a segunda vinda de cristo. uma perspectiva amilenista
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A FORMA QUE CRISTO VOLTARÁ: UMA PROPOSTA AMILENISTA
SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS 061 POSIÇOES ESCATOLÓGICAS 071.1 O QUADRO ATUAL 07
1.2 PRÉ-MILENISMO CLÁSSICO OU HISTÓRICO 09
1.3 PRÉ-MILENISMO DISPENSACIONALISTA 10
1.4 AMILENISMO 13
1.5 PÓS-MILENISMO 14
1.6 AVALIAÇÃO DA HISTÓRIA ESCATOLÓGICA CRISTÃ 15
2 QUESTÕES HERMENÊUTICAS 172.1 BREVE HISTORIA DA INTERPRETAÇÃO BÍBLICA E PROFÉTICA 18
2.1.1 HERMENÊUTICA JUDAICA 18
2.1.2 HERMENÊUTICA DOS PAIS DA IGREJA PRIMITIVA 19
2.1.3 HERMENÊUTICA NA IDADE MÉDIA 19
2.1.4 HERMENÊUTICA NA REFORMA PROTESTANTE 20
2.1.5 HERMENÊUTICA PÓS-REFORMA 21
2.1.6 HERMENÊUTICA NA MODERNIDADE 21
2.1.7 HERMENÊUTICA NA PÓS-MODERNIDADE 21
2.2 PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO DE PROFECIA BÍBLICA 22
2.2.1 AS CARACTERÍSTICAS ESPECIAIS DA PROFECIA 22
2.2.2 AS REGRAS PARA A INTERPRETAÇÃO DA PROFECIA 23
2.3 PRESSUPOSTOS ADOTADOS 24
3 A FORMA QUE CRISTO VOLTARÁ 253.1 ESCOLHENDO O MÉTODO HERMENÊUTICO 25
3.1.2 REVELAÇÃO PROGRESSIVA DAS ESCRITURAS 27
3.1.3 EXEMPLO DE APLICAÇÃO HERMENÊUTICA 29
3.2 UMA VINDA VISÍVEL E SINGULAR 33
3.3 E TRARÁ O FINAL DA HISTORIA 41
CONSIDERAÇÕES FINAIS 46REFERÊNCIAS 47
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CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O tema “a vinda de Cristo para o seu povo de foma visível, singular e final” é
fruto da constatação da existência de grandes divergências teológicas no campo da
escatologia. Mesmo com a predominância do Pré-Milenismo Dispensacionalista no
meio evangélico, ainda persiste estas divergências, visto que esta corrente
escatológica apresenta um longo, complexo e confuso roteiro para a vinda de Cristo.
As outras correntes escatológicas têm apresentado outras respostas ao segundo
advento de Cristo e ao fim dos dias. Entretanto, esse assunto é muito amplo para
ser tratado neste trabalho de conclusão de curso. Com isto, iremos abordar o
conceito do Povo de Deus e o modo da vinda de Cristo, visto que antes de tratar
sobre a maior questão problemática da escatologia, que é a questão do Milênio, se
faz necessário entender para quem Cristo virá e como virá.
Assim, este trabalho irá expor os ensinamentos bíblicos de modo didático
através de seus capítulos que serão apresentados da seguinte forma:
No primeiro capítulo será apresentado um panorama histórico de como se
desenvolveu os conceitos hermenêuticos da interpretação bíblica e uma ênfase na
hermenêutica profética.
No segundo capítulo será apresentado o panorama histórico de como se
desenvolveu os conceitos escatológicos sobre a Parousia de Cristo.
No terceiro capítulo será analisada a forma da segunda vinda de Cristo e as suas
consequências.
E por fim, nas Considerações Finais, será demonstrada o resultado deste trabalho.
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1. POSIÇOES ESCATOLOGICAS
1.1 O QUADRO ATUAL
O Pré-Milenismo Dispensacionalista é a corrente escatológica mais popular
no meio evangélico mundial, principalmente no meio pentecostal e neopentecostal,
ao ponto de não criar sérias contestações. Entretanto, há outras correntes
escatológicas válidas que se propõem a explicar a escatologia bíblica.
Estudando sobre a história da igreja cristã, fica evidente que o pensamento
moderno é baseado mais em uma inovação doutrinária do século XIX do que em
uma visão ortodoxa e bíblica. O Pré-Milenismo Dispensacionalista se desenvolveu
com John Derby e Edward Irving, estes começaram a falar dessa teologia do “fim
dos tempos” e atraíram muitos seguidores, entre eles, foi C. I. Scofield, que mais
tarde publicou esses conceitos em sua famosa Bíblia de Referência Scofield em
1.909.
Com a fundação do moderno estado de Israel em 1948, Edgar
Whisenant publicou o livro “88 Razões pelas quais Jesus voltará em 1988” que
vendeu 4.5 milhões de exemplares e em 1970, Hal Lindsey escreveu "A Agonia do
Grande Planeta Terra", que vendeu aproximadamente 35 milhões de exemplares, e
afetou profundamente uma geração de pastores e líderes que foram convencidos de
seus delírios escatológicos em vez de acreditar no que a bíblia e a história ensinam
sobre esse assunto.
Lindsey não parou por aí, em 1980 lançou outro livro: "Os Anos 80: Contagem
Regressiva para o Juízo Final" afirmando que “a década de 1.980 pode muito bem
ser a última década da história como a conhecemos”. Mesmo tendo fracasso em
prever o fim do mundo em 1988, no início dos anos 90, publicou o livro Planet Earth
– 2000 A.D. , no qual previa que os cristãos não estariam aqui no ano 2000. E em
1.995 foi lançado o primeiro livro da série "Deixados para Trás" que vendeu, no total,
mais de 60 milhões de exemplares graças as especulações do fim do mundo, em
virtude da virada do milênio.
E. Dicson, em seu livro O Erro Milenial (1977, p. 3), analisa a supremacia do
Dispensacionalismo no meio cristão:
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Um dos ensinamentos mais divulgados em nossos dias, no mundo religioso, é o reinado premilenial de Cristo, Frase tais como “E um sinal dos tempos”, ‘O arrebatamento está chegando’, e ‘O reino de Deus está prestes a ser estabelecido na terra’, são lançadas sobre as pessoas através de todos os meios de comunicação em massa. Em vista da agitação causada na sociedade pelos modernos profetas do milênio, muitas pessoas foram levadas a crer em suas profecias de um reinado de mil anos de Cristo na terra. O proposito deste livro é tratar de alguns dos muitos ensinamentos enunciados pelos premilenistas de hoje.
Neste livro, Dickson (1977, p. 3) demonstra o mal uso de passagens bíblica,
distorcidas com a intenção de adequar a uma doutrina pré-concebida. Ele afirma que
“iremos verificar que muitas escrituras usadas pelos que defendem essa doutrina
não têm qualquer relação com aquilo a que se aplicam”, e que dessa forma se faz
necessário analisar cada aspecto das Escrituras relativo a essa doutrina.
Augustus Nicodemus Lopes em seu livro “Ainda não é o fim” (2006, p. 62)
defende a volta de Jesus como fato único, visível, e que este ensino sempre foi
defendido pela Igreja Cristã através dos tempos:
(...) A compreensão histórica da Igreja Cristã sempre foi que Jesus, nesta passagem e em outras similares, está profetizando seu retorno visível, universal, público e glorioso, encerrando o que nõs conhecemos como a presente era, marcando o final do mundo, e inaugurando o dia do juízo, é assim que tem sido entendido, e, por gerações, a Igreja tem aguardado esse momento.
E por fim, Steve Wohlberg em seu livro The Rapture Delusions (2010, p. 18-
19) conseguiu sistematizar os cinco principais ensinos escatológicos mais populares
entre os cristãos:
Não é segredo que os seguintes cinco ensinos se tornaram imensamente populares
1. Todos os verdadeiros cristãos logo irão desaparecer no arrebatamento2. Sete anos de terror apocalíptico dominar os que ficarem para trás.3. O iníquo – o anticristo - controlará o mundo.4. O anticristo entrará no templo reconstruído em Jerusalém, alegando ser
Deus5. As nações da terra irão atacar Israel no Armagedom.
Esses cinco conceitos estão sendo ensinados no rádio, na televisão, em conferências proféticas, em incontáveis livros e revistas, em filmes apocalípticos, em seminários e na internet. Este sistema de crença de cinco pontos também está fortemente ligado com um evento-supostamente levando para o próximo, exatamente como rede elétrica da cidade de Nova York está entrelaçada. Este sistema de crença de cinco pontos também está fortemente ligado - com um evento supostamente levando para o próximo - exatamente como a rede elétrica da cidade de Nova York está entrelaçada.
E ele questiona de forma enfática (2010, p. 32):
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Mas Ele virá invisivelmente? A Igreja irá desaparecer? A Bíblia realmente ensina desaparecimento de cristãos? … Mas “ arrebatar” significa desaparecer? Paulo está descrevendo um retorno silencioso de Jesus Cristo antes de uma tribulação apocalíptica de sete anos?
Chegar a um consenso sobre este assunto é um árduo e duro caminho, pois
os cristãos discutem e divergem sobre escatologia há dois milênios, sendo assim, a
segunda vinda de Jesus não tem sido uma tarefa fácil tendo em vista que muitos
conceitos com respeito a este grande evento não estão bem claros. E por causa
dessa dificuldade, ao longo da história da igreja tem havido quatro visões principais
sobre a época e natureza deste milênio: Pré-Milenismo Clássico ou Histórico,
Amilenismo, Pós-Milenismo e Pré-Milenismo Dispensacionalista.
1.2 PRÉ-MILENISMO CLÁSSICO OU HISTÓRICO
O aspecto principal desta corrente é o estabelecimento de um reino terreno
de Jesus Cristo logo após o seu retorno com duração literal de mil anos. Os adeptos
desta corrente afirmam que ela é a interpretação escatológica mais antiga sobre o
Milênio, por isso é também chamada de Pré-Milenismo Clássico. Os seus
proponentes defendem que ela foi a interpretação escatológica principal nos três
primeiros séculos do Cristianismo, onde personagens como Papias (60-130dC),
Justino Mártir (100-165dC), Irineu (130-202), Tertuliano (160-330dC), Orígenes
(cerca de 185-254), Hipólito, Metódio, Comandiano, Lactanius e outros apoiaram
essa interpretação.
Esta antiguidade também é defendida por Erickson (2012, p 114-115):
A visão que hoje chamamos de “pré-milenismo” tem uma longa história, cujas raízes estão na igreja primitiva. E provável que tenha sido a crença dominante durante o período apostólico, quando os cristãos acreditavam fortemente no fim iminente do mundo e na parúsia de Jesus Cristo. Esperavam uma transformação cataclísmica, não uma chegada gradativa e progressiva do reino. (...) Justino Mártir (100-165), o apologista, é um exemplo desse período. Considerava a crença na ressurreição indispensável à fé cristã. Os que não cressem dessa forma não tinham o direito de serem chamados cristãos. Ele observou duas subclasses de cristãos: os que esperam um reino terreno de Cristo, centralizado numa nova Jerusalém, localizada no local topográfico da antiga Jerusalém; e os que não esperam milênio algum. Considerava que os primeiros eram ortodoxos e que os últimos tinham falhas em sua fé. Justino aplicava todas as profecias do Antigo Testamento acerca da glória futura do povo escolhido ao reino intermediário de Cristo, e não à consumação final. Além disso, interpretava essas profecias de modo literal.
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Basicamente essa corrente sustenta que o arrebatamento e volta de Cristo é
um evento único e antes desse “milênio” haverá sinais que demonstrarão a volta de
Cristo. A atual Igreja é o Israel espiritual, mas Deus restaurará a nação israelita, pois
para ela há promessas no milênio. Ela crê que, após a segunda vinda de Cristo,
Satanás será preso, haverá a chamada primeira ressurreição e Cristo reinará no
milênio. Ela usa somente a literatura apocalíptica para provar a literalidade do
milênio, visto que as escrituras veterotestamentárias não têm texto algum que relata
um período literal de mil anos.
Ferreira e Myatt (2008, p. 1102) definem assim os eventos desta corrente
escatológica: a) época presente da igreja, da evangelização e da apostasia do
homem; b) grande tribulação de sete anos, ascensão do anticristo e perseguição da
igreja; c) volta de Cristo, arrebatamento, primeira ressurreição e batalha do
Armagedom’, d) inauguração do milênio e prisão de Satanás no abismo; e) fim do
milênio, soltura de Satanás e rebelião das nações; f) derrota final de Satanás,
ressurreição dos ímpios e julgamento final; g) estado eterno.
Esta corrente escatológica foi minada pela união da Igreja e o estado sob o
governo de Constantino (SCHALY, 1992, p. 19-20) e por Agostinho reinterpretar o
conceito e a duração do milênio. A mudança de Agostinho se deu em virtude do
“extremismo e carnalidade imoderada daqueles que sustentaram o premilenismo em
sua época” (SHEDD, 2002, p. 16) e da influência de Ticônio, um donatista do quarto
século (SCHALY, 1992, p. 19-20).
