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A RELAÇÃO CAMPO CIDADE: O MOVIMENTO MIGRATÓRIO DOS
ASSOCIADOS DA ASSOCIAÇÃO DE RECICLADORES REI DO PET -
SUAS ORIGENS E TRAJETÓRIAS
Jessica Gislaine das Neves
Camila Sopko
Gilson Campos Ferreira da Cruz
Reidy Rolim de Moura
INTRODUÇÃO
Falar sobre pessoas e seus comportamentos nunca foi tarefa fácil, até hoje a
psicologia, a filosofia, e a sociologia encantam e instigam nossas mentes ao tentarmos
compreender os seres humano. Mas uma coisa podemos facilmente afirmar, as ações de vida
de uma pessoa são resultados de experiências vividas pela mesma, ou seja, somos construções
(somos resultado de um processo histórico), pois nossa história tem muito a ver com o que
somos hoje, nossa criação, nossos costumes, nossas relações, nossas mudanças (sejam
externas ou internas) e tantos outros fatores nos auxiliaram a nossa formação do “eu”. Tanto
as ações quanto as relações que cada ser humano vive e traz experiências resulta em
construções.
Essa tarefa de analisar como foram feitas determinadas construções na vida de cada
sujeito que hoje participa de um determinado grupo é algo complexo, porém se faz necessário
este entendimento, por mais breve e sucinto que seja, uma vez que se faz a formação de um
grupo a partir das histórias que os sujeitos que o compõe trazem. Dessa forma este estudo
resultou da necessidade de se clarificar o processo de movimento migratório dos sujeitos da
associação de Recicladores Rei do “PET”, uma vez que através de observações e conversas
informais pode-se perceber que grande parte dos associados participa do processo de
migração para esta cidade na busca de melhores condições de vida. A partir disso, se fez
necessário esta pesquisa para analisar as origens, trajetórias de vidas dos associados e
perpassar pela temática do êxodo rural, uma vez que esta é uma realidade presente por grande
parte dos associados.
Com o objetivo de deixar a leitura mais clara este trabalho está divido em
Desenvolvimento, contendo 7 partes, sendo estas: População, Área Rural, Área Urbana,
Movimentos Migratórios, Êxodo Rural, Economia Solidária e ARREP – Associação de
Recicladores Rei do Pet (Uma vez que para entender as construções dos processos
migratórios dos sujeitos da ARREP, é importante esclarecer tais tópicos, antes de chegar
constatação final que será a trajetória dos sujeitos.), Resultados, sendo um item composto de
apresentação de gráficos e discussões, Considerações Finais, abordando aspectos relevantes
da pesquisa, e por fim, Referências.
Esta breve pesquisa irá esclarecer de forma breve como se deu este processo e irá
explicitar de onde os sujeitos saíram e quais foram seus motivos para sair do local onde
nasceram e para finalizar mostraremos quais foram os resultados e as evidencias de o porquê a
cidade se mostrou como uma alternativa para a melhora da condição de vida destes sujeitos.
A POPULAÇÃO RURAL E URBANA E SEUS MOVIMENTOS
Compreender a mobilidade territorial de um determinado grupo – no caso, a
mobilidade dos associados da Associação de Recicladores Rei do Pet (ARREP) e as razões
dessa mobilidade são parte de uma compreensão complexa (pois envolve pessoas e suas
trajetórias de vidas – crenças que possuem, condições econômicas, costumes adquiridos, grau
de escolaridade, opção política, opção sexual, entre outros aspectos). Para facilitar essa
compreensão, faz-se necessário um breve conhecimento sobre População, Área Rural, Área
Urbana, Movimentos Migratórios, Êxodo Rural, além das informações sobre o grupo
pesquisado, a ARREP, bem como o contexto de sua inserção na Economia Solidária.
População
Quando falamos de população na perspectiva geográfica, estamos falando do número
de pessoas residentes em um específico tempo e espaço. No planeta, por exemplo, já
passamos dos 7 bilhões de habitantes. No Brasil, segundo IBGE (2010) já passamos dos
190.755.799 habitantes, sendo classificado como o 5º país em população do mundo. O Brasil
por coincidência é também o 5º país em extensão territorial do mundo. Mas essa coincidência
nos leva a uma excelente reflexão: a relação da população com o território habitado.
Sabemos que guerras e conflitos – relacionadas a questões étnicas, religiosas, pela luta
por direitos, por oposição a um sistema político fazem parte do contexto de nossa sociedade.
