a reforma administrativa de 1967

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CADERNOS DE ADMINISTRAÇAO PÚBLICA - 73 J. DE NAZARE: T. DIAS A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 2. a edição FUNDAÇAO GETOLlO VARGAS INSTITUTO DE DOCUMENTAÇAO SERViÇO DE PUBLICAÇõES RIO DE JANEIRO - GB - BRASIL - 1969

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CADERNOS DE ADMINISTRAÇAO PÚBLICA - 73

J. DE NAZARE: T. DIAS

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 2.a edição

FUNDAÇAO GETOLlO VARGAS INSTITUTO DE DOCUMENTAÇAO SERViÇO DE PUBLICAÇõES RIO DE JANEIRO - GB - BRASIL - 1969 •

Direitos reservados da Fundação Getúlio Vargas - Praia de Botafogo, 186 - Rio de Janeiro - GB - ZC-02 - Brasil por ferça de convênio celebrado com a Fundação Ford. É vedada a reprodução total ou parcial desta obra l.a edição - agôsto de 1968 2.a edição - 1969

© Copyright da Fund 'ão Getúlio Vargas

FUNDAÇAO GETúLIO VARGAS - INSTITUTO DE DOCUMEN- \. TAÇAO - Diretor: Benedicto Silva - Serviço de Publicações -Diretor: Raul Lima; coordenação editorial: R. A. Amaral Vieira; capa de Paulo Sêrgio Cardoso Simões; Composto e Impresso no Serviço Gráfico da Fundação mGE.

NOTA DO EDITOR

A segunda edição, em apenas um ano, de A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967, atesta sua importância como instrumento para o estudo e a compreensão das medidas reformistas adotadas pelo Govêrno Castello Branco, de­terminantes da atual estrutura orgânica da Administra­ção Federal.

Integrante da série dos CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PúBLICA, dedicados ao programa de pesquisas mantido pela Fundação Getúlio Vargas em convênio com a Fun­dação Ford, o trabalho de José de Nazaré Teixeira Dias enriquece, objetivamente, a bibliografia especializada, em particular, quanto a experiênci~e questões brasileiras.

A primeira edição em nada düere, no essencial, da que ora lançamos a público. Apenas, uma feição gráfica mais apurada, e a certeza de que terá o rápido destino das mesas de estudo, das bibliotecas de consulta e do acompanhamento permanente dos que lidam com a ad­ministração pública federal.

É dessa fonna que a Fundação Getúlio Vargas, atra­vés do Serviço de Publicações, entrega a segunda edição de A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 ao público leitor.

o Editor

APRESENTAÇÃO

Com esta monografia prossegue a publicação de uma série de livros de texto, monografias e casos especial­mente elaborados para o programa de pesquisas sôbre administração pública brasileira mantido pela Fundação Getúlio Vargas em convênio com a Fundação Ford. Pelo convênio, os recursos concedidos pela Fundação Ford se destinam à remuneração dos trabalhos de pesquisa e pre­paração de originais, cabendo à Fundação Getúlio Vargas os encargos com a publicação das obras e com a infra­estrutura técnico-administrativa para a execução do acôrdo.

O objetivo dêsse programa é o enriquecimento de nossa bibliografia especializada, com trabalhos que espe­lhem a experiência brasileira e encerrem a reflexão dos estudiosos de nossa problemática administrativa.

-A Escola Brasileira de Administração Pública, ao acrescentar esta série ao respeitável acervo de publi­cações da Fundação Getúlio Vargas sôbre o tema, o faz com especial prazer, por se tratar de trabalhos inteira­mente voltados para a nossa realidade e destinados a contribuir para a elaboração de uma doutrina e o desen­volvimento de uma literatura genuInamente brasileira no campo da administração pública.

A coordenação geral desta sene está a cargo do Centro de Pesquisas Administrativas da EBAP, caben­do a coordenação editorial ao Serviço de Publicações da F.G.V.

BEATRIZ M. DE SOUZA WAHRLICH

Diretora da Escola Brasileira de Administração Pública

A RESPEITO DO AUTOR

José de Nazaré Teixeira Dias. professor-conferen­cista da EBAP e membro do Conselho Curador da Fun­dação Getúlio Vargas, é sobejamente conhecido por to­dos os que se interessam pelo estudo da Administração.

No Serviço Público brasileiro, José de Nazaré Tei­xeira Dias, numa longa e profícua carreira, percorreu todos os escalões, desde os mais humildes até os mais elevados.

Possuindo vários cursos de especialização nos Estados Unidos, sua vasta experiência de administrador, inclusi­ve na UNESCO, torna-o um dos nomes mais respeitados no setor público e muito conhecido no setor privado.

Como integrante e Secretário Executivo da Comis­são Especial de Estudos de Reforma Administrativa (ini­ciada em 1964), Chefe do Gabinete do Ministro Extraor­dinário para o Planejamento e Coordenação Econômica, Assessor do Govêrno para os Assuntos de Reforma Administrativa, Secretário-Geral do Ministério do Plane­jamento e Coordenação Econômica e Ministro interino do Planejamento e Coordenação Econômica no Govêrno ___ o

Castello Branco, não poderia haver pessoa mais creden-ciada para falar da REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967, assunto desta monografia.

INTRODUÇÃO

A - ADMINISTRAÇAO PúBLICA E REFORMA ADMINISTRATIVA

Pode-se afirmar, sem receio de contestação, que o tema Reforma Administrativa é um daqueles com que se confronta permanentemente a Administração Pública de qualquer país, constituindo-se, portanto, em constante preocupação dos governos. Quanto mais se tarda em iden­tificar as áreas a exigir reformulação ou se titubeia em relacionar objetivos, prioridades e meios, e, de modo es­pecial, quanto mais se postergam as soluções depois de conhecidos os problemas, mais e mais êstes se avolumam e maior dose de coragem e de espírito de decisão passa a desafiar a capacidade dos governos. O quadro é seme­lhante ao de enfermidade a rondar um organismo debi­litado: se os primeiros sintomas são identificados e, de pronto, corrigidos pelo emprêgo de terapêutica adequada, circunscreve-se a área a ser tratada; quando isso não ocorre, agravam-se os males e a eclosão, afinal, da doen­ça apresenta tal intensidade que o caso passa a exigir longos e penosos tratamentos e mesmo cirurgia.

Impende assinalar uma realidade: nos países desen­volvidos, os pontos fundamentais em que repousa a efi­ciência da administração já lograram, em sua maior

parte, consolidar-se, inclusive perante a opinião pública; enquanto que nos países em desenvolvimento isso está longe de ocorrer. Naqueles, o sistema educacional atin­giu extensão que garante a informação válida e o conhe­cimento seguro dos fundamentos e da evolução dos pro­blemas, deslocando-se as vacilações do fundamental para o complementar ou conjuntural; nestes. a deficiência do sistema educacional alimenta o culto dos mitos e da de­magogia, a estender sua cortina de fumaça sôbre a ver­dade e a estimular vacilações mesmo no que concerne a pontos básicos, por vêzes até inscritos nas Constituições. Enquanto que, nos primeiros, o approach científico ga­nha terreno e se insiste em partir dos fatos para, então, passar à discussão de alternativas e à escolha de uma dentre as possíveis soluções, nos segundos há os donos de soluções improvisadas, os arautos das mezinhas cura­doras, a proclamar, com grande alarido, as virtudes de suas panacéias, e manifestando, invariàvelmente, estra­nha aversão aos fatos. Não é sem razão que, nos últimos, ao contrário do que acontece nos primeiros, dá-se impor­tância secundária aos números e às estatísticas, coloca­dos no segundo plano das prioridades nacionais. Por tudo isso, nos países desenvolvidos há quadros técnicos e di­rigentes habilitados a identificar, tratar e curar as en­fermidades da administração, enquanto que, nos países em desenvolvimento, não os há ou dêles se dispõe em número insuficiente e sem pêso junto aos governos.

B - REFORMA AD:MINISTRATIVA E o SERVIÇO PúBLICO FEDERAL

o caso do serviço público federal brasileiro !lão foge a essa regra.

A necessidade de reforma de há muitos anos se faz sentir, embora sob a predominância do enfoque jurídico, na vã procura da lei perfeita, do código completo, da norma bem redigida a consagrar teorias ou concepções cerebrinas e com grande desprêzo pelos instrumentos e pelas tarefas de implementação efetiva das medidas re­formuladoras. Quando os aspectos técnicos começaram a ser encarados com seriedade pela administração e aos

técnicos se abriu um lugar ao sol, afora a reforma ini­ciada pela Lei n.O 284, de 1936, sob a responsabilidade do Conselho Federal do Serviço Público Civil e a que o De­partamento Administrativo do Serviço Público deu no­tável impulso, extensão e relêvo - mas que se perdeu no tempo por fôrça mesmo da condição brasileira de país subdesenvolvido - nada de importante se empreendeu como realização global séria e de profundidade. No ter­reno instrumental e no setor de pessoal, a Lei de Classi­ficação de Cargos, de 1960, há tanto tempo reclamada, não passou de uma tentativa - ainda do DASP e de sentido parcial - logo desvirtuada no próprio decurso de uma tramitação longa e em clima acentuadamente pa­ternalista e nepotista no Congresso Nacional, assim como pela incapacidade de um DASP, já então tecnicamente enfraquecido, em sustentá-la e aprimorá-la.

No entanto, desde 1952 o próprio Govêrno vinha de­clarando, em palavras inequívocas, o imperativo da re­forma. Para realizá-la, em mensagem de 31 de agôsto de 1953, o Presidente Getúlio Vargas encaminhava ao Con­gresso Nacional Projeto de Lei reorganizando a adminis­tração federal. 1

Em 1956, pelo Decreto n.O 39.855, de 24 de agôsto, o Presidente Juscelino Kubitschek criava a Comissão de Estudos e Projetos Administrativos - a CEPA - para o fim de:

"a) coletar dados, informações e promover a reali­zação de análises especiais destinadas a identi­ficar os problemas de urgência no que tange à

1 Projeto de Lei n.O 3.563/1953, da Câmara dos Deputados, com a seguinte emenda: "Reorganiza a administração federal, cria os Ministérios da Indústria e do Comércio, das Minas e Ener­gia e dos Serviços Sociais, e dá outras providências". Acompa­nham o Projeto os seguintes documentos: Anexo n.O 1 - Ca­racterísticas principais do primiti.-o esquema de reforma ela­borado pelo Govêrno; Anteprojeto primitivo. Anexo 2 - Pare­cer da Comissão Interpartidária de Reforma da Administração Federal sôbre o Anteprojeto organizado pela Presidência da República: Mensagem 351-53, de 31 de agôsto de 1953. Foge ao escopo do presente trabalho a apreciação dêste e de outros pro­jetos de reforma administrativa, os quais são aqui arrolados para documentar a evolução legislativa do difícil caminho da reforma e facilitar aos estudiosos as pesquisas pelas quais se interessem.

melhoria da estrutura e funcionamento dos órgãos integrantes do Poder Executivo Federal;

b) estudar e propor medidas imediatas que asse­gurem a melhor coordenação das atividades administrativas e um contrôle efetivo das dire­trizes fixadas pelo Presidente da República;

c) sugerir medidas para a eliminação de práticas obsoletas e antieconômicas nos vários setores da administração federal;

d) reexaminar os projetos de reforma administra­tiva, a fim de habilitar o Presidente da Repú­blica a prestar mais eficientemente qualquer colaboração que a êste propósito lhe seja soli­citada pelo Congresso Nacional;

e) manter o Presidente da República a par do pro­gresso de seus trabalhos e apresentar relatório final sôbre os mesmos."

A CEPA, sob a direção do presidente da Fundação Getúlio Vargas, Dr. Luiz Simões Lopes, produziu vários projetos, em pequena parte levados em consideração pelo Govêrno. 2

2 As pesquisas e os estudos e projetos realizados pela CEPA, ao longo de quatro anos de trabalho, estão publicados em qua­tro volumes, sob o título genérico A Reforma Administrativa Brasileira, a saber -: VaI. I - Reorganização da Presidência da República; VaI. II - Criação de Novos Ministérios; VaI. m - Normas para elaboração, execução e contrôle orçamentários; VaI. IV - Relatório final das atividades da Comissão de Estudos e Projetos Administrativos da Presidência da República.

É importante assinalar que, nos primeiros dias de sua ges­tão, o Presidente Kubitschek assinou o Decreto n.O 38.744, de 1.0 de Fevereiro de 1956, criando o Conselho do Desenvolvimento. Êste evento marca uma importante etapa na incorporação da idéia de planejamento aos hábitos da administração brasileira. Interessante é que a Comissão Interpartidária que examinou o Projeto de reforma administrativa do Govêrno Getúlio Vargas, embora ressaltando que "o esfôrço do Govêrno, em todos os setores administrativos, não pode prescindir de planejamento e coordenação" e que "o Presidente, por um lado, e os Ministros de Estado, por outro, deverão dispor dos instrumentos adequados ao exercício dêsses dois tipos de procedimento governamental", opinava contràriamente à criação do Conselho de Planejamento e Coordenação, que deveria incluir-se entre os órgãos da Presi­dência da República. Em 1956, a sugestão de 1952, tornava-se realidade.

Em 1963, o· Presidente João Goulart incumbia o Ministro Extraordinário para a Reforma Administra­tiva, Deputado Ernani do Amaral Peixoto, de estudar as modificações que se impunham na Administração Públi­ca Federal. Como resultado dêsse trabalho, de grande amplitude, foram encaminhados ao Poder Legislativo alguns Projetos de Lei, destacando-se o referente à "Lei Orgânica do Sistema Administrativo Federal". 3 As con­dições de anormalidade vividas pelo País, àquela época, não podiam, evidentemente, criar clima propício a ini­ciativas dessa natureza, sobretudo diante de um quadro de inflação galopante claramente desenhado e de seus conhecidos corolários, a impedir, como é óbvio, que se pudesse falar com seriedade em Planejamento, Orça­mento, Programação Financeira e outros instrumentos indubitàvelmente básicos, essenciais, em qualquer movi­mento tecnicamente válido de reformulação adminis­trativa.

Com o advento do Govêrno do Presidente Castello Branco, em 1964, criou-se ambiente eminentemente re­formista, em grande parte devido à ascensão, a postos­chaves da Administração Federal, de elementos civis e militares que cursaram a Escola Superior de Guerra ou que afinavam com as idéias renovadoras nela há muitos anos veiculadas. A reforma administrativa se incluía,

3 Projeto de lei n.o 1.482/1963, da Câmara dos Deputados. O substancioso relatório com o qual o Projeto foi encaminhado pelo Ministro Extraordinário ao Presidente da República, datado de 19 de novembro de 1963, é um valioso repositório de informa­ções, constituindo leitura obrigatória para os estudiosos dos problemas administrativos.

Os demais projetos, também acompanhados de relatórios encaminhados ao Congresso Nacional, foram os seguintes: Pro­jeto de lei n.O 1.483-A, de 1963, referente ao Sistema de Mate­rial; Projeto de lei n.o 1.484-A, de 1963, referente ao Conselho de Defesa do Sistema do Mérito; Projeto de lei n.O 1.486-A, de 1963, referente à organização do Distrito Federal.

Não resta dúvida de que os estudos efetuados na gestão do Presidente Getúlio Vargas, os realizados pela CEPA, na presi­dência Kubitschek, e os superintendidos pelo Ministro Amaral Peixoto, na gestão do Presidente Goulart, embora não hajam lo­grado traduzir-se em textos legais tendentes à reformulação global do Serviço Público Federal, representam estál!"ios rele­vantes de pesquisa, exame de alternativas e formulação de soluções para o complexo problema de organização administra­tiva federal.

evidentemente, no rol das reformas básicas que o nôvo Govêrno se propunha realizar.

Dentre as primeiras medidas de interêsse para o presente estudo destacam-se a designação do Ministro Extraordinário para o Planejamento e Coordenação Eco­nômica,4 emprestando-se, de imediato, o sentido de pro­gramação e de coordenação geral que seria a tônica da nova administração federal; orientação dinâmica para a coordenação da política orçamentária, mediante com­pleto entrosamento entre o Ministério Extraordinário para o Planejamento e Coordenação Econômica e o Mi­nistério da Fazenda e ativa e direta participação do próprio Presidente da República; providências tenden­tes a disciplinar a programação financeira do Tesouro, também mediante ação articulada daqueles dois Minis­térios; e a concentração de esforços no sentido da elabo­ração, com os dados disponíveis e o apêlo à colaboração informal de vários setores técnicos da área pública e da particular, de um Plano de Ação Governamental, do que resultou o PAEG.5

Após várias providências preliminares, decidiu o Govêrno constituir uma Comissão Especial, sob a presi­dência do Ministro Extraordinário para o Planejamento e Coordenação Econômica. 6

Os trabalhos de Reforma Administrativa processa­ram-se em três fases consecutivas: a primeira, no nível da Comissão Especial; a segunda, sob a supervisão di­reta do Ministro Extraordinário; e a terceira, sob a dire­ção imediata do Presidente da República. Desde o início, a Comissão Especial sustentou a necessidade de emen­dar-se a Constituição Federal no que respeita ao Tribunal de Contas, e de se expedirem duas leis, uma dispondo sôbre a nova Lei Orgânica do Tribunal de Contas e outra

• Decreto n.o 53.914, de 11.5.1964. õ Programa de Ação Econômica do Govêrno, o qual, "dentro

de seu propósito básico de estabilização, desenvolvimento e reforma democrática, estabelece as linhas gerais da política eco­nômica a ser adotada no Brasil, no período julho de 1964/março de 1967 ... " (Edição do Ministério Extraordinário para o Plane­jamento e Coordenação Econômica).

• Decreto n.O 54.501, de 9 de outubro de 1964.

sôbre a reorganização da Administração Federal. Como ver-se-á no capítulo seguinte, essa posição acabou lo­grando êxito.

c - os TEXTOS LEGAIS CONCERNENTES A REFORMA ADMINISTRATIVA

Quando nos referimos à Reforma Administrativa empreendida pelo Govêrno Revolucionário, estamos abrangendo os textos legais seguintes:

1. Constituição Federal de 1967, na parte referente ao "Orçamento" e à "Fiscalização Financeira e Orçamentária". 7

2. Decreto-Lei n.o 199, de 25 de fevereiro de 1967, dispondo sôbre a Lei Orgânica do Tribunal de Contas.

3. Decreto-Lei n.o 200, de 25 de fevereiro de 1967, que dispõe sôbre a organização da Administra­ção Federal e estabelece diretrizes para a Re­forma Administrativa.

Habilitou-se, por essa forma, o País com as bases legais e o instrumental indispensáveis para empreender uma reforma objetiva, prudente, coordenada, gradual e em profundidade do Serviço Público Federal.

D - ESCOPO DA MONOGRAFIA

A presente monografia procura resumir os traba­lhos preparatórios; esclarecer e explicitar o pensamento que animou os textos legais, incluídos em anexo; identi­ficar as alternativas que se ofereceram ao Govêrno e as opções dêste; tentar o enfoque do que é essencial no pen­samento da Reforma. Não tem outro intuito senão o de informar, explicar e esclarecer, visando a facilitar a com-

, Arts. 63 a 70 e Arts. 71 a 73.

preensão da legislação expedida e sua real significação para a grande tarefa de modernização da Administração Federal brasileira. Procurou-se desenvolvê-la, tanto quanto possível, na mesma seqi!ência dos Títulos do De­creto-Lei n.O 200, a fim de facilitar a leitura concomi­tante dos textos legais e dos comentários da monografia.

Ao elaborar êste modesto trabalho, cremos estar pro­duzindo serviço útil e rendendo nossa homenagem aos dois eminentes homens públicos que lograram vencer um complexo de quatorze anos da Administração brasileira: o Presidente Castello Branco e o Ministro Roberto Campos.

J. DE NAZARÉ T. DIAS

SUMÁRIO

NOTA DO EDITOR ..................................... V

APRESENTAÇÃO ....................................... VII

A RESPEITO DO AUTOR............................... X

INTRODUÇÃO XI

A ~ Administração Pública e Reforma Administra-tiva .......................................... XI

B ~ Reforma Administrativa e o Serviço Público Federal ... , ........... , ..... , . . .. .. . ......... XII

C ~ Os textos legais concernentes à Reforma Admi­nistrativa .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. XVII

~ ~ Escopo da monografia ........................ XVII

CAPÍTULO 1 ~ ESTUDO DA REFORMA ................ 1

Primeiras tendências do Govêrno .............. 1 2 Ação inicial do Ministério do Planejamento .... 4 3 Entendimentos com o Congresso Nacional ...... 6

.4 Criação da Comissão Especial de Estudos de Reforma Administrativa ....................... 10

5 Trabalhos da Comissão Especial ............... 11 6 Coordenação do Ministro do Planejamento ..... 20 7 Coordenação do Presidente da República ..... 21 8 Interpretação de uma experiência .............. 30

xx CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

CAPITULO 2 - APRECIAÇÃO GERAL DA REFORMA 36

2.1 Observação preliminar ........................ 36 2.2 Reconciliação do legal com o real .............. 37 2.3 Razões da Reforma ........................... 46 2.4 Finalidade da Reforma ........................ 50 2.5 Perspectivas da Reforma ...................... 52 2.6 Moldura da Reforma .......................... 54 2.7 Esquematização da Reforma ................... 71

CAPITULO 3 - PODER EXECUTIVO E ADMINISTRA­çÃO FEDERAL. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS. INTRUMENTAÇÃO BÁSICA ........................ 73

3.1 Poder Executivo ............................... 73 3.2 Administração Federal ........................ 74 3.3 Administração Direta ......................... 75 3.4 Administração Indireta ........................ 76 3.5 Principios Fundamentais ...................... 81 3.6 Instrumentação Básica ........................ 84

CAPITULO 4 - SUPERVISÃO MINISTERIAL. ÓRGÃOS CENTRAIS 89

4. 1 Posição dos Ministros ........................ 89 4.2 Objetivos da Supervisão ....................... 91 4.3 órgãos Centrais ............................... 92 4.4 Outros órgãos................................ 95 4.5 Estrutura operacional ......................... 95 4.6 Administração Indireta ........................ 96 4.7 Os Conselhos .................................. 97 4.8 Outras considerações .......................... 98

CAPITULO 5 - SISTEMAS DE ATIVIDADES AUXILIA-RES ............................................... 99

5.1 Atividades Auxiliares .......................... 99 5.2 Sistemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101 5.3 Atividades não incluídas em Sistema .......... 102 5.4 órgãos de Cúpula ............................. 104 5.5 A atividade de Organizaç3.o .................... 106

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 XXI

CAPíTULO 6 - PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. MINIS­TÉRIOS. SEGURANÇA NACIONAL. FÕRÇAS ARMA-DAS ............................................... 109

6. 1 Presidência da República ...................... 109 6.2 Ministérios ... .............................. . 6. 3 Ministro Coordenador ........................ . 6.4 Ministro Extraordinário 6.5 Áreas de competência ........................ . 6.6 Fôrças Armadas .............................. .

113 114

115 116 120

6.7 Medidas especiais de coordenação............. 121

CAPíTULO 7 - ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA. CON-TABILIDADE. AUDITORIA .................... .

7.1 Sentido das Normas .... 7.2 Pontos Essenciais para Utilização de Recursos 7.3 Administração Indireta ....................... . 7.4 Articulação com o Tribunal de Contas ........ . 7.5 Outras Considerações

131

131 133 147 148

150

CAPíTULO 8 - ADMINISTRAÇÃO DO PESSOAL CIVIL 152

8.1 Observação Preliminar ............ , . . . . 152 8.2 O problema do Pessoal Civil: uma tentativa de

diagnóstico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 154 8.3 Em busca de uma Política de Pessoal ......... 167 8.4 Orientação adotada na Reforma Administrativa 176 8.5 Viabilidade da reabilitação da Política de Admi-

nistração de Pessoal Civil .................... 192

CAPíTULO 9 -- LICITAÇõES ......................... . 201

9.1 Objetivo das Normas ......................... 201 9.2 Preceitos principais ........................... 203 9.3 Modalidades de licitação ...................... 205

XXII CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PúBLICA

CAPÍTULO 10 - EXECUÇÃO DA REFORMA........... .209

CAPÍTULO 11 -- VIABILIDADE DA REFORMA ......... 212

11.1 Demonstração da viabilidade .................. 212 11 .2 Roteiro para implantação da Reforma ......... 215 11.3 A Reforma Administrativa e Brasília ......... 225

ANEXOS

Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 229 Constituição do Brasil: trechos referidos na pre-

sente monografia .............................. 230

A REFORMA ADMINISTRATIVA

DE 1961

1. ESTUDO DA REFORMA

1 PRIMEIRAS TENDÊNCIAS DO GOVÊRNO

Nas circunstâncias de exceção em que assumiu a di­reção do País, teria o Govêrno Revolucionário, antes de tudo. de preocupar-se com o restabelecimento da norma­lidade em todos os setores, dada a situação de crise que se criara desde a renúncia do Presidente Jânio Quadros e se agravara agudamente nos meses mais próximos. As inseminações inflacionárias dos anos 1959 e 1960, em­bora postas em evidência na gestão Jânio Quadros, não haviam sido abortadas, antes prosseguiam em um quadro estimulante de sua gestação, amparadas pela miragem do desenvolvimentismo, emprestando contornos de me­lancólico realismo ao balanço da economia brasileira em 1963: taxa de crescimento do produto real, menos (-) 1,6 c; ; índice de custo de vida (Guanabara), mais (+) 80,6(,; ~ deficit potencial do orçamento em execução em 1964, 20~'; superior à receita estimada, considerado o aumento do funcionalismo. !J Configurava-se, inequivoca-

, "Nos três primeiros meses de 1964 - o período final do Govêrno Goulart - os preços subiram de nada menos de 25%. Essa taxa, extrapolada geomêtricamente, equivaleria a 144% ao ano ... " (MÁRIO HENRIQUE SIMONSEN, Aspectos da Inflação Bra­sileira, p. 8,)

, Estudo de 24 de fevereiro de 1967,. do Ministério do Pla­nejamento.

2 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

mente, um quadro de inflação galopante, a solapar a vida brasileira em todos os seus setores, tornando fictícios lucros e salários, irreais os orçamentos, inócua a pou­pança, empobrecendo a Nação e enfraquecendo a auto­ridade.

Sentiu o Govêrno a amplitude de sua missão e o imperativo de enfatizar certos instrumentos de que não poderia prescindir para uma ação orgânica eficaz. As opções tinham um sentido inusitado de urgência e iriam, gradativamente, delineando as posições governamentais e abrindo caminho para medidas ulteriores. Colocado entre as alternativas de criar uma Comissão de Planeja­mento e Coordenação Econômica junto ao Presidente da República, e por êle presidida, ou designar um Ministro Extraordinário para essa finalidade, optou o Govêrno por esta última solução, 1" determinando o imediato pre­paro de um programa geral de govêrno. Exigiu também absoluta articulação entre o Ministério Extraordinário para o Planejamento e Coordenação Econômica, respon­sável pela coordenação do Orçamento, e o Ministério da Fazenda, responsável pela política fiscal e pela progra­mação financeira, a fim de melhor assegurar as rédeas da política orçamentária, inteiramente desfigurada, atra­vés dos anos, como processo válido de trabalho de go­vêrno, oferecendo monumental deficit e a revelar-se cada vez mais irreal diante da avalanche inflacionária. 11 Por

,.. Decreto n.O 53.914, de 11 de maio de 1964. H Sustentamos, com base nos fatos, que o Serviço Público

Federal possuía, em verdade, cinco Orçamentos: 1. a proposta do Executivo, em geral ficticiamente equili­

brada; 2. o Projeto de lei votado pelo Congresso, no qual se

superestimava a receita - ou se comprimia irrealistica­mente a despesa proposta pelo Executivo - para justi­ficar substancial acréscimo da despesa, por motivos políticos;

3. o programa de economias, com o bloqueio de dotações, procedimento a que era levado o Executivo diante das realidades da arrecadação;

4. o famoso processo de liberação, a conta-gôtas, de cré­ditos, pelo Ministro da Fazenda, sob as pressões mais variadas;

5. e, finalmente, na última parte do exercício, quando a liberação das dotações era mais intensa e alcançava as dotações propiciadoras de maior dinamismo aos ser­viços, a inflação se encarregara de reduzir, substan-

A REFORMA ADMINI5'TRATIVA DE 1967 3

fôrça do PAEG (Programa de Ação Econômica do Go­vêrno) e da nova orientação da política orçamentária, sob a direta supervisão do Presidente da República, os Ministros de Estado começaram a ser compelidos a pen­sar em seus programas setoriais, sem perder de vista a programação geral do govêrno, e a participar intensa­mente do processo de elaboração orçamentária, sob o direto comando do Presidente da República, assessorado pelos Ministros do Planejamento e da Fazenda. O Presi­dente da República passou também a dar relêvo e apoio à ação dos Ministros de Estado e a exigir dêles proposi­ções devidamente coordenadas e soluções alternativas, em articulação com os titulares das demais pastas e, ainda, o afinamento das recomendações com as diretrizes do programa geral do govêrno e do orçamento, colocadas sob a coordenação do Ministro do Planejamento. Com isso, iniciou-se proveitoso contacto direto entre os Minis­tros de Estado, sendo freqüentes as reuniões interminis­teriais e a apresentação ao Presidente de recomendações conjuntas, assinadas pelos Ministros interessados. I~ En­sejou-se, assim, o fortalecimento da ação dos Ministros de Estado e a desconcentração de problemas da área da Presidência da República, favorecendo-se a ação coorde­nada do Govêrno, sob a direção superior do Presiden­te. 1:1 Deu-se início, em suma, a uma experimentação administrativa que a legislação expedida ao final do Go­vêrno iria consagrar, consolidando o terreno para a ação dinâmica e eficaz da administração que o sucederia.

cialmente, o valor real dos créditos; como falar-se, com um mínimo de seriedade, em eficiência administrativa, diante dêsse quadro de verdadeira mímica orçamen­tária?

" Na fase final do Govêrno, os decretos de interêsse de mais de um Ministério subiam à assinatura presidencial com a aposição prévia do referendo dos Ministros competentes e justificados em Exposições de Motivos pelos mesmos assinadas conjuntamente.

1" Êsse propósito de desconcentração de atos de rotina en­controu sérios embaraços no que concerne aos assuntos de ad­ministração geral, notadamente os de pessoal e de ilicitações, por fôrça da tendência centralizadora que caracterizou a longa gestão do Presidente Getúlio Vargas. Isso decorria não só de preceitos constitucionais, como de todo um emaranhado de leis e de normas administrativas, concebidas sob o clima de predo­minância do centralismo administrativo. Note-se que todos os

4 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1.2 AÇãO INICIAL DO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO

Concluída a elaboração do PAEG e articuladas as medidas referentes ao Orçamento e à programação de Caix;a do Tesouro, o Ministro do Planejamento recebeu a incumbência de examinar os rumos mais convenientes para os trabalhos de reforma administrativa.

