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Universidade Federal do Ceará - Campus Cariri IV Encontro Universitário da UFC no Cariri Juazeiro do Norte-CE, 17 a 19 de Dezembro de 2012 A UTILIZAÇÃO DO MANOSSOLFA COMO FORMA DE INTRODUÇÃO A PERCEPÇÃO HARMÔNICA José Werbto Xavier Sales 1 Willames Nunes Rodrigues 2 Isaura Rute de Lima Gino 3 Marco Antônio Silva 4 1 Introdução/ Desenvolvimento As mudanças ocorridas na educação musical durante a passagem do século XIX para o século XX foram marcadas pelo contexto histórico da época. Neste período ocorreram varias mudanças em diversas áreas: Tecnológicas, Geo-politicas, Sociais, Socioeconômicas e transformações na área artística que se relacionavam com acontecimentos do período. Nesse contexto, no Brasil se desenvolve uma tensão histórica na trajetória da educação musical que era a acadêmica/escolar e se fundamentava em uma lógica cartesiana e positivista, ou seja, tinha como referência a musica de concerto de tradição europeia e o ensino da musica acontecia em conservatórios (ARROYO, 2002). Esse confronto passa a existir a partir da tentativa de Villa-Lobos de socializar o ensino da música pela prática do Canto Orfeônico, destinado aos alunos da rede pública do país, nas décadas de 1930 e 1940 (SILVA, 2009). Heitor Villa-Lobos foi maestro e compositor, sendo considerado o maior expoente da música do modernismo no Brasil. Na época, estava na direção da Superintendência da Educação Musical e Artística (SEMA) se tornando o responsável por disseminar o ensino de música no Brasil durante o governo Getúlio Vargas. O compositor preocupou-se não só em criar e disseminar uma metodologia de educação musical própria; mas ao mesmo tempo propunha a formação de um repertório apropriado ao Brasil, além de gerar a habilitação de um corpo docente especializado (BEYER, 1993; HENTSKE e OLIVEIRA, 1993; GOLDENBERG, 1995). Posteriormente, na década de 1960, início do período da ditadura militar no Brasil, o ensino da musica foi oficialmente retirado da rede pública pela promulgação da LDB 5692/71. Depois disso o ensino da musica no Brasil foi resumido a movimentos que se 1 Graduando, Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, [email protected] 2 Graduando, Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, [email protected] 3 Mestranda, Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, [email protected] 4 Mestre, Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, [email protected] 1

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Page 1: A UTILIZAÇÃO DO MANOSSOLFA COMO FORMA DE ... Livro do Musico: Harmonia e improvisação para piano, teclados e outros instrumentos. Rio de Janeiro: Lumiar Editona, 1989. ARROYO,

Universidade Federal do Ceará - Campus Cariri IV Encontro Universitário da UFC no Cariri

Juazeiro do Norte-CE, 17 a 19 de Dezembro de 2012

A UTILIZAÇÃO DO MANOSSOLFA COMO FORMA DE INTRODUÇÃO A PERCEPÇÃO HARMÔNICA

José Werbto Xavier Sales1 Willames Nunes Rodrigues2 Isaura Rute de Lima Gino3

Marco Antônio Silva4

1 Introdução/ Desenvolvimento

As mudanças ocorridas na educação musical durante a passagem do século XIX para o século XX foram marcadas pelo contexto histórico da época. Neste período ocorreram varias mudanças em diversas áreas: Tecnológicas, Geo-politicas, Sociais, Socioeconômicas e transformações na área artística que se relacionavam com acontecimentos do período.

Nesse contexto, no Brasil se desenvolve uma tensão histórica na trajetória da educação musical que era a acadêmica/escolar e se fundamentava em uma lógica cartesiana e positivista, ou seja, tinha como referência a musica de concerto de tradição europeia e o ensino da musica acontecia em conservatórios (ARROYO, 2002). Esse confronto passa a existir a partir da tentativa de Villa-Lobos de socializar o ensino da música pela prática do Canto Orfeônico, destinado aos alunos da rede pública do país, nas décadas de 1930 e 1940 (SILVA, 2009).