Porém, historicamente, podemos observar que muitos conflitos se desencadearam na
sociedade por razões de supremacia territorial (domínio de território). Como exemplo disso
temos o conflito da faixa de Gaza – que envolve questões territoriais e religiosas; o conflito na
região onde vive o povo basco – povo que vive em guerra armada com os países vizinhos, em
luta por independência e conquista de um território basco; o continente africano -– que passou
recentemente por guerras civis causadas pelo desejo de dominar o território – resquícios ainda
do período colonial que viveu; temos também o caso da Irlanda – que é um conflito territorial
e religioso intenso e tantos outros que estão relacionados ao território e a outros fatores.
Segundo alguns autores a dimensão da distribuição espacial é entendida como
geradora de grande parte da desigualdade prevalecida na atualidade – portanto também,
auxiliadora para a surgência de conflitos. Segundo George (1973, p.14):
A localização da população no interior das terras naturalmente ocupáveis surpreende
pela sua desigualdade e pelas contradições aparentes entre as aptidões para o
povoamento e o povoamento real. É essencialmente descontínua, feita de
concentrações de massas separadas por vazios relativos que estão longe de
corresponder na totalidade a regiões de fraca ou nula potencialidade para o
povoamento. Essa descontinuidade observa-se em duas escalas, na planetária e na
regional.
Essa desigualdade seria fruto de diversos fatores: naturais/físicos (considerando
aspectos como: temperatura, altitude, etc) e sociais (ocupações estratégicas e disputas por
terras). Nesse sentido, a distribuição de áreas por muitas vezes foi injusta – podemos observar
esse fato desde as repartições das capitais hereditárias no Brasil Colônia, onde uns possuíam
terras em detrimento de outros -– desprivilegiados, fato esse que influencia até os dias atuais
a ocupação de terras brasileiras, sendo a posse concentrada nas mãos de poucos.
O ideal seria um equilíbrio entre o número de habitantes e o território ocupado, porém
a distribuição desigual e a ausência de planejamento populacional resultam em um
desequilíbrio entre a população absoluta e a área territorial ocupada, o que pode ser
observado quando se analisa a população relativa de diferentes regiões do mundo.
Neste contexto, podemos observar que esse desiquilíbrio de ocupação de áreas acaba
por favorecer outro desequilíbrio, o social. Isso porque, no sistema de economia em que
vivemos, o capitalista, as inovações tecnológicas, o comércio, as inovações medicinais, civis,
os órgãos públicos, etc, chegam primeiramente aos grandes centros urbanos e as grandes
cidades, enquanto outras regiões são desfavorecidas e quase esquecidas. – é o paradigma
tecnológico de nossa sociedade.
As desigualdades podem ser vistas no dia-a-dia das populações que residem tanto na
área rural como na área urbana. Os grupos mais desfavorecidos acabam tendo suas vidas
marcadas pelas desigualdades que vivem.
Área Rural
Apesar de o conceito ainda ser muito discutido, podemos falar de uma forma sucinta e
geral, que é onde está compreendido o campo. Espaço onde ocorre a atividade extrativista (e
eventualmente a industrialização do campo) e as atividades agrícolas, da pecuária e da
silvicultura, que garantem a vida do homem do campo e o sustento das áreas urbanas.
No Brasil atualmente, a porcentagem da população rural é menor do que a população
urbana, diferente do que se observava até alguns anos atrás (até a década de 1960), quando o
que ocorria era o inverso. Muitos movimentos migratórios surgiram como respostas,
principalmente diante da Revolução Industrial, mudando esse quadro. O desenvolvimento
industrial brasileiro que se consolidava no final da década de 1950 resultou em uma demanda
muito grande por mão de obra nas cidades, estimulando um intenso movimento migratório do
campo para a cidade.
Além disso, a atividades agrícolas de larga escala e o aumento cada vez maior das
grandes propriedades na zona rural, resultou na expulsão do homem do campo, que não teve
outra saída a não ser migrar para as cidades.
Área Urbana
Dizer o que é a cidade ainda é um conceito muito discutido entre geógrafos e
pesquisadores, mas podemos argumentar que a mesma é complexa e diversificada
socialmente. No contexto das ideias de Munford (1938) a área urbana é onde ocorrem as
principais transações comerciais e econômicas; é local de força civilizatória – principalmente
em razão da maior concentração de pessoas; espaço com funcionamento estratégico e
articulado; espaço de construções; espaço de multiplicação de riquezas; local de intersecção
entre vários âmbitos – cultural, financeiro, religioso, de paisagem etc; local importante para a
consolidação de poder – seja ele representado pelas autoridades políticas, etc. Segundo
Mumford (1938), a cidade sofreu alterações importantes com as industrializações que a
alcançaram, modificando-a:
Em todos os bairros, os antigos princípios de educação aristocrática e cultura rural
eram substituídos por uma devoção unilateral ao poder industrial e ao sucesso
pecuniária [relativo ao dinheiro], algumas vezes disfarçada de democracia”.
