a surdez congênita não sindrômica

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A surdez congnita no sindrmica (associadas ao locus DFNB1) e suas relaes com as pesquisas dos ganhadores do Prmio Nobel

A surdez congnita no sindrmica (isolada), uma doena que prevalentemente herdada a por meio de herana recessiva (em 80% dos casos de surdez congnita segundo o artigo Hearing loss: frequency and functional studies of the most common connexin26 alleles). O locus DFNB1 aparece como o principal ponto de mutaes. O gene desse locus denominado GJB2 que codifica a protena conexina26, uma das responsveis pela formao de junes gap em clulas de suporte do rgo de Corti. As conexinas se agrupam em hexmeros (conexon) que so endereados s membranas das clulas, dois conexons de clulas adjacentes se alinham, permitindo a formao de uma juno gap (a qual possibilita a passagem de algumas molculas de a at, aproximadamente, 1000 Da). Nas clulas de suporte do rgo de Corti, a principal funo dos canais de conexina26 a recirculao coclear de ons K+, essencial para a gerao do potencial receptor pelas hair cells sensoriais. As diversas mutaes no locus DFNB1 levam a deficincias relacionadas aos canais de conxina26 (seja pelo no endereamento de protenas traduzidas para a membrana citoplasmtica levando uma reteno intracelular da protena, pela formao de protenas incapazes de formar canais funcionais ou pela quantidade insuficiente de protena traduzida). A partir das caractersticas da surdez congnita no sindrmica recessiva e das pesquisas relacionadas fisiopatologia dessa doena, pode-se traar diversas relaes com as pesquisas desenvolvidas pelos pesquisadores agraciados com o Prmio Nobel (principalmente nas reas de Fisiologia ou Medicina e Qumica). Em 1910, o mdico alemo Albrecht Kossel, recebeu o Prmio Nobel de Fisiologia ou Medicina por suas pesquisas em biologia celular envolvendo protenas e cidos nuclicos, alm de ser o responsvel pela descoberta do aminocido histidina. Apesar de no haver nenhuma correspondncia direta da pesquisa de Kossel com a surdez congnita no sindrmica recessiva, podemos interpretar suas descobertas como um dos passos iniciais para a compreenso de dois elementos importantes nessa doena: os nucleotdeos (componentes do DNA, que compem todo material gentico humano, inclusive o gene GJB2 e suas mutaes) e as protenas (grupo de substncias do qual a conexina26 faz parte). O americano Thomas Hunt Morgan, agraciado com o Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1933 foi o primeiro a receber esse prmio por uma pesquisa na rea de gentica. Morgan ficou famoso pelas suas pesquisas com Drosophila melanogaster (conhecida popularmente como mosca das frutas) e deixou um importante legado para o conhecimento de hereditariedade. A surdez congnita no sindrmica recessiva, assim como grande parte das outras doenas congnitas, tem um carter gentico, logo as pesquisas de Morgan foram essenciais para que fosse possvel entender a hereditariedade envolvida na transmisso dessa doena. Por suas pesquisas envolvendo a regulao gnica de eventos bioqumicos celulares, os americanos George Wells Beadle e Edward Lawrie Tatum receberam o Nobel de Fisiologia ou Medicina no ano de 1958 (dividido com o pesquisador tambm americano Joshua Lederberg pelos seus trabalhos em recombinao gnica e

organizao do material gnico bacteriano). Beadle e Tatum fizeram experimentos expondo o bolor do po da espcie Neurospora crassa a raios-X causando diversas mutaes em enzimas envolvidas nas vias metablicas do fungo. Os resultados desses experimentos levaram esses pesquisadores a propor a hiptese de um gene, uma protena. Essa hiptese (apesar de no corresponder totalmente realidade devido ocorrncia de splicing alternativo nos processos de codificao de alguns genes, como sabido atualmente) foi muito importante para que o modelo de produo das protenas a partir de genes fosse entendido e posteriormente aperfeioado. Alm disso, a ideia de que mutaes em genes podem levar produo de protenas mutantes, como provado pelo trabalho de Beadle e Tatum, muito significante no sentido de compreender as diversas doenas genticas, como a surdez congnita no sindrmica recessiva que envolve a produo de conexina26 mutante. No ano de 1959, o americano Arthur Kornberg e o hispano-americano Severo Ochoa ganharam o Nobel por suas descobertas sobre a biossntese de cidos ribonucleicos (RNA) e desoxirribonucleicos (DNA). O tema da pesquisa desses dois Nobis em Fisiologia ou Medicina fundamental para os modelos de transmisso das doenas genticas congnitas (que envolve a replicao do DNA) e da sntese das protenas mutantes (por meio da sntese de mRNA - pela transcrio do gene envolvido e sua posterior traduo) presentes nelas. Um exemplo disso so os genes mutantes do locus DFNB1 e a produo de conexinas26 no funcionais. O hngaro Georg von Bksy, Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1961, foi premiado pela descoberta do mecanismo fsico da estimulao da cclea, rgo de importncia central para a audio e que abriga estruturas como o rgo de Corti (que possui as clulas de suporte nas quais ocorrem as conexinas26 mutantes tpicas da surdez congnita no sindrmica recessiva). No ano seguinte (1962), os americanos James Watson e Francis Crick e o neozelands naturalizado americano Maurice Wilkins dividiram o Nobel de Fisiologia ou Medicina por uma das mais importantes descobertas cientficas da histria: a estrutura dos cidos nuclicos e sua significncia para a transmisso de informao em material vivo. Esse dogma central das cincias biolgicas e biomdicas corrobora e aprofunda as ideias de outros Nobis anteriores, como Morgan, Beadle e Tatum, esclarecendo ainda mais a os mecanismos que envolvem doenas de carter gentico (como a doena tema desse trabalho). O ingls Andrew Huxley foi o escolhido pelo Instituto Karolinska para receber o prmio em Fisiologia ou Medicina em 1963. As descobertas de Huxley sobre os mecanismos inicos envolvidos na excitao e inibio nas pores centrais e perifricas das membranas das clulas nervosas esto francamente relacionadas com o mecanismo de transformao do estmulo sonoro em impulso nervoso e a transmisso desse para o SNC. Tal mecanismo central para a ocorrncia de vrios tipos de surdez. Robert Holley (EUA), Har Khorana (ndia) e Marshall Nirenberg(EUA), responsveis pela interpretao do cdigo gentico e sua funo na sntese de protenas dividiram o Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1968. O cdigo gentico foi um passo fundamental para esclarecer melhor a relao entre a mutao gnica e a produo de protenas mutantes em doenas genticas como a surdez congnita no sindrmica recessiva. A descoberta das enzimas de restrio e sua aplicao em Gentica Molecular pelos americanos Hamilton Smith e Daniel Nathans e pelo suo Werner Arber (Nobis

