a repÚblica abenÇoada de sÃo gonÇalo

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REPÚBLICA A ABENÇOADA DE SÃO GONÇALO Mauricio Mendes de Oliveira

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Obra do geógrafo e urbanista Mauricio Mendes de Oliveira que tenta traça um panorama das forças religiosas na política gonçalense nas últimas décadas. Prefácio de Helcio Albano. Publicado pela Editora Apologia Brasil

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REPÚBLICAA“

ABENÇOADADE SÃO GONÇALO

Mauricio Mendes de Oliveira

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Copyright © by Editora Apologia Brasil

ILUSTRAÇÃOMultidão, de Eduardo Cambuí Junior

EDITORAÇÃO ELETRÔNICAHelcio Albano

REVISÃOCristiana Souza

FOTOSAcervo Apologia Brasil

CAPAAutor desconhecido

OLIVEIRA, Mauricio Mendes de.

Cadernos do Leste nº 4, Org.: Helcio Albano, Edson Amaro, Mauricio Mendes - São Gonçalo/RJ,

Ed. Apologia Brasil, 2014.

50 páginas

1.Política. 2.Religião. 3.Cultura. 4.Cidadania-Leste Fluminense

Todos os Direitos Reservados

2014

APOIO CULTURAL

AB.004.3.2014/01

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literatura para a cidadania

ORGANIZAÇÃO

Helcio AlbanoMauricio MendesEdson Amaro

PUBLICAÇÃOEditora Apologia Brasil

[email protected]

ABRIL DE 2014Todos os Direitos Reservados

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sumário

A “república abençoada’ de São Gonçalo. 9

Apresentação. 7

O neopentecostalismo e o cotidiano em São Gonçalo. 22

As dimensões dos “delírios teocráticos”. 29

“Reforma Protestante posta ao avesso”. 34

Considerações Finais. 37

Referências. 41

Notas. 43

Antecedentes. 11

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APRESE

NTAÇÃO

HELCIO ALBANO

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O peso do voto religioso

Atualmente no Brasil - e em São Gonçalo em particular - é impossível não colocar nos cálculos eleitorais o peso do voto religioso, disputado mui-tas das vezes de modo fratricida de lado a lado do espectro ideológico, à direita e à esquerda.

A participação religiosa na política não é um fenô-meno novo, haja vista o PT ter em seu DNA um forte componente católi-co a partir das organizações de base da Igreja e do que restou da Teologia da Libertação. E fora outros partidos criados com orientação francamente religiosa e cristã após a redemocratização. Porém, algo de mais intenso surgiu nos anos de 1990 com o fortalecimento e expansão do pentecos-talismo e do neopentecostalismo à moda brasileira, atingindo em cheio a correlação de forças políticas e eleitorais a partir de então.

É nisso que o professor, geógrafo e urbanista Mauricio Mendes Olivei-ra se debruça, fazendo um recorte espacial bem definido que abrange a cidade de São Gonçalo e, claro, sem esquecer de contextualizar o presente e o passado, experiências alheias e domésticas, para quem vive na cidade e acompanha o desenrolar político da contemporaneidade.

Na obra, estão presentes figuras bastante conhecidas do mundo político do município, como a ex-prefeita Aparecida Panisset e o atual Neilton Mulim, os dois abertamente identificados com o protestantismo evangé-lico. Em relação a primeira, Oliveira faz uma análise profunda dos seus dois governos (2005/2008 e 2009/2012) e como a mandatária da cidade montou uma máquina eleitoral usando-se de estratagemas administrativos de óbvio favorecimento à sua clientela, até a criação de uma inacreditável e improvável secretaria “para assuntos religiosos”.

A obra é recheada de referências notárias e bibliográficas, desde já transformando-a numa grande fonte de reflexão e pesquisa.

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A “República Abençoada de São Gonçalo”: Considerações sobre o crescimento do fundamentalismo religioso na Região

Metropolitana do Rio de Janeiro no início do Século XXI.

MAURICIO MENDES DE OLIVEIRA [1]

A liberdade de credo enquanto afirmação do estado democrático de direitos

De acordo com dados coletados pelo Instituto de Geografia e Estatísti-ca (IBGE) durante o censo de 2010, a atual religiosidade dos brasileiros se distribui da seguinte forma: católicos apostólicos romanos 73,6%; evangélicos (ou protestantes) 15,4%; espíritas (kardecistas, umbandistas, candomblecistas e outras crenças “populares”) 1,6%; sem religião,7,4% e outras (religiões menores, agnósticos, ateus,etc.) 1,8% [2]. Esses dados revelam que o catolicismo romano ainda é a religião predominante, a despeito do veloz e intenso crescimento do protestantismo (sobretudo das correntes neo-pentecostais) nos últimos trinta (30) anos. Apesar de corres-ponder a 15,4% dos fiéis brasileiros (englobando diversas denominações), o protestantismo vem emergindo bem mais do que o novo segmento religioso, e sim, como uma segmento político cada vez mais influente. Não que a Igreja Católica deixe ainda de influir nos destinos do pais, mas o seu projeto pastoral se construiu de acordo com a dinâmica colonial [3].

Para se ter uma ideia da emergente força política dessas denominações,

importantes lideranças políticas como Anthony Garotinho (deputado fe-

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deral) e Marcelo Crivella (senador da república), não se fazem de rogados de declarar publicamente a sua fé no evangelho e associá-lo aos seus pro-jetos políticos, ou seja, as políticas públicas que vão do “restaurante popu-lar” até o “cheque cidadão” são anunciadas com leves pitadas de citações bíblicas. A reboque desses parlamentares - e outros de menor prestígio -, lideranças comunitárias e um número cada vez maior de militantes vêm reproduzindo uma perigosa simbiose entre política e religião, que abre a possibilidade para a contestação do estado laico, que foi consagrado pelos ideais iluministas há quase trezentos anos. A propósito, o caráter laico do estado brasileiro está garantido na constituição, e em seu artigo 5º, incisos VI, VII e VIII é garantida aos cidadãos a liberdade de credo e sua livre manifestação. (BRANDÃO DE OLIVEIRA, 2000).

O crescimento das igrejas pentecostais vem se manifestando em uma

nova onda de perseguição e cerceamento a outros credos, sobretudo os de matrizes afrobrasileiras, que não é uma novidade, pois desde a colônia a Igreja Católica jamais deixou de reprimir tais crenças, mas que produziu um sincretismo religioso que com o tempo foi estabelecendo uma tolerân-cia e convívio relativamente pacíficos entre o catolicismo e as religiões populares. No caso do protestantismo, isso não vem acontecendo, pois o espiritismo, a umbanda e o candomblé vêm sendo atacados de forma recorrente pelos evangélicos não só na mídia como no cotidiano também, incluindo a invasão de terreiros e agressões aos seus fiéis. Essas ações se configuram em uma clara violação da Carta Magna, e, portanto, passí-vel de sanções por parte do Estado. No entanto, os pastores com os seus mandatos parlamentares e os seus prosélitos, vêm cada vez mais se esta-belecendo nas instâncias jurídicas do país, e assim, tendem a influenciar a legislação ao seu favor.

Para se mensurar o desafio ao estado democrático de direitos que está

lentamente em curso nesse país, recentemente o pastor e deputado federal (de tendências de ultradireita) Marco Feliciano do PSC/SP, que não teve nenhum pudor de atacar segmentos LGBT e afirmar que os “negros estão condenados ao inferno”, foi alçado através de nebulosos acordos polí-ticos ao comando da Comissão Federal dos Direitos Humanos, ou seja, todas as lutas populares contra grupos de extermínio, grupos neofascistas,

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enfim, grupos que perseguem as minorias, têm um porta voz em uma instância que deveria combatê-los! Esse episódio é um sinal de alerta para os movimentos sociais que pretendem manter e aperfeiçoar as conquistas democráticas tão duramente arrancadas após vinte e um anos de ditadura militar e sua continuidade no governo Sarney, ou seja, não podemos assis-tir passivamente a lenta construção de uma teocracia em nome de alianças voltadas para sustentar um governo.

Segundo Roberto da Matta, a variedade religiosa no Brasil é ampla e li-

mitada ao mesmo tempo: ampla por que além dos credos cristãos (catoli-cismo e protestantismo) coexistem ritos africanos, orientais e ameríndios, e limitada, porque todas convergem para a comunicação entre o homem e “Deus” ou os “deuses”(DA MATTA,1988,p.14). De acordo com essa reflexão, a convivência entre credos pode ser o ponto de partida para uma democratização ampla, em que o multiculturalismo abra a possibilidade para uma equidade social autêntica, onde todos se respeitem.Todavia, embora estejamos vivendo em pleno regime democrático, a nossa demo-cracia ainda é frágil, em que forças conservadoras do atraso civilizatório ainda espreitam possibilidades visando o retorno ao poder, e as con-gregações pentecostais são hoje o segmento mais útil para atingir esses sinistros fins. Mas o crescimento do fundamentalismo cristão não se deu por “mágica” pois ocorreram nos últimos trinta anos condições para a sua edificação. É o que vamos expor ao longo desse ensaio..

Antecedentes: A redemocratização do Brasil e a derrota da Teologia da Libertação.

O protestantismo está presente no Brasil desde os tempos coloniais: no

longínquo século XVI, os franceses quando tentaram edificar a “colônia da França Antártica”, e os holandeses, durante a ocupação do nordeste no século XVII, eles estabeleceram igrejas protestantes em seus efêmeros domínios. De acordo com estudos de Alderi Sousa de Matos, os protes-tantes franceses (conhecidos como “huguenotes”) realizaram o primeiro culto no Brasil - talvez das Américas - em 10 de março de 1557, na Ilha

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de Villegagnon. (http://old.thirdmill.org). Com a expulsão dos franceses pelos portugueses, o protestantismo não vingou na América portuguesa [4]. Quanto aos holandeses, as igrejas eram apenas para atender as suas necessidades espirituais, sem qualquer intenção de evangelização, pois a colonização holandesa era exercida pela Companhia das Índias Ociden-tais e não pelo governo, e assim, o objetivo principal era o comércio e o lucro através da produção, refino e distribuição do açúcar nordestino.

Somente no século XIX, os protestantes ganhariam no Brasil a liberda-

de de culto graças ao acordo de comércio e navegação de 1810 com os ingleses, que previa tal prerrogativa em suas cláusulas. Ainda assim, eles foram chegando timidamente no curso do século e dividiam-se em “pro-testantes missionários” e “protestantes de imigração”, não contestando em momento algum o predomínio do catolicismo no país, seja durante o império e na maior parte do regime republicano no século XX. (MATOS, s/d.). Investigações mais aprofundadas de Mônica Sampaio Machado dão conta de que embora se reconhecessem enquanto minorias em uma nação predominantemente católica, os protestantes começaram a se organizar efetivamente através da Congregação Cristã do Brasil e Assembléia de Deus. A primeira nasce da cisão dos presbiterianos em 1911 no bairro paulistano do Brás, e a segunda, da dissidência dos Batistas no mesmo ano na cidade de Belém, no Pará. (MACHADO & NACIF, s/d.)