Heitor Villa-Lobos foi maestro e compositor, sendo considerado o maior expoente da música do modernismo no Brasil. Na época, estava na direção da Superintendência da Educação Musical e Artística (SEMA) se tornando o responsável por disseminar o ensino de música no Brasil durante o governo Getúlio Vargas. O compositor preocupou-se não só em criar e disseminar uma metodologia de educação musical própria; mas ao mesmo tempo propunha a formação de um repertório apropriado ao Brasil, além de gerar a habilitação de um corpo docente especializado (BEYER, 1993; HENTSKE e OLIVEIRA, 1993; GOLDENBERG, 1995). Posteriormente, na década de 1960, início do período da ditadura militar no Brasil, o ensino da musica foi oficialmente retirado da rede pública pela promulgação da LDB 5692/71. Depois disso o ensino da musica no Brasil foi resumido a movimentos que se

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Graduando, Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, [email protected]

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Graduando, Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, [email protected]

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Mestranda, Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, [email protected]

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Mestre, Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, [email protected]

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Page 2: A UTILIZAÇÃO DO MANOSSOLFA COMO FORMA DE ... Livro do Musico: Harmonia e improvisação para piano, teclados e outros instrumentos. Rio de Janeiro: Lumiar Editona, 1989. ARROYO,

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Juazeiro do Norte-CE, 17 a 19 de Dezembro de 2012

estabelecem como experiências particulares em estados brasileiros como São Paulo, Brasília e Ceará. Os acontecimentos subsequentes resultaram no fortalecimento de determinadas praticas musicais no Ceará, marcadas pela efervescência da pratica coral vivida na cidade de Fortaleza no inicio da década de 1990, agindo como fator determinante para a implantação do curso de musica na Universidade Federal do Ceará (UFC) na capital e posteriormente no campus Cariri (SILVA, 2009). No curso de licenciatura em musica da UFC - Campus Cariri são utilizados vários métodos de acordo com necessidades e aplicabilidades especificas. Na disciplina de percepção e solfejo que traz em sua essência a influencia das mudanças ocorridas na educação musical ao longo dos últimos séculos é utilizado o método Kodály.

O músico Zoltán Kodály nasceu em 16 de dezembro de 1882 em Kecskemét, Hungria, e morreu em 6 de março de 1967 em Budapeste (também Hungria). Foi compositor, etnomusicólogo, linguista, filósofo e pesquisador, embora tenha ficado reconhecido internacionalmente pelo seu legado como educador. É erroneamente reconhecido como autor do famoso Método Kodály, embora não seja o idealizador desta composição – essa tarefa foi realizada por seus alunos e seguidores (SALLES, 1967). O método utiliza basicamente as seguintes ferramentas: Manossolfa, o tonic solfa ou dó móvel caracterizado pelo solfejo relativo das notas das escalas pentatônicas e as palavras rítmicas.

Manossolfa é a técnica que usa de uma linguagem de sinais manuais para definir a altura e duração das notas musicais. Essa técnica é praticada no estudo de solfejo, podendo ainda auxiliar na formação dos arranjos vocais em sala de aula, necessitando apenas que as vozes estejam divididas em naipes, para facilitar o processo de passagem e absorção das melodias.

Ao longo da disciplina essa técnica foi amplamente utilizada no exercício de formação de acordes. Os alunos são divididos em grupos, ficando cada grupo responsável pela execução de uma nota transmitida por meio do Manossolfa a fim de formar um acorde desejado a partir da união das vozes. Um acorde musical é composto por duas ou mais notas que podem ser tocadas simultaneamente ou sucessivamente (arpejado). A ordem em que as notas são dispostas em um arranjo musical não altera a natureza do acorde. Duas notas são suficientes para definir a natureza do acorde (maior ou menor). A quantidade de notas utilizadas define os tipos mais comuns que são os formados por três notas (tríades) e quatro notas (tétrades).

