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A Reorganização do Espaço Urbano Carioca - Em Destaque o Eixo Madureira- Campinho e seus Movimentos Sociais. Caio Calixto Teixeira Pereira Graduando em Geografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Bolsista do Programa de Educação Tutorial - PET [email protected] Resumo: O trabalho é resultado da pesquisa orientada pelo Prof. Dr. Ulisses Fernandes dentro do Programa de Educação Tutorial de Geografia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Sua temática envolve as desapropriações feitas pela Administração da Prefeitura do Rio de Janeiro, no Eixo Madureira-Campinho. Nesse eixo estão bairros da Zona Norte do subúrbio Carioca, os quais sofrerão forte interferência urbana em função da obra pública denominada BRT – Transcarioca, a qual ligará o Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, na Ilha do Governador e o bairro da Barra da Tijuca, na Zona Oeste da cidade. Através deste trabalho pretende-se analisar os movimentos sociais criados pelos moradores e entidades civis relacionados direta ou indiretamente ao eixo analisado. Pretendendo apresentar os resultados das remoções feitas no que englobam muitos moradores de uma comunidade e seus deslocamentos populacionais contrapondo com as ações do poder público para com esses moradores e suas moradias. A operacionalização da pesquisa vem sendo realizada através de fontes primárias como documentos e projetos relacionados ao recorte espacial abordado juntamente com o aporte teórico de fontes secundárias dimensionadas pelos movimentos sociais e organização espacial urbana. Com isso, foram realizados trabalhos empíricos para coleta e análise de dados necessários à pesquisa. Os resultados estão em estágio final, e podemos afirmar que muitos moradores foram removidos e realocados em outros bairros da Zona Oeste da cidade, principalmente Cosmos, passando a enfrentar inúmeras dificuldades como a dificuldade de deslocamento ou o fato de terem de sustentar o ônus do aluguel social proposto pelo Município em alguns casos. Palavras-chave: movimentos sociais, Madureira, BRT – Transcarioca, espaço urbano.

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A Reorganização do Espaço Urbano Carioca - Em Destaque o Eixo Madureira-Campinho e seus Movimentos Sociais.

Caio Calixto Teixeira Pereira

Graduando em Geografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Bolsista do Programa de Educação Tutorial - PET

[email protected] Resumo: O trabalho é resultado da pesquisa orientada pelo Prof. Dr. Ulisses Fernandes dentro do Programa de Educação Tutorial de Geografia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Sua temática envolve as desapropriações feitas pela Administração da Prefeitura do Rio de Janeiro, no Eixo Madureira-Campinho. Nesse eixo estão bairros da Zona Norte do subúrbio Carioca, os quais sofrerão forte interferência urbana em função da obra pública denominada BRT – Transcarioca, a qual ligará o Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, na Ilha do Governador e o bairro da Barra da Tijuca, na Zona Oeste da cidade. Através deste trabalho pretende-se analisar os movimentos sociais criados pelos moradores e entidades civis relacionados direta ou indiretamente ao eixo analisado. Pretendendo apresentar os resultados das remoções feitas no que englobam muitos moradores de uma comunidade e seus deslocamentos populacionais contrapondo com as ações do poder público para com esses moradores e suas moradias. A operacionalização da pesquisa vem sendo realizada através de fontes primárias como documentos e projetos relacionados ao recorte espacial abordado juntamente com o aporte teórico de fontes secundárias dimensionadas pelos movimentos sociais e organização espacial urbana. Com isso, foram realizados trabalhos empíricos para coleta e análise de dados necessários à pesquisa. Os resultados estão em estágio final, e podemos afirmar que muitos moradores foram removidos e realocados em outros bairros da Zona Oeste da cidade, principalmente Cosmos, passando a enfrentar inúmeras dificuldades como a dificuldade de deslocamento ou o fato de terem de sustentar o ônus do aluguel social proposto pelo Município em alguns casos. Palavras-chave: movimentos sociais, Madureira, BRT – Transcarioca, espaço urbano.

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Introdução

A cidade tem se constituído, ao longo da história, como um dos principais locais de lutas sociais, expressas pelo conflito entre capital e trabalho. Como consequência, ocorre a articulação de uma rede desigual, caracterizada por uma grande e complexa divisão técnica, social e econômica do espaço urbano. Esse processo está sempre associado a uma enorme diferença nas condições de vida dos inúmeros grupos sociais existentes nas cidades, o que gera, a partir da década de 60, novas formas de manifestação para as lutas sociais na cidade e que passaram a serem denominados Movimentos Sociais Urbanos.