Na metade do século XX, especificamente em 1950, surgem às con-

gregações “Evangelho Quadrangular” e “Brasil para Cristo”, e dez anos depois surgem diversas congregações pentecostais menores que se ex-pandirão na década seguinte, e dentre elas, a Igreja Universal do Rei-no de Deus. Finalmente nos anos 1980, as igrejas protestantes iniciam efetivamente uma massiva conversão, atingindo setores significativos da população dentro de uma conjuntura transitiva e transformadora que irá influenciar os últimos anos do século XX exposta abaixo:

1º: a ditadura militar vivia os seus últimos momentos, não só em função do retorno das intensas manifestações populares, quanto pelo desgaste interno entre oficiais da “linha dura” e oficiais comprometidos com uma abertura “lenta, gradual e segura”;

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2º: os ideais marxistas começam a ser questionados no leste europeu e na própria União Soviética, devido ao fracasso do estabelecimento de uma sociedade democrática e uma crônica estagnação econômica;

3º: o neoliberalismo começa a ser aplicado na América Latina, tendo o Chile como “laboratório” e respaldado pela terrível ditadura do Gene-ral Pinochet e seus assessores econômicos conhecidos como “Chicago Boys”, onde de forma pioneira, aplicou-se a ideologia do “estado míni-mo” e a privatização das empresas estatais;

O declínio do regime policial abriu a oportunidade para o ressurgimento

dos movimentos sociais (sindicatos, associações de moradores, diretó-rios acadêmicos, etc). Assim, os sindicatos voltaram a lutar por melhores salários e condições de trabalho; no campo, a luta pela reforma agrária volta a ganhar fôlego; as federações, associações e sociedades de morado-res passam a lutar pelo direito à moradia e infraestrutura urbana nas agora “caóticas” periferias; os diretórios e grêmios estudantis deixam a clan-destinidade e passam a protestar contra a péssima qualidade do ensino e da precária infraestrutura das escolas; e como grande novidade, surgem movimentos e organizações voltadas à defesa do meio ambiente, além das entidades do terceiro setor (ONGs e Oscips) como resposta ao neolibe-ralismo que advoga um estado apenas fiscalizador da economia. Mesmo com o ideário marxista (comunista e socialista) em refluxo, o capitalismo permaneceu sendo denunciado.

Nesse contexto de redemocratização e transformações, clérigos progres-

sistas que haviam sofrido diretamente a repressão do estado policial (in-clusive muitos torturados e mortos) em fins dos anos 1960 e no decorrer dos anos 1970, desenvolveram uma reflexão teológica que se propunha a construir um engajamento político com a fé, cujo objetivo era uma apro-ximação mais estreita com setores tidos como subalternos na sociedade. (SOARES, 2007). Segundo o padre Leonardo Boff, tratava-se de questio-nar o capitalismo através dos princípios do cristianismo primitivo, toman-do por base a aliança histórica entre o povo brasileiro e a igreja católica. Tal reflexão ficou conhecida como “Teologia da Libertação”, que se de-senvolveu em toda a América Latina em uma conjuntura particularmente

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difícil: entre 1960 e 1990, ou seja, em um período de três décadas em que o continente fora assolado por ditaduras militares e governos pessoais apoiados pelos EUA e que atingiram o seu grau máximo de autoritarismo e repressão [5].

Dentre os resultados obtidos através da atuação da Teologia da Liberta-

ção, o Movimento dos Sem-Terras (MST) foi criado em 1984 por traba-lhadores rurais vinculados ao catolicismo, e apesar da violência da UDR (União Democrática Ruralista), da expansão do “agronegócio” e dos “transgênicos”, o movimento existe até hoje, embora fragmentado. Esse êxito abria a possibilidade de retorno dos fiéis ao seio da igreja, inclusive levando em consideração os aspectos populares que o cristianismo foi absorvendo durante os cinco séculos de colonialismo e neocolonialismo, ou seja, era um projeto de uma igreja inclusiva, onde as tradições popu-lares (dentre estas o sincretismo) em vez de reprimidas seriam reconhe-cidas enquanto cultura popular, de acordo com as reflexões de Roberto da Matta. (MATTA, 1981). Considerando que a Igreja Católica no Brasil sempre esteve ao lado do estado e das suas classes dominantes, a Teologia da Libertação representava sem dúvida uma significativa ruptura.

No entanto, mais do que a repressão do estado castrense, a reação a essa

tentativa de transformação sócio-teológica partiu de setores conserva-dores da Igreja Católica, como a “Opus Dei’, a TFP (Tradição, Família, Propriedade) e da própria cúria romana: o Papa João Paulo II acusou os teólogos libertários de promover a criação de células comunistas através das Comunidades Eclesiais de Base. O Papa era polonês e sentiu durante a sua existência o peso da ocupação nazista durante a Segunda Guerra Mundial e a tutela soviética durante a Guerra Fria, e por isso, apoiou des-de a primeira hora a luta do sindicato polonês independente “Solidarieda-de” e o combate sistemático ao comunismo. Embora os países latinoame-ricanos estivessem sob o mesmo tipo de tutela por parte dos EUA, João Paulo II não titubeou em combater qualquer teologia - por mais leve que fosse - próxima ao marxismo. De certo modo, o combate à Teologia da Libertação foi tratado como parte do conflito leste-oeste naquela conjun-tura histórica [6].

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Para os cardeais proeminentes encastelados no micro-estado do Vatica-no, a Teologia da Libertação foi abertamente considerada herética devido à associação do cristianismo com o marxismo. Argumentavam que tal doutrina era incompatível com a doutrina católica por se em essência materialista e ateia, e, portanto, a ideia “que só é possível alcançar a re-denção cristã com um compromisso político” foi rejeitada energicamente pela Cúria Romana. O então cardeal Ratzinger (o futuro Papa Bento XVI) foi incisivo na desconstrução dos argumentos da Teologia da Libertação, condenado os seus membros (dentre eles Leonardo Boff) ao “silêncio” e justificou-se declarando que:

“... Sem resposta para a fome de verdade, sem cura das doenças da alma ferida porcausa da mentira ou, numa palavra, sem a verdade e sem Deus, o homem nãopode se salvar. Aqui descobrimos a essência do demônio. Deus é um luxo dosRicos. “Segundo ele, a única coisa decisiva é o pão e a matéria.” Ratzinger.

O estado do Vaticano não titubeou em destruir essa experiência de um

catolicismo popular que procurava resgatar os fiéis sob um novo enfo-que, sem a tutela das autoritárias elites latino-americanas que por séculos usaram “a espada, a cruz e a fome” como corolários para fins discrimina-tórios e excludentes que até hoje condenam vastas populações a baixa au-toestima. E assim, encerraram-se as aspirações dos religiosos progressis-tas que ousaram aproximar a Igreja Católica às classes subalternas e, não satisfeitos em desmoralizá-los, a cúpula dos cardeais que formam a Cúria Romana concedeu “carta branca” a atuação na América Latina da “Reno-vação Carismática Católica”, fundada pelo padre jesuíta norte-americano Harold Han em 1968. Esse segmento da Igreja Católica vem agregando fiéis desde os anos 1990, e se foi eficaz para desbaratar definitivamente os resquícios da Teologia da Libertação, não tem tido o mesmo sucesso para conter o fundamentalismo cristão das igrejas pentecostais.

Os alicerces para a ascensão do fundamentalismo cristão: O neoli-beralismo, a pós-modernidade e a globalização.

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A desqualificação da Teologia da Libertação e as suas aspirações para a construção de um “cristianismo popular”, de certo modo pavimentou os caminhos para o crescimento exponencial do neopentecostalismo na América latina, sobretudo no Brasil, que coincidiu com a queda dos regi-mes “ditos” socialistas no Leste Europeu, o colapso da União Soviética, bem como a afirmação das teorias do neoliberalismo, da pós-modernida-de e da globalização, enfim, uma nova conjuntura que representou para os adeptos do marxismo um desolador e preocupante retrocesso. A palavra mágica “Globalização” soava como um “abra-te-sésamo” para um novo mundo, onde doravante não haveria mais lugar para “ideologias falidas” (alusão a qualquer ideia de socialismo ou comunismo) e manifestações voltadas ao nacionalismo (que deveria ser substituída por uma pretensa “mentalidade global”), ou seja, o “fim da história” proposto enquanto dogma por Francis Fukuyama apontava para a vitória final do capitalismo e do neoliberalismo.

Na verdade, o então “vitorioso capitalismo” se apropriou da mensa-

gem internacionalista que o marxismo se pautou ao longo do século XX, apenas substituindo a palavra “Internacionalismo” por “Globalização”. Por fatores que não cabem ser analisados nesse ensaio, o socialismo não conseguiu superar os nacionalismos e a cultura popular no seu cotidiano, tendo em vista que não soube tirar proveito das novas tecnologias que foram se desenvolvendo durante a Guerra Fria, como exemplo, a tecno-logia da informação. Enquanto os marxistas pautavam as suas lutas sob uma cega lealdade ao PCUS ( Partido Comunista da União Soviética), sem levar em consideração as peculiaridades nacionais e locais, os neoli-berais vem desde os anos 1990 tentando desconstruir o nacionalismo e o localismo em nome de uma dita Globalização para poucos - muito poucos - utilizando os seus poderosos recursos midiáticos para estereotipar ou domesticar os seus aspectos culturais [7].

Nessa atmosfera reacionária e conservadora, os prosélitos do neolibera-

lismo se sentiam a vontade para pôr em prática as teses de Milton Fried-man, em que a teoria do “estado mínimo” se tornava uma realidade nas fusões entre transnacionais nos países centrais e a privatização de em-presas estatais nos países periféricos da América Latina e Leste Europeu.

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Um dos desdobramentos desse processo foi à superação da acumulação capitalista de tipo ”fordista” para um regime de acumulação capitalista “flexível”, onde a outrora imprescindível mão-de-obra (que incluía um “exército industrial de reserva”) utilizada até os anos 1980, não era mais necessária em uma conjuntura de expansão e aprimoramento tecnológico, que de certa forma estimulou a livre negociação entre patrões e empre-gados. A livre negociação e o surgimento de novos postos de trabalho ligados às novas tecnologias - sobretudo ligada à informática - provocou uma onda de “desemprego estrutural”.

O desemprego estrutural fora o resultado da falta de qualificação técnica

nessa conjuntura transitiva, além da ausência de tradição de negocia-ções trabalhistas em um continente marcado por séculos de escravismo, servidão e múltiplas modalidades de subempregos. No caso do Brasil em particular - ou melhor, nas suas metrópoles - o desemprego estrutural se manifestou na expansão do trabalho informal que vão desde a venda de produtos “piratas” até a constituição de cooperativas de transportes alter-nativos, mas também no trágico crescimento da criminalidade, especifica-mente em relação ao narcotráfico, abastecido por drogas produzidas nos países vizinhos e por armas descartadas pelo fim da Guerra Fria. Nesse contexto, os sindicatos perderam muito da sua importância, tendo em vis-ta que a sua capacidade de mobilização passou a ser minada, não só pela evasão de filiados, como também pelas reivindicações agora pontuais e de resultados [8].

