ANDR MONTANHOLI MILESKI [2009-2013]

    OTHON CABO WINTER [2009-2013]

    RICARDO LUS DA ROCHA CARMONA [2009-2013]

    JOS NIVALDO HINCKEL [2007-2011]

    OTVIO SANTOS CUPERTINO DURO [2007-2011]

    PETRNIO NORONHA DE SOUZA [2007-2011]

    COMISSO DE POLTICA ESPACIAL

    PRESIDENTE: OTVIO SANTOS CUPERTINO DURO

    MEMBROS: JOS NIVALDO HINCKEL

    OTHON CABO WINTER

    RICARDO LUS DA ROCHA CARMONA

  • A VISO DA AAB PARA O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO

    A P R E S E N T A O

    O Brasil tem tudo para ser uma potncia espacial. Tem boa engenharia, instituies consolidadas, uma indstria espacial emergente, excelentes posies de lanamento, enfim, tudo para que isso possa ocorrer. No entanto, se nada fizerem para que isso acontea, as geraes futuras jamais os perdoaro.

    Comentrio feito por um alto funcionrio da Agncia Espacial Russa (ROSKOSMOS)

    A atividade espacial no Brasil teve inicio na dcada de 60. Foi um comeo modesto, sem grandes ambies, sem motivaes blicas, portanto, diferente dos pases que iniciaram atividades semelhantes na dcada anterior, como os EUA e a ex-URSS. Ao final da dcada seguinte foi estabelecida a Misso Espacial Completa Brasileira, conhecida por MECB, a qual foi cumprida parcialmente.

    Com a criao da Agncia Espacial Brasileira (AEB), primeiramente alocada na Secretaria de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica, e posteriormente no Ministrio de Cincia e Tecnologia (MCT), foi estabelecido o Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE), o qual vem sendo revisado a cada quatro anos.

    O PNAE tem contedo abrangente e considera aspectos relacionados s Misses, aos meios de Acesso ao Espao, as Aplicaes, e aos Programas Cientficos, Tecnolgicos e Educacionais. Em principio serve de diretor e indutor das atividades espaciais a serem desenvolvidas no pas por meio dos rgos Executores do SINDAE (Sistema Nacional de Desenvolvimento das Atividades Espaciais).

    Passados quase cinqenta anos de atividades espaciais no Brasil constata-se que nem todos os objetivos contemplados na MECB, no PNAE e nas suas revises, ou em qualquer outra iniciativa dos rgos coordenadores e executores do SINDAE puderam ser atingidos.

    Algumas misses espaciais foram realizadas, tecnologias desenvolvidas, uma pequena indstria emergiu, recursos humanos foram qualificados, recursos financeiros com razovel crescimento aplicados, cooperaes internacionais foram estabelecidas, enfim aes foram conduzidas e boa parte delas com sucesso. Entretanto, comparando o desempenho do Brasil com pases que iniciaram suas atividades antes e outros que as iniciaram mais tarde, este no muito satisfatrio.

    bvio que desenvolver tecnologia e atividade espacial no uma ao simples. Tambm o fato do Acesso ao Espao caracterizar-se por ter natureza dual, resulta em implicaes comerciais, embargos e sanes. A opo brasileira foi, e nada mais legtimo, liderar suas atividades espaciais com alto contedo de autonomia, no entanto, recorrendo a parceiros (empresas) estabelecidos em pases com os quais mantinha boas relaes.

    Na lista dos pases que desenvolvem e detm domnio da tecnologia espacial, encontram-se aqueles que tambm so lderes no aspecto econmico. Esse um indicativo de que a atividade espacial reflete-se como um indutor da economia, pois propicia avanos tecnolgicos de sua indstria, agregando altos valores aos seus produtos manufaturados. Propicia tambm um maior peso poltico a nvel

  • A VISO DA AAB PARA O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO

    internacional, e acima de tudo, beneficia amplamente suas sociedades com servios e produtos que permitem uma moderna e melhor qualidade de vida.

    Ora, se isso que se almeja para o desenvolvimento de uma sociedade moderna, mais rica e repleta de oportunidades para seus cidados, a atividade espacial, e o uso de suas aplicaes, devem ter um lugar de realce nos programas de governo. A percepo estratgica completa sem dvida a contribuio que ela poder vir a oferecer para que um pas com as dimenses territoriais do Brasil, com as suas potencialidades naturais, sua indstria moderna e emergente, suas demandas de segurana e de governana, e sua populao jovem e empreendedora, sejam por ela beneficiadas.

    Nesse sentido e nesse contexto a Associao Aeroespacial Brasileira (AAB), congregando profissionais e demais interessados relacionados rea espacial no Brasil e at no exterior, conduziu discusses, reflexes e consultas sobre o Programa Espacial Brasileiro (PEB), e elaborou o presente documento conferindo-lhe o ttulo de A VISO DA AAB PARA O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO.

    A estratgica adotada para elaborao do documento foi de, no esquecendo os sucessos e insucessos alcanados, no condenando e nem desmerecendo os atores que deles fizeram parte, oferecer uma visada global para um programa adequado s necessidades, potencialidades e aspiraes de um pas muito maior do que o seu programa espacial atual. Os temas abordados no documento devero servir de orientao para discusses de carter mais tcnico, e a induo e conduo de aes que permitam atingir objetivos claros e inequvocos para que o Brasil, como um dos pioneiros da atividade espacial, venha a ocupar uma posio adequada s suas aspiraes como nao precursora dos benefcios que a explorao espacial possa trazer para si e para o mundo do qual fazemos parte.

    Isso posto, e na qualidade de Presidente da Associao Aeroespacial Brasileira, tenho a satisfao, como tambm a responsabilidade, junto com os Membros da Comisso de Poltica Espacial da AAB, de apresentar o presente documento, esperando que as expectativas nele depositadas tenham sido plenamente atendidas, e que o contedo do mesmo contribua para o estabelecimento de um programa espacial condizente com a grandeza de nossa nao, o Brasil.

    Desejando uma boa e crtica leitura do documento, subscrevo-me,

    Com cordiais saudaes aeroespaciais,

    PAULO MORAES JR. Presidente da AAB [email protected]

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    Sumrio Pgina 5/ 74

    S U M R I O INTRODUO 7 MISSES ESPACIAIS 9 ACESSO AO ESPAO 15 RECURSOS 25

    FSICOS 25

    HUMANOS 33

    ORAMENTRIOS 42

    OUTROS 49 POLTICA INDUSTRIAL 51 ORGANIZAO INSTITUCIONAL 61 COORDENADORES TEMTICOS 71 CONSULTORES 73

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    Sumrio Pgina 6/ 74

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    Introduo Pgina 7/ 74

    INTRODUO Este documento foi realizado para cumprir parte dos objetivos da

    ASSOCIAO AEROESPACIAL BRASILEIRA AAB, qual seja o de contribuir com as autoridades competentes para a formulao e planejamento do Programa Espacial Brasileiro (PEB). Ele uma contribuio como fruto da experincia dos seus membros envolvidos que esto h dcadas com este Programa seja atravs do setor pblico, civil e militar, seja atravs do setor privado e acadmico. Ele foi desenvolvido atravs de uma mobilizao destes membros e na sua contribuio com idias, opinies e experincia prtica nestes diversos setores em suas diversas atividades e em diferentes regies do pas.

    Inicialmente estabeleceu-se uma Comisso de quatro membros da AAB para a conduo deste processo de formulao. Esta Comisso definiu sete tpicos principais para a estrutura do documento: Misses, Acesso ao Espao, Recursos Fsicos, Recursos Humanos, Recursos Oramentrios, Poltica Industrial e Organizao Institucional. Outros tpicos poderiam ter sido singularizados, como pesquisa e desenvolvimento ou cooperao internacional, mas considerou-se que estes e outros tpicos no cobertos especificamente j o estariam por aqueles sete selecionados. Para cada um destes convidou-se um Coordenador para o seu desenvolvimento. Os coordenadores tiveram liberdade para convidar colaboradores para contribuir na redao e formulao de sugestes e anlises para o seu tpico especfico. Alm destes, a Diretoria da AAB tambm estendeu este convite a outros colaboradores que se constituram em consultores ao documento. Assim, aps esta primeira fase dispunha-se de um documento preliminar. Novamente, este documento preliminar, agora integrado, foi submetido a um grupo de cerca de 20 consultores para anlise, crtica e sugestes ao documento. Alm disto, todos os membros da AAB foram convidados a participar com suas crticas e sugestes. Para isto o documento preliminar foi a eles disponibilizado atravs de um link no portal da Associao de onde o documento preliminar podia ser acessado. Posteriormente foi realizado um workshop com os membros da AAB e onde as crticas e sugestes foram discutidas.

    Aps a incorporao das crticas e sugestes dos consultores e membros da Associao a forma final do documento foi revista por dois editores. O resultado o que se ver nas pginas seguintes. Para cada um dos tpicos h uma anlise, um diagnstico e um conjunto de sugestes concretas. Como este no um documento originado de idias e experincia de uma nica pessoa ou mesmo de um nmero reduzido delas, possvel se identificar em alguns pontos propostas e anlises que no seguem linearmente. A redao final preserva esta idia transmitida pelo trabalho por duas razes. H diferentes caminhos que podem ser seguidos e no se pretende estabelecer um nico de uma maneira presunosa. A posio da AAB que estudos possam ser feitos em seguida que aprofundem os temas aqui colocados e as sugestes propostas.

  • A VISO DA AAB PARA O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO

    Introduo Pgina 8/ 74

    Espera-se que este material possa, efetivamente, contribuir para importantes decises que se avizinham para o Programa Espacial Brasileiro e se juntar a outras que esto em andamento por diferentes setores da sociedade.

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    Misses Espaciais Pgina 9/ 74

    Misses Espaciais A sociedade brasileira h algumas dcadas beneficia-se da tecnologia

    espacial atravs das diversas naturezas de aplicaes espaciais: telecomunicaes; observao da Terra; navegao por satlites; cincia espacial. Beneficia-se tambm dos inmeros spin-offs tecnolgicos decorrentes do esforo espacial internacional. Esses benefcios advm quase totalmente de tecnologias externas com o uso de satlites dedicados ao Brasil, no caso de alguns servios de telecomunicaes, ou compartilhados com sistemas estrangeiros ou internacionais, no caso de imagens de satlites, dados meteorolgicos, informaes GPS e dados cientficos.