(MUMFORD, 1998, p. 484)
Área urbana sempre esteve integrada à área rural, pois há um estado de dependência
entre uma e a outra. Por exemplo, é na área rural em que ocorrem as atividades agrícolas de
grande escala, servindo de base para a indústria alimentícia, medicinal e de recursos mundial.
Cabe aos centros urbanos, distribuir, realizar composições, utilizar tais recursos de modo a
atender as demandas de toda a população – porém sabemos que vem sendo estimulado cada
vez mais pelo comércio, o consumismo, gerando maior quantidade de resíduos sólidos, ação
que ignora os malefícios causados na terra, que é a fonte da vida de todos os seres humanos.
Nesse contexto a relação entre área urbana e rural é óbvia, como visto anteriormente,
entretanto, apesar dessa necessidade entre uma e outra, a área rural por muito tempo foi, e
ainda é em algumas regiões, estigmatizada como atrasada. Isso porque muitos que habitam
em tal área, muitas vezes não possuem tantos recursos e benefícios tecnológicos,
educacionais, financeiros, políticos etc. Por essa razão, as populações rurais sentem-se
frequentemente limitadas, ao viver no campo, e constantemente, com tristeza, optam por sair
da área rural (onde muitas vezes, nasceram e viveram a infância), em busca de “novos
horizontes” nas áreas mais urbanizadas.
Nessa perspectiva migratória, a área rural e a área urbana sempre articulam-se entre si.
Por isso, já há certa dificuldade em diferenciar zonas rurais de urbanas, em virtude da alta
taxa de transição entre elas.
Nas cidades, antigamente, o homem do campo encontrava certa facilidade para se
adaptar, até porque conseguia manter algumas atividades desenvolvidas no campo, porém
nos dias de hoje com o desenvolvimento tecnológico e a exigência de mão de obra
qualificada, as dificuldades para ingressar no mercado de trabalho tem sido cada vez
maiores.
Movimentos Migratórios
Podemos compreender os movimento migratórios a partir das reflexões encontradas no
livro de JÚNIOR et al (2010, p. 33), entendendo os movimentos migratórios como os
deslocamentos populacionais que ocorrem em diferentes escalas de espaço e tempo, pelos
mais diversos motivos. Dessa forma, podemos classificar as migrações em: migrações
internas que é o movimento populacional que ocorre dentro do país, e migrações externas que
são movimentos populacionais entre países.
Ainda na mesma visão de JUNIOR et al (2010, p. 33), os movimentos podem ser
classificados também como, permanentes e temporários. Os permanentes são aqueles com
fixação no território sem previsão de volta para o local de origem. As migrações temporárias
são os deslocamentos que podem ser pendulares – no caso de pessoas que diariamente fazem
o deslocamento, em virtude do trabalho por exemplo, e os deslocamentos sazonais ou
transumância, são os que ocorrem por um período específico, como exemplo a mobilidade
que ocorrem em determinadas épocas do ano – férias, ou por trabalho/curso temporário.
Podemos diferenciar ainda, os movimentos migratórios, afirmando que há migrações não
obrigatórias e obrigatórias – no caso de povos refugiados. Bem como migrações legais e
ilegais.
Como podemos observar que a mobilidade populacional ocorre o tempo todo. Isso não
é novidade, os vazios, explosões demográficas sempre existiram:
Desde as invasões dos povos bárbaros asiáticos até os migrantes dos novos tempos,
grupos populacionais põem-se em movimento: lutam pela hegemonia de novos
territórios, fogem de perseguições étnicas e repressões múltiplas, vislumbram a
possibilidade de terras e mercados de trabalho mais promissores, ou simplesmente
perambulam em busca de tarefas que lhes assegurem a mera subsistência (CASTRO
et al, 1997, p. 319).
A citação acima nos remete historicamente a população mundial que sempre foi
marcada por diversas migrações, que ocorreram por razões naturais e climáticas (em virtude
de secas, períodos de intensa chuva, inundações etc), políticas (causadas por guerras ou
atividades vinculadas a ações de cunho político/estatal) ou religiosas (por perseguições e lutas
religiosas) e econômicas (com o propósito de busca de melhoria de condições econômicas de
vida).
Sabemos que há o crescimento natural da população de um determinado território.