O refluxo do ideal socialista e a ascensão neoliberal repercutiram no co-

tidiano, e a partir de então, uma geração de jovens desprovidos de utopias e de esperanças, não tem mais a pretensão de transformar o mundo, e sim, transformarem-se de acordo com a multiplicidade caleidoscópica que a ideologia da pós-modernidade lhe promete todos os dias através da mídia. A “febre’ de ser bem sucedido vem acompanhada pelo desprezo por aque-les que tiveram poucas (ou nenhuma) oportunidades na vida, e assim, o incêndio de um mendigo ou o linchamento de um transexual torna-se uma prática banal e vista por aqueles que gozam de mecanismos para o exercí-cio da impunidade, mera “brincadeira de adolescentes” [9]. É bem ver-dade que a internet, através das redes sociais, multiplica amizades verda-

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deiras e falsas por todo o planeta, como também abre a possibilidade para uma interação inédita entre os povos, onde se podem mobilizar milhões de pessoas para uma determinada causa. Teoricamente escrevendo.

A juventude outrora libertária, sonhadora e sensível à justiça social para

todos os povos já se encontra de cabelos brancos, e hoje, povoam as redes sociais comunidades de jovens que não tem o mínimo constrangimento em advogar a exclusão - ou mesmo o extermínio - de tudo e de todos que lhes pareçam errados, bizarros, feios e diferentes. Assim, do surgimento das “tribos urbanas” no final dos anos 1980 até as comunidades das redes sociais do início do século XXI, encontram-se diversos segmentos bem adaptados a pós-modernidade: de acordo com as investigações de Márcia Regina da Costa, os neonazistas “skinheads”, os fundamentalistas cristãos da “Comunidade Zadoque” e os nacionalistas “Carecas do ABC”, são tribos de direita, quanto aos remanescentes de esquerda (não necessaria-mente marxistas) encontram-se múltiplos grupos de “emos”, “punks”, “rastafáris”, ”metaleiros” e “neo-hippies”. (DA COSTA, 2001, P.52) [10].

A ótica utilitária de mundo fortaleceu entre os jovens um consumis-

mo sem freios que já era latente, sobretudo entre os situados nas classes médias. A facilidade de acesso às novíssimas tecnologias de comunicação digital os afastou da sua realidade cotidiana, e assim, boa parte deles ten-dem a um individualismo exacerbado, a um conservadorismo preocupan-te e o cultivo de ideais e observações mesquinhas. Os resultados são que uma fração de jovens hoje é muito sensível à corrupção, tendo em vista que vigora uma mentalidade de impunidade que incentiva práticas irres-ponsáveis e ilícitas. Desencantado, Frei Beto reconhece que é politica-mente incorreto em nossos dias, propagar ideais voltados a uma sociedade igualitária, em que haja oportunidade para todos, e prossegue afirmando:

“... A desconfiança da razão nos impele ao esotérico, ao espiritualismo de consumo imediato, a um hedonismo, consumista em progressiva ‘mia-mização’ de hábitos e costumes”. (FREI BETTO, 1997, P.45)

Quanto aos partidos e organizações de esquerda, estes jamais se refi-

zeram do impacto da queda do muro de Berlim e do fim da URSS. Na

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verdade, tal “falta de rumo” apenas reflete a ausência de projetos claros e concretos para a sociedade brasileira; sim, isso mesmo, pois durante todo o século XX apenas tentaram reproduzir as idéias dos seus pensadores e experiências externas em um ambiente periférico. Em investigações muito sábias, Emir Sader afirma que as três estratégias dos marxistas para “construir a revolução” (o reformismo democrátco, a guerra de guerrilhas e resistência ao neoliberalismo) não foram suficientes para o estabeleci-mento de uma teoria original, e no caso brasileiro, não houve um acúmulo das experiências transformadoras ocorridas em outros países. (SADER, 2009, P.93-157). À exceção do MST, que embora fragmentado, prossegue em sua luta contra o latifúndio e o agronegócio, os demais segmentos permanecem incapazes de propor alternativas novas que atraíam parcelas significativas da sociedade civil. [11]

De uma forma geral, uma fração importante de filiados aos partidos

socialistas nunca foi realmente marxista ou mesmo social-democrata, não só pelo fato que o pleno conhecimento dos pensadores marxistas sempre foi restrito no máximo a intelectuais orgânicos, como também, após o “refluxo do dito socialismo real”, muitos mostraram a sua verdadeira face, se entre-gando ao carreirismo e a todas as modalidades de fisiologismo, vistos pelos mais cínicos como “alianças estratégicas”. Assim, o discurso socialista e revolucionário caiu em descrédito perante muitos segmentos sociais orga-nizados (se é que tiveram crédito algum dia), sendo considerado panfletário para intelectuais não marxistas, ”exóticos” para segmentos sociais alternati-vos e incompreensíveis para o senso comum. Dessa forma, as organizações de esquerda além de continuar incapazes de formular teorias adequadas à nossa realidade, não têm condições para se opor às promessas metafísicas das igrejas pentecostais e/ou neopentecostais. [12]

Todos esses fatores escritos até aqui tentam revelar que o pentecosta-

lismo/neopentecostalismo cresceu (e vem crescendo) em uma conjuntura que lhe foi bastante favorável: se o neoliberalismo justifica a circulação total e sem restrições do capital, então os pastores têm o aval de decla-rar aos seus fiéis - os indivíduos economicamente falhos - que ficar rico não é pecado, e mais, aprofundam a tese calvinista que diz ser a pobreza material uma ofensa aos olhos de Deus; se a pós-modernidade justifica

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o individualismo como busca da felicidade, então os pastores dizem sem titubear que é preciso ter fé, ir regularmente à igreja, e é claro, pagar o dízimo, também conhecido como “oferta”, como forma de salvação e de certeza da felicidade. De forma mais incisiva, José Arbex Junior já em fins dos anos 1990 afirmava que os pastores neopentecostais sabiam (e sa-bem) muito bem fazer uso da fragilidade popular, pois em suas palavras:

“... Trata-se de uma mensagem em que nada difere dos livros de autoa-juda de Lair Ribeiro. Aos doentes, aos drogados, aos casais em crise, aos que tem a sua vida destruída por problemas familiares e profissionais, os pastores garantem a solução, com rituais cartáticos de exorcismo de satã, o grande inimigo, aquele que está por trás de todos os problemas, de todas as dúvidas e angustias... ”(ARBEX JUNIOR, 1998. P.115.)

Porém, tais mensagens não teriam o alcance desejado, se os protestantes

deixassem de utilizar um recurso que os partidos marxistas, e a esquerda progressista de modo geral, teimosamente abdicaram durante todo o sé-culo XX: a mídia eletrônica como forma de difusão dos seus valores. Em 1990, a IURD (Igreja Universal do Reino de Deus), cujo “proprietário” é o bispo Edir Macedo, adquiriu a TV Record por 45 milhões de dólares em circunstâncias nebulosas e não esclarecidas, e hoje, essa tradicional emis-sora (uma das primeiras instituições de comunicação do Brasil) está espa-lhada em rede por todo o território nacional. O poder midiático da IURD inclui ainda centenas de rádios AM e FM, um jornal impresso semanal e com distribuição gratuita, uma gravadora própria (a Line Records) para promoção de cantores gospel e uma revista de moda chamada Esther, ou seja, uma “transnacional da fé” já que está presente em outros continentes e em diversos países [13]. Lembramos que a própria Igreja Católica, que é parte de um estado constituído, com peso e relevância secular no Brasil, não edificou um conglomerado de midia com tamanha velocidade.

Apesar de dever o seu crescimento à derrota da Teologia da Libertação,

à desmoralização do socialismo e à ascensão do neoliberalismo, o neo-pentecostalismo nega a pós-modernidade, pois necessita de um contin-gente de indivíduos hipossuficientes para justificar a sua mensagem assis-tencialista espiritual, que a igreja católica e a renovação carismática em

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seu conservadorismo são incapazes de oferecer aos seus fiéis. De acordo com as avaliações de Zygmunt Bauman, na modernidade os ricos neces-sitavam dos pobres para fazê-los e mantê-los ricos e na pós- modernidade os novos ricos não precisam mais dos pobres. (BAUMAN, 119, P.80). O pentecostalismo no Brasil desmente a sua tese, pois em nível local, os evangélicos pobres não só ouvem mensagens de esperança, como tam-bém são incluídos - ainda que de forma tutelada - nas estruturas estatais e às suas ramificações nos movimentos sociais, expandido de forma expo-nencial o seu poder de barganha em todo o conjunto da sociedade.

A emergência do neopentecostalismo contesta as teses do neoliberalis-

mo, pois os pastores (quando alçados a parlamentares) se utilizam siste-maticamente da máquina estatal para distribuição de cargos e alocação de suas clientelas (pastores de terceiro escalão, ”obreiros’ e “militantes”); a negação a pós-modernidade se manifesta na sua intolerância a qualquer segmento diferente e com quem ouse contestá-los, e por fim, a própria globalização tem os seus limites em um contexto de fundamentalismo, pois os pastores apontam - ao menos no discurso - para o resgate dos valores familiares. Os objetivos de ampliar a sua influência nas instâncias do estado brasileiro já se manifestam com clareza: a dita “bancada evan-gélica” pretende influir no poder judiciário, através de proposta de emen-da 99/2011, com o fim de impor seus dogmas a toda a sociedade, ou seja, um atentado direto ao estado laico, e por extensão, uma ameaça concreta ao estado democrático de direitos.

A dita ‘bancada evangélica’ é composta por parlamentares de diversos

partidos, incluindo de orientação socialista e social-democrata como o PPS, PDT e mesmo o PSB, revelando que os aspectos ideológicos das suas respectivas agremiações nada significam, e sim, um corporativis-mo de lideranças religiosas que pretendem delirantemente interpretar os problemas brasileiros através da bíblia e não da constituição do país, e, respaldado nisso, por exemplo, o deputado João Campos do PSDB/GO apresentou uma PEC para que os princípios bíblicos fossem inseridos na carta magna. Os delírios desse dito presidente de uma bizarra FPE (Frente Parlamentar Evangélica) pode parecer mais uma das excentricidades que surgem no Congresso Nacional, porém é de bom tom manter a atenção,

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pois essa FPE e outras organizações evangélicas menores pretendem mes-mo propor ao STF (Superior tribunal Federal) ações voltadas à inconstitu-cionalidade de leis, abrindo a possibilidade de colocar ilegais credos que não sejam os seus [14].

