a sedução do discurso

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A SEDUÇÃO NO DISCURSO – O PODER DA LINGUAGEM A SEDUÇÃO NO DISCURSO – O PODER DA LINGUAGEM NOS TRIBUNAIS DE JÚRI NOS TRIBUNAIS DE JÚRI CAPITULO I – O Direito de Seduzir e a Sedução CAPITULO I – O Direito de Seduzir e a Sedução no Direito no Direito O horizonte temático do presente trabalho é o O horizonte temático do presente trabalho é o discurso jurídico em sua manifestação mais discurso jurídico em sua manifestação mais fundamental e antiga: os debates entre fundamental e antiga: os debates entre promotores e advogados, entre defesa e promotores e advogados, entre defesa e acusação. acusação. O direito é uma ciência humana, não meramente O direito é uma ciência humana, não meramente técnica. Conhecer e dominar o Direito não se técnica. Conhecer e dominar o Direito não se resume ao conhecimento das normas, dos resume ao conhecimento das normas, dos ordenamentos jurídicos. Aplicar o Direito não ordenamentos jurídicos. Aplicar o Direito não depende apenas da observância das leis e do depende apenas da observância das leis e do estudo das evidencias. O Direito deve ir estudo das evidencias. O Direito deve ir além, para praticar Justiça. além, para praticar Justiça. Sem duvida, os argumentos do promotor de Sem duvida, os argumentos do promotor de justiça e do advogado de defesa terão caráter justiça e do advogado de defesa terão caráter decisivo. O poder de sedução das partes surge decisivo. O poder de sedução das partes surge como elemento fundamental para o como elemento fundamental para o preenchimento das lacunas do Direito e para preenchimento das lacunas do Direito e para sua aplicação. sua aplicação. Podemos, portanto, conceber o Direito como Podemos, portanto, conceber o Direito como uma ciência da argumentação. Advogados e uma ciência da argumentação. Advogados e promotores devem argumentar em favor da parte promotores devem argumentar em favor da parte 1

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A SEDUÇÃO NO DISCURSO – O PODER DA LINGUAGEMA SEDUÇÃO NO DISCURSO – O PODER DA LINGUAGEM NOS TRIBUNAIS DE JÚRINOS TRIBUNAIS DE JÚRI

CAPITULO I – O Direito de Seduzir e a Sedução noCAPITULO I – O Direito de Seduzir e a Sedução no DireitoDireito

O horizonte temático do presente trabalho é oO horizonte temático do presente trabalho é o discurso jurídico em sua manifestação maisdiscurso jurídico em sua manifestação mais fundamental e antiga: os debates entre promotores efundamental e antiga: os debates entre promotores e advogados, entre defesa e acusação.advogados, entre defesa e acusação.O direito é uma ciência humana, não meramenteO direito é uma ciência humana, não meramente técnica. Conhecer e dominar o Direito não se resumetécnica. Conhecer e dominar o Direito não se resume ao conhecimento das normas, dos ordenamentosao conhecimento das normas, dos ordenamentos jurídicos. Aplicar o Direito não depende apenas dajurídicos. Aplicar o Direito não depende apenas da observância das leis e do estudo das evidencias. Oobservância das leis e do estudo das evidencias. O Direito deve ir além, para praticar Justiça.Direito deve ir além, para praticar Justiça.

Sem duvida, os argumentos do promotor de justiça eSem duvida, os argumentos do promotor de justiça e do advogado de defesa terão caráter decisivo. Odo advogado de defesa terão caráter decisivo. O poder de sedução das partes surge como elementopoder de sedução das partes surge como elemento fundamental para o preenchimento das lacunas dofundamental para o preenchimento das lacunas do Direito e para sua aplicação.Direito e para sua aplicação.Podemos, portanto, conceber o Direito como umaPodemos, portanto, conceber o Direito como uma ciência da argumentação. Advogados e promotoresciência da argumentação. Advogados e promotores devem argumentar em favor da parte quedevem argumentar em favor da parte que representam. Essa é a essência de sua atuação.representam. Essa é a essência de sua atuação.

Utilizamos, no titulo deste trabalho, a palavraUtilizamos, no titulo deste trabalho, a palavra sedução. sedução. O vocábulo traz uma carga de significadoO vocábulo traz uma carga de significado que envolve atração, encanto, fascínio. O processo deque envolve atração, encanto, fascínio. O processo de sedução é um processo de cumplicidade: ao deixar-sesedução é um processo de cumplicidade: ao deixar-se seduzir, aquele que é seduzido recebe algo em troca;seduzir, aquele que é seduzido recebe algo em troca; da mesma forma, ao sedutor parece estar implícitoda mesma forma, ao sedutor parece estar implícito oferecer algo em troca da atenção daquele a quemoferecer algo em troca da atenção daquele a quem

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seduz. A sedução é um processo emocional, nãoseduz. A sedução é um processo emocional, não ocorre por vias do raciocínio puro da demonstração. Oocorre por vias do raciocínio puro da demonstração. O discurso do sedutor não se fundamenta puramentediscurso do sedutor não se fundamenta puramente em argumentos lógicos; recorre a artifícios retóricos eem argumentos lógicos; recorre a artifícios retóricos e visuais a fim de envolver e comover.visuais a fim de envolver e comover.

No discurso de advogados e promotores no TribunalNo discurso de advogados e promotores no Tribunal do Júri, cabe tanto o aspecto reacional quanto odo Júri, cabe tanto o aspecto reacional quanto o emocional. Como pretende demonstrar a presenteemocional. Como pretende demonstrar a presente pesquisa, é o elemento emocional o maiorpesquisa, é o elemento emocional o maior responsável pelo convencimento, aquele queresponsável pelo convencimento, aquele que essencialmente influencia e determina a decisão dosessencialmente influencia e determina a decisão dos jurados. Trata-se, como vem demonstrar o presentejurados. Trata-se, como vem demonstrar o presente trabalho, de um processo de sedução. Aos advogadostrabalho, de um processo de sedução. Aos advogados e promotores cabe envolver e encantar o júri,e promotores cabe envolver e encantar o júri, conduzi-lo a uma determinada posição.conduzi-lo a uma determinada posição.

O discurso jurídico é, por natureza, persuasivo, postoO discurso jurídico é, por natureza, persuasivo, posto que advogados e promotores têm sempre o objetivoque advogados e promotores têm sempre o objetivo de de convencerconvencer seu receptor. Esse discurso persuasivo seu receptor. Esse discurso persuasivo das partes desempenha função essencial para adas partes desempenha função essencial para a aplicação do direito. De certa forma, supera emaplicação do direito. De certa forma, supera em importância os testemunhos e as provas, à medidaimportância os testemunhos e as provas, à medida que conduz com maior facilidade à sua verdade e nãoque conduz com maior facilidade à sua verdade e não à verdade dos autos. O discurso fascina, visa aà verdade dos autos. O discurso fascina, visa a comprometer ideologicamente o receptor.comprometer ideologicamente o receptor.

1.1. Delimitação do Objeto de PesquisaDelimitação do Objeto de Pesquisa

O Direito é uma ciência bastante complexa, que seO Direito é uma ciência bastante complexa, que se manifesta sob diversas formas e divide-se emmanifesta sob diversas formas e divide-se em diversas categorias e sistemas. Portanto, estadiversas categorias e sistemas. Portanto, esta pesquisa buscou seu objeto, o discurso jurídico, empesquisa buscou seu objeto, o discurso jurídico, em

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um campo menos amplo. E encontrou sua primeiraum campo menos amplo. E encontrou sua primeira delimitação ao optar pelo estudo do discurso jurídicodelimitação ao optar pelo estudo do discurso jurídico dentro do Direito Penal.dentro do Direito Penal.

No Direito Penal encontra-se mais evidente o pesoNo Direito Penal encontra-se mais evidente o peso que a sedução pela palavra exerce sobre a decisãoque a sedução pela palavra exerce sobre a decisão final. A aplicação do Direito Penal jamais consegue sefinal. A aplicação do Direito Penal jamais consegue se limitar às provas materiais e técnicas dos casos emlimitar às provas materiais e técnicas dos casos em tela. Depende, acima de tudo, da capacidade detela. Depende, acima de tudo, da capacidade de argumentação das partes. O Direito Penal éargumentação das partes. O Direito Penal é argumentativo em sua própria essência.argumentativo em sua própria essência.

O trabalho que apresentamos a seguir caminhou juntoO trabalho que apresentamos a seguir caminhou junto à hipótese de que a palavra das partes decide muitoà hipótese de que a palavra das partes decide muito mais do que a prova dos autos; na arte domais do que a prova dos autos; na arte do convencimento por meio da sedução, validam-seconvencimento por meio da sedução, validam-se muitos elementos. Cada uma das partes quer provarmuitos elementos. Cada uma das partes quer provar que seu argumento é verdadeiro. Acusação e defesaque seu argumento é verdadeiro. Acusação e defesa têm um trabalho a ser executado: provar se otêm um trabalho a ser executado: provar se o acusado representa ou não risco à sociedade.acusado representa ou não risco à sociedade.

2.2. Sedução, O TemaSedução, O Tema

Nesta parte do livro, o Autor cita a obra Nesta parte do livro, o Autor cita a obra O Beijo daO Beijo da Mulher AranhaMulher Aranha do escritor argentino pós-modernista do escritor argentino pós-modernista Manuel Puig. Chalita faz um comentário detalhadoManuel Puig. Chalita faz um comentário detalhado sobre a obra, com referencia às palavras utilizadas nosobre a obra, com referencia às palavras utilizadas no texto e as usadas nos tribunais. Ele optou por trazertexto e as usadas nos tribunais. Ele optou por trazer esta obra à discussão pelo fato de estar nela ilustradoesta obra à discussão pelo fato de estar nela ilustrado exemplarmente o processo de sedução pela palavra.exemplarmente o processo de sedução pela palavra.

Em o Em o Beijo da Mulher AranhaBeijo da Mulher Aranha ocorre, por força do ocorre, por força do discurso, a aproximação e o choque entre doisdiscurso, a aproximação e o choque entre dois universos pessoais diferentes. Toda a força dramáticauniversos pessoais diferentes. Toda a força dramática e a estrutura da obra se apóiam na profundae a estrutura da obra se apóiam na profunda

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disparidade de sentimentos, crenças e ideais quedisparidade de sentimentos, crenças e ideais que existe entre os personagens da obra.existe entre os personagens da obra.

Percebe-se, pela desenrolar da obra, o quanto estãoPercebe-se, pela desenrolar da obra, o quanto estão distantes, inicialmente, os universos de cadadistantes, inicialmente, os universos de cada personagem. Mesmo assim, apenas pela força dapersonagem. Mesmo assim, apenas pela força da estrutura de seu discurso, Molina consegue fazer comestrutura de seu discurso, Molina consegue fazer com que Valentim ingresse na sua realidade e sofra umaque Valentim ingresse na sua realidade e sofra uma mudança radical em seu comportamento e em suamudança radical em seu comportamento e em sua forma de encarar a realidade. Seu universo muda.forma de encarar a realidade. Seu universo muda. Seduzir é, em certo sentido, desvirtuar. È exatamenteSeduzir é, em certo sentido, desvirtuar. È exatamente isso que Molina faz ao seduzir Valentim. E é também oisso que Molina faz ao seduzir Valentim. E é também o que acontece no Tribunal do Júri: o advogado ouque acontece no Tribunal do Júri: o advogado ou promotor, para convencer os jurados de sua tese,promotor, para convencer os jurados de sua tese, deve transporta-los ao seu imaginário, faze-losdeve transporta-los ao seu imaginário, faze-los enxergar o que ele quer que enxerguem.enxergar o que ele quer que enxerguem.

Vejamos, portanto, como se dá esse lento e gradualVejamos, portanto, como se dá esse lento e gradual processo de mudança de atitude em processo de mudança de atitude em O beijo daO beijo da Mulher Aranha.Mulher Aranha.

O estimulo dos sentidosO estimulo dos sentidos

O primeiro ponto que nos parece característico eO primeiro ponto que nos parece característico e essencial do discurso que vise à sedução são a suaessencial do discurso que vise à sedução são a sua comunicação direcionada fundamentalmente aoscomunicação direcionada fundamentalmente aos sentidos e aos sentimentos, e não à razão. Destasentidos e aos sentimentos, e não à razão. Desta forma, o discurso sedutor não respeitaforma, o discurso sedutor não respeita necessariamente aos padrões da lógica formal, poisnecessariamente aos padrões da lógica formal, pois não visa à demonstração e sim a influencia pura enão visa à demonstração e sim a influencia pura e simples. Deve ser um discurso agradável, comsimples. Deve ser um discurso agradável, com palavras carregadas de poesia e sentidos ambíguos.palavras carregadas de poesia e sentidos ambíguos. Não deve demonstrar preocupação com a concisão eNão deve demonstrar preocupação com a concisão e a objetividade; ao contrario, deve ser subjetivo ea objetividade; ao contrario, deve ser subjetivo e estender-se ao tempo que for necessário à exposiçãoestender-se ao tempo que for necessário à exposição mais rebuscada e ornamental possível daquilo quemais rebuscada e ornamental possível daquilo que

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esta sendo dito. Deve ter mais sonoridade do queesta sendo dito. Deve ter mais sonoridade do que concatenação.concatenação.

O poder da imaginaçãoO poder da imaginação

Não só o estimulo aos sentidos e sentimentos éNão só o estimulo aos sentidos e sentimentos é necessário ao discurso sedutor, como também onecessário ao discurso sedutor, como também o estimulo à imaginação do receptor. Na utilização dasestimulo à imaginação do receptor. Na utilização das palavras com o fim de seduzir, o emissor devepalavras com o fim de seduzir, o emissor deve procurar ordena-las e dar-lhes forma que leve oprocurar ordena-las e dar-lhes forma que leve o receptor a recriar em sua mente aquilo que ouve. Oreceptor a recriar em sua mente aquilo que ouve. O desafio daquele que busca seduzir pelo discursodesafio daquele que busca seduzir pelo discurso consiste em fazer das palavras imagens, o que éconsiste em fazer das palavras imagens, o que é obtido por meio de detalhadas descrições.obtido por meio de detalhadas descrições.

A linguagem A linguagem kitschkitsch

A linguagem utilizada por Molina é bastante coloquial,A linguagem utilizada por Molina é bastante coloquial, algumas vezes chula e, não por acaso, algumas vezes chula e, não por acaso, kitsch. kitsch. NissoNisso reside um pouco do charme sedutor que a narrativareside um pouco do charme sedutor que a narrativa contem. O contem. O kitsch kitsch é algo profundamente ligado aoé algo profundamente ligado ao repertorio sentimental do homem latino. Asrepertorio sentimental do homem latino. As telenovelas, tão populares, e os filmes do espanholtelenovelas, tão populares, e os filmes do espanhol Pedro Almodóvar corrobam essa visão. O Pedro Almodóvar corrobam essa visão. O kitsch kitsch é a é a linguagem ideal do discurso sedutor, pois não busca alinguagem ideal do discurso sedutor, pois não busca a atenção da razão do receptor e trabalha com símbolosatenção da razão do receptor e trabalha com símbolos e elementos familiares, facilmente identificáveis.e elementos familiares, facilmente identificáveis.

Identificação e aproximaçãoIdentificação e aproximação

Na estratégia que Molina estabelece para construirNa estratégia que Molina estabelece para construir seu discurso por meio da narração de filmes, oseu discurso por meio da narração de filmes, o primeiro filme contado é verdadeiro. Trata-se de primeiro filme contado é verdadeiro. Trata-se de CatCat PeoplePeople, um clássico filme americano, refilmado em, um clássico filme americano, refilmado em

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1982 com o mesmo titulo (em português: 1982 com o mesmo titulo (em português: A Marca daA Marca da Pantera,Pantera,disponível em vídeo pela CIC Vídeo). Édisponível em vídeo pela CIC Vídeo). É interessante notar que o envolvimento do receptor seinteressante notar que o envolvimento do receptor se dá por meio da identificação com os personagens.dá por meio da identificação com os personagens. Valentim se interessa e se envolve com o que ouve aoValentim se interessa e se envolve com o que ouve ao enxergar sua namorada em um dos personagens daenxergar sua namorada em um dos personagens da trama narrada por Molina. Seu interesse vem dotrama narrada por Molina. Seu interesse vem do estabelecimento de uma relação entre o discursoestabelecimento de uma relação entre o discurso recebido e sua realidade pessoal. Marcamos aqui umrecebido e sua realidade pessoal. Marcamos aqui um terceiro ponto fundamental do discurso sedutor: eleterceiro ponto fundamental do discurso sedutor: ele deve promover, simbolicamente, a identificação dodeve promover, simbolicamente, a identificação do receptor com aquilo que é transmitido. O conteúdoreceptor com aquilo que é transmitido. O conteúdo deve conter algo com que o receptor possa sedeve conter algo com que o receptor possa se identificar, uma situação na qual ele possa seidentificar, uma situação na qual ele possa se imaginar.imaginar.

Esse processo, que permite ao receptor se identificarEsse processo, que permite ao receptor se identificar com a mensagem do discurso, é muito importantecom a mensagem do discurso, é muito importante dentro do Tribunal do Júri. Para que o júri declaredentro do Tribunal do Júri. Para que o júri declare inocente o réu, o advogado deve promover ainocente o réu, o advogado deve promover a identificação entre cada um dos jurados e seu cliente.identificação entre cada um dos jurados e seu cliente. Da mesma forma, cabe ao promotor fazer os juradosDa mesma forma, cabe ao promotor fazer os jurados se identificarem com a vitima e seus familiares, parase identificarem com a vitima e seus familiares, para que, desta forma, condenem o réu.que, desta forma, condenem o réu.

