a tardinha - olimpiada da lingua portuguesa

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Salvador, SÁBADO, 22 de novembro de 2008 3 EDUCAÇÃO Olimpíada de versos Poesias feitas por estudantes de todo o Brasil concorrem na Olimpíada de Língua Portuguesa ANDRÉ MENDES | DIVULGAÇÃO Delegação de alunos baianos durante a noite de premiação dos melhores poemas do Nordeste, em Recife MIRELA PORTUGAL [email protected] Com um papel em branco à sua frente, e a tarefa de escrever sobre sua cidade, Luana Brito, 10, pensou no matagal que fica em volta de sua casa. Veio à cabeça a floresta grande da cidade pequena de Caculé, e ela rabiscou: “Aqui não tem ruas calçadas / Nem praças feito jardim / Mas a própria natureza / Enfeita o mundo para mim”. Esse trecho está no seu poema que passou para a final da Olimpíada Nacional de Língua Portuguesa. Alunos de escolas públicas do Brasil inteiro escreveram versos com o tema “O lugar onde eu moro”. A semifinal nordestina foi dia 14 de novembro, em Recife, capital de Pernambuco. Lá concorreram 35 alunos da 4ª e 5ª séries (5º e 6º anos) de toda a região. Luana conta nos dedos as horas de viagem de Caculé até Recife. “Seis horas de ônibus até Salvador e uma de avião de lá até aqui“. Foi a primeira vez que ela voou fora da imaginação. Em dezembro, Luana irá para Brasília, onde acontece a etapa final da olimpíada. Participará com mais duas outras baianas, as estudantes Reziene Vieira, 11, de Maracás, e Luana Nascimento, 10, de Ipirá. Elas foram as escolhidas entre os 13 estudantes baianos inscritos. Por três dias, eles cursaram oficinas e conheceram a cidade. Heráclito Neto, 10, morador de São Miguel das Matas, povoado de Sucupira, gostou de conhecer os verdes mares de Recife. Só tinha ouvido falar de praia dessa cor nos poemas de Gonçalves Dias (1823-1864), seu poeta preferido. Foi em Canção do Exílio, poema escrito por Dias, que ele se inspirou: “Minha terra é Sucupira / Madeira forte de quebrar / Com elas fazem móveis / Para nas casas utilizar / São Miguel das Matas, cidade bonita / Apesar de poucas matas existirem / Vamos preservar“. Heráclito conta que pensou em árvores cortadas com motosserra para escrever sua poesia. PALAVRAS DIFÍCEIS – Para Uendel Monteiro, 12, falar de Periperi, bairro de Salvador onde mora, foi mais triste. Ele escreveu sobre tiroteios que o fazem se esconder debaixo da cama. Por causa da violência, Uendel perdeu o pai e o irmão. Uendel foi desclassficado da competição porque estava em uma série acima do permitido. Mas isso não o deixou triste. “Viajei e aprendi bastante”, contou. A repórter viajou a Recife a convite da produção do evento Professores ensinam a poetar Foi em sala de aula que todos os poemas da olimpíada nasceram. Para ajudar os alunos, professores viraram poetas também. É o que conta Gildésio da Silva, professor que mora em Campo Formoso (Bahia). Para explicar a poesia, ele misturou aulas de geografia baiana com o tema da olimpíada. “Outra coisa importante foi mostrar que a poesia não é só aquilo que tem rima. Nem que precisa sempre falar de algo real”. Com essas idéias, alunos e professores discutiram rima, métrica e metáforas, que são uma forma de comparação. Os 35 professores dos estudantes classificados também viajaram e participaram de oficinas. O que mais empolgou os alunos do professor de português Milton Nunes, da cidade de Jaborandi, foram textos de poetas que cantaram sua terra, como o cearense Patativa do Assaré (1909-2002). Para Chirlene Araújo, professora de Uendel na escola Cleto Araponga, em Periperi, foi bom ver alunos mudarem suas idéias sobre poesia. “Pensavam que poesia era só sobre amor, alegria, saudade. Quando viram que era para falar do bairro, só escreveram coisas tristes. Mostrei que poesia é isso também”. Como participar As secretarias de Educação de cada Estado precisam se cadastrar no MEC. Depois, os alunos das escolas públicas que aderirem ao projeto podem se inscrever. A olimpíada acontece a cada dois anos – a próxima será em 2010.