    Independentemente da procedncia do satlite ou da tecnologia o Brasil precisa aprofundar a utilizao de satlites, no somente no mbito privado regido pelo mercado, mas tambm no meio pblico. Qualquer aplicao de satlites envolve esforos e tecnologias que vo muito alm do satlite. Por exemplo, as telecomunicaes por satlites possuem enorme potencial de benefcios sociedade, tais como: incluso digital; gesto pblica remota; segurana; sistemas aumentados de navegao; e distribuio de dados. Por isso, o Estado deve atuar. No entanto, o negcio telecomunicaes por satlites vai muito alm de satlites de telecomunicaes e as aplicaes nacionais no devem ser condicionadas capacidade local de produo. Uma estratgia precisa ser estabelecida para desenvolver o negcio de forma abrangente e, ento, criar a demanda de satlites de forma consistente. Cabe indstria nacional progressivamente atender essas demandas com o domnio de tecnologias de lanadores e campos de lanamento e de satlites, estaes de rastreio e tratamento da informao.

    Uma poltica tecnolgica e industrial deve indicar como perseguir esse domnio das tecnologias e como a participao nacional deve ocorrer. preciso retomar o sonho do domnio da capacidade de acesso ao espao. Retomar o conceito de misses tecnolgicas e experimentais, bem como criar uma estratgia de misses operacionais que possam constituir desafios nossa indstria, aos rgos de pesquisa e desenvolvimento e sociedade em geral.

    O programa espacial precisa distinguir misses experimentais e operacionais. Misses de natureza operacional precisam responder apropriadamente a essa condio, em particular, devem possuir altos ndices de disponibilidade. A expectativa de falha de um satlite deve estar condicionada capacidade de reposio, de forma que o servio no sofra descontinuidade. E isto leva a dificuldades tecnolgicas, em alguns casos, muito difceis de serem atendidas por uma indstria emergente. Em particular, nos satlites de telecomunicaes que requisitam disponibilidade prxima a 100% e longos tempos de vida em rbita.

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    Em algumas misses, por exemplo, de observao da Terra, uma boa engenharia de sistema pode simplificar esses requisitos. Uma possvel forma de conseguir a disponibilidade operacional atravs do uso de constelaes de satlites. Claro que as misses devem ser pensadas para isso e sua viabilizao depende do uso de tecnologias de baixo custo.

    Cada misso espacial brasileira precisa assumir a identidade apropriada: experimental ou operacional. O conflito leva a misses com custos muito altos, baixos resultados tecnolgicos e validade operacional discutvel. Um programa de satlites pode implicar custos elevados. Por exemplo, os investimentos no desenvolvimento dos cinco satlites do programa binacional CBERS representam valores da ordem de um bilho de reais somente na parte brasileira.

    preciso discutir a natureza desses programas: se operacional, incrementar a disponibilidade ao usurio; se experimental, buscar com mais objetividade os ganhos tecnolgicos. Algumas misses cientficas, ou mesmo certas misses de defesa, podem ser atendidas com um tempo de vida menor e assumir maiores riscos, o que permitiria complementar as misses experimentais na construo de uma estratgia de domnio tecnolgico. O desafio a vencer a necessidade de inovao freqentemente relacionada s cargas teis desses satlites e enfrentar a questo dos custos.

    O estabelecimento de uma estratgia adequada parece fundamental para o sucesso do programa espacial brasileiro. A seguir so discutidas possveis misses experimentais e misses voltadas para demandas operacionais do pas, relacionadas pela natureza de suas aplicaes nos prximos vinte anos. A principal proposta a constituio de um programa de satlites geoestacionrios estruturante das atividades espaciais no Brasil tendo como meta a capacitao aos sistemas de telecomunicaes e meteorolgicos.

    Telecomunicaes espaciais

    Est disseminada no meio espacial brasileiro a idia de que telecomunicaes um assunto comercial. A verdade que os investimentos mundiais provenientes de governos para pesquisa e desenvolvimento de telecomunicaes espaciais avanadas so ainda muito significativos. No entanto, verdade que a maior parte desses investimentos refere-se ao setor voltado defesa, ou seja, governo-defesa. Entretanto, nada impede que um pas emergente no setor espacial adote uma estratgia diferente, e invista em programas civis.

    Os benefcios potenciais das telecomunicaes espaciais ao pas, dadas suas dimenses continentais e seu extenso e importante mar territorial so evidentes. O desenvolvimento deste negcio de forma adequada, alm do saber especificar produtos e sistemas, importante para o pas. O pas est desestruturado nesse setor e precisa de uma estratgia para o domnio das tecnologias de telecomunicaes por satlites dentro dos prximos vinte anos, tanto no que se refere aos satlites como no que se refere ao lanamento de satlites geoestacionrios.

    No possvel imaginar um programa espacial sem investimentos em telecomunicaes. Alm das aplicaes em telecomunicaes propriamente ditas,

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    essa tecnologia fundamental em outras naturezas de satlites que envolvam altas taxas de transmisso de dados. H ainda tecnologias correlatas com radiocomunicaes, como o sensoriamento remoto com tecnologia radar. Misses experimentais envolvendo satlites de telecomunicaes poderiam criar as condies estruturantes para o desenvolvimento das tecnologias relacionadas ao negcio de forma mais abrangente. Mesmo uma misso experimental representaria um enorme desafio engenharia nacional. Isto porque deveria incluir tecnologias ainda no dominadas no pas e, embora experimental, para o desenvolvimento dos sistemas aplicativos necessitaria atender tempo de vida mnimo da ordem de cinco anos com confiabilidade de 90%. Estes valores so muito aqum dos projetos comerciais de telecomunicaes com tempos de vida projetados acima de dez anos, s vezes, quinze anos. Entretanto, j seriam bastante satisfatrios para misses de observao da Terra, incluindo as meteorolgicas geoestacionrias.

    Misses experimentais de comunicaes deveriam ter como orientao o desenvolvimento de tecnologias bsicas e tambm a busca da inovao. Deveriam incluir transponders de uso corrente nas bandas C e X, e, no entanto, deveriam incluir capacidade para comunicaes mveis, ou, pelo menos, transportveis nas bandas L ou S. Isto envolveria desafios como a abertura de grandes antenas no espao com possveis oportunidades de inovao em sistemas espaciais ou em tecnologias correlatas, como a dos materiais.

    Um dos potenciais interesses de um satlite experimental de telecomunicaes seria apoiar sistemas aumentados de navegao por satlites. E, para isso, a capacidade de comunicaes mveis importante, embora represente um enorme desafio tecnolgico. Concomitantemente ao desenvolvimento do satlite, a cincia e tecnologia nacionais desenvolveriam esforos estruturantes em um sistema cientfico de monitoramento do clima espacial e navegao por satlites.

    Observao da Terra

    Diversos tipos de misses podem ser classificados nesta categoria, desde o sensoriamento remoto para observao da superfcie, do mar (temperatura, salinidade etc.), a observao atmosfrica, por exemplo, de medida de precipitao pluviomtrica, at a observao meteorolgica por satlite geoestacionrio. Entretanto, impossvel a qualquer pas atender com sistemas prprios todas suas necessidades. A cooperao internacional e a troca de dados entre os pases so a tnica, principalmente, no que se refere aos satlites de monitoramento ambiental, de monitoramento do clima e de aplicaes cientficas de diversas naturezas.

    O Brasil, com o CBERS e suas tecnologias de aplicao e de distribuio de dados, j pode ser considerado um player internacional nessa rea. Considerados os investimentos dos satlites CBERS e Amaznia, o Brasil j investe, em relao ao PIB, mais do que a mdia do planeta. Isso se justifica devido s caractersticas brasileiras de dimenses territoriais, o interesse na Regio Amaznica e a produo agrcola nacional. No entanto, esta concentrao tambm mostra que as oportunidades de crescimento do setor espacial no pas dependem da abertura de novos campos de aplicao. Talvez o programa

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    CBERS deva ser repensado para assumir natureza efetivamente operacional, que venha prover os dados de que o Brasil necessita para o monitoramento ambiental. Por exemplo, poder-se-ia considerar uma estratgia de utilizao de constelaes de satlites menores de baixo custo desenvolvidos pelo Brasil e pela China, com uma poltica cooperativa de troca de dados.

    Ainda dentro do campo observao da Terra, o setor meteorolgico merece ateno especial e um plano de desenvolvimento. tecnicamente demonstrado que a qualidade da previso meteorolgica depende da combinao de dados de satlite em rbita baixa e geoestacionria. O Brasil pode participar cooperativamente de sistemas espaciais internacionais de observao meteorolgica em rbita baixa. Em certa medida isto j ocorre, porque o Brasil tem buscado contribuir com o sistema GPM Global Precipitation Measurement, e tem convivido com a colaborao com os Estados Unidos no fornecimento de imagens meteorolgicas geoestacionrias dos seus satlites da srie GOES. No entanto, essa cooperao tem sido sujeita a restries diversas, condicionadas s condies meteorolgicas no hemisfrio norte ou disponibilidade de satlites backup.

    O Brasil, talvez em cooperao com outros pases da Amrica Latina, deveria nas prximas dcadas implementar sistemas prprios de observao geoestacionria meteorolgica e ambiental. Os custos para manter tal sistema operacional seriam significativos, sendo a cooperao internacional e satlites com tempo de vida prolongado condies necessrias para viabilizar um sistema desse tipo. A boa qualidade da meteorologia brasileira e os enormes benefcios que ela traz ao pas podem justificar o esforo neste sentido. Novamente aqui o domnio tecnolgico e o desenvolvimento de sistemas complementares aos satlites recomendam o desenvolvimento de uma primeira misso com carter experimental.

    Cincia espacial e do ambiente terrestre

    As misses cientficas voltadas ampliao da fronteira do conhecimento, assim como aquelas voltadas observao da Terra, oferecem uma oportunidade de cooperao internacional importante. O Brasil pode contribuir e beneficiar-se do esforo global nessa rea. O Brasil possui singularidades e interesses especficos relativos ao clima espacial, j que nas regies equatoriais so mais intensos os efeitos das bolhas e cintilaes ionosfricas e, por conseguinte, sua influncia nos sistemas de navegao maior do que em outras regies. Alm disso, o Brasil tem uma comunidade cientfica de relevncia internacional nestas reas das cincias espaciais.

    O desafio desenvolver misses com objetivos ousados a custos aceitveis realidade brasileira. O desafio dos custos ainda mais importante quando so considerados o lanador e os servios nacionais de lanamento. Oportunidades de vos como carga secundria poderiam reduzir o problema. Outros veculos para a carga til cientfica podem ser considerados: foguetes de sondagem, bales e caronas em misses estrangeiras ou internacionais. De maneira geral, h necessidade de se estabelecer uma cadncia em misses de natureza cientfica para estimular a participao de pesquisadores e, dessa forma, construir uma cultura cientfica e tecnolgica na rea espacial.