Alguns proponentes dessa interpretação escatológica são: George Ladd, J.
Barton Payne, Alexander Reese, Millard Erickson, Francis Chaeffer, Wayne Grudem
e outros.
1.3 PRÉ-MILENISMO DISPENSACIONALISTA
Esta corrente escatológica tem origem e desdobramento no Pré-Milenismo
histórico, ou seja, ela aguarda a vinda de Jesus Cristo para iniciar o milênio antes
do fim dos tempos. O Pré-Milenismo histórico teve fim quando Agostinho adotou a
interpretação do milênio simbólico em sua obra A cidade de Deus. A partir desta
data, século V, o Pré-Milenismo histórico foi abandonado até que no século
XVI,1591, o padre jesuíta Francisco Ribeira em Salamanca, na Espanha, previa o
Anticristo, a babilônia e a reconstrução do Templo para o fim da era cristã na sua
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obra Sacram beati Joannes – Apocalypse. Este ensino que foi se desenvolvendo por
outros padres jesuítas como o português Blasius Viegas (1554-1599), o belga
Cornelio de Lápide (1567-1637) e pelo Cardeal Belarmino (1542-1621) até que no
século XIX o teólogo protestante inglês Samuel Maitland adotou este ensino e
acrescentou a teoria do arrebatamento invisível e o início da grande tribulação.
No entanto, tem sido atribuído ao padre Emanuel Lacunza (1731-1801) a
autoria desse ensino, ao publicar o livro La venida del Mesías en gloria y majestad
na Espanha em 1811, que separava o arrebatamento da igreja e a volta de Cristo,
e, também, que o intervalo entre o arrebatamento e a segunda vinda de Cristo era
de 45 dias. Depois veio o escocês Eduard Irving, que traduziu e publicou-o em 1827
sob o título de The Coming of the Messiah, dizendo que esse intervalo era de 3 anos
e meio e, por fim, J N Darby que, através de profecias, disse que este intervalo seria
de 7 anos. John N. Darby (1800-1882), líder dos Irmãos Plymouth, adotou este
sistema que foi propagado na famosa Bíblia de Referência editada por Cyrus
Ingerson Scofield em 1909 que apresentou a teoria que o plano de Deus para o
homem era dividido em sete etapas bem distintas chamadas dispensações. Esta
corrente escatológica levou várias décadas para ser aceita e só se tornou a visão
escatológica predominante nas igrejas evangélicas no século XX.
Charles Ryrie (2004, p 523), respeitado dispensacionalista, define assim:
O pré-milenismo é a visão que afirma que a Segunda Vinda de Cristo ocorrerá antes do milênio.Isso resultará no estabelecimento do reinado de Cristo nesta Terra por um período literal de mil anos. Também entende que haverá muitas ocasiões em que ressurreições e juízos ocorrerão. A eternidade começará após esses mil anos serem concluídos. Dentro do pré- milenismo, existem visões diferentes sobre quando o arrebatamento ocorrerá.
Esta corrente pré-milenista foi denominada de dispensacionalista porque a
Bíblia de Scofield dividiu a Bíblia em sete dispensações: a) A Inocência – de Adão
até a queda; b) A Consciência – da queda até o dilúvio; c) O Governo Humano – de
Noé até Abraão; d) A Promessa – de Abraão até Moisés: e) A Lei – de Moisés até o
Calvário; f) A Graça – do Calvário até a grande tribulação; O Reino – da grande
tribulação até o fim do reinado milenar de Cristo.
Shedd (2002, p 12-13) afirma que a interpretação de Daniel 9:24-27 é
essencial para esta corrente escatológica:
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A chave imprescindível para a compreensão do futuro se encontra em Daniel 9:24-27. as setenta semanas se referem a 490 anos (70x7) e não a dias. As primeiras 69 semanas de anos terminaram som a crucificação de Jesus, encerrando a época na qual Deus se interessou principalmente com Israel. Com a rejeição do Messias que ofereceu a Israel no ministério e na pessoa de Jesus, Deus fez o relógio escatológico parar. Em consequência Ele estabeleceu a Igreja, a realidade não prevista pelos profetas do Antigo Testamento. Portanto, a Igreja é o “mistério” revelado a Paulo e aos escritores no Novo Testamento.
Desta forma, os pré-milenistas defendem que a contagem das 70 semanas se
interrompeu entre 69º e a 70º semana por causa da rejeição de Cristo pelos judeus.
Assim, abriu um parêntese na história para que a Igreja do Novo Testamento fosse
alcançada. Após o fim da era da Igreja, através do arrebatamento secreto da
mesma, reiniciará a contagem da septuagésima semana de Daniel, onde o Anticristo
dará início a Grande Tribulação nos seus últimos 3 anos e meio. No fim deste sete
anos, Cristo voltará com os santos para iniciar o Reino físico de mil anos para
cumprir todas as profecias feitas a Israel no Velho Testamento. No fim deste período,
Satanás será solto novamente para a grande última batalha onde ele será destruído
e lançado no lago de fogo para todo o sempre.
Hoekema (1989, p. 210) confirma estes ensinos:
Quando Cristo estava sobre a terra, ele ofereceu o Reino dos céus aos judeus de sua época. Este Reino deveria ser um governo terreno sobre Israel, em cumprimento às profecias do Antigo Testamento; além disso, a entrada do Reino requereria arrependimento dos pecados, fé em Jesus como o Messias e uma disposição para adotar o alto padrão de moralidade ensinado, por exemplo, no Sermão do Monte. Entretanto, os judeus daquela época rejeitaram o Reino. Por causa disso, o estabelecimento final deste Reino foi então adiado para a época do milênio. Neste ínterim, Cristo introduziu a “forma misteriosa” do Reino - uma forma descrita em parábolas tais como a do semeador e a do joio em Mateus 13. Um expoente desta posição, E. Schuyler English, argumenta da seguinte forma: “O Reino em mistério é a cristandade, aquela parte do mundo onde o nome de Cristo é confessado. É a Igreja visível, composta tanto de crentes como de incrédulos, que constitui o Reino dos céus em mistério. Ele continuará até o fim da era, quando Cristo retornará à terra para reinar como Rei”.
Assim, o Dispensacionalismo apresenta a mais longa e complexa corrente
escatologia, onde se destaca a separação entre Igreja e Israel e a vinda de Cristo
em duas fases.
Entre os teólogos contemporâneos que afirmam esta corrente estão Norman
Gaisler, Lewis Sperry Chafer, Charles C. Ryrie, John MacArthur entre outros.
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1.4 AMILENISMO
Apesar do termo significar literalmente “nenhum milênio”, não é esse o caso.
O Amilenismo não crê num milênio literal e futuro. O milênio descrito no capítulo 20
de apocalipse é simbólico (representa o Reino de Cristo) e já iniciado e representa
toda a era do Novo Testamento desde a primeira vinda de Cristo até o fim do mundo.
A sua origem é atribuída a Agostinho de Hipona (354-430 d.c.), no entanto, a
princípio, Agostinho de Hipona também era pré-milenista, mas, conforme Russel
Shedd (2002, p.20):
(...) foi persuadido a abandonar essa posição em vista do extremismo e carnalidade imoderada dos que sustentam o Pré-Milenismo em sua época. Seguindo a posição de Ticônio, donatista do século IV, Agostinho chegou a conclusão de que Apocalípse 20 tratava do intervalo entre a primeira e a segunda vinda de Cristo.
Também Harald Schaly, em sua obra Breve história da escatologia cristã, (1992, p. 20) afirma:
Ticônio ensinava que o milênio, que simbolizava um longo período de tempo, porém indeterminado, começara com a primeira vinda de Cristo e terminaria com sua gloriosa volta, que seria seguida logo pelo Juízo Final. Afirmava ele que a primeira ressurreição, mencionada em Apocalipse 20:5, 6, refere-se à conversão. Agostinho (334-430) ampliou e popularizou a interpretação de Ticônio em sua obra A Cidade de Deus, no livro 20 dessa sua obra, sob o título “Quanto ao Juízo e as Declarações Concernentes do Velho e Novo Testamento”.
Vale salientar que mesmo antes de Agostinho, houve rejeição do milenismo
da parte de Orígenes, Clemente de Alexandria e Dionísio.
No período da Reforma Protestante, as principais confissões protestantes
rejeitaram um milênio literal e adotaram a escatologia amilenista de Agostinho.
Para Calvino, Israel e a Igreja eram a mesma coisa, aguardava a ressurreição para a
Segunda Vinda, e logo após viria o juízo e o estado eterno.
E nisto concorda C. Ryrie (2004, p. 525), famoso pré-milenista
dispensacionalista:
Na Idade Média, a maioria das doutrinas, inclusive a escatologia, foi obscurecida pelas trevas que caracterizaram aqueles séculos. Como já vimos, os reformadores, de modo geral, eram amilenistas em sua escatologia, embora os anabatistas e os huguenotes defendessem o quiliasmo.
Para os amilenistas, o Reino de Deus já chegou, mas não ainda na sua
plenitude. E Hoekema (1989,p. 196) completa dizendo:
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Os amilenistas interpretam o milênio mencionado em Apocalipse 20.4-6 como descrevendo o reinado presente das almas dos crentes mortos e com Cristo no céu. Eles entendem o aprisionamento de Satanás, mencionado nos primeiros três versos deste capítulo, como estando efetivado durante todo o período entre a primeira e a Segunda Vinda de Cristo, embora findando pouco antes da volta de Cristo. Eles ensinam que Cristo voltará após este reinado milenar celestial.Os amilenistas também sustentam que o Reino de Deus está presente agora no mundo, pois o Cristo vitorioso está governando seu povo através de sua Palavra e seu Espírito, embora eles também aguardem um Reino futuro, glorioso e perfeito na nova terra na vida por vir.
Entre os teólogos contemporâneos que afirmam esta corrente estão
Hernandes Dias Lopes, Louis Berkhof, Kim Riddlebarger, Michael Horton, Michael
Wilcock, J. I. Packer, John R. W. Stott, D. M. Lloyd-Jones, R. C. Sproul e Anthony
Hoekema.
1.5 PÓS-MILENISMO
O Pós-Milenismo defende que a Segunda Vinda de Cristo virá após o Milênio.
Este milênio é espiritual e durará todo o período da igreja. Ele será um tempo de
prosperidade e paz advinda da pregação do Evangelho em todo o mundo, onde
todos se converterão, inclusive os judeus, antes da volta de Cristo. Dessa forma, o
mundo ser tornará gradativamente um lugar muito bom, onde o mal será reduzido ao
mínimo e as nações cooperarão entre si. No final deste milênio glorioso, Satanás
será solto e Jesus voltará e o destruirá. Esta corrente escatológica defende uma
interpretação preterista das profecias apocalípticas, e crê que o sermão profético de
Jesus cumpriu-se ainda naquela geração com a queda de Jerusalém pelas mãos
dos romanos.
E nas palavras de Gentry Jr.(2014, p. 10):
Os pós-milenaristas ensinam que Jesus estabeleceu o reino no século I como realidade espiritual redentora incorporada à igreja. Por meio da proclamação do evangelho, dotada de poder pelo Espírito, o cristianismo crescerá de forma progressiva com o passar do tempo até se tornar a influência predominante no mundo. O crescimento do reino produzirá o aumento da justiça, paz e prosperidade, que mais tarde prevalecerão no mundo por um longo período. No fim desse período prolongado de justiça, Jesus voltará, ressuscitará todos os seres humanos, realizará o grande julgamento, estabelecendo então a disposição eterna.
Shedd (2002, p. 17) defende que “as raízes do pós-milenismo são
reconhecíveis nas idéias de Ticônio e Agostinho.”. No entanto, Harald Schaly (1992,
p. 55) afirma que o pós-milenismo tem a sua origem em:
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Lá pelo ano de 1700, surgiu, na Inglaterra, a teoria escatológica que ficou conhecida como pós-milenismo. O pioneiro deste sistema foi Daniel Whitby (1638-1725),um teólogo inglês, cuja convicção era que o mundo todo fosse transformado, esta conquista universal da Igreja constituiria o milênio, que consistiria no desaparecimento da Igreja Romana, do maometanismo, das religiões pagãs, dando lugar ao cristianismo.
Em virtude do início da Revolução Industrial do século XVIII e as idéias de
progresso da humanidade, esta corrente escatológica encontrou condições
favoráveis ao seu desenvolvimento até o ponto que praticamente todos os principais
teólogos e pregadores do século XIX a adotaram, entre eles Charles Hodge, William
GT Shedd, B B Warfield, A A Hodge e A H Strong.