A Assessoria do Ministro entregou-lhe, em 19 de agosto de 1964, um documento intitulado Algumas me­didas consideradas essenciais à eficácia de uma Reforma Administrativa. O documento sustentava a necessidade de emprestar-se à reforma sentido eminentemente ins­trumental, apontava a importância da constituição de um corpo de assessoramento da administração superior, da instituição da inspeção administrativa (baseada em organização da Contabilidade, disciplina de Relatórios Financeiros e Auditoria Contábil Administrativa) e do desenvolvimento de um programa de aperfeiçoamento do pessoal sênior. Aconselhava a revisão do Projeto Amaral Peixoto, sem prejuÍzo de, paralelamente, dedi­car-se o Govêrno, sem esmorecimento, aos três instru­mentos reputados essenciais e sem os quais não pode haver administração eficaz.

Destacam-se dêsse documento os seguintes trechos:

"B) Moldura

Ao traçar a moldura dos estudos a empreender, considerar que a preocupação fundamental con­siste na obtenção de RENDIMENTO E PRODU­TIVIDADE, para o que se' faz necessário: :i: Diretrizes superiores claras e precisas

Execução descentralizada Coordenação, acompanhamento e controle do andamento dos programas

projetos de reforma administrativa focalizaram êste angustioso problema, sendo de esperar que, com a promulgação da Cons­tituição de 1967 e do Decreto-lei n.O 200, se logre inverter hábi­tos que se incrustaram na vida administrativa brasileira, os quais,. em verdade, são a herança dos tempos coloniais e da caraeterística paternalista do períOdO 1930/1945.

*

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 5

Responsabilidades definidas, para com a Ad­ministração e a Coletividade

D) Pressupostos essenciais

Partir do pressuposto de que não é possível obter­se rendimento e produtividade na Administração Federal sem que, previamente, sejam disciplina­dos os assuntos relativos a três itens funda­mentais:

1 - Programação Governamental, que oriente a ação da Administração Pública. em todos os setores.

2 Orçamento-Programa, que sina de roteiro à execução coordenada do programa anual. no que respeita à receita, à despesa e à ação administrativa.

3 Programação de Desembôlso, que ajuste o ritmo de trabalho da Administracão Fe­deral, em geral, e de cada setor dê traba­lho, em particular. às disponibilidades do Erário, criando a confiança de que os re­cursos financeiros fluirão a tempo de serem aplicados.

Não será demais insistir na importància da Pro­gramação de Desembôlso. A Administração Fe­deral está desfigurada por algumas paradoxais certezas, consolidadas através dos anos, e que de­turpam qualquer concepção séria de um mínimo de eficiência administrativa: certeza de que o Orçamento aprovado não será executado; certeza de que haverá um plano de economia. divulgado três ou quatro meses após a aprovação do Orça­mento; certeza de que, apesar das 'anunciadas ri­gorosas restrições das despesas, a parte de Pes­soal será despendida, em sua totalidade, e até mesmo terá ultrapassados seus quantitativos; cer­teza, em conseqüência, de que o pessoal será pago rigorosamente em dia, sem que, todavia, se tornem

6 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

simultâneamente desembolsáveis os recursos fi­nanceiros que ensejariam dinamizar-se a ação do mesmo pessoal. Há tôda uma engrenagem, cuida­dosamente aprimorada através dos anos, para in­validar os instrumentos de trabalho da Adminis­tração. A Programação de Desembôlso tem, no entanto, uma importância vital para a normalidade da vida financeira dos diversos Departamentos de Adminis­tração. Existindo a Programação Governamental e restabelecida a verdadeira função do Orçamento­Programa, urge que a Programação de Desem­bôlso perca sua atual característica de processo puramente burocrático de expediente do Ministé­rio da Fazenda ao Banco do Brasil para conceder suprimento de fundos, para transformar-se em processo de disciplina da ação coordenada do Te­souro e dos Departamentos da Administração."

1 . 3 ENTENDIMENTOS COM O CONGRESSO NACIONAL

Dando forma a entendimentos com os Deputados Amaral Peixoto e Gustavo Capanema, Presidente e Re­lator da Comissão Especial no Congresso Nacional, o Ministro do Planejamento submeteu-lhes, em 18 de se­tembro de 1964, um Memorando contendo "Considera­ções sôbre a Reforma Administrativa". Nêle se focali­zaram "alguns pontos de referência que facilitem a to­mada de posição da Presidência da República em rela­ção ao assunto", arrolando-se os seguintes:

"1.0 conveniência de simplificar o Projeto de Lei Orgânica;

2.° conveniência de melhorar os instrumentos institucionais e jurídicos de que necessita a Administração;

3." - conveniência de alargar o sentido da expres­são 'Reforma Administrativa';

4.° - constituição de um Grupo de Trabalho para coordenar os estudos;

5." - orientação quanto ao Tribunal de Contas."

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Quanto ao primeiro ponto, colimava-se "restringir a lei a um núcleo essencial de princípios, normas e auto­rizações de natureza estritamente legislativa, nos quais o Executivo se apoiará para expedir os Decretos e Regu­lamentos indispensáveis à sua implementação". E isso com a dupla finalidade de:

"a. restabelecer a hierarquia da norma jurídica, reservando-se ao Congresso a matéria de con­teúdo estritamente legal, de sua competência específica, prolongando-se a ação da lei no tempo, garantindo-se a integridade e harmonia do contexto da lei, a qual, de outro modo, seria quebrada quando viessem a ocorrer alterações de estrutura organizacional;

b. melhor definição do Poder Regulamentar, for­talecendo-se a ação do Executivo na implanta­ção das medidas legais aprovadas."

Quanto ao segundo ponto, reproduzia o memorando os dois trechos acima transcritos das Notas de 18 de agôsto, acrescentando que o Govêrno teria de fixar sua posição quanto a alguns tópicos controversos, tais como os concernentes ao Planejamento e ao Orçamento. Enu­meravam-se, outrossim, outros instrumentos de impor­tância:

a. normas financeiras e atualização do Código de Contabilidade, no que fôr de imediata conve­niência;

b . Administração de Pessoal; c. Administração de Material; d. Sistema Estatístico; e. Sistema de Contrôle das Autarquias e Socieda­

des de Economia Mista. Referia-se também o Memorando ao Assessoramen­

to da Administração Superior, à Inspeção Administra­tiva e ao Aperfeiçoamento do Pessoal Sênior. Finalmen­te - e êste constitui um ponto crucial - pugnava-se pela realização de urna reforma por etapas, dizendo-se:

"Deverá também ficar assentado que a Re­forma será implementada gradativamente, na medida em que o Govêrno tenha à suá disposi­ção os instrumentos e meios indispensáveis, a

8 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

fim de não criar ilusões à obtenção de resul­tados pela simples votação de uma lei ou a aprovação de um regulamento." .

Quanto ao terceiro ponto, defendia-se a conveniên­cia de "alargar o sentido da expressão 'Reforma Admi­nistrativa' de modo que abranja, não apenas a modEr­nização da estrutura administrativa e dos métodos de gestão, como também a atualização de outros instrumen­tos jurídicos de ação governamental em certos setores", mencionando-se, entre outros, o Código Tributário. Pro­curava-se, por essa forma, realçar que a atualização do Projeto Amaral Peixoto não esgotaria a ação reformista do Govêrno, empenhado em atacar simultâneamente vá­rios setores considerados carentes de urgente moderni­zação.

Quanto ao quarto ponto, sugeria-se "a constituição de um Grupo de Trabalho, de composição reduzida. com a missão de coordenar os estudos, segundo a orientação que fôr estabelecida pelo Presidente da República e que tenha meios de lançar mão da colaboração técnica que se fizer necessária, com grande rapidez e flexibilidade de ação". Incumbiria ao referido grupo assessorar o Con~ gresso N acionaI.

Quanto ao quinto ponto, consideravam-se essenciais medidas que situassem "o Tribunal de Contas no plano decisório .que lhe cabe, sem interferir, retardar ou buro­cratizar as decisões das autoridades administrativas (Presidente, Ministros e principais Chefes de Serviço) ", de modo a "reconhecer que as autoridades administrati­vas devem ser responsáveis pelos atos que praticarem sem a cobertura do Tribunal através de inócuas for­malidades, geradoras e alimentadoras do papelório." Acrescentava o Memorando:

"Por exemplo: os documentos de comprovação de despesas devem ser arquivados junto ao órgão de Contabilidade que os apropria e es­critura; ao Tribunal podem ir balancetes. ba~ lanços, relatórios de auditagem (devidamente certificados), para a verificação que lhe com­pete dar regular aplicação dos dinheiros pú­blicos; cabe ao Tribunal, através de seus pró­prios auditores ou dos que contratar, mandar

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fazer suas próprias auditagens, onde e quan­do entender, eliminando-se de vez o regime atual de trânsito de papéis, que só faz diluir responsabilidades e, afinal, enfraquecer a autoridade do Tribunal. O Tribunal deve acompanhar a execução orça­mentária descentralizadamente, mantendo De­legados seus junto aos grandes Departamen­tos ou órgãos centrais (Ministérios), para ra­pidez das decisões e desconcentração de suas atividades, permitindo-lhe dedicar-se com mais vigor e presteza ao julgamento das contas dos responsáveis pelos dinheiros públicos e, assim, agir com a eficácia que até agora não logrou obter na defesa de boa aplicação dos recursos públicos. A competência do Tribunal não deve invalidar ou sobrepor-se à competência da autoridadé administrativa para exercer, sob sua respon~ sabilidade, atos de pagamento, distribuição de crédito. etc. O tabu da eficiência do Registro a priori das despesas precisa ser superado:"

Ag conversações realizadas no dia 18 de setembro de 1964, com base no Memorando, revelaram grande har-, monia de pontos de vista, considerando-se, em princípio, aconselhável a seguinte orientação no que respeita aos três tópicos adiante indicados:

"1 - Planejamento

Examinadas as vantagens e desvantagens das soluções aventadas, considerou-se preferível á criação do Ministério do Planejamento, man­tendo-se nos Ministérios as Comissões de Pla­nejamento previstas no Projeto. A Programação Macroeconômica ficaria afe­ta ao Ministério do Planejamento e a Pro­gramação Setorial constituiria atribuição de cada Ministério, mantendo-se a indispensável articulação entre ambas sob a direção supe­rior do Presidente da República. .

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2 - Orçamento O Orçamento-Programa (no qual se refletem, anualmente, a Programação Macroeconômica e as Programações Setoriais) ficaria sob a responsabilidade do Ministério do Planeja­mento, que coordenaria sua elaboração segun­do a orientação emanada do Presidente da República; nos Ministérios, caberia às Comis­sões de Planejamento. a coordenação da ela­boração dos Orçamentos-Programas.

3 - Grupo de Trabalho O Grupo de Trabalho, cuja constituição jul­gou-se oportuna, teria por missão reunir e rever a documentação e preparar o Projeto a ser encaminhado ao Congresso, sob a égide do Ato Institucional."

Num segundo encontro, realizado no Ministério do Planejamento, foram abordados alguns pontos comple­mentares, ficando assentado que o assunto iria à deli­beração presidencial.

Não há dúvida quanto à importância dêsses enten­dimentos, não somente pela finalidade que tiveram de facilitar uma tomada de posição do nôvo Govêrno em relação à Reforma Administrativa, como também pela 'primordial importância que o apoio do Partido Social Democrático - a que pertenciam o Presidente e o Re­lator da Comissão Especial do Congresso - significava, na época, para a tramitação das proposições governa­mentais no Congresso Nacional. Êsse aspecto, incidente na apreciação da Reforma Administrativa, ganha re­lêvo para os estudiosos da situação política brasileira na primeira fase do Govêrno da Revolução, pois a obje­tividade da atuação parlamentar do PSD constituiu-se em importante fator para a tramitação de importantes matérias no Legislativo, do que é exemplo frisante a Re­forma Agrária.

1 .4 CRIAÇAO DA COMISSAO ESPECIAL DE ESTUDOS DE REFORMA ADMINISTRATIVA

Em 9 de outubro de 1964, o Presidente da Repú­blica criou, sob a presidência do Ministro do Planeja-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 11

mento, a Comissão Especial de Estudos de Reforma Administrativa, constituída de doze membros. nomea­dos pelo Presidente, que designaria um dêles para Se­cretário-Executivo. H

Resolveu o Govêrno transmitir à Comissão Especial as linhas gerais de seu pensamento. Para êsse fim. o Ministro do Planejamento solicitou a contribuição de um dos membros da Comissão. Em 20 de outubro de 1964, entregava êle as notas intituladas Considerações Preli­minares à Reforma Administrativa. Com base nessas sugestões e acrescentando os pontos de referência aos Instrumentos Básicos que, segundo pensamento já con­solidado no seio do Govêrno, serviriam de alicerce à Re­forma Administrativa, foi elaborado o documento Decla­rações do Ministro Roberto Campos ao instalar a Co­mi.ssão de Estudos de Reforma Administrativa. ~sse do­cumento, depois de aprovado pelo Ministro do Planeja­mento e pelo Presidente da República, constituiu-se no elemen to básico para o trabalho da Comissão Especial.

1.5 TRABALHOS DA COMISSAO ESPECIAL

A Comissão Especial de Estudos de Reforma Admi­nistrativa (COMESTRA) foi instalada pelo Ministro do Planejamento em 9 de novembro de 1964, oportuni­dade em que foram lidas as declarações do Ministro, em nome do Govêrno, dando relêvo aos seguintes aspectos:

propósito do Govêrno de encaminhar ao Con­gresso Nacional um projeto simplificado, "de modo a restringir a lei a um núcleo essencial de princípios, normas e autorizações de natureza estritamente legislativa, nos quais o Poder Exe­cutivo buscará apoio para expedir os decretos e regulamentos indispensáveis à sua implemen­tação";

11 Decreto n.o 54.501, de 9 de outubro de 1964, e Decreto de designação dos membros da Comissão, da mesma data, ambos publicados no Diário Oficial do dia 12. Integravam a Comissão oit<l civis e quatro militares, sendo um do Estado-Maior das Fôrças Armadas e os demais pertencentes a cada um dos Minis­térios Militares.

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restabelecer a competência regulamentar do Executivo; "O Govêrno tem como certo que reforma admi: nistrativa é um processo amplo, a ser cumpridO por etapas, devendo a lei permitir sua continui­dade através de renovada consciência de missão a cumprir em proveito da coletividade"; "A alteração da atual estrutura administrativa federal não operará, por si só, nenhuma refor­ma, pois não se trata de um trabalho estático, mas, ao contrário, de um processo dinâmico, que se opera normalmente através do exercícioefe~ tivo do Govêrno"; "A filosofia básica da reforma é desconcentrar a autoridade executiva, através de uma vigorosa política de DESCENTRALIZAÇÃO, capaz de restituir aos órgãos centrais sua função direto­ra, orientadora e normativa, e transferir aos órgãos locais - que estão em contacto direto com o público e com os problemas - a autori­dade necessária à solução de questões da admi­nistração ordinária"; "A adoção de uma política de DESCENTgALI­ZAÇÃO implica a decisão de correr conscien~ temente certos riscos, os quais são incomparà­velmente menores do que os da centralização";

- "Considera-se indispensável à ação eficiente. e coordenada do Govêrno: 1.0 - Programação Governamental, que oriente

a ação da Administração Pública em todos os setores.

2.° - Orçamento-Programa, que sirva de rotei­ro à execução coordenada pelo programa anual, no que respeita à receita, à des­pesa e à ação administrativa.

3.° - Programação Financeira, que ajuste o ritmo de trabalho da Administração Fe­deral, em geral, e de cada setor de traba~ lho, em particular, à disponibilidade dó Erário, criando a confiança de que os re~ cursos financeiros fluirão a tempo de se~

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rem aplicados nos serviços que a Admi­nistração manterá para a coletividade social";

- Dar realce. entre outros, aos seguintes princí­pios: 1. supressão dos contrôles meramente formais

ou cujo custo seja superior ao risco, assim como quaisquer centralizações de caráter normativo que correspondam à mera forma­lidade burocrática óu a estéreis preocupações de padronização ou uniformidade;

2. criacão de um sistema de efetivo contrôle dos dispêndios públicos e de responsabilida­de de seus agentes, compreendendo, entre outras medidas, a organização da Contabili­dade, a disciplina dos Relatórios Financeiros, a Auditoria e a Inspeção Administrativa;

3. instituição de Sistema de acompanhamento da execução dos programas de trabalho, que habilite os Ministros de Estado .e o Presi­dente da República a se manterem informa­dos sôbre o seu andamento;

4. normas financeiras que se ajustem aos 'obje­tivos visados;

5. incentivo à intercomunicação administrativa, mediante entendimentos e contactos que per­mitam referir às autoridades superiores so­luções devidamente coordenadas entre os se­tores interessados;

6. valorizar a função púl:>lica: dignificar o ser­viço público. profissionalizá-Io, conferir-lhe autoridade e responsabilidade; observar o sistema do mérito, combater o empreguismo e o pistolão; dar ao serviço público o sentido de uma carreira capaz de remunerar satisfa­tOriamente o servidor e satisfazer suas aspi­rações de auto-realização, assegurando-lhe tranqüilidade quanto ao futuro;

"Isso tudo só será possível impedindo-se o cres­cimento desmesurado da máquina administrati­va, desburocratizando-a e libertando-a, sempre que possível, de encargos delegáveis."

14 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Em sua reunião inicial, a Comissão aprovou um ro­teiro dos estudos a realizar, já tendo cada um de seus membros recebido antecipadamente um dossiê com os projetos elaborados pela Comissão Amaral Peixoto e ou­tros elementos informativos. Decidiu a Comissão distri­buir os seus membros em grupos de coordenadores, aos quais ficaria entregue o exame dos diferentes tópicos constantes do roteiro, sob a liderança do primeiro nome indicado para cada grupo. tste reunir-se-ia por convoca­ção do líder do grupo, por intermédio da Secretaria Executiva; e o Plenário, por convocação do Presidente da Comissão. Acertou também fixar, como objetivo dos estudos a serem empreendidos, o preparo de um Do­cumento contendo Anteprojeto e Justificativa para encaminhamento, com Mensagem Presidencial, ao Congresso Nacional. Ficou, assim, taxativamente excluí­da a elaboração de relatório. 1" Tornou-se, finalmente, assentado que a Secretaria Executiva daria apoio aos grupos de cOÇlrdenadores e ao Plenário, incumbindo-se de manter contacto direto com os Ministérios, como se verá em seguida.

A COMESTRA (Comissão Especial de Estudos de Reforma Administrativa) realizou 36 reuniões plenárias. Os Grupos de Estudo reuniram-se, formal ou informal­mente, na medida requerida pelo andamento de seus trabalhos.

No que concerne à Secretaria Executiva, resolveu-se que, afora um pequeno núcleo de auxiliares para a parte administrativa,]f; contaria com a dedicação integral de dois membros da Comissão e de dois especialistas do staft do Ministério do Planejamento, um para assuntos de ad-

" Essa deliberação, se, de um lado, traduz o método que vinha sendo adotado pelo Ministério do Planejamento na apre­sentação de estudos semelhantes, como, por exemplo, no da Reforma Agrária e no do Plano Habitacional, reflete também o receio dos membros da Comissão de elaborarem mais um rela­tório que, como os anteriores, desde 1953, vinham enriquecendo a nossa literatura administrativa, ajudando a pesquisa dos es­tudiosos de administração. sem contudo evitar a protelação do ataque a problemas cada vez mais agudos do Serviço Público Federal.

10 Quando necessário, a Secretaria Executiva valer-se-ia -como inúmeras vêzes ocorreu - dos serviços administrativos do Ministério do Planejamento.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 15

ministração e outro para assuntos jurídicos, levando em conta que:

1 . caberia aos Membros da Comissão o trabalho principal, cumprindo à Secretaria Executiva dar apoio às suas missões;

2. contar-se-ia com a cooperação, junto à Secre­taria Executiva, dos elementos credenciados pelos Ministérios, embora continuando os mes­mos em suas sedes.

No que tange à colaboração dos Ministérios, dirigiu­se o Ministro do Planejamento a cada um de seus colegas solicitando que designassem dois representantes para co­laborar com a Secretaria Executiva. O Secretário Exe­cutivo foi portador dessa solicitação, insistindo em que um dos designados fôsse pessoa de fácil acesso ao titular da Pasta, o que de modo geral se verificou. A cooperação dos Ministérios teria que concentrar-se na atualização dos esquemas organizacionais adotados pelo Projeto Amaral Peixoto, além da apresentação de sugestões e observações que cada Ministro de Estado julgasse pertinente. Esta parte, entretantct estaria Obviamente condicionada à fixação de rápida orientação da COMESTRA para os pontos essenciais, o que tardou em ocorrer, dificultando, como é evidente, a coordenação que caberia à Secretaria Executiva exercer.

Nos dias 27 e 29 de janeiro de 1965, o Presidente da República recebeu o Ministro Roberto Campos, acom­panhado de membros da Comissão. Os principais aspec­tos dos trabalhos em curso foram minuciosamente expos­tos, inclusive através de gráficos. Manifestou o Presiden­te grande interêsse pelos assuntos relatados pelo presi­dente e pelos membros da Comissão, tornando claro, quanto a pontos sujeitos a notória controvérsia, como por exemplo, desdobramento do Ministério do Trabalho e Previdência Social - então grandemente pressionado pelo titular daquela Pasta - que o Govêrno não adotaria nenhuma posição antes de conhecer o ponto de vista da COMESTRA. Ficou bem esclarecido que outros pontos controvertidos e em tôrno dos quais se empolgavam cer-

16 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

tos setores teriam de ser, ao final, coordenados pessoal­mente pelo próprio Presidente da República, como de fato veio a ocorrer.

Tendo como ponto básico de referência as diretrizes comunicadas pelo Govêrno, entendeu a COMESTRA de dar partida, com o desenvolver dos trabalhos afetos aos grupos de coordenação em que se subdividira, ao prepa­rode Minutas de Anteprojeto. como veículo para, grada­tivamente, através de sucessivas minutas revistas, con­solidar e harmonizar o pensamento de todos os membros da Comissão, obrigando-os a uma participação ativa nas discussões e deliberações.

A Primeira Minuta, de 5 de março de 1965, repre­senta, a rigor, um esbôço muito preliminàr, destinado a facilitar à Comissão a fixação do delineamento do Projeto e a decidir-se, objetivamente, mediante amplo debate, as alternativas resultantes de pontos de vista nem sempre coincidentes de seus membros. Colimava-se trazer para o Plenário o debate concreto dos pontos essenciais e com­plementares e encaminhar ao texto do Projeto o pensa­mento da maioria da Comissão. A Primeira Minuta com­preendia um texto elaborado pela Secretaria Executiva, acompanhado de um texto sugerido por um dos membros da Comissão e de um adendo enfocando o tópico Admi­nistração de Pessoal. Do debate, ponto por ponto; des­sa primeira esquematização, foram resultando textos re­vistos, dando lugar, assim, a uma Primeira Minuta Re­vista, a qual, para todos os efeitos, constituiu-se na Se­gunda Minuta. Logrou-se, por essa forma, contar com uma esquematização realmente representativa dos pontos de vista predominantes na Comissão.

A maior dificuldade com que deparou a Comissão foi a ausência de dados informativos válidos. Sua missão não consistia em realizar estudos aprofundados do Serviço Pú­blico Federal - pois que isso vinha sendo efetuado há mais de dez anos - mas sim em partir do Projeto da Çomissão Amaral Peixoto para ajustá-lo às diretri­~es básicas estabelecidas pelo Govêrno, em grande parte çoincidentes com o pensamento expresso naquele ante­projeto. Cumpria-lhe, ainda, levar em conta a experi­mentação que, em relação aos instrumentos considerados

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essenciais a um nôvo estilo e a um nôvo método de ges­tão do Serviço Público Federal, vinha sendo tentada nos Ministérios do Planejamento e da Fazenda. Cabia-lhe, também, armar um quadro capaz de pôr fim a uma situa­ção de inexistência de contrôle real, efetivo, na Adminis­tração Federal, problema que, por si só, equivalia a rom­per com uma tradição de sessenta anos, enraizada em concepções jurídicas que relegavam a segundo plano as lições da arte de administrar. Mas o exemplo mais frisan­te dessa falta de dados diz respeito ao problema básico, essencial. do pessoal. Todos os membros da Comissão suscitavam-no, assiduamente, nos debates, queixando-se, unissonamente, da falta de elementos informativos vá­lidos. Um dos membros da Comissão - com a autoridade que lhe emprestava a condição de Diretor-Geral do DASP - declarou aos seus colegas e ao Plenário, em mais de uma oportunidade, não dispor de informações essenciais - que sômente iria obter através de um Censo dos Servidores - e que considerava a administração de pessoal em estado caótico. 1;

Com o prosseguimento dos trabalhos, produziu a CO­MESTRA a Terceira Minuta. de 31 de maio de 1965, com­preendendo:

1. Anteprojeto de Lei; 2. Anexo; 3 . Justificativa. 1 "-

Ainda como resultado dos trabalhos processados, a COMESTRA produziu, também, o Documento de 21 de junho de 1965, intitulado Tribunal de Contas e compre­endendo:

, Declarou-se o DASP. desde o início do Govêrno da Revo­lução. incapacitado de informar sequer o número de servidores públicos e, muito menos. sua classificação e distribuição. Acres­centou que isso só seria factível através do Censo dos Servidores. mandado realizar pela Lei n.O 4.242, de 17 de julho de 1963. En­tretanto, somente pelo Decreto n.o 58.297, de 2 de maio de 1966, viriam a ser aprovadas providências conducentes à realização do Censo, cujas tabulações preliminares foram divulgadas em fevereiro de 1967.

Cumpre assinalar que a expressão estado caótico traduz, efetivamente. o panorama existente.

-, A COMESTRA dedicou-se. também, ao estudo de outros três Projetos oriundos da Comissão Amaral Peixoto e enviados ao Congresso Nacional:

18 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1. Emenda Constitucional (Justificativa e Ante­projeto) ;

2. Lei Orgânica (Anteprojeto e Justificativa). Considerando que o Govêrno atribuíra ao Ministro da

Justiça e Negócios Interiores a coordenação da matéria concernente a Emendas Constitucionais, o Ministro do Planejamento encaminhou aquêle Documento ao titular da Justiça com a carta de 8 de julho de 1965, do seguinte teor:

"A Comissão Especial de Estudos de Reforma Ad­ministrativa, que funciona neste Ministério, nos têr­mos do Decreto n.O 54.501, de 9 de outubro de 1964, tem os seus trabalhos pràticamente concluídos com a elaboração de três anteprojetos. Os dois primeiros dizem respeito ao Tribunal de Contas da União. e o terceiro à Reforma da Administração Federal. A minuta do Anteprojeto de Lei de Reforma da Ad­ministração Federal está ainda sendo submetida a revisão. Estou solicitando as diretrizes finais do Se­nhor Presidente para alguns pontos suscitados pela

1. Projeto n.O 1.484-A, de 1963. referente ao Conselho de Defesa do Sistema do Mérito. A COMESTRA entendeu que se tratava de questão intimamente ligada aos pro­blemas de Política de Pessoal, não se justificando, assim, um projeto autônomo, já que prevalecia na Comissão a idéia de cogitar-se, no Projeto de Reforma Administra­tiva, dos assuntos concernentes a Pessoal.

2. Projeto n.o 1.483-A, de 1963, referente ao Sistema de Material. A COMESTRA entendeu que o Projeto viria, apenas, restaurar experiência, de caráter limitado, já vivida nesse setor pelo Serviço Público Federal e que a solução proposta não levava em conta a experiência mo­derna de administração de material, notadamente em al­guns órgãos da administração descentralizada. Verificou, ademais, que o Projeto introduzia medidas de caráter nitidamente burocrático à guisa de controlar o problema de material, copiando soluções tipo exame de processos por colegiados centrais, na mais pura inspiração no gênero de contrôle formal então exercido pelo Tribunal de Contas, que se pretendia reformar.

3. Projeto n.O 1.486-A, de 1963, referente à organização do Distrito Federal. A COMESTRA apresentou ao Govêrno sugestões para o veto parcial do Projeto, no sentido de aperfeiçoá-lo.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 19

Comissão, com vistas ao preparo de minuta mais definitiva, que me apressarei em enviar-lhe e aos de­mais Ministros de Estado. Em relação ao Tribunal de Contas, remeto a V. Ex.a o Anteprojeto de Emenda Constitucional e o Ante­projeto de Lei Orgânica, minutados pela Comissâo Especial, a qual - como resultado dos estudos e aná­lises que realizou - entende ser indispensável uma redefinição das atribuições do Tribunal, com o obje­tivo de colocá-lo na posição de órgão de contrôle ex­terno do Poder Executivo e não, como atualmente ocorre, de órgão que interfere a todo momento em atos de responsabilidade do Presidente da República, dos Ministros de Estado e autoridades delegadas, en­fraquecendo assim a atuação das autoridades admi­nistrativas, sem que disso resulte proveito algum pa­ra o Serviço Público Federal, antes contribuindo pa­ra diluir responsabilidades, estimular a burocracia e aumentar os custos operacionais. Creio que a colo­cação do problema de Reforma Administrativa pe­rante o Congresso Nacional poderá processar-se em duas etapas: na primeira, caberia ao Congresso apreciar a Emenda Constitucional referente ao Tri­bunal de Contas; na segunda, o Congresso Nacional apreciaria, simultâneamente, o Anteprojeto de Lei Orgânica do Tribunal de Contas e o Anteprojeto de Lei de Reforma da Administração Federal. Ao enviar-lhe êstes informes, venho pedir a escla­recida atenção de V. Ex.a para as recomendações for­muladas pela Comissão Especial de Estudos de Re­forma Administrativa, visando a atualizar o meca­nismo obsoleto do Tribunal de Contas, colocando-o em condições de exercer com eficácia o contrôle que lhe deve caber."

Com a apresentação da Terceira Minuta, o problema passou a exigir a orientação superior do Govêrno, no ní­vel do Ministro do Planejamento, o qual sabendo que membros da Comissão desejariam ainda ter a oportuni­dade de rever alguns pontos do Anteprojeto resolveu so­licitar que todos apresentassem suas observações, tendo por base a Minuta de 31 de maio de 1965, e incumbiu um dos membros da Comissão de examinar as observações

20 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

que fôssem oferecidas, apresentando relatório ao Minis­tro de Estado. Dando conta dessa missão, o designado apresentou, em 25 de junho de 1965, seu relatório. Apro­vado pelo Ministro do Planejamento êsse relatório, em 30 de junho de 1965, preparou a Secretaria Executiva a Quarta Minuta, de 5 de julho de 1965, que também compreendia:

1. Anteprojeto de Lei; 2. Anexo; lU e, 3. Justificativa. Encerrava-se, assim, a tarefa da COMESTRA, com

o Anteprojeto de Lei de Reforma Administrativa (Quar­ta Minuta), em mãos do Ministro do Planejamento, e os Anteprojetos referentes ao Tribunal de Contas, em mãos do Ministro da Justiça.