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    Misses Espaciais Pgina 13/ 74

    Os pases j desenvolvidos em atividades espaciais utilizam misses tripuladas e misses no-tripuladas de espao profundo para ampliar ainda mais suas capacidades e tornarem-se potncias espaciais. Em uma escala realista, o Brasil pode conciliar um programa espacial cientfico com o desenvolvimento de capacidade prpria de acesso ao espao, ou seja, a capacidade de desenvolver lanadores, satlites e suas tecnologias associadas.

    Propostas

    Trs propostas bsicas devem nortear a reviso do programa espacial:

    1) Programa estruturante geoestacionrio

    Iniciar um programa de satlites geoestacionrios de aplicaes. Lanar satlites geoestacionrios a cada dois anos, alternando a cada quatro anos satlites de telecomunicaes e meteorolgicos, projetados para cinco anos de tempo de vida, de forma a ter um sistema experimental com operao continuada. Os satlites seriam convergentes tecnologicamente de forma a otimizar custos e tempo de desenvolvimento dos principais subsistemas e plataforma do satlite. Esse programa deve ser estruturante nos diversos segmentos envolvidos: base de lanamentos; lanadores; e satlites.

    2) Programa operacional de observao da Terra

    Desenvolver um sistema operacional de observao da Terra, utilizando conceitos de constelaes de satlites de baixo custo, orientado s demandas brasileiras de dados ambientais. O sistema deve ser especificado com requisitos de qualidade e disponibilidade de servios para atender s demandas nacionais e internacionais, e dessa forma contribuir com o esforo internacional e compartilhar dados do mundo inteiro.

    Trazer o programa CBERS para dentro da realidade tecnolgica e de recursos disponveis, dando-lhe uma natureza operacional com os padres necessrios de qualidade e disponibilidade de servios. A principal sugesto reformular o programa migrando para o uso de constelaes de satlites menores do que os atuais, com cada pas desenvolvendo satlites completos, dentro de uma estratgia de operao conjunta e compartilhamento de dados.

    3) Programa mobilizador de satlites cientficos

    Para mobilizao do meio cientfico, tecnolgico e industrial, dever-se constituir um programa de satlites que efetivamente desenvolvam cincias ou tecnologias. Misses com a liderana cientfica brasileira ou em cooperao de natureza cientfica para capacitao e avano do conhecimento nas reas ambiental, sistema Sol-Terra e astrofsica devem ser desenvolvidas. Este programa deve ter consistncia e cadncia para atrair interesse amplo da comunidade cientfica e industrial brasileira. Alm dos satlites, o programa poderia incluir foguetes de sondagem e bales.

    As misses poderiam incluir experimentos a exemplo daqueles dos

  • A VISO DA AAB PARA O PROGRAMA ESPACIAL BRASILEIRO

    Misses Espaciais Pgina 14/ 74

    satlites GPM j citados. No entanto, necessariamente a comunidade cientfica brasileira deve ser envolvida em todas as etapas da misso. Neste contexto, a atual participao brasileira no GPM deveria ser revista para promover maior participao brasileira no campo cientfico. No formato atual, ela no se aplicaria neste programa.

    Concluso

    A sociedade brasileira tem se beneficiado de numerosos spin-offs da tecnologia espacial oriundos quase exclusivamente do esforo internacional nas telecomunicaes, dados meteorolgicos, GPS e dados cientficos. Entretanto, enormes benefcios ainda permanecem potenciais. Uma estratgia ampla e abrangente deve ser estabelecida para criar uma demanda consistente de satlites que estimulem a indstria nacional a participar do domnio de tecnologias de lanamento e de satlites.

    Essa estratgia deve ser implementada por meio de uma poltica industrial que estimule a participao nacional nas misses operacionais e experimentais. Estas, por sua vez, precisam ser claramente definidas para evitar tanto misses operacionais com custos muito altos e baixa disponibilidade como misses experimentais com baixos resultados tecnolgicos. As misses experimentais incluiriam misses cientficas e de defesa na construo da estratgia de domnio tecnolgico industrial.

    Portanto, como estratgia adequada, prope-se o estabelecimento de um plano nacional de atividades espaciais para os prximos vinte anos que teria por base:

    a constituio de um programa de satlites geoestacionrios para a capacitao dos sistemas de telecomunicaes e meteorolgicos nacionais;

    um sistema operacional de observao da Terra por constelao de satlites; e

    um programa mobilizador de satlites cientficos para mobilizao do meio cientfico, tecnolgico e industrial.

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    Acesso ao Espao Pgina 15/ 74

    Acesso ao Espao

    Sempre use a palavra impossvel com a maior cautela. Wernher Von Braun

    A caracterstica mais importante na explorao dos recursos espaciais a visada global. Ela permite a explorao de recursos de comunicaes, observaes da superfcie terrestre e navegao, no possveis de serem feitos por outros meios e sem restries de aspectos geogrficos e geopolticos. Os meios de explorao destes recursos so os satlites e as plataformas espaciais.

    Inicialmente faz-se importante ressaltar o carter global das trajetrias dos satlites em torno da Terra. Combinados os efeitos de movimento do satlite e da Terra, cada um deles cobre frao substancial da superfcie terrestre ou mesmo o globo inteiro. A cobertura de um dado ponto da superfcie terrestre pode durar desde alguns minutos, para rbitas de baixa altitude, at permanecer continuamente, para a rbita geoestacionria. Com a cobertura espacial ocorre algo semelhante. Para rbitas baixas a cobertura espacial, em cada instante, de algumas centenas de quilmetros quadrados; para grandes altitudes, a cobertura espacial em cada instante se aproxima da metade da superfcie terrestre.

    Isto tem implicao importante para a explorao deste recurso. Dada a cobertura global, a carga de utilizao de cada satlite proporcional superfcie terrestre de interesse. Do ponto de vista da economia de recursos a situao ideal para cada operador o acesso a usurios distribudos em todo o globo terrestre. Por outro lado, para cada usurio na superfcie terrestre interessa tambm o acesso a todos os recursos existentes, com vista a ampliar tanto a cobertura temporal, quanto o alcance espacial.

    Historicamente a explorao dos recursos espaciais acima citados foi perseguida inicialmente pelo carter estratgico de acesso aos meios de comunicao, de observao e de navegao em escala global. Outras aplicaes de carter comercial e cientfico se seguiram e em algumas dcadas os recursos envolvidos em transaes comerciais utilizando meios espaciais superaram largamente os recursos despendidos em aplicaes estratgicas.

    A natureza dupla de aplicaes de carter estratgico e de carter econmico/comercial de recursos espaciais leva tambm a distinguir dois setores de atividade: um setor primrio que atua na produo dos veculos lanadores, bases de lanamento e os satlites, e um setor secundrio que atua na explorao econmica e comercial dos servios proporcionados pelos satlites. No setor secundrio a motivao dos agentes o rendimento econmico proporcionado. Neste setor a explorao disseminada por empresas e pases de diferentes escalas econmicas e graus de desenvolvimento e h poucas restries quanto disseminao de tecnologia e equipamentos.

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    Acesso ao Espao Pgina 16/ 74

    J a explorao do setor primrio conduzida por, e assim se restringe a, um nmero pequeno de pases com grande extenso territorial, economia de grande escala e interesses polticos e econmicos que abrangem grande parte da superfcie terrestre. A atuao neste setor requer enorme dispndio de recursos financeiros, capacidade gerencial e tcnica, e persistncia no alcance dos objetivos. A motivao principal para o engajamento dos pases que dominam este setor essencialmente de carter estratgico. Alm da explorao comercial do setor secundrio, estes pases utilizam os recursos espaciais tambm em seus sistemas de segurana e defesa, em geral preparados para atuao alm do prprio territrio. Devido a este carter estratgico, a disseminao de tecnologia neste setor restrita e cada agente busca a maior autonomia possvel.

    Histrico e diagnstico da situao atual

    possvel distinguir duas geraes de veculos lanadores nos diversos programas espaciais existentes. A primeira gerao teve forte herana dos msseis intercontinentais desenvolvidos na corrida armamentista da Guerra Fria. Os veculos desta primeira gerao utilizavam em grande parte propelentes estocveis e sua capacidade de satelitizao em rbita baixa era de aproximadamente 2% da massa total do veculo na decolagem. A segunda gerao de veculos lanadores caracterizada pela utilizao de propelentes mais energticos e por um melhor aproveitamento dos mesmos; e pela reduo do coeficiente estrutural atravs do uso de materiais mais leves e resistentes. A capacidade de satelitizao em rbita baixa desta gerao mais que dobrou em relao primeira, saltando para a faixa de 4 a 6% da massa total na decolagem.

    Os programas com maior maturidade tecnolgica j migraram seus veculos, em grande parte, para a segunda gerao. Os programas mais recentes operam veculos de primeira gerao e iniciam desenvolvimento de veculos de segunda gerao.

    O roteiro seguido em cada um dos programas atuais para o desenvolvimento de seus veculos lanadores foi bastante variado. Os pioneiros, os Estados Unidos da Amrica e a Rssia (na poca Unio Sovitica), desenvolveram seus veculos de forma bastante independente.

    A segunda onda de programas que lograram sucesso formada por um consrcio de pases europeus, representado pela Agncia Espacial Europia (ESA), e pela China, ndia e Japo. A ESA resultou da unio de esforos individuais de diversos pases europeus e desenvolveu seus veculos tambm de forma autnoma. A China contou inicialmente com apoio tcnico da Rssia, mas rapidamente buscou autonomia. A ndia seguiu uma trajetria de maior interao com programas mais avanados, adquirindo em diferentes pocas motores e insumos de produo de motores da Frana e da Rssia. A assimilao da tecnologia evoluiu para produo interna dos motores sob licena e depois por desenvolvimento autnomo. O Japo seguiu trajetria parecida com a da ndia, tendo como parceiro os Estados Unidos.

    Mais recentemente a Coria do Sul iniciou o desenvolvimento de seus prprios veculos lanadores. Para isso estabeleceu uma estreita parceira com a Rssia na forma de intercmbio tcnico de especialistas e aquisio de estgios inteiros para composio de seus veculos.

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    Os programas do Japo e da Coria do Sul no satisfazem o requisito de interesses em grandes regies territoriais. A maior motivao talvez seja de demonstrao de capacidade tecnolgica e manuteno de capacitao importante frente a conflitos latentes com pases vizinhos.

    Os programas em andamento na Coria do Norte, Ir e Israel so motivados em grande parte pelas aplicaes relacionadas segurana e defesa ou potencial dissuasivo. Em diversos graus, lograram j lanar pequenas cargas ao espao.

