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  • Rua Capito Benedito Tefilo Otoni, n 444, 1 andar, Centro Empresarial Espacio Noble Bairro 13 de Julho CEP 49.020-050 Aracaju SE

    Tel.:(79) 3246-5292; 3043-1632 WWW.PORTALCICLO.COM.BR

    A TUTELA J URDICA DA CONFIANA

    APLICADA AO DIREITO DE FAMLIA

    Cristiano Chaves de Farias: Promotor de Justia do Ministrio Pblico do Estado da Bahia, Mestre em Cincias da Famlia na Sociedade Contempornea pela UCSal. Universidade Catlica do Salvador.Professor de Direito Civil das Faculdades Jorge Amado (graduao e ps-graduao), e do JusPODIVM Centro Preparatrio para as carreiras jurdicas, em Salvador. Coordenador do Curso de Ps-graduao em Direito Civil do Curso JusPODIVM. Membro do IBDFAM Instituto Brasileiro de Direito de Famlia

    Sumrio:1. A submisso das relaes privadas legalidade constitucional; 2. A famlia constitucionalizada; 3. A confiana como elemento das relaes jurdicas; 4. Amplitude da confiana e a sua incidncia no Direito de Famlia; 5. A confiana nas relaes familiares patrimoniais: a boa-f objetiva no Direito de Famlia; 6. A confiana nas relaes familiares existenciais: o afeto como base do Direito de Famlia; 7. Notas conclusivas. Referncias.

    Voc abusou, tirou partido de mim abusou, tirou partido de mim abusou, tirou partido de mim abusou... (Antonio Carlos & Jocafi)

    1. A submisso das relaes privadas legalidade

    constitucional

    No h dvida acerca da superior hierarquia normativa da

    Constituio, devendo-lhe obedincia, formal e material,

    todos os demais diplomas normativos, sob pena de

    inconstitucionalidade, com o seu conseqente expurgo do

    sistema jurdico.1

    1 Nesse diapaso, vale lembrar a lio de PIETRO PERLINGIERI, observando que a Constituio ocupa o lugar mais alto na hierarquia das fontes, precedendo, na ordem, (...) as leis ordinrias (e, portanto, os cdigos, que so leis ordinrias, incluindo o Cdigo Civil), cf. Perfis do Direito Civil: Introduo ao Direito Civil Constitucional, cit., p.4-5.

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    Conforme a lio de ANABELLE MACEDO SILVA, a Constituio, na

    qualidade de fundamento de validade de todo o ordenamento

    jurdico, subordina todas as demais normas, sendo tal o

    sentido de sua supremacia, servindo, ainda, de garantia

    externa para a execuo dos preceitos das normas

    infraconstitucionais.2

    Todavia, considerando o histrico desprezo dos intrpretes

    e aplicadores do Direito (particularmente do direito

    privado) norma constitucional, fruto de uma neutralidade

    da Carta Constitucional e do positivismo jurdico, avulta a

    importncia de realar a necessidade de efetivao da norma

    constitucional. Ou seja, contemporaneamente, releva

    emprestar concretude Constituio Federal, impedindo-a de

    cair no vazio abstrato ideolgico.

    Com senso crtico, LUS ROBERTO BARROSO, percebendo a

    necessidade de pregar a efetividade das normas

    constitucionais, esclarece: a verdade, no entanto, que a

    preocupao com o cumprimento da Constituio, com a

    realizao prtica dos comandos nela contidos, enfim, com a

    sua efetividade incorporou-se, de modo natural, prtica

    jurdica brasileira ps-1988. Passou a fazer parte da pr-

    compreenso do tema, como se houvssemos descoberto o bvio

    aps longa procura. A capacidade ou no de operar com

    as categorias, conceitos e princpios de direito

    constitucional passou a ser um trao distintivo dos

    profissionais das diferentes carreiras jurdicas. A

    Constituio, liberta da tutela indevida do regime militar,

    adquiriu fora normativa e foi alada, ainda que

    tardiamente, ao centro do sistema jurdico, fundamento e

    2 Cf. Concretizando a Constituio, cit., p.84-5.

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    filtro de toda a legislao infraconstitucional. Sua

    supremacia, antes apenas formal, entrou na vida do pas e

    das instituies.3

    Assim, dessa supremacia normativa constitucional, detecta-

    se como consectrio a necessidade de releitura dos

    conceitos e institutos jurdicos clssicos (como, v.g., o

    casamento e a filiao) e a elaborao e o desenvolvimento

    de novas categorias jurdicas (no mais neutras e

    indiferentes, porm dinmicas, vivas, presentes na vida

    social, como no exemplo da unio entre pessoas do mesmo

    sexo como uma entidade familiar).