1.6 COORDENAÇAO DO MINISTRO DO PLANEJAMENTO

Em relação ao primeiro dos citados Anteprojetos, a matéria passou a situar-se no nível do Ministro do Plane­jamento, que se dedicou a seu estudo. Nessa ocasião, um membro da Comissão voltou a insistir junto ao Ministro de Estado em alguns pontos de vista que defendera com calor e não haviam predominado no seio da Comissão. In­teressado em manter abertas as portas da colaboração, o Ministro resolveu reabrir, no nível ministerial, o exame do Anteprojeto. Incumbiu-se o solicitante de apresentar um nôvo texto, do que resultou a Quinta Minuta, de 16 de agôsto de 1965. O documento foi desdobrado em dois:

1. Anteprojeto de Lei; 2. Justificativa. Havendo o Govêrno decidido ativar a matéria, em

reunião ministerial de 28 de agôsto de 1965, a Quinta Mi­nuta e o Documento referente ao Tribunal de Contas fo­ram distribuídos aos Ministros de Estado, com a reco­mendação presidencial de que estudassem e apresentas-

'" Do Anexo constava o rol das entidades da Administração Indireta. com a correspondente vinculação administrativa. Tor­nou-se desnecessário, por fôrça da orientação afinal adotada, que considerou a questão de competência do Poder Executivo.

FUNDAÇAO GETULIO VARGAS WBLlOTECAl\lARIO HENRIQUE Sli\lOl'\SiN

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 21

sem suas observações. Passou, assim, a matéria a ser con­siderada no nível do Presidente da República, isto é, ao seu estágio conclusivo.

1.7 COORDENAÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA

A Quinta Minuta revelou-se, de certo modo, um fa­tor de protelação para as decisões finais do Govêrno sô­bre a Reforma Administrativa. É que foi considerada, em geral, como um desvio em relação ao que vinha sendo ar­ticulado com os setores dos Ministérios que colaboravam mais de perto na reforma. Se a demora da COMESTRA em decidir-se, quanto a alguns pontos-chaves, já conduzi­ra ao enfraquecimento do élan daqueles setores - embo­ra persistisse o grande interêsse de todos pelos assuntos de reforma - a surpresa da Quinta Minuta, a faJta de es­clarecimento quanto à necessidade das modificações in­troduzidas e o afastamento, temporário, do porta-voz au­torizado da Secretaria Executiva da COMESTRA (o Se­cretário Executivo afastara-se em gôzo de férias no aguar­do das decisões do Govêrno) criaram uma atmosfera de perplexidade que ninguém parecia sentir em seus verda­deiros têrmos e muito menos se preocupava em dissipar. Isso determinou uma queda de substância no assessora­mento dos Ministros e, conseqüentemente, uma certa per­da de prioridade do assunto reforma nas cogitações dos mesmos e. portanto, do Govêrno. Além disso, o problema de aumento de vencimentos ao funcionalismo e a matéria orçamentária, além de outros relacionados com a proxi­midade do encerramento da sessão legislativa. passaram a preocupar predominantemente as atenções da cúpula governamental. Todos êsses fatos e, bem assim, a inde­finição do Ministério da Justiça quanto à Emenda Cons­titucional relativa ao Tribunal de Contas, tornaram cla­ro que a Reforma Administrativa sàmente poderia ser re­solvida, no plano do Executivo, no ano seguinte.

Sensível à necessidade de dar continuidade aos as­suntos da Reforma, o Ministro do Planejamento resolveu criar, no seu Gabinete, a Assessoria Especial de Estudos de Reforma Administrativa (ASESTRA), com a missão de:

22 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1. dar continuidade aos estudos já realizados; 2 . man ter articulação com os demais setores téc­

nicos do Ministério e com os setores do Ser­viço Público Federal interessados nos proble­mas de reforma administrativa e melhoria das condições de produtividade da administração federal;

3. promover o estudo de projetos relacionados com a implantação de medidas de reforma ad­ministrativa;

4. manter entendimentos com as entidades na­cionais e estrangeiras que possam cooperar e prestar assistência técnica aos trabalhos a seu cargo. ~Il

A ASESTRA teria um Coordenador, função para a qual foi designado o antigo Secretário Executivo da COMES­TRA.

Em outubro de 1965, o Tribunal de Contas, a pretex­to de colaborar na dinamização dos procedimentos admi­nistrativos e de aproveitar-se o final da sessão legislativa em curso, dirigiu-se ao Presidente da República para su­gerir o envio. ao Congresso Nacional, de Projeto de Lei destinado a atualizar a legislação chamada de contabili­dade pública. A par da elevação de limites para realização de concorrências administrativas, incluía-se extenso rol de penalidades que caberia ao Tribunal aplicar e - aten­te-se bem - um dispositivo declarando que continuavam em vigor as disposições do Código de Contabilidade Pú­blica, do Regulamento Geral de Contabilidade Pública e da Lei n.o 830 (Lei Orgânica), no que não conflitassem com o Projeto. Isso significaria dar plena vigência e atua­lidade a uma legislação considerada obsoleta e, o que é muito mais grave como sintoma de absoluta desatualiza­ção quanto às modernas técnicas de administrar, impor­taria em elevar à categoria de lei um regulamento de 1922. manietando, ainda mais, a ação do Executivo. ~l Por

~, Portaria n.o 137, de 18 de novembro de 1965. Z1 Rezava o Projeto elaborado pelo Tribunal de Contas, no

art. 32: "Continuam em vigor as disposições da Lei n.O 830, de 23 de setembro de 1949, do Código de Contabilidade Pública e Regulamento Geral de Contabilidade Pública, e suas

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 23

determinação do Govêrno, o Ministro do Planejamento manteve entendimentos com a Presidência do Tribunal de Contas, que revelou boa acolhida para as posições defendidas pelo Ministro, com base nos estudos da COMESTRA, mas deixou bem claro não poder aceitá-las, não somente porque considerava necessária a manuten­ção dos princípios constitucionais em vigor, como tam­bém por não concordar com algumas das colocações da COMESTRA (tais como a de eliminação de registro pré­vio, modificação do sistema de registro de contratos) e, ainda. porque continuasse a predominar no Tribunal uma corrente fortemente conservadora. Considerava, no en­tanto, muito conveniente prosseguissem os entendimen­tos. Após vários estudos, o Presidente da República comu­nicou ao Tribunal de Contas sua decisão em não encami­nhar o Projeto ao Legislativo, preferindo que a matéria continuasse relacionada com os estudos de Reforma Ad­ministrativa em curso.

Em Nota de 8 de dezembro de 1965, a ASESTRA ponderava ao Ministro do Planejamento, colocando o problema em sua precisa configuração:

"TRIBUNAL DE CONTAS E REFORMA ADMINISTRATIVA

No documento anexo, procurei fixar os pontos a que o Senhor Ministro Presidente do Tribunal de Contas deu especial relêvo na entrevista com V. Ex.a, em Brasília, aduzindo comentários que facilitem o estu­do do assunto por V. Ex.a. 2. O Senhor Ministro Presidente do Tribunal de Contas deixou bem claro seu ponto de vista no senti­do de que:

alterações, da Lei n.o 4.401, de 10 de setembro de 1964. e de leis gerais e especiais que tratam das matérias objeto da presente lei, no que não contrariem as nor­mas ora fixadas."

Nota-se a ostensiva omissão da Lei n.O 4.320, de 1964, pro­cedimento, sem dúvida, lamentável e reveladoro Lamentável porque se trata de lei moderna e que derroga vários dispositivos sediços do Código de Contabilidade e leis posteriores; revelador porque demonstra que o Tribunal de Contas a preteria, osten­sivamente, em favor da legislação tradicional, que se empenhava a fundo em revigorar, em fortalecer.

24 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1.0 - considera essencial que não se promova Emenda à Constituição;

2." - considera conveniente que, para atualiza­ção da legislação atinente ao Tribunal de Contas, se tome como ponto de partida o anteprojeto que apresentou, a título de sugestão ao Govêrno.

3. Do ponto de vista das idéias defendidas pela COMESTRA, cumpre lembrar que se considera es­sencial:

1.0 - que haja Emenda Constitucional rede fi­nindo as atribuições do Tribunal de Con­tas;

2.0 - que a nova Lei Orgânica do Tribunal de Contas, subseqüente à Emenda, restrin­ja-se à matéria relacionada com a orga­nização e ao funcionamento do Tribunal de Contas, deixando-se o mais para ser tratado na Lei de Reforma Administra­tiva ou em diploma específico;

3.° - que se vitalize, no plano federal, a Lei n.o 4.320, de 1964, cujas disposições, asso­ciadas às Normas Financeiras da Lei de Reforma Administrativa, vão ensejar bai­xar-se regulamentação ajustável ao pro­pósito de modernização da Administração Federal;

4.° - que, por fôrça dessa orientação, se deixe fenecer, por obsoletos, o velho Código de Contabilidade e o Regulamento Geral de Contabilidade Pública.

4. O simples relato dessas posições revela o quanto partem de pólos opostos e o quanto são inconciliá­veis. A análise contida no documento anexo demons­tra-o à saciedade. 5. Por tudo isso, parece que o Govêrno terá de fixar, preliminarmente, sua posição diante do problema: se renovadora, como sugere a Comissão Especial de Estudos de Reforma Administrativa e é da índole da

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 25

atual Administração do País; se conservadora, como é da índole e de tradição inexorável do Egrégio Tri­bunal de Contas. 6. Uma das posições prevalecerá, e será por certo a de índole renovadora, cabendo à outra - a conser­vadora - acertar o passo com aquela. Não há, no caso, posição intermediária possível, dado que seria incompatível com o espírito de reforma que anima o atual Govêrno. A adotá-la, seria preferível, então, deixar esta área da Administração na condição em que se encontra. ainda que notàriamente insatisfa­tória. " Para reativa r o interêsse dos Ministérios na aprecia­

ção dos assuntos pertinentes à Reforma Administrativa, o Ministro do Planejamento promoveu a realização da I Reunião de Administradores Federais, com a participação de representações de todos os Ministérios, sendo convi­dados especificamente alguns órgãos mais importantes do Serviço Público Federal e, como observadores, represen­tantes de entidades públicas e privadas, inclusive de ca­ráter internacional. As reuniões tiveram lugar nos dias 27 e 28 de janeiro de 1966, sendo abertas pelo Ministro do Planejamento. Os debates se processaram durante êsses dois dias, sàmente interrompidos para almoços a que com­pareceram os participantes do conclave. As recomenda­ções apresentadas na reunião e as que. dentro do prazo determinado, foram depois elaboradas, mereceram aten­to estudo pela ASESTRA, antes de encaminhadas ao Go­vêrno.

Entendeu o Ministro do Planejamento que se deveria ~uidar também - já que não fôra possível fazê-lo no âmbito da COMESTRA e que um grupo reunido sob os auspícios do DASP não lograra formulação conclusiva -de modernizar o processo de licitações, a fim de incluir-se um capítulo especial na Reforma Administrativa. Com essa finalidade e valendo-se de sugestões que haviam sido encaminhadas ao Govêrno pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, determinou a constituição infor~ mal, junto à ASESTRA, de um Grupo de Trabalho cons­tituído de dois ex-membros da COMESTRA. de elementos do Ministério da Fazenda, dos principais órgãos do Mi­nistério da Viação e Obras Públicas, de Sociedades de Eco-

26 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

nomia Mista vinculadas ao Ministério das Minas e Ener­gia e de três elementos do setor privado. O Grupo de Tra­balho entregou-se com afinco e método ao desempenho daquela missão, apresentando, em 15 de fevereiro de 1966. uma minuta de capítulo a ser incluído na Reforma Administrativa, acompanhado de sucinto relatório.:!~

De posse dessas novas contribuições, que vinham en­riquecer os trabalhos realizados em fases anteriores, o Mi­nistro do Planejamento propôs ao Presidente da Repú­blica que a ASESTRA consolidasse a matéria em nova mi­nuta. providência que, uma vez aprovada, :::1 determinou o aparecimento da Sexta Minuta, de junho de 1966.

Em 5 de julho de 1966, o Presidente da República aprovou a orientação de se distribuir a Sexta Minuta aos Ministros de Estado, aos Gabinetes Civil e Militar, ao DASP e ao EMFA, com o esclarecimento de que incorporava novas sugestões e observações colhidas pela ASESTRA, sem significar a aprovação presidencial para qualquer um dêles, já que a matéria passaria agora a ser examinada, em caráter final, pelo Presidente. Decidiu êste adotar o seguinte método de trabalho:

1. examinar pessoalmente ponto por ponto do projeto, segundo as anotações que fizera;

2 . recolher as últimas sugestões e observações dos Ministros de Estado;

.. Raras vêzes nos foi dado participar de uma equipe tão motivada e tecnicamente capacitada para determinado traba­lho. Supomos que isso tenha resultado do fato de se ter designa­do pessoas conhecedoras da matéria e grandemente motivadas na sua modernização. O grupo de trabalho logrou delinear as regras básicas a serem inscritas em lei (e, em seguida, explicita­das e desdobradas em um Regulamento), com grande poder de síntese e realismo para as necessidades do Serviço Público Federal. O texto original, de autoria do Grupo de Trabalho, fui atentamente revisto e analisado no curso dos trabalhos finais da Reforma, e pràticamente mantido no Decreto-Lei n.O 200.

",. A sugestão do Ministro do Planejamento foi apresentada e aprovada em reunião com o Presidente da República, em 30 de maio de 1966. Nessa mesma reunião voltou a ser focalizada a provável remessa da Reforma Administrativa ao Congresso Nacional em princípiO de agõsto de 1966. Nela, tambêm, o Presidente da República enumerou os Projetos de Reforma ainda em cogitação no seu govêmo, dentre os quais dava especial re­lêvo à Reforma Administrativa.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 27

3. tomar as decisões finais, assessorado por um pequeno grupo que iria, no momento oportuno, constituir para êsse fim.

Nesse ínterim, a ASESTRA enviou à Comissão Es­pecial de Juristas encarregados de elaborar um Antepro­jeto de Constituição, para informação de seus ilustres membros, os documentos preparados pela COMESTRA, sôbre o Tribunal de Contas, especialmente no que tangia às modificações de natureza constitucional sugeridas ao Govêrno. :!I

A nomeação do nôvo Ministro da Justiça, com a ex­pressa missão de coordenar a revisão constitucional, iria determinar que o Presidente da República passasse a ori­entar e a coordenar, no alto plano de sua autoridade, os assuntos pertinentes à Reforma Administrativa, nos seus aspectos constitucionais e de legislação ordinária. A revi­são constitucional abriria, em suma, a real oportunidade para a efetivação da Reforma Administrativa, permitin­do conjugar os ângulos constitucionais e legais, notada­mente no que respeita ao problema do contrôle orçamen­tário e financeiro, cuja modernização estava a exigir -conforme já acentuara a COMESTRA em julho de 1965 - alteração do texto da Constituição.

Ao dar posse ao nôvo Ministro da Justiça, em 19 de .iulho de 1966, o Presidente da República anunciava os principais itens do programa de reformas a ser ainda cumprido em sua gestão, dentre as quais se incluía a Re­forma Administrativa. Em relação a esta, disse o Pre­sidente:

"Por outro lado, está no consenso geral que de há muito a administração federal não possui condições que lhe permitam o cumprimento da importante mis­são de atender à coletividade brasileira. Situações e circunstâncias demonstram, à evidência, aquilo que constitui convicção dos administradores e, mais ain­da, justificam as reações daqueles que mantêm con­tato com o Govêrno Federal ou que precisam utilizar seus serviços. Apresentaremos, então, em breve, o projeto de uma reforma administrativa capaz de criar condições pro-

.. Carta de 3 de junho de 1966.

28 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

pícias ao ajuste da máquina administrativa às ne­cessidades do poder público, estabelecendo a efetiva responsabilidade dos administradores e, ao mesmo tempo, criando contrôles que assegurem a correta aplicação dos dinheiros públicos, sem prejudicar seu ritmo de trabalho e sem diminuir seu grau de efici­ência. Trata-se, evidentemente, de elevar a produti­vidade da administração, em benefício do desenvol­vimen to nacional." c.-,

Continuou o Presidente da República a dedicar vá­rias reuniões ao estudo da Reforma Administrativa, as­sessorado pelo Coordenador da ASESTRA que, no cor­rer dos trabalhos, foi elaborando notas focalizando os pontos considerados essenciais e as alternativas resul­tantes de ponderações e sugestões trazidas ao Presidente pelos Ministros de Estado e pelos órgãos de assessoria ime­diata do Govêrno.

Em 20 de setembro de 1966, o Presidente deu por con~ cluído o estudo que pessoalmente fizera da matéria, e in­cumbiu o Coordenador da ASESTRA de reunir um dos­siê, com indicação dos pontos que, à margem da Sexta Minuta, estavam a requerer uma decisão final diante das alternativas que se ofereciam e bem assim das princi­pais notas pertinentes. :',;

A Comissão Especial de Juristas apresentou o resul~ tado de seus estudos, iniciando-se, assim, a segunda fase da tarefa de revisão constitucional, afeta ao Ministro da Justiça. No que tange aos aspectos relacionados com a Reforma Administrativa, o Anteprojeto de Constituição elaborado pela Comissão Especial de Juristas revelou-se extremamente conservador e desencorajante para as pro-

c:. Jornal do Brasil de 20 de julho de 1966. ~, Constavam dêsse dossiê: 1) um aide-mémoire intitulado "Reforma Administrativa" e

desdobrado em: A. Pontos sob a atenção imediata do Sr. Presidente; B. Observações dos Ministérios; C. Tribunal de Contas; D. Cronograma Final; E. Futuro Govêrno.

2i Notas abrangendo várias pontos focalizados no aide­-mémoire.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 29

posições da COMESTRA, representando mesmo um gran­de retrocesso ao admitir, por exemplo, que despesas de pessoal pudessem exceder dos montantes autorizados pelo Congresso N acionaI. ~, .

Tornara-se claro que a Reforma Administrativa teria, já agora, de ajustar-se ao contexto da Constituição em es­tudo. Continuou a ser examinada, mas a prioridade do Govêrno deslocou-se para a matéria constitucional e, também, para a questão do aumento de vencimentos do funcionalismo. cujo estudo foi afeto a uma Comissão Es­pecial.

O Ato Institucional n.o 4, de 7 de dezembro de 1966, que regulou o processo de elaboração da nova Constitui­ção do Brasil, viria tornar claro que o Govêrno Revolucio­nário se dispunha a concluir os estudos do Projeto de Re­forma Administrativa e a convertê-lo em lei através da expedição de Decreto-Iei. ~~

Para a apreciação final do Presidente da República e elaboração do Projeto de Reforma Administrativa a ASESTRA preparou exemplares datilografados consoli-

'" Dizia o Anteprojeto da Comissão Especial de Juristas: "Art. 138 - São vedados na lei do orçamento ou na exe­cução dêste:

IV - A realização, por qualquer dos podêres, de des­pesas que excedam as verbas votadas pelo Con­gresso Nacional. excetuados os casos de pagamen­to de vencimentos fixados em lei, proventos de aposentadoria, reforma ou pensão, e de juros de dívida pública consolidada." (Correio da Manhã, de 25 de agôsto de 1966, Caderno da Constituição) .

No que respeita ao Tribunal de Contas, o Anteprojeto admitia a sobrevivência do regime de registro prévio (Art. 141. ~ 1.0).

"" "Art. 9.° .............................................. . * 2.° - Finda a convocação extraordinária e até a reunião

ordinária do Congresso Nacional, o Presidente da República poderá expedir decretos com fôrça de lei sôbre matéria administrativa e financeira."

O Projeto de Constituição foi encaminhado ao Gongresso Na­cional, com a Mensagem de 12 de dezembro de 1966, consa­grando, no plano administrativo, medidas renovadoras que em sua maior parte. lograram ser incorporadas ao texto da Constituição promulgada, notadamente no que respeita ao Tri­bunal de Contas.

30 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

dando a matéria até então discutida, ajustando as discus­sões, em princípio, adotadas pelo Presidente, ao texto da Sexta Minuta. Assessorado diretamente pelo Coordena­dor da ASESTRA, pelo Chefe do Gabinete Militar e pelo Chefe do Serviço Nacional de Informações, o Presidente debateu, em sucessivas reuniões, no Rio de Janeiro e em Brasília, fixando um texto considerado definitivo, que foi mimeografado e encaminhado pessoalmente pelo Pre­sidente aos Ministros de Estado, com prazo curto para seus comentários finais. O texto foi igualmente entregue aos Chefes dos Gabinetes Civil e Militar, ao Chefe do SNI, ao Diretor-Geral do DASP, ao Chefe do Estado-Maior das Fôrças Armadas, assim como à pessoa credenciada pelo Presidente eleito, Marechal Costa e Silva, para acompa­nhar o assunto junto ao Presidente da República. Colhi­das as observações de todos, dedicou-se o Presidente da República ao estudo das mesmas, debatendo-as com seus três assessôres diretos, promovendo novas reuniões com os seus Ministros e tomando as decisões que, em seu alto critério, lhe pareceram mais acertadas. O Presidente do Tribunal de Contas também recebeu o Projeto referente à Lei Orgânica, apresentando ao Presidente da República várias sugestões, em sua maior parte acolhidas. ~~

Seguiu-se a redação definitiva do texto dos Decretos­-leis finalmente assinados pelo Presidente e por todos os Ministros de Estado.:lU

1 .8 INTERPRETAÇÃO DE UMA EXPERIÊNCIA

Como se vê, longo curso teria ainda de percorrer a Reforma Administrativa antes de converter-se em texto legal, sem embargo de se haver adotado, desde o início. a política de simplificar os projetos anteriores e de expe­dir legislação orientada no sentido da implantação da

". Telex n.O 214/ AC/221725 P, de 22 de fevereiro de 1967.

"'. Decretos-leis n."' 199 e 200, de 25 de fevereiro de 1967, publicados no Diário Oficial (Suplemento) do dia 27. As justifi­cativas dos dois projetos, também aprovadas pelo Govêrno. foram mimeografadas e distribuídas.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 31

Reforma por etapas, gradativamente, uma vez assentadas suas diretrizes, bases e instrumentos. Isso evidencia. ao nosso entender, o quanto de teórico e fluido subsistia nas idéias de reforma e como são frágeis, no meio brasileiro, os instrumentos de pressão da coletividade em favor de legislação e de medidas de seu vital, evidente e imediato interêsse.

Na verdade, os que administram vêm, de há longos anos, dando expansão a reiteradas queixas de que não têm condições de bem administrar; os clientes da admi­nistração de longa data reclamam contra o burocratismo e a falta de eficiência do serviço público; os idealistas de há muitos anos pugnam, sem êxito, pelo sistema do méri­to; os políticos discursam reclamando pelas demoras e fa­lhas da administração; e os governantes colocam a refor­ma nos seus ambiciosos programas. Mas jamais se con­jugaram os esforços no sentido de efetivar-se a reforma, pois que a simples reunião de pessoas qualificadas para estudá-la não representa, na realidade, o resultado das pressões dos interessados nem o manifesto propósito de transformá-la em realidade.

Nunca o assunto foi tão perquirido como no Governo da Revolução, que o retomara depois de anos a fio de in­termitente discussão e após amplos debates, bem recentes, como foram os da Comissão Amaral Peixoto. A descrição que fizemos, resumidamente, dos passos adotados na ges­tão Castello Branco torna claro que houTe. por parte do Govêrno Revolucionário, grande preocupação de que tudo se discutisse em minúcia e profundidade, que se consul­tassem os mais variados setores de opinião, 31 que se ouvisse o Conselho Consultivo do Planejamento (CONSPLAN), que os Ministros de Estado participassem ativa e intimamente dos estudos, que os chefes de serviço

'U o Secretário Executivo da COMESTRA e. posteriormente. Coordenador da ASESTRA, afora os entendimentos informais. realizou vários palestras seguidas de debates, sôbre a Reforma Administrativa. no Rio de Janeiro e em São Paulo, abrangendo, entre outros, um Grupo de Jornalistas, Associação Brasileira de Técnicos de Administração, Fundação Getúlio Vargas (Profes­sôres da EBAPl, Federação das Indústrias de São Paulo, Clube de Engenharia. Associação dos Servidores Civis do Brasil.

32 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

trouxessem, diretamente, sua contribuição. Mas em ne­nhum momento se sentiu, realmente, a presença de pres­são orgânica sôbre o Govêrno em favor da Reforma, em­bora todos afirmassem e reiterassem a necessidade de realizá-la e seu propósito de apoiá-la.

Difícil será identificar as causas reais de tal situa­ção, injustificável em um país do porte e do grau de evolução cultural do Brasil. Vislumbra-se aí imenso campo aberto à pesquisa. Arriscamo-nos, todavia, a apontar alguns ângulos que a convivência com os fatos nos induz a configurar como relevantes.

Em primeiro lugar, a ausência da mentalidade do contribuinte, do taxpayer - tão atuante nos países de­mocráticos - dificulta incutir-se nos cidadãos a noção de que são êles os mais interessados na boa organização e no eficiente funcionamento do Serviço Público Federal, pois a ineficiência, os desperdícios e os altos custos ope­racionais representam pesado ônus para os que pagam impostos e taxas.

Em segundo lugar, os setores de pressão organizada - como é o caso do Comércio e da Indústria - embora conscientes da importância de uma eficiente administra­ção pública e interessados no seu aprimoramento, expres­sam seus pontos de vista de maneira muito frágil, tra­zendo-os à colocação mais como argumento subsidiário ao postularem, perante o Govêrno, naquilo que mais diretamente lhes afeta, do que como objeto primordial de suas manifestações.

Em terceiro lugar, os sindicatos de trabalhadores estão longe de conhecer, em sua verdadeira dimensão, a relevância do problema, que não identificam como inte­grando as áreas de seu interêsse. Desconhecem, por exemplo, que o princípio de livre acesso aos cargos pú­blicos, mediante concurso, é uma das raras demonstra­ções concretas do espírito das Democracias, pôsto que abre oportunidade de emprêgo para os brasileiros de qualquer condição social. E parecem também desconhe­cer que a eficiência e produtividade operativa da Pre­vidência Social - para a qual contribuem diretamente

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 33

depende, em grande parte, da eliminação do empre­guismo que nela se incrustou.

Em quarto lugar, os centros universitários não es­tão preparados - como lhes cumpria - para estimular, em campo neutro e em clima propício, o debate dêsses temas e nêles interessar a opinião pública, contribuindo para informá-la e esclarecê-la. As Escolas de Adminis­tração ainda estão na adolescência e, embora revelem grande interêsse pelo assunto, ainda não se constituem em fôrça de pressão atuante.

Em quinto lugar, os políticos não se sentem pres­sionados pelos seus eleitores, no sentido da racionaliza­ção administrativa, nem lograram dar substância às suas organizações partidárias, nas quais poderiam assi­nalar sua presença aquêles que consideram o assunto relevante e, assim, combater os vícios da burocracia e provocar melhoria na organização e no funcionamento do serviço público.

Impende ponderar que a imprensa tem, em parte, demonstrado crescente interêsse pelo aperfeiçoamento da Administração Federal, refletindo um desejo de reor­ganização que está no consenso geral e, mais acentuada­mente, as queixas que lhe são levadas pelo público que lida com as repartições. Ressente-se, contudo, de um las­tro que só poderia ser encontrado nos setores de opinião antes referidos, pois a ação da imprensa tem, natural­mente, caráter mais reflexo.

Constata-se, assim, que a idéia de Reforma é ali­mentada pelos próprios agentes da Administração, de uns poucos que não perdem alento - e parecem ressur­gir, de quando em vez, das próprias cinzas - e estão sempre dispostos a dar a contribuição de sua experiên­cia nas oportunidades que surgem para concretização dos ideais reformistas. ~sses movimentos ressentem-se. con­tudo, da falta de continuidade, pois não conta o Serviço Público Federal - exceção feita aos Ministérios Milita­res e ao Ministério das Relações Exteriores, por isso mesmo os únicos realmente dotados de corpo funcional organizado - com quadros dirigentes efetivamente pre­parados para atender aos reclamos de uma administra­ção moderna.

34 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Mas o que há de curioso nesta questão de Reforma Administrativa é que o conformismo com a ineficiência dá lugar ao inconformismo com a delonga em obter re­sultados, logo ao se promulgarem as leis, como se por um passe de mágica fôsse possível transformar a água em vinho. E a falta de informação válida, a ausência do hábito de compulsar dados e analisá-los, de dosar as expectativas em proporção aos meios empregados. o total desconhecimento desta verdade elementar de que para se criar condições de melhoria no serviço público torna-se indispensável fazer aplicações financeiras. tudo isso torna a tarefa reformadora extremamente defi­cultosa. As dificuldades crescem em extensão quando as fôrças conservadoras se reúnem para defender seus baluartes.

É significativo que, enquanto se falou em planeja­mento, em orçamento-programa e em programação fi­nanceira de desembôlso, revelou-se relativamente fácil convencer a todos. Bastou, porém, aflorar o programa do contrôle, envolvendo o Tribunal de Contas - defensor impérvio das vantagens do regime de registro a priori - ou no de localização da coordenação orçamentária -envolvendo o DASP, ainda muito convencido da priori­dade da administração geral - para que se levantassem as fôrças conservadoras, nesses dois redutos retardatá­rios da modernização da arte de administrar, não para debater conceitos e alternativas, não para sopesar van­tagens ou desvantagens, mas para repisar argumentos envelhecidos e incompatíveis com a época em que vive­mos e as exigências do progresso do País.

Em resumo: parece conveniente registrar uma no­tável persistência de propósitos do Govêrno Castello Branco em pautar sua gestão - sem prejuízo dos estu­dos referentes à Reforma Administrativa - com apoio em três instrumentos básicos, acionando-os, experimen­tando-os e aperfeiçoando-os mesmo antes de sua consa­gração pela Lei de Reforma. Idêntico registro deve me­recer sua preocupação em modernizar o sentido de con­trôle, sem o que o obsoletismo do Serviço Público Federal não lograria ser removido. Assinale-se, finalmente, a di­ficuldade que se lhe deparou em fixar diretrizes eficaz€;s

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 35

para o problema de pessoal - melhor diríamos, para o crucial problema de pessoal - dado o tumulto a que se chegou e o enfraquecimento técnico do DASP através dos anos, a ponto de torná-lo incapaz de sensibilizar-se, até mesmo diante de uma administração renovadora como foi a do Govêrno Revolucionário. O DASP - no passado uma entidade dinâmica e na qual. normalmente, se deveriam apoiar os estudos de reforma administrativa - adquirira a condição de um organismo anêmico, con­tido por suas próprias indecisões, carente de atitude pe­nitente para poder corrigir suas próprias omissões.