    O Brasil iniciou seu programa de lanadores junto com os pases da segunda onda. At o presente foram realizadas duas tentativas de lanamento do seu veculo lanador de satlites (VLS), sem, no entanto, lograr sucesso.

    Nesse contexto importante ressaltar que revises tcnicas realizadas, que contaram com a colaborao de especialistas estrangeiros, no detectaram inviabilidade tcnica inerente concepo ou projeto do veculo brasileiro testado. Entretanto a anlise de riscos de falhas associadas ao nmero elevado de eventos durante o vo torna patente a dificuldade de se reduzir a probabilidade de falha de misso com esse tipo de veculo a um valor aceitvel, ou seja, inferior a 10%.

    Uma das propostas mais freqentes prega a substituio dos veculos descartveis utilizados atualmente no mundo por veculos capazes de realizar mltiplas viagens, nos moldes dos outros meios de transporte terrestre. Para viabilizar esta proposta os veculos passariam a utilizar o meio atmosfrico como agente propulsivo. Entretanto so poucos os avanos realizados ou vislumbrados para superar os obstculos apresentados pelas elevadas cargas trmicas e dinmicas associadas ao perfil de trajetria de ascenso e retorno Terra para este tipo de veculo.

    De fato, os custos envolvidos na construo e operao de foguetes so comparveis aos custos de um avio com dimenses equivalentes. O problema de ordem econmica, visto que um foguete utilizado apenas uma nica vez. Um veculo reutilizvel, com o mesmo envelope de misso, ter seu custo de produo acrescido de pelo menos uma ordem de grandeza. O ritmo de misses atuais deveria ser multiplicado pelo mesmo fator para tornar o custo destes novos veculos compatveis com os custos dos veculos atuais. Considerando as dificuldades tcnicas envolvidas e os fatores de escala econmica, razoavelmente seguro prever que tais meios no se materializaro num prazo inferior a 30 anos.

    Tanto os Estados Unidos quanto a Rssia desenvolveram veculos parcialmente reutilizveis; o Space Shuttle e o Energia/Buran. Os Estados Unidos esto aposentando o Space Shuttle aps mais de duas dcadas de operao. O custo unitrio por misso deste veculo, estimado em um bilho de dlares, quase dez vezes superior ao custo de misso equivalente realizado por um veculo descartvel. A Rssia abandonou seu sistema aps apenas dois lanamentos.

    Outra proposta igualmente recorrente a miniaturizao de veculos e satlites, nos moldes do que ocorreu com os equipamentos e componentes eletrnicos, uma indstria que se desenvolveu em paralelo com os veculos

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    espaciais e satlites e com grande aplicao nestes.

    Em primeiro lugar cabe notar que a vantagem de escala observada nas reas de produtos eletrnicos industriais e de consumo no se aplica da mesma forma rea espacial. A demanda por produtos espaciais limitada. Veculos lanadores e satlites continuam a ser produzidos como unidades individuais, muitos deles com nomes prprios.

    Do ponto de vista tecnolgico, uma anlise do escalonamento dimensional de veculos lanadores mostra que a reduo do tamanho do veculo acompanhada de uma correspondente reduo de desempenho.

    O desempenho de um veculo, medido pela razo entre a massa satelizvel e a massa bruta do lanador na decolagem, determinado pelos seguintes parmetros: impulso especfico, coeficiente estrutural e coeficiente balstico. Todos estes parmetros se deterioram com o escalonamento para dimenses menores. O resultado que a frao de massa satelizvel (em rbita baixa), da ordem de 4% para um veculo com massa bruta de cem toneladas, torna-se nula para um veculo com massa bruta abaixo de trinta toneladas. As razes para esse comportamento so em grande parte determinadas por leis da Fsica e h pouca coisa que possa ser minorada por avanos tecnolgicos. Do ponto de vista econmico, por outro lado, o escalonamento dimensional para baixo no reduz significativamente o custo do veculo. A razo principal para isto que o custo pode ser modelado como a soma de duas parcelas: uma associada infraestrutura, mo de obra e custos fixos em geral; a outra, associada a materiais. A primeira parcela constitui mais de 90% do custo total e varia muito pouco com o tamanho do veculo. A segunda parcela varia de forma aproximadamente linear com o tamanho do veculo. O resultado final, dessa forma, que o escalonamento dimensional para baixo reduz substancialmente o desempenho do veculo sem reduo equivalente no custo.

    Sustentabilidade Tcnica e Econmica

    Conceitualmente as misses espaciais a serem conduzidas devem ditar o ritmo do programa. Entretanto deve tambm ser considerado que a sustentabilidade tcnica e econmica do segmento de veculos, base de lanamento e suporte operao de lanamento passam a ser preponderantes medida que o ritmo se torna muito baixo. O primeiro nvel a ser observado o limite de sustentabilidade tcnica.

    O patamar mnimo de um programa espacial, tanto no que se refere implantao do programa propriamente dita quanto da operao e evoluo do mesmo, o patamar de sustentabilidade tcnica.

    Do ponto de vista de recursos humanos, a sustentabilidade diz respeito formao de massa crtica de pessoas que possibilite gerar e manter competncias de pesquisa, desenvolvimento, produo e operao de veculos lanadores.

    Tambm, a aplicao de metodologias de documentao extensiva das atividades essencial para a preservao do conhecimento e tcnicas.

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    A experincia dos diversos programas espaciais no mundo mostra que, para superar a complexidade do problema global e dificuldades tcnicas de grande parte das tarefas envolvidas, necessrio que seja estruturada equipe com algumas centenas de engenheiros, cientistas e administradores altamente qualificados e motivados. No entanto, a intensidade de aplicao desses recursos humanos de grande importncia, visto que lacunas em reas de conhecimento, e descompassos em andamentos de tarefas interdependentes podem tornar avanos muito lentos, inibi-los ou mesmo revert-los em retrocesso.

    Portanto, a sustentabilidade tcnica est associada formao e reteno de equipes tcnicas capazes de realizar as tarefas em patamares mnimos de segurana e desempenho. Em um ritmo muito lento de desenvolvimento, a equipe pode ficar desmotivada e a manuteno das pessoas nos projetos ficar prejudicada, caso os resultados demorem a ser atingidos, o que acarreta evaso de competncias e gera necessidade de novas contrataes.

    O segundo patamar o da sustentabilidade econmica. Este patamar est associado utilizao eficiente dos recursos humanos e tcnicos, uma vez garantido o patamar de sustentabilidade tcnica.

    Roteiro para o acesso ao espao

    Its trivial to build a rocket. Its incredibly difficult to build a rocket that goes to orbit.

    Elon Musk, SpaceX

    Duas propostas de roteiro de acesso ao espao para o programa espacial brasileiro so apresentadas e discutidas a seguir.

    A primeira proposta baseia-se em uma evoluo progressiva do projeto de veculo lanador de satlites ora em curso no pas (VLS), com a incorporao de estgios a propelentes lquidos e futuras combinaes de estgios lquidos e slidos com incremento do envelope de lanamento em termos de massa satelizvel e tipos de rbita a alcanar. Esta proposta espelha-se de certa forma na trajetria do programa indiano. Nessa alternativa, cada veculo intermedirio atenderia uma faixa no envelope de misses, viabilizando e demonstrando condies para prosseguir para a etapa seguinte.

    Essa primeira proposta pressupe que haja um nmero crescente de misses envolvendo satlites de pequeno e mdio porte lanados por veculos dedicados. As principais vantagens nesse caminho so os sucessos intermedirios que serviriam para motivar as equipes, permitiriam eventuais correes no programa, muito freqentes em projetos de longo prazo, bem como exigiriam recursos humanos e financeiros de forma gradativa.

    A proposta do Programa de Veculos Lanadores Cruzeiro do Sul apresentada pelo CTA (hoje DCTA) em outubro de 2005, e amplamente divulgada[1], inserindo-se exemplarmente no contexto dessa proposta, considera o desenvolvimento de cinco veculos lanadores para atendimento de misses espaciais de pequeno, mdio e grande porte. Nesse programa a famlia de

    1 Paulo Moraes Jr. et alli, An Overview of the Brazilian Launch Vehicle Program Cruzeiro do Sul, 57th International Astronautical Congress, IAC 2006-D2.1.08, Oct, 2-6, 2006, Valencia, Espanha..

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    lanadores propostos prev a inteira comunalidade de estgios em todos os veculos.

    A segunda proposta prega uma bifurcao imediata do programa de veculos lanadores, com a introduo e consolidao de um novo projeto voltado para o desenvolvimento de um veculo de porte mdio, capaz de atender a uma grade razovel de misses de carter estratgico para o pas.

    O primeiro veculo contemplado nessa proposta atenderia um envelope de misses cobrindo massas satelizveis de 1 a 4 toneladas em rbita baixa e incrementos de velocidade de 9 a 12 km/s. Com este envelope seria viabilizada a realizao de uma grade de misses que atendem os objetivos estratgicos do programa e permitem avanar a tecnologia e explorao de misses com apelo comercial e sustentabilidade econmica. O primeiro vo desse veculo seria realizado num prazo de 8 a 12 anos, dependendo do grau de acesso a tecnologia e assistncia tcnica externa e da intensidade de aplicao de recursos internos.

    Uma vez realizado o primeiro lanamento com sucesso, os recursos humanos e infraestrutura fsica de desenvolvimento envolvidos seriam progressivamente redirecionados para um veculo de gerao avanada ampliando o envelope de cargas satelizveis para a faixa de 6 a 8 toneladas em rbita baixa e incrementos de velocidade de 9 a 15 km/s. Este veculo realizaria o primeiro vo num horizonte de 18 a 20 anos. Com este envelope de misses ser possvel atender s demandas de carter estratgico e estar tambm aberta a possibilidade de explorao comercial dos recursos espaciais.

    Uma cooperao externa poder encurtar significativamente o prazo de desenvolvimento e reduzir os riscos do programa, com a ressalva de que o saber fazer seja alcanado, para que o pas se torne gradativamente independente. Entretanto no deve ser descartada a possibilidade de um desenvolvimento interno em caso de dificuldades intransponveis de acordo de cooperao externa. Deve tambm ficar claro que a cooperao tcnica externa nesta rea envolve negociao poltica delicada e requer posicionamento claro e previsvel do pas no cenrio mundial.

    importante ressaltar que esta alternativa no prega o abandono dos avanos obtidos em motores a propelentes slidos at o presente. Ser acentuado o seu carter de plataforma tecnolgica, visto que a propulso slida tornou-se tradicional no Brasil, e recomendvel que o desenvolvimento e a aplicao desta tecnologia sejam permanentemente exercitados, pela sua vasta gama de aplicaes.