    Percebe-se que o Direito Constitucional afastou-se de um

    carter neutro e indiferente socialmente, deixando de

    cuidar apenas da organizao poltica do Estado, para

    avizinhar-se das necessidades humanas reais, concretas, ao

    cuidar de direitos individuais e sociais (nos arts. 226 e

    227, por exemplo, a Constituio disciplina a organizao

    da famlia e no art. 225 cuida da estruturao do meio

    ambiente). Trata-se, sem dvida, da afirmao de uma nova e

    fecunda teoria constitucional.

    Com isso, ocorre uma verdadeira migrao dos princpios

    gerais e regras atinentes s instituies privadas

    (historicamente tratadas exclusivamente no Cdigo Civil de

    1916 de feio nitidamente patrimonialista) para o Texto

    Constitucional, que passa a assumir um verdadeiro papel

    reunificador do sistema, passando a demarcar os limites do

    Direito Civil, inclusive no que concerne proteo dos

    3 Cf. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituio Brasileira, cit., nota prvia, p.X.

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    ncleos familiares.4 Enfim, o papel unificador do sistema

    jurdico, tanto nos seus aspectos mais tradicionalmente

    civilsticos, quanto noutros temas de relevncia pblica,

    desempenhado pela norma constitucional.5

    Ademais, o cidado indiferenciado, que a Lei Civil de 1916

    tomou por modelo (o denominado homo medio), , na

    contemporaneidade, um cidado qualificado e concreto,

    merecedor de proteo real. Trata-se do cnjuge ou

    companheiro, da criana e do adolescente, do idoso, do

    deficiente fsico, enfim, da pessoa humana. A Carta Maior,

    ento, apresenta novos valores, informando e fundamentando

    as relaes privadas, fincando, por conseguinte, as vigas

    de sustentao do sistema de direito privado, reunificando

    o sistema civilista.6

    Em linhas bastante claras: os atos e institutos da

    autonomia privada (seja na esfera das relaes

    patrimoniais, seja no campo das relaes existenciais) tm

    a sua validade condicionada aos valores constitucionais.

    Trilhando esse caminho, infere-se a indispensabilidade de

    uma nova compreenso do Direito Civil, a partir dos novos

    valores e da legalidade constitucional.

    Para tanto, preciso afirmar, permanentemente, os

    princpios e regras constitucionais, emprestando-lhes

    4 Acenam no mesmo sentido, chegando a uma idntica concluso, ORLANDO GOMES, cf. Novos temas de Direito Civil, cit., p.46; GUSTAVO TEPEDINO, cf. Temas de Direito Civil, cit., p.7; LUIZ EDSON FACHIN, cf. Teoria Crtica do Direito Civil, cit., p.21 e ss.; e PIETRO PERLINGIERI, cf. Perfis do Direito Civil: introduo ao Direito Civil Constitucional, cit., p.4. 5 Com esse pensar, PERLINGIERI, PIETRO, cf. Perfis do Direito Civil: introduo ao Direito Civil Constitucional, cit., p.6. 6 As idias sobre o tema, defendendo a interpretao constitucional de todos os institutos de Direito Civil, so coligidas, especialmente, do que escrevi anteriormente, em obra dedicada anlise da Teoria Geral do Direito Civil, In FARIAS, CRISTIANO CHAVES DE, cf. Direito Civil: Teoria Geral, cit., especialmente p. 23 e ss.

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    efetividade (concretude), tornando-os vivos, pulsantes em

    nosso cotidiano jurdico. Porm, uma advertncia se faz

    necessria: no se pode resumir os valores constitucionais

    ao texto formal de 5 de outubro de 1988, sendo

    imprescindvel conferir maior elasticidade e mobilidade

    dimenso substancial da Constituio, atingindo um

    resultado efetivo dos princpios constitucionais explcitos

    e implcitos.

    Impe-se, dessa maneira, uma viso dos princpios do

    Direito Civil a partir da legalidade constitucional, com o

    fito de dar vazo e concretude prpria Lei Maior. At

    mesmo porque, na fase atual da nossa cincia, mais

    relevante do que afirmar os direitos