2. APRECIAÇÃO GERAL DA REFORMA

2.1 OBSERVAÇÃO PRELIMINAR

Arrolados sucintamente os passos que medeiam entre as primeiras tendências do Govêrno e a promulga­ção da Reforma Administrativa e antes da apreciaç1.o da lei que a consagrou - objeto dos capítulos seguintes - cumpre tentar um enfoque geral, compreendendo as razões da Reforma, sua finalidade, suas perspectivas e sua moldura, proporcionando uma visão conjunta do pensamento que a anima, dos meios em que se apóia e dos objetivos que visa a alcançar.

O singelo relato do que ocorreu no Govêrno Castello Branco evidencia que a tomada de posição inicial, dando predominância ao sentido instrumental e funcional, pre­valeceu por todo o longo caminho e logrou consolidar-se nos textos legais. Deixa, Lambém, muito claro que o de­bate da Reforma foi muito mais extenso do que tenderia a admitir o observador desavisado e envolveu importan­tes questões, cuja modernização exigia se rompessem tabus constitucionais cuidadosa e ardorosamente cultiva­dos pelos espíritos conservadores. Revela, finalmente, que o estilo de trabalho seguido trouxe à tona divergên­cias de vulto. felizmente resolvidas dentro de um espírito eminentemente construtivo, embora exigindo ponderável participação pessoal do Ministro do Planejamento e do Presidente da República.

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De tudo isso parece haver-se colhido um bom resul­tado, expresso na aceitação aparentemente tranqüila da orientação e das diretrizes consagradas na Lei de Re­forma Administrativa.

2.2 RECONCILIAÇAO DO LEGAL COM O REAL

Em nenhum setor da vida brasileira talvez se tenha configurado tão acentuado descompasso entre as leis e a realidade do que nos serviços públicos. A Administra­ção Federal é exemplo vivo dêsse descompasso. Não se estará mesmo incorrendo em simplificação injustificá­vel ao afirmar-se que a grande missão da Reforma Admi­nistrativa teria de consistir, para ser válida, na recon­ciliação das normas jurídicas - destinadas a presidir o Serviço Público Federal - com a realidade administra­tiva do País.

Sem a pretensão de remontar às raízes históricas -que nos levariam às Ordenações do Reino - e muito menos de deslocar o enfoque dêste trabalho para o campo sedutor da pesquisa sociológica, há que registrar o fato da absoluta predominância da fórmula jurídica, em larga parte da nossa experiência republicana, :l~ em tudo quanto concerne à Administração Federal, contri­buindo para o desajuste e crescente despreparo da má­quina administrativa para atender à coletividade e, mais importante ainda, para cumprir a básica e relevante missão que lhe incumbe em um país que almeja desen­volver-se e se propõe a consegui-lo. :l:l

"" "O clima intelectual das Escolas Superiores fundadas no Brasil. principalmente as jurídicas do Recife e de São Paulo, não é muito diferente do de Coimbra. Formam-se bacharéis e doutores nas mesmas fontes do Direito romano e do Direito canônico, rígidos e formalísticos. O Corpus Juris e as Ordenações do Reino. eis os seus principais alimentos do espírito" (BELLo, JosÉ MARIA. História da República, p. 48) .

'" A Reforma Administrativa é uma das facêtas do problema mais amplo da organização econômica, social e política do País. Cumpre-lhe conciliar as necessidades de um País no estágio e com as perspectivas de desenvolvimento do Brasil com a reali­dade administrativa de uma burocracia sem inspiração, onerosa, e que teima em não encontrar os meios de contribuir para aquêle objetivo, mas que precisa urgentemente fazê-lo.

38 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Em verdade, no Brasil, a formulação jurídica mono­polizava a inspiração e determinava o conteúdo das leis promulgadas para orientar e balizar a atividade dos bra­sileiros nos diversos setores. Predominava, soberana­mente, ao se traçarem os princípios e as regras de con­duta da Administração Federal, nas suas relações com os cidadãos e no que diz respeito ao seu funcionamento interno. O bacharel em Direito dominava o panorama do ensino superior - o qual, acentue-se, não adquirira sentido universitário - o campo profissional e dominava as áreas política e administrativa. O engenheiro e o mé­dico - duas profissões categorizadas e respeitadas na vida brasileira - exerciam sua influência mais no âm­bito profissional, com incursões, muitas vêzes brilhantes, na política. Sua participação era, obviamente, intensa nas áreas técnicas, mas rareava na parte da adminis­tração superior, assaz simplificada no passado pela própria natureza das funções então desempenhadas pelo Estado, e em razão da predominância das preocupações legalísticas. Os homens de administração - os burocra­tas - que gravitavam em tôrno das direções políticas ou administrativas de cúpula, provinham, via de regra, das Faculdades de Direito. Os contadores - guarda-li­vros, mais ao sabor da época - isolavam-se no herme­tismo de uma ciência contábil, cuja grande novidade foi durante anos a fio o sistema de partidas dobradas. A Economia incluía-se no campo de estudo da Economia Política, cadeira curricular das Faculdades de Direito, incrustada entre as matérias de caráter cultural e de pêso equivalente à de Direito Romano, como que a ba­lancear o passado com o futuro da evolução social. A formulação jurídica constituía-se, assim, no feixe de luz, no farol a iluminar os caminhos da composição, estrutura e funcionamento da Administração Federal.

A complexidade crescente das relações sociais; os vai­véns da concentração e desconcentração das atividades estatais; a inflexibilidade que a norma jurídica passou a representar no atendimento e solução dos novos proble­mas criados para a gestão administrativa; as modifica­ções substanciais processadas na evolução da economia brasileira, no desenvolvimento industrial, na urbanização, nos assuntos referentes à mão-de-obra e nas relações de

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convívio internacional que o pós-guerra impôs a tôdas as nações, tudo isso foi levando à formulação de solu­ções episódicas que, gradativamente, à margem das dire­trizes e princípios fundamentais, criaram outros tantos sistemas e subsistemas, sob a constante invocação - fre­qüentemente válida - de que isso se tornava necessário para atender a novas e instantes exigências da adminis­tração. As necessidades tinham sempre de traduzir-se em textos legais, hàbilmente manipulados por bacharéis se­gundo as condições do momento. E como as leis, após a Revolução de 1930, :;1 podiam ser fàcilmente modificadas, buscou-se o amparo de disposições inscritas na Lei Mag­na a ponto de ingurgitar-se a Constituição, como ocorreu em 1934. ;:.-, Mas as Constituições passaram também a ser modificadas com a maior facilidade, traduzindo as inde­cisões nacionais quanto aos rumos de que carece o País, para alçar-se ao nível das nações desenvolvidas.

A tendência centralizadora que se acentuou depois de 1930 - e atingia seu apogeu com o regime de 1937 - e o sentido paternalista dos governos acionados pelas condições econômicas do País e tão do agrado do Presi­dente Getúlio Vargas; os slogans de estatização a criar uma opinião pública desprovida da consciência de custos e ignorante de que a solicitação de novos encargos ao Es­tado acarreta a imposição de maiores ônus fiscais; a descoordenação, conduzindo a enxergar-se o caso, o setor, sem a visão do global; todos êsses fatôres contribuíram para impedir que o problema administrativo brasileiro lo­grasse ser examinado em seus têrmos reais: nem a nor­ma jurídica acompanhou as necessidades da administra-

Decreto n .o 19.398. de 11 de novembro de 1930 (Lei Ins­titucional do Govêrno Provisório).

Como resultado da pressão de representantes classistas do funcionalismo na Constituinte, associados a políticos titulares de cargos públicos nos vários níveis de Govêrno. encaixou-se no texto constitucional um capítulo dedicado aos funcionários pú­blicos. reconhecendo-se a êstes direitos de que não gozavam as classes trabalhadoras. A rigidez das regras inscritas na Cons­tituição revelar-se-iam um fator negativo na aplicação dos princípios da Administração de Pessoal, segundo as técnicas que o País ainda iria aprender com o correr dos anos. Paradoxal­mente. revestia-se de singular flexibilidade quando se tratava de elidi-las, postergando-se a realização de concursos para favore­cer o empreguismo político.

40 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

ção, nem a administração conseguiu equacionar suas ne­cessidades para postular novas normas jurídicas adequa­das às exigências sociais.

Fatos novos foram ocorrendo sem encontrar uma ori­entação legislativa a indicar-lhes os caminhos mais acer­tados, nem um pensamento administrativo coerente e abrangedor que servisse de alicerce. Surgiu a descentrali­zação patrimonial e de gestão, através da instituição das Autarquias; e quando estas se revelaram insuficientes pa­ra atender a novas necessidades, apareceram as Socieda­des de Economia Mista. Os Bancos de Desenvolvimento e outras organizações congêneres fizeram-se presentes no cenário da Administração Federal e dos Estados. órgãos de administração regional também passaram a compor o pi,norama para contornar o grave problema da desarti­culação entre a organização política, consagrada tradi­cionalmente pela Constituição, e a alocação dos recursos provenientes da arrecadação de impostos. A Emprêsa PÚ­blica nasceu, cresceu e vicejou enquanto os juristas da­vam tratos à bola para identificar e definir sua natureza e posição no quadro geral. Aplicou-se uma figura típica do Direito Civil - a Fundação - para resolver proble­mas com que se confrontava a Administração Pública.

Em 1935, descobria-se no Brasil a literatura ameri­cana sôbre administração. O livro de WILLOUGHBY, :;,; des­conhecido nas Faculdades de Direito - onde se ensinava Direito Administrativo para cuidar, dentre outros aspec­tos, da organização jurídica da administração - iria in­fluenciar a reforma do Ministério da Educação e Saúde, realizada pelo Ministro Gustavo Capanema, o qual. na sua justificativa, referia-se expressamente à dicotomia Administração Geral e Administração Específica. :17 Com

"6 WILLOUGHBY, W. F. Principles of Public Administration. 1927.

37 A Lei n.O 378, de 13 de janeiro de 1937, ao dar nova orga­nização ao Ministério da Educação e Saúde, distinguia os "órgãos de administração geral" dos "órgãos de administração espe­cial" (art. 5.°) e, ao regular as funções da Comissão de Eficiên­cia - capitulada entre os "órgãos complementares" - declarava competir-lhe "estudar e propor, permanentemente, as medidas que devam ser tomadas para que a administração geral do Mi­nistério (organização do pessoal, do material e da contabilidade) . bem como o funcionamento burocrático se façam com regula­ridade, rapidez e economia" (Art. 21) .

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o funcionamento do Conselho Federal do Serviço Público Civil 3$ essa influência se acentuaria e viria, afinal, a tra­duzir-se na criação do Departamento Administrativo do Serviço Público. 39 A transplantação de literatura mal as­similada e sem quadros preparados para a disseminação das novas técnicas teria de conduzir a distorções e incom­preensões. Faltou ao estudo da Administração, então nas­cente, o berço e o alimento da Universidade. 4<1

O mesmo ocorreu no campo da Economia, matéria pela qual demonstravam algum interêsse os bacharéis e os engenheiros. Pode-se, talvez, afirmar que foi na Comis­são Mista Brasil-Estados Unidos, em 1951,41 que se fir-

"" Criado pela Lei n,o 284, de 28 de outubro de 1936. '" Decreto-lei n.O 579, de 30 de julho de 1938. A criação do

DASP "representa o esfôrço de uma elite de administradores que. sob a liderança do Dr. Luiz Simões Lopes, começou a tratar dos problemas de administração do ponto de vista da economia e da eficiência, ou seja, do ponto de vista técnico. O grupo de homens, que constituiu aquela elite, pretendia, ao que tudo indica, superar o unilateralismo jurídico, isto é, aquela tendên­cia bacharelesca com que têm sido tratados no Brasil os pro­blemas de administração" (VIANA, ARÍZIO de, O Problema da Racionalização Administrativa no Brasil, 1951).

'" Eis dois depoimentos bastantes expressivos: "Apesar da diversidade de propósitos entre a corrente do

formalismo jurídico, responsável pela burocracia orçamentívora. e a da racionalização administrativa, um traço identifica os adeptos de uma e de outra: o método de ação social que êles têm usado. Uns e outros transplantaram, lisa e simplesmente, para o nosso meio, soluções impregnadas das peculiaridades de outros meios históricos. Nada mais natural, portanto, que. sob o impacto de nossa realidade histórica, as soluções importadas tivessem sofrido deformações e reinterpretações. Suscita-se a vitalidade mesma da cultura brasileira" (VIANA, ARÍzIO de. O Problema da Racionalização Administrativa no Brasil, 1951J.

"Extasiados ante a experiência norte-americana, esquece­mo-nos de. valendo-nos desta última, criar formas organizacio­nais adaptáveis ao meio brasileiro. Desenvolvemos a parte ope­racional dos órgãos administrativos, tal como se estivéssemos face a elementos de ação, e instrumentos de trabalho, semelhan­tes àqueles que a grande nação norte-americana dispõe. Reve­lamo-nos. assim, ingênuos, em parte, e, por outra, irrealistas quanto ao modo de ver o nosso País" (MESQUITA, L. F .. O Problema do Executivo, 1952) .

41 Integrada por equipes de especialistas brasileiros - pre­dominando engenheiros e economistas - e norte-americanos, dedicados ao estudo de problemas da economia brasileira.

42 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

mou a necessidade de enfocar em novos têrmos a econo­mia brasileira, dando ao seu estudo e ao equacionamento preliminar de seus problemas uma objetividade de que até então se ressentia. 4~ O interêsse de jovens diplomatas pe­lo estudo da Economia, notadamente nos Estados Unidos da América e na Inglaterra, haveria de proporcionar ao Ministério das Relações Exteriores um núcleo de brilhan­tes economistas, cedo convocados para missões em todos os setores. A Universidade, como sempre, revelou-se re­tardatária em relação às necessidades educacionais do País. O funcionamento da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, que tão parcos resultados proporcionou ao País, em têrmos de auxílio financeiro, revelar-se-ia ex­tremamente produtivo no que tange à necessidade de pla­nejamento, de condicionar a alocação de financiamentos à existência de projetos de provada viabilidade econômi­ca. conduzindo à criação do Banco Nacional de Desenvol­vimento Econômico, entidade que, a exemplo do DASP, no terreno da administração, seria um marco no campo da Economia, e representando quiçá a matriz do Progra­ma de Metas do Govêrno Kubitschek, que tanto popula­rizou a noção de planejamento no Brasil.

Como se vê, os fatos da realidade brasileira cami­nharam mais céleremente do que a nossa capacidade de formulação jurídica, tal como a concebíamos anos atrás. Os diques foram rompidos, o conteúdo extravasou a fôrma, o farol inverteu seu feixe de luz, passando a ilu­minar, de maneira cada vez mais tênue, o funcionamen­to da Administração Federal, encontrando-se, ao final, na retaguarda dos fatos. H As regras legais e até consti-

'0 Segundo GUERREIRO RAMOS, a Comissão Mista "contribuiu para tomada de consciência dos desequilíbrios estruturais do País. sobretudo de caráter econômico" (Administração e Estra­tégia do Desenvolvimento, p. 451) .

" Exemplo típico dessa situação pode ser encontrado na inadequada organização dos Ministérios para administrar, no plano que lhe compete, as entidades descentralizadas. No Minis­tério do Trabalho, Indústria e Comércio, para citar um caso, o Departamento Nacional de Previdência Social trabalhava com pessoal cedido, temporàriamente, pelos Institutos de Aposenta­doria e Pensões. Que fiscalização poderia. realmente, sôbre os Institutos exercer? Não estaríamos, paradoxalmente, admitindo que os fiscalizadores fôssem por si mesmos fiscalizados?

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tucionais resultavam muitas vêzes, em ornamento da cultura jurídica do País. H

Na evolução da sociedade de nossos dias, por efeito do convívio mais estreito entre as nacões e como decor­rência da fôrça motivadora que passou a impulsionar os países menos desenvolvidos na procura de se aproxima­rem daquelas nações que já atingiram alto grau de desen­volvimento, em busca do bem-estar e do progresso social, surgiu, cresceu, multiplicou-se o ângulo econômico, o de­senvolvimento econômico e social, o progresso da econo­mia de um país, a mobilização de seus recursos para au­mentar a riqueza do povo, o avanço tecnológico e cientí­fico que o aproxime dos países desenvolvidos. Tais fatos fizeram com que o nôvo farol, o nôvo ponto de referência passasse a ser, inelutàvelmente, o desenvolvimento econô­mico e social do País. O próprio conceito de segurança militar perdeu de há muito o sentido limitado em que se enrodilhava para ajustar-se ao conceito nôvo de seguran­ça nacional, em que os campos social, econômico, político e psicológico têm participação básica. 4:;

H o descumprimento do princípio constitucional de prevIa habilitação em concurso para o provimento de car~os públicos é. certamente. o exemplo mais elucidativo. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. complemento indispensável da Constituição de 1946, somente lograria ser promulgada em de­zembro de 1961 (Lei n.o 4.024, de 20 de dezembro de 1961l. De­correram quinze anos à espera de legislação fundamental para a unidade e o progresso do País. Embora de imediato e direto interêsse para os Estados e Municípios, a matéria não logrou galvanizar a representação política no Congresso Nacional. Entretanto. na campanha para as eleições presidenciais decor­rentes da nova Lei Magna. os candidatos Eurico Dutra e Eduardo Gomes. em notáveis pronunciamentos na Bahia, davam grande destaque aos problemas da educação, numa visão coin­cidente das necessidades brasileiras no setor.

,;, Começou, felizmente a configurar-se o panorama uni­versitário brasileiro. embora ainda muito distorcido por fatô­res conhecidos. tais como a inadequação do Ministério da Edu­cação e Cultura para a imensa missão que lhe recai sôbre os ombros. a ausência de Institutos de Pesquisa, o vírus do tempo parcial - de estudantes e mestres - a corroer o organismo universitário. a ausência de bibliotecas. É por demais sensível a falta de sentido econômico na administração da Educação em todos os níveis. Registra-se, todavia. um movimento saudável de renovação. embora de fraca liderança no âmbito nacional. No que respeita aos problemas que constituem a preocupação da

44 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.

A formulação jurídica, já a esta altura, adquiria co­mo que a posição de satélite dêsse nôvo astro-rei. 4U ÊSte é o fato marcante de nossa época. O povo vai adquirindo sêde de progresso, não mais se contentando com a mi­ragem e a promessa de progresso, antes querendo desfru­tá-lo no quotidiano. E, na medida em que se educa e ins­trui, mais e mais se apressa em atingir os fins colimados. sem deter-se por demais no exercício acadêmico das re­gras jurídicas.

Daí o relêvo ao planejamento, à programação geral, os quais, de simples concepção relacionada com a gestão ao nível das emprêsas - como preconizado lucidamente nas tradicionais doutrinas de organização, desde a mag­nífica e sempre atual lição de Fayol - adquiriram senti­do nôvo, subiram ao nível de preocupação do Estado, co­mo entidade política e administrativa. O planejamento passou a constituir a preocupação central dos governos. O Poder Executivo, em especial, como responsável pela Administração Pública, terá, hoje em dia, em qualquer país civilizado, de inspirar-se em seus ensinamentos e apoiar-se em suas técnicas para tentar obter o máximo

presente monografia, há que assinalar o funcionamento de Es­colas de Administração, graças ao trabalho pioneiro da Funda­ção Getúlio Vargas, no Rio e em São Paulo, com excelente reper­cussão em todo o País. Não se pode deixar de recordar que a Escola Superior de Guerra. propiciando o convívio entre civis e militares, com a permuta de experiências entre os diversos seto­res de atividade e o debate amplo e de sentido objetivo dos pro­blemas brasileiros, terá sido provàvelmente a primeira Univer­sidade realmente a funcionar no Brasil. gerando a influência que se vem fazendo notar nos últimos anos.

'" Tende, porém, a refugiar-se nos tradicionais pareceres em que conselheiros jurídicos, em pronunciamentos que variam de setor para setor, constrangem a Administração a adotar pontos de vistas baseados em regras teóricas de interpretação estrita­mente jurídica, ou concepções doutrinárias previamente adota­das pelos seus prolatores e, freqüentemente, inconciliáveis com a conceituação técnica que constitui a essência mesma dos pro­blemas tratados, de caráter especializado. A Administração de Pessoal é particularmente afetada por êsse desvirtuamento, que se tem espraiado nos últimos anos, a ponto de tornar muitas vêzes irreconhecíveis as funções que, nas organizações públicas e privadas, são normalmente afetas aos especialistas de adminis­tração de pessoal, cada vez mais impedidos de utilizar e aper­feiçoar seus instrumentos técnicos.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 45

rendimento na utilização dos meios postos à disposição do Estado, visando a assegurar o bem-estar da população e o progresso social.

Do ponto de vista de organização das atividades ad­ministrativas, o planejamento consolidou a posição que lhe é própria de instrumento indispensável aos que diri­gem a Administração Federal para a formulação de dire­trizes capazes de permitir o metódico exercício da arte de administrar e o contrôle objetivo das realizações sob a responsabilidade do Estado.

Urge, pois, reconciliar a realidade da Administração Federal com a realidade legal e isso exige - a par de le­gislação básica que se inspire nessa motivação de horizon­tes muito amplos - a organização de cúpula administra­tiva do Poder Executivo, preparando-a para tomar deci­sões e permitir que cumpra uma atuação socialmente efi­caz. É sob êsse prisma que se deverá procurar compreen­der a Reforma Administrativa.

O pensamento que orientou o Govêrno Castello Bran­co na elaboração do Projeto de Reforma Administrativa nutriu-se do propósito de tornar compatível a adminis­tração legal com a administração real, firmando as dire­trizes e assentando os alicerces da Reforma, a fim de acelerar o processo capaz de fazer com que a Administra­ção Federal possa servir efetivamente à coletividade. 47

Daí a preocupação de modernizar a Administração Supe­rior do Serviço Público Federal - o Poder Executivo -concentrando-se a Reforma naquilo que, socorrendo-nos

.7 A "Justiça do Projeto de Lei de Reforma Administrativa", de fevereiro de 1967, traduz nitidamente essa preocupação, ao dizer: "V - Objetivos Sociais e Econômicos da Reforma. Redi­gido sob a inspiração das idéias acima focalizadas, o Projeto teria, obviamente, de substituir a clássica concepção de se orga­nizar a Administração Pública atendendo-se, estritamente, a ângulos jurídicos, por outra concepção, ditada pela preeminên­cia dos objetivos sociais e econômicos de uma reforma adminis­trativa, visando à aproximação dêsses objetivos do sentido de organização da atividade privada e, assim, a alcançar melhores resultados em proveito da coletividade. ~sse enfoque não deve

, ser perdido de vista na apreciação do projeto, pois que se consti­tuiu em constante preocupação na elaboração do seu texto, ao se traçarem novos contornos de organização, ao se adotarem com as adaptações necessárias - métodos de natureza gerencial na aplicação dos recursos recolhidos do povo, ao se instituírem sistemas de administração que tenham como preocupação a

46 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

da linguagem dos economistas. se poderia talvez chamar de macroadministração, na convicção de que, no Esta­do moderno, se a cúpula não funciona, nada realmente pode funcionar.

2.3 RAZõES DA REFORMA

A Reforma Administrativa reflete a consciência ge­neralizada de que o Serviço Público Federal não pode con­tinuar a operar na base de improvisações incompatíveis com as responsabilidades do Poder Executivo, como prin­cipal gestor da Administração Federal.

Alguns pontos justificam, nesse particular, certo des­taque:

Primeiro: o Serviço Público Federal compreende a maior, a mais diversificada e a mais complexa organiza­ção do País. Por conseguinte, as dificuldades em adminis­trá-lo eficientemente não encontram paralelo no territó­rio nacional.

Segundo: a organização do Serviço Público Federal está defasada para com as necessidades de hoje - como já o estava para as de ontem - e não atende ao que a coletividade está a exigir - em grau sempre crescente - para o amanhã. Qualquer hesitação em equacionar o problema administrativo e começar a solucioná-lo repre­senta desperdício pelo qual paga a coletividade em pro­porções sempre crescentes.

Terceiro: afora um esfôrço inicial, limitado e fugaz do DASP, nada mais de consistente se fêz para dar conti­nuidade a um trabalho sistemático de aperfeiçoamento do serviço público. Há esforços parciais e de muito mé­rito, mas apenas temporários ou de âmbito também res­trito.

produtividade e o custo dos serviços estatais e, finalmente, na montagem de um moderno e simplificado mecanismo de acom­panhamento da execução dos serviços, da verificação dos seus resultados e do contrôle dos seus gastos. A reforma é o momento oportuno para ajustar o Serviço Público ao progresso científico e tecnológico de nossos dias, queimando-se etapas, pois que a Ad­ministração Federal não se manteve atenta para assimilar e adotar, no devido tempo, métodos novos decorrentes da evolu­ção da ciência e da técnica."

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 47

Quarto: os meios têm gradativamente se sobreposto aos fins, o acessório ao principal, o burocratismo à ação.

Quinto: a excessiva centralização administrativa de­corre da falta de planejamento, de diretrizes, de organi­zação competente do centro de direção administrativa, fa­tôres que levam os dirigentes superiores a ficarem entu­lhados de casos - com a predominância do processo, dos canais competentes, do burocratismo - diluin­do-se a responsabilidade dos agentes, tornando-se moro­sas as operações e encarecendo-se os custos. Os órgãos da periferia - que estão mais próximos da coletividade ou dos problemas - têm sua ação tolhida, entorpecida.

Sexto: afora os Ministérios Militares e o Ministério das Relações Exteriores, os demais Ministérios não con­tam com corpos de direção e assessoramento preparados para o desempenho de suas funções e formando quadros estáveis, em cuja composição prevaleçam os princípios de bom recrutamento, seleção e contínuo aperfeiçoamento.

Sétimo: o planejamento precisa ser institucionaliza­do como moderno método de bem administrar; o orça­mento precisa, de um lado, dar objetividade ao planeja­mento através do mecanismo do orçamento-programa, e, de outro, traduzir a compatibilização entre o que se de­seja o que se pode realizar; o desembôlso de caixa do Tesouro deve ajustar-se ao programa e à disponibilidade de recursos financeiros, de modo que o ritmo das reali­zações do Govêrno não sofra interrupções ou acarrete impontualidade na satisfação das obrigações regularmen­te assumidas pelos administradores.

Oitavo: são insatisfatórios os sistemas de contrôle de que dispõe a administração, tanto no que respeita à exe­cução dos programas como no que tange à responsabilida­de financeira e orçamentária dos agentes.

Nono: a Reforma terá de ser ampla, abrangedora, ter caráter de profundidade, ser realizada por etapas, ter sentido funcional, antes do que estrutural, e precisará contar com recursos e meios de cuja metódica aplicação possa decorrer efetivo aumento de produtividade.

A Comissão de Estudos de Reforma Administrativa (COMESTRA) dispensou-se de "recordar, arrolar e re­pisar os defeitos por demais conhecidos" do Serviço Pú-

48 CADERNOS DI: ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

blico Federal, conforme se assinala na justificativa, le­vando em conta que seu trabalho se apoiava em amplos e profundos estudos anteriores e por considerar que "no consenso de todos, a Administração Pública Federal de há muito não oferece condições de funcionamento que lhe permitam o cumprimento da importante missão de aten­der à coletividade brasileira". 4"

Na verdade, o documento básico que deu início ao movimento de reforma, em 1952, com o Presidente Ge­túlio Vargas, aponta com muita precisão e com grande poder de síntese os pontos mais carentes e, reportando-se aos estudos realizados em outros países, afirmava: "Em tôdas essas tentativas e estudos, o que ressalta desde logo à vista é a impossibilidade de conciliar um govêrno ver­dadeiramente democrático com sistemas administrativos ineficientes e incapazes. A essência do regime democrá­tico consiste, não apenas em que as decisões fundamen­tais e as leis sejam feitas pelos representantes do povo, mas, também, em que essas decisões e essas leis sejam cumpridas e executadas rápida e eficazmente." Acrescen­tava o histórico documento: "A Reforma Administrativa que o Govêrno se propõe executar tem por objetivo prin­cipal fornecer os elementos estruturais e dinâmicos ne­cessários à realização dos fins do Estado brasileiro. A instrumentalidade presente está obsoleta e inservível: foi superada pelos acontecimentos, pelas necessidades e pelo progresso do País, no campo econômico, social e intelec­tual. Cumpre ajustá-la aos imperativos da situação em mudança." 4P

Nos Estados Unidos da América, no ano de 1937, o Presidente Roosevelt, dirigindo-se ao Congresso para pro­por-lhe ampla reforma administrativa,50 depois de re-

.. Justificativa, Item I - Antecedentes.

.. Projeto n.O 3.563/53, da Câmara dos Deputados, Anexo I - "Características PrinCipais do Primitivo Esquema de Reforma Elaborado pelo Govêmo".

... As profundas modificações introduzidas n~ vida norte­-americana após a crise de 1929 e o concentrado esfôrço de recuperação do Govêmo Roosevelt através do New Deal provo­caram sensível mudança na escala das solicitações a pesar sôbre Il Administração Federal daquele País, exigindo reorganização de profundidade. A mensagem de 1937 do Presidente Roosevelt ao Congresso marca o início de um movimento de reorganização

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 49

cordar que, exceção feita ao "Budget and Accounting Act" de 1921, nenhuma modificação profunda em admi­nistração ocorrera depois de 1913, quando foi criado o Ministério do Trabalho, afirmava: "Nestes dias tumul­tuados da história mundial, um self government não pode sobreviver por muito tempo a menos que êsse govêr­no se constitua numa agência atuante e eficiente para servir à humanidade e executar a vontade da Nação. Um Govêrno sem boa administração é uma casa construída sôbre a areia." Não receava acrescentar, enfàticamente: "O fato evidente é que a presente organização e equipa­mento do ramo executivo do Govêrno derrota o propósito governamental de que haja um único responsável Chefe do Executivo para coordenar e administrar os Ministérios e as atividades, de acôrdo com as leis votadas pelo Con­gresso. Em tais condições, o Govêrno não pode ser intei­ramente eficaz em trabalhar, sob contrôle popular, pa­ra o bem comum." Ao referir-se, especificamente, às re­comendações do Comitê que estudara a reforma adminis­trativa e antecipando-se às críticas - então muito vivas - de que se estava a reforçar em grau excessivo os po­dêres do Executivo, escrevia o Presidente Roosevelt: "Ao colocar êste programa sob vossa atenção, estou consci­ente de que será dito que estou a recomendar o aumento dos podêres da Presidência. Isso não é verdade. A Presi­dência, como estabelecida pela Constituição dos Estados Unidos, dispõe de todos os podêres que são requeridos. Apesar das almas tímidas em 1787, que receavam govêr­no atuante, a Presidência foi estabelecida como um único e forte cargo de Chefe Executivo, no qual foi investido to­do o Poder Executivo do Govêrno Nacional, enquanto que o Poder Legislativo foi atribuído ao Congresso e o Judi­ciário à Côrte Suprema. O que estou colocando diante de vós não é uma solicitação de mais poder, mas os instru­mentos de administração e a autoridade para distribuir o trabalho, de modo que o Presidente possa efetivamente utilizar-se daqueles podêres que a Constituição atualmen­te lhe confere. A menos que estejamos preparados para abandonar esta importante parte da Constituição, pre-

realmente intenso e indispensável à adequação dos mecanismos administrativos a novas responsabilidades assumidas pelo Poder Executivo.