Assim, a pós-modernidade não é necessariamente sinônimo de descon-

tinuidade histórica, pois se costuma esquecer que nesse dito “caleidos-cópio”, estão presentes tanto movimentos progressistas como o LGBT, quanto movimentos retrógrados surgidos dessa geleia geral do pentecos-talismo. A linearidade da história que durante muito tempo os marxistas acreditavam que era contínua, ou seja, nas suas palavras, “a roda da his-tória não anda para trás” foi desmentida pelo tempo, pois saímos de vinte e um anos de ditadura, vivemos hoje um regime de plena democracia e pode estar em gestação um improvável [15] fundamentalismo religioso, que se algum dia atingir o poder de estado, trará, com certeza conseqüên-cias não muito agradáveis à vida democrática. Dessa forma, veremos a seguir como esse pretenso “embrião de teocracia” se manifesta ao nível local. O município em questão, São Gonçalo, componente da Região Metropolitana do Rio de Janeiro.

O neopentecostalismo e o cotidiano em São Gonçalo: Desordem

urbana + populismo x fundamentalismo cristão²= delírios teocráticos.

O município de São Gonçalo abriga uma população de 1.008.065 ha-

bitantes, distribuída em um território de aproximadamente 247 km², e é no momento em que escrevemos o segundo município em população, o segundo colégio eleitoral, e de acordo com muitos pesquisadores sérios, o segundo parque industrial do estado graças às emancipações que ocorreram no município de Nova Iguaçu nos últimos vinte anos. [16] Esses dados garantem ao município uma centralidade no Leste Metropolitano Flumi-nense, embora o município de Niterói ainda tenha melhores indicadores de infraestrutura urbana e qualidade de vida e o COMPERJ (Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro) estar sediado no município de Itaboraí, especificamente no distrito de Sambaetiba. Apesar da centralidade de São Gonçalo e a disponibilidade dessas informações, ainda há vozes que

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a denominam como “cidade dormitório”, normalmente em discursos de políticos e lideranças comunitárias não tão bem intencionadas [17].

Em oito décadas, o tecido urbano gonçalense se expandiu de forma desordenada: em um primeiro momento, em função do surto industrial que o município foi palco entre 1920 e 1960 no eixo Neves – Centro – Alcântara, e em um segundo momento, em função dos intensos loteamen-tos voltados para o assentamento de migrantes entre 1960 e 2000 no eixo Alcântara – Manilha. O resultado desse processo foi o estabelecimento de uma crônica desordem urbana. Essa situação que foi paulatinamente sendo construída em São Gonçalo criou efeitos colaterais que são parte do cotidiano dos seus munícipes, que sofrem com uma falta crônica de abastecimento de água (que atinge a metade da cidade), que habitam em moradias precárias e mal construídas, que convivem com a ausência de saneamento básico em vários bairros e, por isso exposto, são induzidos a aprofundar a permanente degradação ambiental, seja em parte por igno-rância, seja por sobrevivência [18].

Como é usual em cidades periféricas, os membros do executivo e do le-

gislativo municipais em sua maioria estão impregnados com uma menta-lidade consagrada como “terceiro-mundista”, que sempre se aproveitaram da precariedade dos equipamentos urbanos para perpetuar os seus “currais eleitorais” com fronteiras muito bem definidades entre os seus pares. Nilo Sérgio D’Ávila Modesto em suas investigações sobre o poder político em São Gonçalo afirma que:

“... No trato do problema social é politicamente vantajoso adotar a estratégia da deterioração: não fazer nada, ou quase nada, até que a si-tuação atinja um nível de penúria, a partir do qual, O mínimo realizável soe como esplendor de solução possível e de eficiência. ”(MODESTO, 2006, P.315)

Essa estratégia populista há décadas é um padrão em São Gonçalo, pois a “cultura” de corrupção e clientelismo levou a política ao descrédito junto a população, revoltada com um recorrente descaso que se manifesta na ineficiência dos serviços públicos. Esse quadro promíscuo, induz lide-

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ranças comunitárias a confundir o fazer político com relações de compro-misso, castrando assim uma salutar politização dos munícipes, que seria fundamental numa desejável (para segmentos mais avançados) interação entre poder público e sociedade civil organizada. Ou seja, uma interação real e programática com os gestores municipais e aqueles que produzem a cidade no seu cotidiano. Assim, “fazer política” vira sinônimo de nego-ciações para o acesso a cargos comissionados, algum tipo de influência junto a parlamentares, o acesso ilícito a programas sociais e outras be-nesses disponibilizadas ilegalmente pelos poderes públicos sem qualquer constrangimento.

Em um ambiente onde grassa a má fé, o voluntarismo e o cafajestismo

político, boa parte das lideranças comunitárias acredita que tais práticas são “normais” neste contexto, pois à precariedade econômica de um nú-mero significativo desses atores, se soma à ausência de formação política qualificada, impedindo assim a clarividência para a realização de traba-lhos e ações comunitárias mais avançadas e amplamente articuladas, que realmente atendam as demandas das comunidades que eles pretendem (ou acreditam) representar. (TORRES RIBEIRO, 2002). O desdobramen-to desse quadro se reflete na ineficiência dos conselhos municipais, que foram finalmente legitimados no governo Lula e abriam reais possibilida-des para a interação governo e sociedade civil organizada na gestão dos serviços públicos, mas, no entanto, foram descaracterizados na sua gênese pelas seguintes situações:

1:º A persistência da prática de cooptação de lideranças comunitárias pelas instâncias governamentais, principalmente com a oferta de emprego na administração pública e as constantes promessas de “influência” junto a segmentos ou órgãos do legislativo e do executivo municipais;

2:º A maior parte dessas lideranças comunitárias é de indivíduos de baixa renda e de baixa ou baixíssima escolaridade, que, conseqüentemen-te, possuem pouca ou nenhuma qualificação profissional. Dentro desse quadro, os cargos comissionados, a oferta de acesso a programas sociais pontuais, o acesso barato a materiais de construção e até auxílio em enter-ros dos seus familiares e membros da sua comunidade etc, são uma tática

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de sobrevivência que faz parte de uma estratégia maior de reprodução da realidade política municipal;

3:º A falta de escolaridade e a consequente ausência de formação técnica das lideranças comunitárias, compromete uma interação equitativa entre o estado e a sociedade civil organizada, pois os primeiros conduzirão as políticas públicas de acordo com os seus interesses de ocasião que fatal-mente irão ao encontro com os da iniciativa privada. A população, enges-sada pelo vício original do fazer político local, nada ou pouco aproveitará dos recursos públicos que deveriam servir à melhoria de sua qualidade de vida;

4:º O despreparo das lideranças comunitárias, além de vir da ineficiên-cia crônica dos serviços de educação com base humanista, de um lado, também é o resultado da falta de interesse das agremiações políticas em promover a formação desses segmentos. Como padrão, tem-se que os “caciques” partidários, e mesmo os seus agregados, participam em maior ou menor grau da estrutura viciada do Estado, e assim eles precisam para a sua miserável sobrevivência política, de “massas de manobra” que cons-tituem o seu numerário dentro de um cálculo eleitoral;

5:º Somando todo esse arcabouço de subdesenvolvimento político, o resultado é a falta de projetos que poderiam ser apresentados nos diversos Conselhos Municipais, onde, infelizmente, ONGs suspeitas, federação de associações de moradores sem a menor representatividade e parlamen-tares conhecidos por práticas nebulosas, são onipresentes, e apenas se utilizam das conferências de área enquanto palco para a exibição dos seus discursos a agregar mais clientes. Assim, não há uma intenção sincera para que essas instâncias funcionem, pois basta fazer com que elas exis-tam e legitimem as políticas públicas emanadas quase que exclusivamen-te pelo executivo. Nesse contexto, as lideranças comunitárias em vez de serem “atores de transformação” passam a ser “atores de contenção”, pois barram aqueles que poderiam fazer algum tipo de diferença.

Toda essa desordem induzida, construída e cultivada por um populis-

mo local de aura vitalícia, tem sido um campo favorável para a expansão

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das igrejas evangélicas neopentecostais, não só nos movimentos so-ciais, como também na administração municipal [19]. Não que deixem de reproduzir as mesmas práticas dos partidos políticos, mas com um diferencial: além de prometerem a redenção metafísica e alívio espiritu-al, prometem também a redenção se apresentando como alternativa às odiosas práticas corruptas terrenas. Se uma desejável educação política é negligenciada pelos partidos políticos com a intenção de perpetuar “o status quo local, os pastores têm sido muito mais eficientes em agregar fiéis, não só para o trabalho missionário propriamente dito, mas também na militância política para atender a uma eventual candidatura evangélica para cargos legislativos, em cujo contexto, os partidos políticos são ape-nas ferramentas para atingir tal fim, sem considerações ideológicas.

Entre os parlamentares evangélicos, os aspectos ideológicos que regem

os partidos políticos se diluem, pois os dogmas religiosos estão se solidifi-cando e ficando cada vez mais fortes entre os seus adeptos: é comum aos militantes (independentes de partido político) se valerem de passagens da Bíblia para justificar uma determinada candidatura, sobretudo quando se deparam com argumentações ideológicas fundamentadas no raciona-lismo, ou seja, a defasagem político-teórica é compensada por um mes-sianismo que algumas vezes atinge as agressões verbais e físicas quando os argumentos se esgotam. Mônica Sampaio Machado afirma em suas investigações, que a permeabilidade dos missionários pentecostais junto à população é facilitada devido a não obrigatoriedade de um dirigente ou pastor ter formação acadêmica, bastando uma formação prática, ou seja, valorizam-se indivíduos leigos para a evangelização sem conhecimentos aprofundados sobre Teologia. http://www.Kazerua.com/artigos

Assim, indivíduos que se dizem “pastores” sem qualquer conhecimento

de Teologia, se aproximam da população de baixa escolaridade e con-seguem converter novos fiéis com mais facilidade, pois há uma conver-gência na linguagem e visão de mundo entre esses interlocutores. Ainda de acordo com Mônica Sampaio Machado, a estrutura organizacional pentecostal e neopentecostal se distribui da seguinte forma: na base da hierarquia, estão os pontos de pregação e os salões; na hierarquia inter-mediária, os templos-sede, as “igrejas mães” e as igrejas filiais -; e no

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topo da pirâmide, os organismos supra locais. Essa estrutura garante uma onipresença em localidades distantes e de difícil acesso, que não por aca-so, residem populações que sofrem com pouca ou nenhuma infraestrutura urbana, que se soma à ausência de assistência médica e a crônica falta de segurança, ou seja, munícipes que estão literalmente abandonados pelos poderes públicos. (MACHADO, 1993).