Além dessas possibilidades os acordes podem ter acréscimos de tensões fazendo com que eles cheguem a ter até sete notas diferentes. A nota mais grave é chamada de baixo e na maioria dos casos é a nota que dá nome ao acorde (tônica). A notação que descreve os acordes é chamada de cifra que por sua vez se utiliza de letras do alfabeto, números e símbolos.

O presente trabalho tem como objetivo discutir a importância de se trabalhar a formação de acordes, através da técnica do Manossolfa, nas turmas de solfejo do curso de licenciatura em música na UFC, campus Cariri como ferramenta para o desenvolvimento e percepção da consciência harmônica. Trata-se de uma reflexão sobre a aprendizagem harmônica a partir da aplicação dos métodos de solfejo relativo (dó móvel) e da formação de acordes, direcionado ao iniciante do estudo de percepção musical. Esse trabalho se justifica pelo fato de que a prática de formação de acordes nas aulas de solfejo contribui no desenvolvimento da percepção musical.

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Juazeiro do Norte-CE, 17 a 19 de Dezembro de 2012

2 Metodologia/ Resultados

Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa, tipo estudo de caso. Segundo Gil “[...] o estudo de caso é caracterizado pelo estudo profundo e exaustivo de um ou de poucos objetos, de maneira a permitir o seu conhecimento amplo e detalhado” (GIL, 2008, p. 10).

Parte da pesquisa deu-se a partir de observação participante. A observação participante se distingue da observação informal, ou melhor, da observação comum. Essa distinção ocorre na medida em que pressupõe a integração do investigador ao grupo investigado, ou seja, o pesquisador deixa de ser apenas observador dos acontecimentos e passa também a fazer parte do contexto (COSTA, 1987).

Além da observação participante, foi utilizada também a aplicação de um questionário formulado com seis perguntas, das quais quatro eram objetivas e duas solicitavam justificativa, com o objetivo de colher informações que não eram possíveis de serem obtidas através da observação participante. As entrevistas foram feitas de forma semiestruturada. Segundo Queiroz (1988) a entrevista semiestruturada é uma técnica de coleta de dados que supõe uma conversação continuada entre informante e pesquisador e que deve ser dirigida por este, de acordo com seus objetivos.

Nesse sentido, a pesquisa em questão consiste de uma análise da evolução dos alunos do curso de educação musical a partir da percepção harmônica por meio da formação de acordes. A pesquisa foi realizada no Curso de Licenciatura em Música da Universidade Federal do Ceará no Campus Cariri, situado em Juazeiro do Norte – CE.

A pesquisa deu-se da seguinte forma: a técnica do Manossolfa utilizada na disciplina foi explorada no exercício de formação de acordes. Os alunos foram divididos em grupos, ficando cada grupo responsável pela execução de uma nota, transmitida por meio do Manossolfa a fim de formar um acorde desejado a partir da união das vozes. Foi utilizado também o quadro com pautas para uma melhor visualização do que está sendo executado e de um instrumento harmônico para execução das notas e acordes com maior precisão, alertando ainda para os intervalos existentes entre cada nota usada.

A tabela a seguir apresenta os dados coletados com as quatro primeiras perguntas utilizadas no questionário:

Tabela 1 – Resultado para as quatro primeiras perguntasHaviam estudado musica antes de ingressarem no curso de licenciatura em música.

20%

Optaram por estudar instrumentos melódicos. 70% Estudaram solfejo antes de ingressarem no curso de licenciatura em música.

30%

Não tiveram contato com o método da Manossolfa antes de ingressarem no curso de licenciatura em música.