O eixo Madureira-Campinho, no subúrbio do Rio de Janeiro, passou por este processo caracterizado pela diferenciação do espaço urbano, como condicionante social, pois houve uma grande reforma no município Rio de Janeiro referente à infraestrutura visando a melhoria dos espaços urbanos para a Copa do Mundo em 2014 e os Jogos Olímpicos em 2016. Contudo, no que tange aos movimentos sociais, alguns processos urbanos de construções e remoções ficaram latentes em nossa cidade, a partir de alguns pontos denominados pelo poder público como cruciais para a conclusão das obras de mobilidade urbana. Um dos processos de reorganização espacial é denominado de BRT (Bus Rapid Transit), no qual ligará bairros distantes da cidade, diminuindo seu tempo de percurso.

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Figura 1: Detalhes do projeto da Transcarioca.

Fonte : http://www.cidadeolimpica.com.br/noticias/orgulho-da-transcarioca.

Dentre os quatro traçados propostos pela Prefeitura da Cidade – Transoeste,

Transbrasil, Transolímpica e Transcarioca, conforme Figuras 1 e 2 –, o abordado na pesquisa será o do Transcarioca, o qual ligará o bairro do Galeão, na Ilha do Governador, mais especificamente o Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro ao bairro da Barra da Tijuca. Este traçado superpõe-se ao eixo Madureira-Campinho, fazendo com que o poder público se manifestasse de forma coerente com seus interesses, obrigando a muitos cidadãos que residiam no traçado superposto fossem removidos de suas casas, principalmente na Rua Domingos Lopes, no bairro de Madureira. Os moradores se articularam e criaram movimentos que pudessem ir contra as remoções realizadas pela Prefeitura Municipal, visto que havia pessoas que residiam naquela localidade há mais de 30 anos.

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Figura 2: Trajeto dos Corredores de BRT na Cidade do Rio de Janeiro

Fonte: http://www.onibusparaibanos.com/2012/06/conhecendo-o-sistema-brt-transoeste-do.html.

Objetivos

Através desta pesquisa, pretende-se analisar os movimentos sociais criados pelos moradores e entidades civis relacionados direta ou indiretamente ao Eixo Madureira-Campinho, no que diz respeito ao tratamento imposto pelo poder público e as questões diretamente relacionadas ao traçado elegido pela Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro para execução da referida obra. E apresentar a situação dos moradores para com as ações da Prefeitura no que tange principalmente a perda incontornável de suas casas, e a consequente obrigação de se deslocarem a outros locais, novas moradias em outros bairros ou abrigos públicos.

Justificativa

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Por ser morador do Bairro de Campinho noto que mudanças na organização espacial do eixo a ser trabalhado estão acontecendo de maneira intensa e com isso, muitos moradores estão insatisfeitos com as ações do Poder Público, principalmente em respeito às indenizações e realocações propostas.

Área de Estudo

A pesquisa é desenvolvida no bairro de Madureira, bairro localizado na Zona Norte da Cidade do Rio de Janeiro [vide Figura 2], que possui uma área de 378,76 Km² e uma população de 49.546 habitantes – principalmente na Rua Domingos Lopes [vide Figura 3] onde há maior concentração de famílias removidas. O bairro caracteriza-se por apresentar um considerável comércio de rua, principalmente no Mercadão de

Madureira, sendo um importante subcentro, apresentando um caráter popular e atendendo outras áreas do município.

Figura 3: Divisão Político-Administrativa do Município do Rio de Janeiro

Fonte: http://www.sempretops.com/informacao/mapa-do-rio-de-janeiro/.

Metodologia

Foram estruturadas informações concernentes à pesquisa através de fontes primárias como documentos e projetos relacionados ao recorte espacial, bem como artigos acadêmicos ou jornalísticos direcionados para o assunto abordado. As fontes secundárias também atenderão ao aporte teórico dimensionado pelos movimentos sociais e pela organização espacial urbana, além de dados do IBGE (Instituto Brasileiro

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de Geografia Estatística), da Prefeitura Municipal (Sítio Eletrônico cidadeolímpica.com) e do Instituto Pereira Passos. Também foram realizados trabalhos empíricos para coleta e análise de dados necessários à pesquisa, como entrevistas e visitas aos locais de desapropriação dos moradores, principalmente a Rua Domingos Lopes, Madureira, obtendo informações para a formatação e inclusão na pesquisa, com os depoimentos dos moradores sobre o ocorrido.

