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Universidade Estadual de Maringá 02 a 04 de Dezembro de 2015 1 A VIOLÊNCIA FÍSICA E PSICOLÓGICA NA CRIANÇA DE HOJE COM DANOS NO ADULTO DE AMANHÃ BUENO, Priscila da Rocha Luiz. MAIO, Eliane Rose. RESUMO Atualmente vemos muitos casos de agressão contra crianças e adolescentes, o que nos faz repensar muitos conceitos. Estas agressões em alguns casos são executadas pela própria família, ou na residência da criança/adolescente o que se caracteriza como violência familiar ou doméstica. Não se pode deixar que este tipo de violência ocorra, ainda mais porque a criança de hoje é o adulto de amanhã que formará famílias e pode desencadear uma cadeia de novas agressões e assim por diante. É importante levantar dados para entender através do histórico o que ocorre para que se dê a violência contra criança e adolescência – que pode ser física ou psicológica – e identificar o motivo pelo qual um ser mais frágil é acometido pela violência. Além disso, é importante frisar que se a violência não é executada por um adulto, mas presenciada ou outro que não faz nenhuma ação, esta violência é compartilhada, e quem assiste passa de testemunha para cúmplice. Sendo assim, a violência é um fenômeno complexo que precisa ser acompanhado devido à violação, opressão e exposição do direito ao desenvolvimento de quem sofre. Palavras-chave: Criança e adolescência. Violência. Políticas públicas. INTRODUÇÃO Atualmente, o mundo é formado por cidadãos que desempenham e desenvolvem um papel na sociedade, sendo que cada um tem a sua devida importância, independente de sua idade, ou posição social. Um fato que sempre ganha destaque e que choca a todos é a violência praticada contra crianças e adolescentes, principalmente quando esta é realizada em um âmbito que é de familiaridade com o violentado, ou seja, em sua maioria, a própria família pode executar tal ato. De acordo com o histórico levantado no desenvolvimento deste artigo, não é de hoje que crianças e adolescentes tem a sua imagem prejudicada, e físico e psicológico

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Universidade Estadual de Maringá 02 a 04 de Dezembro de 2015

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A VIOLÊNCIA FÍSICA E PSICOLÓGICA NA CRIANÇA DE HOJE COM

DANOS NO ADULTO DE AMANHÃ

BUENO, Priscila da Rocha Luiz.

MAIO, Eliane Rose.

RESUMO Atualmente vemos muitos casos de agressão contra crianças e adolescentes, o que nos faz repensar muitos conceitos. Estas agressões em alguns casos são executadas pela própria família, ou na residência da criança/adolescente o que se caracteriza como violência familiar ou doméstica. Não se pode deixar que este tipo de violência ocorra, ainda mais porque a criança de hoje é o adulto de amanhã que formará famílias e pode desencadear uma cadeia de novas agressões e assim por diante. É importante levantar dados para entender através do histórico o que ocorre para que se dê a violência contra criança e adolescência – que pode ser física ou psicológica – e identificar o motivo pelo qual um ser mais frágil é acometido pela violência. Além disso, é importante frisar que se a violência não é executada por um adulto, mas presenciada ou outro que não faz nenhuma ação, esta violência é compartilhada, e quem assiste passa de testemunha para cúmplice. Sendo assim, a violência é um fenômeno complexo que precisa ser acompanhado devido à violação, opressão e exposição do direito ao desenvolvimento de quem sofre.

Palavras-chave: Criança e adolescência. Violência. Políticas públicas.

INTRODUÇÃO

Atualmente, o mundo é formado por cidadãos que desempenham e desenvolvem

um papel na sociedade, sendo que cada um tem a sua devida importância, independente

de sua idade, ou posição social. Um fato que sempre ganha destaque e que choca a todos

é a violência praticada contra crianças e adolescentes, principalmente quando esta é

realizada em um âmbito que é de familiaridade com o violentado, ou seja, em sua

maioria, a própria família pode executar tal ato.