Porém, é importante destacarmos que as migrações modificam a constituição desse
crescimento, além de modificar também atributos gerais daquela sociedade, podendo
provocar: centros de aglomerações ou manchas urbanas, saturação de infraestrutura, meios
transitórios caóticos, o desordenamento de habitações, entre outras consequências.
Êxodo rural
Êxodo rural é um fenômeno social, sendo um movimento migratório específico, que é
evidenciado quando há um deslocamento da população do campo - área rural, para a cidade –
área urbana.
O êxodo rural teve períodos de intensa ocorrência no Brasil e também em outros locais
do mundo. No Brasil isso ocorreu principalmente nas décadas de 50, 60 e 70.
As principais justificativas para a ocorrência do êxodo rural são: a ausência de
investimentos nos setores de produção rural, a ausência de infraestrutura ou infraestrutura
precária (estradas, hospitais, órgãos públicos, escolas, tecnologias básicas, transporte), baixos
salários, trabalhos insalubres, poder de terras por poucos proprietários – sendo eles
geralmente grandes fazendeiros, etc. Fatores esses causam a ideia iludida de que o progresso
somente pode acontecer em regiões urbanizadas (pois nelas tem melhor infraestrutura, mais
oportunidades de trabalho – fugindo apenas das atividades do campo), e é nessa busca que
muitos habitantes da área rural deixam tudo e vão em direção as áreas urbanas (sejam na
mesma cidade ou indo a outras consideras mais desenvolvidas).
Porém, na maioria dos casos, pela ausência da infraestrutura no campo, sem níveis de
escolaridade necessários e formações técnicas em muitas áreas profissionais, os migrantes
rurais acabam sendo marcados em suas vidas. Muitos são destinados a viver a mercê da
sociedade – fato pertinente para o surgimento de favelas, loteamentos irregulares, e exclusão
social.
Atualmente a conexão entre campo e cidade têm sofrido algumas alterações
significativas, como a intensificação da mecanização das atividades rurais, causando um
impacto urbano (impacto capitalista) ao meio rural.
Além disso, nos últimos anos vem ocorrendo em algumas regiões um movimento
migratório inverso, que é o êxodo urbano, ou seja, parte da população urbana, tem deixado os
grandes centros e conglomerados urbanos, para viver no campo, ainda que seja tímido este
movimento.
Algumas alternativas de trabalho e renda na cidade (e também no campo) têm surgido
como forma de atenuar a falta de espaço no mercado de trabalho, seja pela baixa qualificação
da mão de obra, seja pela faixa de idade em que se encontram ou pela simples dificuldade de
se colocar no mercado de trabalho formal, o que cada vez mais vem levando grupos de
pessoas a ficar a margem da sociedade. Uma das alternativas é o trabalho coletivo e neste
sentido a Economia Solidária vem se transformando em um importante meio de organização
dos grupos excluídos, como no caso dos catadores de material reciclável, Portanto, no
próximo item falaremos sobre Economia Solidária.
Economia Solidária
A Economia Solidária é uma nova forma de economia, a qual vai contra os objetivos e
princípios da economia capitalista, que tem por seu objetivo a exploração e o lucro. Desta
forma precisamos entender o surgimento da Economia Solidária, e como está presente no
atual cenário.
A economia solidária surge como uma resposta alternativa às contradições do modo
de produção capitalista, em especial a separação dos trabalhadores dos meios de
produção e as conseqüências deste fato, como a submissão à exploração do trabalho
assalariado, o desemprego, etc. (PITAGUARI, 2010, p. 20)
Foi a partir dos próprios trabalhadores que percebendo a crise que estava acontecendo,
o desemprego em massa que estava ocorrendo e a exploração de empresas capitalistas as
quais cada vez mais ansiavam pelo lucro demasiado, que estes se organizaram para trabalhar
de uma maneira mais justa, os quais não tivessem que ser submetidos às ordens de um chefe.
A economia solidária surge como um modo de produção e distribuição alternativo
ao capitalismo, criado e recriado periodicamente pelos que se encontram (ou temem
ficar) marginalizados do mercado de trabalho. A economia solidária casa o principio
da unidade entre posse e uso dos meios de produção e distribuição (da produção
simples de mercadorias) com o principio da socialização destes meios (do
capitalismo). [...] (SINGER, 2000, p. 13)
A economia solidária esta presente em diversas formas econômicas e sociais, sendo
algumas destas: associações, cooperativas, grupos informais, clube de trocas, entre outras. A
principal característica da economia solidária é a autogestão, a qual se caracteriza pela
ausência de chefes, uma vez que as decisões e a distribuição da renda é de forma igualitária e
coletiva.