As mensagens implícitasAs mensagens implícitas

Ao contar um segundo filme, Molina inventa umaAo contar um segundo filme, Molina inventa uma narrativa sobre uma cantora francesa que senarrativa sobre uma cantora francesa que se apaixona por um soldado alemão em plena guerra. Aapaixona por um soldado alemão em plena guerra. A trama que Molina inventa nesse ponto é mais umatrama que Molina inventa nesse ponto é mais uma evidencia de sua estratégia sedutora. Implicitamente,evidencia de sua estratégia sedutora. Implicitamente, ao contar a historia de amor entre a francesa e oao contar a historia de amor entre a francesa e o nazista, o que Molina esta buscando é demonstrarnazista, o que Molina esta buscando é demonstrar para Valentim que duas pessoas completamentepara Valentim que duas pessoas completamente diferentes podem se amar. Trata-se de umadiferentes podem se amar. Trata-se de uma

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mensagem implícita. Aquilo que poderia ser feito pormensagem implícita. Aquilo que poderia ser feito por meio da demonstração, por meio de argumentosmeio da demonstração, por meio de argumentos lógicos que sustentassem a tese, é feito por meio delógicos que sustentassem a tese, é feito por meio de uma narrativa em que a tese está implícita. Auma narrativa em que a tese está implícita. A narrativa é a própria argumentação. É umanarrativa é a própria argumentação. É uma mensagem trabalhada por Molina para convencermensagem trabalhada por Molina para convencer Valentim, seduzi-lo a aceitar a conjunção carnal comValentim, seduzi-lo a aceitar a conjunção carnal com ele. Trata-se de mais uma das “ferramentas” doele. Trata-se de mais uma das “ferramentas” do discurso de sedução.discurso de sedução.

Conhecimento do universo pessoal do receptorConhecimento do universo pessoal do receptor

O filme seguinte também é escolhido por Molina comO filme seguinte também é escolhido por Molina com um propósito bastante especifico. Trata-se de umum propósito bastante especifico. Trata-se de um filme no qual a personagem central é um jovemfilme no qual a personagem central é um jovem burguês de idéias revolucionarias, que abandona suaburguês de idéias revolucionarias, que abandona sua vida de conforto e luxo para se juntar a terroristas.vida de conforto e luxo para se juntar a terroristas. Um filme político, portanto, que deveria agradar aoUm filme político, portanto, que deveria agradar ao gosto de Valentim. Molina tenta politizar asgosto de Valentim. Molina tenta politizar as personagens para faze-las mais próximas de Valentimpersonagens para faze-las mais próximas de Valentim e atrair a sua atenção. Aplica na pratica, no discurso,e atrair a sua atenção. Aplica na pratica, no discurso, o conhecimento que já possui sobre a personalidade eo conhecimento que já possui sobre a personalidade e o repertorio de Valentim, seu receptor. Há umao repertorio de Valentim, seu receptor. Há uma hibridização da linguagem, que Molina usa inventandohibridização da linguagem, que Molina usa inventando cenas a partir do conhecimento da personalidade decenas a partir do conhecimento da personalidade de Valentim, para objetivo de sedução. Modifica aValentim, para objetivo de sedução. Modifica a narrativa para adaptar o discurso.narrativa para adaptar o discurso.

O resultado é que, de todas as tramas contadas porO resultado é que, de todas as tramas contadas por Molina, essa é a que menos conquista a atenção deMolina, essa é a que menos conquista a atenção de Valentim. O que atrai, o que seduz, parece nunca serValentim. O que atrai, o que seduz, parece nunca ser aquilo que é semelhante. O velho ditame popularaquilo que é semelhante. O velho ditame popular sobre a tração dos opostos parece ser mais uma vezsobre a tração dos opostos parece ser mais uma vez corrobado. O discurso, se quiser seduzir, devecorrobado. O discurso, se quiser seduzir, deve oferecer ao receptor algo diferente do seu repertorio.oferecer ao receptor algo diferente do seu repertorio.

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Nesse sentido, faz-se necessário que o emissorNesse sentido, faz-se necessário que o emissor conheça o universo pessoal do receptor.conheça o universo pessoal do receptor.

O desfechoO desfecho

Na narrativa do ultimo filme, o envolvimento total deNa narrativa do ultimo filme, o envolvimento total de Molina sobre Valentim, afinal, acontece. O temaMolina sobre Valentim, afinal, acontece. O tema escolhido é uma aventura no Haiti, um ambiente queescolhido é uma aventura no Haiti, um ambiente que contempla rituais vodus, a exploração dos negros e acontempla rituais vodus, a exploração dos negros e a recompensa amorosa e carnal. Valentim, ao ouvi-la,recompensa amorosa e carnal. Valentim, ao ouvi-la, esta agora exclusivamente preocupado com o prazer,esta agora exclusivamente preocupado com o prazer, com a emoção. com a emoção. O Beijo da Mulher Aranha O Beijo da Mulher Aranha constrói-se constrói-se sob o signo da teia. O trabalho de Molina para seduzirsob o signo da teia. O trabalho de Molina para seduzir Valentim, envolve-lo em sua teia, é um trabalho deValentim, envolve-lo em sua teia, é um trabalho de minúcias, visando a um objetivo. Assim como a teiaminúcias, visando a um objetivo. Assim como a teia de seu discurso envolve seu companheiro de cela,de seu discurso envolve seu companheiro de cela, também o discurso dos advogados e promotores notambém o discurso dos advogados e promotores no Tribunal do Júri deve envolver os jurados em sua teia,Tribunal do Júri deve envolver os jurados em sua teia, minuciosamente construída, de gestos, palavras,minuciosamente construída, de gestos, palavras, inflexões e argumentos.inflexões e argumentos.

CAPITULO II – A Vida Desfila Diante do JúriCAPITULO II – A Vida Desfila Diante do Júri

Selecionamos alguns filmes para evidenciar exemplosSelecionamos alguns filmes para evidenciar exemplos da sedução em tribunais de júri. São todos norte-da sedução em tribunais de júri. São todos norte-americanos, por razoes facilmente explicáveis.americanos, por razoes facilmente explicáveis. Escolhemos os filmes norte-americanos porqueEscolhemos os filmes norte-americanos porque observamos que a sedução é um elemento com o queobservamos que a sedução é um elemento com o que os diretores daquele país fazem questão de trabalhar,os diretores daquele país fazem questão de trabalhar, o que reforça de certa forma a nossa tese, que não éo que reforça de certa forma a nossa tese, que não é propriamente a analise dos meandros dopropriamente a analise dos meandros do procedimento do processo penal, mas a analise daprocedimento do processo penal, mas a analise da sedução dentro desse mesmo processo penal.sedução dentro desse mesmo processo penal.

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Evidentemente, há diferenças enormes entre oEvidentemente, há diferenças enormes entre o processo penal brasileiro e o americano. Entretanto,processo penal brasileiro e o americano. Entretanto, essas diferenças não são significativas para o nossoessas diferenças não são significativas para o nosso intento, pois a discussão promovida pelo presenteintento, pois a discussão promovida pelo presente trabalho, embora coteje a âmbito jurídico, privilegia otrabalho, embora coteje a âmbito jurídico, privilegia o aspecto sedutor da linguagem, que se manifesta deaspecto sedutor da linguagem, que se manifesta de forma bastante evidente na retórica dessesforma bastante evidente na retórica desses advogados e promotores da ficção. Mas o estudoadvogados e promotores da ficção. Mas o estudo desses filmes nos permite evidenciar de forma maisdesses filmes nos permite evidenciar de forma mais clara a performance de advogados e promotores noclara a performance de advogados e promotores no plenário e os recursos retóricos, que são os mesmos,plenário e os recursos retóricos, que são os mesmos, seja no direito brasileiro ou no americano, dos quaisseja no direito brasileiro ou no americano, dos quais eles se valem para seduzir os jurados. Sedução háeles se valem para seduzir os jurados. Sedução há onde há discurso, Brasil, Estados Unidos ou qualqueronde há discurso, Brasil, Estados Unidos ou qualquer outro país em que pessoas tenham a possibilidade deoutro país em que pessoas tenham a possibilidade de decidir ouvindo argumentos de outras.decidir ouvindo argumentos de outras.

EXEMPLO 1EXEMPLO 1

Filme: Filme: Tempo de MatarTempo de Matar, baseado em livro de John, baseado em livro de John Grisham. Direção de Joel Schumacher. Grisham. Direção de Joel Schumacher. Atores: SandraAtores: Sandra Bullock, Samuel L. Jackson, Mathew McConaughey eBullock, Samuel L. Jackson, Mathew McConaughey e Kevin Spacey. Kevin Spacey. Estados Unidos, 1996. Disponível emEstados Unidos, 1996. Disponível em vídeo pela Warner Vídeo.vídeo pela Warner Vídeo.

Enredo: Enredo: Dois jovens brancos, num bairro onde aDois jovens brancos, num bairro onde a maioria dos moradores é negra, os jovens agemmaioria dos moradores é negra, os jovens agem grosseiramente e saem alcoolizados dirigindo umagrosseiramente e saem alcoolizados dirigindo uma camioneta. Numa certa altura da estrada elescamioneta. Numa certa altura da estrada eles deparam com uma menina negra de 10 anos. Eles pordeparam com uma menina negra de 10 anos. Eles por brincadeira, atiram uma lata de cerveja na cabeça dabrincadeira, atiram uma lata de cerveja na cabeça da menina que desmaia. A tomada seguinte mostra amenina que desmaia. A tomada seguinte mostra a menina sendo amarrada e estuprada e depoismenina sendo amarrada e estuprada e depois pendurada num galho de uma arvore. O pai épendurada num galho de uma arvore. O pai é chamado no trabalho, chega em casa e encontra achamado no trabalho, chega em casa e encontra a

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menina muita ferida. O xerife, também um negro,menina muita ferida. O xerife, também um negro, localiza a camionete, encontra um dos sapatos nalocaliza a camionete, encontra um dos sapatos na carroceria e prende os dois jovens.carroceria e prende os dois jovens.

O pai procura um advogado, branco, e pergunta a eleO pai procura um advogado, branco, e pergunta a ele se ele lhe ajudara, o amigo pergunta porque, o paise ele lhe ajudara, o amigo pergunta porque, o pai somente faz uma nova pergunta: “Você tem umasomente faz uma nova pergunta: “Você tem uma filha, Jake. O que você faria?” Os dois jovens sãofilha, Jake. O que você faria?” Os dois jovens são retirados da cadeia para a audiência preliminar eretirados da cadeia para a audiência preliminar e quando entram no Tribunal, o pai aparece com umquando entram no Tribunal, o pai aparece com um rifle e atira nos dois jovens, matando-os na frente derifle e atira nos dois jovens, matando-os na frente de todo mundo, e depois foge. Mais tarde ele se entregatodo mundo, e depois foge. Mais tarde ele se entrega ao xerife. O caso então repercute na cidade umaao xerife. O caso então repercute na cidade uma discussão racial, os brancos querem a pena de mortediscussão racial, os brancos querem a pena de morte para o pai, os negros querem que ele seja absolvido.para o pai, os negros querem que ele seja absolvido. O advogado tenta a mudança de foro mas nãoO advogado tenta a mudança de foro mas não consegue, passa a sofrer pressão da populaçãoconsegue, passa a sofrer pressão da população branca, muda à alegação então para insanidadebranca, muda à alegação então para insanidade mental temporária causada por forte comoção,mental temporária causada por forte comoção, estabelece-se uma disputa pessoal entre o advogadoestabelece-se uma disputa pessoal entre o advogado e o procurador encarregado da acusação.e o procurador encarregado da acusação.

Se Carl Lee (pai) for condenado, a Justiça prevalecera,Se Carl Lee (pai) for condenado, a Justiça prevalecera, ele tomou a justiça em suas próprias mãos eele tomou a justiça em suas próprias mãos e assassinou duas pessoas. Se Carl Lee for absolvido, aassassinou duas pessoas. Se Carl Lee for absolvido, a justiça prevalecera, ele matou dois homens quejustiça prevalecera, ele matou dois homens que estupraram barbaramente sua filha de 10 anos deestupraram barbaramente sua filha de 10 anos de idade e que, possivelmente, dada à estatística deidade e que, possivelmente, dada à estatística de casos anteriores, seriam libertados para cometercasos anteriores, seriam libertados para cometer crimes semelhantes. Durante o julgamento, no seucrimes semelhantes. Durante o julgamento, no seu discurso final, o advogado de defesa (Jake) pede aodiscurso final, o advogado de defesa (Jake) pede ao júri que feche os olhos e então ele conta uma historiajúri que feche os olhos e então ele conta uma historia parecida com o que aconteceu com a menina negra,parecida com o que aconteceu com a menina negra, mas no final ele pede para os jurados (que são namas no final ele pede para os jurados (que são na maioria brancos) que imaginem que essa menina damaioria brancos) que imaginem que essa menina da historia é branca.historia é branca.

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Considerações deste trabalho acerca do filmeConsiderações deste trabalho acerca do filme

No filme No filme Tempo de Matar, Tempo de Matar, a defesa aliou uma defesa aliou um pronunciamento pautado pela intenção depronunciamento pautado pela intenção de proximidade com cada um dos jurados, trabalhandoproximidade com cada um dos jurados, trabalhando um crescendo de emotividade, ate eclodir no impactoum crescendo de emotividade, ate eclodir no impacto de fazer com que a situação narrada, subitamente,de fazer com que a situação narrada, subitamente, pudesse fazer parte intima da vida dos jurados. Apudesse fazer parte intima da vida dos jurados. A incitação, “agora imaginem que ela é branca”,incitação, “agora imaginem que ela é branca”, despertou, seguramente, dois sentimentos diferentes,despertou, seguramente, dois sentimentos diferentes, mas igualmente demolidores. Para os brancos, omas igualmente demolidores. Para os brancos, o impacto do constrangimento. Para os negros, oimpacto do constrangimento. Para os negros, o impacto da humilhação. Sentimentos queimpacto da humilhação. Sentimentos que forçosamente os dois lados repudiam e repelem. Noforçosamente os dois lados repudiam e repelem. No filme colocado como exemplo, estabelecido o climafilme colocado como exemplo, estabelecido o clima favorável, por meio do uso da pausa, do silênciofavorável, por meio do uso da pausa, do silêncio cúmplice, o advogado Jack Brigance desfechou acúmplice, o advogado Jack Brigance desfechou a conclusão que apanhou desprevenido o júri e oconclusão que apanhou desprevenido o júri e o confundiu. E, confundindo-o, seduziu-o e manipulou-o.confundiu. E, confundindo-o, seduziu-o e manipulou-o.

RacismoRacismo

Apenas para complementar a questão racial abordadaApenas para complementar a questão racial abordada no filme, vamos nos reportar ao recente julgamentono filme, vamos nos reportar ao recente julgamento do jogador de futebol americano O. J. Simpson. Preso,do jogador de futebol americano O. J. Simpson. Preso, Simpson foi a julgamento e acabou consideradoSimpson foi a julgamento e acabou considerado inocente, mas obrigado a pagar uma multa imensa àinocente, mas obrigado a pagar uma multa imensa à família da esposa e do amante. Decisão contestadafamília da esposa e do amante. Decisão contestada largamente pela opinião publica e pela imprensalargamente pela opinião publica e pela imprensa norte-americana. Perguntar-se-á, adiante nestenorte-americana. Perguntar-se-á, adiante neste trabalho, que influencia terão sobre as decisões dotrabalho, que influencia terão sobre as decisões do júri as contingências de raça, sexo, região ou etnia.júri as contingências de raça, sexo, região ou etnia. Detalharemos, oportunamente, estas questões.Detalharemos, oportunamente, estas questões.

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EXEMPLO 2EXEMPLO 2

Filme: Filme: Filadélfia,Filadélfia, dirigidodirigido por Jonathan Demme. por Jonathan Demme. Atores: Tom Hanks, Denzel Washington, JasonAtores: Tom Hanks, Denzel Washington, Jason Robards, Mary Steenburgen, Antonio Bandeiras.Robards, Mary Steenburgen, Antonio Bandeiras. Estados Unidos, 1993. Disponível em vídeo pela AbrilEstados Unidos, 1993. Disponível em vídeo pela Abril Vídeo.Vídeo.

Enredo: Enredo: Um jovem advogado é demitido da firma deUm jovem advogado é demitido da firma de advocacia em que trabalhava sob alegação deadvocacia em que trabalhava sob alegação de incompetência, mas sabe que a verdadeira razão éincompetência, mas sabe que a verdadeira razão é porque tem Aids. Determinado a defender suaporque tem Aids. Determinado a defender sua dignidade e reputação profissional, Andrew Beckettdignidade e reputação profissional, Andrew Beckett contrata outro advogado, Joe Miller, para processar oscontrata outro advogado, Joe Miller, para processar os patrões por demissão injusta. Joe reluta em aceitar opatrões por demissão injusta. Joe reluta em aceitar o caso, apesar de ter crescido conhecendo as dores docaso, apesar de ter crescido conhecendo as dores do preconceito racial, o advogado negro nunca tinhapreconceito racial, o advogado negro nunca tinha antes encarado seus próprios preconceitos contra oantes encarado seus próprios preconceitos contra o homossexualismo e a Aids. Os dois iniciam uma lutahomossexualismo e a Aids. Os dois iniciam uma luta intensa contra a intolerância e a ignorância daintensa contra a intolerância e a ignorância da sociedade. Andrew Beckett prossegue com ação, massociedade. Andrew Beckett prossegue com ação, mas morre antes do final. O veredicto é dado pouco tempomorre antes do final. O veredicto é dado pouco tempo depois, dando-lhe ganho de causa e aplicando umadepois, dando-lhe ganho de causa e aplicando uma multa de mais de 4 milhões de dólares contra amulta de mais de 4 milhões de dólares contra a empresa.empresa.