A curiosa eficiência da distribuição das igrejas evangélicas neopentecos-

tais contribui para que a “conversão em massa” seja eficaz, pois é comum em São Gonçalo a presença de dois ou mais “templos” (na verdade salões e pontos de pregação) em uma única rua, onde ocorrem simultaneamente cultos, reuniões, mini-shows e rituais de “desobsessão”, onde a onipre-sença das manifestações religiosas induz indivíduos não crentes - e com uma vida emocional e financeira precárias - a se agregarem ao “rebanho” da igreja. Esse crescimento do neopentecostalismo no espaço urbano (ou melhor, peri-urbano) em São Gonçalo atraiu a atenção de políticos locais na passagem dos séculos XX e XXI, e nos dois mandatos da prefeita Aparecida Panisset (2005-2008 / 2009 -2012), as igrejas evangélicas conquistaram proeminência e protagonismo na administração municipal - desconhecidos em gestões anteriores - onde a prefeita e todo o seu staff franquearam-lhes uma série de facilidades.

O peso da representação evangélica era tão grande na administração Panisset, que a prefeita não titubeou em criar uma pitoresca “subsecre-taria para assuntos comunitários e religiosos” em 2008, nomeando para a função de subsecretário o pastor e antigo colaborador José Ricardo Assumpção Correa, líder da comunidade Paz e Vida, muito influente na região do Alcântara. Já em 2003, um ano antes de sua surpreendente vitó-ria ao executivo, e numa franca demonstração de apreço pelo colaborador, a então deputada tem aprovada na Alerj “MOÇÃO DE APLAUSO E LOUVOR, ao JOSÉ RICARDO DE ASSUMPÇÃO CORREA, pastor da Comunidade Pentecostal de Amendoeiras, pelo brilhante trabalho eclesi-ástico que vem desenvolvendo”. Mais tarde, em 2009, Correa cairia em desgraça, preso em flagrante com carro com placa adulterada. E sem que ninguém se desse conta, estavam ali as pistas de onde viriam os votos que elegeram Panisset no pleito disputadíssimo em 2004. Votos, esses, muito

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bem recompensados pela máquina pública municipal durante os oito anos de mandato.

Cabe-nos discorrer aqui, entretanto, um pouco sobre o que ocorreu na-quelas eleições de 2004, que se constituíram num verdadeiro marco político na cidade. Estavam em disputa três candidaturas realmente competitivas. A do então prefeito Henry Charles (PTB), que vinha desgastado mas com um vigoroso arco de alianças que incluía o PT, a da deputada Graça Matos (PMDB), que era apontada como favorita por todas as pesquisas e que tinha o apoio do governo estadual e de vários vereadores e, finalmente, a candi-datura da também deputada estadual Aparecida Panisset (DEM), que con-corria praticamente sozinha, correndo por fora, tendo apoio apenas de dois partidos nanicos e do prefeito do Rio de Janeiro Cesar Maia, que indicou correligionários que montaram a coordenação de campanha e que depois ocuparam importantes cargos na primeira administração. Foram os famosos “forasteiros”, como os chamavam os “municipalistas”.

No desenrolar da campanha, a candidatura Charles perdeu fôlego, observava-se uma pequena e consistente subida nas intenções de voto em Aparecida, mas tudo indicava que seria Graça Matos a nova prefeita da cidade. Porém, um fato espetacular aconteceu como resultado de uma percepção social e política que a equipe de coordenação de Panisset tinha como trunfo: o fator religioso, mas decididamente evangélico. A uma semana do pleito, são espalhados milhares de jornais saídos da gráfica do Jornal Povo com uma foto-montagem de Graça Matos paramentada de “pomba-gira” num terreiro. Se antes faltava alguma coisa na campanha de Panisset decolar de vez, agora não faltava mais nada. A estratégia inu-sitada e heterodoxa para a cultura política local mostrou-se eficiente como estratégia eleitoral, levando Aparecida Panisset à vitória em primeiro tur-no, para surpresa de muitos, que se depararam finalmente com o grande fenômeno político-eleitoral que entraria na agenda de qualquer político com pretensões de se eleger a algum cargo público dali para frente.

O expediente inusual e nada ético de Panisset é e deve ser reprovável, porém o que ficou para a história é o peso que as comunidades evangé-licas têm no processo político. Se o processo histórico a partir do século

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XIX apontava o laicismo do estado como paradigma das suas instituições, hoje vemos que isso é relativizado. A presença religiosa no discurso e no fazer políticos é amplamente aceito, cada vez mais estimulado, levando a certos paroxismos em setores progressistas da sociedade que se veem reféns do irracionalismo religioso como base argumentativa. O moralismo avança truculento sobre a ética aos safanões como fenômeno que ao que tudo indica veio para ficar, pelo menos por um bom tempo.

Durante a Administração de Aparecida Panisset, as facilidades que as igrejas pentecostais e neopentecostais obtiveram iam desde a promoção de “shows gospel” até a cessão de transporte para eventos religiosos. Essas ações foram o reflexo de um “populismo rejuvenescido” com uma imponente base de sustentação, considerando que a penetração dos missionários (agora com aval estatal) junto às comunidades carentes, os transforma em multiplicadores das “benfeitorias da prefeitura”, e essa estreita interação entre segmentos religiosos e a administração municipal estimula os primeiros a acreditar que possuem “carta branca” para pôr em funcionamento práticas ilegais, como o abuso da utilização dos meios de comunicação, o “patrulhamento ideológico” e a intolerância religiosa. O preocupante é que tudo isso ocorreu sob a “vista grossa” das autoridades municipais que deveriam zelar pelo o caráter laico do estado brasileiro, com potencial para restaurar práticas autoritárias [20].

O neopentecostalismo e o cotidiano em São Gonçalo: As dimensões

dos “delírios teocráticos” e o rejuvenescimento do autoritarismo.

Os delírios teocráticos que foram alimentados durante os oito anos da

administração Panisset, ganharam dimensões se não perigosas ao me-nos preocupantes: as congregações pentecostais e neopentecostais estão infiltradas em diversas instâncias do município, que vão desde a suposta facilidade para concessões de rádios comunitárias, passando por uma intensa influência nos conselhos municipais, até o desrespeito e perse-guição a outras religiões. Não que o crescimento de rádios comunitárias e a maior presença de lideranças comunitárias nos conselhos municipais não sejam salutares, porém, o cerceamento recorrente e a perseguição

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a credos populares revelam que as duas situações anteriores não vêm servindo para a democratização no município, muito ao contrário, vem na verdade fortalecendo grupos que não têm qualquer compromisso com a consolidação do estado democrático de direitos e a diversidade que marca a sociedade brasileira.

Comecemos pelas rádios comunitárias: A luta pela democratização dos meios de comunicação já ocorre desde o

processo de redemocratização nos anos 1980, embora os partidos políti-cos (sobretudo os de esquerda) e sindicatos jamais tenham se engajado de forma mais incisiva no assunto. De uma forma geral, a instalação de rádios e TVs (em menor grau) comunitárias partiam de grupos de es-querda independentes, ou seja, sem o aval do seu partido - ou então - de segmentos alternativos sem qualquer vínculo partidário. Desde sempre, a perseguição às rádios comunitárias, ”livres” e “piratas’, coube primeiro ao DENTEL e depois à ANATEL, que se utiliza da terceira nomenclatura para interceptar as emissoras e prender os seus membros, alegando” a “utilização indevida das comunicações e das ondas de rádio”, como se estas fossem propriedade privada. No entanto, além da penetração siste-mática na mídia oficial através da Rede Record e outras emissoras de TV a cabo, os evangélicos obtêm concessões para centenas de rádios AM e FM, além de abocanhar o setor comunitário. E com absoluta impunidade, como veremos a seguir.

Das sete emissoras comunitárias evangélicas que funcionam no muni-

cípio de São Gonçalo [21], a Nova Unção 103,03 MHz (ligada à Assem-bléia de Deus) e a 100,09 MHz (Congregação e nome da rádio desconhe-cida) violam explicitamente o Código Brasileiro de Telecomunicações para esse tipo de modalidade de transmissão ao veicular publicidade nas suas programações (Lei 9.612 de 1998), ao não respeitar o horário da “Voz do Brasil”, além de ultrapassar 1 km de raio, pois são ouvidas em todos os bairros dos distritos de Monjolos e Ipiíba. Eis outra irregulari-dade: utilizam um transmissor superior a 25 watts, proibido para rádios comunitárias. Não estamos dizendo nesse ensaio que deva haver a obri-gatoriedade de transmissão da Voz do Brasil - ou muito menos - que as

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rádios comunitárias devam ser cerceadas, pois afinal de contas, é preciso democratizar os meios de comunicação para dar voz a comunidades isola-das que não tem acesso a grande mídia. (www.mc.gov.br).

Considerando que a ANATEL não é nada indulgente com rádios comu-nitárias que atendem de verdade às comunidades em que estão inseridas, e não tem o menor constrangimento de ameaçar e mesmo agredir fisica-mente os profissionais que trabalham nas emissoras, fica a pergunta: por que as emissoras evangélicas não são tiradas do ar? A Lei nº 9.612/98 é violada em seu artigo 4º parágrafos 1º e 2º, ou seja, além de praticarem explicitamente o proselitismo religioso (inclusive atacando outros cre-dos), desqualificam a pluralidade de opinião na medida em que somente é aberta a palavra a membros de outras congregações evangélicas. Isso demonstra que pessoas com grande influência nas instâncias federais são no mínimo negligentes, senão, facilitam essas irregularidades em detri-mento de segmentos que pretendem desenvolver trabalhos jornalísticos e culturais no município. Portanto ficam novas perguntas para um chamado à reflexão: quem financia realmente essas emissoras? E qual a influência dessas pessoas na ANATEL e, por extensão, no Ministério das Comunica-ções? (www.anatel.gov.br).

Outras instâncias onde a influência evangélica é significativa são os

poderes públicos municipais e os seus conselhos setoriais. Aconteci-mentos notórios e comentados a “boca pequena” (talvez por medo de represarias), são a preferência por lideranças e agregados pentecostais e neopentecostais para o acesso a cargos comissionados na prefeitura e no legislativo municipal, sobretudo em épocas de eleições. Mesmo entre os concursados a discriminação velada a funcionários públicos de outros cre-dos é largamente praticada, incluindo assédios morais e constrangimentos psicológicos contra indivíduos de orientação LGBT [22]. Os Conselhos Municipais (política urbana, segurança alimentar, meio ambiente, assis-tência social, etc) têm entre os seus membros ao menos um indivíduo evangélico, que por sua vez, fala em nome primeiro de sua congregação, depois pela sua igreja, pelo seu “partido” (se tiver), e por fim, pela comu-nidade ou entidade que representa.