De acordo com o histórico levantado no desenvolvimento deste artigo, não é de

hoje que crianças e adolescentes tem a sua imagem prejudicada, e físico e psicológico

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agredidos, pois desde a Grécia Antiga existiram provações que eram exigência para o

futuro adulto (até então adolescente) fizesse parte da sociedade. Claro que de lá para cá,

muito se evoluiu, leis foram criadas e existem dos mais variados tipos de órgãos para

que os direitos de crianças e adolescentes sejam mantidos, garantidos e os que infringem

estes direitos sejam punidos.

No entanto, há necessidade de entender o que se passa para que leve um familiar

a violentar uma criança próxima a si, ou seja, quais motivações passam pela análise

deste adulto para que cometa tal crime – seja ele físico, psicológico, sexual, pois a

violência pode se dar nestas e outras esferas.

A presente pesquisa toma por base o Estatuto da Criança e do Adolescente

(ECA/90), que traz em seu art. 5º que nenhuma criança ou adolescente será objeto de

qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e

opressão, punindo na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus

direitos fundamentais, pois a concepção de que a violência sexual é uma violação de

direitos e se faz necessário o acompanhamento, ressaltando que na maioria dos casos,

outros direitos básicos da criança e de seus familiares também são violados.

O presente projeto justifica-se na mediada em que muito se têm falado e até

escrito sobre a violência que ocorre com crianças e adolescentes em diferentes espaços,

e ainda, embora repudiada em nossa sociedade a violência, em várias circunstâncias:

violência de exploração, abuso extrafamiliar ou intrafamiliar, está presente em todas as

classes sociais e, infelizmente, ocorre com maior frequência do que, em geral, se tem

conhecimento.

Os procedimentos metodológicos a serem realizados consistirão em

instrumentos baseados nas leis vigentes, em documentos, referências bibliográficas e

entrevistas com os profissionais que atuam nos órgãos citados acima e que acompanham

o processo dessas crianças/ desses casos que se encontram em situação de risco.

Este tema caracteriza-se devido aos casos de abusos e violência conhecidos cada

vez maiores, cometidos por adultos contra crianças e adolescentes em nossa sociedade.

1 OS DADOS DA VIOLÊNCIA NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA

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A violência é um comportamento que causa intencionalmente dano ou

intimidação moral a outra pessoa. O comportamento praticado pode invadir a

autonomia, integridade física ou psicológica e até mesmo a vida do outro. É o uso

excessivo da força que ultrapassa o necessário ou o esperado.

Todos os tipos de violência causam forte impacto na sociedade e principalmente,

as pessoas que a sofrem. Quando cometida por uma pessoa de fora do convívio familiar,

causa grande impacto, e ainda, agride a dignidade e evidencia o senso de

vulnerabilidade humana, condições que sustentam o plano simbólico do ser social.

Independente da cultura e da sociedade, a infância tem que ser reconhecida

como um valor universal e deve ser protegida contra quaisquer formas de negligência,

crueldade e exploração, pois ela é uma condição concreta de existência e em qualquer

parte do mundo e, enquanto seres políticos, a criança e o adolescente são sujeitos de

direitos, necessitando de proteção e cuidados de cidadãos especiais (AZEVEDO;

GUERRA, 2010).

Para que a criança e adolescente tenham seus direitos assegurados, o Estatuto da

Criança e Adolescente (ECA) se faz presente em nosso país, o que dá liberdade de

expressão à criança e também penaliza quem vai contra este direito.