Considerações deste trabalho acerca do filmeConsiderações deste trabalho acerca do filme

A inclusão do filme A inclusão do filme FiladélfiaFiladélfia neste trabalho vem a neste trabalho vem a propósito de questionar a qualidade e isenção de umpropósito de questionar a qualidade e isenção de um júri, no julgamento de um dos primeiros casos dejúri, no julgamento de um dos primeiros casos de discriminação contra um portador do vírus da Aids, ediscriminação contra um portador do vírus da Aids, e que, na época do filme, já se havia transformado emque, na época do filme, já se havia transformado em

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símbolo do preconceito contra o homossexualismo. Ossímbolo do preconceito contra o homossexualismo. Os trechos selecionados no filme de exemplo, nestetrechos selecionados no filme de exemplo, neste trabalho, privilegiam momentos dos questionamentostrabalho, privilegiam momentos dos questionamentos e dos debates que contribuíram para mascarar oue dos debates que contribuíram para mascarar ou desmascarar idéias preconcebidas e que poderiamdesmascarar idéias preconcebidas e que poderiam atuar como filtros para a decisão imparcial do corpoatuar como filtros para a decisão imparcial do corpo de jurados. E que os promotores ou advogados,de jurados. E que os promotores ou advogados, conhecendo as fraquezas do corpo de jurados,conhecendo as fraquezas do corpo de jurados, utilizam para seduzi-los e faze-los tomar atitudes nautilizam para seduzi-los e faze-los tomar atitudes na direção que preferem.direção que preferem.

EXEMPLO 3EXEMPLO 3

Filme: Filme: Questão de Honra.Questão de Honra. Direção de Rob Reiner. Direção de Rob Reiner. Atores: Jack Nicholson, Tom Cruise, Demi Moore.Atores: Jack Nicholson, Tom Cruise, Demi Moore. Estados Unidos, 1993. Disponível em vídeo pela LK-Estados Unidos, 1993. Disponível em vídeo pela LK-TEL.TEL.

Enredo: Enredo: Um soldado foi morto na base naval norte-Um soldado foi morto na base naval norte-americana de Quantánamo, Cuba, durante um turnoamericana de Quantánamo, Cuba, durante um turno de vigília, à noite. Dois outros soldados são acusados.de vigília, à noite. Dois outros soldados são acusados. Um tenente, Daniel Kaffe, é indicado para a defesaUm tenente, Daniel Kaffe, é indicado para a defesa dos dois soldados acusados. Durante as investigaçõesdos dois soldados acusados. Durante as investigações são descobertos indícios de que o comando da basesão descobertos indícios de que o comando da base estaria ocultando o que verdadeiramente aconteceu.estaria ocultando o que verdadeiramente aconteceu. Verificou-se, por meio de vários depoimentos, que osVerificou-se, por meio de vários depoimentos, que os soldados eram forçados a obedecer às ordenssoldados eram forçados a obedecer às ordens superiores acima de qualquer coisa, às vezes acimasuperiores acima de qualquer coisa, às vezes acima da própria dignidade. Auxiliado por uma oficial dada própria dignidade. Auxiliado por uma oficial da Marinha, o tenente Kaffee descobre que existe umMarinha, o tenente Kaffee descobre que existe um “código vermelho” na base, funcionando como uma“código vermelho” na base, funcionando como uma espécie de manual paralelo, que manda que soldadosespécie de manual paralelo, que manda que soldados que tenham cometido quaisquer falta contra aque tenham cometido quaisquer falta contra a

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disciplina, ética ou o assim chamado código de honradisciplina, ética ou o assim chamado código de honra do batalhão sejam punidos pelos própriosdo batalhão sejam punidos pelos próprios companheiros, a mando dos oficiais e sob a imposiçãocompanheiros, a mando dos oficiais e sob a imposição do general comandante. Por seu lado, os soldadosdo general comandante. Por seu lado, os soldados enviados para aplicar a punição não podiam recusar aenviados para aplicar a punição não podiam recusar a tarefa, ou seriam considerados passiveis de puniçãotarefa, ou seriam considerados passiveis de punição parecida com a que deveriam infligir.parecida com a que deveriam infligir.

Kaffee e sua auxiliar tentam de tudo para conseguirKaffee e sua auxiliar tentam de tudo para conseguir que os acusados denunciem o comandante. Quase noque os acusados denunciem o comandante. Quase no final do julgamento, pronto para desistir, teve umafinal do julgamento, pronto para desistir, teve uma idéia e resolve chamar para depor o generalidéia e resolve chamar para depor o general comandante. Trava-se então uma luta verbal perigosacomandante. Trava-se então uma luta verbal perigosa para o tenente, que começa a insinuar acusaçõespara o tenente, que começa a insinuar acusações contra o general. No inicio tolerante, o general vaicontra o general. No inicio tolerante, o general vai cedendo as instigações do tenente, e usando de suacedendo as instigações do tenente, e usando de sua patente, esbraveja, tentando submeter o tenente apatente, esbraveja, tentando submeter o tenente a obediência militar que ele fazia imperar dentro daobediência militar que ele fazia imperar dentro da base. O processo de sedução aplicado pelo tenentebase. O processo de sedução aplicado pelo tenente Kaffee é tão ardiloso e envolvente que o comandanteKaffee é tão ardiloso e envolvente que o comandante acaba confessando, muito menos por consciência deacaba confessando, muito menos por consciência de culpa do que por imaginar-se inatingível. O recursoculpa do que por imaginar-se inatingível. O recurso utilizado pelo advogado é o de se aproveitar doutilizado pelo advogado é o de se aproveitar do temperamento do comandante e conduzir seutemperamento do comandante e conduzir seu discurso de forma a irrita-lo. O general é enganadodiscurso de forma a irrita-lo. O general é enganado pelo discurso hábil do advogado, apanhado empelo discurso hábil do advogado, apanhado em flagrante confissão, é preso ali mesmo, e os doisflagrante confissão, é preso ali mesmo, e os dois soldados obtêm atenuantes para a pena, uma vez quesoldados obtêm atenuantes para a pena, uma vez que haviam agido sob ordens superiores e sob coação.haviam agido sob ordens superiores e sob coação.

Considerações deste trabalho acerca do filmeConsiderações deste trabalho acerca do filme

O que buscamos extrair do filme O que buscamos extrair do filme Questão de HonraQuestão de Honra foram os momentos de sedução pelas palavras, aforam os momentos de sedução pelas palavras, a preocupação da defesa de impressionar, desta oupreocupação da defesa de impressionar, desta ou

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daquela forma, o corpo de jurados. Como veremos,daquela forma, o corpo de jurados. Como veremos, adiante, as palavras vêm sempre acompanhadas deadiante, as palavras vêm sempre acompanhadas de um contexto físico, ambiental e, na maior parte dasum contexto físico, ambiental e, na maior parte das vezes, emocional.vezes, emocional.

EXEMPLO 4EXEMPLO 4

Filme: Filme: Assassinato em Primeiro Grau. Assassinato em Primeiro Grau. Baseado emBaseado em fato real. Direção de Marc Rocco. fato real. Direção de Marc Rocco. Atores: ChristianAtores: Christian Slater, Kevin Bacon, Gary Oldman, Brad Douriff.Slater, Kevin Bacon, Gary Oldman, Brad Douriff. Estados Unidos, 1994. Disponível em vídeo pela AbrilEstados Unidos, 1994. Disponível em vídeo pela Abril Vídeo.Vídeo.

Enredo: Enredo: Henri Young é um jovem que rouba cincoHenri Young é um jovem que rouba cinco dólares de uma loja que, funcionava também comodólares de uma loja que, funcionava também como correio, e roubar correio nos Estados Unidos, écorreio, e roubar correio nos Estados Unidos, é considerado crime federal. Ele acaba preso econsiderado crime federal. Ele acaba preso e condenado e seu destino é Alcatraz, cujo diretor agecondenado e seu destino é Alcatraz, cujo diretor age de modo cruel com os presos. Young tenta fugir e porde modo cruel com os presos. Young tenta fugir e por isso, é mandando para a solitária por três anos (sendoisso, é mandando para a solitária por três anos (sendo que a lei só permite 19 dias). Na solitária ele éque a lei só permite 19 dias). Na solitária ele é surrado diariamente pelo próprio diretor que o deixasurrado diariamente pelo próprio diretor que o deixa aleijado, diante desta situação ele começa a cultivaraleijado, diante desta situação ele começa a cultivar um ódio mortal pelo colega de cela que o delatou. Aoum ódio mortal pelo colega de cela que o delatou. Ao sair da solitária, Young se vinga assassinando osair da solitária, Young se vinga assassinando o delator durante o horário de almoço, na frente de 200delator durante o horário de almoço, na frente de 200 testemunhas. Sua vida fica então nas mãos do jovemtestemunhas. Sua vida fica então nas mãos do jovem advogado James Stamphill, que durante o caso vaiadvogado James Stamphill, que durante o caso vai descobrindo as barbaridades cometidas pelo diretordescobrindo as barbaridades cometidas pelo diretor contra os presos.contra os presos.

Henri Young foi declarado culpado de homicídioHenri Young foi declarado culpado de homicídio involuntário e condenado a cumprir mais três anos deinvoluntário e condenado a cumprir mais três anos de

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pena em Alcatraz. O júri recomendou aindapena em Alcatraz. O júri recomendou ainda investigações no sistema prisional. Variasinvestigações no sistema prisional. Varias irregularidades foram descobertas e o diretor foiirregularidades foram descobertas e o diretor foi exonerado. As solitárias foram seladas e nunca maisexonerado. As solitárias foram seladas e nunca mais utilizadas ate o fechamento de Alcatraz, em 1963.utilizadas ate o fechamento de Alcatraz, em 1963. Henri Young foi encontrado morto em sua cela, diasHenri Young foi encontrado morto em sua cela, dias antes da apelação, nunca se soube quem o matou.antes da apelação, nunca se soube quem o matou.

Considerações deste trabalho acerca deste filmeConsiderações deste trabalho acerca deste filme

A importância da utilização deste filme como exemploA importância da utilização deste filme como exemplo reside no fato de que a sedução, aqui, foi voltada parareside no fato de que a sedução, aqui, foi voltada para a discussão de uma cultura cristalizada envolvendo aa discussão de uma cultura cristalizada envolvendo a impressão que a população norte-americana tinhaimpressão que a população norte-americana tinha sobre o seu sistema prisional. O advogado, com muitasobre o seu sistema prisional. O advogado, com muita habilidade e ainda mais sorte, optou por aplicar umhabilidade e ainda mais sorte, optou por aplicar um esforço de envolvimento da comunidade como umesforço de envolvimento da comunidade como um todo, e não apenas o júri. Foi dessa maneira quetodo, e não apenas o júri. Foi dessa maneira que acabou por seduzir o júri, que se rendeu a umaacabou por seduzir o júri, que se rendeu a uma comoção explicita no grupo social que o cercava.comoção explicita no grupo social que o cercava. Ganhou dimensão nacional o caso, e a repercussão,Ganhou dimensão nacional o caso, e a repercussão, que acabava por chegar aos ouvidos dos juradosque acabava por chegar aos ouvidos dos jurados influenciou na decisão dos integrantes. Os exemplosinfluenciou na decisão dos integrantes. Os exemplos selecionados apóiam nossa tese à exaustão, e nãoselecionados apóiam nossa tese à exaustão, e não estão distantes do que ocorre diariamente numestão distantes do que ocorre diariamente num tribunal de júri real. Como poderá ser facilmentetribunal de júri real. Como poderá ser facilmente comprovado pelo caso brasileiro que detalhamos nocomprovado pelo caso brasileiro que detalhamos no capitulo que se segue.capitulo que se segue.

CAPITULO III – Um Caso BrasileiroCAPITULO III – Um Caso Brasileiro

Dando continuidade à coleta de exemplos queDando continuidade à coleta de exemplos que possam corrobar nossa hipótese sobre a importânciapossam corrobar nossa hipótese sobre a importância

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fundamental da sedução no Tribunal de Júri, segue-sefundamental da sedução no Tribunal de Júri, segue-se a transcrição do julgamento realizado no Foroa transcrição do julgamento realizado no Foro Regional de Pinheiros, no dia 09 de novembro deRegional de Pinheiros, no dia 09 de novembro de 1994, presidido pelo juiz de direito presidente, Sergio1994, presidido pelo juiz de direito presidente, Sergio Rui da Fonseca. O processo foi o de numero 552/90. ORui da Fonseca. O processo foi o de numero 552/90. O réu, Nivaldo Jose Silva. Atuou como promotora deréu, Nivaldo Jose Silva. Atuou como promotora de justiça Eloísa de Souza Arruda Mendes Damasceno, ejustiça Eloísa de Souza Arruda Mendes Damasceno, e como advogado de defesa André Veras Garcia.como advogado de defesa André Veras Garcia.

Resumo do julgamentoResumo do julgamento

O juiz presidente inicia os trabalhos com a formaçãoO juiz presidente inicia os trabalhos com a formação do júri, são sorteados sete jurados (cinco mulheres edo júri, são sorteados sete jurados (cinco mulheres e dois homens), todos aceitos pela defesa e acusação.dois homens), todos aceitos pela defesa e acusação. O juiz presidente faz com que o réu, algemado, seO juiz presidente faz com que o réu, algemado, se aproxime da banca, comunica-lhe que é obrigado aaproxime da banca, comunica-lhe que é obrigado a responder às perguntas que lhe serão feitas e que, seresponder às perguntas que lhe serão feitas e que, se decidir ficar em silêncio, esse direito lhe é facultado.decidir ficar em silêncio, esse direito lhe é facultado. O juiz sumariza a acusação:O juiz sumariza a acusação:

SUMARIOSUMARIO“Consta dos autos que, no dia 22 de agosto de 1990,“Consta dos autos que, no dia 22 de agosto de 1990, por volta das 15 horas, na Rua Fragata dapor volta das 15 horas, na Rua Fragata da Constituição, na cidade de São Paulo, o senhorConstituição, na cidade de São Paulo, o senhor desfechou um projétil de arma de fogo contra Edsondesfechou um projétil de arma de fogo contra Edson de Souza Lopes, produzindo-lhe lesões corporais quede Souza Lopes, produzindo-lhe lesões corporais que foram à causa de sua morte. Segundo o apurado, aforam à causa de sua morte. Segundo o apurado, a vitima era credora do senhor na quantia de CR$vitima era credora do senhor na quantia de CR$ 15.000,00. No dia dos fatos, a vitima foi à residência15.000,00. No dia dos fatos, a vitima foi à residência do senhor, disposta a receber seu crédito. Como odo senhor, disposta a receber seu crédito. Como o senhor se mostrasse recalcitrante em pagar a divida,senhor se mostrasse recalcitrante em pagar a divida, Edson resolveu levar uma garantia do credito. AoEdson resolveu levar uma garantia do credito. Ao deixar a residência do senhor levando ao ombro umadeixar a residência do senhor levando ao ombro uma televisão, Edson viu-se surpreendido pelo cano detelevisão, Edson viu-se surpreendido pelo cano de uma arma de fogo que foi disparada contra a suauma arma de fogo que foi disparada contra a sua pessoa. Razão pela qual o senhor esta aqui, diantepessoa. Razão pela qual o senhor esta aqui, diante

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dos seus pares. A respeito desses fatos, o que odos seus pares. A respeito desses fatos, o que o senhor gostaria de dizer, ou de acrescentar?”senhor gostaria de dizer, ou de acrescentar?”

Começa o interrogatório. A defesa do réu se baseia noComeça o interrogatório. A defesa do réu se baseia no disparo acidental da arma, uma vez que a intenção dedisparo acidental da arma, uma vez que a intenção de exibi-la teria sido unicamente para constrange-la aexibi-la teria sido unicamente para constrange-la a não levar a televisão. Réu e vitima teriam senão levar a televisão. Réu e vitima teriam se engalfinhado e a arma disparada acidentalmente.engalfinhado e a arma disparada acidentalmente. Assustado, fugiu para a região Norte do país, onde aAssustado, fugiu para a região Norte do país, onde a prisão foi efetuada. Pelas perguntas do advogado, háprisão foi efetuada. Pelas perguntas do advogado, há indicações de que a tese da defesa se baseia noindicações de que a tese da defesa se baseia no comentário corrente no bairro onde moravam vitima ecomentário corrente no bairro onde moravam vitima e réu, de que a vitima era uma espécie de justiceiroréu, de que a vitima era uma espécie de justiceiro local, e que andava sempre armado, amedrontandolocal, e que andava sempre armado, amedrontando as pessoas contra quem houvesse qualquer tipo deas pessoas contra quem houvesse qualquer tipo de denuncia de transgressão. Segue o julgamento comdenuncia de transgressão. Segue o julgamento com os discursos da acusação e da defesa. No final, oos discursos da acusação e da defesa. No final, o advogado de defesa reforça a tese da legitima defesa,advogado de defesa reforça a tese da legitima defesa, relembrando que a vitima foi acintosamente, armada,relembrando que a vitima foi acintosamente, armada, à casa do réu, para cobrar-lhe uma divida de modoà casa do réu, para cobrar-lhe uma divida de modo violento e injusto. Trouxe à consideração dos juradosviolento e injusto. Trouxe à consideração dos jurados também à informação de que o réu tinha sidotambém à informação de que o réu tinha sido hospitalizado e que, em função disso, qualquerhospitalizado e que, em função disso, qualquer vestígio de ferimento causado pela luta corporal teriavestígio de ferimento causado pela luta corporal teria sido eliminado pela própria ação medica.sido eliminado pela própria ação medica.