Discussão Teórica

Desde seu início, a obra está gerando uma enorme insatisfação por parte dos moradores para com a forma pela qual o Poder Público vem tratando o remanejamento das pessoas cujas casas se superpõem ao traçado da nova via expressa. A partir de tal situação, muitos moradores se organizaram e iniciaram alguns movimentos contra o remanejamento e as indenizações – consideradas insuficientes – recebidas pelos atingidos, criando movimentos sociais de bairro para que pudessem se defender das ações da Prefeitura da Cidade em relação às remoções e remanejamento das famílias.

Nesse sentido, procurou-se buscar uma bibliografia que permitisse o melhor entendimento acerca dos movimentos sociais e de suas funções dentro da sociedade. Assim, nos embasamos nos seguintes autores, Maria da Glória Gohn (1987), Satie Mizubuti (2007), Jean Lojkine (1981) e Roberto Lobato Corrêa (1995), para que com a bibliografia citada possamos entender o que de fato significa e se articula como Movimento Social e Movimento Social Urbano, que são concepções diferentes acerca do assunto.

Reconhecemos, portanto, a importância de uma sucinta discussão, dada a amplitude do assunto, acerca dos movimentos sociais. Portanto, apoiamo-nos na análise de Mizubuti (2007), quando afirma que:

para que os movimentos sociais tenham eclodido e prosperado, porém, não basta a simples existência de carências e insatisfações. É necessária a convergência desse estado de precariedade cotidiana e elementos detonadores que põem o povo em movimento, mesmo em quadro de profundo autoritarismo político-institucional, inibidor de qualquer possibilidade de manifestações (MIZUBUTI, 2007, p. 233).

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Por sua vez, Gohn (1987, pag. 270) ressalta que um movimento social pode passar por diferentes fases, tais como:

- situação de carência ou ideias e conjunto de metas e valores a se atingir;

- formulação das demandas por um pequeno número de pessoas (lideranças e

assessorias);

- aglutinação de pessoas (Futuras bases do movimento) em torno das demandas;

- organização elementar do movimento;

- formulação de estratégias.

Encontramos as fases citadas na articulação dos moradores que se expressaram em determinados protestos que eclodiram principalmente em janeiro e fevereiro de 2010, tais como: ação através de associações de moradores em Madureira para que a defensoria pública do Estado do Rio de Janeiro pudesse instruí-los quanto à questão; inúmeros protestos pacíficos com faixas e cartazes contra as remoções e remanejamentos, afirmando que estão sendo removidos de forma arbitrariamente dos seus imóveis.

O Estado se articula como regulador do espaço urbano e se utiliza de aparelhos públicos para este processo. Sendo assim, age de forma desigual para com determinados âmbitos sociais, ressaltando a forma de atuação do mesmo para com as remoções feitas no processo de desapropriação dos moradores em Madureira. Esse fato remete a ideia de Corrêa (1995, p. 24), quando aborda o papel do Estado: “uma primeira observação refere-se ao fato de o Estado atuar diretamente como grande industrial, consumidor de espaço e de localizações específicas, proprietário fundiário e promotor imobiliário, sem deixar de ser também um agente de regulação do solo”. A citação faz uma alusão aos conflitos sociais urbanos, que geram esses movimentos de ações para lutas concernentes às necessidades e direitos de cada cidadão, nos mostrando que o Estado serve como um árbitro que delimita suas bases principalmente onde se encontra o capital, seja ele privado ou público.

Com a ajuda do Comitê Popular da Copa – entidade que trata as questões sociais referentes à infraestrutura e seu rearranjo social, principalmente das remoções e ações públicas contra os cidadãos – foram publicados artigos, em fevereiro de 2011, com apoio dos moradores, que apresentavam a insatisfação dos mesmos para com o tratamento recebido por parte do poder público, principalmente do Subprefeito da Região Administrativa de Madureira, o Sr. André Luiz dos Santos. O mesmo prometeu

uma resolução no que tange as realocações dos moradores a bairros próximos e não a cumpriu.

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Figura 4 : Insatisfações dos moradores com as obras

Fonte: sítio eletrônico: http://www.fazendomedia.com/.

Figura 5: Rua Domingos Lopes, Madureira – Rio de Janeiro

Fonte: Sítio Eletrônico da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro.