O principal objetivo do Estatuto é especificar os direitos de crianças e adolescentes no que diz respeito à vida e à saúde, à liberdade, ao respeito e à dignidade, à educação, cultura, esporte e lazer, e à profissionalização e proteção no trabalho. Além disso, explicita claramente a condenação legal contra toda e qualquer forma de ameaça ou violação desses direitos, sob forma de violência, exploração, discriminação ou negligência, responsabilizando o Poder Público pela implementação de políticas sociais “que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência” (Art. 7º) (FALEIROS; FALEIROS, 2007, p. 71, 72)

No Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), consta que é dever da família,

da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta

prioridade, a efetivação dos direitos referente à vida, à saúde, à alimentação, à educação,

ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade,

à convivência familiar e comunitária. Ainda fica expresso que não deve haver nenhuma

criança ou adolescente sujeito a qualquer forma de negligência, discriminação,

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exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado,

por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais (BRASIL, 1990).

Historicamente o abandono, a negligência, o sacrifício e a violência contra

criança, sempre existiram, e eram aceitos por determinadas comunidades, chegando, em

algumas situações, ao filicíneo, declarado ou velado, que levava as taxas de mortalidade

infantil, a índices elevados.

Na França do século XVIII, estes níveis chegavam a mais de 25% das crianças

nascidas vivas. Foi a partir do final do século passado, que a criança, até então estorvo

inútil, passou a ser valorizada, sob a óptica de que deveria sobreviver para ser tornar

adulto produtivo. Foi com a Revolução Industrial especialmente em fins do século

XVIII, que a criança passou a ser protegida por interesses, antes de tudo, econômicos e

políticos. Estes fatos culminam com a própria história da medicina, em que a palavra

pediatria só surgiu em 1872, até então, cuidar de crianças era uma responsabilidade para

mulheres (MINAYO, 2002).

A partir do século XX que algumas iniciativas foram realizadas para reconhecer

o direito de crianças e adolescentes e fazer com que os abusos diminuíssem ou pelo

menos começassem a se valorizar os pequenos.

O século XX inaugura a linha de produção em série e a intensa exploração do trabalho infanto-juvenil provoca, por um lado, mudanças nas famílias e problemas sociais e de saúde coletiva e, por outro, o surgimento de políticas para a proteção de crianças e adolescentes. De uma realidade do capitalismo industrial de meados do século XIX, em que as crianças trabalhavam por mais de 16 horas, avançamos, ao final do século XX, para um paradigma de proteção integral (FALEIROS; FALEIROS, 2007, p. 16).

Abranches e Assis (2011) comentam que mesmo apesar da violência

psicológica, que atinge crianças e adolescentes, não ser recente, apenas há 30 anos

recebeu atenção internacional com crescente conscientização e sensibilização de

profissionais e do público em geral. Ainda colocam que “... é um fenômeno universal

que não tem limites culturais, sociais, ideológicos ou geográficos e ainda está envolto

por um pacto de silêncio, principal responsável pelo ainda tímido diagnóstico e pelo

reduzido número de notificações.” (ABRANCHES; ASSIS, 2011, p. 846).

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Certamente, não é coincidência que o Brasil seja conhecido como o país com a

pior distribuição de renda, o que pode também ser compreendido como violência

estrutural (GOMES; SILVA; NJAINE, 1999).

Embora seja equivocada a associação mecânica entre violência, pobreza,

criminalidade e violação dos direitos, predominante no senso comum, é perceptível que

as desigualdades econômicas e a miséria estão diretamente relacionadas com as taxas de

homicídio e com a violência não gratuita (GOMES; SILVA; NJAINE, 1999).

A mortalidade por homicídio ocorre em adolescentes e adultos jovens, do sexo

masculino residentes em áreas pobres e às vezes periféricas das grandes metrópoles; de

cor negra ou descendentes dessa etnia; com baixa escolaridade e pouca ou nenhuma

qualificação profissional (SOUZA, 1999).

Ainda Milani (1999) coloca que ao longo da história e em grande parte dos

povos, a adolescência tem sido identificada com os níveis mais elevados de

agressividade, transgressão e conflito. Ficou estabelecida uma relação direta entre

juventude e violência. Se suas premissas estiverem corretas, é possível considerar

sombrias as perspectivas da sociedade brasileira nos próximos dez a quinze anos.