Lidos os quesitos, foi convocado o Conselho deLidos os quesitos, foi convocado o Conselho de Sentença para o veredito, e o juiz leu a sentença: “OsSentença para o veredito, e o juiz leu a sentença: “Os jurados, analisando os quesitos que lhe foramjurados, analisando os quesitos que lhe foram formulados, acolheram a tese da legitima defesa.formulados, acolheram a tese da legitima defesa. Decidiu-se, então, absolver Nivaldo Jose Silva.”Decidiu-se, então, absolver Nivaldo Jose Silva.”

Considerações deste trabalho acerca do julgamentoConsiderações deste trabalho acerca do julgamento

A acusação funcionou bem, com base no laudo daA acusação funcionou bem, com base no laudo da perícia, e insistindo em gráficos que mostravam ondeperícia, e insistindo em gráficos que mostravam onde

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a bala tinha se instalado e de que direção tinha vindo.a bala tinha se instalado e de que direção tinha vindo. Interveio quando considerou necessário, tentando ateInterveio quando considerou necessário, tentando ate desmerecer, a atuação do advogado de defesa, quedesmerecer, a atuação do advogado de defesa, que classificou como emocional. Isso poderia ter levado oclassificou como emocional. Isso poderia ter levado o júri a postar-se ao lado da promotora, impressionadojúri a postar-se ao lado da promotora, impressionado pela sua altivez. Mas a defesa optou por umapela sua altivez. Mas a defesa optou por uma abordagem que privilegiou o conceito daabordagem que privilegiou o conceito da proximidade. Ou seja, procurou fazer com que osproximidade. Ou seja, procurou fazer com que os jurados se transportassem para o lugar do réu,jurados se transportassem para o lugar do réu, enfrentando a mesma situação de constrangimento eenfrentando a mesma situação de constrangimento e coerção.coerção.

Não é difícil imaginar que a situação, de uma famíliaNão é difícil imaginar que a situação, de uma família em sossego sendo pressionada por um “malandro”,em sossego sendo pressionada por um “malandro”, impressionou a maioria do júri, composto na maioriaimpressionou a maioria do júri, composto na maioria de mulheres. O advogado buscou seduzir essasde mulheres. O advogado buscou seduzir essas mulheres, fazendo-as imaginar a situação esdrúxulamulheres, fazendo-as imaginar a situação esdrúxula que foi criada, com a invasão de alguém, armado, aque foi criada, com a invasão de alguém, armado, a ameaçar a integridade de um homem pobre, dianteameaçar a integridade de um homem pobre, diante de sua mulher e de duas filhas pequenas. O advogadode sua mulher e de duas filhas pequenas. O advogado foi hábil, passou emoção quando entendeufoi hábil, passou emoção quando entendeu necessário, afrontou a promotora quando lhe pareceunecessário, afrontou a promotora quando lhe pareceu saudável, adoçou a voz em alguns momentos,saudável, adoçou a voz em alguns momentos, endureceu o tom em outros.endureceu o tom em outros.

A despeito de uma tese tecnicamente correta, aA despeito de uma tese tecnicamente correta, a acusação pecou ao desmerecer pequenos detalhes daacusação pecou ao desmerecer pequenos detalhes da historia. Alem disso, a promotora optou pela posiçãohistoria. Alem disso, a promotora optou pela posição de superioridade, o que parece ter causado um efeitode superioridade, o que parece ter causado um efeito indesejado no júri. Exatamente ao contrario, oindesejado no júri. Exatamente ao contrario, o advogado manteve-se humilde, utilizou uma posturaadvogado manteve-se humilde, utilizou uma postura vocal suave e contrita. Ganhou a simpatia dos juradosvocal suave e contrita. Ganhou a simpatia dos jurados para a sua tese, apoiado no fato de a vitima terpara a sua tese, apoiado no fato de a vitima ter invadido a privacidade da casa do acusado, que nãoinvadido a privacidade da casa do acusado, que não teria tido outra saída senão defender a honra de suateria tido outra saída senão defender a honra de sua casa. Venceu pela sedução do envolvimento.casa. Venceu pela sedução do envolvimento.

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CAPITULO IV – AVE, PalavraCAPITULO IV – AVE, Palavra

“A palavra certa é um agente poderoso. Sempre que“A palavra certa é um agente poderoso. Sempre que encontramos uma dessas palavras intensamenteencontramos uma dessas palavras intensamente certas... o efeito resultante é físico e espiritual, alemcertas... o efeito resultante é físico e espiritual, alem de imediato”. Mark Twainde imediato”. Mark Twain

A palavra tem um significado tácito, mas significantesA palavra tem um significado tácito, mas significantes implícitos. O tom, o ritmo, a entonação, tudo contribuiimplícitos. O tom, o ritmo, a entonação, tudo contribui para emprestar a palavras alternativas diferentes depara emprestar a palavras alternativas diferentes de entendimento por parte do auditório. Analisaremos,entendimento por parte do auditório. Analisaremos, neste capitulo, as principais qualidades que fazem daneste capitulo, as principais qualidades que fazem da palavra oral, especialmente num contexto de debate,palavra oral, especialmente num contexto de debate, um poderoso elemento de sedução. E, sem duvida, aum poderoso elemento de sedução. E, sem duvida, a utilização da palavra é baseada em técnicasutilização da palavra é baseada em técnicas aperfeiçoadas pela humanidade ao longo de milênios.aperfeiçoadas pela humanidade ao longo de milênios. No entanto, da mesma forma que, bem utilizada, aNo entanto, da mesma forma que, bem utilizada, a linguagem pode obter resultados expressivos, mallinguagem pode obter resultados expressivos, mal utilizada ela pode causar a condenação de quem autilizada ela pode causar a condenação de quem a profere ou daquele que dela quereria se beneficiar.profere ou daquele que dela quereria se beneficiar.

1.1. A LINGUAGEMA LINGUAGEM

“No principio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus,“No principio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no principio com Deus.e o Verbo era Deus. Ele estava no principio com Deus. Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nadaTodas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez”. Gênesisdo que foi feito se fez”. Gênesis

A fala humana é um produto do sistema físico-A fala humana é um produto do sistema físico-psíquico de uma pessoa e provoca eventos no sistemapsíquico de uma pessoa e provoca eventos no sistema nervoso de outra. É o meio mais conhecido e utilizadonervoso de outra. É o meio mais conhecido e utilizado

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da comunicação, mas é somente uma de suas vias.da comunicação, mas é somente uma de suas vias. Porque a comunicação é composta por todos osPorque a comunicação é composta por todos os sistemas de transmissão e recebimento desistemas de transmissão e recebimento de mensagens, envolvendo vários blocos demensagens, envolvendo vários blocos de conhecimento e atitude. As classificações dessesconhecimento e atitude. As classificações desses sistemas foram esquematizadas por muitossistemas foram esquematizadas por muitos especialistas, e para citar somente alguns brasileiros:especialistas, e para citar somente alguns brasileiros: Damião e Henriques (1995), Cegalla (1989) e QuadrosDamião e Henriques (1995), Cegalla (1989) e Quadros (1969).(1969).

Ao dirigir-se aos jurados, os advogados e promotoresAo dirigir-se aos jurados, os advogados e promotores buscam potencializar a emoção em seu discurso, debuscam potencializar a emoção em seu discurso, de modo a potencializar também a reação emocional dosmodo a potencializar também a reação emocional dos jurados. Da mesma forma, procuram manipular osjurados. Da mesma forma, procuram manipular os sinais reflexos correspondentes àquilo que dizem.sinais reflexos correspondentes àquilo que dizem. Podemos depreender a importância dos sinaisPodemos depreender a importância dos sinais externos, pois eles fazem parte da mensagemexternos, pois eles fazem parte da mensagem comunicada, incorporando-se a ela. Por isso, nãocomunicada, incorporando-se a ela. Por isso, não podemos contradizer o que exprimem as palavras. Opodemos contradizer o que exprimem as palavras. O sinal externo é reflexo da alma da pessoa e, muitassinal externo é reflexo da alma da pessoa e, muitas vezes, recebe maior atenção do receptor do que ovezes, recebe maior atenção do receptor do que o discurso falado. Daí a importância de advogados ediscurso falado. Daí a importância de advogados e promotores estarem sempre atentos àpromotores estarem sempre atentos à correspondência entre a mensagem que buscamcorrespondência entre a mensagem que buscam transmitir e sua roupa, maquiagem, expressões,transmitir e sua roupa, maquiagem, expressões, gestos e postura.gestos e postura.

2.2. A LINGUAGEM DO SILÊNCIOA LINGUAGEM DO SILÊNCIO

Não resta duvida de que se calar também é umNão resta duvida de que se calar também é um processo de comunicação. Alias, nem é precisoprocesso de comunicação. Alias, nem é preciso lembrar situações em que o silêncio de alguém é maislembrar situações em que o silêncio de alguém é mais eloqüente do que mil discursos. Essa técnica deeloqüente do que mil discursos. Essa técnica de sedução foi utilizada brilhantemente no trecho dosedução foi utilizada brilhantemente no trecho do discurso do advogado Brigance, do filme discurso do advogado Brigance, do filme Tempo deTempo de

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Matar, Matar, imediatamente antes do fecho de ouro,imediatamente antes do fecho de ouro, surpreendente e cortante. Juridicamente, a nossasurpreendente e cortante. Juridicamente, a nossa própria lei processual, imitando textos de outrosprópria lei processual, imitando textos de outros paises, estabeleceu que o calar do acusado pode serpaises, estabeleceu que o calar do acusado pode ser interpretado em seu desfavor. O silêncio predispõe. Ointerpretado em seu desfavor. O silêncio predispõe. O silêncio aciona um estado de alerta, para o bem ousilêncio aciona um estado de alerta, para o bem ou para o mal. O silêncio acumplicia. O silêncio envolve.para o mal. O silêncio acumplicia. O silêncio envolve. O silêncio acoberta. O silêncio é, portanto, um signo,O silêncio acoberta. O silêncio é, portanto, um signo, com significados que variam de acordo com ocom significados que variam de acordo com o contexto, a forma e o momento do discurso em quecontexto, a forma e o momento do discurso em que se inserem.se inserem.

3.3. ARGUMENTAÇÃOARGUMENTAÇÃO

Em resumo, a argumentação opõe-se àEm resumo, a argumentação opõe-se à demonstração. A teoria da demonstração sedemonstração. A teoria da demonstração se fundamenta na idéia de evidencia, concebida como afundamenta na idéia de evidencia, concebida como a força diante da qual todo pensamento do homemforça diante da qual todo pensamento do homem normal tem de ceder. A teoria da argumentaçãonormal tem de ceder. A teoria da argumentação desenvolveu-se a partir da idéia de que nem todadesenvolveu-se a partir da idéia de que nem toda prova é concebível como redução à evidencia, masprova é concebível como redução à evidencia, mas requer técnicas capazes de provocar ou acrescer arequer técnicas capazes de provocar ou acrescer a adesão dos espíritos às teses que se apresentam aoadesão dos espíritos às teses que se apresentam ao seu descortínio. A demonstração, neste sentido, liga-seu descortínio. A demonstração, neste sentido, liga-se aos raciocínios lógicos formais, como osse aos raciocínios lógicos formais, como os matemáticos, enquanto a argumentação, nãomatemáticos, enquanto a argumentação, não pressupondo a construção de sistemaspressupondo a construção de sistemas axiomatizáveis, com seus axiomas e regras deaxiomatizáveis, com seus axiomas e regras de transformação, refere-se antes aos raciocíniostransformação, refere-se antes aos raciocínios persuasivos, como são os políticos e os jurídicos, cujapersuasivos, como são os políticos e os jurídicos, cuja validade é restrita a auditórios particulares, nãovalidade é restrita a auditórios particulares, não pretendendo adquirir a universidade dapretendendo adquirir a universidade da demonstração.demonstração.

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Com base nisso, podemos afirmar que a dialéticaCom base nisso, podemos afirmar que a dialética utilizada no discurso no Tribunal do Júri não é umutilizada no discurso no Tribunal do Júri não é um processo de busca pela verdade, apenas um embateprocesso de busca pela verdade, apenas um embate pela aceitação de uma proposição. É muito comumpela aceitação de uma proposição. É muito comum acontecer que o orador tenha que persuadir umacontecer que o orador tenha que persuadir um auditório heterogêneo, reunindo pessoasauditório heterogêneo, reunindo pessoas diferenciadas pelo caráter, vínculos ou funções. Elediferenciadas pelo caráter, vínculos ou funções. Ele devera utilizar argumentos múltiplos para conquistardevera utilizar argumentos múltiplos para conquistar os diversos elementos de seu auditório. É a arte deos diversos elementos de seu auditório. É a arte de levar em conta, na argumentação, esse auditóriolevar em conta, na argumentação, esse auditório heterogêneo que caracteriza o grande orador. Pascalheterogêneo que caracteriza o grande orador. Pascal tem um axioma que se tornou básico na analise dastem um axioma que se tornou básico na analise das atitudes sociais: “O coração tem razoes que a própriaatitudes sociais: “O coração tem razoes que a própria razão desconhece”. No âmbito de uma ciência socialrazão desconhece”. No âmbito de uma ciência social como o Direito, é impossível não se prestar à devidacomo o Direito, é impossível não se prestar à devida importância aos elementos não-racionais.importância aos elementos não-racionais.

4.4. RETÓRICARETÓRICA

A retórica tem sido definida como a arte de falar bem,A retórica tem sido definida como a arte de falar bem, isto é, a arte de usar todos os recursos da linguagemisto é, a arte de usar todos os recursos da linguagem com o objetivo de provocar um efeito determinadocom o objetivo de provocar um efeito determinado nos ouvintes. A retórica ensinada na Grécia Antiganos ouvintes. A retórica ensinada na Grécia Antiga pelos sofistas teve origem em Siracusa, por volta dopelos sofistas teve origem em Siracusa, por volta do séc. V a.C. Sofistas eram pensadores pragmáticos eséc. V a.C. Sofistas eram pensadores pragmáticos e utilitaristas nas suas doutrinas e nas suas vidas.utilitaristas nas suas doutrinas e nas suas vidas. Ensinavam, principalmente, a arte de argumentar eEnsinavam, principalmente, a arte de argumentar e todo conhecimento que pudesse ser-lhe útil.todo conhecimento que pudesse ser-lhe útil. Ensinavam a debater contra ou a favor de qualquerEnsinavam a debater contra ou a favor de qualquer opinião, desde que lhe fosse vantajosa. O tratado deopinião, desde que lhe fosse vantajosa. O tratado de retórica mais conhecido na Antiguidade é o livroretórica mais conhecido na Antiguidade é o livro intitulado intitulado Retórica, Retórica, de Aristóteles, para quem ade Aristóteles, para quem a retórica é corretiva, instrutiva, sugestiva e defensiva.retórica é corretiva, instrutiva, sugestiva e defensiva.

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Outro teórico fundamental foi o orador romano Cícero,Outro teórico fundamental foi o orador romano Cícero, que expôs sua doutrina em três tratados, com a idéiaque expôs sua doutrina em três tratados, com a idéia central de que o orador perfeito era o homemcentral de que o orador perfeito era o homem perfeito. Tal ponto de vista é encontrado também emperfeito. Tal ponto de vista é encontrado também em Quintiliano, cujo tratado Quintiliano, cujo tratado Instituição Oratória Instituição Oratória é a maisé a mais completa e sistemática exposição do assunto.completa e sistemática exposição do assunto. Durante a Idade Media e a Renascença, a retóricaDurante a Idade Media e a Renascença, a retórica fazia parte do fazia parte do trivium, trivium, como indispensável requisitocomo indispensável requisito educacional. No século XVI, dividiu seus elementoseducacional. No século XVI, dividiu seus elementos com a Lógica. No século XIX, os jesuítas tornaram-secom a Lógica. No século XIX, os jesuítas tornaram-se os mestres da retórica aplicada à oratória e aosos mestres da retórica aplicada à oratória e aos domínios da critica e da ficção. Na Grécia, asdomínios da critica e da ficção. Na Grécia, as discussões eram apaixonadas e visavam a convencerdiscussões eram apaixonadas e visavam a convencer os homens das idéias de outros homens. Emos homens das idéias de outros homens. Em Maquiavel, o conhecimento da realidade eraMaquiavel, o conhecimento da realidade era imprescindível à edificação do discurso para seimprescindível à edificação do discurso para se manter no poder.manter no poder.

No Processo Penal, esses dois elementos aparecem. ANo Processo Penal, esses dois elementos aparecem. A retórica é elemento indispensável para oretórica é elemento indispensável para o convencimento. Um dos fatores essenciais daconvencimento. Um dos fatores essenciais da propaganda, tal como se desenvolveu no século XX,propaganda, tal como se desenvolveu no século XX, mas cujo uso era bem conhecido desde a Antiguidademas cujo uso era bem conhecido desde a Antiguidade e que a Igreja Católica aproveitou com incomparávele que a Igreja Católica aproveitou com incomparável maestria, è o condicionamento do auditório por meiomaestria, è o condicionamento do auditório por meio de numerosas e variadas técnicas que utilizam tudode numerosas e variadas técnicas que utilizam tudo quanto pode influenciar o comportamento. Essasquanto pode influenciar o comportamento. Essas técnicas exercem um efeito inegável para preparar otécnicas exercem um efeito inegável para preparar o auditório, torna-lo mais acessível aos argumentos queauditório, torna-lo mais acessível aos argumentos que se lhe apresentarão. A moral interfere ao nível dese lhe apresentarão. A moral interfere ao nível de credibilidade, segundo Michel Meyer, da Universidadecredibilidade, segundo Michel Meyer, da Universidade Livre de Bruxelas. A lógica e a dialética estãoLivre de Bruxelas. A lógica e a dialética estão presentes no uso de argumentos. E a poética épresentes no uso de argumentos. E a poética é aplicada no estilo e na economia do discurso.aplicada no estilo e na economia do discurso.