50 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

cisamos equipar a Presidência de autoridade compatível com as suas responsabilidades sob a Constituição".~.1

2.4 FINALIDADE DA REFORMA

Dirigindo-se ao Congresso Nacional, o Presidente Castello Branco afirmou que "o propósito é obter que o setor público possa operar com a eficiência da emprêsa privada". ~~ Trata-se, é bem de ver, de uma proposição ambiciosa, enunciada certamente com o objetivo de cons­truir uma imagem para o grande esfôrço nacional visan­do a aprimorar o Serviço Público Federal.

Parece evidente que a coletividade precisa adquirir consciência e interêsse pelo serviço público, assim como necessita êste ter consciência plena de que a razão de sua existência está em atender à coletividade. Somente a con­jugação dêsses dois sentimentos pode gerar a melhoria dos serviços públicos, tanto no seu sentido global de di­reção de cúpula como nos seus aspectos setoriais, regio­nais e locais. Uma comunidade que não participe dos as­suntos de seu interêsse social deixa de poder exercer a influência que lhe cabe, e perde em autoridade para exigir a prestação dos serviços desejados. O serviço público que não é pressionado por uma coletividade participante ten­de a enredar-se no círculo limitado dos interêsses dos seus próprios agentes, dando-lhes preferência e prioridade com prejuízo para os reclamos da comunidade. ~.:l Não será

:., Mensagem do Presidente Roosevelt. ao Congresso, em 12 de janeiro de 1937, transmitindo o relatório e as recomendações do The President's Committee on Administrative Management.

'" Mensagem Presidencial de 1965. '" Fenômeno característico do subdesenvolvimento e que só­

mente o desenvolvimento pode superar. Daí a importância do papel desempenhado pela Educação, fator de influência prepon­derante para essa superação. Como afirmou, com o brilho de sempre. San Thiago Dantas, "o sistema educacional a que aspi­ramos, nas raízes incomutáveis da nossa realidade vital. é a educação para o desenvolvimento, isto é, a que prepare uma clas­se dirigente capaz de dar desempenho às novas tarefas técnicas e de chefia, que se abrem no campo da administração pública. da iniciativa privada, dos serviços civis, como manifestações de exigências orgânicas criadas pela expansão do País" (SAN TmAOO DANTAS, Educação para o Desenvolvimento, in Alguns Problemas Brasileiros, Confederação Nacional do Comércio, 1955).

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demais insistir na noção básica, fundamental - mas tão olvidada - de que a Administração Pública existe para prestar os serviços requeridos pela coletividade e para cuja execução esta contribui pagando impostos e taxas. É de primordial interêsse para a coletividade - e ela o exige em grau cada vez mais intenso, na medida em que, pela melhoria de seu nível educacional, adquire cons­ciência dêsse aspecto tundamental da vida social - que a Administração Pública se revele ativa e eficiente, dan­do aplicação racional e correta aos recursos financeiros pela redução dos custos e utilização das economias assim obtidas na prestação de novos serviços ou na intensifica­ção dos existentes, ou, ainda, na redução da carga fiscal.

O Administrador Público não pode, pois, deixar de basear-se em planejamento que oriente sua ação adminis­trativa, atendendo às expectativas da coleti\"idade na me­dida dos recursos mobilizáveis, assim como não pode pres­cindir de contrôles que lhe assegurem conhecimento exa­to e realista das etapas de cumprimento das tarefas pro­gramadas e da aplicação dos recursos financeiros obtidos e desembolsados. Planejamento, Ação Administrativa e Contrôle, eis os pontos essenciais de preocupação de qual­quer administrador moderno, em todos os níveis da hie­rarquia funcional. A dimensão varia conforme o nível hie­rárquico, mas na substância trata-se do mesmo problema. A principal responsabilidade do Administrador, em qual­quer escalão. consiste em tomar decisões, ou. como decla­rou o Govêrno: "A Reforma terá de criar condições para a reconciliação dos serviços públicos federais com a rea­lidade administrativa brasileira, sob pena de perder sua razão de ser. Cumpre-lhe, em suma, habilitar o adminis­trador público a tomar decisões expeditas, correntes, coor­denadas e tempestivas.":;4

A Reforma, em conclusão, tem por escopo habilitar o Administrador, em todos os planos. desde o Presidente da República até o Chefe de Serviço, a realmente admi­nistrar, tendo bem nítida a idéia de que, para a Adminis­tração Federal funcionar a contento, faz-se indispensável que a grande, imensa, a tão diversificada e complexa máquina administrativa conte com alguns pontos de re-

'" Justificativa. Item IlI.

52 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

ferência comuns capazes de servir de alicerces à ação coordenada do todo e a atuação eficaz de suas partes com­ponentes, de cada uma delas, sublinhe-se, por mais afas­tada que se configure sua posição no conjunto.

2.5 PERSPECTIV AS DA REFORMA

Ao deflagrar o processo de Reforma Administrativa de sentido amplo, e que se propõe a sedimentar suas ba­ses. podem-se destacar duas ordens de preocupação:

1. romper os diques do acúmulo de equívocos e he­sitações do passado, abrindo canais que condu­zam as águas para a grande tarefa de irrigar os campos de ação administrativa;

2. lançar os olhos na direção do horizonte, polari­zando as fôrças construtivas e as energias cria­doras para enfrentar, com decisão, os problemas do futuro. Ao deflagrar o processo de reforma é preciso encará-lo sob êsse duplo aspecto e tor­nar essa colocação conhecida e difundida.

Disso decorre o imperativo de se emprestar à Re­forma caráter eminentemente instrumental operativo, afastando-a das teorias e das concepções apriorísticas, de modo a se poder atender, simultâneamente, àquela dupla preocupação. ~,~,

.',. o Professor KLEBER NASCIMENTO, em trabalho de grande atualidade, referindo-se à perspectiva histórica da experiência federal brasileira de reforma administrativa, afirma que "além de longa e rica. a experiência é frustrada, já que não tem conse­guido reduzir o descompasso entre a capacidade operacional da burocracia e as crescentes exigências administrativas do desen­volvimento econômico e social." Seu propósito de proceder a "uma análise que vise a identificar elementos básicos para uma diagnose das falhas do passado, e, a partir de tal diagnose. for­mular orientações de ordem estratégica que aumentem as possi­bilidades de implantação desta e de outras reformas futuras" conclui por identificar na experiência brasileira "uma reformu­lação no sentido de substituir-se uma estratégia predominante­mente estruturalista por outra, predominantemente compor­tamentalista" nos parece inobjetável. Gostaríamos, todavia, de inserir uma observação: parece-nos que a estratégia comporta­mentalista, para ser objetiva, terá de basear-se no Instrumen­talismo - o tripé da Reforma Administrativa aprovada -

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o tripé em que se apóia a Reforma - planejamento, orçamento-programa e programação financeira de desen­bôlso - ensejará remover-se o represamento resultante dos erros e das protelações passadas. ~le traduz com fi­delidade os propósitos e as intenções do Govêrno ao en­gajar-se no processo de reforma, adotando uma lingua­gem que, pela sua simplicidade e fácil assimilação - e tendo a ampará-la os mais modernos conceitos e princí­pios da arte de administrar - possa servir de veículo comum de entendimento entre os administradores, desde os de tôpo até os de menor nível hierárquico. abrangendo a eliminação de conceitos, teorias, teses e formulações que a nenhum resultado concreto conduzem e perderam sua razão de ser, quer pelos erros de sua própria concepção, quer pela má aplicação que lhes foi dada, ou, ainda, pelas idiossincrasias que provocaram no meio administrativo ao longo dos anos. Essa a linguagem que vem sendo falada desde abril de 1964, conferindo, portanto, à Reforma um lastro experimental sem dúvida ponderável tanto mais quando se há de reconhecer que favorece a desconcentra­ção de funções afetas às autoridades de maior hierarquia, a delegação de atribuições e a descentralização que todos reputam essencial. Não será demais apontar, também, que permite superar as manifestas desvantagens e os ônus que se criaram em tôrno da aplicação entre nós dos con­ceitos de atividade-fim e de atividade-meio, de adminis­tração geral e de administração específica, e outros im­propriamente elevados à categoria de última palavra na arte de administrar. ;,,; E, finalmente, suscita, de imedia­to, no pensamento de todos, a noção altamente importan­te de que não basta planejar, pois é preciso também ad­ministrar e verificar os resultados, impedindo. com isso, que o administrador de menor visão ponha de lado a preocupação do planejamento, assim como coibindo que o administrador mais inclinado aos rasgos de entusiasmo

pois, sem essa condição o Comportamentalismo cairá no vácuo, ao passo que, com apoio nêle, deverá e poderá afirmar-se no seu duplo propósito de superar o descompasso existente e aten­der ao que se configura no horizonte. (NASCIMENTO, KLEBER. Reflexões sôbre Estratégia de Reforma Administrativa: a expe­riência federal brasileira. Revista de Administração Pública, 1.0

semestre, 1967). W Esta observação será desenvolvida no Capítulo 9.

54 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

pelos planos deixe de verificar os resultados de sua exe­cução, mantendo-se o planejamento permanentemente ajustado à realidade; e, acrescente-se - o que é de suma relevância - não retirando do administrador a ênfase em suas funções gerenciais, de sua responsabilidade pelos resultados.

Visa. outrossim, o tripé a consolidar o terreno, a fim de que se persigam, com intensidade cada vez mais acen­tuada, ambiciosamente mesmo, os dois grandes objetivos que pairam no plano superior dos desafios lançados aos brasileiros nesta segunda parte do século XX: a partici­pação ativa do Brasil na era da Ciência e da Tecnologia e a ocupação dos espaços vazios do território nacional. A conquista dêsse duplo objetivo, a resposta a êsses imensos desafios que se apresentam aos brasileiros, ao lado dos ideais de desenvolvimento social e econômico que já vêm sendo perseguidos, ~., jamais serão suficientemente enfa­tizadas.

A Reforma Administrativa deve ser encarada sob es­sa ampla perspectiva - a de abertura para o futuro, um futuro marcado pelas conquistas científicas e tecnológi­cas - se quisermos, realmente, empreender, com intensa emulação, a imensa tarefa construtiva que se impõe.

2.6 MOLDURA DA REFORMA

As soluções adotadas pela Reforma Administrativa se inserem em ampla mDldura que convém esboçar para facilidade de compreensão dos textos legais promulgados e utilização profícua dos preceitos que consagram. As grandes linhas da moldura podem ser sintetizadas sob os títulos seguintes: Diretrizes, Planejamento, Execução, Contrôle, Organização 'Coordenação e Pessoal. Procure­mos descrevê-las.

'" A austeridade suportada pelo povo brasileiro a partir de 1964, na procura do corttrôle da inflação e da retomada do desenvolvimento, constitui demonstração eloqüente da maturi­dade do País e estimula a confiança de que os dois grandes objetivos possam galvanizar o pensamento e a ação construtiva da coletividade.

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Diretrizes

A Reforma tem como indispensáveis uma política e normas que fixem o pensamento do Govêrno sôbre os as­suntos que se compreendem no seu campo de atuação, ajustadas aos preceitos da Constituição, consagradas nas leis e explicitadas nos regulamentos e atos de menor categoria pertinentes. Partindo-se de políticas e normas, automàticamente se relega a segundo plano - quer dizer, ao plano que lhe é próprio - o problema organizacional. Em outras palavras, o órgão passa a caracterizar-se - o que é correto - como o executor de determinada política, sua existência somente se justifica para o exercício de de­terminada função, enquanto esta subsista e nos têrmos em que se estabeleça seu desempenho. Estabelece-se liga­ção direta entre a política fixada em sua realização, dis­pensando-se atenção secundária ao organismo que vai de­sempenhá-la. É óbvio que tanto a política como o órgão são imprescindíveis, mas o que se quer ressaltar é a priori­dade de que goza a primeira. Se fizermos uma análise do SerYiço Público Federal, sob êsse ângulo, verificaremos, por certo, que grande número de órgãos não lograram funcionar por falta de políticas e normas que traduzam as diretrizes governamentais, assim como também há órgãos que continuam a existir sem que seu funciona­mento se justifique à luz de novas políticas estabelecidas. Isso resulta de não se considerar o problema de organi­zação da Administração Federal sob ângulo bem amplo, mas sim em consideração de aspectos estritamente orga­nizacionais e do âmbito restrito desta ou daquela en­tidade.

A política monetária é fixada em lei e tem sua exe­cução orientada pelo Govêrno, através do Conselho Mo­netário Nacional, com atribuições nitidamente definidas. O Banco Central é o órgão incumbido de orientar, coor­denar e controlar essa política - como agente executivo do Conselho Monetário - que penetra em tôdas as· áreas relacionadas com os problemas monetários do setor pú­blíco (Banco do Brasil, Banco Nacional de DesenVolvi­mento Econômico, Banco Nacional de Habitação, etc.) e do setor privado (bancos privados). Sem uma política monetária, o Banco Central flutuaria ao sabor das cor ...

56 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

rentes e dos ventos; sem êle, a política monetária seria mera ficção.

A política de abastecimento - uma das mais impor­tantes, complexas e de mais intensa repercussão social ~ exige, na opinião geral, que à sua coordenação se dê prio­ridade, com vistas à fixação de Diretrizes de Abaste­cimento (compreendendo Produção, Armazenamento, Transporte, Comercialização e Industrialização) e Dire­trizes de Financiamento. A política de abastecimento, que precisará contar com um órgão habilitado a orientar, su­pervisionar e acompanhar sua aplicação, vai permear to­dos os setores interessados ou participantes do problema, seja no setor público (entidades ligadas a diferentes Mi­nistérios, aos Estados, aos Municípios), seja no setor pri­vado. Cada um dêsses órgãos, onde quer que se situe, en­contrará um meio hábil de entrosar-se na política de abastecimento, na qual todos têm grande interêsse e atuam.

A política de pessoal - para mencionar uma ativi­dade auxiliar da administração - deve, por igual, ter os seus têrmos previamente definidos pelo Govêrno, dispor de órgão incumbido de orientar, supervisionar e contro­lar sua execução. É uma política destinada a traduzir o pensamento governamental, no que respeita aos proble­mas do elemento humano e da mão-de-obra no setor pú­bUco, atingindo os órgãos que o compõem, onde quer que se localizem ou se filiem administrativamente.

Em conclusão: a primeira preocupação da Adminis­tração deve consistir na fixação de políticas e normas, tanto para os assuntos específicos como para os de natu­reza estritamente administrativa, como meio de irradiar o pensamento governamental, por todo o Serviço Público Federal, e de fazê-lo conhecido dos seus agentes e dos in­teressados, em particular, e da coletividade, em geral.

Planejamento

A ação administrativa - responsabilidade precípua do Poder Executivo segundo a organização política e ad· ministrativa do País, consagrada na Constituição - há de ser precedida de planejamento em que, considerados os

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objetivos nacionais e os recursos mobilizáveis, se tracem os rumos a seguir em busca do progresso econômico e social.

Tem-se como pacífico que o Administrador Público, em qualquer nível em que atue, terá de situar-se e agir em consonância com as linhas gerais do planejamento econômico e social do Govêrno. O planejamento setorial em que se engaje deverá moldar-se em têrmos compatí­veis com o planejamento geral, assim como o planeja­mento ao nível departamental, em que eventualmente opere, terá de ajustar-se ao planejamento setorial cor­respondente e, portanto, ao planejamento geral. É isto que assegura a ação integrada e coordenada do Govêrno e dos Administradores Públicos, em seus setores de ação ou em suas áreas departamentais. c._

Execução

Lastreada pelas Diretrizes e pelo Planejamento, a ação administrativa se desenrola balizada:

a. pelo Orçamento-Programa b. pela Programação financeira de Desembô}so.

"', Pode-se considerar o planejamento como definitivamente incorporado ao pensamento administrativo brasileiro, muito em­bora esteja ainda longe do constituir-se no instrumento previsto na Reforma Administrativa, poiS que ainda se trata de cogitação restrita a certos setores governamentais. Essa consolidação do planejamento no pensamento nacional se (leve aos sucessivos planos que vêm sendo concebidos pelos governos, tais como: o Plano SALTE, no Govêrno Dutra; o Programa de Metas, no Govêrno Kubitschek; o programa elaborado pelo Gabinete Tan­credo Neves; o Plano Trienal, no Govêrno Goulart; e o PAEG, no Govêrno Castello Branco. Referindo-se à evolução da admi­nistração brasileira, opina GUERREIRO RAMOS, ao mencionar o P AEG e os estudos visando à programação decenal que " ... estão a demonstrar que a nossa Administração entrou definiti­vamente na fase que podemos chamar de planificação. Isso não quer dizer, porém, que os critérios dominantes nas fases prece­dentes, o jurídico e o da eficiência, tenham perdido vigência. Na verdade, cada uma das fases da nossa Administração Federal integra o critério dominante na fase anterior. A atual fase de planificação integra, portanto, o critério jurídico e o da eficiên­cia." (GUERREIRO RAMOS, Administração e Estratégia do Desen­volvimento, p. 452/453.l

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Trata-se de instrumentos que permitem ao Govêrno cumprir os programas requeridos pela coletividade, de maneira compatível, ordenada e realista.

O Orçamento-Programa surge, assim, como instru­mento da maior valia, essencial à eficiência do Adminis­trador Público de nossos dias. É através dêle que se esta­belece, no mais alto plano político, linguagem comum en­tre o Poder Executivo e o Poder Legislativo, ao elabora­rem e aprovarem o Orçamento; mas é sobretudo por seu intermédio que se estabelece uma linguagem compre­ensível para a coletividade, permitindo a todos - e em particular ao setor privado, o qual, numa política de des­centralização administrativa, vai colaborar com o Go­vêrno de modo intensivo - melhor e mais exato conheci­mento do programa anual de trabalho governamental e os recursos alocados para sua execução. Como já se pôs em evidência, com muita propriedade, a conciliação de propósitos entre a programação de atividades e a estima­tiva dos recursos financeiros destinados a implementá­las. gera, pelo menos, três vantagens:

1. a confiança de que as diretrizes do planejamento permearão os diversos níveis administrativos até atingirem as unidades executiv~ de menor por­te, definindo-lhes a responsabilidade pela realiza­ção dos serviços esperados pela coletividade, ra­zão de ser do Serviço Público;

2. a convicção dos órgãos executivos de que se ajus­tam às diretrizes da programação governamen­tal, podendo pleitear e contar em tempo com os recursos indispensáveis ao desenvolvimento de uma ação dinâmica que os habilite a produzir serviços e a demonstrar realizações;

3. o surgimento de linguagem comum .entre os que planejam - tanto no que respeita à ação econô­mica e financeira, em geral, como no que con­cerne aos aspectos setoriais - e os que adminis­tram, coordenam e executam, afinando-se os ins-, trumentos de avaliação e aferição, sem os quais será impraticável medir resultados, distinguir entre ação eficiente e ineficiente, óuscar a obten­ção de maior produtividade, administrar, em suma.

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Como se vê, o Orçamento-Programa, se, de um lado. permite que o Administrador Público acerte o passo com a programação econômica e social do Govêrno, de outra parte vai servir de base a que se modernizem os meca­nismos de contrôle, talvez a parte mais retardatária do Serviço Público.

À Programação Financeira de Desembôlso (Cash Flow) cabe, de um lado. assegurar um fluxo ordenado de recursos financeiros aos diferentes setores de ação gover­namental e, assim, proporcionar ritmo de trabalho pro­dutivo aos diferentes serviços, no interêsse da coletivida­de: e, por outro lado, proporcionar a todo aquêle que pres­te um serviço, realize um fornecimento ou faça uma obra para a administração pública a certeza de que, cumpri­do seu compromisso. o Serviço Público igualmente cum­prirá o dêle, pagando pontualmente, nas épocas estipula­das. os encargos assumidos. A desorganização do Serviço Público Federal decorre, ponderàvelmente, da ausência de boa programação financeira por parte do Tesouro e dos Ministérios. As unidades administrativas têm suas ver­bas, fazem as concorrências, assumem compromissos, mas, na hora de pagá-los, não contam com suprimentos financeiros em suas contas bancárias para fazer os sa­ques. Os interessados não podem, é óbvio, aguardar inde­finidamente, passando, em conseqüência, a apelar para o crédito bancário, que também não lhes pode ser pro­porcionado nos montantes compatíveis com os atrasos das repartições em saldarem seus débitos. A monotomia com que se repete êsse espetáculo ainda não logrou en­contrar, do lado da administração, uma solução adequa­da. Disso resultam, pelo menos, dois aspectos eminente­mente negativos: o afastamento de muitas organizações privadas, ainda que altamente qualificadas e credencia­das tecnicamente, das licitações e dos negócios com o Serviço Público, e o inevitável encarecimento dos serviços, pois não há organização privada que possa suportar, sem terríveis encargos financeiros adicionais, situações dessa natureza. Os métodos de programação de caixa; adotados no setor privado, especialmente nas emprêsas de grande vulto, podem, evidentemente, ser introduzidos com pro­veito no Serviço Público Federal.

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A Programação Financeira de Desembôlso é, portan­to, o mecanismo através do qual se liberam os recursos financeiros que vão permitir aos Administradores cum­prirem seu programas de modo ordenado e segundo uma cronologia sem a qual impossível lhes será responder pe­las realizações de que são incumbidos. Cabe ao Ministro da Fazenda entrosar os fluxos de receita e de despesa, estabelecendo os níveis em que esta se deva comportar, na execução do Orçamento-Programa, distribuindo-a em blocos aos diversos Ministérios. t:stes, a seu turno, os re­distribuirão, segundo as conveniências programáticas, aos diversos setores de trabalho. É a disciplina da programa­ção financeira que dá realidade às autorizações progra­máticas constantes do Orçamento, regulando a cadência de sua implementação.

t:ste instrumento pràticamente inexiste em nossa Administração Federal, no sentido em que o consagra a Reforma Administrativa, pois foi apenas ensaiado nos últimos anos e precisa de muita coisa ainda para sedi­mentar-se.

Ouso afirmar que a eficiência da Administração Fe­deral, nas condições em que a Reforma Administrativa pretende vê-la organizada e funcionando, poderá ser me­dida pela sua capacidade de emprestar continuidade e rit-' mo seguro à realização de seus programas e de manter re­gularidade no cumprimento das obrigações financeiras que assumir, atendendo, pontualmente, como o faz qual­quer emprêsa bem organizada, a seus fornecedores e em­preiteiros, e ensejando, a seu turno, que os últimos pos­sam, igualmente, manter suas programações de caixa. ~!<

". Trata-se de ponto crucial da vida administrativa brasi­leira a requerer, para chegar-se a boa solução, uma disciplina de formulação orçamentária tão olvidada e posta à margem por tão longos anos, e que deixou profunda herança negativa ainda em processo de intenso esfôrço de regularização. Se tivess~ havido preocupação verdadeira e orgânica pela programação da Caixa do Tesouro, não teríamos chegado ao descalabro das extravagâncias das autarquias deficitárias. E tudo isso foi-se criando sem que nenhuma fôrça de pressão da coletividade lo~ grasse êxito em impedir a consagração de práticas tão absurdas, que conduziram a Administração Federal ao tumulto e pelas quais ainda paga tôda a coletividade.

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Contrôle

~ste terá sido, talvez, o traço mais difícil de fixar na moldura da Reforma Administrativa. E, no entanto, como prescindir da modernização do contrôle quando se tinha presente a ineficácia dos aparentes contrôles existentes e dêle não se podia prescindir - ou sequer adiar uma de­finição - dada sua condição de contrapartida indispen­sável à política de descentralização preconizada pela Re­forma?

Instituíram-se tantos contrôles, sob a invocação de que era preciso controlar o funcionamento da Adminis­tração Federal, que terminamos por não contar, efetiva­mente, com instrumental de contrôle realmente válido, acabando por criar nítida indisposição para com tôda e qualquer preocupação de contrôle .• iO Enraizou-se, no Ser-

"', o próprio Tribunal de Contas. em seus relatórios anuais de apreciação das contas do Govêrno, sempre deu destaque à sua insatisfação com os contrôles existentes. Todavia, havendo no passado sustentado posição muito rígida quanto à absoluta necessidade de lançar-se mão do registro a priori, por apegar-se demasiadamente à tradição do Código de Contabilidade e, em especial, por se recusar a adquirir consciência da indispensabi­lidade de se dar responsabilidade aos administradores - e não cerceá-la ou diluí-la - não logrou o Tribunal, no curso dos anos oferecer contribuição eficaz ao equacionamento da grave ques­tão. Não se valeu. em suma, de sua influência para levar o Poder Executivo a organizar sistemas de contrôle realmente operacionais e o Poder Legislativo - do qual é. por definição constitucional. órgão auxiliar - a se empenhar pela votação de medidas legais que a isso conduzissem. No parecer sôbre as contas de 1965. o Ministro Wagner Estelita Campos expende importantes considerações evidenciadoras da insatisfação do Tri­bunal de Contas com o quadro vigente e dá grande ênfase ao que denomina de contrôle substancial; mas não logrou libe­rar-se do tradicionalismo do regime de registro prévio (Diário Oficial, Suplemento ao n.o 96, de 23 de maio de 1966). A Comis­são de Fiscalização Financeira e de Tomada de Contas da Câ­mara dos Deputados também manifestou sua insatisfação com a situação vigente, conforme pronunciamentos do Deputado Hamilton Prado. Preocupada com a situação, aquela Comissão, além de sugerir o estudo e proposição. pelo Executivo, de legisla­.ção apropriada. inclinava-se em contratar auditores, propósito êste que, àbviamente, melhor seria atendido se o Tribunal de Contas - que é o órgão auxiliar do Congresso Nacional - para tanto se aparelhasse (Diário do Congresso Nacional, Suplemento B ao n.O 95, de 1.0 de julho de 1966).

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viço Público Federal, uma conotação negativa do contrô­le, traduzindo, de modo geral, concepções cerebrinas, pre­dominantemente jurídicas, afinadas com uma tradição que vinha das Ordenações do Reino, e cujo duplo sentido se resume em presumir que a maior parte dos administra­dores vai agir irregularmente e que é preciso vigiar os mais simples atos administrativos, sem distinguir entre os planos em que se exercem, sob pena de se fomentar a prática de irregularidades no Serviço Público.

Cumpria escoimar o contrôle dêsse sentido deforman­te. que as regras de bem administrar sem dúvida repelem e com o qual não se concilia. De fato, nenhum instrumen­to de contrôle moderno visa a frear o administrador na prática de gestão administrativa que lhe incumbe na­quela condição. O que o contrôle deseja é que o adminis­trador - agindo em têrmos de flexibilidade e a1!t·)nomia - se comporte em consonância com os lineamentos e as regras previamente traçadas para enquadrar sua condu­ta. Parte-se do pressuposto de que o administrador vai respeitar essas normas e, por isso mesmo, dá-se-Ihe au­tonomia bastante para praticar os atos de gestão com a rapidez indispensável para garantir-lhe a eficiência de ação e, pur conseguinte, estimular o dinamismo dos ser­viços que dirige; mas verificar-se-á, rigorosamente, se as regras do jôgo previamente traçadas foram respeitadas.

Já a Ministra Dulce Magalhães, do Tribunal de Contas do Estado da Guanabara, no relatório das contas do exercício de 1965, dedicou um capítulo especial ao assunto. institulado "6. A Reforma dos órgãos de contrôle e de contabilidade pública deve ser radical", afirmando textualmente: "As causas profun­das dos males apontados nos itens anteriores residem, a meu ver, na completa desatualização da legislação de contabilidade pública. bem como das atribuições, organização e métodos de trabalho do Tribunal de Contas. Assim, não me parece solução clamar-se contra o esvaziamento do Tribunal de Contas. ao mesmo tempo em que se insiste em aumentar suas atribuições. sem oferecer-lhe as condições para a eficácia do contrôle. A solução estará em reduzir-lhe as atribuições ao mínimo indis­pensável ao exercício efetivo do contrôle onde quer que haja responsáveis por bens e dinheiros públicos, sem criar óbices à Administração, mas sem deixar, por outro lado, de exigir-lhe o fiel e integral cumprimento dos programas decorrentes da execução do orçamento." São três depoimentos autorizados. em áreas estranhas ao Poder Executivo, a demonstrar que havia, de fato, muito que alterar.

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definindo-se, por êsse modo, as responsabilidades de cada um. Em outras palavras, não se empece a atuação do ad­ministrador, mas se verifica se sua ação administrativa se exercitou em condições compatíveis com as regras de conduta previamente aprovadas.

Visando a retirar. o debate da questão do terreno circunscrito a que nos acostumáramos, restringindo-o, pràticamente, à falaciosa opção entre contrôle a priori e contrôle a posteriori, como se a isso se reduzisse o com­plexo e relevante problema, decidiu-se, afinal, lançar ao debate uma nova formulação que, alargando os horizon­tes e aprofundando o sentido finalista, viesse a conduzir a construções úteis e operativas. Ao fazê-lo, o Ministro do Planejamento postulou por que se distinguissem quatro tipos principais de contrôle, a saber:

"1.0 - o acompanhamento e verificação da exe­cução do Plano e do Orçamento-Programa. ou seja, o contrôle programático;

2.0 - o acompanhamento e a verificação da regula­ridade das despesas efetuadas, ou seja. o contrôle financeiro;

3.0 - o acompanhamento e a verificação da obser­vância das normas administrativas em geral, ou seja, o contrôle administrativo;

4.0 - .a verificação dos resultados alcançados ou que deixaram de o ser pelo administrador, ou seja, o contrôle de resultados" . .;1

Destacou-se, naquela oportunidade, que o contrôle de resultados, considerado o mais importante por resu­mir o objetivo primordial do contrôle, vinha sendo exa­tamente aquele a que se teimava em não dar relêvo. No entanto, a finalidade última de todo contrôle exercido na Administração Federal deve consistir na verificação dos resultados, medindo-se a eficiência do administrador e da organização que dirige, com o sentido de saber se pres­taram, efetivamente, os serviços que a coletividade aguar­da e para cuja manutenção contribuiu através do pa­gamento de impostos. E quando resultados satisfatórios não hajam sido alcançados. impõe-se identificar as razões

" Conferência pronunciada em 11 de dezembro de 1966, no Tribunal de Contas de São Paulo.