    Conseqentemente, o desenvolvimento, produo e operao de foguetes de sondagem devem permanecer no mbito da Atividade Espacial do Brasil, pelas razes principais que se seguem:

    Treinamento das equipes: tanto os campos de lanamento quanto as equipes de integrao e operao se mantm hbeis pela operao de foguetes menores. Os membros mais novos podem ser treinados nos foguetes de sondagem antes de passarem a atuar nos lanadores de satlites. Isto vale para tcnicos dos rgos governamentais e das empresas envolvidas;

    Misses precursoras de sistemas espaciais: experimentos e

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    equipamentos a serem embarcados em satlites podem ser avaliados em vos suborbitais.

    Popularizao do acesso ao espao: os foguetes de sondagem podem ser utilizados para captar a ateno do meio estudantil para a Atividade Espacial de forma participativa e educativa.

    Manuteno da competncia neste tipo de atividade nas organizaes j detentoras da infraestrutura e do saber fazer.

    Apoio pesquisa nas reas de fsica da atmosfera, microgravidade, reentrada e outras de interesse nacional e estrangeiro. A atividade mantm habilidades necessrias aos lanadores de satlites.

    Para atender s demandas citadas acima, e visando tornar essa ao mais atraente para uma forte participao industrial, dever ser estabelecida uma cadncia de lanamento de dois a trs veculos de sondagem por ano por um perodo de dez anos. As misses a serem atendidas com esses veculos seriam objetos de chamadas de oportunidade para os diversos agentes envolvidos no programa, incluindo universidades, instituies cientficas, empresas e parceiros industriais.

    Com respeito aos veculos lanadores de satlites a cadncia de lanamentos seria ditada pela necessidade da realizao de vos tecnolgicos e de qualificao, bem como pelo atendimento de misses espaciais brasileiras j estabelecidas ou a serem estabelecidas por intermdio de estmulos juntos aos usurios em potencial, tanto no Brasil como no exterior.

    Marcos importantes a serem cumpridos no desenvolvimento dos veculos lanadores:

    Definio do combustvel a ser utilizado nos motores principais: Embora existam alternativas para o par combustvel a ser utilizado, o emprego do par queroseneoxignio lquido o recomendado, porque pouco txico, tem eficincia aceitvel, tem ampla disponibilidade e baixo custo, e conta com uma boa gama de motores j desenvolvidos em outros pases. Embora os pares estocveis tenham seus mritos, os pases detentores de tecnologia espacial vm abandonando esta soluo em funo dos riscos de contaminao ambiental associados. Quanto aos motores, o grande nmero de motores j desenvolvidos na Rssia permitir encontrar a soluo para o veculo desejado.

    Insumos necessrios e deciso sobre quais seriam desenvolvidos no pas e quais seriam adquiridos no exterior:

    H itens para os quais o Brasil tem apresentado grande dependncia externa, tais como sensores, equipamentos eletrnicos de bordo (avinicos), pirotcnicos de alta confiabilidade, materiais a base de carbono (fibras e tecidos de carbono e blocos de carbono-carbono), e componentes eletrnicos. Desenvolver ou continuar adquirindo do exterior ? Essa uma questo a ser discutida e resolvida com brevidade.

    Especificao, projeto, construo e aceitao da infraestrutura de

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    ensaios, integrao, transporte e lanamento:

    O investimento em infraestrutura maior que aquele empregado no desenvolvimento dos foguetes, e envolve: bancos de prova de motores, meios de ensaios ambientais (vibrao, temperatura, vcuo, eletromagntico); prdios de estocagem e de integrao, torres de lanamento, meios de transporte de superfcie e areo.

    Equipes tcnicas: As atividades de desenvolvimento dos veculos lanadores demandam equipes tcnicas com alta especializao adquirida ao longo de anos de experincia. imprescindvel, portanto, um planejamento de longo prazo para a utilizao eficiente destes recursos. Como parte deste planejamento, imprescindvel que a carteira de projetos considere a disponibilidade das equipes e a necessidade de preparao das mesmas. Um ritmo muito lento de misses tende a gerar ociosidade de equipes especializadas (tarefas especficas de engenharia, ou operao de equipamentos dedicados) ou alargar muito a faixa de atuao de equipes.

    Lanamentos e Planejamento de Misses:

    A quantidade de lanamentos importante para o planejamento das misses, sendo que estas devero levar em considerao o cronograma de desenvolvimento dos veculos. O planejamento das misses poder ditar o ritmo a partir de uma situao que garanta sustentabilidade tcnica e econmica por parte do veculo.

    Portflio de Misses:

    Uma ou duas misses anuais o mnimo para a sustentabilidade tcnica de um programa espacial. Trs a seis misses anuais aproximam o programa do equilbrio na utilizao dos recursos, na reteno de capacitao e capacidade de acompanhamento de avanos realizados por outros programas. Um ritmo maior de misses passa ser atraente para atuao comercial. A demanda por misses passa a ditar o ritmo de produo de veculos.

    Concluses

    As consideraes apresentadas neste documento levam s seguintes concluses:

    A motivao principal para o programa espacial brasileiro o carter estratgico representado de uma forma geral pela explorao dos recursos espaciais em comunicaes e observao da Terra para fins de segurana, defesa e governo, e aplicaes de interesse e com benefcios para a sociedade brasileira.

    O foguete a propelente qumico continuar sendo o meio de acesso ao espao nas prximas dcadas.

    A sustentabilidade tcnica requer um ritmo mnimo de produo e lanamento de um veculo por ano.

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    A sustentabilidade econmica obtida medida que o ritmo de produo e lanamento passa de uma a duas misses para um ritmo de quatro a seis misses anuais. Este crescimento pode ser obtido com incrementos pequenos dos recursos humanos e infraestrutura em relao ao patamar mnimo de sustentabilidade tcnica.

    Vencido o patamar de sustentabilidade econmica abre-se a perspectiva de operaes com retorno comercial.

    H uma janela de oportunidade para que o Brasil participe de forma competitiva no acesso ao espao com veculos que atendam a uma grade significativa de misses que satisfaam interesses estratgicos do pas.

    O envelope de misses dos veculos deve atender ao transporte de satlites de at quatro toneladas em rbita baixa e rbita de transferncia geoestacionria. Este envelope de misses permite a realizao de misses de observao (cientficas, sensoriamento remoto, meteorolgicas, etc.) e de comunicaes.

    O prazo para o incio de operao do primeiro veculo ps VLS no deve ultrapassar cinco anos.

    A abordagem do tema Acesso ao Espao se concentrou nos aspectos da sustentabilidade e no roteiro para acesso ao espao. Estes temas so centrais para o momento e para os objetivos do Programa Espacial Brasileiro no que tange sua sustentabilidade e cada um de seus componentes.

    Quanto forma de acesso ao espao, foram identificadas duas linhas de ao que no so necessariamente excludentes. Uma prioriza o atendimento a misses que visam tornar o pas independente no lanamento de satlites de comunicao e de sensoriamento. A outra prev progresso na forma de chegar ao mesmo objetivo. Cabe agora avaliar e discutir as alternativas apresentadas, contribuindo assim na deciso do que e como fazer, em debates de alto nvel governamental.

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    Recursos Recursos Fsicos

    Relao entre os meios fsicos e o ciclo de vida de uma misso espacial

    Programas Espaciais sempre exigem extensos meios fsicos para o seu desenvolvimento. Os meios fsicos necessrios mudam de acordo com as misses escolhidas e ao longo do ciclo de vida dessas misses, o que leva a uma grande variedade de meios que devem ser permanentemente mantidos e atualizados. O desenvolvimento de misses espaciais, em qualquer um de seus segmentos fundamentais (espacial, de lanamento e de solo) obedece a um ciclo de vida padronizado, que pode englobar as seguintes fases:

    Fase 0 (Zero): Anlise de Misso / Identificao de Necessidades

    Fase A: Anlise de Viabilidade

    Fase B: Projeto Preliminar

    Fase C: Projeto Detalhado

    Fase D: Qualificao e Produo

    Fase E: Operao

    Fase F: Descarte

    Cada uma das fases de um projeto espacial apresenta demandas por meios fsicos diferenciadas, que em resumo podem ser assim descritas:

    Fases 0, A e B: so fases de estudos preliminares, que demandam os meios tpicos dos escritrios de engenharia, hoje fortemente apoiados por sistemas computacionais para o desenvolvimento de projetos estruturais, eltricos e eletrnicos, projetos trmicos, desenvolvimento de software, anlise de misso, determinao de confiabilidade, etc. Tambm se faz essencial o apoio computacional para a comunicao entre equipes; para o gerenciamento dos projetos e para controle da configurao. O ambiente de projetos tambm demanda acomodaes adequadas para as equipes, infraestrutura para reunies, arquivamento e apoio administrativo. O produto final dessas trs fases so projetos preliminares de satlites, lanadores ou sistemas de solo, que antecedem o incio de sua efetiva materializao.

    Fase C: esta fase repete as necessidades das fases anteriores, com o acrscimo da demanda por laboratrios para desenvolvimento e meios de produo industrial. Tambm surge a demanda por meios de teste para a realizao de ensaios em modelos de engenharia ou de qualificao. O produto final so projetos detalhados e uma variedade de modelos necessrios para o desenvolvimento de cada misso.

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    Fase D: as mesmas anteriores, somadas de instalaes industriais de maior porte para manufatura, estocagem, recebimento de partes e materiais, integrao, realizao de testes funcionais, eltricos, e ambientais. Dessa fase resulta o modelo de vo pronto, assim como todo o aparato necessrio para sua manipulao, armazenamento e transporte.

    Fase E: no que ser refere ao lanamento, a infraestrutura suprida pela organizao lanadora, o que inclui portos, aeroportos, estradas de ferro e de rodagem preparados para o recebimento das partes do lanador e dos satlites a serem lanados. Tambm inclui a infraestrutura para estocagem de partes do foguete e do combustvel, movimentao, integrao e testes do veculo lanador, assim como para a preparao final, abastecimento e montagem no foguete do(s) satlite(s) a ser(em) lanados. Completada a etapa de lanamento, tem incio a fase de utilizao do satlite, que para ser conduzida demanda recursos fsicos de solo capazes de control-lo (centros de controle que realizam as funes de telemetria, telecomando e rastreio), assim como para planejar a operao das cargas teis e tratar os dados transmitidos para a terra, tarefa realizada pelos centros de misso. Estes ltimos variam substancialmente de acordo com as misses.

    Fase F: no caso de satlites, esta ltima fase cuida do encerramento da misso. Para ela so necessrios recursos de anlise e simulao semelhantes aos utilizados nas fases iniciais da misso, mais os recursos do centro de controle de satlites, eventualmente expandido para atender a requisitos de ampliao dos perodos de visibilidade.