No entanto, esta corrente escatológica caiu em descrédito com os
acontecimentos do século XX (duas grandes guerras mundiais, a crise de 29, o
comunismo, a bomba atômica e a guerra fria). E isto também é defendido por
Erickson (20012, p. 73):
O pós-milenismo tem sofrido um forte declínio em sua popularidade entre o final dos anos cinquenta e os anos sessenta. Em grande medida, isso tem resultado mais das considerações históricas do que das exegéticas.
Alguns proponentes dessa interpretação escatológica são: Jonathan Edwards,
W. D. G. Shedd, Charles Hodge, A. H. Strong e B. B. Warfield, Kennety L. Gentry Jr.
1.6 AVALIAÇÃO DA HISTÓRIA ESCATOLÓGICA CRISTÃ
Durante a história da Igreja Cristã, o fim dos tempos sempre trouxe grandes
debates, divisões e frustrações. Por isso o grande número de métodos de
interpretação escatológicos, sem falar da existência de discordâncias doutrinárias
dentro do mesmo método de interpretação. No entanto, as quatro principais
correntes escatológicas não conseguem comportar todas as variantes escatológicas
criadas, de tal forma que vários ensinos flutuam entre dois ou mais correntes
escatológicas. Apesar que a cristandade em geral desconhece o ensino escatológico
de forma consistente, sendo conduzida acriticamente conforme o esquema adotado
pela comunidade cristã a que pertence.
Algumas observações podem ser tiradas da história escatológica cristã.
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A primeira é que cada corrente ressalta um aspecto em detrimento de outros
da escatologia, assim o Pré-Milenismo Clássico ou Histórico ressaltou a
necessidade de enfrentar a perseguição pagã e glorificar Jesus no meio do
sofrimento; o Pré-Milenismo Dispensacionalista que ressaltou a interpretação literal
das Escrituras; o Amilenismo ressaltou o início do Reino de Cristo e a sua natureza e
autoridade espiritual e o Pós-Milenismo ressaltou o triunfo da Igreja transformando a
civilização humana antes da Segunda Vinda de Cristo.
A segunda observações é que cada corrente escatológica foi influenciada
pelas condições de cada época ou foram reações a outras correntes. A perseguição
pagã implacável gerou o milênio literal; a oficialização do cristianismo pelo Império
Romano influenciou o Amilenismo. A revolução industrial e o iluminismo
influenciaram o Pós-Milenismo e a reação e o literalismo influenciou o Pré-Milenismo
Dispensacionalista.
E por fim, a terceira observação é que não se pode esperar coerência e
concordância no pensamento escatológico, visto que ele é dinâmico, flutuante e
incapaz de ser completamente encaixotado em alguma corrente escatológica.
Com isto, percebe-se que estas correntes escatológicas são incapazes de
representar toda a verdade escatológica e que, de um jeito ou outro, elas contribuem
para a compreensão da Parousia de Cristo.
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2 QUESTÕES HERMENÊUTICAS
Por menor ou despretensiosa que seja uma leitura, ela sempre estará envolvida em
um processo de interpretação. Dessa forma, não existe a compreensão de um texto
sem que haja primeiro a sua interpretação. E isto também se aplica ao texto bíblico,
pois quando o leitor busca ler o texto bíblico ele automaticamente entra no processo
de interpretação do texto. Mesmo sendo um livro inspirado por Deus, a leitura da
Bíblia exige um esforço consciente e planejado de interpretação. E Augustus
Nicodemus, em seu livro A Bíblia e seus intérpretes – Uma breve história da
interpretação (2007, p. 29), esclarece o desafio da interpretação bíblica:
A dupla natureza da Bíblia provoca um distanciamento temporal e espiritual que precisa ser transposto, para que possamos chegar à sua mensagem. Porém, isso não nos isenta de buscarmos compreender de forma mais exata e completa a revelação que Deus fez de si mesmo. Com a graça de Deus, o estudo da interpretação da Bíblia feita pela Igreja Cristã e outros grupos através da história pode nos servir de auxílio oportuno para aprendermos com os erros e acertos dos que vieram antes de nós.
E como o escopo de trabalho é a escatologia, as palavras de Ladd (1986, p.10)
definem que “o Apocalipse é o livro do Novo Testamento mais difícil de ser
interpretado, basicamente por causa do uso elaborado e extensivo de simbolismo” e
por causa disto foram criados vários métodos de interpretação. Estes métodos
adotam vários princípios de interpretação que acabam distinguindo-os dos demais.
Diante dessa pluralidade de interpretação, fica a pergunta: como interpretar
corretamente o texto bíblico, e, mais especificamente, os textos proféticos e
apocalípticos?
Diante de várias opiniões de um mesmo texto e da dificuldade de saber com
precisão a intenção do autor, verificou-se a necessidade de estabelecer parâmetros
eficazes para descobrir a intenção do mesmo. Assim, desenvolveu-se a ciência que
estuda a interpretação de textos, e ela se chama hermenêutica. Este termo tem
origem grega na palavra hermeios que simbolizava um deus-mensageiro-alado tido
como o descobridor da linguagem e da escrita. Este deus grego, chamado Hermes,
traduzia tudo o que a mente humana não compreendia. Daí veio o termo
hermeneuein (Hermenêutica) que significa filosofia da interpretação ou a teoria
científica da arte de interpretar.
A hermenêutica na Grécia antiga relacionava-se com à gramática, à retórica e à
dialética e sobretudo com o método alegórico, para permitir a conciliação da tradição
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(os mitos) com a consciência filosoficamente esclarecida. Depois, a hermenêutica foi
usada por teólogos judeus, cristãos e islâmicos.
Dentre os vários ramos da hermenêutica, existe a hermenêutica bíblica que procura
estudar os princípios da interpretação da Bíblia com o objetivo de descobrir a
intenção original do inspirado autor bíblico.
Além das dificuldades linguísticas e históricas, Moisés Silva defende que
“precisamos da hermenêutica não somente pelo fato de a Bíblia ser um livro divino,
mas por que, além de ser divino, é um livro humano.” Além do mais, Osborne (2009,
p. 27) defende a necessidade da hermenêutica com a seguinte afirmação:
A hermenêutica é importante porque capacita a pessoa a se movimentar do texto para o contexto, para que o significado inspirado por Deus na Bíblia fale hoje com uma relevância tão nova e dinâmica quanto em seu ambiente original. Além disso, pregadores ou professores devem anunciar a Palavra de Deus em vez de suas opiniões religiosas repletas de subjetividade. Só uma hermenêutica bem definida pode manter alguém atrelado ao texto.
2.1 BREVE HISTORIA DA INTERPRETAÇÃO BÍBLICA E PROFÉTICA
Kaiser Jr (2009, p. 203) defende que “uma compreensão da história sobre a
interpretação da Bíblia pode ser muito útil para aquele que está estudando as
Escrituras”, tanto para familiarizar o intérprete com os métodos usados no passado,
quanto para poupá-lo de erros cometidos no passado.
2.1.1 HERMENÊUTICA JUDAICA
Costuma-se afirmar que hermenêutica bíblica teve o seu início quando, sob a
liderança de Esdras, os hebreus voltaram do cativeiro da Babilônia, conforme
relatado no livro de Neemias. Onde os escribas interpretaram oralmente as
Escrituras para os israelitas recém-chegados do cativeiro babilônico, que mais tarde,
esses ensinos orais se tornaram os Targuns ( nome dado às traduções, paráfrases e
comentários em aramaico da Bíblia hebraica) que acabaram tendo uma autoridade
igual a das Escrituras. A interpretação judaica foi influenciada por três grupos: os
rabinos (judeus palestinos); a seita de Qumrã e a diáspora judaica (judeus
helênicos).
Os rabinos reuniram as suas tradições orais em três grandes coleções de escritos
conhecidos como Mishna, o Gemara e o Talmude. Os da seita de Qumrã afirmavam
19
que a Escritura era a autoridade única de fé, desconsiderando a tradição oral
rabínica e a interpretação alegórica dos judeus helênicos. Os judeus da diáspora ou
helênicos influenciados pela filosofia platônica acreditavam que as Escrituras
continham uma verdade mais profunda e espiritual chamada de hyponoia, e ela
somente era alcançada por meio da interpretação alegórica.
2.1.2 HERMENÊUTICA DOS PAIS DA IGREJA PRIMITIVA
Nesse período se destacaram três escolas: a de Alexandria, a de Antioquia e a do
Ocidente.
A escola de Alexandria adotou o método alegórico de Filo e defendia que as
Escrituras tinham um sentido triplo: carnal, físico e espiritual. O seu maior exponente
foi Orígenes (185-254 d.C.).
A escola de Antioquia surgiu por volta do fim do terceiro século e defendia que o
sentido espiritual não podia ser separado do sentido literal, e sempre buscava a
intenção do autor dentro de um contexto histórico e mantendo-se fiel ao sentido
original dos textos. Seus maiores defensores foram Teodoro de Mopsuéstia e João
Crisóstomo e essa escola de interpretação durou muito tempo nas igrejas orientais e
em muito influenciou na exegese praticada na Reforma Protestante.
A escola do Ocidente incluía alguns elementos das duas escolas anteriores, mas a
sua principal característica era dar autoridade a tradição na interpretação da Bíblia.
Os seus principais representantes são Tertuliano (150-230 d.C.), Hilário, Ambrósio,
Jeronimo (347-420 d. C.) e Agostinho (354-430 d. C.).
2.1.3 HERMENÊUTICA NA IDADE MÉDIA
Durante o período entre os anos 600 d.C e 1500 d.C. a hermenêutica bíblica foi
submetida às tradições e doutrinas da Igreja, no entanto, a interpretação alegórica
ainda era importante neste período. O seu principal representante for Tomás de
Aquino (1225-1274 d.C), além de outros como Hugo de São Vitor (1096?-1141 d.C)
e Stephan Langdon (1150-1228 d.C). Entretanto, alguns poucos valorizavam o
sentido histórico-gramatical das Escrituras, como, por exemplo, Nicolau de Lira
(1270-1340 d.C).
20
2.1.4 HERMENÊUTICA NA REFORMA PROTESTANTE
As bases desta hermenêutica foram lançadas pelos trabalhos de Johannes Reuchlin
e Desidério Erasmo (1467-1536), onde o primeiro publicou uma gramática hebraica,
um léxico hebraico e uma interpretação gramatical de sete salmos; e o segundo
publicou uma edição crítica do Novo Testamento em grego em 1516. Martinho Lutero
se utilizou desse Novo Testamento em grego para traduzi-lo para a língua alemã. Ele
também atacou o método alegórico e defendeu do método literal de interpretar as
Escrituras. Lutero afirmava que a alegoria era como uma meretriz que seduzia os
homens desocupados, e que a alegoria degenerava as Escrituras. Neste caminho
também trilhou João Calvino que afirma que utilizar a alegoria era ceder à Satanás.
Assim, Nicodemus diz que “o retorno aos princípios de interpretação defendidos pela
escola de Antioquia marca a pregação, o ensino e os princípios dos Reformadores.”
(2007, p.159). O principal interprete de Reforma Protestante foi Calvino, ele
acreditava na necessidade da iluminação espiritual e defendia que a Escritura
interpreta a Escritura. Um nome importante foi o de Felipe Melanchton que com
grande talento e extenso conhecimento adotou o principio de que a interpretação
deve ser gramatical antes de ser teológica e de que só há um sentido na Bíblia, que
é o literal. De modo geral, os Reformadores criam na infalível e inspirada Palavra de
Deus e adotaram o princípio de interpretação da Bíblia pela Bíblia.
Calvino foi considerado o maior interprete bíblico da Reforma Protestante por fazer
um uso mais desenvolvido do método histórico-gramatical e manter uma coerência
metodológica ao analisar textos do Novo e do Antigo Testamento. E os seus
princípios da hermenêutica foram:
a) A Bíblia interpreta a própria Bíblia.
b) Ênfase no sentido literal do texto, embora que ele defendia que há passagens que
são nitidamente figurativas e outras simbólicas, estas devem ser interpretadas como
demonstra ser a intenção do autor.
c) Renúncia do uso de alegoria por ela causar deturpação do sentido da Escritura.
d) Valorização do estudo das línguas originais para melhor compreensão do ensino
sagrado.
e) O uso equilibrado da tipologia.
2.1.5 HERMENÊUTICA PÓS-REFORMA
21
A partir deste ponto, a história da interpretação bíblica começa a se tornar complexa.
Podemos ressaltar que no século XVII surgiram o pietismo e o racionalismo. Onde o
primeiro era uma resposta ao frio dogmatismo doutrinário e o institucionalismo que
era caracterizado por falta de fé pessoal e prática cristã, e o segundo onde os
interpretes procuram trazer as Escrituras para o crivo da razão e do natural. Este
período foi os primórdios do racionalismo e do iluminismo que varreu a Europa
através das obras de René Descartes (1596-1650), Thomas Hobbes (1588-1676),
Baruch Spinoza (1632-1677) e John Locke (1632-1704).