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que a isso conduziram e procurar os meios de que se· po­derá lançar mão para sua pronta correção. Afirmava-se, então, taxativamente:

"É nisso que se resume a tarefa de supervisão que cabe aos dirigentes do Serviço Público exercer: o Presidente da República, em relação aos seus Minis­tros; os Ministros de Estado, em relação aos seus Departamentos; e cada Departamento em relação aos seus setores de trabalho. Essa lição fundamental tem sido relegada a segundo plano entre nós. E, no entanto, nada mais frustrante para um govêrno que trabalha na base moderna de planos e programas do que sentir o quanto é tênue ainda a preocupação pelos resultados e o quanto de obstáculos viciosos ainda se deparam no caminho do administrador que se empenha em apresentar bons resultados." tl~ O sentido racionalizador felizmente prosperou, do

mesmo modo que se consolidou a necessidade de se cuidar da disciplina do contrôle interno da Administração Fe­deral - através da organização da contabilidade e da instituição do regime de auditoria - como condição in­dispensável a que o Poder Executivo tomasse as rédeas da realização dos programas e da aplicação dos dinheiros públicos, ensejando a eficácia do contrôle externo, de competência do Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas. Alcançava-se, finalmente, um dos ;lrimeiros objetivos delineados para a Reforma Adminis­trativa, dando-se, nesse particular, atualidade à regras constitucionais. 1\:,

'2 Idem. ~; A Constituição estabelece que "a fiscalização financeira e

orçamentária da União será exercida pelo Congresso Nacional, através de contrôle externo e dos sistemas de contrôle interno do Poder Executivo, instituídos por lei" (Art. 71) . Esclarece que o "contrôle externo", exercido pelo Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas, "compreenderá a apreciação das contas do Presidente da República, o desempenho das funções de auditoria financeira e orçamentária, e o julgamento das contas dos administradores e demais responsáveis por bens e valôres públicos" (Art. 71, § 1.0).

Determina que o "Poder Executivo manterá sistema de con­trôle interno, visando a: I - criar condições indispensáveis para eficácia do contrôle externo e para assegurar regularidade à

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A colocação exata do problema do contrôle teve, por igual, a virtude de trazer à tona o imenso atraso na or­ganização da contabilidade no Serviço Público Federal e exibiu, em tôda a sua nudez, a inexistência de serviços de auditoria.

Num complexo organizacional do imenso porte da Administração Federal não se poderá, decisivamente, falar sequer em gestão eficiente, em têrmos gerenciais atualizados, se não se dispõe de contabilidade adequada e se não se realizam auditagens. Somente o desinterêsse - e muitas vêzes o desconhecimento - pelos administra­dores brasileiros do sentido e da finalidade dêsse instru­mental, seu arraigado hábito de praticar ato por ato, autorizar despesa por despesa, despachar processo por processo, e o seu refúgio tradicional no contrôle aparen­te a cargo do Tribunal de Contas - também desarmado, como se sabe, para atender àquele encargo - possam talvez explicar a persistência e o conformismo com essa gravíssima lacuna.

A criação de Departamento de Administração nos Ministérios, inspirada na dicotomia Administração Geral e Administração Específica, de muito contribuiu para ali­mentar a ilusão de se estar resolvendo o problema do con­trôle, pois que a cada uma de suas Divisões caberia fisca­lizar a área sob sua jurisdição. Mas, o que, em verdade, ocorreu é que passaram a coexistir as Contadorias Sec­cionais - subordinadas técnica e administrativamente ao Ministério da Fazenda - e os Departamentos de Admi­nistração, subordinados aos Ministérios, sem que se pre­cisasse a tarefa de cada um no processo geral de contrôle. E, como àqueles Departamentos e às suas Divisões se atri­buiu a movimentação de recursos financeiros, e nêles se concentrasse a competência para autorizar pagamentos, simplesmente deixou de ser exercido qualquer contrôle quanto à boa aplicação dos dinheiros públicos, já que êste se resumia na verificação de compreender-se a despesa nos saldos das verbas ou no exame, sempre tardio, distan­te e meramente formal, de volumosos processos repletos

realização da receita e da despesa; II - acompanhar a execução de programas de trabalho e do orçamento; lI! - avaliar os resultados alcançados pelos administradores e verificar a execu­ção dos contratos" (Art. 72) .

66 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

de documentos de despesa. Com a gradativa ampliação da área de despesas sujeitas a registro a posteriori do Tribu­nal de Contas, a própria formalidade da aprovação buro­crática das contas dos responsáveis foi esmaecendo de importância. As Divisões de Pessoal, que autorizam paga­mentos substanciais por conta da rubrica pessoal, jamais foram inspecionadas ou tiveram seus registros auditados para verificação do acêrto de seus procedimentos. 64 De­mais, tomavam-se as contas dos que pagavam as despesas - os tesoureiros - mas não dos que as autorizavam -os ordenadores de despesa - numa inversão flagrante da noção de responsabilidade pela prática de atos admi­nistrativos, que sàmente a Reforma viria retificar.

Os órgãos oficiais de contabilidade, as Contadorias Seccionais, jamais entregaram balancetes aos Ministérios, remetsndo-os diretamente ao Ministério da Fazenda. Se o fizessem, estariam incompletos, pois que apenas com­preenderiam as despesas por elas diretamente contabili­zadas. As despesas dos Ministérios efetuadas através das Delegacias do Tesouro, nos Estados. são contabilizadas pe­las Contadorias Seccionais que junto a estas funcionam, as quais enviam seus balancetes diretamente à Contado­ria Geral da República.

Como se vê, os sistemas são estanques, o paralelismo, abundante, e os contrôles, realmente precaríssimos. A contabilidade não atende à sua finalidade precípua de faci'itar e propiciar a ação controladora dos adminis­tradores.

Daí a necessidade e a importância - para não refe­rir a inadiabilidade - de se pensar seriamente no con­trôle interno, sem o qual o Poder Executivo, como um to­do, e os administradores. nos diversos escalões, não terão condições de assegurar que a aplicação dos dinheiros pú­blicos está sendo feita corretamente. E sem contrôle in­terno organizado - à base, evidentemente, da contabili­dade e da auditoria - não há possibilidade de se exercer contrôle externo competente.

'" Um dos contrôles mais rigidamente exercidos em outros países em que se adota o Sistema do Mérito consiste em blo­quear o pagamento de quem não satisfaça as regras estabele­cidas. Na Administração Federal brasileira jamais se logrou en­contrar mecanismo eficiente para êsse tipo de contrôle, real­mente operante.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 67

A Reforma Administrativa não visou, em momento algum, à extinção do Tribunal de Contas. Sua preocupa­ção consistia em eliminar as ilusões de tantos anos e par­tir da constatação da inexistência de um sistema aceitá­vel de contrôle na Administração Federal; reconhecida essa realidade, estabelecer um sistema racional abran­gendo, articuladamente, os contrôles externo e interno­que nada têm de antagônicos, antes se completam -, criando, assim, condições propícias para que se efetivem os procedimentos de descentralização administrativa.

Em outras palavras, a Reforma Administrativa, ao procurar criar as bases de um eficaz sistema de contrôle, sentiu a necessidade e a conveniência de bem caracteri­zar as áreas externa e interna, de modo a reconhecer-se que, tanto quanto a primeira - e até mais do que ela - a última estava a exigir imediata reformulação.

Organização/Coordenação

o sentido de organização mais consentâneo com o pensamento da Reforma Administrativa é o de um agre­gado de pessoas trabalhando harmoniosa e coordenada­mente para a realização de objetivos previamente delinea­dos. 65

Assim o entendendo, a Reforma Administrativa teria de dar importância secundária aos problemas meramen­te estruturais, embora não minimizasse sua essencialida­de. Mesmo porque se preocupou com a parte instrumen­tal, com o funcionamento da administração, fixando, no que concerne à estrutura, tão-somente a composição do mais alto escalão, compreendendo os Ministérios e os ór­gãos de imediato apoio aos Ministros de Estado, ou seja. os de planejamento, coordenação e contrôle.

55 Cf. GAUS: "Organização é o arranjo de pessoas para facilitar a realização de algum propósito assentado através da alocação de funções e responsabilidade. É a conjugação de esfor­ços e capacidade de indivíduos e grupos engajados nl'ma ta­refa comum de tal modo que se alcance o desejado objetivo com um mínimo de fricção e o máximo de satisfação para aquêles em proveito dos quais a tarefa é realizada e para aquêles engaiados no empreendimento." (GAUS, JOHN M., A Theory of Organization in Public Administration. The Frontiers of Public Administra­tion, 1940)

68 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Os aspectos estruturais de organização têm sentido mais estático, compõem verdadeiras fotografias, os ins­tantâneos da estrutura organizacional: os organogramas. Embora - insistimos - sejam dotados de relevância, por emprestarem organicidade à Administração Federal e constituírem, sob certos aspectos, mecanismos de contrô­le, de definição hierárquica, não se constituem na princi­pal preocupação da Reforma Administrativa. A esta inte­ressam, precipuamente, os aspectos dinâmicos, a adminis­tração como filme em movimento, a seqüência do seu funcionamento em busca de resultados.

Em matéria de organização tudo tem sua relevância. Estrutura, liderança, pessoal, material, finanças, comu­nicação, tudo isso é importante. Mas o que faz funcionar a contento qualquer organização é o êxito da coordenação e consiste, essencialmente, em coordenação de pessoal, e não de estruturas. Não resta dúvida de que a estrutura já contém em si o sentido de coordenação. O organogra­ma, de um lado, traduz uma fotografia da entidade. de sua forma estática, mas, de outro, corresponde a uma disposição metódica, exata, de suas partes, visando à dis­ciplina coordenada do funcionamento da entidade, atra­vés da definição de áreas de atuação, de atribuição de competências, etc. Cumpre, porém, que não nos deixemos iludir pela beleza e propriedade estrutural, organogra­mática, de qualquer entidade. Conforme ponderou, com felicidade, o professor ROSCOE MARTIN, precisamos estar atentos para as relações informais, e estas são um dos alimentos de que se nutre a função coordenadora. 1\6

ffi "Tais inter-relações têm por resultado o que se pode cha­mar, na falta de têrmo melhor, de organização informal. Na verdade, a palavra organização não cabe aqui porque os dois membros da expressão acima sublinhadas são mutuamente in­compatíveis. O que está em jôgo não é uma organização em nenhum de seus justos sentidos, mas, em vez disso, um com­plexo de relações pessoais e oficiais, de indivíduos e de grupos, diretos e incidentes, horizontais ou verticais, que determinam como a máquina formalmente descrita funcionará."

"Em segundo lugar, a organização informal afeta de modo interessante a hierarquia administrativa. Que dizer das ve­lhas fórmulas favoritas como o comando em cadeia, processo de escala, canais administrativos, autoridade e responsabilidade? É claro que há uma organização disfarçada, uma espécie de império invisível existente ao longo da escala hierárquica for-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 69

A importância da coordenação transparece em todo o trabalho da Reforma Administrativa, que reconhece tratar-se de uma das mais instantes necessidades da Ad­ministração Federal. 67 Não titubeamos mesmo em avan­çar que a grande, a imensa tarefa do administrador, em nossos dias, é a coordenação, que leva qualquer entidade a alcançar seus objetivos a tempo e a hora, com o mínimo de dificuldades e o máximo de rendimento dos esforços empregados pelo grupo.

PessoaZ

A Reforma Administrativa não olvidou que "é axio­mático que da qualidade do pessoal depende a dos serviços prestados por qualquer administração, pública ou priva­da".68 Mas constatou que a descontinuidade e a desaten­ção às mais comezinhas normas de Administração de Pes­soal configuraram um panorama desfigurado, dentro do qual se teriam de buscar os caminhos que, por fim, pos­sam conduzir à obtenção de uma política de pessoal real­mente indispensável. Inclinou-se, em resumo, pela se­guinte orientação:

mal, sendo, também, claro que uma sem a outra não faz a história completa. Tem-se dito com muita propriedade que a hierarquia é a forma anatômica, e as disposições e os entendi­mentos informais, a fisiologia da organização administrativa." (MARTIN, ROSCOE C., A Base Ecológica da Administração Pública)

6' Segundo WHlTE, "coordenação é o ajustamento das fun­ções das partes, entre si, e o movimento e operação das partes no momento apropriado, de modo que cada uma delas possa ofe­recer a máxima contribuição para o produto do conjunto" (WHlTE, LEONARD D., Introduction to the Study 01 Public Admi­nistration) .

Para MOONEY e RElLEY, "coordenação é o arranjo ordenado do esfôrço coletivo para assegurar unidade de ação na procura de um objetivo comum" (MOONEY, JAMES D. e REILEY, ALAN C., The Principles 01 Organization). E FAYOL conceitua: "Coorde­nar quer dizer relacionar, unir, harmonizar todos os atos e todos os esforços. É. em suma, dar às coisas e aos atos as proporções que convêm, adaptar os meios ao objetivo" (FAYOL, HENRI, Ad­ministration Industrielle et Générale).

68 Justificativa, item V, Título XI.

70 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1 . Fixar diretrizes que permitam reformular a Ad­ministração do Pessoal Civil, através da revisão da legislação básica e da reforma dos esquemas de classificação e de remuneraçao.

2. Sem prejuízo daquela reformulação, adotar pro­vidências imediatas que permitam encontrar solução para os problemas mais agudos.

3. Atribuir a um órgão dedicado exclusivamente aos problemas de pessoal, subordinado direta­mente ao Presidente da República, a responsa­bilidade pela formulação, orientação e coordena­ção da política de administração de pessoal.

4. Delinear a instituição de um corpo de assessora­mento imediato do Poder Executivo, recrutado e selecionado segundo padrões especiais e sujeito a permanente processo de aperfeiçoamento".

Há que reconhecer que a Administração Federal tem se colocado, no decorrer dos anos, numa posição de cres­cente perplexidade diante do problema de pessoal 69 con­dição a que não logrou escapar o Govêrno iniciado em 1964. 70 A Reforma Administrativa cria condições para que se comece a enfrentar, de modo ordenado e orgânico, tão relevante problema, embora, como se verá em outro trecho dêste trabalho, a Constituição, nesse particular, haja sido afetada por orientação conservadora. A Refor­ma procurou abrir os caminhos para solução do problema mais grave e complexo do Serviço Público Federal.

Três medidas ganham relêvo na Reforma Adminis­trativa, no que respeita ao problema de pessoal. Primeiro, a enunciação de normas permitindo a composição de um corpo de assessoramento da administração superior, por se reconhecer que a Administração Federal - exceção feita dos Ministérios Militares e das Relações Exteriores - está totalmente desguarnecida nesse setor chave. Se­gundo, a enunciação de algumas normas visando a esti-

'" o assunto será objeto de mais extenso exame do Capítu­lo 8.

10 Deve-se isso essencialmente às reiteradas omissões do DASP em habilitar-se para reenfocar o problema de pessoal diante de üm quadro administrativo totalmente diverso daquele a que se acostumara e rotinizara. O Govêrno deixou-se iludir com a miragem de recuperação do DASP, o que não logrou efetivar.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 71

mular a melhor composição dos cargos de chefia e dire­ção, com vistas a se começar a eliminar o vazio que se foi configurando, nesse particular, com a evolução da polí­tica de pessoal adotada em 1936 e orientada pelo DASP. Terceiro, a instituição de um Centro de Aperfeiçoamento para dedicar-se intensamente ao pessoal-chave.

2.7 ESQUEMA TIZAÇAO DA REFORMA

Condicionada pela moldura que acaba de ser deli­neada, a Reforma Administrativa assim esquematizou seus pontos principais no Decreto-lei n.o 200:

1. Princípios fundamentais Enumeração dos princípios fundamentais em que se inspiram os textos da Reforma (Título II).

2. Instrumentação básica Fixação do tripé (planejamento, orçamento-pro­grama e programação financeira de desembõlso) em que se sustenta a Reforma (Título IH).

3. órgãos Centrais Definição dos órgãos de apoio direto dos Minis­tros de Estado e institucionalização imediata dos de planejamento, coordenação e contrôle finan­ceiro (Título IV), essenciais à operacionalidade do tripé.

4. Assessoramento Superior da Administração Ci­vil. Fixação do roteiro para constituição do staff de assessoramento imediato dos Ministros de Estado, para composição dos órgãos Centrais (Título IV).

5. Contrôle Inscrição de regras fundamentais na Constitui­ção, no Decreto-lei n.o 200: Títulos IV e X) e no Decreto-lei n.o 199 ..

6. Normas administrativas básicas Estabelecimento de normas que permitam mo­dernizar as regras existentes e, assim, empres­tar dinamismo operacional à Administração Fe­deral, compreendendo:

72 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

a . Normas de Administração Financeira e de Contabilidade (Título X);

b. Normas Gerais referentes ao Pessoal Civil, consistindo em diretrizes para a revisão da legislação atual (Título XI, Capítulo I);

c. Normas relativas às licitações para Com­pras, Obras, Serviços e Alienações (Título XII).

7. Estruturação básica da Administração Federal As regras estão consubstanciadas, em essência, nos Títulos I, IV, V e VI.

8. Implementação da Reforma Explicitação do critério de que se faça por etapas e outras regras pertinentes constam do Título XIII.

Concluída esta apreciação geral, focalizaremos em seguida a matéria principal constante do Decreto-lei n.o 200.

3. PODER EXECUTIVO E ADMINISTRAÇÃO FEDERAL. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS. INSTRUMENTAÇÃO BÁSICA 71

3.1 PODER EXECUTIVO

A Lei de Reforma Administrativa reproduz, em seu primeiro artigo, o preceito constitucional de que "o Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxi­liado pelos Ministros de Estado" (Constituição, Art. 74). Isso poderia ser considerado uma super afetação ou uma repetição ociosa, mas, em verdade, não o é. Entendeu-se ser indispensável à compreensão de uma lei que se pro­põe a deflagrar uma reforma, de amplas proporções, e a ser implementada gradualmente, deixar bem nítido no contexto da lei de diretrizes para a ação reformista a du­pla posição do Poder Executivo:

1. como Poder Político-Administrativo, compondo a divisão tríplice de Podêres consagrada na Cons­tituição, ao lado do Poder Legislativo e do Poder Judiciário;

2. como Poder Administrativo, responsável pela gestão do Serviço Público Federal.

No primeiro caso, o Presidente da República, auxilia­do pelos Ministros de Estado, tem ampla participação no

71 Decreto-lei n.O 200, Títulos l, II e m.

74 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

processo legislativo. No segundo, o Presidente da Repú­blica, auxiliado pelos Ministros de Estado, é a principal autoridade administrativa do Serviço Público Federal. Poderíamos lembrar que, no caso da elaboração orçamen­tária, há clara manifestação das duas posições do Poder Executivo, participando do processo legislativo ao subme­ter a lei orçamentária ao Congresso Nacional e ao sancio­ná-la ou vetá-la, e, simultâneamente, dando expressão programática e financeira ao principal instrumento de ação do Poder Administrativo na sua missão de prestar serviços à coletividade.

Por isso mesmo, preocupou-se a Lei em enfatizar que o Presidente e os Ministros exercem as atribuições consti­tucionais, legais e regulamentares - fiéis à hierarquia jurídica consagrada - com o auxílio dos órgãos da Admi­nistração Federal (Art. 2.°). Faz-se. assim, a ligação das duas posições do Poder Executivo, dando-se realce ao fa­to de que, ao exercer suas atribuições de Poder Adminis­trativo, estará êle jungido aos preceitos de ordem consti­tucional, às normas fixadas em lei e às regras que, em conformidade com aquêles, estabelecerem os regulamen­tos. O regulamento, a seu turno, é o elo entre as leis e os outros atos, de natureza tipicamente administrativa, ex­pedidos pelos diversos escalões da hierarquia administra­tiva, segundo as peculiaridades de organização de cada setor e as condições particulares disciplinadoras de seu funcionamento.

S.2 ADMINISTRAÇAO FEDERAL

A Administração Federal se constitui, assim, dos ór­gãos que compõem o Serviço Público Federal, o mecanis­mo através do qual o Poder Executivo - na sua configu­ração de Poder Administrativo - dá cumprimento à mis­são que constitucionalmente lhe é atribuída. A Adminis­tração Federal é, em outras palavras, o Serviço Público Federal organizado e funcionando para prestar os servi­ços que incumbem ao Poder Executivo, na sua condição de Poder Administrativo, sob a direção superior do Pre­sidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado. Partindo dêsse conceito fundamental, a Lei traçou, em

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 75

têrmos bastante precisos, o delineamento da Administra­çãão Federal, dividindo-a em duas grandes categorias:

1 . Administração Direta; 2 . Administração Indireta.

3.3 ADMINISTRAÇAO DIRETA

A Administração Direta encampa os serviços integra­dos na estrutura administrativa da Presidência da Repú­blica e dos Ministérios. Compreende os órgãos diretamen­te subordinados às principais autoridades da Administra­ção Federal, o Presidente e os Ministros de Estado. É a Administração Centralizada, isto é, aquela que possui a personalidade jurídica de direito público inerente ao pró­prio Estado. É o Serviço Público Federal na sua forma mais ostensiva de presença do Poder Executivo. A Refor­ma Administrativa dirige-se, preponderantemente, à Ad­ministração Direta, exatamente por se constituir esta no aparelhamento de ação administrativa imediata do Poder Executivo, visando a assegurar-lhe condições de funciona­mento eficaz, modernizando-a. As normas e preceitos constantes da Reforma Administrativa devem ser enten­didas como endereçadas à Administração Direta, que deve obedecer a sistemas gerais de comportamento, presumida­mente dotados de suficiente flexibilidade para contem­plar as peculiaridades pertinentes a certos setores do con­junto administrativo. A êsse propósito, cumpre assinalar que, apesar de consubstanciar normas e procedimentos racionais, simplificadores e flexíveis para a Administra­ção Direta, a Lei se preocupou em destacar a necessidade de assegurar o máximo de maleabilidade possível a certos órgãos da Administração Direta que, embora não gozan­do - por fôrça dessa condição - de personalidade ju­rídica própria e de outros requisitos caracterizadores das entidades que não a integram, exigem tratamento diver­so do aplicável aos demais, sem prejuízo da supervisão ministerial que a todos alcança. A essa categoria especial de órgãos da Administração Direta a Lei emprestou a denominação genérica de "órgãos Autônomos", prescre­vendo que o Poder Executivo lhes assegure autonomia ad­ministrati-,a e financeira, no grau conveniente, e esclare-

76 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

cendo que abrangem "serviços, institutos e estabeleci­mentos incumbidos da supervisão ou execução de ativi­dades de pesquisa ou ensino, de caráter industrial" (Art. 172).

Trata-se de manifestação coerente com os intuitos da Reforma Administrativa decorrentes dos princípios que a inspiram. Sem fixar rígido critério para a manutenção ou exclusão de um órgão na Administração Direta, preo­cupou-se, entretanto, a Reforma em acentuar que os ser­viços possuidores das peculiaridades enunciadas devem ser objeto de tratamento especial, levando-se em conta na sua gestão as peculiaridades que os distinguem dos órgãos mais caracteristicamente administrativos. Exemplifique­mos: se um Museu - que é uma unidade administrativa de configuração peculiar - estiver classificado entre os órgãos integrantes da Administração Direta, há que con­siderar as condições típicas de seu funcionamento, distin­guindo-o de um Departamento de Administração (para citar um órgão de caráter eminentemente administra­tivo) .

3.4 ADMINISTRAÇAO INDIRETA

A Administração Indireta í:? compreende as entidades dotadas de personalidade jurídica própria, classificadas em três categorias:

1. Autarquias; 2. Emprêsas Públicas; 3 . Sociedades de Economia Mista.

72 A evolução do pensamento brasileiro em tôrno da Admi­nistração Descentralizada pode ser acompanhada através da literatura de Direito Administrativo, sobretudo dos trabalhos dos Professôres THEMÍSTOCLES BRANDÃO CAVALCANTI, BlLAC PINTO, SEABRA FAGUNDES, CARLOS MEDEIROS SILVA, CAIO TÁCITO, OSCAR SARAIVA e HELY MElRELLES, entre outros eminentes juristas. A Conferência proferida pelo Dr. OSCAR SARAIVA, então Consultor Jurídico do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, em 1942, sob o tema Organização da Administração Delegada, re­presenta interessante amostra das preocupações da época. O artigo do Professor ARNALDO WALD, As Sociedades de Economia Mista e as Emprêsas Públicas no Direito Comparado, fixa, em 1954, um admirável quadro sintético de interrogações e ten-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 77

Abrange as entidades que realizam atividades de in­terêsse do Estado debaixo do máximo grau possível de fle­xibilidade de gestão, característica do setor privado. Em outras palavras, cônscio de que sua participação ou inter­venção em determinadas áreas só poderá ter eficácia ad­ministrativa e operacional se amoldar-se aos critérios e métodos utilizados pelo setor privado, o Governo socorre­se da experiência da iniciativa privada em benefício do funcionamento das entidades sujeitas ao regime de admi­nistração descentralizada. Com isso, retira dos seus ór­gãos descentralizados qualquer escusa quando deixem de cumprir os programas cuja execução lhes foi confiada. Duas são, pelo menos, as conseqüências dessa política de horizontes largos:

1. confere-se às entidades da Administração Indire­ta tôdas as condições essenciais à eficiência e à flexibilidade de seu funcionamento;

2. obrigam-se os responsáveis pela Administração Federal - os representantes do Poder Executi­vo - a lançar mãos dos instrumentos básicos de administração para poderem exercer, realmente, a supervisão que lhes cabe, sem interferência ca­suística, episódica, aprogramática.

dências (Revista do Serviço Público, setembro de 1954) . O estudo de NATALIA GAIL, As Emprêsas Estatais na França, Itália e Polô­nia (Revista de Direito Administrativo, outubro-dezembro, 1962) indica o contínuo interêsse pela questão. Os trabalhos da Mesa Redonda realizada na Fundação Getúlio Vargas em 1963 sôbre o tema A Emprêsa Pública e de Economia Mista (Revista de Direito Público e Ciência Política, agôsto de 1964) evidencia o esfôrço dos juristas em encontrar respostas para indagações cada vez mais intensas. Idêntica preocupação conduziu à dis­cussão do tema Emprêsas Públicas no Direito Brasileiro na I Conferência Nacional de Administração Pública realizada, em 1963, sob os auspícios da Fundação Getúlio Vargas (Instituto Brasileiro de Ciências Administrativas, Boletim Informativo Trimestral, 3.0 Trimestre de 1963). O artigo Emprêsa Pública e Desenvolvimento Econômico, do Professor DIAS LEITE (Jornal do Brasil de 4 de outubro de 1964 - Caderno Especial), revela a preocupação dos economistas com a utilização da Emprêsa Pública na ação do Estado no campo industrial. E, finalmente, o livro Emprêsas Públicas - Textos selecionados, editado em 1964 pela Fundação Getúlio Vargas, dá uma visão panorâmica dos ângulos segundo os quais, em diversos países, se focaliza a matéria.

78 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA -----

As três categorias de entidades da Admini3tração Indireta apresentam alguns traços comuns:

1. personalidade jurídica própria. distinta, assim, da do Estado;

2. criação da entidade por lei; 3. patrimônio próprio.

A Autarquia possui personalidade jurídica de direito público. A Emprêsa Pública e a Sociedade de Economia Mista são dotadas de personalidade jurídica de direito privado. A Autarquia é instituída para executar ativi­dades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada. Trata-se da institucionaliza­ção de um processo de descentralização de atividades que são típicas da Administração Federal. Descentraliza-se institucionalmente determinado órgão do Serviço Público Federal para facilitar-lhe o cumprimento de determinado programa de trabalho. i3 A Emprêsa Pública é o veículo para a ação do Estado no desempenho de atividades de natureza empresarial que o Govêrno seja levado a exer­cer, por motivos de conveniência ou contingência admi­nistrativa. Seu capital pertence exclusivamente à União e a personalidade de direito privado de que é dotada per­mite ao Estado atuar em determinado setor como se fôra uma emprêsa de iniciativa particular. A Sociedade de Economia Mista visa a atender a atividade de natureza mercantil, sob a forma de sociedade anônima, perten­cendo as ações, em sua maioria, à União. Neste caso, vale-se o Estado do mecanismo das sociedades por ações para atuar em certas áreas de atividade com o delibera­do propósito de regular sua gestão segundo normas que são próprias da ação privada.

É sensível a preocupação da Reforma Administrativa em bem caracterizar as entidades da Administracão Indi­reta, imp:=:dindo, a todo preço, que se queira sujeitá-las às

73 É possível, no futuro, a redução do número de autarquias, de um lado pela sua reinclusão na Administração Direta caso esta venha a adquirir, por fôrça da Reforma Administrativa, condições de eficiente funcionamento; e, de outro, pela prefe­rência em transformá-las em uma das outras modalidades de entidade da Administração Indireta, de organização mais pró­xima dos critérios operacionais do setor privado.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 79

regras habituais e gerais do Serviço Público Federal, que se destinam à Administração Direta. 74 Assim é que, além de acentuar que aquelas entidades possuem personalida­de jurídica própria, deixa expresso que as Emprêsas Pú­blicas e as Sociedades de Economia Mista são "dotadas de personalidade jurídica de direito privado". Não satisfei­ta com isso, estabelece que as referidas entidades são "vinculadas" (Art. 4.°, § 1.0) - e não "subordinadas" -aos Ministérios; ao cuidar da supervisão ministerial, dei­xa claro que esta assegurará "a autonomia administra­tiva, operacional e financeira da entidade" (Art. 26, item IV); e para tornar mais explícito o pensamento descen­tralizador e o manifesto propósito de propiciar às Emprê­sas Públicas e às Sociedades de Economia Mista condi­ções de funcionamento e de operação idênticas às do setor privado, a Lei declara: "Assegurar-se-á às emprêsas pú­blicas e às sociedades de economia mista condicões de funcionamento idênticas às do setor privado, cabendo a essas entidades, sob a supervisão ministerial, ajustar-se ao plano geral do Govêrno" (Art. 27, Parágrafo único).

Realmente, a descentralização administrativa opera­da através das entidades da Administração Indireta não importa em desligá-las da supervisão ministerial, cujo ob­jetivo precípuo consiste em verificar se o programa go­vernamental está sendo cumprido, se a gestão da entida­de se vem fazendo com proveito e, se não o vem. buscar meios de correção. Mas é preciso considerar que as enti­dades da Administração Indireta possuem, segundo a le­gislação que lhes é pertinente, seus órgãos de direção e de fiscalização, cuja autoridade deve ser prestigiada. A su­pervisão ministerial se exerce, assim, através daqueles ór­gãos, sem prejuízo de o Ministro, através dos órgãos Cen-

74 Os vícios e hábitos administrativos podem, irrefletida­mente, querer arrastar as entidades da Administração Indireta para ° casuísmo de orientação a que se acostumou a Administra­ção Federal. Cumpre opor tenaz reação a essa tendência que viria invalidar os propósitos da Reforma Administrativa de fa­vorecer a plena realização dos objetivos dessas entidades e dar margem a que realizem suas experiências de administração, de modo a se poder, adiante, colhêr os frutos das diversas experiên­cias. O contrôle dessas entidades deve visar, mais do que em qualquer outro caso, à verificação dos resultados alcançados no cumprimento de suas finalidades.