Já Adorno (2009) coloca que a associação entre adolescência e criminalidade

não é inquietação exclusivamente própria de sociedades com acentuadas desigualdades

sociais e em que as políticas sociais governamentais, ainda que se esforcem por

minimizá-las, não logram assegurar direitos sociais fundamentais para grandes parcelas

da população urbana ou rural, cujo ônus recai preferencialmente sobre crianças e

adolescentes, como sugerem vários estudos.

Estudos das décadas de 70, 80 e 90 apontam para a grande preocupação com o

conceituar e definir a violência psicológica. Diferente das outras naturezas de violência,

com definição e conceitos mais claros possibilitando assim melhor detecção e

consequente intervenção, a violência psicológica é pouco diagnosticada apesar de ser

mais prevalente do que as outras formas de abuso (ABRANCHES; ASSIS, 2011).

O perfil demográfico do Brasil está iniciando uma “onda adolescente”, durante a

qual esse grupo etário tornou-se o mais numeroso da população. São mais de 34 milhões

de adolescentes, representando mais de 20% da população, o que vai impor grandes

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mudanças no país por suas demandas em relação ao sistema de ensino, mercado de

trabalho, lazer e cultura (JUNQUEIRA, 2007).

2 ONDE, COMO E POR QUE ACONTECE A VIOLÊNCIA CONTRA

CRIANÇA E ADOLESCENTE

Antes de introduzir a motivação pela violência ser executada contra as crianças e

adolescentes, deve-se distinguir o termo violência doméstica e violência familiar.

Faleiros e Faleiros (2010) colocam que esta distinção faz-se necessária para identificar e

quantificar cada tipo de violência. A violência doméstica refere-se ao lugar onde ela

ocorre: na casa, no lar. A violência familiar se refere à natureza dos laços parentais que

unem as vítimas e os autores da violência.

Um dos fatores para que os adolescentes tenham sido mergulhados nessa trama

da violência é a dificuldade de pais, profissionais de educação, de saúde, e governantes

em compreenderem as características e necessidades dessa etapa (AZEVEDO;

GUERRA, 2010).

A adolescência é marcada por profundas transformações nas quais se entrelaçam

processos de amadurecimento físico, mental, emocional, social e moral, que são

influenciados pelas peculiaridades inerentes a cada sujeito, pelo seu ambiente

sociocultural e pelo momento histórico, o que torna complexa a sua delimitação ou

conceituação (COSTA, 1999).

Milani (1999) coloca que muitas vezes a violência contra o adolescente ocorre

dentro da própria família e na casa onde reside o violentado.

Embora existam múltiplas formas de família em nossa sociedade, distintas dos moldes tradicionais, o fato é que, independente de sua estrutura, a família é o primeiro grupo, a primeira escola, a primeira comunidade e a primeira experiência de exercício da cidadania que todo indivíduo vivencia, sendo essa experiência profundamente marcante e, muitas vezes, determinante da trajetória de vida. No entanto, como laços de consangüinidade não asseguram o amor, frequentemente o convívio familiar é marcado pela violência doméstica – cujas principais vítimas são crianças, adolescentes... (MILANI, 1999, p. 3).

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A violência doméstica contra crianças e adolescentes é caracterizada pelo abuso

do poder disciplinar e coercitivo de pais ou responsáveis, que muitas vezes se prolonga

ao longo de meses e anos, sendo uma violação dos direitos essenciais da criança e do

adolescente em sua condição de humanidade (AZEVEDO; GUERRA, 1997).

Embora a situação da violência familiar esteja sempre presente e pouco

discutida, acreditamos que isso decorre principalmente do fato de ser a família

entendida como uma instituição privada e o que se passa no seu interior não dizer

respeito às pessoas que não fazem parte dela. Portanto, é o conjunto de normas, de

administração da propriedade patrimonial ou privada, dirigida pelo chefe da família

(CHAUÍ, 1999).