2.1.6 HERMENÊUTICA NA MODERNIDADE
A partir do século XVIII, surgiu a Modernidade calcada no humanismo e no
racionalismo que se desenvolveram com a intenção de colocar o ser humano no
lugar de Deus. A partir da Modernidade, a história deixou de ser dirigida por Deus e
passou a ser considerada uma relação natural entre causas e efeitos, e isto
influenciou profundamente a teologia, ao ponto dele não considerar mais as
Escrituras como a revelação de Deus e sim como uma obra meramente humana.
Desta forma, os milagres bíblicos foram negados, a historicidade dos relatos bíblicos
foram contestadas, foi feita a distinção entre Fé e História, foi defendida a existência
de erros nas Escrituras e a exegese foi controlada pela razão. Foi desenvolvido o
Método Histórico-Crítico e também foi marcado pelo surgimento das Metodologias
Críticas das Fontes, da Forma e da Redação.
2.1.7 HERMENÊUTICA NA PÓS-MODERNIDADE
A partir do século XX, surgiu a Pós-Modernidade que defendia que não existe
verdades absolutas e que o foco da interpretação bíblica move-se do texto para o
leitor, renegando a formação do texto e a intenção do autor, contribuindo para o
subjetivismo bíblico. Nela foram criadas as escolas da Nova Crítica Literária,
Estruturalismo, Reader Response (Hermenêuticas de Libertação),
Desconstrucionismo.
2.2 PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO DE PROFECIA BÍBLICA
22
O estudo da hermenêutica é amplo e complexo, no entanto, para o propósito deste
trabalho será direcionado para o estudo da hermenêutica aplicada ao estudo das
profecias e da escatologia. Mesmo vivendo em uma época em que a escatologia se
tornou em modismo e tem sido extremamente difundida, a sua natureza e propósito
não são perfeitamente compreendidos. Osborne (2009, p. 330) reconhece esta
dificuldade específica:
Berkekey Mickelsen reconheceu a dificuldade da tarefa hermenêutica em relação à profecia, propondo “uma abordagem que não interprete nada que não esteja na profecia, que torne claro tudo o que o profeta disse ou escreveu ao seu próprio povo, e que torne a mensagem do profeta, corretamente interpretada, pertinente ao nosso próprio tempo. De forma alguma, essa é uma tarefa pequena”.
Tratando do mesmo assunto, Berkhof (2004, p. 112) concorda que na profecia se
encontram os mais difíceis problemas de interpretação e propõe dois pontos que
pedem consideração especial: 1) as características especiais da profecia; 2) As
regras para a interpretação da profecia.
2.2.1 AS CARACTERÍSTICAS ESPECIAIS DA PROFECIA
A profecia como um todo tem um caráter orgânico. A profecia se desenvolve ao
longo do tempo. Ela primeiro começa com termos gerais que, ao longo da revelação
progressiva de Deus, cresce em minuciosidade e definição, como é o caso das
profecias messiânicas.
A profecia está intimamente relacionada à História. Os profetas não eram
personalidades alheias ao seu tempo e ambiente, eles tinham primeiramente uma
mensagem para os seus contemporâneos, que depois de desdobravam em ações
futuras, isto é, eles descobriam ocasiões históricas que transcendiam os limites da
História.
A profecia tem a sua própria perspectiva. Os profetas comprimiam grandes eventos
em um breve espaço de tempo, prevendo eventos distantes no tempo em um
simples relance. Esta perspectiva profética encurtava o seu horizonte, de modo uma
cadeia de eventos sucessivos parecessem um só, como por exemplo as profecias
do Dia do Senhor e das duas vindas de Cristo.
23
As profecias são frequentemente condicionais. Em muitos casos, o seu cumprimento
depende da ação dos homens. No entanto, isto só pode ser relacionado às profecias
que se referem ao futuro próximo, pois as profecias que se referem ao futuro
distante não são condicionais.
Embora os profetas frequentemente tenham se expressado simbolicamente, é
errôneo considerar sua linguagem como sendo completamente simbólica. A
tendência sempre é o sentido literal, quando os profetas se expressam
simbolicamente, o contexto normalmente indicará isto. E estes casos devem estar
fundamentados nas Escrituras.
Os profetas vestiram seus pensamentos com as formas derivadas da dispensação a
que pertenciam. Quando os profetas se referiam a fatos que aconteceriam em uma
dispensação futura, eles usam termos próprios da sua própria dispensação. Desta
forma, estas profecias tendem a não se realizarem em todos os seus detalhes.
Sob a direção do Espirito Santo, os profetas ocasionalmente transcenderam suas
limitações dispensacionais e históricas, e falaram de maneira que apontavam para
uma dispensação mais espiritual no futuro. Os profetas perceberam que as antigas
formas tinham caráter passageiro e apontaram para outra dispensação que
descreviam as bênçãos da Igreja no Novo Testamento. (Jr 31.31-34; Ml 1.11).
Algumas vezes os profetas revelaram a palavra do Senhor em ações proféticas. As
Escrituras estão cheias de ações que manifestaram a palavra de Deus, alguns
intérpretes acreditam elas foram realizadas em visões. Como, por exemplo, Oséias
que casou-se como uma prostituta e Isaías que caminhou descalço pelas ruas de
Jerusalém.
2.2.2 AS REGRAS PARA A INTERPRETAÇÃO DA PROFECIA.
As palavras dos profetas devem ser aceitas no seu sentido literal usual a não ser
que o contexto ou o modo no qual foram cumpridas indiquem claramente que
tenham um significado simbólico. Ao estudar as descrições figuradas encontradas
nos profetas, o intérprete deve objetivar descobrir a ideia fundamental expressa. Na
interpretação das ações simbólicas dos profetas, intérprete deve partir do
pressuposto da sua realidade, isto é, da sua ocorrência na vida ral, a não ser que o
contexto prove claramente o contrário.
24
O cumprimento de algumas das mais importantes profecias é germinante, isto é,
foram cumpridas em etapas, cada cumprimento sendo uma garantia do que se
seguiria. Como exemplo a passagem de Joel 2.28-32 que não completamente
cumprida no dia de Pentecostes.
As profecias devem ser lidas à luz do seu cumprimento porque isso irá, muitas
vezes, revelar profundezas que teriam, de outra maneira, escapado à atenção. Isto
que dizer se uma profecia for cumprida numa dispensação posterior, a forma
dispensacional deve ser desconsiderada no seu cumprimento.
2.3 PRESSUPOSTOS ADOTADOS
Moisés Silva (2009, p. 222) diz que “Bultmann tinha razão ao argumentar que era
impossível interpretar a Bíblia (ou qualquer texto) sem pressuposições”, e ele está
certo. No decorrer da história da interpretação bíblica, todos se aproximaram do
texto bíblico com idéias pré-concebidas, mesmo que de forma inconsciente. Os
israelitas receberam o Pentateuco das mãos de Moisés com se fossem escritos
sagrados e ensinaram isto para os seus filhos. A partir deste pressuposto, eles
desenvolveram escolas de interpretação sobre o texto sagrado. Não foi diferente
com os primeiros cristãos, que não só aceitaram as Escrituras Hebraicas como
acrescentaram os seus próprios escritos como sendo de origem divina, este
acréscimo foi denominado Novo Testamento e as Escrituras Hebraicas foram
denominadas de Antigo Testamento. Isto é somente um pequeno exemplo que é
impossível de se achegar ao texto bíblico sem algum pressuposto.
Desta forma, este trabalho tem os seus pressupostos e eles são os do
método histórico-crítico desenvolvido pelos Reformadores. Cujo lema era: Sola fide
(somente a fé), Sola scriptura (somente a Escritura), Solus Christus (somente
Cristo), Sola gratia (somentea graça), Soli Deo gloria (glória somente a Deus).
3. A FORMA QUE CRISTO VOLTARÁ
A partir deste capítulo, será demonstrado como a perspectiva amilenista
compreende a segunda vinda de Cristo. Mas, antes será demonstrado a validade da
25
hermenêutica adotada como a que satisfaz com maior precisão o ensino bíblico
sobre a Parousia de Cristo
3.1 ESCOLHENDO O MÉTODO HERMENÊUTICO
O presente trabalho tratou no capítulo 2 sobre a questão hermenêutica. Aquela
abordagem tratou sobre a história e desenvolvimento da interpretação bíblica e
focalizou no aspecto profético. O seu objetivo era preparar caminho para
compreender a hermenêutica usada pelas correntes escatológicas e fazer uma
escolha consciente da hermenêutica usada neste trabalho. Por isso que este
assunto é retomado aqui.
Hoekema (CLOUSE, 1990, p. 156) também pensa assim “Há uma diferença básica
entre o método de interpretação empregado pelos pré-milenistas e o empregado
pelos amilenistas” e Ladd concorda, na mesma obra (CLOUSE, 1990, p. 18),
entende que o pré-milenismo dispensacionalista “ baseia-se no tipo de hermenêutica
que julga que as profecias do Antigo Testamento devem ser interpretadas
literalmente”. E C. Ryrie (2004, p. 518) completa:
Inquestionavelmente, as diferentes interpretações do milênio resultam de hermenêuticas diferentes. Ou seja, possuem princípios de interpretação distintos. Os pré-milenistas usam a interpretação literal ou normal em todas as áreas da verdade bíblica, enquanto os amilenistas utilizam um princípio não-literal ou espiritual na área da escatologia. Todos os conservadores, independentemente de seus argumentos escatológicos, usam a interpretação literal ou normal em todas as Escrituras, menos na escatologia. Floyd Hamilton, um amilenista, reconhece que “uma interpretação literal das profecias do Antigo Testamento apresenta-nos uma imagem do reino terreno do Messias igual à dos pré-milenistas”. Os amilenistas, claro, não aceitam essa imagem do futuro, porque ela utiliza hermenêuticas distintas na área da profecia.
Kim Riddlebarger (2013, p.47) vai mais além:
Todo mundo tem pressuposições de como se podem ler as Escrituras. A suposição de que qualquer uma dessas visões milenaristas é o resultado de uma leitura simples, imparcial das Escrituras é demasiado simplista. Para entender por que os cristãos alcançam tais opiniões diversas, temos de identificar e avaliar cuidadosamente os pressupostos que eles adotam antes de vir para o texto bíblico. É vital saber o que estes pressupostos são e determinar como eles afetam uma leitura de seções proféticos da Bíblia, se quisermos obter textos de prova para debater com pontos de vista opostos.
Assim, a maneira como abordamos o texto bíblico irá determinar a sua
interpretação. No capítulo 2, foi dito que o método adotado seria o método histórico-
gramatical. No entanto, todas as correntes escatológicas afirmam utilizar este
26
método, mas os dispensacionalistas acusam os amilenistas de alegorizar ou
espiritualizar as profecias e, por sua vez, os amilenistas acusam os
dispensacionalistas de usar indevidamente a interpretação literal. Ryrie demonstra
muito bem isto em sua Teologia Básica (2004, p.518-519):
Nenhum literalista nega que a Bíblia contém figuras de linguagem, porém insiste que elas descrevem verdades literais.(...) Mas, veja bem, os amilenistas querem ser capazes de afirmar que não podemos ter certeza de que as profecias do Antigo Testamento, em relação ao reino milenar, serão cumpridas literalmente, pois nenhum tipo de cumprimento chegou a acontecer ainda. Mas como a Igreja possui algumas características similares ao reino, então a Igreja deve estar cumprindo essas profecias do Antigo Testamento.
Diante deste impasse, Riddlebarger (2013, p. 47) mostra uma maneira de determinar o caminho:
A melhor maneira de escolher a correta posição escatológica dentre os diferentes sistemas, é identificar e avaliar a hermenêutica subjacente involvida. Ao examinar os métodos hermenêuticos de cada sistema, podemos então decidir qual interpretação faz mais sentido dos dados bíblicos.
Como dito no capítulo 2, este trabalho adota o método histórico-gramatical na
perspectiva protestante histórica. Em resumo, este método tem três pressupostos
que são pertinentes a este trabalho:
a) o Novo Testamento explica o Antigo Testamento, tendo
autoridade para determinar a plena interpretação do Antigo
Testamento. E nisto Riddlebarger (2013, p. 50) demonstra o
porquê de não aceitar o método literal dos dispensacionalistas:
Se os escritores do Novo Testamento espiritualizam as profecias do Antigo Testamento, aplicando-as em um sentido não literal, então, as passagem do Antigo Testamento devem ser vistas à luz da interpretação do Novo Testamento, e não vice-versa.
b) Os profetas falaram da glória da era messiânica nos termos da própria era
pré-messiânica. Os termos usados por esses profetas refletiram a cultura que eles
viveram. No entanto, estes termos eram sombras e figuras que foram
reinterpretados no Novo Testamento na pessoa de Jesus Cristo.
c) Analogia da fé. Este termo demonstra a necessidade de
interpretar os textos obscuros à luz dos textos mais claros.