Nós costumamos definir economia solidária como um modo de produção que se
caracteriza pela igualdade. Pela igualdade de direitos, os meios de produção são de
posse coletiva dos que trabalham com eles – essa é a característica central. E a
autogestão, ou seja, os empreendimentos de economia solidária são geridos pelos
próprios trabalhadores coletivamente de forma inteiramente democrática, quer dizer,
cada sócio, cada membro do empreendimento tem direito a um voto. (SINGER,
2008, p. 289)
Desta forma percebemos o quanto o empreendimento acaba por se tornar mais
democrático, uma vez que prevalece a decisão coletiva. A igualdade de direitos acaba por se
tornar fundamental na econômica solidária.
As organizações de economia solidária têm como objetivo estabelecer ganhos que
não ficam restritos à dimensão econômica, elas buscam incorporar elementos do
imaginário, do simbólico e da subjetividade humana, tais como, auto-estima,
identificação com o trabalho e com o grupo, companheirismo, a autonomia e os
direitos de cidadãos, e a valorização das relações humanas e sociais. (PITAGUARI,
2010, p. 48)
Cada empreendimento busca pela sua geração de renda, como também busca cada vez
mais incorporar os princípios da economia solidária em seus empreendimentos. Vale ressaltar
que existem desafios presentes para os empreendimentos, uma vez que não existe uma forma
de gerir um empreendimento econômico solidário. Existe complexidade nas relações, fazendo
com que seja necessária uma constante prática para se alcançar êxito do empreendimento.
Segundo Cruz (2004) A universidade começou a questionar seu papel diante de toda a
crise de desemprego e o aumento de formas de sobrevivência que estavam ocorrendo, fazendo
com que a universidade tivesse por interesse vincular de forma mais efetiva sua interação com
a comunidade.
Apenas uns poucos grupos de docentes, funcionários e alunos, em algumas
universidades, e de modo mais intuitivo que propriamente fundamentado em
análises políticas de longo alcance, buscaram construir formas diversas de atender
direta e imediatamente aos interesses econômicos e sociais dos setores mais
desprotegidos pela crise, buscando direcionar os poucos recursos para projetos que
buscassem ao mesmo tempo atender demandas sociais e reforçar a organização
popular [...]. E foi em meio a estas tentativas que surgiram as incubadoras
universitárias de cooperativas populares – as ITCP‟s. (CRUZ, 2004, p. 2)
A universidade através das ITCP’s1 articulam o trabalho entre universidade e
comunidade. As incubadoras na sua metodologia de trabalho tem como objetivo das
assessoria a grupos, que estejam dentro dos princípios da economia solidária.
[...] A ITCP tem por objetivo desenvolver atividades voltadas para a inserção de
setores economicamente marginalizados no mercado formal de trabalho. Seu
público-alvo é um grande contingente de trabalhadores, desempregados ou
vinculados ao plano da economia informal, que pode conquistar requisitos básicos
de cidadania a partir da organização do trabalho. A Incubadora nasce na
universidade pública, a partir de um centro de alta tecnologia. O impacto dessa
novidade difunde-se num sistema complexo de parcerias, estrutura-se em redes
semelhantes dentro da universidade e articula-se em alianças com outros atores
sociais nacionais. Num momento de reestruturação econômica que acentua a
precarização do mercado de trabalho, a experiência da ITCP faz parte de um
processo ora organizado, ora espontâneo, dos setores da classe trabalhadora, nas
comunidades excluídas do espaço social e produtivo do capital. (BOCAYUVA,
2001, p. 1)
No ano de 2005 a Incubadora de Empreendimentos Solidários - IESol, começou sua
articulação para existir como uma incubadora e projeto de extensão, para isso foi necessário o
auxilio de uma incubadora já consolidada, sendo esta a ITCP da Universidade Federal do
Paraná- UFPR a qual fez este processo de “incubação” que durou um ano.
Desta forma se deu a consolidação para a existência da ITCP da UEPG, sendo esta a
IESol. A IESol deu inicio ao processo de incubação dos grupos, sendo o primeiro destes a
feira solidária que hoje se encontra como Associação de Feirantes Solidários- AFESOL,
porém não conta com os mesmos membros.
No decorrer dos anos outros grupos foram incubados, poucos tiveram o processo de
incubação interrompido, mas na sua maioria estão presentes até hoje neste processo.
1 Segundo (CRUZ) 2004, a primeira ITCP surge em 1996 na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
dentro da Coordenação de Programas de Pós-graduação em engenharia (COPPE).