100%

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Juazeiro do Norte-CE, 17 a 19 de Dezembro de 2012

Fonte: Pesquisa aplicada com alunos do 1° semestre do curso de Licenciatura em Musica da Universidade Federal do Ceara UFC Campos Cariri, Juazeiro do Norte, CE.

Dentre os alunos submetidos ao questionário, todos responderam de forma positiva quanto à eficácia na aplicação da Técnica do Manossolfa.

Foram citados os seguintes pontos positivos quanto à utilização do método:

• Colabora para a interação entre aluno/aluno, aluno/professor e também entre aluno/monitor.

• Os gestos através do método do Manossolfa contribuem para a memorização dos intervalos e das alturas.

• Método é de fácil assimilação.

Todos os entrevistados responderam de forma positiva quanto à contribuição do método Manossolfa para a aprendizagem musical e também para a memorização da altura dos sons.

3 Considerações Finais

Embora essa metodologia não tenha sido de conhecimento dos alunos antes da faculdade, a forma de abordagem é vista como satisfatória por todos os entrevistados por ter facilitado à memorização e internalização de sons e intervalos, a percepção dos intervalos, possibilitando uma maior integração entre os alunos.

Percebe-se também que o Manossolfa contribui para uma melhor interação entre os alunos da disciplina de percepção I.

Constata-se que a metodologia adotada contribui para uma formação inicial, no que diz respeito à formação de acordes.

Esta pesquisa é apenas o inicio de um processo de investigação sobre Manossolfa com os alunos de musica da UFC Cariri e não se esgota neste presente trabalho.

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Juazeiro do Norte-CE, 17 a 19 de Dezembro de 2012

4 Referências

ADOLFO, Antonio. O Livro do Musico: Harmonia e improvisação para piano, teclados e outros instrumentos. Rio de Janeiro: Lumiar Editona, 1989.

ARROYO, Margarete. Educação musical na contemporaneidade. Anais do II seminário nacional de pesquisa em musica da UFG. Goiania: 2002. P.18 – 29.

BEYER, E. Educação Musical no Brasil: tradição ou inovação? In: ANAIS DO ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 3. 1993.Salvador: ANPPOM, 1993. p. 97-115.

CHEDIAK, Almir. Harmonia & improvisação, II: 70 músicas harmônicas e analisadas: violão, guitarra, baixo, teclado. São Paulo: Irmãos Vitale, 2009.

COLLUA, Turi. Improvisação, volume 1: Práticas criativas para a composição melódica na música popular. São Paulo: Irmãos Vitale, 2008.

FREIRE, Ricardo Dourado. Características e foco de aprendizagem de diversos sistemas de solfejo. Anais do XV Congresso Anual da ANPPOM - anppom.com.br . Page 1. 2005.

GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de Pesquisa Social. São Paulo, Ed. Atlas, 2008.

GOLDEMBERG, R. . Educação Musical: A Experiência do Canto Orfeônico no Brasil. Revista Pro Posições, Campinas, SP, v. 6, n. 3, p. 103-109, 1995.

HENTSCHKE, L; OLIVEIRA, A. A educação musical no Brasil. In: ANAIS DO ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MUSICAL, 3. 1993, Salvador: ANPPOM, 1993. p. 47-64.

QUEIROZ, M. I. P. Relatos orais: do “indizível” ao “dizível”. In: VON SIMSON, O. M. (org. eintr.). Experimentos com histórias de vida (Itália-Brasil). São Paulo: Vértice, Editora Revista dos Tribunais, Enciclopédia Aberta de Ciências Sociais, v.5, 1988. p. 68-80.

SALLES, Vicente. Zoltán Kodály. Revista Brasileira de Folclore, Brasília, v.7, n° 17, p. 41-50, jan/abr. 1967.

SILVA, Maria Goretti Herculano. Cotidianos Sonoros Na Constituição Do Habitus E Do Campo Pedagógico Musical: Um Estudo A Partir Dos Relatos De Vida De Professores Da UFC. Fortaleza, ed. UFC, 2009.

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