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No Conselho Municipal de Saúde eles são hegemônicos, e os dados sobre a real dimensão da saúde pública em São Gonçalo são caprichosa-mente omitidos: há no município surtos de dengue (inclusive com óbitos), os postos de saúde em sua maioria não têm médicos e nem remédios a contento, as ambulâncias demoram a atender os doentes, sobretudo em bairros distantes e há relatos que existem munícipes acometidos de moléstias medievais como a hanseníase, também conhecida como lepra. Todas essas mazelas deveriam ser divulgadas para associações de mo-radores, organizações não-governamentais e para a população em geral. Não que não se produzam cartazes e folders voltados para a prevenção de doenças e exista um serviço de agentes comunitários de saúde que em alguns lugares são ativos, porém, o Conselho de Saúde não promove um debate amplo sobre a sua real situação [23]. Mas uma pergunta que não quer calar: por que não são franqueados aos munícipes o orçamento relativo à saúde em São Gonçalo?

Mas outra demanda que é mais uma manifestação desses “delírios teo-

cráticos” é a banalização da intolerância religiosa, que é o resultado direto da precária formação teológica dos pastores que ministram os seus cultos em salões alugados e transformados em “igrejas” [24]·. Os efeitos colate-rais diretos dessa má formação se manifestam em quatro pontos, a saber:

1º : a intolerância religiosa é uma manifestação que revela pouca erudição, tendo em vista que se pretende compensar a ausência de conhe-cimentos teológicos fazendo uso do radicalismo. Como os pastores de formação “empírica”atuam em localidades onde a população tem pouco ou nenhum conhecimento histórico, difunde-se coisas como os aspectos “demoníacos” dos cultos afrobrasileiros. O efeito colateral mais grave da banalização da intolerância religiosa é que se abre a possibilidade para novas intolerâncias, incluindo a potencialização dos preconceitos raciais, ideológicos, de gênero e sociais que a muito custo vêm diminuindo e que se caracterizariam como um retrocesso;

2º: a ausência de conhecimentos teológicos bloqueia a percepção de que as religiões politeístas foram as primeiras manifestações da interação entre o homem e o sobrenatural, ou seja, essa interação estava ligada a

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relação homem/natureza. Assim, a deusa das águas grega “Afrodite” tem a sua equivalente romana “Vênus” e a sua equivalente africana iorubá “Oxum”; o deus da guerra iorubá “Ogum” tem o seus equivalentes roma-no “Marte” e grego “Ares”. Mesmo Exu, que no Brasil foi associado ao “demônio”, era uma divindade mensageira na região da África ociden-tal, ou seja, era um equivalente africano do deus romano “Mercúrio”. É preciso ressaltar que sequer existia uma equivalência na cultura dos povos africanos sobre o conceito de “diabo” ou nomenclatura parecida, pois o conceito de “demônio” foi trazido primeiro pelos muçulmanos devido ao comércio Sahel - Saara - Mediterrâneo, e depois, pelos cristãos em função das grandes navegações;

3º: em mais um sintoma da precária base teológica, está se solidificando uma espécie de “sincretismo monoteísta”, pois é comum encontrar em muitas igrejas evangélicas a ‘Estrela de David’, símbolo do judaísmo ao invés da “Cruz” que é o símbolo do cristianismo. Alguns alegam que tal uso é um pretenso “retorno ao cristianismo primitivo”- e se assim for - o certo seria o uso do “Peixe”, símbolo usado pelos cristãos nos difíceis períodos da clandestinidade que viveram no Império Romano até a época de Constantino. É pouco provável que os pastores de formação empíri-ca saibam que o “velho testamento” é conhecido entre os judeus como “Torá” ou que Jesus Cristo não é reconhecido como “messias’ por esse povo, pois para os judeus, o verdadeiro messias ainda está por vir a Terra. Considerando que o cristianismo (e o novo testamento) foi na verdade uma ruptura com o judaísmo, o uso da “Estrela de Davi” pode até ser considerado por teólogos realmente eruditos uma “heresia”;

4º: a pouca erudição leva ainda à falta de sensibilidade que vivemos em um estado laico de acordo com a Constituição Federal, além de violar explicitamente a Declaração Universal dos Direitos Humanos em seu Artigo 2 [25]. Assim, práticas discriminatórias contra outros credos, im-preterivelmente levarão com o tempo a outros segmentos, jogando assim por terra anos de lutas pelo estabelecimento do estado democrático de direitos.

Os exemplos mais contundentes da cumplicidade entre o executivo

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municipal e as igrejas evangélicas foram à destruição de um espaço histórico e a colocação de nomes bíblicos em logradouros sem a consulta aos munícipes: a primeira refere-se à omissão da administração Panis-set diante da demolição da primeira tenda de umbanda do Brasil, que se localizava no bairro de Neves, especificamente na Rua Floriano Peixoto nº 30. Mais do que um atentado à liberdade de credo, esse ato revela um desprezo pela cultura nacional, tendo em vista, que trata-se da primeira (e única) religião genuinamente brasileira. É bem verdade que os terreiros de umbanda e candomblé carecem de coesão, pois a secular repressão os atomizou, impedindo assim, uma organicidade que os proteja das repres-sões sazonais. Mesmo assim, os terreiros sobrevivem contando com um número significativo de adeptos.

Quanto aos logradouros, a prefeitura estabeleceu um ponto de ora-

ção coletiva no Morro da Amendoeira, que foi rebatizada de Monte das Oliveiras, além de tentar mudar o nome da Praça Chico Mendes por “Praça da Bíblia”, em ambas, não houve consulta aos munícipes como se o pentecostalismo fosse a “religião oficial do município” não só desa-fiando mais uma vez a orientação laica do estado, como também afron-tando a população gonçalense de outros credos e aqueles que optam por não seguir religião nenhuma.Com a pressão dos formadores de opinião que atuam no município, a prefeitura recuou, e deu os dois nomes para a Praça, e assim mesmo, durante o período eleitoral, já que estava em plena campanha por seu candidato Adolfo Konder em São Gonçalo e do seu “irmão” Marcio Panisset em Itaboraí. Como diz o ditado popular “Deus escreve certo por linhas tortas” e ela não conseguiu eleger nenhum dos dois. Mas a vitória de Neílton Mulim não significa que os “delírios teo-cráticos” acabaram.

O neopentecostalismo e o cotidiano em São Gonçalo: Os “Delírios Teocráticos” enquanto uma “Reforma Protestante posta ao avesso”.

Nas eleições de 2012, a prefeita Aparecida Panisset - que edificou a

“República Abençoada de São Gonçalo” em oito anos de mandato - foi

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fiadora das candidaturas de Adolfo konder no seu município e Marcio Panisset em Itaboraí, e como não podia deixar de ser, ambos foram pre-parados politicamente em “cursos-relâmpago” de teologia, ou melhor, da bíblia sagrada. Porém, outras candidaturas seguiam o mesmo caminho, pois afinal de contas, no Leste Metropolitano Fluminense discursos con-dimentados por capítulos e versículos do livro sagrado dos cristãos são imprescindíveis para angariar votos em ambientes subdesenvolvidos, pois, seguindo a máxima, é preciso falar o que o povo quer ouvir. Foi assim com a candidata a prefeita em 2012 Alice Tamborindeguy, que prometeu ressuscitar em São Gonçalo a subsecretaria para assustos reli-giosos. Em Maricá, cidade governada pelo PT (o evangelismo da coisa pública não se atém a ideologias, como se vê), a tal secretaria está lá, tendo como subsecretário o senhor Maurício Avillez. Aparecida Panisset fez escola, criou tendências.

No entanto, o evangélico Neilton Mulim com a sua vice-candidata a prefeita, que também é evangélica, parece que foi mais verossímil para angariar a maioria dos votos de uma população devota, e assim, a “Re-pública Abençoada de São Gonçalo” ganhou uma sobrevida, bem como aqueles que souberam crescer politicamente durante a administração anterior [26].

O curioso é que o direito ao voto universal foi conquistado nos últimos

trezentos anos justamente por filósofos que colocaram o racionalismo como superação dos dogmas da fé, ou seja, o voto que digitamos na urna eletrônica de dois em dois anos é o resultado concreto do advento do racionalismo desenvolvido graças a homens como Kant (um protestante), Voltaire, Montesquieu, Rousseau e outros iluministas, que deixaram como legado ao ocidente as sementes da democracia contemporânea. E hoje, assistimos perplexos o declínio da razão e o retorno dos dogmas metafí-sicos. Neste ensaio, longe de ser alarmista às avessas ou expor conside-rações maniqueístas, tentamos colocar em debate o crescimento de um outro ramo dos cristianismo, que nos parece não estar contribuindo para a consolidação da democracia no Brasil, pois além do pentecostalismo e do neopentecostalismo serem denominações recentes e originárias dos EUA, elas têm mais aspectos de “transnacionais” do que locais de oração.

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Essa realidade inclusive preocupa protestantes sérios e cônscios do seu papel em uma sociedade democrática e não veem com bons olhos essa sinistra construção teocrática: o Pastor Ricardo Godim da Igreja Betesda, mestre em teologia da Universidade Metodista, afirma que os neopente-costais têm sim um projeto de assumir o poder político no Brasil e que está em pleno andamento. Segundo Godim, a existência na Câmara Fede-ral da dita “bancada evangélica” e o mandato de senador do Pastor Mar-celo Crivella, são os sinais da edificação desse projeto de poder. (http://www.noticias.gospel.br). Outros que se preocupam com essa ameaça ao estado de orientação laica, são os pastores protestantes históricos como os luteranos, Metodistas, Batistas e Anglicanos que veem com desconfiança essa junção entre o mercantilismo da fé e as aspirações por poder político. Esses segmentos protestantes são coerentes com o seu histórico de lutas contra a ditadura militar e o retorno a democracia desde os anos 1970.

O problema é que os neopentecostais já controlam uma fatia considerá-

vel da mídia, e os protestantes dissidentes são praticamente colocados a margem do processo e, não raro, são alvos de intimidações por parte dos fundamentalistas cristãos. Dentre as congregações que são intimidadas, está a denominação conhecida como “Igreja Inclusiva”, que não condena outros credos e tolera a homossexualidade. É um segmento protestante que não compactua com esse processo de desconstrução do racionalismo. É necessário lembrar que o iluminismo do século XVIII é tributário de movimentos que se iniciaram no Renascimento no longínquo século XIII e na Reforma Protestante no século XVI, cujas “revoluções” destruíram o feudalismo, abalaram a onipotência da Igreja Católica e permitiu a até então marginalizada burguesia o acesso ao poder político na Europa Oci-dental. Mas se nesse continente o protestantismo foi renovador, no Brasil ele vem sendo um vetor de retrocesso.

Os pastores Marcelo Crivella, Edir Macedo e Silas Malafaia, nada têm a

ver com a aquele monge agostiniano conhecido por Martinho Lutero, que ousou afixar na porta do Castelo de Wittenberg - no então Sacro impé-rio Romano Germânico - noventa e cinco teses, nas quais, denunciou os desvios e abusos da Igreja Católica. Lutero revoltara-se contra a venda

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de indulgências (o perdão de Deus) através de clérigos tão venais quanto frações de políticos e pastores leigos dos nossos dias. Também não se comparam nem de leve ao Pastor Batista Martin Luther King, que tomou as dores de uma dona de casa negra chamada Rosa Parks e organizou ou-tras denominações protestantes pela luta dos direitos civis nos EUA. Aqui no Brasil, ao contrário, os evangélicos pouco contribuem para as ações afirmativas, que estão incluídas, tanto o acesso às universidades e bons empregos, quanto à defesa da cultura e de suas tradições, ou seja, assisti-mos a uma “reforma protestante posta ao avesso”.