3.1.2 REVELAÇÃO PROGRESSIVA DAS ESCRITURAS
É o princípio pelo qual a interpretação de qualquer parte ou assunto é ajudada por
uma consideração das menções progressivas do seu assunto nas Escrituras. Estas
27
foram escritas durante um longo período de tempo de pelo menos 1600 anos, de
Moisés (1445 ac) até o Apostolo João (96 ad). Esta revelação foi sendo expandida
no decorrer da história, no início era incompleta e parcial, até que ela se tornou
completa com a vinda de Cristo. Foi o próprio Deus que tomou iniciativa e se
encarregou de realizar a revelação de si mesmo e de seus propósitos ao ser
humano. Ao escrever as Escrituras, Deus utilizou o método literário da menção
progressiva, de tal maneira que em cada menção sucessiva de um assunto bíblico,
Ele deu mais entendimento quanto ao seu sentido e uma compreensão maior do seu
significado.
Assim, Deus não revelou a verdade completa de uma só vez, ela foi feita
progressivamente, detalhe por detalhe, com cada parte fornecendo mais
acréscimos e esclarecimentos, com cada uma delas apresentando uma parte da
verdade. A revelação progressiva pode ser verificada em seis áreas principais que
são princípios, eventos, símbolos, pessoas, lugares e profecias.
Com isto, podemos dizer que a revelação progressiva veio em dois sentidos:
a) no sentido material, onde ocorreu o acréscimo de documentos, começando
pelos documentos escritos por Moisés e terminando pelos documentos escritos pelo
apostolo João.
b) no sentido cognitivo, onde a revelação mais nova completa o sentido da
revelação mais antiga.
Isto é demonstrado no livro de Hebreus quando diz que a lei era “a sombra dos bens
futuros, e não a imagem exata das coisas” (Hb 10:1) e que tinha “Deus antigamente
falado muitas vezes, e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, a nós falou-nos
nestes últimos dias pelo Filho (Hb 1:1). Assim, o Antigo Testamento era a sombra
(forma rudimentar, protótipo) das coisas que viriam. E tudo apontava para Cristo,
seja profecias, ritos ou símbolos, por isso o ensino (revelação) bíblico alcança a sua
plenitude no Novo Testamento, isto é, em Cristo Jesus onde “habita corporalmente
toda a plenitude da divindade” (Cl 2:9)
E isto é provado quando os escritores do Novo Testamento citam passagens
do Antigo Testamento com outro enfoque ou aplicação, geralmente como previsões
de coisas futuras. Exemplo disto é o discurso de Pedro no Pentecostes quando ele
menciona uma profecia de Moisés e o aplica em Cristo Jesus:
28
Porque Moisés disse aos pais: O Senhor vosso Deus levantará de entre vossos irmãos um profeta semelhante a mim; a ele ouvireis em tudo quanto vos disser. E acontecerá que toda a alma que não escutar esse profeta será exterminada dentre o povo. Sim, e todos os profetas, desde Samuel, todos quantos depois falaram, também predisseram estes dias. Atos 3:22-24
Não só os profetas foram interpretados à luz do Novo Testamento, os Salmos
também seguiram pelo mesmo caminho, ou revelação:
Homens irmãos, seja-me lícito dizer-vos livremente acerca do patriarca Davi, que ele morreu e foi sepultado, e entre nós está até hoje a sua sepultura. Sendo, pois, ele profeta, e sabendo que Deus lhe havia prometido com juramento que do fruto de seus lombos, segundo a carne, levantaria o Cristo, para o assentar sobre o seu trono, Nesta previsão, disse da ressurreição de Cristo, que a sua alma não foi deixada no inferno, nem a sua carne viu a corrupção. Deus ressuscitou a este Jesus, do que todos nós somos testemunhas. Atos 2:29-32
Este é o processo que a Bíblia usa para revelar os seus ensinos. Eles
começam como uma semente que durante o tempo ela cresce e se torna uma
frondosa árvore, ou seja, a forma elementar de uma doutrina se encontra no inicio
das Escrituras e a forma mais desenvolvida se encontra nos livros posteriores. E por
fim, esta frondosa árvore é Jesus Cristo que veio para dar à lei o sentido e a
coerência que nunca teve, dando-lhe um sentido mais completo.
Então aparecerá no céu o sinal do Filho do homem; e todas as tribos da terra se lamentarão, e verão o Filho do homem, vindo sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória. Mateus 24:30
A vinda do messias trouxe muitas surpresas para o povo judeu. Apesar de ser
ansiosamente aguardado, o reino do messias não foi da maneira que os israelitas
esperavam. Eles não tinham percebido que antes vir com poder e gloria, o messias
teria que vir como servo sofredor. Antes de reinar com o messias, eles tinham que
entender que a natureza desse reino não era político e material, e sim, espiritual e
escatológico. Os israelitas não tinham percebido que o messias tinha vindo não
somente para eles, mas para todos aqueles a quem Deus chamar. Os israelitas não
tinham percebido que ser Israel não era uma questão sanguínea, era uma questão
de fé.
Quanto Cristo iniciou o seu ministério, ele anunciou a chegada do Reino de Deus ou
Reino dos Céus (Mt 12:24-29) e começou a ensinar a plena revelação de Deus aos
homens e demonstrou a autenticidade de seus ensinos através da releitura do
Antigo Testamento e a realização de sinais e maravilhas(João 10:25). Cristo destruiu
as obras do Diabo (1 João 3:8), o amarrou (Marcos 3:27) e o expulsou (João 12:31-
32), recebeu toda a autoridade (Mateus 28:18-20) e inaugurou o Reino de Deus, que
na presente era, não é aparente (Lucas 17:20-21) e não é deste mundo (João
29
17:20:21), enviou o Espírito Santo (João 16:7), deu poder espiritual aos seus
discípulos (Lucas 24:49) e os ordenou a pregar e fazer discípulos em todas as
nações (Mateus 28:19-20) e prometeu voltar com poder e grande glória (Mateus
24:30). E esta é a “bem-aventurada esperança” que tem movido a Igreja durante
todo este tempo, mas, também, tem causado muita controvérsia sobre a maneira
que Cristo voltará.
3.1.3 EXEMPLO DE APLICAÇÃO HERMENÊUTICA
Como exemplo da hermenêutica adotada, é a interpretação da natureza do
povo de Deus em face do surgimento da Igreja. Tem sido ensinado que Israel é
diferente da Igreja neo-testamentária, no entanto, os escritores do novo testamento
se utilizaram de textos aplicados a Israel no Antigo Testamento e os aplicam na
Igreja. Esta hermenêutica neo-testamentária tem causado muitas discursões por
utilizar textos vétero-testamentários e reinterpretá-los no Novo Testamento de forma
surpreendente. Como exemplo, vemos em Mateus que Jesus retorna do Egito para
cumprir uma profecia que diz: “E esteve lá, até à morte de Herodes, para que se
cumprisse o que foi dito da parte do Senhor pelo profeta, que diz: Do Egito chamei o
meu Filho”. (Mateus 2:15). Entretanto, esta passagem em Oséias 11:1 “Quando
Israel era menino, eu o amei; e do Egito chamei a meu filho” não é uma profecia. A
princípio, Deus está se referindo a Israel na época do Êxodo. No entanto, Mateus, o
autor neo-testamentário, o aplica como uma profecia referente ao Messias. Este tipo
de abordagem tem feito muitos estudiosos duvidarem não só da autenticidade dos
Evangelhos como também da autenticidade da própria messianidade de Jesus
Cristo. E Nicodemus Lopes reconhece este problema faz com que “muitos críticos
apontam para ocasiões em que eles (autores do Novo Testamento) parecem estar
manipulando e torcendo as Escrituras para provar seus argumentos” (2007, p.109-
110). No entanto, “pode-se argumentar que não existe violência ao sentido do texto
original” (2007, p.113). Para Nicodemus, os escritores do Novo Testamento
reinterpretaram radicalmente as “Escrituras do Antigo Testamento à luz dos eventos
históricos-redentivos relacionados com a encarnação, vida, morte e ressurreição de
Cristo e o surgimento da Igreja Cristã” (2007, p.116).
30
E é com esta hermenêutica revolucionaria que os escritores do novo
testamento demonstram que a Igreja neo-testamentária é a continuação do Israel fiel
do Antigo Testamento.
Em Jeremias 31:31-34 tem uma promessa de restauração de Israel feita por
Deus, onde o pacto de Moisés seria descartado e outra pacto seria feito no lugar
daquele. Na passagem de Jeremias fica claro que este novo pacto seria feito com “a
casa de Israel e com a casa de Judá”, no entanto, o autor de Hebreus pega esta
profecia e afirma que ela foi cumprida na Igreja de Cristo. Ele afirma claramente que
este novo pacto é a aliança que Jesus Cristo fez com todos aqueles que crêem
Nele, seja judeu ou gentio. Diante disso fica a seguinte questão: ou os cristãos
judeus e os cristão gentios são um só povo ou o autor de Hebreus está errado.
Eis que dias vêm, diz o Senhor, em que farei uma aliança nova com a casa de Israel e com a casa de Judá. Não conforme a aliança que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito; porque eles invalidaram a minha aliança apesar de eu os haver desposado, diz o Senhor. Mas esta é a aliança que farei com a casa de Israel depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei a minha lei no seu interior, e a escreverei no seu coração; e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo. E não ensinará mais cada um a seu próximo, nem cada um a seu irmão, dizendo: Conhecei ao Senhor; porque todos me conhecerão, desde o menor até ao maior deles, diz o Senhor; porque lhes perdoarei a sua maldade, e nunca mais me lembrarei dos seus pecados. Jeremias 31:31-34
Mas agora alcançou ele ministério tanto mais excelente, quanto é mediador de uma melhor aliança que está confirmada em melhores promessas. Porque, se aquela primeira fora irrepreensível, nunca se teria buscado lugar para a segunda. Porque, repreendendo-os, lhes diz: Eis que virão dias, diz o Senhor, Em que com a casa de Israel e com a casa de Judá estabelecerei uma nova aliança, Não segundo a aliança que fiz com seus pais No dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito; Como não permaneceram naquela minha aliança, Eu para eles não atentei, diz o Senhor. Porque esta é a aliança que depois daqueles dias Farei com a casa de Israel, diz o Senhor; Porei as minhas leis no seu entendimento, E em seu coração as escreverei; E eu lhes serei por Deus, E eles me serão por povo;E não ensinará cada um a seu próximo, Nem cada um ao seu irmão, dizendo: Conhece o Senhor; Porque todos me conhecerão, Desde o menor deles até ao maior. Porque serei misericordioso para com suas iniquidades, E de seus pecados e de suas prevaricações não me lembrarei mais. Dizendo Nova aliança, envelheceu a primeira. Ora, o que foi tornado velho, e se envelhece, perto está de acabar. Hebreus 8:6-13
As passagens de Salmo 135:14 (Pois o Senhor julgará o seu povo, e se arrependerá
com respeito aos seus servos) e Deuteronômio 32:36 (Porque o Senhor fará justiça
ao seu povo, e se compadecerá de seus servos; quando vir que o poder deles se foi,
e não há preso nem desamparado) asseguram que Deus irá julgar o seu povo e o
escritor aos Hebreus afirma que estas passagem se aplicam à Igreja de Cristo
(Porque bem conhecemos aquele que disse: Minha é a vingança, eu darei a
31
recompensa, diz o Senhor. E outra vez: O Senhor julgará o seu povo) Hebreus
10:30.
O escritor aos Hebreus se utiliza de Deuteronômio 31:6 (Esforçai-vos, e animai-vos;
não temais, nem vos espanteis diante deles; porque o Senhor teu Deus é o que vai
contigo; não te deixará nem te desamparará) e o aplica à Igreja de Cristo em
Hebreus 13:5 (Sejam vossos costumes sem avareza, contentando-vos com o que
tendes; porque ele disse: Não te deixarei, nem te desampararei).
Mais uma vez o escritor de Hebreus aplica passagens que se referem aos
judeus e as aplicam na Igreja neo-testamentária. A passagem de Salmos 95:7-11 é
aplica na Igreja de Cristo em Hebreus 3:7-11 para alertar aos cristãos que
permanecessem em Cristo, não abandonando a fé, para que eles entrassem no
descanso celestial. Dizendo que o descanso da terra prometida era um tipo do
descanso que Jesus dava aos seus fiéis.
Em 2 Coríntios 6:16 (E que consenso tem o templo de Deus com os ídolos?
Porque vós sois o templo do Deus vivente, como Deus disse: Neles habitarei, e
entre eles andarei; e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo) o Apóstolo Paulo
cita Levítico 26:11-12 (E porei o meu tabernáculo no meio de vós, e a minha alma de
vós não se enfadará. E andarei no meio de vós, e eu vos serei por Deus, e vós me
sereis por povo) e Ezequiel 37:27 (E o meu tabernáculo estará com eles, e eu serei
o seu Deus e eles serão o meu povo) e os aplicam à Igreja. Estas passagem tratam
sobre a restauração do povo de Israel e Paulo demonstra que esta restauração será
através da Igreja de Cristo, e não será restrita à raça, à localidade e a um edifício
material.