    Demandas atuais e futuras

    O Programa Espacial Brasileiro dever, ao longo dos prximos vinte anos, desenvolver misses satelitrias e de lanadores nas categorias propostas no item anterior neste documento, e novamente mencionadas a seguir para relacion-las com suas respectivas demandas por infraestrutura fsica.

    Sensoriamento Remoto do tipo ptico (Ex.: satlite da srie CBERS e Amaznia): estas sries de satlites constituem hoje o cerne do programa espacial no tocante a satlites. A infraestrutura hoje existente no INPE e nas empresas por ele contratadas cobre as necessidades fundamentais para o desenvolvimento dos subsistemas hoje produzidos no Brasil. Dentre as necessidades ainda no inteiramente satisfeitas destacam-se as de um laboratrio para o desenvolvimento de sistemas de controle de atitude, e de um ambiente para a verificao e validao de softwares de bordo e solo. Quanto aos centros de controle e de misso, os meios necessrios devero ser uma modernizao dos que hoje j existem, no havendo uma alterao substancial em seus requisitos.

    Sensoriamento Remoto do tipo radar (Ex.: MAPSAR): estas misses so o prximo passo das misses de sensoriamento remoto nacionais, cujo objetivo ser complementar as do tipo ptico. O desenvolvimento de sua plataforma dever ser em boa medida baseado nas plataformas j existentes, semelhante em porte que hoje equipa os satlites da srie CBERS, para as quais a infraestrutura existente atende a parcela substancial da misso. No entanto, o maior desafio para esta misso est no desenvolvimento da carga til, constituda

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    por mdulos eletrnicos e por antenas radar do tipo planar ou flexvel. Quanto aos centros de controle, estes devero ser em muito semelhantes aos que atendem s misses de sensoriamento remoto pticos. Os centros de misso devero ser estruturados para atender s peculiaridades das misses radar, particularmente no que ser refere s demandas por armazenamento e processamento dos dados coletados em rbita.

    Ambientais (Ex.: GPM-Br, SABIA-mar): estas misses cobrem uma faixa intermediria de necessidades situada entre as de sensoriamento remoto e as meteorolgicas convencionais. Nestes casos as plataformas podero ser de porte intermedirio, semelhantes que deve equipar os satlites da srie Amaznia, ou de maior porte, semelhante que equipa os satlites da srie CBERS. Nos dois casos, a infraestrutura existente j atende a parcela significativa das necessidades das misses. Tambm para elas o maior desafio recai no desenvolvimento das cargas teis, caso de instrumentos do tipo radimetro, como o que dever equipar o satlite GPM-Br. Assim como nos casos dos satlites de sensoriamento remoto, os sistemas de controle no devero ser substancialmente diferentes. Os centros de misso tero um carter mais modesto, podendo no limite ser do tipo monousurio, sem grandes demandas por armazenamento, processamento e distribuio de dados brutos ou produtos mais elaborados.

    Cientficas (Ex.: Lattes): misses cientficas so usualmente nicas, atendendo a um conjunto singular de requisitos. No caso brasileiro, as misses do gnero devero explorar temas associados fsica de altas atmosferas. Neste caso tambm, enquanto as necessidades das plataformas esto razoavelmente satisfeitas, os maiores desafios recaem no desenvolvimento, fabricao, integrao e testes de cargas teis de vrias naturezas, cada uma podendo requerer um conjunto nico de meios. Neste caso os centros de controle e misso devero ter caractersticas em tudo semelhantes aos dos requeridos pelas misses ambientais.

    Coleta de Dados (Ex.: srie SCD-Avanado): trata-se da continuidade da misso dos primeiros satlites brasileiros, com o acrscimo de alguns avanos, particularmente na forma de um transponder de carga til mais moderno, e de uma plataforma miniaturizada. A infraestrutura necessria no dever impor requisitos novos j existente, com a exceo da demanda pela compactao dos sistemas eletrnicos de bordo. Os sistemas de solo, para controle e misso, sero em tudo semelhantes s que hoje atendem aos satlites SCD, a menos das necessrias modernizaes.

    Telecomunicaes (a serem definidas): quaisquer que sejam as misses a serem definidas, elas traro um grande impacto em termos de meios fsicos, devido tanto natureza de suas partes, quanto ao porte dos satlites a serem desenvolvidos. Sob o ponto de vista da natureza, a demanda vir na forma de meios para o desenvolvimento e teste das cargas teis de comunicao (transponders e antenas). Para tanto sero necessrios cmaras blindadas anecicas dotadas de campos de antena do tipo prximo. Sob o ponto de vista do porte, torna-se necessrio ter meios para testar, em uma matriz de testes ambientais completa (vibrao, trmico em vcuo, interferncia e compatibilidade eletromagnticas e propriedades de massa) de satlites com porte entre trs e quatro toneladas. Para estas misses tambm os centros de controle e de misso

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    devero atender a lgicas distintas daquelas requeridas para os satlites listados anteriormente, todos de rbita baixa. Neste caso as antenas de rastreio devero ser dedicadas. No existe a figura de um centro de misso nico, existindo sim sistemas modulares de transmisso e recepo que podero ser distribudos a todos os eventuais usurios.

    Meteorolgicas (a serem definidas): tambm neste caso a demanda por meios fsicos ser significativa, a imagem do que deve ocorrer com os satlites de comunicao, embora em escala um pouco menor. A massa dever estar na faixa de duas a trs toneladas, e as cargas teis sero o item que dever impor a maior demanda por meios de desenvolvimento e teste. Tambm neste caso, os centros de controle devero ser dedicados, supondo satlites do tipo geoestacionrio. A diferena da misso anterior recai no centro de misso, que tambm ser nico.

    Lanadores de satlites

    De uma formal geral, e considerando a necessidade de desenvolvimento e qualificao de propulsores a propelente slido e lquido de mdio porte, faz-se necessrio modernizar e ampliar os meios existentes para atender os requisitos impostos por estes.

    Ao iniciar o desenvolvimento de foguetes no pas fez-se opo pelo uso de propelentes slidos. Essa tecnologia foi desenvolvida ao longo de trinta anos e hoje de amplo domnio pelo IAE. Portanto, imprescindvel que dela se continue fazendo uso e que propulsores j qualificados e outros a serem desenvolvidos sejam considerados no projeto de veculos lanadores de satlites futuros. Para continuidade de uso dessa tecnologia, so relacionadas a seguir as instalaes necessrias para desenvolvimento de propulsores a propelente slido que devero compor estgios de veculos lanadores de mdio porte:

    Usina de propelente slido para atender uma produo de at 1.000 t/ano;

    Instalaes para carregamento de propulsores a propelente slido de dimenses de at 2 m de dimetro e 8 metros de comprimento;

    Banco de provas de propulsores a propelente slido com empuxo de at 3 MN;

    Infraestrutura fixa e mvel para manipulao e transporte de propulsores a propelente slido de at 50 t, com medidas mximas de 2 m de dimetro e 8 m de comprimento;

    Mquina de bobinagem de estruturas em material compsito para envelopes motores de at 2 m de dimetro e 8 m de comprimento;

    Correspondentes instalaes para ensaios mecnicos, estticos e dinmicos, e hidropneumticos de propulsores de at 50 t;

    Equipamentos de ensaios de raio-x e ultra-som condizentes com as novas estruturas dos propulsores.

    Objetivando reduzir a logstica de transporte das novas estruturas e propulsores de maior porte que os atuais, torna-se evidente que estas novas instalaes sejam implementadas prximas aos stios de lanamento. Portanto, recomenda-se que todas as instalaes relacionadas a: processo de preparao do envelope motor e colagem das protees trmicas, preparao da proteo

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    trmica e carregamento propriamente dito, acabamento e estocagem, controle e preveno de falhas, segurana e logstica de transporte, sejam implantadas no entorno do futuro stio de lanamento dos veculos lanadores de mdio porte.

    Considerando o estabelecimento de misses espaciais que exigiro o uso de veculos lanadores de desempenhos superiores ao atual VLS-1, propulsores a propelente lquido far-se-o necessrios na composio destes. Em se tratando de uma tecnologia ainda incipiente no pas, apesar do razovel esforo que vem sendo empreendido pelo IAE (Instituto de Aeronutica e Espao), motores e seus dispositivos e componentes, banco de provas e instalaes de carregamento, tero que ser adquiridos inicialmente de fornecedores de pases j parceiros do Brasil em atividades anteriores e correntes (destaca-se aqui a Rssia como potencial fornecedor de motores a propelente lquido nas classes de desempenho de interesse). No obstante, o Brasil no deve abster-se em desenvolver seus prprios motores, uma vez que absolutamente desejvel, no depender de fornecedores externos em item de tal importncia para fabricao majoritariamente autnoma dos veculos.

    Nesse contexto deve-se investir fortemente no desenvolvimento de estudos e projetos de propulsores a propelente lquido em conjunto com parceiro externo altamente qualificado, objetivando adquirir expertise em tempo hbil para atender o que preconizado e proposto no tpico II do presente documento.

    A poltica para os investimentos em meios fsicos

    Os investimentos requeridos por programas espaciais em meios fsicos so enormemente variados no tempo, no local de instalao, em seu custo e em sua finalidade. A infraestrutura fsica est intrinsecamente associada s atividades de Pesquisa & Desenvolvimento fundamental, e ao ciclo de Desenvolvimento, Fabricao / Integrao / Verificao / Validao / Testes, Lanamento e Operao de misses especficas.

    Todos os investimentos em meios fsicos criam um passivo institucional permanente, na forma de uma demanda constante por manuteno, modernizao e recursos humanos. Uma vez feito o investimento, haver um nus permanente para o oramento da instituio. Historicamente, as instituies envolvidas com o PEB formaram um patrimnio de laboratrios e outros meios fsicos que ainda refletem as necessidades originais da Misso Espacial Completa Brasileira (MECB), que remonta aos anos 80.

    Do lado do INPE, as modernizaes incorporadas desde ento so fruto do envolvimento com o programa CBERS, por se tratar de satlites de porte significativamente maior. Estas modernizaes ocorreram principalmente no Laboratrio de Integrao e Testes (LIT) do INPE, e na ampliao, tambm no INPE, da capacidade de seu centro de misso para atender demanda imposta pela livre distribuio de imagens de sensoriamento remoto produzidas pelos satlites da srie CBERS e de outras fontes.

    Do lado do IAE pouco foi feito desde ento, por no ter sido ainda possvel completar o projeto original do VLS-1, nem ter sido estabelecido de forma clara um novo curso de ao.