Considerações finais: A República “Abençoada” de São Gonçalo enquanto resultado do conservadorismo católico, do despotismo po-pulista e de obscuras forças externas.

A “República Abençoada de São Gonçalo” é uma denominação irônica

para assinalar o protagonismo que as igrejas evangélicas edificaram na administração pública da cidade, que se construiu no bojo de práticas pseudo-políticas que estão disseminadas no município há décadas: a equação do subtítulo na parte quatro desse ensaio “desordem urbana + populismo x fundamentalismo cristão = delírios teocráticos é outra forma irônica para expor como a precariedade administrativa, somada a práticas rasteiras e multiplicada por um fanatismo ao quadrado, pode culminar em uma possível destruição da democracia a médio ou longo prazos. Mas não somente estes fatores contribuíram para que o fundamentalismo religioso venha ganhando terreno, pois a Igreja Católica também tem a sua parcela de contribuição nesse processo, tendo em vista que ao destruir a Teologia da Libertação, ela “jogou pela janela” a possibilidade de não só recuperar fiéis após a sua omissão durante a ditadura militar, mas também de educá--los, à luz da doutrina, politicamente.

A Igreja Católica não foi capaz sequer de ajudar na promoção da Reno-

vação Carismática - mesmo utilizando o padre showman Marcelo Rossi - e oferecer conforto ou esperança às populações hipossuficientes, como também não tem respostas para uma classe média perplexa com os re-

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correntes acontecimentos que a desmoralizam, como casos de pedofilia e corrupção. E o pior: é arrogante demais para fazer uma autocrítica perante os seus fiéis. Assim, a Igreja Católica está provando do seu próprio vene-no: além dos desvios já citados, a cúria romana não consegue administrar demandas novas como a ordenação de mulheres, o fim do celibato e a união entre homossexuais, ou seja, combateu-se a Teologia da Libertação para uma suposta “contenção do comunismo” no seio da igreja, e recen-temente, o Papa Bento XVI reconheceu publicamente os valores morais e econômicos do marxismo. Muito tarde, pois ele não resistiu às polêmicas e renunciou ao cargo.

A eleição do Papa Francisco - o primeiro não europeu em séculos a che-

gar ao topo da hierarquia do Vaticano - pode ser um sinal de que se não haverá mudanças profundas na Igreja Católica, ao menos o crescimento exponencial do protestantismo na América Latina está sendo levado em consideração: coincidentemente, o Papa Francisco é argentino, e, portan-to, conhece bem os aspectos favoráveis em que o pentecostalismo vem crescendo no continente. Por ser também jesuíta, ele é um “católico mi-litante”, e assim, os padres com certeza deverão potencializar atividades missionárias nas regiões e localidades mais pobres, sobretudo nas perife-rias das grandes cidades latino-americanas; mais uma vez, coincidente-mente, os locais onde o protestantismo edificou o seu crescimento. Essa nova realidade talvez mude a conduta de parlamentares católicos, que são exigidos à emergêcia dos novos tempos.

A “República Abençoada de São Gonçalo” é antes de tudo uma cons-

trução do tradicional populismo em nível local, onde a reprodução permanente de “massas de manobra” são o sustentáculo de uma prática política subdesenvolvida, e assim, a crescente influência dos evangélicos em cidades que compõe a RMRJ é apenas mais um desdobramento desse processo, ou seja, é possível que a estreita relação entre poderes públicos e igrejas pentecostais esteja presente em outras centenas ou milhares de municípios, onde com certeza, não são incomuns vereadores e mesmo secretários de governo portar uma Bíblia debaixo do braço, com o fim de obter influência junto a comunidades carentes, e é claro, angariar alguns votos, pois afinal de contas, o significativo número de fiéis nessas cidades

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são mais importantes do que uma tão almejada “opinião pública”, que acreditávamos ter construído nos quase trinta anos de redemocratização, e hoje, constatamos que não foi bem assim.

Todavia, não achamos prudente cair na tentação de comparar tal fe-

nômeno com a ascensão do nazi-fascismo na Europa Ocidental como quer José Arbex Júnior, ou então, a vitória da Revolução Islâmica no Irã e a sua expansão ideológica pelo Oriente Médio e Norte da África, pois foram eventos ocorridos em épocas diferentes e em conjunturas espe-cíficas: o nazi-fascismo foi um desdobramento dos efeitos deletérios da Primeira Guerra Mundial e o fracasso da expansão do comunismo para Europa Ocidental, sobretudo em função da derrota da revolução proletária na Alemanha. Quanto a Revolução Islâmica no Irã, ela foi uma resposta a penetração imperialista anglo-americana no mundo muçulmano e os seus efeitos sociais desagregadores. Enfim, o primeiro caso foi uma resposta a expansão do comunismo, e o segundo, uma resposta ao imperialismo. O protestantismo no Brasil vem crescendo em uma conjuntura de redemo-cratização e crescimento econômico, ou seja, em uma situação distinta dos dois casos.

Porém, não podemos perder de vista que tais diferenças não significam

que o perigo ao estado de democrático de direitos não exista, muito ao contrário, pois educadores pentecostais e neopentecostais não só induzem os estudantes à intolerância religiosa como também ao “bullyng” contra jovens de tendência LGBT, ou seja, disseminação de valores perigosos já citados nesse ensaio, onde o respeito à individualidade e às peculiaridades culturais são literalmente desconsideradas. É muito preocupante quan-do professores - entendidos aqui enquanto formadores de opinião - se omitem diante desses fatos, que por sua vez, se soma à precariedade das escolas públicas. Se a intolerância e a atrofia cultural são reproduzidas nas escolas, o que dizer do que acontece no cotidiano! E isso já aconteceu em outros países: na Coréia do Sul, o budismo foi superado pelo protestan-tismo em seis décadas, dentro de um processo de histeria anticomunista (a tensão permanente com a Coréia do Norte), a ocupação militar norte-a-mericana e o acelerado crescimento urbano e econômico [27].

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Longe de alimentar qualquer tipo de “teoria da conspiração”, não deve-mos esquecer que o neocolonialismo apesar de estabelecido em uma fase mais avançada do capitalismo, onde a mídia é a principal ferramenta de manutenção de poderes, o uso da religião não foi abandonado, apenas ela foi absorvida pelos meios de comunicação enquanto reforço da conquista de mentes e corações. Causa-nos curiosidade o fato do pentecostalismo e o neopentecostalismo terem crescido nas últimas décadas da Guerra Fria, em um momento em que as Revoluções Cubana e Nicaraguense angaria-vam a simpatia da juventude e a Teologia da Libertação estava ganhando terreno, e os EUA financiavam qualquer mecanismo que pudesse conter as lutas populares na América Latina. A providencial ajuda do Vaticano na desqualificação da Teologia da Libertação - como já escrevemos - ajudou muito ao crescimento evangélico no continente. Fica então a pergunta: qual o grau de participação dos EUA nesse processo?

Essa reflexão foi deixada de propósito para o final desse ensaio: mais

uma vez, é muita coincidência que o Bispo brasileiro Edir Macedo tenha iniciado a vitoriosa trajetória da IURD em fins dos anos 1970 e inícios dos 1980, ou seja, uma década depois que um pastor Sul-Coreano conhe-cido como “Reverendo Moon”, ergueu uma transnacional da fé contando com igrejas em todo o mundo, chegando inclusive a ser proprietário de um clube de futebol no Brasil [28]. Considerando que a Agência Central de Inteligência dos EUA (popularmente conhecida como “CIA”) dispõe de verbas ilimitadas para o financiamento de grupos terroristas - nos quais o saudita Osama Bin Laden fora um dos contemplados - não é nada difícil que as igrejas pentecostais e neopentecostais tenham obtido algum tipo de contribuição para conter o comunismo. Quem tiver interesse, é uma boa investigação a ser feita.

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Notas

1. Graduado em Licenciatura em Geografia pela UERJ/FFP, Campus São Gonçalo.Pós – Graduado em Políticas Territoriais no Estado do Rio de Janeiro,””Latu senso”, pelo Instituto de Geociências da UERJ, Cam-pus Maracanã

2. Os dados do Banco Mundial apresentam outros resultados, devido à metodologia diferenciada utilizada por esta instituição. Assim posto, o

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percentual de Católicos Romanos sobe para 85,3%,enquanto os Evan-gélicos sobem também para 16,6%.É importante assinalar,que o termo “evangélico” é utilizado apenas no Brasil,pois no resto do mundo são conhecidos como Protestantes.O espiritismo, os cultos afro-brasileiros e ameríndios ( como o Santo Daime) são tratados como religiões “ani-mistas”.e perfazem 4,9% dos fiéis.Os sem religião (ateus e agnósticos ) representam 2,9%.Outros credos representam 1%.

3. O catolicismo Romano fora um dos mecanismos para a dominação colonial, sobretudo através das ordens dos jesuítas e franciscanos, que tomaram para si a tarefa de evangelização dos índios e fundação das primeiras instituições de ensino na então América portuguesa..Desde o início, a repressão as divindades indígenas e africanas fazia parte do empreendimento colonizador - e civilizatório - português, mas que com o tempo,produziu um sincretismo bastante variado regionalmente.A repres-são ao Judaísmo e ao islamismo eram mais por considerações políticas,e assim,enquanto os muçulmanos (conhecidos como “marranos’ ou “sarra-cenos” ) eram considerados “infiéis” e foram definitivamente expulsos do Brasil após a Revolta dos Malês em Salvador no ano de 1835. Os judeus eram convertidos a força e passaram a ser conhecidos como “cristãos no-vos”,cujos sobrenomes sobrevivem em ramos familiares como “Pereira”, “Oliveira”, “Carvalho” e outros.

4. No século XVI, os conflitos entre católicos e protestantes estavam no auge, e assim, os portugueses que aderiram fervorosamente à contra-re-forma, não permitiram o estabelecimento de qualquer congregação pro-testante em sua s colônia. Em 1572, os Huguenotes foram exterminados na própria França na sangrenta “noite de São Bartolomeu”, onde o seu líder, Almirante Coligny foi assassinado em público por ordem da Rainha Maria de Médicis.

5. Além do brasileiro Leonardo Boff, o peruano Gustavo Gutierrez e o nicaraguense Ernesto Cardenal (ministro da educação no governo sandi-nista), eram as figuras mais proeminentes da Teologia da Libertação.