O apóstolo Paulo cita Joel 2:32 (E há de ser que todo aquele que invocar o
nome do Senhor será salvo; porque no monte Sião e em Jerusalém haverá
livramento, assim como disse o Senhor, e entre os sobreviventes, aqueles que o
Senhor chamar) em Romanos 10:13 (Porque todo aquele que invocar o nome do
Senhor será salvo) e o aplica à Igreja de Cristo. Esta passagem de Joel está
relacionada com o Israel étnico e com a cidade de Jerusalém, mas agora, ela sai do
contexto racial e geográfico e se torna supra racial e supranacional e espiritual.
Dentre tantos outros exemplos, para encerrar esta parte, tem a passagem de
1 Pedro 2:9 (Mas vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo
adquirido, para que anuncieis as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a
sua maravilhosa luz) que se refere à Êxodo 19:5-6 (Agora, pois, se diligentemente
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ouvirdes a minha voz e guardardes a minha aliança, então sereis a minha
propriedade peculiar dentre todos os povos, porque toda a terra é minha. E vós me
sereis um reino sacerdotal e o povo santo. Estas são as palavras que falarás aos
filhos de Israel.). esta passagem de Êxodo trata do concerto que Deus fez com o
antigo Israel, em ser o Deus deles e ele, o povo de Israel, ser propriedade exclusiva
de Deus. Agora, na nova aliança, o apóstolo Pedro aplica esta passagem do Israel
étnico e a aplica na Igreja de Cristo.
Grier (1987, p. 45) concorda com isto ao dizer que ”os escritos do Novo
Testamento tomam profecias que, se entendidas sob o ponto de vista literal,
referem-se a Israel, e aplicam-nas à Igreja Cristã”, e que “os profetas do Velho
Testamento apontaram direta e definidamente para a Igreja do Novo Testamento”. E
por fim, Grier (1987, p. 54-55) demonstra a consequência lógica de adotar a
hermenêutica dos escritores do Novo Testamento:
Muitas profecias do Antigo Testamento foram cumpridas em seu sentido literal. Outras, muito numerosas também, apresentadas em linguagem figurada, o Novo Testamento declara cumpridas, não à risca da letra, mas em um sentido espiritual. (...) A aplicação das profecias do Antigo Testamento no Novo leva-nos a atribuir uma significação ampla e espiritual a promessas que, à primeira vista, poderiam parecer interessar exclusivamente aos Judeus.
Com isto, fica evidenciado que a Bíblia relata a existência de um único povo
de Deus, que antes estava restrito ao Israel natural e agora se estende ao Israel de
Deus formado por todos que creem em Cristo Jesus, seja judeu ou gentio.
3.2 UMA VINDA VISÍVEL E ÚNICA
No capítulo um foi mostrado o quanto que a questão escatológica tem promovido
uma variedade de interpretações conflitantes sobre este assunto. Neste ponto deste
trabalho, será tratado sobre a visibilidade da vinda de Cristo e a melhor maneira é
conhecer o que o próprio Jesus revela sobre a sua Segunda Vinda.
Mateus, capítulos 24 e 25, registrou o momento em que Jesus no Monte das
Oliveiras começa a explicar o tempo do fim. Ele fez isso a partir de um
questionamento de seus discípulos: “quando sucederão estas coisas e que sinal
haverá da tua vinda e da consumação do século?”(Mateus 24:3). Esta pergunta
tríplice ocorreu logo após Jesus e seus discípulos saírem do templo e estes se
gabarem da grandiosidade do prédio do Templo. Porém Jesus faz uma predição
33
assombrosa: “Não vedes tudo isto? Em verdade vos digo que não ficará aqui pedra
sobre pedra que não seja derrubada.” (Mateus 24:2). Ao chegarem no Monte da
Oliveiras, Jesus responde à pergunta tríplice dos seus discípulos: a) Quando o
Templo seria destruído; b) Quando seria o fim do mundo; c) Quando o Senhor
retornaria em glória. (LOPES, 2006, p. 28).
Este trabalho restringirá-se ao item “c”, que responde quando e de maneira
Cristo voltará à Terra.
“Porque, assim como o relâmpago sai do oriente e se mostra até ao ocidente,
assim será também a vinda do Filho do homem”. (Mateus 24:27). “E então verão vir
o Filho do homem nas nuvens, com grande poder e glória.”( Marcos 13:26)
E, quando dizia isto, vendo-o eles, foi elevado às alturas, e uma nuvem o recebeu, ocultando-o a seus olhos. E, estando com os olhos fitos no céu, enquanto ele subia, eis que junto deles se puseram dois homens vestidos de branco. Os quais lhes disseram: Homens galileus, por que estais olhando para o céu? Esse Jesus, que dentre vós foi recebido em cima no céu, há de vir assim como para o céu o vistes ir. Atos 1:9-11
Da simples leitura destes versículos, fica claro que quando Cristo voltar, não será
meramente um evento local e isolado, será visível a todo em todo a Terra, todos,
sem exceção, verão a sua Vinda. Então, Cristo não está dizendo que a sua vinda
será rápida como um relâmpago, Ele está dizendo que a sua vinda será visível,
perceptível e notória a todas as pessoas. O termo utilizado por Mateus não deixa
dúvidas sobre este significado: Parousia. Este termo vem do grego clássico e dá a
idéia de chegada, vinda, ou a presença de pessoas ou coisas. Este termo foi
utilizada em muitas outras passagens (1 Co 15.23, 16.17; 2 Co 7.6-7; 10.10; Fp
1.26; 2.12; 1 Ts 2.19; 3.13; 4.15; 5.23; 2 Ts 2.1,8-9; Tg 5.7-8; 2 Pe 1.16; 3.4,12; 1 Jo
2.28), sempre com o mesmo significado.
Hendriksen confirma este entendimento (2001, p. 503):
E mister que se diga uma palavra sobre o importante termo, "vinda", parousia, em grego. As vezes é usada no sentido não-técnico de a. presença; ver 1 Coríntios 16.17; 2 Coríntios 10.10; Filipenses 1.26; 2.12; ou, vinda, advento, ou chegada (2Co 7.6,7; 2Ts 2.9), Em outras passagens - ver especialmente Mateus 24.3, 27 (ora em estudo), 37, 39; 1 Coríntios 15.23; 1 Tessalonicenses 2.19; 3.13; 4.15; 5.23; 2 Tessalonicenses 2.1, 8; Tiago 5.7, 8; 2 Pedro 1.16; 3.4, 12; 1 João 2.28 - o termo refere-se a o retorno ou advento do Senhor, sua [segunda] vinda com o propósito de abençoar seu povo com sua presença. Esse significado pode ser visto como uma modificação do sentido: "chegada" ou "visita" do rei ou imperador. Então, o sentido da comparação é este: assim como o relâmpago produz um resplendor tão brilhante que pode ser nitidamente visto de um a outro extremo do céu, assim a vinda de Cristo será de tal modo pública, que "todo olho o verá" (Ap 1.7).
E Shedd (2002, p. 23) também:
34
Mas quem toma a sério a palavra de Cristo sobre seu retorno à terra não será iludido. Sua vinda não será escondida, nem secreta: mas como o relâmpago numa noite escura, assim se anunciará sua presença ao mundo todo, (Mt 24:27).que todo o olho O verá encontra sua confirmação em Apocalipse 1:7.
Desta forma, este termo era comumente usado como termo técnico para a visita de
algum imperador ou de governantes em visita oficial. Estas visitas sempre eram
celebradas com grande pompa e circunstância. Com isto, fica claro que parousia
sempre se relaciona a algo visível, nunca a algo secreto. Percebe-se que todas as
vezes que o termo parousia é utilizado evoca na mente dos ouvintes ou leitores algo
que será visível, evidente aos olhos, ou seja, nunca poderia se pensar em um
arrebatamento secreto. Mounce (1996, p. 234) também concorda com esta
interpretação ao afirmar que:
A palavra parousia (vinda) ocorre nos evangelhos somente neste capítulo (vv. 2,27,37,39); todavia, é comum por todo o resto do Novo Testamento. É largamente empregada em textos não-bíblicos a respeito da “vinda” (chegada) de uma pessoa de muito prestígio.
Riddlebarger (2013, p. 200) diz que:
No verso 27, Jesus disse que sua vinda não será um segredo ou um evento isolado “Porque, assim como o relâmpago sai do oriente e se mostra até ao ocidente, assim será também a vinda do Filho do homem”. Isto desafia a ideia de um arrebatamento secreto, já que a vinda de Cristo foi descrita com uma única, visível aparição ( não duas vindas com uma sendo secreta) que é a sua parousia no fim dos tempos “que acontecerá de uma forma tão súbita e traumática ( que é) incapaz de passar desperdiçada”. (…) Sua vinda não será um evento isolado, secreto, ou local, mas será testemunhado por todo o mundo. Todo o olho O verá.(...) Sua vinda será um inequivoco evento, como um relampago brilhando através do céu, impossível de perder.
No entanto, o Novo Testamento utiliza três palavras para se referirem a volta de
Cristo parousia, apocalipsys e epiphaneia sendo que, destes três, o mais utilizado é
parousia.
O significado literal de apocalipsys é "revelação", como em "Revelação de Jesus
Cristo" (Ap 1.1) "a revelação de nosso Senhor Jesus Cristo" (1 Co 1.7). "Revelação
de Jesus Cristo" (Ap 1.1). De acordo com 2 Ts 1.6-7 e 1 Pe 4.13, essa revelação
parece ser um tempo de alívio das grandes provações que produzirá alegria e
regozijo nos salvos. O termo epiphaneia significa "manifestação". Expressa a vinda
de Cristo no fim da tribulação e envolve o julgamento do mundo e do Anticristo. A
esperança dos crentes é colocada nessa manifestação, quando esperam a
recompensa e serem recebidos por Cristo (1 Tm 6.14; 2 Tm 4.8).
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Estes termos gregos utilizados para descrever a vinda de Cristo são palavras que
denotam sempre visibilidade e poder, seja para parousia (vinda), seja apocalipsys
(revelação) ou epiphaneia (aparecimento).
O texto de Atos 1:9-11 é paralelo a este de Mateus e confirma como Jesus voltará.
Boor (2003, p. 17) defende este entendimento:
Jesus voltará! Não é uma despedida para sempre. Da mesma maneira que Jesus agora “saiu” do âmbito terreno para o mundo divino completamente diferente, assim Ele retornará, ingressando novamente na esfera da atuação visível sobre esta terra. É por isso que o NT fala da “parusia”, da nova “presença” de Jesus, ou de sua nova “revelação”. Também dessa forma todas as concepções “místicas” são refutadas. Da palavra dos anjos, Lucas salientou singularmente o “assim, do mesmo modo”. O que isso significa? Nos dias da Páscoa a glória de Jesus ainda estava oculta de modo peculiar. Ele nem mesmo foi reconhecido imediatamente, logo não andava pela região com magnitude esplendorosa. Mas agora, na ascensão, é “exaltado”, liberto dos limites terrenais, e dotado da glória de Deus. E da mesma maneira “todos os povos da terra… verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e muita glória” (Mt 24.30; Lc 21.27). Isso acontecerá da mesma maneira real e visível como sua saída para o céu.
Boor defende que “os homens vestidos de branco” estava dizendo que Cristo viria
corporal, visível e repentinamente, assim com Cristo subiu, Cristo irá voltar.
Hendriksen (2001, p. 200) concorda com Boor:
Quantas vezes ascendeu Jesus ao céu? Você responderia: Claro que somente uma vez. Bem então aqui está sua resposta, esse Jesus que que dentre vós foi assunto ao céu virá do modo como o viste subir. Se ele entrou no céu somente uma vez, ele também retornará somente uma vez. Em nenhuma parte a Bília chega a sugestionar que haverá mais do que um retorno glorioso.
Wohlberg (2004, p.29) diz que:
Sua “vinda” ou “Paurosia”, será inconfundivelmente visível a “todas as tribos da terra”. As massas atordoadas da humanidade literalmente “verão o Filho do homem, vindo sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória”. Certamente ninguém perderá isto, e ninguém irá acordar no próximo dia perguntado, para onde foram os cristãos? Naquele dia incrível, os não-salvos irão “lamentar”. Porquê? Por quê os seus amados desapareceram? Não! Mas porque Jesus Cristo veio de repente e sua última chance para se preparar ficou para trás. Agora é muito tarde. Eles estão perdidos para sempre.
Com isto, fica claro que não há lugar para algo oculto ou secreto, e sim para a vinda
de Jesus que aparecerá nos céus com anjos, poder e glória para arrebatar a Igreja e
por fim aos tempos e trazer o juízo final. Isso fica bastante claro em passagens
como Mateus 25: 31-32: “E quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos os
santos anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória; E todas as nações
serão reunidas diante dele, e apartará uns dos outros, como o pastor aparta dos
bodes as ovelhas.”