Por outro lado, destaca-se também a existência de recomendações e regulamentações deferidas pela Organização das nações Unidas, as quais a Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro e outras esferas de poder presentes no Brasil deveriam observar.

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Recomendações e Regulamentações dos Órgãos Envolvidos no Processo de Reestruturação Urbana.

Recomendação do Conselho de DHs da ONU ao Brasil no âmbito da Revisão

Periódica Universal – maio 2012

‘Assegurar que a reestruturação urbana que antecede a Copa de 2014 e as Olimpíadas

de 2016 sejam apropriadamente reguladas para evitar remoções e despejos forçados e

fazer todo esforço para assegurar que os eventos futuros tragam benefícios duradouros

para os moradores urbanos mais pobres e marginalizados’

No âmbito internacional, o Pacto Internacional pelos Direitos Econômicos, Sociais e

Culturais (adotado pela XXI Sessão da Assembléia-Geral das Nações Unidas, em 19

dedezembro de 1966 e subscrito pelo Brasil em 1992) estabelece em seu artigo 11 o

direitoà moradia adequada, que o Comentário Geral nº. 4 da Organização das Nações

Unidasmelhor especifi ca, fazendo menção à segurança jurídica da posse (em que se

protege o cidadão das remoções forçadas e ameaças), à disponibilidade de serviços e

infraestrutura,ao custo da moradia acessível, e à habitabilidade, acessibilidade,

localização e adequação cultural da habitação.

No âmbito nacional, a Constituição Federal de 1988 estabelece a moradia como direito

social fundamental, cria a função social da propriedade e estabelece as diretrizes da

política urbana, enquanto o Estatuto da Cidade (2001) torna obrigatórios os planos

diretores – emque deve ser tratada a questão habitacional – para cidades acima de

20.000 habitantes. Ainda,a Lei 11.124, de 16 de junho de 2005, dispõe sobre a

utilização prioritária de terrenos de propriedade do Poder Público para a implantação

de projetos habitacionais de interesse social.

O Município do Rio de Janeiro se pronuncia através de uma Lei Municipal, na qual explicita a questão da habitação.

A política de desenvolvimento urbano respeitará os seguintes preceitos: [...] VI - urbanização, regularização fundiária e titulação das áreas faveladas e de baixa renda, sem remoção dos moradores, salvo quando as condições físicas da área ocupada imponham risco de vida aos seus

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habitantes, hipótese em que serão seguidas as seguintes regras: a) laudo técnico do órgão responsável; b) participação da comunidade interessada e das entidades representativas na análise e definição das soluções; c) assentamento em localidades próximas dos locais da moradia ou do trabalho, se necessário o remanejamento (LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, Artigo 429).

Segundo os moradores, o referido administrador, como representante da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, não informou que os moradores seriam removidos a bairros situados na zona oeste da Cidade e a aproximadamente 46 quilômetros de distância do antigo bairro. Além disso, a informação do local para onde seriam realocados foi dada apenas no momento de desapropriação. Além deste fato, os moradores teriam que custear uma prestação mensal de cinquenta reais do programa Minha Casa Minha Vida, da Caixa Econômica Federal, algo muito custoso para algumas famílias, em sua maioria muito pobres. Anteriormente, não tinham que custear tal dívida, pois suas antigas casas que eram próprias, em grande maioria. Outros moradores, sem recursos para custearem essa prestação mensal proposta pela Prefeitura, seriam levados a abrigos comunitários ou a casa de eventuais parentes.

A cientista Social Maria da Gloria Gohn categoriza alguns movimentos recorrentes no mundo, mostrando que os movimentos sociais construídos a partir de determinados problemas sociais buscam soluções de cunho coletivo. Para a autora,

todo coletivo enfrenta dificuldades a serem superadas na sobrevivência cotidiana. Independente da classe social de um indivíduo, ele precisa ter acesso a condições de abrigo, alimentação etc. Várias dessas condições só são possíveis à maioria da população no nível do coletivo. São chamados equipamentos coletivos de consumo: escola, transportes, saúde e lazer (GOHN, 1987, p.269).

Sendo assim, Lojkine (1981) ressalta a representação dos movimentos sociais urbanos, indicando que

os movimentos sociais urbanos representam a capacidade de um conjunto de agentes das classes dominadas de se

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diferenciar dos papéis e funções pelas quais a classe (ou fração de classe) dominante assegura sua subordinação e sua dependência em relação ao sistema socioeconômico vigente (LOJKINE, 1981, p.237).