6. Em visita a Nicarágua nos anos 1980, João Paulo II chegou a re-

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preender o padre e ministro da educação do país Ernesto Cardenal em público, deixando clara a sua reprovação com as atividades da Teologia da Libertação. É necessário lembrar, que os EUA promoviam uma verda-deira guerra não declarada contra esse país centro americano, onde a CIA apoiava nessa época com armas e dinheiro os remanescentes da Guarda Nacional de Anastácio Somoza (conhecidos como contras) que tinham como fim a derrubada do governo sandinista.

7. Na América Latina poucos partidos ou organizações de orientação marxista vislumbraram a utilização da mídia como ferramentas para a construção - se não de uma revolução – de uma nova sociedade:além dos diversos periódicos que além de terem vida efêmera,eram incompreen-síveis para o proletariado que pretendiam organizar,pelo simples fato da baixa instrução da maioria esmagadora desses trabalhadores.Nos anos 1980,a Rádios Venceremos da Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional em El Salvador, e na Nicarágua,o jornal e Rádio ‘Barricada” da Frente Sandinista de Libertação Nacional foram tentativas mais para fazer frente as transmissões das emissoras financiadas pela CIA as Rádio América e Rádio Martí, ambas com sede em Miami,EUA e que tinham por objetivo desqualificar os movimentos guerrilheiros que atingiram a região na época.

8. Além do trabalho informal, a terceirização de serviços foi se expan-dindo dentro do processo de desemprego estrutural, cuja nomenclatura, se refere à velha padronização “fordista” da carteira assinada, ou melhor, o vinculo empregatício de um trabalhador com uma determinada empresa. A acumulação flexível trouxe a figura do trabalhador eventual, que ganha uma importância “x”por dia trabalhado, sem qualquer ligação trabalhista com a empresa que oferece determinado serviço. Assim, os sindicatos perderam muito da sua importância, e hoje, são de uma forma geral parti-lhado por partidos e remanescentes grupos de esquerda ou por “pelegos” ligados a segmentos de direita com base sindical.

9. O que resta hoje de jovens militando em partidos de orientação marxista estão restritos a Diretórios Acadêmicos nas Universidades, em Grêmios Estudantis (cada vez mais raros) nos colégios no ensino médio

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– e em casos especiais – nas entidades do terceiro setor, especificamente em ONGs e Ocips. Embora de forma inconsciente, as populações hipos-suficientes vêem com desconfiança o discurso revolucionário de “mauri-cinhos e “patricinhas” enquanto promessas de transformação social,e de certo modo,estão com a razão:é muito fácil vender a idéia de “revolução” quando se tem café da manhã,almoço e janta garantida;estudam em bons colégios particulares;viajam para os países centrais pelo menos a cada dois anos e para países periféricos em lúdicas e alucinantes experiências psicodélicas,ou seja, tratam-se de jovens de classe média alta que estão envergonhados (ou revoltados) com a alta mesada que ganham em seu ócio e tomam emprestado parcas idéias marxistas para o exercício do seu “recreio” social.E assim,os jovens de classe média são apenas “espéci-mes’ curiosos para as populações que padecem com a insegurança,falta de infra-estrutura e o “estresse” permanente para a sobrevivência.

10. Sempre existiram as aglomerações de jovens: das “turmas” da pri-meira metade do século XX até as tribos urbanas da passagem desse sé-culo ao XXI, os adolescentes sempre necessitaram se juntar a algum tipo de comunidade, e hoje, as tribos fortaleceram-se com a pós-modernidade, pois a idéia da diversidade criou grupos específicos, que compartilham locais de reunião, preferências musicais e outras peculiaridades que não raro, levam a rivalidades muitas vezes com manifestações violentas entre esses diferentes grupos.

11. A idéia de solidariedade entre os povos e no cotidiano pregado pelo socialismo não seduz as massas, pois estas preferem a ideologia do “ame-rican way of life”, ou seja, o modo de vida americano que a sua poderosa mídia vende diariamente através das suas poderosas redes de comuni-cação (CBS, ABC, NBC, CNN, etc), recurso que a maioria dos partidos marxistas ou socialistas sempre desprezou. Mesmo a existência dos filmes do iconoclasta Michel Moore, onde a verdadeira sociedade americana mostra a sua face ou o irônico desenho animado dos “Simpsons” que de forma lúdica ironiza os valores norte americanos, não ofusca ainda o domínio global das mentes por essa superpotência. Assim, os adversários do capitalismo são recorrentemente desqualificados como “invejosos”, ”derrotados”, e mesmo, “desequilibrados mentais”.

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12. De uma forma geral, as populações hipossuficientes não estão nem um pouco interessadas em ouvir discursos pragmáticos ou transgressores emanados por organizações de esquerda, e por quê? Primeiro, o discurso não é compreendido por essas populações, e, portanto, são normalmente repelidos; segundo, há uma insensibilidade e desconhecimento sobre as necessidades mínimas do povo, e assim, costumamos ver e julgar as popu-lações pobres enquanto “vendidas e pelegas”, pois aceitam cargos comis-sionados, cestas básicas e se contentam com o restaurante popular, ou seja, em nossa concepção elitista, esses povos são “subservientes” ao estado e aos empresários, embora não vejamos que estamos lidando com comuni-dades que jamais tiveram acesso a nada, e assim, o pouco que ganham soa como vitória. As igrejas neo-pentecostais não só compreendem tal situação e vem tomando espaço de outros grupos de direita que desde os primórdios da república se utilizam desse recurso para manter a sua hegemonia.

13. A IURD está presente em Portugal na Europa, Angola na África e mesmo nos EUA

14. Essas prerrogativas abrem espaço para colocar os cultos afro-brasi-leiros e indígenas na ilegalidade, além de cercear outras religiões impor-tantes como o Budismo e outras politeístas orientais. Isso atenta contra a diversidade que apesar do racismo e do elitismo, sempre foi corrente no Brasil.

15. Pelo histórico de diversidade religiosa e étnica que sempre vigorou no Brasil (apesar de constante repressão), a instalação de uma teocracia é improvável, mas não impossível, pois o brasileiro de uma forma geral sempre se orientou pelo conservadorismo, e as igrejas evangélicas prome-tem – ao menos no discurso – a moralização da sociedade e da política, velhos discursos que a direita sempre se pautou para manter a ordem segundo a sua ótica.

16. No início do século XXI, estudos da Professora Desiree Guichard Freire assinalam que estava ocorrendo uma emergência de pólos de con-fecção, que no ano de 2005, correspondiam a 224 empresas e micro-em-presas, empregando um contingente de 2.765 pessoas. Além disso, por

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essa época foram voltando atividades industriais em setores tradicionais como tintas, cimento e vidro, bem como, a instalação de um pólo quí-mico/farmacêutico, inclusive com a participação do capital estrangeiro. (FREIRE, 2006, p.353 -354).

17. Uma fração de políticos locais e quase a maioria doas lideranças co-munitárias continuam a denominar São Gonçalo enquanto cidade dormi-tório apesar da ter ultrapassado o seu primeiro milhão de habitantes. Essa mentalidade impede que tenhamos um transporte integrado como reza o Estatuto das Cidades, a melhoria do saneamento básico e até mesmo melhores indicadores de saúde.

18. Por décadas a instalação acelerada de habitações precárias favore-ceu especuladores fundiários urbanos, que foram assentando os migrantes sem qualquer assessoria de engenheiros ou arquitetos, pois vigorou em São Gonçalo a prática da “autoconstrução”,onde os moradores com a aju-da de parentes e vizinhos solidários foram erguendo as moradias.Dentro desse processo, jamais respeitou-se o código de obras e as moradias fo-ram erguidas em margens de rios por exemplo.A utilização de lenha,pois muitas localidades não tinham sequer postos para a venda de bujões de gás,foi degradando manguezais e destruindo os remanescentes de mata atlântica,ou seja, a desordem urbana trouxe consigo problemas ambientais em cadeia.

19. Trata-se de um fenômeno que não acontece somente em São Gon-çalo, e sim, em toda a RMRJ: além da penetração missionária junto às comunidades carentes, eles se articulam para penetrar nas instâncias das prefeituras municipais, ou seja, interessa-lhes o acesso aos organismos municipais (secretarias, subsecretarias, conselhos municipais, etc) para a construção de influência política ao nível local.

20. O discurso conservador dos neopentecostais não se afasta muito da di-reita tradicional. Não se deve perder de vista, que apesar de estarem presen-tes em associações de moradores, e entidades do terceiro setor, as congre-gações evangélicas não tem nenhum compromisso com a transformação da sociedade e sim fortificar os poderes dos pastores mais proeminentes.

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21. Outras emissoras evangélicas que transmitem nesses dois distritos citados podem ser encontradas durante a Voz do Brasil nos seguintes dials: 91,03MHz; 91,07MHz, 94,05 MHz, 95,03MHz e 102,05 MHz.Os profissionais que trabalham nessas emissoras pouco dizem sobre o nome das rádios e a congregação a que pertencem.

22. A discriminação contra grupos LGBT chega ao ponto de se estender para a rede de ensino no município: há relatos que professores de credo evangélico além de desqualificar as culturas negras e indígenas, estimula o “bullyng” entre os alunos, sobretudo contra estudantes de orientação LGBT, o que é um escárnio considerando que a escola deve preparar as pessoas para a vida e não para a perpetuação de preconceitos.

23. Há relatos bastante correntes que a corrupção na Secretaria de Saúde, bem como no próprio Conselho municipal da área é um padrão. Porém, poucos se atrevem a apurar e denunciar essa situação,devido a própria segurança de quem sabe sobre o assunto.

24. Nas igrejas principais, os cultos são ministrados por pastores com formação acadêmica, ou seja,realmente são estudiosos de teologia e cos-tumam dialogar com outras religiões com mais base teórica,ainda que não deixem de ser fundamentalistas.

25. Declaração Universal dos Direitos Humanos Artigo 2: “Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidas nessa declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição.”

26. As bases de penetração evangélicas nas instâncias municipais foram construídas e consolidadas nos oito anos da “era Panisset”, e assim, eles já têm musculatura suficiente para intervir em qualquer administração que venha a ocupar a prefeitura de São Gonçalo. Mais uma vez, o ditado popular é sábio: “Rei morto, rei posto”.

27. O argumento de que a Coréia do Sul sob a influência norte-ameri-

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cana entrou no grupos dos países centrais (ou do primeiro mundo como queiram) é bastante tentador, porém, esse país vive em situação análoga a Alemanha durante a Guerra Fria: após décadas de domínio japonês, norte-americanos e soviéticos dividiram o país em dois no contexto da disputa leste/oeste. A Guerra Fria acabou as as duas Coréias estão muito longe da unificação, pois a do norte está sob a tutela de uma dinastia dita comunista, e a do sul, não passa de uma base norte-americana no extremo oriente. Considerando que a “Segunda Guerra Fria” está em gestação, e o novo rival dos EUA é a China, as Coréias permaneceram divididas por um bom tempo ao longo desse século.

28. O time era o CENE, filiado à Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul. Foi um dos seus últimos empreendimentos até a sua morte.

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