Apocalipse 1:7 narra também o mesmo instante: “Eis que vem com as nuvens, e
todo o olho o verá, até os mesmos que o traspassaram; e todas as tribos da terra se
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lamentarão sobre ele. Sim. Amém. ". sim, este texto confirma as palavras de Jesus
em Mateus 24: 27 e 30, Pohl (2003, p. 42) concorda também que “Ele vem com as
nuvens, i. é, ―'com grande poder e glória', como é desdobrado em Mt 24.30.”
Outro famoso texto que está relacionado com a volta de Cristo é 1
Tessalonicense 4:13-18:
Não quero, porém, irmãos, que sejais ignorantes acerca dos que já dormem, para que não vos entristeçais, como os demais, que não têm esperança. Porque, se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também aos que em Jesus dormem, Deus os tornará a trazer com ele. Dizemo-vos, pois, isto, pela palavra do Senhor: que nós, os que ficarmos vivos para a vinda do Senhor, não precederemos os que dormem. Porque o mesmo Senhor descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor. Portanto, consolai-vos uns aos outros com estas palavras
Nesse período que Paulo escreveu esta carta, a Igreja de Tessalônica estava
passando por uma grande perseguição, além da morte natural dos membros
daquela Igreja. Assim, Timóteo informou que a igreja está muito abalada pelo
falecimento de seus membros. A Igreja não tinha certeza do destino dos irmãos que
morriam antes da vinda do Senhor, e por isso a Igreja tinha receio que os que já
morreram não participariam da glória do retomo de Cristo e nem se ajuntariam aos
que estariam vivos na vinda do Senhor. Paulo assegura aos tessalonicenses que
eles não precisavam temer, pois na Vinda de Cristo nenhum grupo de crentes teria
vantagem sobre o outro. Ambos, os vivo e os mortos, teriam os seus corpos
glorificados e seriam reunidos com Cristo nos ares, na momento da Parousia.
Hoekema (1989, p. 189) confirma isto:
O que esta passagem ensina claramente é que, na hora da volta de Cristo, todos os crentes mortos (os “mortos em Cristo”) serão ressuscitados, e todos os crentes que ainda estiverem vivos serão transformados e glorificados (veja 1 Coríntios 15.51,52); então estes dois grupos serão levantados rapidamente para encontrar o Senhor no ar.
E com isto em mente, Paulo descreve como será a vinda de Cristo. A partir
dos versículos 16 e 17 fica claro que a vinda de Cristo será visível e audível, e em
um único ato. Assim a segunda vinda de Cristo será extremamente barulhenta, pois
haverá gritos, alaridos, soar de trombetas e todo tipo de som. São encontrados os
seguintes elementos nesta passagem:
a) Palavra de ordem do Senhor: “Porque o mesmo Senhor descerá do céu
com alarido ...”.
b) Voz do arcanjo: “e com voz de arcanjo”.
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c) Som da trombeta de Deus: “e com a trombeta de Deus...”.
d) O Senhor desce dos céus: “descerá dos céus...”.
e) Ressurreição dos mortos em Cristo: “e os que morreram em Cristo
ressuscitarão primeiro”.
f) Arrebatamento dos santos: “Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos
arrebatados juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor nos
ares, e assim estaremos sempre com o Senhor”.
Erickson (2012, p. 177-178) também concorda que o texto fala somente de uma
única vinda:
O outro grande problema para o pré-tribulacionismo diz respeito às passagens bíblicas em que veem descrições do arrebatamento (a vinda para a igreja). Uma delas é 1 Tessalonicenses 4.16-17. Embora se suponha que o arrebatamento (em que o Senhor não vem totalmente até a terra) seja relativamente indiscernível, não visto pelos descrentes, sua descrição (“dada a sua palavra de ordem, ouvida a voz do arcanjo, e ressoada a trombeta de Deus”) faz com que soe como algo inconfundível. A sugestão dos pós-tribulacionistas de que essa seja uma referência, não a uma “vinda para” a igreja, mas a uma só Segunda Vinda de Cristo parece encaixar-se melhor na descrição.
E para contradizer os Dispensacionalistas, este texto não ensina que Jesus, após o
arrebatamento, retornará para o céu. O texto não diz isto, pelo contrário, os termos
usados por Paulo dão um sentido completamente diferente. Hoekema (1989, p.190)
ensina que a expressão “o encontro do Senhor nos ares” traz do grego a locução
preposicional: eis apantesin. Esta palavra era utilizada na época neo-testamentária
para descrever as boas-vindas públicas dadas por uma cidade a um visitante ilustre.
Estas boas-vindas constituíam na recepção do ilustre visitante ainda fora da cidade,
e depois ambos voltavam juntos para dentro da cidade. Com esta comparação,
Paulo está dizendo que após a reunião dos crentes ressurretos com os crentes
transformados com Cristo nos ares, eles, Cristo e todos os crentes, voltarão para a
terra.
Isto pode ser verificado em outras passagens do Novo Testamento, como em
Atos 28.15 os irmãos saíram ao encontro de Paulo na praça de Ápio e às Três
Vendas, a expressão “nos saíram ao encontro”, é o mesmo termo eis apantesin
hemim, desta forma, estes irmãos de Roma saíram para encontrar Paulo e o
acompanharam até o término de sua chegada. Outra passagem é a de Mateus 25:6
“Mas à meia-noite ouviu-se um clamor: Aí vem o esposo, saí-lhe ao encontro” onde
“ao encontro" é a tradução da mesma palavra eis apantesin. Desta forma, como as
virgens acompanharam a chegada do noivo a Igreja também acompanhará o
término da chegada de Cristo à terra, visto que as virgens não interromperam o
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avanço do noivo e, nem inverteram a sua direção. Hoekema (1989, p .190) completa
o raciocínio:
Assim como as virgens, depois disso, foram juntamente com o noivo em seu caminho para as bodas, assim os crentes ressurrectos e os transformados, após terem-se encontrado com o Senhor nos ares, permanecerão juntos com o Senhor, enquanto ele continua seu caminho para terra. A figura das bodas implica em comunhão feliz e amorosa. Por que dever-se-ia presumir que esta comunhão só pode acontecer no céu? O lugar dos corpos ressurrectos e glorificados dos crentes não é no céu, mas sobre a terra. Portanto, não é no céu mas na nova terra que a festa do casamento de Cristo e seu povo redimido acontecerá.
Ladd (ERICKSON, 2012, p. 193) comenta da seguinte forma o significado da
termo apantesin em 1 Tessalonicenses 4:16-17:
Cristo voltará, e os mortos justos serão ressuscitados para encontrar-se com ele, seguidos pelos crentes que ainda estiverem vivos sobre a terra. Esses dois grupos se tornarão uma só grande comitiva de boas-vindas e, quando se encontrarem com o Senhor, ele não virará para ir embora com eles. Pelo contrário, eles farão a volta para acompanhá-lo à terra. A palavra apantêsis tem exatamente o mesmo significado aqui que tem nas outras duas referências no Novo Testamento, especialmente em Mateus 25.6. Nada no estudo comparativo da palavra sugere a remoção dos crentes paraalgum outro lugar, conforme a visão pré-tribulacionista parece requerer.
Outra passagem correlata é 1 Corintios 15:51-54. Ela descreve o mesmo evento de
Mateus e de 1 Tessalonicenses:
Eis aqui vos digo um mistério: Na verdade, nem todos dormiremos, mas todos seremos transformados; Num momento, num abrir e fechar de olhos, ante a última trombeta; porque a trombeta soará, e os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados. Porque convém que isto que é corruptível se revista da incorruptibilidade, e que isto que é mortal se revista da imortalidade.E, quando isto que é corruptível se revestir da incorruptibilidade, e isto que é mortal se revestir da imortalidade, então cumprir-se-á a palavra que está escrita: Tragada foi a morte na vitória.
Haverá dois grupos de santos que serão arrebatados: aqueles que já
morreram (ou dormiram) e aqueles que estarão vivos. Nesta passagem de 1
Coríntios Paulo descreve que a segunda vinda de Cristo e a glorificação dos santos
irão ocorrer imediatamente antes do último dia, ou seja, cristo retorna, os santos
recebem corpos imortais e glorificados e vem o estado eterno.
João também ensina que a ressurreição ocorrerá no último dia:
E a vontade do Pai que me enviou é esta: Que nenhum de todos aqueles que me deu se perca, mas que o ressuscite no último dia. Porquanto a vontade daquele que me enviou é esta: Que todo aquele que vê o Filho, e crê nele, tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia.Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou o não trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia. João 6:39,40 e 44
Disse-lhe Jesus: Teu irmão há de ressuscitar. Disse-lhe Marta: Eu sei que há de
ressuscitar na ressurreição do último dia. (João 11:23-24). E também Mateus 24:37-
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41 e Lucas 17: 26-37 descrevem que o arrebatamento ocorrerá antes do último
julgamento
Mas daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos do céu, mas unicamente meu Pai. E, como foi nos dias de Noé, assim será também a vinda do Filho do homem. Porquanto, assim como, nos dias anteriores ao dilúvio, comiam, bebiam, casavam e davam-se em casamento, até ao dia em que Noé entrou na arca, E não o perceberam, até que veio o dilúvio, e os levou a todos, assim será também a vinda do Filho do homem. Então, estando dois no campo, será levado um, e deixado o outro; Estando duas moendo no moinho, será levada uma, e deixada outra. Mateus 24:36-41
Os dispensacionalistas se utilizam deste texto para provar que o arrebatamento será
secreto, ou seja, que as pessoas irão desaparecer instantaneamente em todo o
mundo, deixando para trás os incrédulos, que estarão perplexos e confusos, e se
iniciará o período da Grande Tribulação.
No entanto, após uma análise do contexto dessa passagem, Jesus fala o repentino
julgamento que virá. E Ele cita o relato do Dilúvio quando Noé entrou na arca e foi
salvo e os incrédulos foram pegos de surpresa e levados pelas águas da destruição,
isto é, os levados são comparados àqueles que o Dilúvio levou, ou seja, os levados
são os ímpios, e os que ficaram, são os justos, que no caso, foi Noé e sua família. E
assim será na sua vinda. Champlim (1995, p. 568) afirma que:
Os verbos gregos aqui traduzidos como futuros (estarão- e -será) em realidade estão no tempo presente, e isso aumenta a vivacidade da narrativa. Portanto, “um é tomado e o outro é deixado”. O julgamento virá com subitaneidade, apanhando a muitos em suas ocupações diárias; e assim a um será ‘tomado’, isto é, apanhado pelo juízo, enquanto que outro será ‘ deixado’, ou seja, escapará do julgamento.Embora o julgamento seja repentino, não será indiscriminado. Alguns serão tomados para a condenação, enquanto que outras serão preservados de dano; e somente os conselhos de Deus podem fornecer a razão apropriada para essa ação. Alguns intérpretes modernos vêm visto um quadro do ‘ arrebatamento’ da igreja nessas palavras de Jesus, crendo que o ‘tomar’ será a ação de Deus que removerá a igreja deste mundo perverso, e que os ‘deixados’ são justamente aqueles que, não pertencendo à igreja, serão deixados para o eventual sofrimento e destruição, durante o período de tribulação. Neste capitulo , entretanto , não temos uma descrição doarrebatamento da igreja.
O contexto dos capítulos 24 e 25 de Mateus é sobre a destruição do templo,
a vinda de Cristo e o fim dos tempos. Os versículos 36 ao 41 deste capítulo 24 fala
sobre a vigilância e fidelidade devida ao tempo desconhecido desse julgamento
súbito vindo sobre os desatentos. Desta forma, estes capítulos não descrevem um
arrebatamento secreto, mas faz uma advertência para que não sejam condenados
na sua vinda.
Por fim, fica insustentável o ensino que Cristo voltará em duas fases tendo a Grande
Tribulação entre elas. Ladd (2012, p. 162), ao analisar o ensino dispensacionalista
das duas vindas de Cristo, chega a seguinte conclusão:
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O vocabulário da Bem-dita Esperança não conhece os dois aspectos da vinda de Cristo, um secreto e outro glorioso. Pelo contrário, a terminologia aponta para um único indivisível retorno de Cristo. As Escrituras não dizem nada sobre uma secreta vinda do Senhor. As Escrituras que predizem a Grande Tribulação, o Rapto e a Ressurreição em nenhum lugar colocam o Rapto e a Ressurreição dos santos no começo da Tribulação. (...) Pelo contrário, a única passagem que é mais específica para a cronologia coloca a ressurreição dos mártires e santos para depois da Tribulação.
E declara (LADD, 2012, p. 167) que a Bíblia apoia uma única vinda de Cristo
no último dia.