    Da parte dos centros de lanamento viu-se uma regresso, pois o CLBI

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    teve sua operacionalidade reduzida, e o CLA ainda no se recuperou dos danos causados pelo acidente com o terceiro prottipo do VLS-1 em 2003, nem teve materializados os investimentos planejados pela empresa binacional ACS.

    Como conseqncia, vive-se em termos de meios fsicos um processo de decadncia material e de competncias que afeta a maioria das instalaes criadas nos anos 80 e 90. Cabe ressaltar que mais grave que a decadncia material a decadncia, obsolescncia ou simples desaparecimento por abandono ou aposentadorias dos recursos humanos, pois sem eles torna-se intil o aporte de recursos oramentrios para a recuperao fsica das instalaes.

    A reverso do estado atual dever ser regida por um novo paradigma que reconhea que um plano estratgico eficaz implica numa composio harmnica entre os meios fsicos disponveis nas organizaes governamentais envolvidas e na indstria. Sem isso o envolvimento industrial ser sempre tardio e incompleto.

    A infraestrutura das organizaes governamentais dever ser desenvolvida em duas vertentes:

    Na primeira deve suprir os meios nicos necessrios para atender aos ciclos de verificao, validao, qualificao e integrao dos sistemas espaciais de forma universal, ficando disponveis tanto para a demanda interna quando para a da indstria.

    Na segunda devem manter laboratrios em porte reduzido para atividades de desenvolvimento tecnolgico (produtos e processos), particularmente de misses de pequeno porte (p. ex.: Cubesats) ou cientficas. Isto servir para (a) manter a proficincia da organizao, (b) a mitigao de riscos por meio do amadurecimento de tecnologias inovadoras, (c) o treinamento de mo de obra.

    Organizaes governamentais devero manter a infraestrutura fabril mnima necessria para atender a necessidades quotidianas dos seus laboratrios. Neste caso elas no devem competir com a indstria. Nas empresas, a infraestrutura dever prover os meios requeridos para o desenvolvimento, fabricao e integrao de produtos, particularmente em nvel de equipamento e subsistemas. O financiamento para o estabelecimento desta infraestrutura poder vir por meio de investimentos prprios, por contratos para o desenvolvimento de equipamentos ou por subvenes econmicas.

    A infraestrutura do setor privado dever ser posta em uso e mantida por meio de vrias estratgias, tais como:

    Contratos para o desenvolvimento tecnolgico preliminar, visando alcanar a maturidade tecnolgica mnima (TRL) para sua futura incorporao em misses reais. Estes contratos podem ter origem tanto nas organizaes governamentais desenvolvedoras de satlites e lanadores, quanto por meio de subvenes econmicas.

    Contratos para o desenvolvimento, fabricao e integrao de equipamentos e subsistemas para misses nacionais ou internacionais, nos casos em que as empresas conseguirem se colocar como exportadoras.

    A sustentabilidade deste sistema s ser possvel na medida em que as empresas buscarem seus nichos de competncia, e que a poltica espacial

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    permita um fluxo regular de recursos e o planejamento de longo prazo. Para tanto, a legislao que disciplina as compras governamentais deve ser revista, pois com as limitaes atuais quase impossvel ter uma poltica industrial adequada a este tipo de atividade. Devem ser autorizadas contrataes em modalidades adicionais de contrato nico a preo fixo. Dentre as possveis alternativas, poderiam ser citadas as que permitam:

    A contratao, por meio de processo competitivo ou no, de mais de uma empresa simultaneamente para produzir o mesmo trabalho, como comum encontrar nas reas espacial e de defesa de outras naes, particularmente para as fases preliminares de desenvolvimento de uma nova tecnologia. Tal mecanismo no constituiria um desperdcio de recursos pblicos, mas sim um incentivo criao de oportunidades e competio. Neste caso, cabe ao Contratante estabelecer as regras para a conduo do processo, promover a igualdade de competio entre as empresas envolvidas, garantir a preservao dos direitos intelectuais, exigir a comprovao dos recursos consumidos e impor indicadores que observem o investimento em infraestrutura, a aquisio de tecnologia, bem como o treinamento e a contratao de mo de obra para as atividades fim. O ciclo completo de desenvolvimento contemplaria um processo de afunilamento pelo qual um nmero maior, de at trs empresas (por exemplo), poderiam ser contratadas para o desenvolvimento de estudos correspondentes s Fases 0-A, at duas empresas para a Fase B (at a PDR), seguido de uma nica empresa para as Fases C (CDR) em diante.

    A contratao do tipo cost-plus nas fases de estudo prospectivo e preliminar de novos projetos (Fases 0-A ou 0-B). Esta modalidade deve ser seguida de contrataes a preo fixo da Fase C (Fase de Projeto Detalhado) em diante. Esta passaria a ser a norma dos novos planos de implementao. Adicionalmente, a empresa que realizasse a fase preliminar tambm poderia concorrer para a fase seguinte, o que hoje vetado por Lei, mas no poderia contar com o benefcio da dispensa de licitao. O Contratante teria que assegurar que ao final da fase inicial a documentao preparada e entregue seja suficiente para que outras empresas assumam o projeto, pois a licitao da segunda fase utilizaria a documentao tcnica da primeira como base para a concorrncia.

    A contratao de empresa no papel de contratante principal, prime contractor com competncia para assumir o desenvolvimento completo de satlites e lanadores.

    A contratao de empresas que possam assumir as atividades de centros de misso, como de processamento, arquivamento e distribuio de dados.

    A recomendao para que empresas no invistam em meios fsicos para a integrao e testes em nvel de sistema completo (para satlites e lanadores), advm do fato de que seria pouco provvel, com a cadncia de misses do programa espacial brasileiro, que qualquer empresa consiga manter esta infraestrutura ocupada, ou que consiga amortiz-la. No entanto, esta opo no inviabiliza a existncia de empresa, ou empresas, com o papel de contratante principal.

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    Laboratrios e instalaes de testes dedicados

    Sob a perspectiva proposta na poltica de investimentos, caberia s organizaes pblicas manter, no mnimo, laboratrios e instalaes com os seguintes objetivos:

    a. Laboratrio para Verificao e Validao de softwares de bordo e de solo (para satlites e lanadores).

    b. Laboratrio para Simulao, Verificao e Validao de sistemas de controle de atitude (para satlites), ou para guiagem, navegao e controle (para lanadores).

    c. Laboratrio para Integrao e Testes (bancos de teste) de sistemas de propulso a combustvel lquido e slido de pequeno a grande porte (para satlites e lanadores).

    d. Laboratrio para Montagem, Integrao e Testes funcionais, eltricos e ambientais de equipamento, subsistemas e sistemas completos (para satlites e lanadores).

    e. Laboratrio para Ensaios Estruturais (para satlites e lanadores).

    f. Laboratrio para Ensaios Aerodinmicos (tneis de vento para lanadores).

    g. Bases de lanamento.

    h. Centros de controle de satlites e infraestrutura de rastreio e comunicao.

    i. Centros de misso de satlites.

    j. Laboratrios de desenvolvimento de produtos e processos.

    Os laboratrios de (a) a (f) seriam obrigatoriamente de uso compartilhado com a indstria, em base remunerada ou no. Sua presena nas organizaes pblicas teria como finalidade desonerar as empresas e manter, sob controle dos contratantes, o ciclo de ensaios que garantem a qualidade dos equipamentos encomendados junto indstria. Os itens de (g) a (i) no seriam de uso compartilhado com a indstria. Poderiam eventualmente ser tema de contrato de gesto junto a empresas, que assim assumiriam a tarefa de uso e gesto da infraestrutura por um perodo determinado. O item (j) corresponde a laboratrios de menor porte distribudos na estrutura departamental das organizaes pblicas envolvidas. Para todos os casos citados, tambm caberia s organizaes governamentais a responsabilidade pelo provimento de mo de obra, seu treinamento e reposio, assim como a manuteno e modernizao peridicas dos meios fsicos.

    s empresas caberia desenvolver a infraestrutura de desenvolvimento e fabricao correspondente aos subsistemas e cargas teis tpicos de satlites e lanadores, dentre eles:

    a. Estruturas e Trmica (para satlites e lanadores).

    b. Telemetria, Telecomando e Rastreio (para satlites e lanadores).

    c. Propulso (para satlites e lanadores).

    d. Gerenciamento de Bordo (para satlites e lanadores).

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    e. Suprimento de Energia (para satlites e lanadores).

    f. Controle de Atitude (para satlites) e Guiagem, Navegao e Controle (para lanadores).

    g. Cargas teis satelitrias (a serem definidas pelas misses).

    h. Sistema de solo para rastreio e controle (para satlites e lanadores).

    A manuteno, modernizao e provimento da mo de obra para manter o funcionamento desses laboratrios seria responsabilidade das empresas. Em casos eventuais, quando permitido pela Lei de Inovao, poderia haver o intercmbio de recursos entre as empresas e as organizaes pblicas contratantes.

    Recursos Humanos

    Ao tratar da temtica Recursos Humanos, o PNAE 2005-2014 apresenta o seguinte quadro para a quantidade de recursos humanos disponveis, referentes ao ano de 2005[2]:

    AEB: 84

    INPE: 1.145

    DEPED (atual DCTA): 1.035

    Indstria: 873

    O PNAE 2005-2014[2] reconhece a carncia de profissionais nas reas de materiais e processos, controle de atitude e rbita, sensores e atuadores espaciais, imageadores pticos de alta resoluo, radares de abertura sinttica, nanotecnologias e propulso lquida. Desconhece-se a fonte dos dados relativos ao DEPED (atual DCTA), mas naquilo que concerne s atividades espaciais a cargo do DCTA, a quantidade de especialistas civis destinada vertente Acesso ao Espao no chega a 700 especialistas, a includos os do Instituto de Aeronutica e Espao (IAE), Centro de Lanamento da Barreira do Inferno (CLBI) e Centro de Lanamento de Alcntara (CLA). A informao da existncia de 873 profissionais lotados na indstria deve ser oriunda da Associao das Indstrias Aeroespaciais Brasileiras (AIAB), a qual representa um conjunto de empresas que se dedicam rea aeroespacial com nfase, em funo da demanda, rea aeronutica.

    O PNAE 2005-2014 estabelece algumas metas para o PEB, incluindo o lanamento de quatro VLS-1, dois VLS-1 B e dois VLS-2, a bordo dos quais seriam transportadas as cargas-teis apresentadas na Tabela 1. Cinco anos depois do lanamento do PNAE 2005-2014 constata-se que nenhuma dessas misses foi realizada e sequer h previses de que o sejam em um futuro prximo.