O autor sintetiza algumas das insatisfações em relação ao tratamento dado pela sociedade e principalmente o poder público às classes menos providas de recursos, informando que são reféns do sistema vigente e das classes dominantes. Corroborando com o pensamento do autor, a charge a seguir [Figura 4] resume de forma brilhante o ocorrido na localidade estudada, demonstrando como a resistência popular tenta impedir as ações do Estado contrárias as suas necessidades de vida.

Figura 6: Charge Contra as Remoções

Fonte: Sítio Eletrônico Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas.

Sintetiza-se a discussão teórica apresentando o que de fato seria um movimento social urbano e de que forma o mesmo poderia influenciar numa determina espacialidade da cidade. Utilizando a bibliografia estudada, foi estruturada essa síntese da definição de Movimentos Sociais Urbanos:

Movimentos sociais são articulações de inúmeras formas de organizações populares, com o objetivo de reivindicar direitos sociais tradicionais, para sobrevivência do ser humano. Visa a garantia da igualdade, liberdade e construção de uma democracia, para que toda a sociedade

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possa usufruir de qualquer equipamento do aparato estatal de forma positiva e digna (GOHN, 1995, pag.13).

Conclusão

Analisadas as informações coletadas na operacionalização da pesquisa, informamos que a mesma encontra-se em andamento, porém ja obtivemos alguns resultados significativos. Sobre o arranjo socioespacial urbano no eixo citado no estudo incide uma infração aos direitos de moradia previstos pela Câmara de Vereadores da Cidade do Rio de Janeiro, pois a Prefeitura arbitrariamente removeu os moradores para que a passagem da via expressa pudesse trazer pretensos benefícios ao restante da população da cidade, não considerando o previsto na Lei Orgânica do Município. A saída encontrada pela Prefeitura foi à realocação dos mesmos na zona oeste da Cidade, principalmente no bairro de Cosmos, o que corresponde a 46 quilômetros de distância do antigo bairro onde residiam. Além disso, a prefeitura propôs aos moradores que fizessem parte do programa social denominado Minha Casa, Minha Vida, do Governo Federal, que acarretaria em um ônus de R$ 50,00 [cinquenta reais] por mês para se realocarem nas novas casas. Os moradores que não pudessem sustentar este aluguel seriam levados a abrigos comunitários da Cidade ou a casa de parentes.

Figura 7: Complexo de moradias em Cosmos.

Fonte: Sítio eletrônico, http://rioonwatch.org.br/, acessado em 24/06/2014.

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Podemos perceber um descaso inicial da administração municipal, que postergou soluções satisfatórias para as quase cem famílias, aproximadamente quatrocentos moradores, residentes desta localidade, que em muitos casos estão instalados no local a mais de trinta anos, sujeitando os mesmos a situações extremas de humilhação e inferioridade por conta dos interesses do próprio Município. Com isso podemos afirmar que o descaso do Município para com os moradores que foram realocados na Zona Oeste da cidade foi rechaçado pelos mesmos, visto que após os realocamentos e desapropriações o Município ‘esqueceu’ os moradores, principalmente no que concerne ao aparato estrutural das novas casas que foram ‘cedidas’ pela Prefeitura, expondo novamente os moradores a situações de humilhação, pois além de realocarem estas famílias, ainda concederam moradias que não estavam adequadas, havendo inúmeras reformas que os próprios moradores realizaram. As reformas realizadas, obtiveram um custo no qual foi inteiramente arcado pelos próprios moradores, não havendo nenhum subsídio Municipal para as famílias reassentadas.

Referências:

CORRÊA, R.L. Região e Organização Espacial. 8ª Edição. São Paulo: Editora Ática, 1995.

GOHN, Maria da Gloria. Teoria dos Movimentos Sociais: Paradigmas Clássicos e Contemporâneos. São Paulo: Editora Loyola, 1987.

LOJKINE, Jean. O Estado Capitalista e a Questão Urbana. São Paulo: Martins Fontes, 1981.

MIZUBUTI, Satie. Uma Releitura do Movimento Associativo de Bairro. In: SANTOS, Milton et all. Território, Territórios – Ensaios sobre o Ordenamento Territorial. Rio de Janeiro: Lamparina, 2007.

RIO DE JANEIRO. Lei Orgânica do Município (1990). – 2ª. edição. Rio de Janeiro: Centro de Estudos da Procuradoria-Geral do Município, 2010.

FERNANDES, Marlene. Agenda Habitat para Municípios. Rio de Janeiro: IBAM, 2003.

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