80 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

trais de seu Ministério, acompanhar a execução progra­mática e financeira das entidades descentralizadas.

Outro ponto importante a ressaltar é que a Reforma Administrativa conduz à Administração Indireta, no que concerne à administração de pessoal, para o regime da Consolidação das Leis do Trabalho. Êsse regime é manda­tório para as Emprêsas Públicas e para as Sociedades de Economia Mista, podendo também ser aplicado às pró­prias Autarquias (Art. 182). É mais um aspecto a aditar aos que enfatizam a necessidade de se tratar as entidades de Administração Indireta segundo as regras prevalecen­tes no setor privado, isolando-as definitivamente da legis­lação geral que disciplina os órgãos integrantes da Admi­nistração Direta.

Quanto às Fundações instituídas pela União, nota-se que a Lei de Reforma Administrativa evitou classificá-las entre as categorias da Administração Indireta, a fim de resguardar, ao máximo, sua condição de entidade priva­da, bàsicamente relacionada ao Código Civil. Levando em conta, porém, a necessidade que também aí se ,apresenta­va de estender a supervisão ministerial às Fundações, bus­cou a Lei, entre as categorias da Administração Indireta, aquela que mais facilitasse respeitar-se aquela condição, de modo que a supervisão ministerial pudesse ter caráter eminentemente programático. Daí o dispositivo segundo o qual "equiparam-se às Emprêsas Públicas, para os efei­tos desta Lei, as Fundações instituídas em virtude de lei federal e de cujos recursos participe a União quaisquer que sejam suas finalidades" (Art. 4.0, § 2.°).

Dêsse modo:

1 . fundações instituídas por lei federal não com­põem, propriamente, a Administração Indire­ta, mas equiparam-se às Emprêsas Públicas para os efeitos da Lei de Reforma Administra­tiva, o que importa dizer estão sujeitas "à su­pervisão ministerial", como definido na Lei;

2. em conseqüência, as Fundações - mais ainda do que ocorre com as Emprêsas Públicas - de­vem ter asseguradas "condições de funciona­mento idêntico às do setor privado";

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3 . cada Fundação rege-se pela sua lei específica e está, como as demais, sujeita à supervisão ministerial;

4 . no que tange ao pessoal, as Fundações regem­se pela Legislação Trabalhista e subordinam­se à Política Salarial abrangedora de todo o se­tor privado e orientada pelo Conselho de Polí­tica Salarial. A legislação relativa aos funcio­nários civis não se aplica nem é extensiva ao pessoal das Fundações.

3.5 PRINCíPIOS FUNDAMENTAIS

A inclusão de princípios no texto da Lei de Reforma Administrativa foi um dos pontos mais controvertidos no decorrer de seus estudos. Quatro posições, pelo menos, fo­ram defendidas:

1. não incluir uma lista de princípios na Lei, dei­xando-se o assunto para ser tratado na Justifi­cativa do Projeto;

2. incluir uma lista de princípios de forma bem sintética;

3. fazer uma lei somente de princípios, para ori­entação das sucessivas etapas da Reforma;

4. incluir na Lei não somente os princípios mas também os instrumentos básicos e outros tópi­cos, de modo a cobrir, de pronto, tôda a área de reforma, sem prejuízo da implantação gra­dual desta.

O primeiro ponto de vista não prevaleceu, por se en­tender que se a lei visava, precipuamente, a estabelecer as diretrizes e bases do processo de uma reforma admi­nistrativa a ser implementada no tempo, cumpria tornar bem claro, no próprio texto legal, o pensamento orienta­dor da reforma. O segundo ponto de vista também não prosperou porque se considerou insuficiente aos objetivos colimados uma enumeração sintética. O terceiro ponto de vista não foi acolhido por se haver entendido que uma lei que se contentasse em traçar diretrizes poderia ser inter­pretada como procrastinadora do movimento de reforma

82 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

e, além disso, deixaria à margem a parte instrumental a que o Govêrno vinha emprestando tanta relevância e para a qual a opinião pública estava sendo preparada. O quar­to ponto de vista logrou conciliar as tendências manifes­tadas, daí resultando a inclusão na Lei, logo em seguida à caracterização da Administração Federal e sua posição perante o Poder Executivo, de um Título consagrado, ex­clusivamente, aos Princípios Fundamentais.

Tal orientação parece, de fato, a mais conveniente nas circunstâncias, sobretudo se considerarmos que é m'üto preferível, à increpação de omissão, enfrentar even­tuais críticas de que a enumeração dos princípios nada mais significa do que a reprodução daquilo que é pacífico nos compêndios, nos relatórios, e está mesmo no consenso geral. Convém não olvidar que há tal ausência de consoli­dação de pontos de vista em relação à organização e ao funcionamento do Serviço Público Federal, pelos motivos que tentamos anteriormente apontar, que somente vanta­gens poderão advir da identificação na Lei de Reforma Administrativa dos conceitos básicos que sustentam o pensamento reformador.

Cinco são os princípios enumerados: 1. Planejamento; 2. Coordenação; 3. Descentralização; 4. Delegação de competência; 5. Contrôle. O princípio do Planejamento, embora sucintamente

exposto (Art. 7.°), traduz com grande precisão o sentido de que a ação governamental obedeça a planejamento que vise a promover o desenvolvimento econômico-social do País e a segurança nacional, contando como instrumen­tos básicos o plano geral de govêrno, os programas gerais, setoriais e regionais, de duração plurianual, o orçamen­to-prograrria anual e a programação financeira de desem­bôlso. Acolhe, por essa forma, o sentido integrado que se vinha procurando emprestar, desde a gestão iniciada em abril de 1964, ao importante problema. Insiste-se na ne­cessidade de correlacionar os programas gerais ao realis­mo da programação de caixa, deixando-se para as recor­dações do passado os métodos que consideravam todos

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 83

aquêles instrumentos compartimentados, sem atender pa­ra as inter-relações que os unem.

A coordenação mereceu também tratamento desta­cado, apontando-se a necessidade de considerá-la desde o nível presidencial até as chefias de menor nível. Convém mencionar que uma das regras inscritas na lei como que está a marcar a necessidade de se pôr côbro, em defini­tivo, ao tão enraizado hábito da burocracia brasileira de submeter à autoridade superior - e isso ocorre em todos os níveis - determinado assunto sem que, previamente, se haja estabelecido a indispensável coordenação entre os setores de trabalho interessados, direta ou indiretamen­te. No § 3.0 do Art. 8.0 da lei se diz que "quando subme­tidos aos Presidente da República, os assuntos deverão ter sido preVIamente coordenados com todos os setores nêles interessados, inclusive no que respeita aos aspectos admi­nistrativos pertinentes, através de consultas e entendi­mentos, de modo a sempre compreenderem soluções inte­gradas e que se harmonizem com a política geral e seto­rial do Govêrno. Idêntico procedimento será adotado nos demais níveis da Administração Federal, antes da sub­missão dos assuntos à decisão da autoridade compe­tente" .• ~

A descentralização recebeu grande ênfase, traduzin­do a orientação geral da Reforma no sentido de presti­giar a ação dos órgãos da periferia, facilitar seu funcio­namento e repor a estrutura central de direção superior no plano que lhe cabe, liberando-a da massa de papéis impeditiva de sua atividade de cúpula. A entrega da exe­cução de serviços ao setor privado, embora plenamente justificada, encontrará na prática problemas de difícil solucão devido à existência de mão-de-obra ociosa em quantidade avultada e à impossibilidade, diante da rigi­dez do regime jurídico do funcionalismo civil, de aprovei­tar o pessoal que trabalha em órgãos que se tornariam desnecessários com a intensificação do sistema de contra-

75 Deliberou o Govêrno dar ênfase a êsse aspecto na Re­forma, preocupado em ver continuados seus esforços no sentido de desentulhar a Presidência da República (e as direções e che­fias dos outros níveis) de papéis e documentos que sobem à consideração dos dirigentes sem estarem completos, conduzindo à pletora de despachos de encaminhamento perfeitamente evi­táveis.

84 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

tação de serviços. O assunto será abordado em outro trecho, 76 mas pode-se desde logo talvez dizer que o prin­cípio é salutar como diretriz para o futuro, embora de praticabilidade bastante limitada no presente, pelos mo­tivos apontados.

A delegação de competência também foi assinalada, pois ter-se-á de recorrer a êsse princípio no processo de descentralização administrativa, contornando a rigidez da legislação existente.

O contrôle é a contrapartida indispensável em uma política de descentralização administrativa, além de cons­tituir-se em condição fundamental para o êxito de qual­quer administração. A própria Lei de Reforma Adminis­trativa está enriquecida de dispositivos destinados a asse­gurar a instituição de verdadeiro contrôle na Adminis­tração Federal, comprovado como ficou serem totalmen­te insatisfatórios os existentes.

3.6 INSTRUMENT AÇAO BASICA

A Lei de Reforma Administrativa consagra o tripé em que se apóia a modernização do Serviço Público Fe­deral, dedicando um Título - o Título UI - especifica­mente ao instrumental básico para a nova maneira de atuar da Administração Federal.

A ação administrativa do Poder Executivo - diz a lei - obedecerá a programas gerais, setoriais e regio­nais de duração plurianual, elaborados através dos órgãos de planejamento, sob a orientação e coordenação supe­riores do Presidente da República (Art. 15). Consoli­da-se por êsse modo o planejamento como a tônica da ação administrativa, sob a responsabilidade direta do Presidente da República. Torna-se claro que cada Minis­tro de Estado orientará e dirigirá a elaboração do pro­grama setorial correspondente ao seu Ministério, mas atribui-se ao Ministro do Planejamento e Coordenação Geral o encargo de auxiliar, diretamente, o Presidente da República na coordenação, revisão e consolidação dos programas setoriais e regionais, e na elaboração da pro-

.. Capítulo 8.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 85

gramação geral do Govêrno. Fica, portanto, definido o mecanismo mediante o qual será possível tratar do plane­j amen to governamental:

1. o Presidente da República deve orientar a ação administrativa do Poder Executivo consoante o planejamento do Govêrno;

2. cada Ministro de Estado é responsável pelo pla­nejamento - setorial ou regional - correspon­dente à atividade de seu Ministério;

3. o Ministro do Planejamento e Coordenação Ge­ral auxilia o Presidente da República na elabo­ração da programação geral do Govêrno e na coordenação dos programas setoriais e regionais, que devem ser compatíveis com as linhas gerais, do programa do Govêrno.

A aprovação dos planos e programas gerais, seto­riais e regionais compete ao Presidente da República.

Observa-se o princípio constitucional de que o Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxi­liado pelos Ministros de Estado, articulando-se tôdas as peças de forma a reforçar a autoridade de cada Ministro de Estado no que respeita ao programa setorial ou re­gional pelo qual é responsável e, paralelamente, harmo­nizando-se todos os programas com o plano geral do Govêrno, através da ação coordenadora do Ministro do Planejamento.

Como se vê, ao Presidente da República, na quali­dade de Chefe do Poder Executivo, cabe a responsabi­lidade pelo planejamento, tendo a auxiliá-lo, em relação a cada setor da Administração, o Ministro de Estado competente, e, na coordenação geral, buscando a compa­tibilização dos vários planos setoriais e regionais, o Mi­nistro do Planejamento.

Não se caracteriza, portanto, o Ministério do Plane­jamento como um Superministério, receio que por vêzes é manifestado e parece resultar, preponderantemente, de observação baseada em concepções predominantemente estruturais do Serviço Público Federal. Colocado o pro­blema sob o enfoque instrumental - como o fêz a Re­forma Administrativa, baseada no tripé a que nos vimos referindo, e repousando, organizacionalmente, nos órgãos

86 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

de planejamento criados em todos os Ministérios cremos estarem afastados aquêles receios, tanto mais quanto, no nível dos representantes do Poder Executivo -.isto é, na cúpula da Administração Federal - o pro­blema passa a envolver delicadas e complexas operações de coordenação, esta sim da essência do mecanismo adotado.

Convém lembrar que a tarefa de coordenação não se esgota na ação do Ministério do Planejamento. Um Mi­nistro incumbido de planejamento regional - como é o caso do Ministro do Interior - terá, evidentemente, de coordenar os programas de cada região, nos seus desdo­bramentos setoriais, com o Ministro setorial competente. E Ministros que tenham a seu cargo programas setoriais - como é o caso do Ministro do Trabalho e Previdência Social - não poderão deixar de coordenar seus programas de assistência médica, por exemplo, com o programa se­torial afeto ao Ministro da Saúde, especialmente em se considerando que a êste cabe a formulação da política na­donal de saúde. São alguns aspectos a confirmar a enor­me importância que a coordenação representa nas con­cepções da Reforma Administrativa.

Recorde-se que a alternativa à institucionalização do Ministério do Planejamento e Coordenação Geral consis­tia no estabelecimento de uma Comissão de Planejamen­to, integrada pelo Presidente e pelos Ministros, apoiada em uma Secretaria-Geral. Essa solução já foi adotada en­tre nós, em 1965, pelo Presidente Kubitschek, ao criar-se o Conselho de Desenvolvimento. Foi seguida de várias al­ternativas, inclusive com a nomeação de Ministros Extra­ordinários, como aconteceu com o Ministro Celso Furtado e, mais recentemente, com o Ministro Roberto Campos. Julgamos ter ficado suficientemente demonstrado que o responsável pela missão de auxiliar o Presidente da Repú­blica nos assuntos de planejamento precisa ter o status de Ministro de Estado, para poder entender-se no mesmo pla­no de igualdade com seus colegas de Ministério. Daí o con­cluir-se que a solução Secretaria-Geral de uma Comissão de Planejamento não parece eficaz. Eficazes serão, pois, as soluções que busquem atribuir a referida missão a um Ministro Extraordinário, como aconteceu anterior­mente, ou a um Ministro permanente, institucionalizan-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 87

do-se o Ministério do Planejamento, conforme se inclina­ram, desde o início, os estudos da Reforma Administrati­va que conduziram à promulgação do Decreto-lei n.o 200.

Quanto ao orçamento-programa, determina-se seja elaborado, em cada ano, a fim de pormenorizar a etapa do programa plurianual a ser realizada no exercício se­guinte e que servirá de roteiro à execução coordenada do programa anual (Art. 16). A Reforma Administrativa dá, também aqui, sua consagração ao instrumento enunciado na Lei n.o 4.320, de 17 de março de 1964, e adotado com sentido experimental pelo Govêrno Federal nos últimos anos.

A programação financeira de desembôlso - peça im­portantíssima, mas apesar disso, sempre tratada em pla­no secundário no Serviço Público - foi também consoli­dada pela Reforma Administrativa, para ajustar o ritmo de execução do orçamento-programa ao fluxo provável de recursos. Sua elaboração foi confiada, conjuntamente, ao Ministério da Fazenda e do Planejamento e Coordena­ção Geral " e seu objetivo, tal como o exprime a Lei, con­siste em "assegurar a liberdade automática e oportuna dos recursos necessários à execução dos programas anuais de trabalho" (Art. 17).

Reveste-se de importância a recomendação legal no sentido de que tôda atividade deverá ajustar-se à progra­mação governamental e ao orçamento-programa e os compromissos financeiros só poderão ser assumidos em consonância com a programação financeira de desem­bôlso (Art. 18). Na verdade, sàmente quando isso acon­tecer normalmente, quando êsses procedimentos se cons­tituírem em rotina administrativa, é que se poderá afir­mar, convictamente, que a instrumentação básica conso-

" Entendemos que a função é, precipuamente, do Ministé­rio da Fazenda, pois a programação financeira de desembôlso, no seu conjunto, deve traduzir-se no desdobramento dos mon­tantes globais de dispêndio, admitidos pelo Ministro da Fazenda para determinado período, em quotas atribuíveis a cada Mi­nistério. Tais quotas devem corresponder, em cada Ministério, a uma programação setorial que se harmonize com as prioridades assentadas pelo Govêrno, sob a responsabilidade do Ministro Setorial. O Ministério do Planejamento estará presente nas duas fases, mas não nos parece que a liderança nesses casos lhe caiba.

88 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

lidada na Reforma Administrativa está produzindo os efeitos para o~ quais foi concebida.

Convém assinalar, finalmente, que a instrumentação básica consolidada na Reforma Administrativa deixou de ter caráter teórico ou optativo, diante dos preceitos que a Constituição de 1967 passou a consagrar. Os orçamen­tos plurianuais, que só podem resultar de uma programa­ção geral do Govêrno, são hoje um imperativo constitu­cional. Ainda segundo a Constituição, o orçamento anual está intimamente articulado com o plurianual, do qual é uma etapa. E a programação financeira de desembôlso tornou-se impositiva, em face das normas constitucionais que não mais permitem a realização de despesas sem cré­dito e emprestam ao orçamento critérios de equilíbrio financeiro indubitável.

Abre-se para o Serviço Público Federal, por via ins­trumental, uma ampla perspectiva de modernização de concepções e de métodos de ação, como jamais ocorreu no passado.

4. SUPERVISÃO MINISTERIAL. ÓRGÃOS CENTRAIS78

4.1 POSIÇAO DOS MINISTROS

A Reforma Administrativa reforça a autoridade dos Ministros de Estado quando determina que todo e qual­quer órgão da Administração Federal está sujeito à su­pervisão de um Ministro. Trata-se de regra destinada a melhor atender ao preceito constitucional segundo o qual o Poder Executivo é exercido pelo Presidente da Repú­blica, auxiliado pelos Ministros de Estado. Deixam de su­jeitar-se a essa regra geral unicamente os órgãos que a Lei expressamente relaciona como de supervisão direta do Presidente da República, em número de oito, compondo a Presidência da República. 79

Inicia-se, por essa forma, a aplicação do princípio da descentralização, operando-se substancial desconcentra­ção de órgãos até então subordinados à Presidência da República. As recomendações de tantos anos, formuladas nos sucessivos estudos de reorganização do Serviço Pú­blico Federal, conseguiram enfim ser adotadas e encon­traram o ambiente preparado para sua aceitação, mercê da orientação que vinha sendo seguida, a partir de 1964, pelo Presidente da República. Realmente, sem clara uni­dade de comando na área do Poder Executivo, sem o exer-

,. Decreto-lei n.o 200, Título IV. 70 Decreto-lei n.o 200, Título VI.

90 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

cício de efetiva coordenação pelo Presidente da Repúbli­ca e sem a preocupação de fixar políticas, de prestigiar a observância do programa do Govêrno e de fazer do orça­mento um instrumento efetivo do trabalho governamen­tal, não se teria preparado o terreno para a tão necessá­ria definição inscrita na Reforma Administrativa.

A Reforma pôs têrmo a uma tendência centralizadora que se acentuara ao longo dos anos, enfraquecendo a au­toridade dos Ministros de Estado, alargando desmesura­damente a área da Presidência da República e dificul­tando o efetivo desempenho da função coordenadora tão fundamental à eficácia e ao rendimento da atuação ad­ministrativa do Govêrno e à confiança que em sua ação deve depositar a coletividade.

Os Ministros de Estado são os responsáveis pela fiel aplicação da política do Govêrno em sua áreas, em har­monia com a orientação superior traçada pelo Presidente da República. Como representantes do Poder Executivo cabe-lhes, no regime presidencialista brasileiro, manter estreito contacto com as Comissões Técnicas do Poder Le­gislativo e com o Congresso Nacional. As informações, os dados técnicos e os esclarecimentos essenciais à formula­ção das diretrizes governamentais, inclusive, quando ne­cessário, para a elaboração de nova legislação, concen­tram-se nos Ministérios. O Ministro é o centro da ação político-administrativa do Poder Executivo. Nessa condi­ção, cumpre-lhe estar permanentemente preparado para atuar no plano superior, em relação ao Presidente da Re­pública e ao Poder Legislativo; horizontalmente, em rela­ção aos seus colegas de Ministério, para articulação e en­trosamento das respectivas atuações; e, para baixo, em relação aos órgãos sujeitos à sua jurisdição, fazendo valer sua autoridade administrativa. Deve o Ministro de Esta­do estar permanentemente preparado para cumprir sua missão - e essa é uma das principais preocupações da Reforma Administrativa - e não episodicamente, como infelizmente vinha funcionando a Administracão Federal. Pois, como já advertia EDMUND BURKE, em 1770, "as leis não alcançam senão caminho muito limitado. Qualquer que seja a constituição do govêrno, a parte imensuràvel­mente maior dêle dependerá do exercício de podêres que são largamente confiados à prudência e à correção dos

A REFORMA ADl'.UNISTRATIVA DE 1967 91

Ministros de Estado." ~u Cumpre, por último, recordar que cabe aos Ministros de Estado, em relação aos seus seto­res de atuação, manter a coletividade informada e escla­recida sôbre os assuntos governamentais, quer diretamen­te, quer através dos mecanismos instituídos para êsse fim específico. Numa Democracia, especialmente, essa atribui­ção dos Ministros de Estado adquire cada dia maior rele­vância e, para atendê-la, nas condições atuais de funcio­namento da sociedade e com a velocidade que os veículos de comunicação proporcionam, é preciso que a Adminis­tração Federal se encontre permanentemente organiza­da, pois ninguém hoje em dia se contenta com frases va­zias e de efeito, antes deseja e quer conhecer os fatos.

Como responsável perante o Presidente da República pelo's assuntos afetos ao seu Ministério, o Ministro de Es­tado exerce sôbre os órgãos e entidades que o integram uma supervisão que se acentua ter o sentido de orienta­ção, coordenação e contrôle. Tais órgãos e entidades. con­vém notar, subordinam-se ou vinculam-se ao Minis­tério, conforme componham a Administração Direta ou a Administração Indireta. A distinção tem amplo signifi­cado, pôsto que visa a caracterizar, nItidamente, a área de administração descentralizada, cujas relações com o Ministro de Estado obedecem a critérios e métodos que não são idênticos aos aplicáveis aos órgãos da adminis­tração centralizada.

Para apoiá-los na função supervisora, os Ministros de Estado contam com os órgãos Centrais.

4.2 OBJETIVOS DA SUPERVISÃO

A supervisão ministerial visa, essencialmente, a as­segurar:

1. a observância da política geral e da programa­ção geral do Govêrno;

2. a execução ordenada da programação anual; 3 . a regularidade da vida financeira.

,., BURKE, EDMUND, Thoughts on the Cause of the Present Discontents, 1770. ApUD GAUS, JOHN M., Should Administrators be Generalists or Specialists (Publicação do Ministério da Agri­cultura norte-americano, 1939).

92 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

o Ministro de Estado participa da fixação das dire­trizes governamentais e zela pela sua observância na área 'sob sua jurisdição; empenha-se em que a instrumentação básica (planejamento, orçamento-programa e programa­ção financeira) seja efetivamente utilizada; cuida que o sistema de contrôle interno funcione e atenda às exigên­cias do contrôle externo. O Ministro de Estado acompa­nha -a realização programática, exerce o contrôle e avalia os resultados. A enumeração dos objetivos da supervisão ministerial, constante da Lei de Reforma Administrativa, filia-se a êsse pensamento, em coerência, aliás, com os princípios fundamentais que a Lei consagra. Nota-se, cla­ramente, que aquela enumeração pretende retirar da co­gitação da cúpula ministerial os atos de rotina adminis­trativa, cujo exercício a diretriz de descentralização devol­ve às chefias operacionais. Observa-se, outrossim, o propó­sito de proteger a Administração Indireta da indevida in­terferência da cúpula ministerial, certamente por bem se conhecer a viciosa colocação da matéria no passado, pois o que se deseja é "assegurar a autonomia administrativa, operacional e financeira" da entidade, e nunca perturbar a realização dos seus programas de trabalho. A supervi­são ministerial tem sentido de orientação, de coordena­ção e de contrôle, entendido êste principalmente como avaliação de resultados e apreciação dos balanços.

4 _ 3 óRGAOS CENTRAIS

A Reforma Administrativa sentiu a essencialidade de se esquematizar a organização que permitirá aos Minis­tros de Estado exercerem a supervisão que lhes incumbe e, desde logo, institucionalizar os órgãos incumbidos de apoiá-los nas tarefas de planejamento, coordenação e con­trôle, 'de modo a emprestar sentido orgânico ao funciona­mento da instrumentação básica. Dêsse propósito resultou a instituição dos órgãos Centrais, assim desdobrados:

I - órgãos Centrais de planejamento, coordena­ção e contrôle financeiro;

II - órgãos Centrais de direção superior.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 93

Os primeiros têm "a incumbência de assessorar dire­tamente o Ministro de Estado e, por fôrça de suas atri­buições, em nome e sob a direção do Ministro, realizar estudos para formulação de diretrizes e desempenhar funções de planejamento, orçamento, orientação, coor­denação, inspeção e contrôle financeiro", desdobrando-se em:

1. Secretaria-Geral; 2 . Ins~etoria-Geral de Fina,nças.

As funções de planejamento e de orçamento, que constituem, no plano geral da Administração Federal, atribuições precípuas do Ministério do Planejamento e Coordenação Geral, cabem, no nível de cada Ministério, à Secretaria-Geral, que se constitui, assim, no verdadei­ro estado-maior do Ministro de Estado. As Secretarias­Gerais 81 constituem a rêde do planejamento, orçamenta­ção e coordenação da Administração Federal, dependen­do de sua atuação o conseguir-se a unidade, a coordena­ção e a continuidade tão essenciais, no consenso geral, ao bom funcionamento do Serviço Público Federal nos têrmos em que o concebe a Reforma Administrativa. São os órgãos-chaves para a nova política administrativa tra­çada e, pela primeira vez no nosso serviço público, tradu­zem o reconhecimento de que o planejamento, o orçamen­to e a coordenação precisam ser cuidados permanente e eficientemente, quaisquer que sejam os governos, quais­quer que sejam os titulares das pastas ministeriais. É a lição dos povos organizados que, afinal, chega até nós, sem copiar nada, sem transmitir plantas exógenas, sem pairar apenas no plano teórico, antes reconhecendo que há ensinamentos a colhêr nas teorias universais de orga­nização, há lições a aprender da experiência dos países de­senvolvidos, mas há, sobretudo, necessidade de uma for­mulação que seja racional e, uma vez implantada, possa vicejar - se devidamente cuidada e utilizada - ajustan­do-se, obviamente, ao que lograrmos aprender com o seu funcionamento, no sentido de aperfeiçoá-la. As funções relacionadas com a administração financeira, contabi­lidade e auditoria, atribuídas, no plano geral da Admi-

81 Melhor teria sido, talvez, denominá-las Secretarias-Ge­rais de Planej amento e Coordenação.

94 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

nistração Federal, ao Ministério da Fazenda, competem, no âmbito de cada Ministério, à Inspetoria Geral de Fi­nanças, que se constitui, portanto, no órgão de contrôle financeiro com que conta o Ministro de Estado. Acentue­se que cooperará com a Secretaria-Geral no acompanha­mento da execução do programa e do orçamento. Pela primeira vez no Serviço Público Federal se instituciona­liza um sistema de contrôle interno, já agora correspon­dendo a mandamento constitucional. O Ministro de Es­tado terá, já agora, de preocupar-se com a gestão finan­ceira de sua pasta, através da ação integrada que cabe à Inspetoria Geral de Finanças promover no âmbito mi­nisterial, integrando-se ela mesma, a seu turno com o órgão Central do Ministério da Fazenda, onde se localiza a cúpula do sistema de Administração Financeira, de Con­tabilidade e de Auditoria.

Quanto aos órgãos centrais de direção superior, es­tabeleceu-se que "executam funções da administração das atividades específicas e auxiliares do Ministério e se­rão, preferentemente, organizados em base departamen­tal". Sua finalidade, no caso de atividades específicas, de­verá orientar-se segundo as preocupações de unidades de orientação, unidade de programa, centralização de infor­mações e documentação técnica, acompanhamento técni­co, uma vez que a ação dos órgãos Centrais não deverá anular ou enfraquecer - segundo a tônica da Reforma Administrativa - a atuação das unidades operacionais, como decorrência da política de descentralização e dele­gação de competência. No caso de atividade auxiliar, o órgão Central ministerial estará, de um lado, filiado às diretrizes gerais fixados pelo órgão de cúpula do sistema (ao Departamento Federal de Administração Civil, por exemplo, no caso de administração de pessoal) e, de ou­tro, à orientação programática do Ministério, cumprindo­-lhe, ainda aqui, funcionar no nível que lhe cabe, e não absorver - como no passado - tarefas operativas que atravancaram seu funcionamento, retiraram dos órgãos operacionais a responsabilidade administrativa que lhes deve caber e fizeram-no perder tôda a capacidade de es­tudo, de formulação e de avaliação, como deveria ser sua missão principal.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 95

4.4 OUTROS óRGAOS

A Reforma Administrativa prevê, ainda, a existên­cia, em cada Ministério, para assistirem o Ministro de Estado:

1. o Gabinete; 2. o Consultor Jurídico; 3 . a Divisão de Segurança e Informações.

Com a estruturação dos órgãos Centrais e, em espe­cial, o relêvo que foi dado ao de planejamento e coorde­nação - a Secretaria-Geral - repôs-se o Gabinete na sua verdadeira posição, retirando-se-Ihe a hipertrofia de funções construída no curso dos anos em virtude das soluções emergenciais a que vinham recorrendo os Mi­nistros de Estado. Assim, ao Gabinete cabem a represen­tação política e social do Ministro, as relações públicas e o preparo e despacho do expediente pessoal ao Ministro. A Divisão de Segurança e Informações, que substitui a an­tiga Seção de Segurança Nacional, é o órgão que atua no Ministério em articulação com o Conselho de Segurança Nacional e o Serviço Nacional de Informações, subordina­dos ao Presidente da República.

4.5 ESTRUTURA OPERACIONAL

Além dos órgãos anteriormente mencionados, cada Ministério dispõe, na Administração Direta, de uma es­trutura operacional ajustada às suas necessidades. A Re­forma Administrativa entendeu que sua explicitação ca­beria no Regulamento de cada Ministério, a ser expedido após a promulgação da Lei e em harmonia com os seus preceitos. Alguns dêsses órgãos operacionais, apesar de incluídos na Administração Direta, podem classificar-se, em razão da peculiaridade de suas atribuições, como ór­gãos Autônomos e, em conseqüência, gozar do máximo grau de flexibilidade possível. ~:!

.. Decreto-lei n.o 200, Art. 172.