Enquanto isso, devemos insistir que a inferência contemporâneo de dois aspectos na segunda vinda não tem a explícita confirmação das Escrituras. A interpretação natural do retorno de Cristo é a de um glorioso evento único no final; e esta foi sempre a expectativa do futurista vista da Igreja até a criação das distinções dispensacionais
3.3 E TRARÁ O FIM DA HISTORIA
Até agora foi mostrado neste trabalho que que ao soar da última trombeta, Cristo
retornará uma única vez em glória visível e audível a todo o mundo e irá se
encontrar nos ares com todos os santos de todas as eras. E isto será “depois da
tribulação daqueles dias", descrita por Cristo nos versículos 15 a 26. Estes santos
terão seus ressuscitados (os mortos) e glorificados (todos) e ficaram para sempre
com Cristo. Isto trará o fim (1Co. 15:23-24) desta era, o juízo final e o estado eterno.
Logo depois da aflição daqueles dias, o sol escurecerá, a lua não dará a sua luz, as estrelas cairão do firmamento e os corpos celestes serão abalados. Então aparecerá no céu o sinal do Filho do homem, e todos os povos da terra se lamentarão e verão o Filho do homem, vindo sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória. E ele enviará os seus anjos, com grande clangor de trombeta, os quais ajuntarão os seus escolhidos desde os quatro ventos, de uma à outra extremidade dos céus. Mateus 24:29-31
Cristo ensina isto nas parábolas do trigo e do joio e da rede de pescar. Ele ensina
que o trigo e o joio(os santos e os ímpios) existirão na Terra até o dia da colheita que
acontecerá no fim do mundo (consumação dos séculos). Também ensina que os
santos e os ímpios não serão separados até a consumação dos séculos (Mt. 13:47-
50). Desta forma, a ressurreição dos santos deve coincidir com a ressurreição dos
ímpios, uma logo após a outra. Isto é dito Daniel:
E naquele tempo se levantará Miguel, o grande príncipe, que se levanta a favor dos filhos do teu povo, e haverá um tempo de angústia, qual nunca houve, desde que houve nação até àquele tempo; mas naquele tempo livrar-se-á o teu povo, todo aquele que for achado escrito no livro.
E muitos dos que dormem no pó da terra ressuscitarão, uns para vida eterna, e outros para vergonha e desprezo eterno. Daniel 12:1,2
E em João: “Está chegando a hora em que todos que estiverem nos túmulos
ouvirão a sua voz e sairão; os que fizeram o bem ressuscitarão para a vida, e os que
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fizeram o mal ressuscitarão para serem condenados.” (João 5.28,29). E “Porquanto
a vontade daquele que me enviou é esta: Que todo aquele que vê o Filho, e crê
nele, tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia.” (João 6:40). E também:
“Quem me rejeitar a mim, e não receber as minhas palavras, já tem quem o julgue; a
palavra que tenho pregado, essa o há de julgar no último dia.” (João 12:48)
Nestas passagens, o ensino de Jesus Cristo diz que a ressurreição dos justos e
injustos acontecerá na mesma hora que será no último dia. Cristo também ensina
que a ressurreição dos justos e o julgamento dos perversos acontecerão no último
dia. Sendo assim, estes dois eventos serão no mesmo dia: o último dia.
E ele, respondendo, disse-lhes: O que semeia a boa semente, é o Filho do homem; O campo é o mundo; e a boa semente são os filhos do reino; e o joio são os filhos do maligno; O inimigo, que o semeou, é o diabo; e a ceifa é o fim do mundo; e os ceifeiros são os anjos. Assim como o joio é colhido e queimado no fogo, assim será na consumação deste mundo. Mateus 13:37-40
Mounce (1996, p. 144 ) ao analisar esta passagem concorda que:
Mateus enfatiza com esta parábola que o julgamento final sobrevirá quando da volta de Cristo. O dia do julgamento será semelhante ao enfeixamento e queima do joio. Começando pelo versículo 41, a interpretação da parábola retrata o juízo final nos termos tradicionais da literatura apocalíptica judaica.
Cristo ensina que quando Ele vier na Sua glória e com todos os santos, Ele reunirá
todas as nações e separará um dos outros, os justos dos injustos, os justos para a
glória eterna e os injustos para a punição eterna.
E quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos os santos anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória; E todas as nações serão reunidas diante dele, e apartará uns dos outros, como o pastor aparta dos bodes as ovelhas; Mateus 25:31,32
Segundo Mounce (1996, p. 246), ‘o masculino autous (“uns”) em 32b, em seguida ao
neutro ethne (nações), indica que a separação será entre indivíduos, e não entre
nações.’, com isto, verifica-se que irá tratar as pessoas individualmente, ou seja, “
todas as nações” indicam todas as pessoas indiscriminadamente.
O julgamento de Sodoma e Gomorra é um excelente exemplo de como Deus julga
um ente coletivo, no caso, uma cidade.
Disse mais o Senhor: Porquanto o clamor de Sodoma e Gomorra se tem multiplicado, e porquanto o seu pecado se tem agravado muito,
Descerei agora, e verei se com efeito têm praticado segundo o seu clamor, que é vindo até mim; e se não, sabê-lo-ei.Então viraram aqueles homens os rostos dali, e foram-se para Sodoma; mas Abraão ficou ainda em pé diante da face do Senhor.E chegou-se Abraão, dizendo: Destruirás também o justo com o ímpio?Se porventura houver cinqüenta justos na cidade, destruirás também, e não pouparás o lugar por causa dos cinqüenta justos que estão dentro dela?
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Longe de ti que faças tal coisa, que mates o justo com o ímpio; que o justo seja como o ímpio, longe de ti. Não faria justiça o Juiz de toda a terra?Então disse o Senhor: Se eu em Sodoma achar cinqüenta justos dentro da cidade, pouparei a todo o lugar por amor deles. Gênesis 18:20-26
Nesta passagem fica claro que Deus destruiria as cidades de Sodoma e Gomorra
por que não havia um justo sequer. Caso existisse um justo, Deus não as destruiria
por amor deste justo, por mais pecadora que fosse a maioria dos seus cidadãos. O
contrário também é válido, o injusto não escaparia do julgamento divino por estar
vivendo entre os justos. Ou seja, Deus não julga entes coletivos, Ele julga os entes
individuais, pois “ a alma que pecar, esta morrerá”. Se Deus destruiu estas cidades é
por que todos os seus indivíduos mereciam o julgamento. Prova disto é o livramento
que Deus deu a Ló e sua família. Eles moravam em Sodoma, mas participavam de
sua iniquidade, de tal forma que Deus enviou anjos para os livrarem da destruição
destas cidades:
E ao amanhecer os anjos apertaram com Ló, dizendo: Levanta-te, toma tua mulher e tuas duas filhas que aqui estão, para que não pereças na injustiça desta cidade. Gênesis 19:15
No próprio capítulo 25 de Mateus, fica claro que as nações não serão julgadas como
entes coletivos, e sim, como entes individuais de todas as nações. Após todas as
nações serem reunidas diante de Cristo, “Ele separará uns dos outros.” e não uma
das outras. A redação do texto deixa bastante clara que Cristo irá julgar os
indivíduos de todas as nações, e não as nações como tal. E por fim, no versículo 46,
para ficar ainda mais claro, Cristo menciona a recompensa dos justos e injustos,
onde os primeiros recebem a vida eterna e aqueles, a condenação eterna.
Obviamente, as nações não recebem nem a vida eterna e nem a condenação
eterna, sem contar que Cristo não menciona nenhuma referência ao milênio, ou
outro período anterior ao estado eterno. Cristo, de forma clara e inequívoca,
apresenta o estado eterno logo após a sua vinda.
E quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos os santos anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória;E todas as nações serão reunidas diante dele, e apartará uns dos outros, como o pastor aparta dos bodes as ovelhas;E porá as ovelhas à sua direita, mas os bodes à esquerda.Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo;Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; era estrangeiro, e hospedastes-me;Estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me; estive na prisão, e foste me ver.
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Então os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer? ou com sede, e te demos de beber?E quando te vimos estrangeiro, e te hospedamos? ou nu, e te vestimos?
E quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos ver-te?E, respondendo o Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes.Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos. Mateus 25:31-41
Schaly confirma este entendimento (1987, p. 87):
O termo nações ocorre, também, na Grande Comissão (Mat. 28:19) (Versão de Almeida, Revista e Corrigida da IBB), que manda ensinar e batizar nações, o que só pode significar indivíduos de várias nações
Como os dispensacionalistas alegam usar uma interpretação literal e natural
do texto, eles não podem negar que o sentido literal e claro das palavras de Cristo é
que, no futuro, justos e injustos ressuscitarão e serão julgados ao mesmo tempo, no
grande dia da sua vinda, que será o último dia, depois de ser tocada a trombeta
final.
Com visto, a ideia de uma vinda secreta e dupla do Senhor é uma imposição ao
ensino de Cristo. Grier (1987, p. 71) compartilha do mesmo entendimento ao dizer
que “o Senhor Jesus ensina claramente que haverá um julgamento geral, universal,
quando da sua segunda vinda”.
Porque, assim como o relâmpago sai do oriente e se mostra até ao ocidente, assim será também a vinda do Filho do homem.Pois onde estiver o cadáver, aí se ajuntarão as águias.E, logo depois da aflição daqueles dias, o sol escurecerá, e a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão do céu, e as potências dos céus serão abaladas.Então aparecerá no céu o sinal do Filho do homem; e todas as tribos da terra se lamentarão, e verão o Filho do homem, vindo sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória.E ele enviará os seus anjos com rijo clamor de trombeta, os quais ajuntarão os seus escolhidos desde os quatro ventos, de uma à outra extremidade dos céus. Mateus 24:27-31
Nesta passagem, fica claro a vinda de Cristo será imediatamente seguida pela
transformação dos astros celestes, o sol escurecerá e as estrelas cairão do céu
rumo à Terra. Esta é a descrição do fim dos tempos e do julgamento final. E Pedro
ensina que na volta de Cristo o mundo sofrerá transformações cataclísmicas:
O Senhor não retarda a sua promessa, ainda que alguns a têm por tardia; mas é longânimo para conosco, não querendo que alguns se percam, senão que todos venham a arrepender-se.Mas o dia do Senhor virá como o ladrão de noite; no qual os céus passarão com grande estrondo, e os elementos, ardendo, se desfarão, e a terra, e as obras que nela há, se queimarão.Havendo, pois, de perecer todas estas coisas, que pessoas vos convém ser em santo trato, e piedade,Aguardando, e apressando-vos para a vinda do dia de Deus, em que os céus, em fogo se desfarão, e os elementos, ardendo, se fundirão?
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Mas nós, segundo a sua promessa, aguardamos novos céus e nova terra, em que habita a justiça. 2 Pedro 3:9-13
E a consequência da vinda de Cristo é o surgimento de novos céus e nova terra,
logo após o Dia do Senhor, pois Pedro não faz distinção entre o Dia do Senhor e a
Volta de Cristo.
Com isto, fica claro que as Escrituras mostram que a vinda de Cristo trará o fim da
história humana e o julgamento de todos os indivíduos no mesmo evento. Não há
espaço para outros desdobramentos escatológicos, seja para a nação de Israel ou
para um reino intermediário antes do julgamento final.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Antes de apresentar a conclusão, é necessário afirmar que se deve evitar que
métodos de interpretação bíblica sejam confundidos com a própria Bíblia, e que
qualquer um que interprete de outra forma seja considerado herege. Assim, o Pré-
Milenismo Dispensacionalista não é a Bíblia e nem detém a última palavra sobre a
hermenêutica bíblica.
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Mesmo que o tema deste trabalho seja complexo, ficou claro como ele chegou a
suas conclusões. Primeiro, através da parte geral (capítulos 1 e 2), iniciou pela
abordagem histórica do pensamento escatológico na igreja cristã, ficou demonstrado
o quanto este assunto tem gerado controvérsias ao longo do tempo e certamente
será assim até a volta de Cristo. Depois foram analisadas as questões
hermenêuticas envolvidas no estudo da escatologia através do panorama histórico
do seu desenvolvimento e o modo como as principais correntes escatológicas
aplicam a hermenêutica em seus ensinos.
No terceiro capítulo começa a ser desenvolvido o tema principal deste trabalho.
Onde é demonstrado que a vinda de Cristo ocorrerá de forma visível e singular, não
cabendo nenhum outro evento escatológico, visto que esta vinda trará junto consigo
o julgamento final e os novos céus e a nova terra.
Assim, este trabalho chega ao fim demonstrando que a perspectiva amilenista
apresenta uma proposta hermenêutica viável, pois ela busca a hermenêutica do
próprio texto bíblico, deixando os próprios autores neo-testamentários conduzirem o
ensino bíblico. Desta forma, este trabalho conclui que Cristo voltará visivelmente
com poder e glória, um única vez, e trará o fim dos tempos, o julgamento final à
humanidade e trará os novos céus e nova terra que tanto os cristãos almejam.
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