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Reportagem de capa do suplemento semanal infantil do jornal A Tarde

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Salvador, SÁBADO,22 de novembro de 2008 3

E D U CA Ç Ã O

Olimpíada de versosPoesias feitas por estudantes de todoo Brasil concorrem na Olimpíada deLíngua Portuguesa

ANDRÉ MENDES | DIVULGAÇÃO

Delegação de alunos baianos durante a noite de premiação dos melhores poemas do Nordeste, em Recife

MIRELA PORTUGALm p o r t u g a l @ g r u p o a t a rd e . c o m . b r

Com um papel em branco àsua frente, e a tarefa deescrever sobre sua cidade,Luana Brito, 10, pensou nomatagal que fica em voltade sua casa. Veio à cabeça afloresta grande da cidadepequena de Caculé, e elarabiscou: “Aqui não temruas calçadas / Nem praçasfeito jardim / Mas a próprianatureza / Enfeita o mundopara mim”.

Esse trecho está no seupoema que passou para afinal da Olimpíada Nacionalde Língua Portuguesa.Alunos de escolas públicasdo Brasil inteiro escreveramversos com o tema “O lugaronde eu moro”. A semifinalnordestina foi dia 14 denovembro, em Recife,capital de Pernambuco. Láconcorreram 35 alunos da4ª e 5ª séries (5º e 6º anos)de toda a região.

Luana conta nos dedos ashoras de viagem de Caculéaté Recife. “Seis horas deônibus até Salvador e umade avião de lá até aqui“. Foia primeira vez que ela vooufora da imaginação.

Em dezembro, Luana irápara Brasília, onde acontecea etapa final da olimpíada.Participará com mais duasoutras baianas, asestudantes Reziene Vieira,11, de Maracás, e LuanaNascimento, 10, de Ipirá.

Elas foram as escolhidas

entre os 13 estudantesbaianos inscritos. Por trêsdias, eles cursaram oficinase conheceram a cidade.

Heráclito Neto, 10,morador de São Miguel dasMatas, povoado deSucupira, gostou deconhecer os verdes maresde Recife. Só tinha ouvidofalar de praia dessa cor nospoemas de Gonçalves Dias(1823-1864), seu poetapreferido. Foi em Cançãodo Exílio, poema escrito porDias, que ele se inspirou:“Minha terra é Sucupira /Madeira forte de quebrar /Com elas fazem móveis /Para nas casas utilizar / SãoMiguel das Matas, cidadebonita / Apesar de poucasmatas existirem / Vamospreservar“. Heráclito contaque pensou em árvorescortadas com motosserrapara escrever sua poesia.

PALAVRAS DIFÍCEIS – ParaUendel Monteiro, 12, falarde Periperi, bairro deSalvador onde mora, foimais triste. Ele escreveusobre tiroteios que o fazemse esconder debaixo dacama. Por causa daviolência, Uendel perdeu opai e o irmão.

Uendel foi desclassficadoda competição porqueestava em uma série acimado permitido. Mas isso nãoo deixou triste. “Viajei eaprendi bastante”, contou.

A repórter viajou a Recife a convite daprodução do evento

Professores ensinam a poetar

Foi em sala de aula quetodos os poemas daolimpíada nasceram. Paraajudar os alunos,professores viraram poetastambém. É o que contaGildésio da Silva, professorque mora em CampoFormoso (Bahia). Paraexplicar a poesia, elemisturou aulas de geografiabaiana com o tema daolimpíada. “Outra coisaimportante foi mostrar quea poesia não é só aquiloque tem rima. Nem queprecisa sempre falar de algoreal”. Com essas idéias,alunos e professoresdiscutiram rima, métrica emetáforas, que são umaforma de comparação.

Os 35 professores dos

estudantes classificadostambém viajaram eparticiparam de oficinas.

O que mais empolgou osalunos do professor deportuguês Milton Nunes, dacidade de Jaborandi, foramtextos de poetas quecantaram sua terra, como ocearense Patativa do Assaré(1909-2002).

Para Chirlene Araújo,professora de Uendel naescola Cleto Araponga, emPeriperi, foi bom ver alunosmudarem suas idéias sobrepoesia. “Pensavam quepoesia era só sobre amor,alegria, saudade. Quandoviram que era para falar dobairro, só escreveram coisastristes. Mostrei que poesia éisso também”.

Comoparticipar

As secretarias deEducação de cadaEstado precisam secadastrar no MEC.Depois, os alunos dasescolas públicas queaderirem ao projetopodem se inscrever. Aolimpíada acontece acada dois anos – apróxima será em 2010.