Platão já achava que a retórica era sofistica, semPlatão já achava que a retórica era sofistica, sem nada de positivo, sobretudo porque, para ele, anada de positivo, sobretudo porque, para ele, a

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persuasão podia nascer dos feitos do estilo, que tantopersuasão podia nascer dos feitos do estilo, que tanto produziam sentimentos de prazer como de adesão.produziam sentimentos de prazer como de adesão. Um belo discurso, que dá prazer e é agradável deUm belo discurso, que dá prazer e é agradável de ouvir, tem mais a ver com as emoções que suscita ououvir, tem mais a ver com as emoções que suscita ou com as quais joga do que propriamente com a Razãocom as quais joga do que propriamente com a Razão que representa. A retórica é, então, tradicionalmente,que representa. A retórica é, então, tradicionalmente, a arte de bem falar. A retórica judiciária, ou aa arte de bem falar. A retórica judiciária, ou a argumentação jurídica em geral, consagraram, desdeargumentação jurídica em geral, consagraram, desde Roma, as partes do discurso: exórdio, narração,Roma, as partes do discurso: exórdio, narração, argumentação e peroração. Nessas partes,argumentação e peroração. Nessas partes, encontram-se misturados o prazer de convencer, aencontram-se misturados o prazer de convencer, a linguagem das paixões, a forma e o conteúdo, olinguagem das paixões, a forma e o conteúdo, o implícito e o explicito, o racional e o emotivo; emimplícito e o explicito, o racional e o emotivo; em suma, tudo o que faz a retórica e cujas principaissuma, tudo o que faz a retórica e cujas principais linhas de força resumimos mais acima.linhas de força resumimos mais acima.

5.5. DEFEITOS E FALÁCIAS DO DISCURSODEFEITOS E FALÁCIAS DO DISCURSO

Antes de iniciarmos este tópico, a primeiraAntes de iniciarmos este tópico, a primeira consideração a ser feita é de que, normalmente, todoconsideração a ser feita é de que, normalmente, todo ser humano vive, no dia-a-dia, com o raciocínioser humano vive, no dia-a-dia, com o raciocínio dedutivo. O mesmo ocorre no discurso, a dedução é,dedutivo. O mesmo ocorre no discurso, a dedução é, por definição, uma sinédoque mental. Por sua vez, apor definição, uma sinédoque mental. Por sua vez, a indução também pode ser uma falácia. Um turista queindução também pode ser uma falácia. Um turista que passar dois dias na praia de Copacabana poderápassar dois dias na praia de Copacabana poderá estabelecer o modelo de que todas as pessoas do Rioestabelecer o modelo de que todas as pessoas do Rio de Janeiro usam trajes de banho e vão à praia. Estade Janeiro usam trajes de banho e vão à praia. Esta generalização pode afirmar ou negar especificaçõesgeneralização pode afirmar ou negar especificações sem as provas dos fatos.sem as provas dos fatos.

6.6. ERROSERROS

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Othon M. Garcia (op.cit.:291 e seguintes) entendeOthon M. Garcia (op.cit.:291 e seguintes) entende que, do ponto de vista lógico, só existem duasque, do ponto de vista lógico, só existem duas maneiras de errar. “Erramos, raciocinando mal commaneiras de errar. “Erramos, raciocinando mal com dados corretos ou raciocinando bem com dadosdados corretos ou raciocinando bem com dados falsos. O erro, portanto, pode resultar de um vicio defalsos. O erro, portanto, pode resultar de um vicio de forma, ou de matéria.” A esse raciocínio vicioso ouforma, ou de matéria.” A esse raciocínio vicioso ou falacioso é que a Lógica chama de sofisma. E, aofalacioso é que a Lógica chama de sofisma. E, ao sofisma que não é intencionalmente vicioso, isto é,sofisma que não é intencionalmente vicioso, isto é, que não tem o propósito de enganar, chamam osque não tem o propósito de enganar, chamam os lógicos paralogismo. O sofisma implica má-fé. Ológicos paralogismo. O sofisma implica má-fé. O paralogismo pressupõe boa-fé. Ao paralogismo queparalogismo pressupõe boa-fé. Ao paralogismo que apresenta premissas munidas de prova chama-seapresenta premissas munidas de prova chama-se epiquirema.epiquirema.

7.7. POSTURAS FÍSICAS ENGANOSASPOSTURAS FÍSICAS ENGANOSAS

A própria linguagem do corpo pode também servir deA própria linguagem do corpo pode também servir de complemento à evocação das emoções maiscomplemento à evocação das emoções mais legitimas, sinceras e nobres. Pode até servir comolegitimas, sinceras e nobres. Pode até servir como arma extremamente eficaz para eventuais “contra-arma extremamente eficaz para eventuais “contra-ataques mudos”, notadamente quando não estamosataques mudos”, notadamente quando não estamos com a palavra. Bem empregados, causam mais danoscom a palavra. Bem empregados, causam mais danos ao adversário do que um discurso inteiro. A posturaao adversário do que um discurso inteiro. A postura física possui um grande poder na transmissão de umafísica possui um grande poder na transmissão de uma mensagem. Surge daí a força de uma postura físicamensagem. Surge daí a força de uma postura física enganosa.enganosa.

8.8. OUTROS ERROS DO DISCURSOOUTROS ERROS DO DISCURSO

Dando continuidade à questão dos erros no discurso,Dando continuidade à questão dos erros no discurso, faz-se mister arrolar também os seguintes:faz-se mister arrolar também os seguintes:

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-- Mal-entendidos: discursos e argumentaçõesMal-entendidos: discursos e argumentações baseadas em mal-entendidos podem levar àbaseadas em mal-entendidos podem levar à dispersão das idéias.dispersão das idéias.

-- Preconceitos e prevenções: algunsPreconceitos e prevenções: alguns fenômenos socioculturais podem ser citadosfenômenos socioculturais podem ser citados como responsáveis pela formação decomo responsáveis pela formação de diferentes atitudes nos jurados, se utilizadosdiferentes atitudes nos jurados, se utilizados com destreza pelo acusador ou defensor.com destreza pelo acusador ou defensor.

-- Generalizações ou falsos axiomas: o defensorGeneralizações ou falsos axiomas: o defensor ou acusador polemista pode mascarar aou acusador polemista pode mascarar a verdade sob a forma de falsos axiomas,verdade sob a forma de falsos axiomas, dando como evidente e indemonstrável odando como evidente e indemonstrável o que é apenas o resultado de sua presunção,que é apenas o resultado de sua presunção, ousadia ou ignorância.ousadia ou ignorância.

-- Falsos juízos: o choque entre as premissas,Falsos juízos: o choque entre as premissas, insuficientes, leva a uma conclusãoinsuficientes, leva a uma conclusão extensiva, não fundamentada nas premissas.extensiva, não fundamentada nas premissas.

9.9. OS DEBATESOS DEBATES

Não se pode perder de vista o fato de que, no TribunalNão se pode perder de vista o fato de que, no Tribunal do Júri, o discurso de advogados e promotores se dádo Júri, o discurso de advogados e promotores se dá não apenas por meio da exposição individual, masnão apenas por meio da exposição individual, mas também por meio do debate entre as partes. Há umatambém por meio do debate entre as partes. Há uma permanente disputa, em embate direto entrepermanente disputa, em embate direto entre advogado e promotor. E o desempenho das partesadvogado e promotor. E o desempenho das partes nesse jogo de força certamente influenciara o júri emnesse jogo de força certamente influenciara o júri em sua decisão. Não se trata de um processo em que assua decisão. Não se trata de um processo em que as duas partes unem seus discursos para alcançar umduas partes unem seus discursos para alcançar um objetivo, a verdade, mas sim uma disputa da qualobjetivo, a verdade, mas sim uma disputa da qual apenas uma das partes poderá sair vencedora. Aapenas uma das partes poderá sair vencedora. A vitória é o objetivo do debate. E para vencer e impedirvitória é o objetivo do debate. E para vencer e impedir o adversário de se sobressair frente ao júri,o adversário de se sobressair frente ao júri,

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advogados e promotores se valem de inúmerosadvogados e promotores se valem de inúmeros estratagemas dialéticos e retóricos. Em sua obraestratagemas dialéticos e retóricos. Em sua obra Dialética Eristica, Dialética Eristica, Schopenhauer compila uma serieSchopenhauer compila uma serie desses estratagemas que podem garantir a vitória emdesses estratagemas que podem garantir a vitória em um debate. Compete-nos citar alguns, aqueles queum debate. Compete-nos citar alguns, aqueles que são com maior freqüência, utilizados no Tribunal dosão com maior freqüência, utilizados no Tribunal do Júri e estão diretamente relacionados com a seduçãoJúri e estão diretamente relacionados com a sedução exercida por advogados e promotores sobre osexercida por advogados e promotores sobre os jurados.jurados.

O primeiro estratagema a nos chamar a atenção dizO primeiro estratagema a nos chamar a atenção diz respeito à alternativa forçada. Outro recurso muitorespeito à alternativa forçada. Outro recurso muito verificado em debates no Tribunal do Júri é aqueleverificado em debates no Tribunal do Júri é aquele que Schopenhauer designa por “uso intencional daque Schopenhauer designa por “uso intencional da mutatio controvérsiamutatio controvérsia”. Trata-se, pois, de uma fuga,”. Trata-se, pois, de uma fuga, um meio de se manter a discussão no âmbitoum meio de se manter a discussão no âmbito favorável à tese que se quer ver aceita pelos jurados.favorável à tese que se quer ver aceita pelos jurados. Complementando, é necessário que sejam citadosComplementando, é necessário que sejam citados ainda outros estratagemas dialéticos apontados porainda outros estratagemas dialéticos apontados por Schopenhauer, como: Schopenhauer, como: ampliação indevida, falsaampliação indevida, falsa proclamação de vitória, uso da premissa falsaproclamação de vitória, uso da premissa falsa previamente aceita pelo adversário. previamente aceita pelo adversário. Essas são,Essas são, essencialmente, as linhas gerais da estratégia deessencialmente, as linhas gerais da estratégia de Schopenhauer para se vencer um debate.Schopenhauer para se vencer um debate.

Também vale ressaltar que, na dialética do debate noTambém vale ressaltar que, na dialética do debate no Tribunal de Júri, o orador, seja defensor ou acusador,Tribunal de Júri, o orador, seja defensor ou acusador, vale-se de duas contingências que, mesmovale-se de duas contingências que, mesmo separáveis, são normalmente apresentadas juntas: 1-)separáveis, são normalmente apresentadas juntas: 1-) O discurso, como manifestação oral persuasiva,O discurso, como manifestação oral persuasiva, retórica, cheia de contundência ordinária, de apeloretórica, cheia de contundência ordinária, de apelo emocional etc; 2-) A interpretação cênica, mímica,emocional etc; 2-) A interpretação cênica, mímica, teatral, gesticular. Seduzir o júri é utilizar todos osteatral, gesticular. Seduzir o júri é utilizar todos os recursos para fazer com que o jurado se reporte àrecursos para fazer com que o jurado se reporte à situação fática que resultou no cometimento dasituação fática que resultou no cometimento da violência. É induzir o jurado a projetar-seviolência. É induzir o jurado a projetar-se mentalmente numa situação análoga que possa,mentalmente numa situação análoga que possa,

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nesse deslocamento abstrato, testemunhar onesse deslocamento abstrato, testemunhar o acontecimento ou avaliar a conduta do agente nasacontecimento ou avaliar a conduta do agente nas mesmas circunstâncias.mesmas circunstâncias.CAPITULO V – Condicionantes do Discurso JurídicoCAPITULO V – Condicionantes do Discurso Jurídico

Um axioma corrente entre a classe dá conta de que oUm axioma corrente entre a classe dá conta de que o advogado emotivo é um mau advogado. Iniciamosadvogado emotivo é um mau advogado. Iniciamos com esta lembrança porque o discurso jurídicocom esta lembrança porque o discurso jurídico apresenta algumas particularidades que merecemapresenta algumas particularidades que merecem atenção. Possui elementos objetivos e subjetivos. Nãoatenção. Possui elementos objetivos e subjetivos. Não se pode ter medidas diferentes para julgar casosse pode ter medidas diferentes para julgar casos semelhantes: afinal, todos são iguais perante a lei.semelhantes: afinal, todos são iguais perante a lei. Sob esse prisma, poucas lacunas restam no Direito aSob esse prisma, poucas lacunas restam no Direito a serem preenchidas pela subjetividade dos juristas.serem preenchidas pela subjetividade dos juristas. Entretanto, por mais que se eliminem as lacunas, elasEntretanto, por mais que se eliminem as lacunas, elas existem. Por mais objetiva que seja a lei, há umaexistem. Por mais objetiva que seja a lei, há uma margem de atuação de grande importância da figuramargem de atuação de grande importância da figura do julgador, de sua sensibilidade. Existe, portanto,do julgador, de sua sensibilidade. Existe, portanto, certa subjetividade tanto da parte dos julgadorescerta subjetividade tanto da parte dos julgadores leigos do Tribunal do Júri, quanto do julgador técnico,leigos do Tribunal do Júri, quanto do julgador técnico, do juiz de direito, que estuda durante anos parado juiz de direito, que estuda durante anos para entender os meandros do mundo do crime.entender os meandros do mundo do crime.

A aplicação da justiça segue algumas concepções deA aplicação da justiça segue algumas concepções de caráter inconciliável, e que podemos reunir numacaráter inconciliável, e que podemos reunir numa seqüência de “mandamentos”, numa tentativa deseqüência de “mandamentos”, numa tentativa de reprodução da releitura, por parte do cidadão comum,reprodução da releitura, por parte do cidadão comum, das bases jurídicas do Direito Romano:das bases jurídicas do Direito Romano:

1-) A cada qual a mesma coisa.1-) A cada qual a mesma coisa.2-) A cada qual segundo seus méritos.2-) A cada qual segundo seus méritos.3-) A cada qual segundo suas obras.3-) A cada qual segundo suas obras.4-) A cada qual segundo suas necessidades.4-) A cada qual segundo suas necessidades.5-) A cada qual segundo sua posição.5-) A cada qual segundo sua posição.6-) A cada qual segundo o que a lei lhe atribui.6-) A cada qual segundo o que a lei lhe atribui.

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De posse desse conhecimento, o promotor publico e oDe posse desse conhecimento, o promotor publico e o advogado de defesa formulam um discurso rico emadvogado de defesa formulam um discurso rico em elementos emocionais, em exemplos, em casos doelementos emocionais, em exemplos, em casos do cotidiano, que servem para atestar ou retalhar umacotidiano, que servem para atestar ou retalhar uma prova ou um dado proposto. Buscam-se, na riquíssimaprova ou um dado proposto. Buscam-se, na riquíssima arte da retórica, os argumentos subjetivosarte da retórica, os argumentos subjetivos necessários para a difícil tarefa de persuadir, denecessários para a difícil tarefa de persuadir, de convencer. Desta maneira, procura-se atingir oconvencer. Desta maneira, procura-se atingir o auditório também pelo raciocínio, pelo intelecto, mas,auditório também pelo raciocínio, pelo intelecto, mas, principalmente, pelo coração, pela emoção.principalmente, pelo coração, pela emoção.

1.1. AS ATITUDES DO ORADORAS ATITUDES DO ORADOR

Consultamos Trein (1996: 158) para esmiuçar umConsultamos Trein (1996: 158) para esmiuçar um pouco mais o tanto de encenação a que os advogadospouco mais o tanto de encenação a que os advogados recorrem para tentar empatia com o júri. Cada jurado,recorrem para tentar empatia com o júri. Cada jurado, assegura Trein, referindo-se a vários estudos já feitos,assegura Trein, referindo-se a vários estudos já feitos, instantaneamente perguntara e respondera a siinstantaneamente perguntara e respondera a si próprio varias coisas ao nosso respeito: próprio varias coisas ao nosso respeito: Como é aComo é a nossa voz? Como é o nosso modo de falar? Sobre onossa voz? Como é o nosso modo de falar? Sobre o que estamos falando? Como são os nossosque estamos falando? Como são os nossos movimentos e gestos? Como se comporta nossamovimentos e gestos? Como se comporta nossa fisionomia? Como é a nossa aparência geral. fisionomia? Como é a nossa aparência geral. TreinTrein exemplifica, a importância de aplicar atenção a todosexemplifica, a importância de aplicar atenção a todos os detalhes de apresentação postural, gestual,os detalhes de apresentação postural, gestual, fonética ou fisionômica, com o propósito de ganhar afonética ou fisionômica, com o propósito de ganhar a confiança dos jurados pelas atitudes.confiança dos jurados pelas atitudes.