Com o advento da Constituição Federal de 1988, o Brasil avançou na percepção

da infância, sob a ótica do Direito Público. Declara-se o direito da criança e do

adolescente, segundo seu grau de maturidade, para manifestar opiniões, reagir à

violência, defender-se, e responder por seus atos quando maltrata os demais (RIBEIRO,

ROSSO; MARTINS, 2004).

No entanto, houve evolução quanto às normas e leis que incriminam a violência

familiar, focada na criança e adolescente. E apesar do avanço ocorrido na legislação e

na sociedade nas últimas décadas, que alterou o modo de vida, costumes e valores das

pessoas, a família não recuou na mesma proporção na violência contra crianças e

adolescentes, pois ainda assim a violência continua marcando presença tanto pelas ações

brutais quanto pela omissão do adulto.

A violência manifesta-se, segundo essa concepção, pela imposição do adulto

sobre a criança e/ou adolescente em situações, nas quais, a vítima da violência é sempre

o indivíduo que reagiu de alguma forma, contrariando a vontade do adulto. Para que

seja corrigido, de maneira que não repita a ação, esse indivíduo precisa ser punido pela

imposição da autoridade “superior” (RIBEIRO, ROSSO; MARTINS, 2004).

Garbarino et al (1996) elencaram cinco importantes comportamentos parentais

tóxicos do ponto de vista psicológico infantil para auxiliar na detecção deste abuso:

[..] rejeitar (recusar-se a reconhecer a importância da criança e a legitimidade de suas necessidades), isolar (separar a criança de experiências sociais normais impedindo-a de fazer amizades, e fazendo com que a criança

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acredite estar sozinha no mundo); aterrorizar (a criança é atacada verbalmente, criando um clima de medo e terror, fazendo-a acreditar que o mundo é hostil); ignorar (privar a criança de estimulação, reprimindo o desenvolvimento emocional e intelectual) e corromper (quando o adulto conduz negativamente a socialização da criança, estimula e reforça o seu engajamento em atos antissociais) (GARBARINO et al, 1996, p. 156)

Mesmo que a violência contra a criança e adolescente não sejam

presenciadas, qualquer pessoa da sociedade que esteja ciente que a violência

ocorre e não faz nada, se torna cúmplice da agressão. Ou seja, se sabe que a

agressão física, moral ou psicológica ocorrem, mas não faz nada para ajudar,

deve-se entender que essa pessoa concorda com as ações, mesmo que não tenha

consentimento.

Todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra criança e/ou adolescente que sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou psicológico a vítima, implica de um lado, numa transgressão do poder/dever de proteção do adulto e, de outro, numa coisificação da infância, isto é, numa negação do direito que criança e adolescente têm de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento (AZEVEDO; GUERRA, 2010).

Ainda sobre a omissão daquela pessoa que tem ciência da agressão, mas nada

faz, temos Ribeiro, Rosso e Martins (2004) que colocam que é preciso que essas pessoas

se conscientizem de que a omissão quanto a casos de violência os tornam cúmplices ou

agressores passivos.

Mesmo que uma pessoa teve ciência da violência efetuada, muitas vezes esta não

leva ao conhecimento de autoridades e órgãos competentes por achar que o assunto é

familiar, de ordem privada e que não deve intrometer-se. A violência doméstica contra

criança e/ou adolescente é uma dura realidade, muito presente na sociedade. Contudo, a

maioria dos casos não chega a ser notificada aos órgãos competentes, pelo fato de as

pessoas não quererem se envolver em um assunto familiar, privado, dificultando assim o

trabalho de atendimento à vítima (RIBEIRO, ROSSO; MARTINS, 2004).

3 COMO EVITAR OU PREVENIR OS CASOS

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Faz-se mais que importante trazer as discussões sobre a violência na infância e

adolescência para dentro da escola, onde os docentes deparam-se constantemente com

situações em que a violência está presente da criança, a fim de que eles considerem a

realidade de vida das crianças e possam orientar os pais ou responsáveis, caso isso se

torne necessário.