    2 Agncia Espacial Brasileira. Programa Nacional de Atividades Espaciais 2005-2014: PNAE, Ministrio da Cincia e Tecnologia, Braslia, 2005.

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    Tabela 1. Calendrio de lanamento dos veculos nacionais (PNAE 2005-2014)[2].

    Ano Veculo Carga-til

    2007 VLS-1 EQUARS (Satlite de Pesquisa da Atmosfera Equatorial)

    2008 VLS-1 B SSR-1 (Satlite de Sensoriamento Remoto)

    2009 VLS-1 MIRAX (Monitor e Imageador de Raios X)

    2010 VLS-1 B GPM (Medidas Globais de Precipitao)

    2011 VLS-2 GEO-1

    2011-2012

    VLS-1 Satlite Cientfico 1

    2013 VLS-1 Satlite Cientfico -2

    2014 VLS-2 GEO-2

    Manifestao importante relativa importncia da rea espacial vem da Estratgia Nacional de Defesa, documento do Ministrio da Defesa publicado em 2008[3]. Dentre as suas diretrizes destacam-se:

    Uma comparao oportuna na rea espacial se faz com a ndia, a comear por alguns dados scio-econmicos dessas duas naes emergentes, apresentado na Tabela 2. Apesar de possurem menos recursos que o Brasil, os indianos possuem mais de 20 satlites artificiais em rbita da Terra, enquanto o Brasil apenas dois. O SCD-1 e SCD-2, satlites de coleta de dados nacionais, lanados em 1993 e 1998, respectivamente, j cumpriram seus ciclos de vida e encontram-se muito prximos do fim de vida til. Cem por cento das telecomunicaes e transmisso de dados brasileiros so realizadas por meio de satlites estrangeiros. Os indianos, por outro lado, j enviaram misso no tripulada Lua e j planejam o envio de um rob ao satlite artificial da Terra. Para tanto, a ndia investe um bilho de dlares em seu Programa Espacial, enquanto o Brasil menos de um tero disto. No Programa Espacial Indiano trabalham 14.500 pessoas, 3/4 das quais com formao superior[4]. No PEB trabalham cerca de 2.000 especialistas civis, incluindo INPE, IAE (espao), CLBI e CLA. Os indianos, cujo programa espacial comeou junto com o brasileiro, parecem no ter dvidas de que a melhoria na qualidade de vida do seu povo est intrinsecamente ligada ao desenvolvimento tecnolgico, do qual o espacial exemplo mpar.

    Tabela 2. Dados comparativos entre Brasil e ndia[4].

    Pas PIB (U$) Populao IDH/Posio

    Brasil 1,6 trilhes 194.000.000 0,813/75o

    ndia 1,2 trilhes 1.200.000.000 0,612/134o

    3 Tecnologia e Defesa, Suplemento Especial O que o Brasil busca no Espao, no 20, 2010. 4 Almanaque Abril 2010, Editora Abril, So Paulo, 2010.

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    Novamente cabe comparar os dados brasileiros com aqueles do Programa Espacial Indiano. A Figura 1 apresenta dados relativos aos recursos humanos e financeiros da ISRO (Indian Space Research Organization), enquanto a Figura 2 ilustra a quantidade e formao desses especialistas.

    Figura 1. Evoluo oramentria e de pessoal do programa espacial indiano[5].

    Figura 2. Perfil dos recursos humanos do programa espacial indiano[4]. 5 Jayanthi, U. B. Indian Space Research Organization. An Appraisal, Documento produzido para reviso do PNAE 2015-2030, 2009.

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    No item referente formao e aperfeioamento de recursos humanos, somando-se 2008 e 2009, foram investidos cerca de quinhentos mil dlares pelo PEB.

    Quadro Atual de Pessoal

    O grande salto do PEB ocorreu na dcada de 1980, como conseqncia da Misso Espacial Completa Brasileira (MECB). Por isso, a grande maioria dos 2.000 especialistas que trabalham no IAE, INPE, CLBI e CLA foram contratados a partir de 1980. A eles, alm de salrios atrativos, era oferecida perspectiva profissional. A perspectiva de lanar foguetes e colocar satlites em rbita da Terra fascinante em qualquer lugar do mundo, e no foi diferente no Brasil. A MECB visava o lanamento de um satlite nacional, a partir do territrio brasileiro, com um foguete aqui fabricado. Tudo isso deveria ser alcanado at o final da dcada de 1980. Apesar de importantes para uma nao como o Brasil, 30 anos depois, esses objetivos foram parcialmente atingidos. O primeiro satlite (SCD-1) foi lanado em 1993 por um foguete americano. O segundo (SCD-2), cinco anos depois, tambm pelo foguete Pegasus. Quanto ao veculo lanador (VLS-1), somente em 1997 foi realizada a primeira tentativa de lanamento, quando um dos motores do primeiro estgio no foi acionado, causando a perda do vo. Dois anos depois, foi realizada a segunda tentativa de lanamento. Daquela feita houve a exploso do motor do segundo estgio, segundos aps a sua ignio. A terceira tentativa de lanamento ocorreria em agosto de 2003. Infelizmente, a ignio intempestiva de um dos propulsores do primeiro estgio causou uma catstrofe que vitimou 21 tcnicos civis que trabalhavam na integrao do VLS-1 na Torre Mvel de Integrao (TMI) do CLA. Desde ento, inmeras previses sobre o lanamento de um prximo VLS-1 tm sido feitas. Teme-se, contudo, que tal no ocorrer em um horizonte prximo. Alm das razes de carter tcnico e financeiro, h de se considerar aquelas de origem organizacional, decorrente da administrao de parte do programa espacial sob as regras de uma Organizao Militar (OM), como so o caso do IAE, CLA e CLBI. No menos importante a limitada quantidade de especialistas destinada ao programa.

    Ainda na dcada de 1980 o INPE deu incio ao desenvolvimento de satlites junto com a China. Desse acordo resultou o lanamento de trs satlites de sensoriamento remoto da srie CBERS (Satlite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres): CBERS-1, CBERS-2 e CBERS-2B, todos lanados por foguetes chineses da srie Longa Marcha. Atualmente no existe qualquer satlite CBERS em operao, devendo o prximo lanamento ocorrer em 2012. At ento as observaes da Amaznia ficaro prejudicadas e sero feitas por satlites estrangeiros. Apesar da importncia das imagens fornecidas pelo CBERS, cabe aos chineses boa parte dos recursos financeiros destinados pelo Governo brasileiro. Por falta de recursos humanos, o Brasil paga aos chineses para desenvolver parte das atividades que deveriam ser desenvolvidas aqui.

    Os recursos humanos hoje existentes no Programa Espacial Brasileiro so 2/3 daqueles existentes no incio dos anos 1990. Tal diminuio ocorreu por: aposentadorias, dois programas de demisso voluntria (PDV), opo pela iniciativa privada e diminuio no processo de admisso de novos especialistas. Desde 1994 foram realizados quatro concursos: 1995, 2002, 2004 e 2009 (servidores ainda no efetivados). Entre 1990 e 2007 ingressaram no DCTA (ITA,

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    IFI, IEAv, CLBA, CLBI e IAE) mil servidores. No mesmo perodo a evaso foi de 2.500 funcionrios. A mdia de idade elevada dos especialistas (50 anos) aliada ausncia de recursos humanos novos capazes de absorver o conhecimento dos mais velhos levar, muito em breve, perda de conhecimento no setor, perda esta que levar mais de uma dcada para ser reparada.

    Por ocasio da temtica Institutos de Pesquisa e Inovao: Novos Paradigmas, na 4a Conferncia Nacional de Cincia, Tecnologia e Inovao (CNCTI), ocorrida em Braslia no dia 28 de maio de 2010, a formao de recursos humanos foi apresentada como um dos itens a estrangular o setor. Quando ocorreu a discusso da temtica Energia Nuclear (P&D, Atores, Cadeia Pblica) foram apresentadas as seguintes dificuldades para aquele setor: capacidade tecnolgica, recursos financeiros, Lei de Compras e Licitaes (8.666) e idade mdia de 54 anos dos recursos humanos. A questo da elevada faixa etria dos servidores na rea de Cincia e Tecnologia grave. Em seu livro Failure is not an option (2001), Eugene Kranz, ex-diretor de vo da NASA, relata que a mdia de idade dos seus subordinados que pousaram Armstrong e Buzz Aldrin em solo lunar era de 27 anos[6]. Ou seja, foram os adolescentes do Sputnik que levaram os americanos Lua. Os prprios Armstrong e Aldrin tinham, em julho de 1969, 39 anos de idade. Alm de piloto da fora area americana e astronauta, Buzz Aldrin era Ph.D. pelo Massachusetts Institute of Technology. Foi l, alis, que ele desenvolveu vrios dos procedimentos utilizados para as manobras espaciais do Projeto Apollo. Eugene Kranz tinha 35 anos de idade. Tais fatos parecem indicar a existncia de uma idade mdia ideal para o desenvolvimento de programas de grande complexidade. Neste contexto, cabe aos mais novos conferirem ousadia e idealismo s suas atividades, cabendo aos mais velhos oferecerem prudncia, experincia e viso. Prestes a completar 50 anos de existncia, o Programa Espacial Brasileiro passa pelo seu momento mais crtico. Amadureceu sem que tenha oferecido os frutos dele esperados. A capacidade de realizaes existente h dez anos era superior quela existente hoje. Para retom-la e colocar o PEB em trajetria ascendente, ser preciso a contratao de 2.500 especialistas, distribudos entre o IAE, CLA, CLBI e INPE, alm da prpria AEB, que deve ser reformulada. Caso contrrio, o PEB atingir o ponto de no retorno, ou seja, ponto a partir do qual ser necessrio recomear da estaca zero.

    A Evoluo dos Recursos Humanos

    Considerando-se que um dos principais obstculos ao desenvolvimento do PEB a qualificao do VLS-1, bem como o fato do acidente ocorrido em agosto de 2003 ter trazido opinio pblica fatos e dados oficiais[7], a nfase da presente anlise ter o VLS-1 como foco. No h dvidas, no entanto, de que a mesma anlise pode ser aplicada vertente Satlites e Aplicaes.

    Alm do aporte de recursos financeiros, os idealizadores da MECB previram o aumento gradual dos recursos humanos para o desenvolvimento do VLS-1. Na Figura 3, a FASE 1 corresponde ao perodo que vai at a criao da COBAE (1971), enquanto a FASE 2 vai de 1971 at 1985. Nessas fases o programa contou com os recursos humanos necessrios sua conduo e

    6 Kranz, G., Failure is not an option: mission control from Mercury to Apollo 13