2.2. PAPEISPAPEIS

À acusação cumpre rechaçar qualquer duvida quantoÀ acusação cumpre rechaçar qualquer duvida quanto à autoria do delito e à cumplicidade do agente. Aà autoria do delito e à cumplicidade do agente. A duvida milita sempre em favor da defesa. A defesa,duvida milita sempre em favor da defesa. A defesa,

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ao contrario, devera fazer uso, irremediavelmente,ao contrario, devera fazer uso, irremediavelmente, das prerrogativas que tem em face de ser a partedas prerrogativas que tem em face de ser a parte hipossuficiente na relação jurídico-acusatória.hipossuficiente na relação jurídico-acusatória. Constitui garantia constitucional do acusado aConstitui garantia constitucional do acusado a presunção de inocência que milita a seu favor ate quepresunção de inocência que milita a seu favor ate que sobrevenha o transito em julgado de sentença penalsobrevenha o transito em julgado de sentença penal condenatória. Semeando a duvida, certamente, acondenatória. Semeando a duvida, certamente, a defesa colhera a absolvição do acusado. O discurso, edefesa colhera a absolvição do acusado. O discurso, e não necessariamente o seu conteúdo, masnão necessariamente o seu conteúdo, mas essencialmente a sua forma, é tudo na comunicaçãoessencialmente a sua forma, é tudo na comunicação com seu receptor.com seu receptor.

3.3. O DISCURSO E SUAS CONDICIONANTESO DISCURSO E SUAS CONDICIONANTES

A linguagem é o objeto fundamental do trabalho queA linguagem é o objeto fundamental do trabalho que aqui se apresenta, mas afastando-se da concepção daaqui se apresenta, mas afastando-se da concepção da linguagem apenas como instrumento de comunicaçãolinguagem apenas como instrumento de comunicação ou relação entre categorias mentais abstratas e oou relação entre categorias mentais abstratas e o mundo. Abordaremos, primordialmente, o carátermundo. Abordaremos, primordialmente, o caráter ativo da linguagem, e não sua função puramenteativo da linguagem, e não sua função puramente cognitiva. Você, as palavras, o outro. Essa relação écognitiva. Você, as palavras, o outro. Essa relação é um enigma decifrável; a esfinge formada pelaum enigma decifrável; a esfinge formada pela dicotomia do pensamento e da linguagem. Duasdicotomia do pensamento e da linguagem. Duas coisas tão paralelas, relacionando-se de forma intima.coisas tão paralelas, relacionando-se de forma intima. Isto porque num mesmo universo complementarIsto porque num mesmo universo complementar agem texto e contexto.agem texto e contexto.

Para muitos autores, o discurso tem uma configuraçãoPara muitos autores, o discurso tem uma configuração especifica que o situa alem dos limites do alcanceespecifica que o situa alem dos limites do alcance explicativo da Lingüística. Geneviève Provost apontaexplicativo da Lingüística. Geneviève Provost aponta em seu trabalho que se pode perceber duasem seu trabalho que se pode perceber duas tendências definidoras do discurso. Harris torna comotendências definidoras do discurso. Harris torna como ponto de partida um discurso efetivamenteponto de partida um discurso efetivamente pronunciado, em situação especifica, mas não fornecepronunciado, em situação especifica, mas não fornece

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critérios para a sua delimitação. Do trabalho decritérios para a sua delimitação. Do trabalho de Geneviève Provost observa-se que a autora concordaGeneviève Provost observa-se que a autora concorda com esta concepção, mas acrescenta outros doiscom esta concepção, mas acrescenta outros dois elementos: “tomada de palavra por um locutor” e umelementos: “tomada de palavra por um locutor” e um “silêncio”. A instancia do discurso a que pertence a“silêncio”. A instancia do discurso a que pertence a pessoa e todo o aparelho com ela correlacionadopessoa e todo o aparelho com ela correlacionado parece definir-se como aquela na qual a pessoa eparece definir-se como aquela na qual a pessoa e tudo aquilo que ela manipula podem sertudo aquilo que ela manipula podem ser equacionados sistematicamente.equacionados sistematicamente.

Ao lado da língua, existe uma instancia do discursoAo lado da língua, existe uma instancia do discurso em que os indicadores de pessoa, tempo, lugar eem que os indicadores de pessoa, tempo, lugar e objeto mostrado ganham um sentido preciso eobjeto mostrado ganham um sentido preciso e precisável. O discurso, no entanto, se restringeprecisável. O discurso, no entanto, se restringe àquelas manifestações verbais em que efetivamenteàquelas manifestações verbais em que efetivamente se realizam as relações de pessoa. O enunciadose realizam as relações de pessoa. O enunciado histórico se restringe à língua escrita, o locutor sehistórico se restringe à língua escrita, o locutor se encontra oculto e não revela o quanto esta envolvidoencontra oculto e não revela o quanto esta envolvido pela trama estruturada, ocultando o processopela trama estruturada, ocultando o processo discursivo sem o negar. Assim é que a linguagemdiscursivo sem o negar. Assim é que a linguagem utilizada tanto nos discursos orais quanto escritos,utilizada tanto nos discursos orais quanto escritos, não pode ser estudada sem o aporte do sistemanão pode ser estudada sem o aporte do sistema interno que a gerou, enquanto formação ideológica.interno que a gerou, enquanto formação ideológica.

O auditório do discursoO auditório do discurso

É preciso alguma qualidade para tomar a palavra eÉ preciso alguma qualidade para tomar a palavra e ser ouvido. Como a argumentação, visa a obter aser ouvido. Como a argumentação, visa a obter a adesão daqueles a quem se dirige, ela é, por inteiro,adesão daqueles a quem se dirige, ela é, por inteiro, relativa ao auditório que pretende influenciar. Emrelativa ao auditório que pretende influenciar. Em resumo, auditório parece ser a definição do conjuntoresumo, auditório parece ser a definição do conjunto de pessoas que o orador quer influenciar com a suade pessoas que o orador quer influenciar com a sua argumentação. Especificamente em relação ao Júri, ouargumentação. Especificamente em relação ao Júri, ou Conselho de Sentença, que denominamos “Júri, oConselho de Sentença, que denominamos “Júri, o

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auditório soberano do discurso.” Há uma dinâmica deauditório soberano do discurso.” Há uma dinâmica de grupo no plenário, porque jurados e orador nada maisgrupo no plenário, porque jurados e orador nada mais são do que um conjunto organizado de pessoas quesão do que um conjunto organizado de pessoas que se propõe a analisar um determinado fato e chegar ase propõe a analisar um determinado fato e chegar a uma conclusão. É verdade que existem relaçõesuma conclusão. É verdade que existem relações assimétricas entre os componentes. Bastaria dizer,assimétricas entre os componentes. Bastaria dizer, quanto a isso, que apenas um deles faz uso da voz.quanto a isso, que apenas um deles faz uso da voz.

Observa-se, por aí, que a palavra aplicada é umObserva-se, por aí, que a palavra aplicada é um reflexo das expectativas e temores do grupo socialreflexo das expectativas e temores do grupo social em que foi suscitada a palavra. E, como tal, mais queem que foi suscitada a palavra. E, como tal, mais que reflexo, é retrato. Não é, pois, senão obrigatórioreflexo, é retrato. Não é, pois, senão obrigatório adaptar o discurso à realidade cultural dos jurados. Oadaptar o discurso à realidade cultural dos jurados. O advogado ou o promotor que não perceber que o seuadvogado ou o promotor que não perceber que o seu discurso precisa estar adaptado está fadado aodiscurso precisa estar adaptado está fadado ao fracasso.fracasso.

A verdade e o discursoA verdade e o discurso

Meia-verdade é, também, uma mentira inteira. AMeia-verdade é, também, uma mentira inteira. A pratica de interromper uma resposta, durantepratica de interromper uma resposta, durante depoimentos, é típica da abordagem jurídica, e muitasdepoimentos, é típica da abordagem jurídica, e muitas vezes impede que a verdade completa venha a tona.vezes impede que a verdade completa venha a tona. O advogado de acusação ou de defesa exige que oO advogado de acusação ou de defesa exige que o depoente dê unicamente a resposta quedepoente dê unicamente a resposta que complemente ou responda a sua argumentação. Ocomplemente ou responda a sua argumentação. O auditório é induzido e conduzido. O auditório, comoauditório é induzido e conduzido. O auditório, como queremos provar neste trabalho, é seduzido. Segundoqueremos provar neste trabalho, é seduzido. Segundo Perelman (Perelman (Ética e Direito: Ética e Direito: 46), ser justo não é aplicar46), ser justo não é aplicar corretamente uma regra qualquer. A justiça formal,corretamente uma regra qualquer. A justiça formal, diz ele, consiste em observar uma regra que enunciadiz ele, consiste em observar uma regra que enuncia a obrigação de tratar de uma certa maneira todos osa obrigação de tratar de uma certa maneira todos os seres de determinada categoria.seres de determinada categoria.

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O colocar-se no lugar do outro é abolir a presunção deO colocar-se no lugar do outro é abolir a presunção de que o discurso pode conquistar o outro sem que seque o discurso pode conquistar o outro sem que se tenha conhecimento do universo deste receptor. Istotenha conhecimento do universo deste receptor. Isto ocorre seguidamente em tribunais do júri, e quem nãoocorre seguidamente em tribunais do júri, e quem não assume esta humildade acaba perdendo a contenda.assume esta humildade acaba perdendo a contenda. O que o outro quer ouvir? O próprio MaquiavelO que o outro quer ouvir? O próprio Maquiavel discutia esta questão em discutia esta questão em O Príncipe. O Príncipe. Em suma, oEm suma, o orador deve respeitar a fantasia do auditório. Paraorador deve respeitar a fantasia do auditório. Para levar o juiz (ou os jurados) à sua verdade, as parteslevar o juiz (ou os jurados) à sua verdade, as partes recorrem não apenas a elementos subjetivos erecorrem não apenas a elementos subjetivos e técnicas da arte retórica, como também a sofismas etécnicas da arte retórica, como também a sofismas e falácias. Isto justifica o apontamento de algumasfalácias. Isto justifica o apontamento de algumas considerações acerca do assunto, alem daquelas jáconsiderações acerca do assunto, alem daquelas já feitas no capitulo “Ave, palavra”.feitas no capitulo “Ave, palavra”.

Pedro Hispano costumava dizer que falácia é aPedro Hispano costumava dizer que falácia é a idoneidade de fazer crer que seja aquilo que não é,idoneidade de fazer crer que seja aquilo que não é, mediante alguma visão fantástica; isto é, a aparênciamediante alguma visão fantástica; isto é, a aparência sem existência. Os sofistas, segundo Bárbara Cassinsem existência. Os sofistas, segundo Bárbara Cassin (1990: 7 e seguintes), em vez de meditar sobre o ser,(1990: 7 e seguintes), em vez de meditar sobre o ser, escolhem ser educadores profissionais, estrangeirosescolhem ser educadores profissionais, estrangeiros itinerantes que comerciam sua cultura e sabedoria.itinerantes que comerciam sua cultura e sabedoria. Com o tempo, os sofistas passaram a tratar do não-Com o tempo, os sofistas passaram a tratar do não-ser, e dos fenômenos ou dos acidentes. Hegel, porser, e dos fenômenos ou dos acidentes. Hegel, por exemplo, em alguns pontos do seu livro exemplo, em alguns pontos do seu livro Lições SobreLições Sobre a Historia da Filosofiaa Historia da Filosofia, insiste na lógica de insistir, insiste na lógica de insistir sobre o não-ser do ser. Não concordava, quanto asobre o não-ser do ser. Não concordava, quanto a este aspecto, com Aristóteles, que definia o sofistaeste aspecto, com Aristóteles, que definia o sofista pelo “prazer de falar”.pelo “prazer de falar”.

Como se vê, o argumento sofistico conduz com maiorComo se vê, o argumento sofistico conduz com maior facilidade à vitória em um debate do que a longafacilidade à vitória em um debate do que a longa demonstração lógica. O sofisma, portanto, não é umdemonstração lógica. O sofisma, portanto, não é um caminho para a obtenção da verdade e sim umacaminho para a obtenção da verdade e sim uma ferramenta da sedução. Pode-se compreender, comferramenta da sedução. Pode-se compreender, com isto, que não se deve julgar as pessoas como se elasisto, que não se deve julgar as pessoas como se elas fossem iguais, mesmo porque elas não são. Deve-se,fossem iguais, mesmo porque elas não são. Deve-se,

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isto sim, ter uma regra básica para todos, de modo aisto sim, ter uma regra básica para todos, de modo a ficar estabelecido o ideal de justiça, mas aplicar asficar estabelecido o ideal de justiça, mas aplicar as atenuantes e agravantes ao que cada individuoatenuantes e agravantes ao que cada individuo apresenta.apresenta.

O objeto no discursoO objeto no discurso

Utilizam-se, no discurso, fatos e indícios. Fatos não seUtilizam-se, no discurso, fatos e indícios. Fatos não se discutem, porque é possível prova-los; indícios sãodiscutem, porque é possível prova-los; indícios são opiniões, e opiniões se discutem. O advogado utilizaopiniões, e opiniões se discutem. O advogado utiliza os indícios como elementos de sedução que permitamos indícios como elementos de sedução que permitam levar os jurados a presumir que o acusado sejalevar os jurados a presumir que o acusado seja criminoso. Com base nesses indícios, o grau decriminoso. Com base nesses indícios, o grau de certeza do julgamento não será absoluto. Analisados,certeza do julgamento não será absoluto. Analisados, um a um, de todos os modos de dominação que oum a um, de todos os modos de dominação que o homem inventou ao longo dos séculos parahomem inventou ao longo dos séculos para relacionar-se com seu próximo, nenhum é maisrelacionar-se com seu próximo, nenhum é mais eficiente do que o da manipulação dos sentidos. Pois,eficiente do que o da manipulação dos sentidos. Pois, como os mitos de sempre demonstram, só o que sabecomo os mitos de sempre demonstram, só o que sabe quer, só o que sabe pode, só o que sabe faz. E oquer, só o que sabe pode, só o que sabe faz. E o saber, ou seja, o conhecimento, só será possível asaber, ou seja, o conhecimento, só será possível a partir de provas. E provas provem de fatos, não departir de provas. E provas provem de fatos, não de indícios. E a realidade é que o Tribunal do Júriindícios. E a realidade é que o Tribunal do Júri trabalha com fatos, e não com indícios. Os fatos é quetrabalha com fatos, e não com indícios. Os fatos é que devem ser o objeto do discurso jurídico.devem ser o objeto do discurso jurídico.

A autoridade no discursoA autoridade no discurso

Como diz o personagem Humpty Dumpty a Alice, noComo diz o personagem Humpty Dumpty a Alice, no livro livro Alice no País das Maravilhas, Alice no País das Maravilhas, “a questão não é“a questão não é saber o que é que as palavras querem dizer, mas,saber o que é que as palavras querem dizer, mas, sim, saber quem é que manda”. Cumpre observar quesim, saber quem é que manda”. Cumpre observar que querer convencer alguém implica sempre certaquerer convencer alguém implica sempre certa modéstia da parte de quem argumenta. Ele admitemodéstia da parte de quem argumenta. Ele admite que deve persuadir, pensar nos argumentos queque deve persuadir, pensar nos argumentos que

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podem influenciar seu interlocutor, preocupar-se compodem influenciar seu interlocutor, preocupar-se com ele, interessar-se por seu estado de espírito. Jacquesele, interessar-se por seu estado de espírito. Jacques Maritain, no relatório Maritain, no relatório Democracia e Autoridade, Democracia e Autoridade, dádá duas definições de autoridade.duas definições de autoridade.

Ele chama de “autoridade” o direito de dirigir e deEle chama de “autoridade” o direito de dirigir e de comandar, de ser escutado ou obedecido peloscomandar, de ser escutado ou obedecido pelos outros; e de “poder” a força de que se dispõe e comoutros; e de “poder” a força de que se dispõe e com cuja ajuda se pode obrigar os outros a escutar ou acuja ajuda se pode obrigar os outros a escutar ou a obedecer. Todo poder que não é a expressão de umaobedecer. Todo poder que não é a expressão de uma autoridade é iníquo. Separar o poder da autoridadeautoridade é iníquo. Separar o poder da autoridade significa separar a força a força da justiça. Em nossosignifica separar a força a força da justiça. Em nosso mundo organizado, hierarquizado, existemmundo organizado, hierarquizado, existem geralmente regras que estabelecem como umageralmente regras que estabelecem como uma conversa pode iniciar-se, um acordo prévio resultanteconversa pode iniciar-se, um acordo prévio resultante das próprias normas da vida social.das próprias normas da vida social.

A emoção no discursoA emoção no discurso

Emoção designa em estado de excitação que englobaEmoção designa em estado de excitação que engloba um complexo de sentimentos ou sensações de origemum complexo de sentimentos ou sensações de origem interna, geralmente considerada mais ou menosinterna, geralmente considerada mais ou menos duradoura, de caráter intenso e que guarda certaduradoura, de caráter intenso e que guarda certa relação com propósito e motivação. Esta definição,relação com propósito e motivação. Esta definição, constante do constante do Dicionário de Ciências Sociais doDicionário de Ciências Sociais do Instituto de Documentação da Fundação GetulioInstituto de Documentação da Fundação Getulio Vargas, Vargas, vem contribuir para lembrar, neste trabalho,vem contribuir para lembrar, neste trabalho, algumas teorias sobre a emoção. As emoções sãoalgumas teorias sobre a emoção. As emoções são ocorrências da mente, e, portanto, somente quem asocorrências da mente, e, portanto, somente quem as experimenta pode conhecer a sua natureza. Oexperimenta pode conhecer a sua natureza. O advogado, como observador das emoções humanas,advogado, como observador das emoções humanas, pode relaciona-las com qualquer objeto externo parapode relaciona-las com qualquer objeto externo para atender a um propósito especial e especifico.atender a um propósito especial e especifico.