Já Abranches e Assis (2011) colocam que alguns problemas identificados à

convivência de violência psicológica na infância e constatados nos estudos foram: mau

rendimento escolar; problemas emocionais (ansiedade, depressão, tentativa de suicídio e

transtorno de estresse póstraumático – TEPT); ser vítima de violência na comunidade e

na escola, transgredir normas e vivenciar violência no namoro.

Milani (2010) coloca que as crianças e adolescentes que foram agredidos,

apresentam alguns sinais na escola, pois seu rendimento é diferente:

... [elas] têm mais dificuldades de leitura e compreensão de textos [...], menor capacidade de atenção e concentração em tarefas [...], são ainda mais apáticas, desinteressadas pelas normas. Têm mais problemas disciplinares, mais suspensões, piores notas, repetências [...] O mau desempenho escolar afeta a autopercepção de competência e motivação para as atividades escolares. Esses aspectos estão associados a uma baixa auto-estima e à violência dentro das escolas (MILANI, 2010, p. 5).

Para Minayo e Souza (2003), a violência é uma questão fundamental para o setor

de saúde devido ao seu impacto nas condições de vida e de saúde da população,

especialmente quando acontece durante a infância, antes do completo crescimento e

desenvolvimento humano.

A observação constante do professor nas mudanças de comportamento dos

alunos e em atividades por eles realizadas, como a produção de textos, desenhos, e

outras que podem manifestar tensões, medos e angústias, contribui para a identificação

de situações de vitimização da criança e/ou adolescente no contexto familiar ou em

torno dele (RIBEIRO, ROSSO; MARTINS, 2004).

Desta forma é possível conferir a importância dos profissionais que trabalham

com essa clientela, principalmente os educadores, auxiliarem essa criança ou

adolescente mediante a denúncia. Somente através da comunicação do fato aos órgãos

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competentes é que poderemos quebrar esse ciclo da violência. Além disso, Ribeiro,

Rosso e Martins (2004) colocam que uma boa forma de se levantar e manter dados, é

utilizar os órgãos municipais existentes, conselhos tutelares existentes, entre outros.

Entre os principais mecanismos de execução das políticas em relação à criança e ao adolescente, os municípios contam com os Conselhos Municipais de Direito da Criança e/ou Adolescente, que se destinam à formulação, gestão e fiscalização de programas relacionados a crianças e/ou adolescentes, e os Conselhos Tutelares, que atuam quando ocorre a violação dos direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente, juntamente com o Ministério Público e o Juiz da Infância e Adolescência (RIBEIRO, ROSSO; MARTINS, 2004, p. 122).

Para os familiares ao redor, cabe observar também, pois algumas ações, por

parte das crianças, denotam que algum abuso está ocorrendo. Milani (2010) define estes

comportamentos como:

Desconfia dos contatos com adultos; está sempre alerta, esperando que algo ruim aconteça; está sujeito a mudanças frequentes e severas de humor; tem receio dos pais e evita, muitas vezes, a sua casa (quando é estudante procura chegar cedo à escola e dela sair bem mais tarde); apreensivo quando outras crianças começam a chorar; demonstra comportamentos que poderiam ser considerados como extremos (agressivos, disruptivos, destrutivos ou excessivamente tímidos, passivos, submissos, retraídos); demonstra mudanças súbitas no desempenho escolar ou no comportamento; apresenta dificuldades de aprendizagem não atribuíveis a problemas físicos específicos ou a problemas no próprio ambiente escolar; revela que está sofrendo violência física. (MILANI, 2010, p.6)

Entre estas opções ainda restam os Fundos dos Direitos da Criança e do

Adolescente, os Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente (federal e estadual),

as Varas da Infância e da Juventude, as Promotorias da Infância e Juventude.