Diante das aprovações em projetos, no ano de 2013 a IESol pode estender a demanda
de incubações, assessorias e acompanhamentos. Atualmente na categoria incubação a IESol
auxilia quatro grupos, sendo estes: Associação de Recicladores Rei do “PET” (ARREP),
Associação de Feirantes Solidárias (AFESOL), Pré assentamento Emiliano Zapata,
Associação das Colônias. Na categoria acompanhamento os grupos são: Associação de
recicladores de Porto Amazonas, Associação Três Lagoas, Associação jardinagem Campos
Gerais, Associação dos trabalhadores em madeira (ASTRAMA). E os grupos de assessoria
são: Como vovó já dizia, Projeto YUMI, Rede de economia solidária e popular- Irati, Marista
Santa Mônica e PUC – PR.
Com o objetivo de entender os processos migratórios dos sujeitos da Associação de
Recicladores Rei do “PET”. Tem se a necessidade de entender a formação do grupo.
A ASSOCIAÇÃO DE RECICLADORES REI DO PET - ARREP – IESOL
A Associação de Recicladores Solidários que iniciou em 2010 com apenas o desejo
e sonho de se concretizar enquanto associação e de trabalhar coletivamente possui
uma trajetória desde sua criação vinculada a IESol – Incubadora de
Empreendimentos Solidários, Programa de Extensão Universitária da UEPG –
Universidade Estadual de Ponta Grossa. Esse trabalho consiste numa tentativa de
resgatar a história e os acontecimentos relacionados à incubação desse grupo,
visando apresentar todo o processo desde a pré-incubação até o presente momento,
perpassando dificuldades, lutas, conflitos e relações interpessoais e suas conquistas.”
(DOSSIÊ, 2012, p. 3)
A ARREP é uma associação que vem sendo acompanhada pela IESol desde sua
gênese. O seu início ocorreu em 2010, inicialmente com um grupo de catadores que uniu-se
para a formação de uma associação. Em 2011 o grupo efetivou-se como associação,
oportunizando trabalho e renda coletiva, laços de amizades intensos e a preservação
ambiental.
A ARREP é um dos grupos incubados pela IESol. Dentro desta perspectiva, são
realizadas visitas semanais à associação, executadas formações sobre economia solidária,
cooperativismo, segurança no trabalho, realização pessoal, meio ambiente, reciclagem e
outros temas. Também são realizadas reuniões autogestionárias com os associados,
cumprindo assim seu papel de estimular a participação e a autonomia de todo o grupo para as
decisões da associação. A equipe da IESol procura mediar de forma geral, as necessidades do
grupo para a melhoria e o desenvolvimento do mesmo e neste sentido é papel da Incubadora
buscar recursos, por meio de editais, para o aparelhamento da associação e melhoria nas
condições de trabalho.
A trajetória do grupo relaciona-se à trajetória individual dos associados. Nessa
perspectiva, as maiores dificuldades da ARREP foram: a rotatividade de pessoas – na maioria
das visitas realizadas pela equipe da IESol, era possível identificar, quase sempre um novo
membro e por hora a saída de outro. Esse aspecto tem melhorado progressivamente, em
virtude da melhoria da renda obtida com o trabalho na associação e também porque os
critérios para a permanência de um novo associado tem sido avaliado por todos.
Outra dificuldade foram os conflitos interpessoais, que estão sendo resolvidos com
formações e conversas sobre convivência grupal e igualdade. Por fim, outra situação que vem
sendo transformada na ARREP é o da alta taxa de analfabetismo que dificulta as atividades e
a diminui a autoestima. A IESol em parceria com o Núcleo Regional de Educação, viabilizou
a inserção da ARREP no programa federal Brasil Alfabetizado, o que permitiu a alfabetização
daqueles que eram analfabetos.
RESULTADOS
A partir de um diagnóstico realizado pela equipe da IESol no início da incubação, da
atualização do mesmo ao logo do processo e de observações a cada visita ao grupo, uma
situação nos chamou a atenção, quanto a origem dos membros da associação, visto que a
maioria não era de Ponta Grossa e muitos eram da área rural do Estado do Paraná e de outros
estados.
A partir da constatação inicial de que o grupo era resultado de um movimento
migratório, partiu-se para a investigação e levantamento de dados sobre a questão. Iniciamos
observando o grupo e realizando conversas informais com os membros da associação, para
ouvir deles a história sobre suas origens, para num segundo momento entrar com a aplicação
de questionário, o que foi feito na sequência.
O questionário (Apêndice 1) foi aplicado para 16 membros da equipe, por estagiários
e técnicos da IESol, com perguntas que permitiram compreender melhor a origem e os
movimentos migratório dos associados da ARREP.