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Mas é o próprio Trein quem reconhece que, se asMas é o próprio Trein quem reconhece que, se as emoções podem prejudicar a imagem, podememoções podem prejudicar a imagem, podem também ser benéficas em plenário. Isto ocorre, eletambém ser benéficas em plenário. Isto ocorre, ele diz, quando elas expõem e reforçam, em estágiosdiz, quando elas expõem e reforçam, em estágios decisivos e fundamentais do discurso, a sinceridade edecisivos e fundamentais do discurso, a sinceridade e a dramaticidade das nossas palavras mais fortes. Ema dramaticidade das nossas palavras mais fortes. Em vez de passar ao júri a idéia de fraqueza, mostrando-vez de passar ao júri a idéia de fraqueza, mostrando-se abatido, ele pode estar transferido a impressão dese abatido, ele pode estar transferido a impressão de um profissional profundamente tocado pelo fato emum profissional profundamente tocado pelo fato em discussão, e que, portanto, é franco, é humano. Masdiscussão, e que, portanto, é franco, é humano. Mas seduzir não é, não deve ser, mentir. Nem sempre osseduzir não é, não deve ser, mentir. Nem sempre os advogados simulam estarem emocionados,advogados simulam estarem emocionados, acompanhando o estado de passionalismo dosacompanhando o estado de passionalismo dos julgadores. Às vezes, acreditam piamente que o réu éjulgadores. Às vezes, acreditam piamente que o réu é um herói injustiçado.um herói injustiçado.

Há os que mentem. Mas mentir emoções significaHá os que mentem. Mas mentir emoções significa transformar o plenário em uma opera bufa. E,transformar o plenário em uma opera bufa. E, infelizmente, os plenários estão cheios de atores einfelizmente, os plenários estão cheios de atores e atrizes simuladores da emoção. O objetivo dessesatrizes simuladores da emoção. O objetivo desses amantes do disfarce é conseguir, contaminando osamantes do disfarce é conseguir, contaminando os jurados, a decisão passional. A ampla defesa incita ajurados, a decisão passional. A ampla defesa incita a que os advogados lancem mão de numerososque os advogados lancem mão de numerosos recursos para satisfazer os interesses do réu. Arecursos para satisfazer os interesses do réu. A dualidade esta em que freqüentemente o advogadodualidade esta em que freqüentemente o advogado se encontre na situação de, ou utilizar esses recursos,se encontre na situação de, ou utilizar esses recursos, correndo o risco de mentir, ou aplique um discursocorrendo o risco de mentir, ou aplique um discurso estritamente técnico, correndo o risco de deixar deestritamente técnico, correndo o risco de deixar de praticar a ampla defesa, podendo ate prejudica-lo.praticar a ampla defesa, podendo ate prejudica-lo.

A imagem no discursoA imagem no discurso

Um julgamento mostrado em filme como os queUm julgamento mostrado em filme como os que mostramos no inicio deste trabalho, no capitulomostramos no inicio deste trabalho, no capitulo “Ávida desfila diante do júri”, tem todo o suporte da“Ávida desfila diante do júri”, tem todo o suporte da imagem, na dialética do texto e da imagem queimagem, na dialética do texto e da imagem que

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Roland Barthes pregava. E não só a imagem, mas aRoland Barthes pregava. E não só a imagem, mas a imagem trabalhada, iluminada, colorida, movente,imagem trabalhada, iluminada, colorida, movente, emotiva. Ao lado do enredo, a imagem formula oemotiva. Ao lado do enredo, a imagem formula o texto que contem e o texto que o espectador lha dá.texto que contem e o texto que o espectador lha dá. Tanto num caso quanto noutro, é a dialética texto-Tanto num caso quanto noutro, é a dialética texto-imagem que compõe a mensagem. Por esse motivo,imagem que compõe a mensagem. Por esse motivo, tecemos tantas considerações a respeito do gestual,tecemos tantas considerações a respeito do gestual, da postura, da expressão, dos recursos visuais,da postura, da expressão, dos recursos visuais, gráficos, exibição de trechos de vídeos etc. nográficos, exibição de trechos de vídeos etc. no tribunal, validam-se todas as ressalvas já citadastribunal, validam-se todas as ressalvas já citadas sobre o uso da imagem junto com o discurso.sobre o uso da imagem junto com o discurso.

CAPITULO VI – Júri, O Auditório Soberano do DiscursoCAPITULO VI – Júri, O Auditório Soberano do Discurso

O júri, no Brasil, é convocado somente para julgarO júri, no Brasil, é convocado somente para julgar crimes dolosos contra a vida. No modelo judiciáriocrimes dolosos contra a vida. No modelo judiciário norte-americano, crimes hediondos como estupro enorte-americano, crimes hediondos como estupro e seqüestro e mesmo casos de lesão corporal, sãoseqüestro e mesmo casos de lesão corporal, são passiveis também de julgamento por tribunais de júri,passiveis também de julgamento por tribunais de júri, o que não ocorre no Brasil. E quem compõe o júri noo que não ocorre no Brasil. E quem compõe o júri no Brasil? Gente comum, sorteada entre pessoas daBrasil? Gente comum, sorteada entre pessoas da comunidade, que terá o papel de juizes leigos. Oscomunidade, que terá o papel de juizes leigos. Os jurados se pronunciam sobre os fatos, e o juiz aplica ajurados se pronunciam sobre os fatos, e o juiz aplica a lei.lei.

A redação da Constituição vigente, de 1988, no artigoA redação da Constituição vigente, de 1988, no artigo 5º, parágrafo XXXVIII, mantém a instituição do júri5º, parágrafo XXXVIII, mantém a instituição do júri entre os direitos e garantias fundamentais,entre os direitos e garantias fundamentais, restabelece a soberania dos vereditos e define arestabelece a soberania dos vereditos e define a competência mínima dos julgadores, estabelecendocompetência mínima dos julgadores, estabelecendo como preceito constitucional e exclusivo, a relativacomo preceito constitucional e exclusivo, a relativa aos crimes dolosos contra a vida.aos crimes dolosos contra a vida.

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1)1) ANÁLISE DA CULPABILIDADE PRESUMIDAANÁLISE DA CULPABILIDADE PRESUMIDA

Determinados jurados, em razão de lembranças ou deDeterminados jurados, em razão de lembranças ou de experiências particularizados, personalíssimas,experiências particularizados, personalíssimas, transformam-se em verdadeiros filtros para atransformam-se em verdadeiros filtros para a recepção de qualquer tipo de linguagem. A oratóriarecepção de qualquer tipo de linguagem. A oratória utilizada nos debates deve cuidar para não despertarutilizada nos debates deve cuidar para não despertar esses adormecidos gigantes emocionais. Utilizandoesses adormecidos gigantes emocionais. Utilizando um exemplo mencionado por Trein, se o promotorum exemplo mencionado por Trein, se o promotor assevera energicamente: “O réu sempre seassevera energicamente: “O réu sempre se caracterizou pela covardia, bastando dizer que viviacaracterizou pela covardia, bastando dizer que vivia agredindo a companheira!”, talvez estejaagredindo a companheira!”, talvez esteja considerando que todos os jurados respeitem aconsiderando que todos os jurados respeitem a esposa. O que mostra que o assunto, ainda nãoesposa. O que mostra que o assunto, ainda não suficientemente esgotado, tem importância definitivasuficientemente esgotado, tem importância definitiva para o estabelecimento da verdade. A culpabilidadepara o estabelecimento da verdade. A culpabilidade presumida deve ser muito bem calculado, dentro daspresumida deve ser muito bem calculado, dentro das observações do orador a respeito da personalidadeobservações do orador a respeito da personalidade dos jurados.dos jurados.

2)2) ANÁLISE DE UM CRIMEANÁLISE DE UM CRIME

A análise do crime como fato psicossocial, queA análise do crime como fato psicossocial, que trazemos para apoiar em parte os argumentostrazemos para apoiar em parte os argumentos utilizados pela defesa, no caso jurídico mostrado peloutilizados pela defesa, no caso jurídico mostrado pelo filme filme Assassinato em Primeiro Grau, Assassinato em Primeiro Grau, foi exposta comfoi exposta com clareza por Nassif. É importante trazer à consideraçãoclareza por Nassif. É importante trazer à consideração esta abordagem do crime violento, porque aesta abordagem do crime violento, porque a justificativa histórica da violência tem raiz na religião.justificativa histórica da violência tem raiz na religião. Ora, o júri, como grupo social, tem influencia culturalOra, o júri, como grupo social, tem influencia cultural definitiva e marcante da religião, mas somente adefinitiva e marcante da religião, mas somente a partir do cristianismo primitivo, do qual um dospartir do cristianismo primitivo, do qual um dos princípios, era o seguinte:princípios, era o seguinte:

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“Todos os bons pensamentos,“Todos os bons pensamentos, todas as boas palavras, todas as boas ações eu ostodas as boas palavras, todas as boas ações eu os faço conscientemente. Todos os maus pensamentos,faço conscientemente. Todos os maus pensamentos, todas as más palavras, todas as más ações, eu ostodas as más palavras, todas as más ações, eu os faço inconscientemente”.faço inconscientemente”.

Nassif relata que, especialmente na Europa, nosNassif relata que, especialmente na Europa, nos séculos XVII a XIX, proliferam as prisões. Focaultséculos XVII a XIX, proliferam as prisões. Focault denominou este movimento de o “grandedenominou este movimento de o “grande confinamento”. Era um tempo em que persistia aconfinamento”. Era um tempo em que persistia a ignorância ou o desinteresse quanto ao atoignorância ou o desinteresse quanto ao ato emocional. Ele era simplesmente anti-social e/ouemocional. Ele era simplesmente anti-social e/ou antijurídico, e perigoso à sociedade ou ao Estado, eantijurídico, e perigoso à sociedade ou ao Estado, e deles deveria ser isolado. Por coincidência, foi nessedeles deveria ser isolado. Por coincidência, foi nesse mesmo período que se iniciou a investigação maismesmo período que se iniciou a investigação mais cuidadosa do comportamento do individuo a partir decuidadosa do comportamento do individuo a partir de avaliação psicossocial e/ou filosófica.avaliação psicossocial e/ou filosófica.

Trouxemos à luz estas considerações para esclarecerTrouxemos à luz estas considerações para esclarecer como foi longe, no tempo, na conceituação filosófica ecomo foi longe, no tempo, na conceituação filosófica e na abordagem cultural do povo norte-americano ona abordagem cultural do povo norte-americano o advogado Stamphill, no filme advogado Stamphill, no filme Assassinato em PrimeiroAssassinato em Primeiro Grau, Grau, ao lidar com a premissa de que o acusado nãoao lidar com a premissa de que o acusado não estava consciente de suas ações ao praticar oestava consciente de suas ações ao praticar o homicídio. A sedução, aqui, se dá em duas etapas. Ahomicídio. A sedução, aqui, se dá em duas etapas. A primeira tem a ver com o convencimento do júri, masprimeira tem a ver com o convencimento do júri, mas a segunda e paralela tem a ver com o convencimentoa segunda e paralela tem a ver com o convencimento do próprio acusado, que se recusava, por medodo próprio acusado, que se recusava, por medo absoluto de retaliação, a prosseguir com a acusaçãoabsoluto de retaliação, a prosseguir com a acusação contra o diretor do presídio. A análise psicológica docontra o diretor do presídio. A análise psicológica do crime e do criminoso, como se vê, não pode sercrime e do criminoso, como se vê, não pode ser negligenciada. Trata-se de uma das etapas maisnegligenciada. Trata-se de uma das etapas mais complexas do caminho que têm os advogados quecomplexas do caminho que têm os advogados que percorrer para seduzir o júri.percorrer para seduzir o júri.

3)3) A COMPOSIÇÃO DO CORPO DE JURADOSA COMPOSIÇÃO DO CORPO DE JURADOS

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No Brasil, é jurado potencial qualquer cidadão maiorNo Brasil, é jurado potencial qualquer cidadão maior de 21 anos e com menos de 60, de notóriade 21 anos e com menos de 60, de notória idoneidade, conforme o artigo 439 do Código deidoneidade, conforme o artigo 439 do Código de Processo Penal. Na forma desse artigo se processa oProcesso Penal. Na forma desse artigo se processa o alistamento dos jurados. Em seguida, passa-se àalistamento dos jurados. Em seguida, passa-se à análise da lista de jurados. O Ministério Público éanálise da lista de jurados. O Ministério Público é legalmente responsável por analisar a lista doslegalmente responsável por analisar a lista dos jurados e solicitar a exclusão de pessoas que nãojurados e solicitar a exclusão de pessoas que não contemplem o quesito “notória idoneidade”. A listacontemplem o quesito “notória idoneidade”. A lista dos jurados é publicada e os nomes dos juradosdos jurados é publicada e os nomes dos jurados colocados em cartões iguais que ficam guardados sobcolocados em cartões iguais que ficam guardados sob a responsabilidade do juiz. a responsabilidade do juiz.

Quando necessário, são sorteados 21 nomes emQuando necessário, são sorteados 21 nomes em solenidade de portas abertas, e a convocação é feitasolenidade de portas abertas, e a convocação é feita mediante edital. Dentre esses 21 jurados, sete delesmediante edital. Dentre esses 21 jurados, sete deles são novamente sorteados e comporão o Conselho desão novamente sorteados e comporão o Conselho de Sentença. Dos jurados sorteados, defensor e promotorSentença. Dos jurados sorteados, defensor e promotor poderão cada qual, a seu tempo, recusarpoderão cada qual, a seu tempo, recusar imotivadamente até três jurados, além daqueles dosimotivadamente até três jurados, além daqueles dos quais podem solicitar a exclusão por “impedimento ouquais podem solicitar a exclusão por “impedimento ou suspeição”, de acordo com o artigo 459 do Código desuspeição”, de acordo com o artigo 459 do Código de Processo Penal. São considerações pertinentes, queProcesso Penal. São considerações pertinentes, que encerram a questão da composição do corpo deencerram a questão da composição do corpo de jurados. Passemos agora à análise do júri dentro dojurados. Passemos agora à análise do júri dentro do processo de julgamento.processo de julgamento.

4)4) O JULGAMENTOO JULGAMENTO

Iniciado o julgamento, as testemunhas de acusação eIniciado o julgamento, as testemunhas de acusação e de defesa são mantidas afastadas umas das outras,de defesa são mantidas afastadas umas das outras, recolhidas a um lugar de onde não possam ouvir osrecolhidas a um lugar de onde não possam ouvir os debates, nem as respostas umas das outras. Edebates, nem as respostas umas das outras. E interrogado o réu, e segue-se a leitura do relatório dointerrogado o réu, e segue-se a leitura do relatório do processo feito pelo juiz-presidente. A requerimentoprocesso feito pelo juiz-presidente. A requerimento

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das partes, pode ser feita a leitura das peças dosdas partes, pode ser feita a leitura das peças dos autos. Passa-se então à oitiva das testemunhas, e sóautos. Passa-se então à oitiva das testemunhas, e só então se procedem aos debates, com as palavras daentão se procedem aos debates, com as palavras da promotoria e a manifestação da defesa, ambas compromotoria e a manifestação da defesa, ambas com tempo de duas horas para a sustentação dastempo de duas horas para a sustentação das respectivas razões. O acusado pode replicar e arespectivas razões. O acusado pode replicar e a defesa, por sua parte, treplicar, com o tempo de meiadefesa, por sua parte, treplicar, com o tempo de meia hora cada um. Esta é a regra para os julgamentos emhora cada um. Esta é a regra para os julgamentos em que há apenas um réu.que há apenas um réu.

Assim, finalizados os debates, o juiz indagara dosAssim, finalizados os debates, o juiz indagara dos jurados se estão habilitados a julgar ou se necessitamjurados se estão habilitados a julgar ou se necessitam de mais esclarecimentos. O juiz, em seguida, fazde mais esclarecimentos. O juiz, em seguida, faz retirar-se o réu e convida o auditório a deixar a sala.retirar-se o réu e convida o auditório a deixar a sala. Os jurados se retiram para uma sala secreta,Os jurados se retiram para uma sala secreta, conforme manda o artigo 481 do C.P.P., ondeconforme manda o artigo 481 do C.P.P., onde responderão aos quesitos elaborados pelo juiz. Aresponderão aos quesitos elaborados pelo juiz. A partir das respostas dos jurados a estes quesitos,partir das respostas dos jurados a estes quesitos, cabe ao juiz elaborar a sentença.cabe ao juiz elaborar a sentença.

5)5) ARGÜIÇÃO DE NULIDADESARGÜIÇÃO DE NULIDADES

A sentença poderá ser anulada, segundo dispõe oA sentença poderá ser anulada, segundo dispõe o artigo 564 do Código de Processo Penal. O artigo 564artigo 564 do Código de Processo Penal. O artigo 564 do Código de Processo Penal ainda prevê, emdo Código de Processo Penal ainda prevê, em parágrafo único, que ocorrera a nulidade porparágrafo único, que ocorrera a nulidade por deficiência dos quesitos ou das respostas, e adeficiência dos quesitos ou das respostas, e a contradição entre estas. Sobre a repetição da votaçãocontradição entre estas. Sobre a repetição da votação em caso de contradição na resposta dos quesitos, oem caso de contradição na resposta dos quesitos, o Código de Processo Penal trata também no artigoCódigo de Processo Penal trata também no artigo 4879.4879.

6)6) BREVE HISTÓRICOBREVE HISTÓRICO

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Quase todos os estudiosos do Direito apontam oQuase todos os estudiosos do Direito apontam o surgimento do júri na Inglaterra, quando foi abolidosurgimento do júri na Inglaterra, quando foi abolido pelo Concilio de Latrão (ano 1215) o chamado “juízopelo Concilio de Latrão (ano 1215) o chamado “juízo de Deus”. Os juízos de Deus eram verdadeirasde Deus”. Os juízos de Deus eram verdadeiras torturas. O Concilio de Latrão utilizou uma outratorturas. O Concilio de Latrão utilizou uma outra convicção religiosa para estabelecer o júri. Segundo aconvicção religiosa para estabelecer o júri. Segundo a crença da época, em lembrança ao Espírito Santo quecrença da época, em lembrança ao Espírito Santo que se apresentou aos doze apóstolos de Cristo, quandose apresentou aos doze apóstolos de Cristo, quando doze homens de consciência pura se reuniam sob adoze homens de consciência pura se reuniam sob a invocação divina, a verdade infalivelmente seinvocação divina, a verdade infalivelmente se encontrava entre eles.encontrava entre eles.