de Fisiologia ou Medicina em 1978) propiciou o estudo de diversos genes (inclusive os mutantes) a partir da possibilidade da separao de fragmentos a partir da clivagem do material gentico pelas enzimas de restrio em pontos especficos (como aquelas usadas pelos autores dos artigo Hearing loss: frequency and functional studies of the most common connexin26 alleles). Elemento muito significativo para o entendimento da no funcionalidade das protenas mutantes tpicas da surdez congnita no sindrmica recessiva, os sinais de endereamento celular das protenas foram esclarecidos pelo teuto-americano Gnter Blobel (Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1999). exatamente o no endereamento das protenas produzidas em algumas mutaes do gene GJB2 que comprometem a audio em portadores de tal doena. No campo da Qumica, assim como no de Fisiologia ou Medicina, existem exemplos de pesquisadores importantssimos para a compreenso de doenas como a surdez congnita no sindrmica recessiva. O ingls Frederick Sanger (ganhador do Nobel de Qumica em 1958 e em 1980 nessa ltima ocasio dividindo o prmio com os americanos Paul Berg e Walter Gilbert) teve papel de grande destaque tanto pelas pesquisas que permitiram determinar a estrutura de muita protenas (importante devido a relao entre estrutura e funcionalidade da protena) quanto para a formulao de mtodos para a determinao da sequncia das bases em cidos nuclicos (que permitiram identificar e catalogar mutaes a nvel molecular). Em 1993, o americano Kary Mullis recebeu o Nobel de Qumica (junto ao canadense Michael Smith, que desenvolveu mtodos baseados na qumica do DNA) por inventar o mtodo de Polymerase Chain Reaction (PCR), amplamente utilizado at hoje para a amplificao de material gentico de interesse (como por exemplo na amplificao de genes mutantes para a pesquisa). Esse procedimento tambm foi utilizado pelos autores de Hearing loss: frequency and functional studies of the most common connexin26 alleles nos mtodos de pesquisa dos genes mutantes do locus DFNB1. Em 2006, o filho do Nobel Arthur Kornberg, o americano Roger Kornberg foi agraciado com o Nobel de Qumica de pelos seus estudos da base molecular da transcrio em seres eucariticos, somando novos conhecimentos queles j obtidos em pesquisas anteriores sobre o processo de sntese proteica a partir de genes. A sntese proteica, como citado anteriormente, est envolvida praticamente com todos os estados patolgicos ou normais dos organismos vivos. Os americanos Roger Tsien e Martin Chalfie e o japons Osamu Shimomura dividiram o Nobel de Qumica de 2008 pelo desenvolvimento da Green Fluorescent Protein (GPF), usada largamente em pesquisas envolvendo, principalmente, a anlise da localizao de protenas aps sua traduo. A GFP foi utilizada pelos pesquisadores do artigo Hearing loss: frequency and functional studies of the most common connexin26 alleles para determinar se o endereamento das conexinas para a membrana celular foi ou no correto (o que essencial para o desempenho de sua funo de comunicao entre clulas adjacentes). Pode-se, por fim, concluir que o trabalho dos Nobis constitui um conjunto de avanos que est presente entre as mais importantes descobertas cientificas dos sculos XX e XXI. Esse trabalho esclareceu mecanismos e forneceu mtodos para o progresso cientfico desse perodo, que foi rpido e abrangente como nunca antes

visto. Os trabalhos evidenciam ainda uma tendncia muito evidente da cincia das reas biolgicas e biomdicas atuais: a base gentica da vida (tanto em seu estado normal quanto patolgico).

Da direita para esquerda: Conexina26, Conexon e Canal de Conexina26

Referncia Bibliogrfica: - P. DAndrea, V. Veronesi, M. Bicego, S. Melchionda, L. Zelante, E. Di Iorio, R. Bruzzone, P. Gasparini, Hearing loss: frequency and functional studies of the most common connexin26 alleles in Biochemical and Biophysical Research Communications Volume 296, Issue 3, 23 August 2002, Pages 685-691

Aluno: Thiago Machado Nogueira Curso: Medicina Matria: Biologia Molecular Pofessor: Shaker Chuck Farah

Universidade de So Paulo, 6 de junho de 2011