A aplicação do questionário foi importante para o levantamento de dados, mas
também foi importante para que os associados pudessem se conhecer melhor, assim como
para compreender as histórias de vida uns dos outros.
Com os dados obtidos na tabulação dos questionários, a Incubadora definiu melhor o
perfil do grupo que está incubando, o que proporcionará melhorias na forma de atuação junto
a ARREP. Na sequência serão apresentados os dados obtidos com a aplicação dos
questionários.
A maioria dos associados vieram de outras cidades. A maior parte é do Paraná, mas há
um representante de Minas Gerais e um de São Paulo. Os municípios de origem foram os
seguintes: Irati, Ivaí, Guarapuava, Ituiutaba –MG, Imbituva, Goioerê, São Bernardo do
Campo – SP, Candido de Abreu, Cascavel, Ipiranga, Reserva e Prudentópolis.
Gráfico 1 – Origem dos membros da Associação
Organização: dos autores
Fonte: Pesquisa de Campo, Julho/2014.
Gráfico 2 – Origem dos membros da Associação
por Estado da Federação
Organização: dos autores
Fonte: Pesquisa de Campo, Julho/2014.
Gráfico 3- Origem dos membros da Associação por municípios
Organização: dos autores
Fonte: Pesquisa de Campo, Julho/2014.
Com relação à origem rural e urbana, a maioria dos associados, nasceu em áreas
rurais. Dos que nasceram nas áreas urbanas, muitos passaram em algum momento a viver em
áreas rurais.
Gráfico 4 – Quanto a localidade de nascimento, rural e
urbano e aos que já moraram na área rural, mesmo tendo
nascido no meio urbano.
Organização: dos autores
Fonte: Pesquisa de Campo, Julho/2014.
Em relação ao trabalho em atividades rurais, a maioria dos associados da ARREP, que
migraram adultos, já foram trabalhadores rurais, ou então, quando ainda crianças ajudavam
seus pais nas atividades rurais, antes de migrarem.
Gráfico 5 – Atividades profissionais desenvolvidas pelos
Associados, antes de entrarem na ARREP.
Organização: dos autores
Fonte: Pesquisa de Campo, Julho/2014.
A principal razão da saída de muitos do campo, foi para acompanhar a família, , mas
também, houve quem saiu diante das dificuldades do trabalho rural, ou para buscar melhores
condições de trabalho e vida. Alguns associados ainda eram novos quando precisaram mudar
de cidade e/ou região, portanto acompanharam suas famílias, mas os motivos que fizeram
suas famílias abandonarem a vida rural são os mesmos citados acima.
Gráfico 5 – Razões pelas quais os associados migraram.
Organização: dos autores
Fonte: Pesquisa de Campo, Julho/2014.
No que diz respeito a morar na área rural ou na cidade, a maioria manifestou
preferência por morar na cidade ao invés do campo. Muitos justificaram que a vida rural era
muito difícil, sofrida e que não tinham boas lembranças. Disseram que na cidade obtiveram
um pouco mais de retorno, principalmente financeiro e de bem-estar. Relataram também, já
estarem acostumados com a vida na área urbana.
Gráfico 6 – Atividades profissionais desenvolvidas pelos
associados antes da ARREP.
Organização: dos autores
Fonte: Pesquisa de Campo, Julho/2014.
Porém, muitos destacaram que, se fosse possível viver no campo de forma digna, com
um salário digno com casa própria, com a família, com certeza a proposta de vida no campo
seria bem interessante. Alguns ainda apontaram a opção de morar no campo e trabalhar na
cidade.
É relevante o destaque que foi dado pelos entrevistados, com relação às experiências
negativas na área rural, o que os motivou a se deslocar para a cidade e não querer mais voltar.
Figura 1 – Movimento migratório dos associados da Associação de Catadores de Material Reciclável
Rei do Pet – ARREP.
Organização: dos autores
Fonte: Pesquisa de Campo, mês/ano.
O movimento migratório dos associados da ARREP foi reproduzido num cartograma (Figura
1) acima por meio do qual é possível visualizar que os movimentos ocorreram,
principalmente, a partir de cidades pequenas, próximas à Ponta Grossa, evidência de que,
também neste caso, a mesma funciona como um polo regional. No entanto, é possível
identificar que pessoas de municípios distantes e até de outros estados, também, se
deslocaram para a cidade, os quais muito provavelmente foram ficando à margem da
sociedade com o passar do tempo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho apresentou breves considerações sobre População, Área Rural, Área
Urbana, Movimentos Migratórios, Êxodo Rural, Economia Solidária e a ARREP. Cada item
procurou dar sucintas abordagens das temáticas, para melhor compreensão da pertinência da
pesquisa realizada na ARREP – Associação de Recicladores Rei do Pet, que teve como
objetivo tentar compreender as causas e razões dos movimentos migratórios existentes nas
trajetórias dos associados. Os dados q apresentaram que de fato que a maioria dos associados
viveu pelo menos uma migração (da área rural para a área urbana).