No entanto, algumas características parecem indicarNo entanto, algumas características parecem indicar que o júri já existia em algumas regiões da Europa. Éque o júri já existia em algumas regiões da Europa. É o caso, por exemplo, dos “heliastas” da Grécia, queo caso, por exemplo, dos “heliastas” da Grécia, que eram presididos por um magistrado e decidiam deeram presididos por um magistrado e decidiam de fato e de direito, e, em Roma, dos fato e de direito, e, em Roma, dos judices jurati,judices jurati, tribunais populares. Da Inglaterra, o júri espalhou-setribunais populares. Da Inglaterra, o júri espalhou-se pela Europa graças à Revolução Francesa de 1789,pela Europa graças à Revolução Francesa de 1789, mas assumiu, na França e na Itália, caráter misto,mas assumiu, na França e na Itália, caráter misto, pois era composto de leigos e juizes togados. Nospois era composto de leigos e juizes togados. Nos Estados Unidos, por sua vez, colônia britânica, o Estados Unidos, por sua vez, colônia britânica, o juryjury assumiu características mais populares e maisassumiu características mais populares e mais abrangentes, especialmente como forma de oposiçãoabrangentes, especialmente como forma de oposição ao Reino Unido, aproximando-se assim do modeloao Reino Unido, aproximando-se assim do modelo francês.francês.

Dessa forma, são dois os modelos de júri no mundo,Dessa forma, são dois os modelos de júri no mundo, hoje. O britânico, no qual os jurados decidem de “fatohoje. O britânico, no qual os jurados decidem de “fato e de direito”, respondendo a um único quesitoe de direito”, respondendo a um único quesito (culpado ou não culpado), e o francês, em que os(culpado ou não culpado), e o francês, em que os jurados só decidem de “fato”, cabendo ao juiz togado,jurados só decidem de “fato”, cabendo ao juiz togado, com base nos votos dos leigos, aplicar o direito.com base nos votos dos leigos, aplicar o direito.

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O júri no BrasilO júri no Brasil

No Brasil vigora o sistema francês, instituído peloNo Brasil vigora o sistema francês, instituído pelo príncipe Dom Pedro, então regente, pouco antes dapríncipe Dom Pedro, então regente, pouco antes da proclamação da independência, em 18 de junho deproclamação da independência, em 18 de junho de 1822, com o objetivo único de punir excessos da1822, com o objetivo único de punir excessos da imprensa nacional. A partir daí, o sistema passou porimprensa nacional. A partir daí, o sistema passou por muitas alterações, tendo sido inclusive extinto pelamuitas alterações, tendo sido inclusive extinto pela Carta de 1937. Hoje, é reconhecido em nosso paísCarta de 1937. Hoje, é reconhecido em nosso país como direito e garantia fundamental pela Constituiçãocomo direito e garantia fundamental pela Constituição de 5 de outubro de 1988 (artigo 5º, inciso XXXVIII)de 5 de outubro de 1988 (artigo 5º, inciso XXXVIII)

CAPITULO VII – Discurso e SeduçãoCAPITULO VII – Discurso e Sedução

Os debates no plenário do júri provocam as maisOs debates no plenário do júri provocam as mais desencontradas paixões, tanto por parte dos críticosdesencontradas paixões, tanto por parte dos críticos quanto dos defensores da instituição. O que retiramosquanto dos defensores da instituição. O que retiramos desta nossa pesquisa? Em suma, que a justiça padecedesta nossa pesquisa? Em suma, que a justiça padece da influencia da sedução, voluntária ou involuntária,da influencia da sedução, voluntária ou involuntária, das pessoas envolvidas no processo penal. O Direito,das pessoas envolvidas no processo penal. O Direito, dissemos, não é uma ciência exata. A busca dadissemos, não é uma ciência exata. A busca da verdade real, típica do processo penal, esbarra naverdade real, típica do processo penal, esbarra na verdade do individuo, ou na verdade latente masverdade do individuo, ou na verdade latente mas escondida sob a aparência de mentira. Quem seduzescondida sob a aparência de mentira. Quem seduz induz. Quem seduz conduz. Quem seduz deduz. Queminduz. Quem seduz conduz. Quem seduz deduz. Quem seduz aduz.seduz aduz.

É licito, então, presumir que a sedução pode se dar aÉ licito, então, presumir que a sedução pode se dar a favor ou contra uma decisão. O que reproduzimosfavor ou contra uma decisão. O que reproduzimos aqui poderia estar sob um titulo especifico de “Manualaqui poderia estar sob um titulo especifico de “Manual da Sedução num Tribunal de Júri”. Exemplos deda Sedução num Tribunal de Júri”. Exemplos de atitudes de sedução, positivas ou negativas, foramatitudes de sedução, positivas ou negativas, foram

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disseminados ao longo deste trabalho. A verificaçãodisseminados ao longo deste trabalho. A verificação pratica do poder da sedução em tribunais do júri épratica do poder da sedução em tribunais do júri é simples e corriqueira. Poderíamos, comosimples e corriqueira. Poderíamos, como recomendava o velho pesquisador Mario de Andrade,recomendava o velho pesquisador Mario de Andrade, utilizar a “técnica da disseminação e recolha”,utilizar a “técnica da disseminação e recolha”, trazendo para este capitulo as considerações todastrazendo para este capitulo as considerações todas que foram feitas ao longo do trabalho. Por amor àque foram feitas ao longo do trabalho. Por amor à concisão, vamos somente relembrar o queconcisão, vamos somente relembrar o que detalhamos anteriormente.detalhamos anteriormente.

Mencionamos as conjunturas estruturais, morfológicasMencionamos as conjunturas estruturais, morfológicas e semióticas do discurso; analisamos o auditório comoe semióticas do discurso; analisamos o auditório como condicionante do teor do discurso; buscamos analisarcondicionante do teor do discurso; buscamos analisar os fatos que constituem o objeto do discurso;os fatos que constituem o objeto do discurso; discorremos acerca da autoridade de quem aplica odiscorremos acerca da autoridade de quem aplica o discurso; talvez um dos quesitos mais importantes,discurso; talvez um dos quesitos mais importantes, que é a emoção contida e trabalhada no discursoque é a emoção contida e trabalhada no discurso mereceu destaque neste trabalho; finalmentemereceu destaque neste trabalho; finalmente abordamos a questão visual, plástica, de quemabordamos a questão visual, plástica, de quem profere o discurso, e que impressão causará aprofere o discurso, e que impressão causará a imagem em quem recebe e assimila o discurso.imagem em quem recebe e assimila o discurso.

Nenhuma duvida parece perdurar a respeito do papelNenhuma duvida parece perdurar a respeito do papel decisivo e fundamental que exerce a exploração dadecisivo e fundamental que exerce a exploração da sedução nos debates de um tribunal de júri, tanto porsedução nos debates de um tribunal de júri, tanto por parte da defesa quanto por parte da acusação.parte da defesa quanto por parte da acusação. Nenhuma duvida parece perdurar, também, acerca doNenhuma duvida parece perdurar, também, acerca do fato de os advogados utilizarem conscientementefato de os advogados utilizarem conscientemente essa ferramenta, às vezes, lamentavelmente, comessa ferramenta, às vezes, lamentavelmente, com intenção declarada ou subjacente de conduzir para ointenção declarada ou subjacente de conduzir para o lado incorreto, a decisão do júri. Esperamos que estelado incorreto, a decisão do júri. Esperamos que este trabalho leve a uma profunda reflexão os profissionaistrabalho leve a uma profunda reflexão os profissionais do Direito e, oxalá, estudantes que desempenharãodo Direito e, oxalá, estudantes que desempenharão tarefas dentro do Direito, da Comunicação, datarefas dentro do Direito, da Comunicação, da Semiótica, da Psicologia Judiciária, no futuro.Semiótica, da Psicologia Judiciária, no futuro. Esperamos que eles considerem a pesquisa queEsperamos que eles considerem a pesquisa que

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desenvolvemos, em nome do Bem, da Verdade e dadesenvolvemos, em nome do Bem, da Verdade e da Justiça integral.Justiça integral.

Por fim, reconhecemos que uma tese que apreciasse,Por fim, reconhecemos que uma tese que apreciasse, como esta apreciou, o Poder da Palavra, poderia tercomo esta apreciou, o Poder da Palavra, poderia ter sido aplicada a qualquer ciência humana. Os signos,sido aplicada a qualquer ciência humana. Os signos, os símbolos, a linguagem oral e gestual, a linguagemos símbolos, a linguagem oral e gestual, a linguagem da pausa, do silêncio. A Comunicação como elementoda pausa, do silêncio. A Comunicação como elemento propulsor de uma tese a ser apresentada dentro depropulsor de uma tese a ser apresentada dentro de uma Ciência tradicional como o Direito. O discursouma Ciência tradicional como o Direito. O discurso analisado em seus meandros da emoção e da paixão.analisado em seus meandros da emoção e da paixão. O Tribunal do Júri não se restringe a elementosO Tribunal do Júri não se restringe a elementos puramente jurídicos. O discurso no Tribunal do Júripuramente jurídicos. O discurso no Tribunal do Júri aproveita elementos da Literatura, da Política, daaproveita elementos da Literatura, da Política, da Matemática. É híbrido. O Tribunal do Júri é um palcoMatemática. É híbrido. O Tribunal do Júri é um palco por definição. Um palco de sedução. E a palavra é apor definição. Um palco de sedução. E a palavra é a luz da ribalta. Que faz diferença, básica eluz da ribalta. Que faz diferença, básica e fundamental, para permitir que uma vida sigafundamental, para permitir que uma vida siga intocada, ou, ao contrario, ceda, esmoreça, sucumba,intocada, ou, ao contrario, ceda, esmoreça, sucumba, sob o peso da condenação.sob o peso da condenação.

Não adiante, em suma, o conhecimento afunilado dasNão adiante, em suma, o conhecimento afunilado das técnicas e dos jargões jurídicos. De nada valem atécnicas e dos jargões jurídicos. De nada valem a cultura puramente jurídica, ou o amplo conhecimentocultura puramente jurídica, ou o amplo conhecimento do Direito Penal e Processual Penal, ou ainda odo Direito Penal e Processual Penal, ou ainda o domínio sobre as legislações extravagantes. É precisodomínio sobre as legislações extravagantes. É preciso mais: o poder da palavra, o toque imponderável emais: o poder da palavra, o toque imponderável e intangível da sedução. A intenção deste trabalho nãointangível da sedução. A intenção deste trabalho não foi destruir a instituição do júri e nem fazer a suafoi destruir a instituição do júri e nem fazer a sua apologia, mas discutir os instrumentos de que ela seapologia, mas discutir os instrumentos de que ela se vale. Como já foi visto, o caráter sedutor do discursovale. Como já foi visto, o caráter sedutor do discurso das partes desempenha função essencial para adas partes desempenha função essencial para a aplicação do direito, superando em importância osaplicação do direito, superando em importância os testemunhos e as provas, à medida que conduz àtestemunhos e as provas, à medida que conduz à verdade dos jurados e não à verdade dos autos.verdade dos jurados e não à verdade dos autos.

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Cai, em tese, o axioma jurídico do Direito Penal, daCai, em tese, o axioma jurídico do Direito Penal, da verdade real. A verdade torna-se filha do discurso. Overdade real. A verdade torna-se filha do discurso. O discurso fascina, o discurso quer comprometerdiscurso fascina, o discurso quer comprometer ideologicamente o receptor. De acordo com a suaideologicamente o receptor. De acordo com a sua formação, preparo intelectual, ambiência cultural, oformação, preparo intelectual, ambiência cultural, o receptor pode sofrer influencia da sedução aplicadareceptor pode sofrer influencia da sedução aplicada pelo advogado ou pelo promotor à sua fala, nospelo advogado ou pelo promotor à sua fala, nos debates finais. A justiça é, então, refém do talento dedebates finais. A justiça é, então, refém do talento de cada indivíduo, porque o Direito, já sabe, não é umacada indivíduo, porque o Direito, já sabe, não é uma ciência exata. E a verdade, sabe também, não estaciência exata. E a verdade, sabe também, não esta circunscrita a um botão identificador pelo seu nome,circunscrita a um botão identificador pelo seu nome, ao qual basta apertar para que surja, límpida, paraao qual basta apertar para que surja, límpida, para quem clamou por ela. Ela tem que surgir dasquem clamou por ela. Ela tem que surgir das verdades de cada um, formando um painel deverdades de cada um, formando um painel de verdades, um mosaico de impressões que, reunidas,verdades, um mosaico de impressões que, reunidas, apóiam decisão de qual verdade é aquela queapóiam decisão de qual verdade é aquela que privilegiara a Justiça.privilegiara a Justiça.

CONCLUSÃOCONCLUSÃO

“A Sedução no Discurso”, de Gabriel Chalita, é talvez“A Sedução no Discurso”, de Gabriel Chalita, é talvez uma das obras sobre o tema “sedução” mais ativo euma das obras sobre o tema “sedução” mais ativo e eficaz dos nossos dias. Temos que nos render a elaeficaz dos nossos dias. Temos que nos render a ela mais vezes do que provavelmente suspeitamos. Elamais vezes do que provavelmente suspeitamos. Ela seduz o nosso sentidos e a nossa mente acariciando-seduz o nosso sentidos e a nossa mente acariciando-nos com as suas mensagens, colocações, exemplosnos com as suas mensagens, colocações, exemplos atuais e fictícios, despertando os meus mais secretosatuais e fictícios, despertando os meus mais secretos

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desejos, que é, um dia, estar diante de um Tribunaldesejos, que é, um dia, estar diante de um Tribunal do Júri, defendendo uma tese na ânsia de inocentardo Júri, defendendo uma tese na ânsia de inocentar alguém, ou até, defendendo a verdade e a justiça.alguém, ou até, defendendo a verdade e a justiça.

Chalita fala da linguagem de sedução e penso nesteChalita fala da linguagem de sedução e penso neste conceito como um conceito alargado que abrangeconceito como um conceito alargado que abrange todos os processos psicológicos, ideológicos,todos os processos psicológicos, ideológicos, simbólicos, sociais, de gestação de sentido nasimbólicos, sociais, de gestação de sentido na aplicação do Direito. Trata-se, de fato, de umaplicação do Direito. Trata-se, de fato, de um processo semiótico complexo que me obrigou aprocesso semiótico complexo que me obrigou a inúmeras reflexões sobre todos os profissionais doinúmeras reflexões sobre todos os profissionais do Direito devido à importância e a maestria com que oDireito devido à importância e a maestria com que o autor demonstrou.autor demonstrou.

Sabia já que há muito, que o poder contido numSabia já que há muito, que o poder contido num discurso podia significar a vitória ou a derrota, issodiscurso podia significar a vitória ou a derrota, isso em varias profissões, principalmente no Direito, ondeem varias profissões, principalmente no Direito, onde a satisfação é ainda maior, pelo simples motivo dea satisfação é ainda maior, pelo simples motivo de você estar lidando com a Justiça e a Verdade. Graçasvocê estar lidando com a Justiça e a Verdade. Graças à linguagem, que é escorreita e a leitura fácil eà linguagem, que é escorreita e a leitura fácil e agradável, assim como os exemplos dos filmes sãoagradável, assim como os exemplos dos filmes são trabalhados, o livro ganhou uma dinâmica muitotrabalhados, o livro ganhou uma dinâmica muito interessante, faz prender qualquer leitor que nãointeressante, faz prender qualquer leitor que não consegue parar de ler, curioso para saber qual será oconsegue parar de ler, curioso para saber qual será o próximo tema a ser debatido. próximo tema a ser debatido.

A Sedução no Discurso é, neste contexto, uns dosA Sedução no Discurso é, neste contexto, uns dos instrumentos, ou o mais importante até, para zelarinstrumentos, ou o mais importante até, para zelar pela sobrevivência do advogado, inserido numpela sobrevivência do advogado, inserido num sistema onde não basta o conhecimento jurídico, mas,sistema onde não basta o conhecimento jurídico, mas, acima de tudo, que o advogado tenha a habilidade naacima de tudo, que o advogado tenha a habilidade na arte de seduzir, para que ele possa assegurar quearte de seduzir, para que ele possa assegurar que aquilo que é justo, que é verdadeiro, ou até mesmoaquilo que é justo, que é verdadeiro, ou até mesmo correto, se produza e venha a tona nos Tribunais decorreto, se produza e venha a tona nos Tribunais de Júri desse país.Júri desse país.

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MARCO ANTONIO NADALIN PEIXOTO E RICARDOMARCO ANTONIO NADALIN PEIXOTO E RICARDO CÉSAR PIOTTOCÉSAR PIOTTO

RESUMO DA OBRA DE GABRIEL CHALITARESUMO DA OBRA DE GABRIEL CHALITA

A SEDUÇÃO NO DISCURSO: O PODER DA LINGUAGEMA SEDUÇÃO NO DISCURSO: O PODER DA LINGUAGEM NOS TRIBUNAIS DE JÚRINOS TRIBUNAIS DE JÚRI

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CURSO DE DIREITO DA UNIBAN – SBC - 2003 - 1º LCURSO DE DIREITO DA UNIBAN – SBC - 2003 - 1º L

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