Também as Delegacias de Proteção à Criança e ao Adolescente, os Fóruns dos

Direitos da Criança e do Adolescente, os Centros de Defesa, a Defensoria Pública, as

Secretarias de governo estaduais e municipais executoras de políticas públicas e as

ONGs. Esta última é parte integrante da Rede de Proteção, nas funções de Promoção

(nos Conselhos de Direitos), Atendimento (em programas nas áreas de saúde, educação,

assistência, cultura, profissionalização e proteção especial), Controle (Fóruns DCA),

Defesa e Responsabilização (Centros de Defesa) (FALEIROS; FALEIROS, 2010).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando que o fenômeno da violência contra crianças ocorre por diferentes

questões sociais, culturais, políticas e pessoais, e sabendo que qualquer tentativa de ação

eficaz necessita atentar para a multiplicidade de ações interventivas, certifica-se que tal

multiplicidade de ações implica a participação conjunta de todas as áreas de

atendimento, ou seja a intersetoriariedade deve acontecer de maneira eficaz com as

secretarias: social, saúde, educação, justiça, segurança, dentre outras, e jamais deve ser

abarcada por uma única instituição, ainda que multiprofissional, tendo em vista o grande

número de situações de violência que ocorrem diariamente contra crianças e de

indivíduos nelas envolvidos.

De acordo com os dados bibliográficos levantados, o número de crianças e

adolescentes violentados é grande e não tem um padrão para a diminuição, a não ser

quando são feitas leis específicas e rígidas contra os que praticam tal violência.

Nestes dados, foi visto também que antigamente as crianças e adolescentes

tinham péssimo tratamento e parecia que sequer faziam parte da sociedade como

pessoas normais. Com o tempo, e muita evolução, foram criadas leis específicas para

que houvesse proteção contra eles, bem como desenvolvimento de órgãos responsáveis

por processar os crimes contra crianças e adolescentes, bem como elaboração de normas

para proteger cada vez mais.

A violência familiar ou violência doméstica se dão pelo simples motivo de

exercer poder sob alguém e como normalmente a criança ou adolescente são mais

indefesos do que um adulto, a violência recai sobre eles.

Neste artigo, foram identificados motivos básicos que levam à agressão física ou

psicológica de crianças e adolescentes, bem como identificação de órgãos competentes

que fazem intervenção por esta classe que é fragilizada, devido à pouca idade ou mesmo

força de expressão.

Além disso, verificaram-se alguns pontos de apoios, como a escola e

professores, por exemplo, que podem ser uma ponte e canal de comunicação entre as

crianças violentadas e os órgãos competentes.

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A violência física e psicológica que são praticadas contra crianças e adolescentes

existe, e faz-se necessário a criação de projetos ou mesmo uma maior atuação por parte

da assistência social existente, fornecida pelo Estado ou Município.

Como foi verificado, os motivos pelos quais os adultos são levados a cometer

violência contra a criança e o adolescente são vários, sem um único identificador, então,

é interessante que há políticas públicas eficientes e que atuem também em cima do

agressor, verificando o histórico disso, para que haja prevenção e que o fato não volte a

ocorrer, ou ainda, se ocorrer, que a criança seja acolhida por uma instituição, ou

realocada em um membro da família, para que seja afastado de seu agressor.

REFERÊNCIAS

ABRANCHES, C.D.; ASSIS, S.G. A (in)visibilidade da violência psicológica na infância e adolescência no contexto familiar. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, pg 843-854, mai, 2011.

ADORNO, Sérgio, BORDINI, Eliana, LIMA, Renato Sérgio. O adolescente e as mudanças na criminalidade urbana. Revista São Paulo em Perspectiva - Vol.13, n°4, Oct./Dec.1999 AZEVEDO, M. A.; GUERRA, V. Contribuições e prevenção da violência doméstica contra crianças e adolescentes, 2010. Disponível em: <http://www.usp. br/ip/laboratórios/lacri>. Acesso em 02 Maio 2015.

BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente (1990). Estatuto da criança e do adolescente : Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, Lei n. 8.242, de 12 de outubro de 1991. – 3.ª edição – Brasília : Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2001.

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