Através de gráficos, sistematizamos e disponibilizamos aspectos importantes para o
entendimento dos movimentos migratórios vividos pelos mesmos.
O artigo procurou apresentar considerações singelas sobre a pesquisa realizada na
ARREP (e que ainda terá outros desdobramentos). Dessa forma, a pesquisa realizada resultou
em dados que mostram o perfil dos associados da ARREP, numa perspectiva que permite
entender melhor as razões que os levaram a fazer a opção de trabalhar como catador e de fazer
parte de uma associação de catadores.
Ponta Grossa funciona como um atrativo para as pessoas que se encontram na área
rural ou urbana de municípios próximos, por estes acreditarem que numa cidade maior será
mais fácil conseguir emprego.
As razões que levaram os associados da ARREP a deixar suas cidades de origem, são
diversas, mas destacam-se as más condições de vida na área rural, baixos salários e a falta de
infraestrutura.
Ficou evidente que morar na cidade hoje é uma opção, apesar das dificuldades
encontradas Neste sentido a ARREP se transformou para a maioria o meio para realização do
desejo de viver na cidade de Ponta Grossa.
Os movimentos migratórios identificados entre a maioria dos membros da ARREP
foram o êxodo rural e a migração de pequenas cidades para uma cidade média, o que vai de
encontro com o crescente aumento das cidades, principalmente das periferias e a diminuição
sistemática da população das áreas rurais.
REFERÊNCIAS
BOCAYUVA, Pedro Cláudio Cunca. Desempregados e trabalhadores informais
encontram nesta experiência uma oportunidade de se organizar, ter acesso ao mercado
formal de trabalho e conquistar direitos básicos de cidadania, Redução da Pobreza e
Dinâmicas Locais. (FGV) 328p. Rio de Janeiro, 2001.
CASTRO, Iná Elias de; GOMES, Paulo Cesar da Costa; CORRÊA, Roberto Lobato.
Explorações Geográficas: percursos no fim do século. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
1997.
CRUZ, Antonio. É caminhando que se faz o caminho – diferentes metodologias das
incubadoras tecnológicas de cooperativas populares no Brasil. In: Cayapa –Revista
Venezolana de Economía Social. Año 4, n.8. Mérida (Venezuela): CIRIEC/Venezuela, 2004.
GEORGE, P. Geografia da população. São Paulo: Bertrand Brasil, 1991.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br>. Acesso em: 16 jul. 2014.
IESOL. Incubadora de Empreendimentos Solidários. (Ponta Grossa, PR). Dossiê de
Incubação Grupo: ARREP – associação de Recicladores Rei do Pet. Ponta Grossa: 2012.
JUNIOR, Alides Baptista Chimin et al.Geografia da População – Educação a Distância.
Ponta Grossa: Universidade Aberta do Brasil, 2010.
MUMFORD, Lewis. “Paraíso Paleotécnico: Coketown” In: A cidade na história. São Paulo:
Martins Fontes, 1998. [1961]
PITAGUARI, Sinival Osorio, A economia solidária no Brasil: Políticas Públicas e
desenvolvimento local, 2010, 147 f. (Dissertação de mestrado em Economia Regional),
Universidade Estadual de Londrina. Londrina 2010.
SINGER, P. Economia Solidária: entrevista com Paul Singer. Estudos avançados vol. 22,
nº 62, p. 289 a 314, 2008.
SINGER, Paul, Souza, André Ricardo de. (ORG) Economia Solidária no Brasil. A
autogestão como resposta ao desemprego. São Paulo, Conexto, 2000.
QUESTIONÁRIO 1
DENTIFICAÇÃO DOS MOVIMENTOS MIGRATÓRIOS
REALIZADOS PELOS ASSOCIADOS DA ARREP
1 - Nome:
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2 - Cidade onde nasceu?
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3 - Na sua cidade natal você vivia na zona rural ou na região urbana?
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4 - Caso não more em sua cidade natal, qual foi o motivo de sua saída dela?
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5 - Qual é a cidade em que você vive atualmente?
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6 - É zona rural ou na zona urbana?
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7 - Quais eram as atividades (trabalho) que você realizava antes de trabalhar na ARREP, já
trabalhou no campo?
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8 - Você prefere viver e trabalhar na área urbana ou rural? Justifique
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