96 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

4.6 ADMINISTRAÇAO INDIRETA

As entidades da Administração Indireta - Autar­quias, Emprêsas Públicas e Sociedades de Economia Mista - vinculam-se, como já se observou, ao Ministério em cuja área de competência estiver enquadrada sua principal atividade. Isso será matéria da alçada do Poder Executivo, regulamentando as disposições da Lei. As fun­dações, embora não classificadas expressamente entre as categorias de entidades da Administração Indireta, equi­param-se às Emprêsas Públicas, como foi explicado. Es­tão, assim, também sujeitas à supervisão ministerial pelo Ministério em cuja área de competência estiver enqua­drada sua principal atividade. Também não se classifi­cam na Administração Indireta as entidades de direito privado que recebem contribuições parafiscais e prestam serviços de interêsse público ou social; mas nem por isso sôbre elas deixa de verificar-se a fiscalização do Ministro de Estado. Apenas, dadas as peculiaridades que oferecem, estabeleceu-se que a fiscalização estatal se fará "nos têr­mos e condições estabelecidas na legislação pertinente a cada uma". 83

No que tange à vinculação das entidades da Admi­nistração Indireta, a Reforma Administrativa viu-se com­pelida a explicitar a referente aos estabelecimentos ofi­ciais de crédito, a fim de reiterar sua subordinação téc­nica à autoridade monetária nacional e definir sua vin­culação administrativa aos Ministérios diretamente inte­ressados em suas atividades programáticas. 84 Assim é que ao Ministério da Fazenda foram vinculados o Banco Central, o Banco do Brasil e as Caixas Econômicas Fe­derais; ao da Agricultura, o Banco Nacional do Crédito Cooperativo; ao do Interior, o Banco de Crédito da Ama­zônia, o Banco do Nordeste do Brasil e o Banco Nacional de Habitação; ao Ministério do Planejamento e Coorde­nação Geral, o Banco Nacional do Desenvolvimento Eco­nômico.

'" Decreto-lei n.o 200, Art. 183. .. Decreto-lei n.o 200, Art. 189.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 97

4.7 OS CONSELHOS

Os órgãos colegiados, constituídos sob a forma de Conselhos, Comissões ou Juntas, não mereceram trata­mento especial na Reforma Administrativa, a não ser quando esta decidiu-se a normalizar a irregularidade da composição de alguns dêles, em que a predominância da representação dos interêsses privados retirava do colegia­do a expressão de legítimo fixador de diretrizes do Poder Público, como de sua finalidade. ~5 Trata-se, no entanto, de uma área a merecer especial atenção dos estudiosos dos nossos problemas administrativos.

Os órgãos colegiados atendem a mútiplas finalidades. Há Conselhos - vamos utilizar esta expressão em senti­do genérico - cuja missão consiste, exclusivamente, em abrir uma porta formal para o Setor Privado, trazendo-o a uma colaboração ostensiva com o govêrno, aconselhan­do-o em relação a problemas e questões de interêsse geral. É o caso do Conselho do Planejamento Nacional - o CONSPLAN - instituído junto ao Ministério do Pla­nejamento para colaborar com o Govêrno na considera­ção dos problemas econômicos nacionais, informando-se das intenções e dos planos governamentais e oferecendo ao Govêrno a contribuição da experiência do setor priva­do - classes produtoras, meios universitários e represen­tações sindicais - para melhor alcançar-se o desenvolvi­mento econômico e social do País. Há os Conselhos in­cumbidos da coordenação de assuntos interministeriais, quando a articulação das várias áreas tem sentido perma­nente e relevante. É o caso do Conselho do Comércio Ex­terior, através do qual o Ministro da Indústria e do Co­mércio coordena a ação de sua pasta com os Ministérios interessados nessa importante área governamental. Há os Conselhos que supervisionam determinado setor de ati­vidade, exercendo as funções de fiscalização determina­das em lei. É o que ocorre com o Conselho Nacional de Pe­tróleo, que orienta, coordena e fiscaliza a política petro­lífera, executada por entidades do setor público e do se­tor privado.

S5 Decreto-lei n.o 200, Art. 177.

98 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Os Conselhos terão sua posição administrativa defi­nida no regulamento do Ministério a que se subordinem ou vinculem. É bem possível que, no curso dessa etapa da Reforma Administrativa, ou em conseqüência do que se observar após seu transcurso, torne-se viável e oportuno caminhar para uma diretriz mais segura quanto à verda­deira conceituação e posição administrativa dos Conse­lhos na Administração Federal.

4.8 OUTRAS CONSIDERAÇÕES

Do que vem de ser exposto, lícito é concluir quanto à urgência de se traduzirem os princípios, critérios e nor­mas inscritos na Reforma Administrativa em disciplina organizacional para cada Ministério. Certos órgãos do Serviço Público Federal tanto poderão continuar a operar classificados na Administração Direta, desde que se lhes empreste o caráter de órgãos Autônomos, como poderá evidenciar-se a conveniência ou oportunidade de serem deslocados para a Administração Indireta, na modalida­de mais indicada. É provável que alguns casos dessa na­tureza ocorram, a ensejar a busca de legislação que auto­rize sua concretização, e levando os responsáveis pela im­plantação da Reforma Administrativa a formularem ou consolidarem critérios que passem a reger essas questões. Não resta dúvida que tudo isso deverá ser feito com a preocupação básica de lograr resultados, de buscar a me­lhor operacionalidade dos serviços, e não para perseguir uma padronização que intrinsecamente a nada conduza. Qualquer que seja a orientação adotada, certo é que a supervisão ministerial, na conformidade dos critérios ins­critos na Reforma Administrativa, há de se fazer sentir em relação a tôda a Administração Federal visando ao cumprimento dos programas governamentais e a medir os resultados alcançados.

5. SISTEMAS DE ATIVIDADES AUXILIARES

5.1 ATIVIDADES AUXILIARES

A Reforma Administrativa dedicou atenção especial às Atividades Auxiliares, entendidas como as que são comuns a tôda a Administracão e devem obedecer a dire­trizes gerais aprovadas pelo Govêrno.

A distinção é antiga, mas nem por isso perde em atualidade quanto às suas vantagens didáticas: a Admi­nistração Federal é organizada, e funciona com a fina­lidade principal de atender às atividades específicas do Estado, atribuídas aos Ministérios segundo a classifica­ção setorial e a divisão de áreas de competência conside­radas mais convenientes. Onde quer que se realizem essas funções específicas, diretamente relacionadas à prestação de serviços à coletividade, como é da finali­dade do Estado, há necessidade de cuidar dos meios que as acionam e auxiliam a cumprir seus objetivos. Caracte­rizam-se, assim, as atividades-meio, comuns a tôda a Administração, e cuja razão de ser consiste em auxiliar o cumprimento das atividades-fim, ou seja, daquilo que caracteriza as funções do Estado.

As atividades-meio tanto podem ser classificadas como Atividades de Administração Geral, segundo a

N' Decreto-lei n.o 200. Título V.

100 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

clássica lição de WILLOUGHBY, 87 como de Atividades Auxi­liares, como preferem outros teóricos de administração 88

e optou a Reforma Administrativa. Esta última classifi­cação tem, inquestionàvelmente, a vantagem de enfati­zar o caráter auxiliar, complementar, das atividades não específicas do Estado. Parece, realmente, vantajoso tor­nar bem precisa sua posição complementar no conjunto da Administração Federal para evitar que os meios pre­ponderem sôbre os fins, como tende sempre a ocorrer, realçando-se, paralelamente, que o traço predominante dos órgãos por elas responsáveis é a prestação de serviços aos órgãos que têm a missão de realizar a programação governamen tal.

As principais atividades auxiliares consideradas fo-ram as de:

1. Pessoal; 2. Orçamento; 3. Estatística; 4. Administração Financeira, Contabilidade e Au­

ditoria;

5 . Serviços Gerais.

O Planejamento não figura nesse rol, embora não haja como negar à Reforma Administrativa o cuidado de sua institucionalização num verdadeiro sistema. O Pla­nejamento não poderia ser classificado pura e simples­mente como Sistema de Atividade Auxiliar porque, se­gundo os conceitos acolhidos e adotados pelo Govêrno que promulgou a Reforma, e nesta consagrados, trata-se de função que não pode ser de~vinculada da direção supe­rior da Administração Federal, participa da essência do próprio Govêrno, lastreia seu modo de atuar, constituin­do-se, por tudo isso, em responsabilidade direta do Presi­dente da República, auxiliado pelos seus Ministros de Fstado.

'" WILLOUGHBY, W. F., PrincipIes 01 Public Administration, p.105.

'" WHlTE. LEONARD D., lntroduction to the Study 01 Public Administration, p. 42.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 101

5.2 SISTEMAS

A organização das atividades auxiliares em sistemas tem por fim discipliná-las em tôda a Administração, de modo que a ação normativa, de coordenação, orientação técnica e fiscalização seja desempenhada, efetivamente, pelo órgão de cúpula de cada sistema. Enquanto a auto­ridade do Presidente da República e dos Ministros de Estado se exerce verticalmente sôbre os sucessivos esca­lõ:::s administrativos, no caso dos serviços auxiliares, em­bora filiando-se às leis e aos regulamentos, ela decorre das instruções e das normas expedidas pelos órgãos de tôpo dos sistemas, cuja ação permeia, horizontalmente, tôda a administração. Trata-se de atividades de interêsse geral e que os Regulamentos do Poder Executivo dese­jam ver atendidas em obediência à legislação que as rege, aos regulamentos que explicitam os textos legais e às instruções emanadas do órgão que, por fôrça de lei, tem a responsabilidade de zelar pela fiel observância do sis­tema. São diretrizes administrativas que o GOiTêrno aprova e confia à zelosa responsabilidade dos órgãos de cúpula dos sistemas, com a firme determinação de que por todos sejam observadas. Não será demais insistir: tais diretrizes administrativas têm assento na lei (pro­mulgada pelo poder competente); regem-se pelos regu­lamentos (ap:i:Ovados pelo Poder Executivo); e são apli­cadas de acôrdo com as instruções e normas que, com base na lei e nos regulamentos, o órgão de cúpula do sistema expede e por cuja fiel execução tem o dever de zelar. Não se trata, assim, de medida impositiva, tomada ao arbítrio do órgão de tôpo do sistema, mas de diretriz administrativa assentada pelo poder competente, regula­da pelo Poder Executivo e por cujo esclarecido e fiel cumprimento aquêle órgão é responsáveL

Assim. a Política de Pessoal é aprovada pela lei e explicitada pelos Regulamentos, exp~did0.5 pelo Poder Executivo e assinados pelo Presidente da República e seus Ministros de Estado. O órgão de cúpula do sistema de Pessoal é responsável, nos têrmos da lei e dos regu­lamentos, pelo funcionamento do sistema, cabendo-lhe, nessa condição, expedir as instruções e normas que orien­tem a aplicação da atividade através de tôda a Adminis-

102 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

tração. Em cada Ministério, o órgão de pessoal, admi­nistrativamente entrosado no mecanismo de autoridade administrativa ministerial, zela setorial mente pelo fun­cionamento do sistema. E as unidades administrativas do Ministério aplicam as normas em vigor, orientadas e supervionadas pelo órgão setorial do Ministério, o qual, a seu turno, é orientado e supervisionado pelo órgão de cúpula do sistema. Para assegurar que êste não se iso­lará no exercício de sua competência, evitar que deixe de considerar as circunstâncias e peculiaridades de cada setor, e no propósito de propiciar aos órgãos setoriais oportunidade de oferecerem a contribuição de seus Mi­nitérios, julga-se conveniente o funcionamento de uma Comissão de Coordenação, peça cuja importância não pode ser menosprezada no mecanismo do sistema.

5.3 ATIVIDADES NAO INCLUíDAS EM SISTEMA

Além dos cinco sistemas referidos, admite a Refor­ma Administrativa que outros a necessitar de coordena­ção central sejam instituídos, a critério do Poder Exe­cutivo. A matéria prende-se, portanto, a considerações de conveniência administrativa. Cremos ser oportuno tecer breves considerações sôbre algumas áreas por vê­zes mencionadas - impropriamente, ao nosso entender - na apreciação do assunto, pois envolvem instrumentos de trabalho e técnicas, cada qual sob comando próprio, sem a necessidade da presença de um órgão de tôpo, in­vestido de autoridade técnica e administrativa, como foi explicado. É claro que, dentro de cada especialidade, se faz sentir a necessidade de intercâmbio e coordenação, mas isso deve ser considerado normal em qualquer campo de atividade.

Documentação. Não parece haver motivo para in­cluÍ-la entre as atividades auxiliares classificáveis em sistema, no sentido da Reforma Administrativa. O fato de haver uma técnica especializada de documentação não significa, necessàriamente, a necessidade de organizar-se um sistema da natureza dos preconizados pela Reforma. Não se pode perder de vista que a documentação é orga­nizada tendo em consideração, essencialmente, servir ao

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 103

desempenho de determinada atividade, junto à qual terá, inevitàvelmente, de ser colocada. As formas de inter­câmbio, universalmente consagradas e que têm sido esti­muladas no País, bastam para os fins de mais ampla utilização dos documentos.

Arquivos. A preservação dos documentos de inte­rêsse administrativo increve-se entre as preocupações do Govêrno, pois que interessa não apenas à Administra­ção, como à coletividade. A repartição de Arquivo Na­cional deve ser prestigiada em sua autoridade técnica e ficar habilitada a cumprir sua finalidade, mediante en­trosamento com os demais setores. Não se configura, po­rém, um quadro a justificar a criação de um sistema.

Relações Públicas. Aqui também não se configura um sistema da natureza dos cogitados pela Reforma Ad­ministrativa, embora se trate de atividade essenci.al e de imediato interêsse do Govêrno, como um todo, e de cada Ministério e de cada unidade administrativa. A parte de divulgação conta com o veículo da Agência Nacional, parecendo que o problema é mais de dinamização e, por que não reconhecê-lo, de não recear a Administração Fe­deral informar a coletividade, sobretudo com o desen­volvimento dos instrumentos em que se apóia a Reforma Administrativa.

Processamento de Dados. Não se trata de uma ati­vidade auxiliar propriamente, mas da execução de servi­ços técnicos altamente especializados que requerem equi­pamento de alto custo e cuja realização tanto poderá ser efetuada diretamente pela Administração '!J como medi­ante contrato com emprêsas privadas.

Estas observações servem para ilustrar que o con­ceito de atividades auxiliares e de sistema, adotado pela Reforma Administrativa, muito embora se filie à boa doutrina administrativa, tem sentido eminentemente pragmático, pois que visa a reorganizar e fortalecer as atividades-meio sem, contudo, que disso possa resultar o enfraquecimento das atividades-fim.

"" A criação de uma Emprêsa Pública - o Serviço de Pro­cessamento de Dados - vinculada ao Ministério da Fazenda, decorreu da conveniência alegada pelo Ministério de contar com um organismo próprio para suas necessidades, com capacidade potenCial de atender a outras áreas do Serviço Público Federal.

104 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

5.4 óRGAOS DE CúPULA

A Reforma Administrativa denominou os órgãos de cúpula dos sistemas de órgão Central do sistema assim localizando-os:

Sistema de Pessoal

o órgão central do sistema de pessoal civil foi loca­lizado na Presidência da República. Duas razões terão preponderado nessa solução:

1 . a relevância do problema de pessoal, que as administrações pública e privada colocam, nor­malmente, junto ao principal dirigente;

2. o fato de nosso regime constitucional atribuir ao Presidente da República important~s atribuições no setor de pessoal, embora em parte delegáveis segundo a Carta Magna de 1967.

Orçamento

o órgão central do sistema de Orçamento foi situa­do no Ministério do PlanejamEnto e Coordenação Geral, por considerar-se que a programação anual do Govêrno, traduzida no Orçamento, deve estar intimamente relacio­nada com a programação geral, de sentido plurianual, da qual constitui uma etapa. Não se considerou conveniente alimentar uma segregação das duas tarefas, ou sua bi­partição, na esperança de que, se outro fôsse o órgão central do sistema de Orçamento, o Ministério do Plane­jamento lhe transmitiria as coordenadas programáticas do Govêrno dentro das quais se teria de batizar o traba­lho orçamentário. Ademais, era notória a tendência, através dos anos, e acolhida pelos estudos de reformu­lação da Administração Federal, no sentido de entrosar definitivamente as duas atividades. No Govêrno Revo­lucionário, o entrosamento fôra de fato efetivado, nada mais havendo feito a Reforma Administrativa do que ratificar essa orientação.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 105

Estatística

o órgão central do sistema de Estatística foi locali­zado no Ministério do Planejamento e Coordenação Ge­ral. Considerou-se que o Ministério incumbido dos estu­dos e pesquisas sócio-econômicos e da coordenação da programação geral do Govêrrro seria o maior interessa­do na reorganização do Sistema Estatístico Nacional. no­tável trabalho de Teixeira de Freitas e outros pioneiros, relegado, gradativamente, a segundo plano nas cogita­ções governamentais. Daí a localização do Instituto Bra­sileiro de Geografia e Estatística naquele Ministério, como órgão central do sistema estatístico nacional. nu

Administração financeira, contabilidade e auditoria

A localização do órgão central dêste sistema no Mi­nistério da Fazenda decorre de razões históricas que acentuam aquela Pasta como possuindo as atribuições de Ministério do Tesouro. As contas que o Poder Executivo tem o dever constitucional de apresentar, anualmente, ao Poder Legislativo, são organizadas pelo Ministério da Fazenda. Responsável pela arrecadação e pela despesa pública, cabe-lhe o encargo de contabilizá-las e exercer a auditoria prevista na Reforma Administrativa.

Serviços gerais

o órgão central do sistema de Serviços Gerais foi situado no Ministério da Fazenda, levando em conta o fato de que, nessa Pasta, já se situavam a administração de material, a administração patrimonial e, em parte, a administração de edifícios e instalações. A decisão per­tinente a êsse sistema foi precedida de muito debate, quer no seio da COMESTRA, quer nas fases posteriores de apreciação da Reforma Administrativa. Como a ques­tão está estreitamente relacionada à discussão que se

00 Reorganizado pelo Decreto-lei n.O 161, de 13 de feve­reiro de 1967.

106 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

travou em tôrno do DASP, julgamos mais conveniente abordá-la quando fôr examinada a organização dada a êsse Dspartamento. 111

Confrontam-se, a seguir, as posições dêsses órgãos centrais de sistema, antes e depois da Reforma Admi­nistrativa:

SISTEMA

1. Pessoal

2. Orçamento

3. Estatistica

4. Administração Finan­nanceira. Contabilida­de e Auditoria

SITuAQAO ANTERIOR

Presidência da Repúbli­ca: DASP

Presidência da Repúbli­ca: DASP

Ministério Extraordiná­rio para Coordenação dos Organismos Re­gionais: IBGE

Ministério da Fazenda

4.1 Administração Fi- Gabinete do Ministro

REFORMA ADMINISTRATIVA

Presidência da Repúbli­ca: DASP

Ministério do Planeja­mento e Coordenação Geral: Secretaria-Ge­ral

Ministério do Planeja­mento e Coordenação Geral: Fundaço IBGE

Ministério da Fazenda

nanceira Contadoria-Geral da Re- Inspetoria-Geral de Fi-pÚblica nanças

4.2 Contabilidade

4.3 Auditoria

5. Serviços Gerais

Contadoria-Geral da Re­pÚblica

Ministério da Fazenda Serviço do Patrimônio

5.1 Administração Pa- da União trimonial

5.2 Administração de Material

Ministério da Fazenda Conselho de Adminis­

tração de Material (Departamento Fede­ral de Compras)

Ministério da Fazenda 5.3 Administração de Serviço de Patrimônio

Edificios Públicos da União e DASP (Divisão de Edifi­

cios Públicos)

5.5 A ATIVIDADE DE ORGANIZAÇAO

Ministério da Fazenda Secretaria-Geral (e De·

partamento de Servi· ços Gerais)

As atividades de organização constituem um pro­blema à parte. Teàricamente, o órgão central do sistema . , Capítulo 8 .

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 107

de Organização era o DASP; na prática, não mais vinha o DASP, há muitos anos, exercendo efetivamente tais funções. Na COMESTRA, várias hipóteses foram aven­tadas, inclusive a que levaria a confiar ao DASP as fun­ções de órgão central, simultâneamente, do sistema de Pessoal e do sistema de Organização.

PredomülOu, na COMESTRA, o ponto de vista de que a reorganização do Serviço Público Federal envolvia tarefa de tal envergadura e dimensões que se justificava atribuÍ-la a um Ministro Extraordinário, apoiado em um Escritório Especializado e habilitado a contratar estudos e serviços no setor privado, na medida das necessidades ou conveniências. Assim, o início do profundo e extenso processo de reforma contaria com o Escritório Especia­lizado, sob a orientação e coordenação do Ministro Ex­traordinário. Paralelamente, entendia-se que a matéria organizacional é de interêsse do Presidente da República, quando envolva a cúpula governamental, e, em geral, as diretrizes básicas de organização do Serviço Público Fe­deral - objetivo da Reforma Administrativa; dos Mi­nistros de Estado, quanto aos seus Ministérios; e dos Che­fes de Serviço, quanto às unidades que dirigem, Dêsse modo, afigurava-se não ser prudente institucionalizar permanentemente a atividade de organização, deixando­se ao Ministro Extraordinário para a Reforma Adminis­trativa caminho livre para formular, oportunamente, re­comendação ao Govêrno, na base da experiência que iria viver.

Se alguma sugestão imediata houvesse de ser apre­sentada ao Govêrno, cremos que seria lícito supor que ela consistiria em agregar o sistema de Organização ao sistema de Orçamento e, assim, localizá-lo no Ministério do Planejamento e Coordenação Geral, responsável pelo último. Na derradeira fase que antecedeu a promulgação da Reforma Administrativa, o representante do Marechal Costa e Silva, Presidente eleito, insistiu em que se in­cluísse entre as funções da área de competência do Mi­nistério do Planejamento o item referente à Organiza­ção Administrativa,!I~ além de se atribuir ao Ministro de Estado dessa Pasta a missão de implantar a Reforma

I" Decreto-lei n.o 200. Art. 39.

108 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Administrativa, podendo o Govêrno optar pela solução de confiá-la a um Ministro Extraordinário. 93 Dessa gestão, que terá sido motivada pelo desejo de não afastar-se, de imediato, a reorganização administrativa do âmbito de ação direta do Ministro do Planejamento, escolhido entre os especialistas em Administração e Organização, resul­tou um traço de incoerência na ordenação sistemática da Lei de Reforma Administrativa, refletindo na omissão da atividade organização na refinição dos sistemas.

.. Decreto-lei n.o 200, Art. 147.

6. PRESID~NCIA DA REPÚBLICA, MINISTÉ­RIOS, SEGURANÇA NACIONAL, FÔRÇAS

ARMADAS 04

6.1 PRESIDtNCIA DA REPÚBLICA

Subordinam-se ao Presidente da República, com­pondo a Presidência da República, unicamente oito ór­gãos. Dois são da essência do assessoramento do Presi­dente da República e integram o staff imediato do Presi­dente: o Gabinete Civil e o Gabinete Militar. O terceiro, o Conselho de Segurança Nacional, é o mais importante Conselho da República. O quarto, o Serviço Nacional de Informações, corresponde à tendência moderna de habi­litar o Govêrno com um serviço de informação e de con­tra-informação. O quinto e o sexto relacionam-se com uma das atribuições constitucionais do Presidente da República, a de Comandante Supremo das Fôrças Arma­das: o Estado-Maior das Fôrcas Armadas e o Alto Co­mando das Fôrças Armadas: O sétimo é o órgão de cúpula do Sistema de Pessoal Civil, o Departamento Administrativo de Pessoal Civil. E, finalmente, o oitavo é o órgão de assessoramento do Govêrno nos assuntos jurídicos, a Consultoria-Geral da República.

O Conselho de Segurança Nacional é o mais impor­tante órgão colegiado da República, por fôrça de disposi-

{l4 Decreto-lei n.O 200, Títulos VI, VII, VIII e IX.

110 CADER~OS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

ção constitucional que o destina a assessorar o Presidente da República na formulação e na conduta da segurança nacional; !):) ou, como está explicitado na Reforma Admi­nistrativa, da política de segurança nacional. 96 Quanto à formulação, diz a Lei que ela se fará, bàsicamente, me­diante o estabelecimento do' Conceito Estratégico Nacio­nal; e. no que respeita à conduta, mediante apreciação dos problemas que forem propostos ao Conselho, no qua­dro da conjuntura nacional ou internacional. ,.7 Partici­pam do Conselho o Presidente da República, que o preside, o Vice-Presidente e todos os Ministros de Estado, segundo o preceito constitucional, além de outros que a lei admita. \l~ Cumpre assinalar o caráter de órgão de as­sessoramento atribuído ao Conselho de Segurança Nacio­n9.l. Sua função é, portanto, de aconselhar o Presidente da República no relevante campo da Segurança Nacional, mas não a de impor-lhe soluções. A presença constitucio­nal do Conselho na Administracão Federal não invalida nem enfraquece a posição do Presidente da República co­mo Chefe do Poder Executivo. As decisões são de compe­tência do Presidente da República, que se vale do assesso­ramento do Conselho de Segurança Nacional.

Dos oito órgãos integrantes da Presidência da Repú­blica, pode-se apenas considerar discutível o acêrto da lo­calização de dois dêles. O assunto envolve decisões de con­veniência ou preferência administrativa e, talvez mesmo, meramente conjunturais. Referimo-nos ao órgão de pes­soal e ao órgão jurídico.

O órgão central do sistema de Serviços Auxiliares de Pessoal pode, perfeitamente - tal como ocorre com os re­lativos a outras atividades - ser também desconcentrado para a área de um Ministro de Estado. Razões de tradição administrativa e o fato, já pur nós assinalado, da ênfase que as Constituições brasileiras emprestam às atribui­çõc:s do Presidente da República quanto à administração de pessoal e à participação legislativa no processo - cite­se, por exemplo, a regra da criação de cargos em lei. não 9.colhida em nenhuma Constituição de país desenvolvido

'" Constituição, Art. 90; Decreto-lei n.O 200, Art. 40. ,.; Decreto-lei n.o 200, Art. 40. "' Decreto-lei n.o 200, Art. 40, § 2.°. ,.. Constituição, Art. 80, § 2.°.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 111

- levam, naturalmente, à solução adotada pela Reforma Administrativa. Todavia, nota-se no quadro flexível que a Reforma traçou para o Poder Executivo a presença de meios de que o PresidEnte da República possa lançar mão para dar à matéria outro encaminhamento que venha a considerar mais conveniente ou adequado. Poderá, por exemplo, atribuir a um Ministro Extraordinário a mis­são específica de cuidar da área de pessoal. Aliás, reco­nhecendo o íntimo entrelaçamento das funções de pes­soal, cometidas ao Departamento Administrativo do Pes­soal Civil com as tarefas de Reforma Administrativa, a Lei determina que o citado Departamento "prestará tôda cooperação solicitada pelo Ministro responsável pela Re­forma Administrativa". \111

Quanto ao órgão jurídico, a Consultoria-Geral da Re­pública se, de uma parte, tem a incumbência de assesso­rar o Presidente da República Em matéria de alta relevân­cia jurídica, de outra deve coordenar os órgãos do serviço jurídico da União, a fim de uniformizar a jurisprudên­cia administrativa federal. Na verdade, somente a pri­meira parte é de fato atendida pela Consultoria-Geral da República. Também aqui, a desconcentração da Presidên­cia da República poderá conduzir ao deslocamento da Consultoria Geral da República para o âmbito do Minis­tério da Justiça. Essa solução ofereceria visíveis vanta­gens, sobretudo diante da reformulação que, por efeito da Reforma Administrativa, se deu ao antigo Ministério da Justiça e Negócios Interiores. Realmente, liberado de assuntos que determinaram, através dos anos, a dupla condição - Justiça e Interior - do Ministro daquela Pasta, criou-se um nôvo quadro tendente a caracterizar o Ministério da Justiça como o Ministério, juríciico por exce~ência, da República. A concentração dos assuntos jurídicos em um Ministério teria como vantagens:

1. criar no Ministério um corpo de juristas capaci­tado a assessorar o Govêrno no campo do Direi­to;

2. orientar e uniformizar a jurisprudência admi­nistrativa federal, especialmente no terreno constitucional e da legislação complementar;

"" Decreto-lei n.o 200, Art. 120.

112 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

3. estabelecer articulação mais estreita com o Mi­nistério Público, e, portanto, com os Tribunais;

4. pensar, permanente e não esporàdicamente, na atualização da legislação federal, assistindo os órgãos técnicos nos seus estudos especializados, evitando a defasagem a que nos referimos em capítulo anterior.

Na primeira fase dos trabalhos da Reforma Admi­nistrativa, despertou-se a atenção dos elementos de liga­ção do Ministério da Justiça e Negócios Interiores para a importância do assunto. Verificou-se, porém, não haver nenhum estudo mais extenso sôbre a matéria e muito me­nos a sedimentação de pontos de vista em busca de alter­nativas, que sàmente poderiam ser encontradas depois de vislumbrar-se o problema em sua verdadeira dimensão. O Ministério acomodara-se à tradição, de tal modo que se conformava com a subordinação da Comissão de Defesa de Capitais Nacionais à Presidência da República, ver­dadeiro absurdo de formulação jurídico-administrativa tolerado por tanto tempo. O exemplo dos Estados Unidos da América, onde o Ministério equivalente goza de indu­bitável prestígio na opinião pública e é extremamente atuante, não chegou a despertar interêsse entre nós. 1UU É claro que o ajustamento do relevante problema jurídico aos métodos modernos de trabalho governamental está a exigir urgente e séria consideração da parte do Govêrno e, em especial, do Ministro da Justiça, a quem cabe liderar os estudos nesse sentido, com a cooperação - que certa­mente não deixará de se fazer sentir - de todos os seto­res da Administração. 101

'''' United States Government Organization Manual, 1964-1965 p. 208.

101 O pronunciamento jurídico, ao longo da Administração Federal, tende a configurar-se, na ausência dessa modernização, com uma palavra imperativa, inarredável, para os Administra­dores, sempre sob a ameaça de que, se não fôr respeitado, obe­decido, ficarão êles à margem da lei. Quem conhece a maleabi­lidade das interpretações jurídicas bem pode avaliar o quanto essa posição pode ser danosa para a Administração e, o que é mais importante, tender a invalidar os fundamentos técnicos de disciplinas cujas bases e finalidade deveriam certamente pre­ponderar sôbre os tortuosos caminhos da teorização interpreta­tiva no campo estritamente jurídico. Eis uma área a ser urgen-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 113

Parece evidente que o deslocamento da Consultoria Geral da República, devidamente reformulada, para a área do Ministério da Justiça, não deixaria o Presidente da República desguarnecido de aconselhamento jurídico, pois tanto poderia êle socorrer-se, a seu critério, do pró­prio Consultor-Geral da República, como dispor de um Consultor Especial integrado no Gabinete Civil. 102

Estas considerações servem para ilustrar que, apesar da desconcentração radical operada na área de Presidên­cia da República, pondo têrmo à irracionalidade adminis­trativa que adquirira raízes ao longo de tantos anos, ain­da há margem para outras medidas de descentralização, cuja oportunidade e real conveniência o tempo indicará.

6.2 MINISTÉRIOS

Os Ministérios foram classificados em cinco setores, a saber:

l. 2. 3. 4. 5.

Setor Político; Setor de Planejamento Governamental; Setor Econômico; Setor Social; Setor Militar. 103

No Setor Político, incluem-se o Ministério da Justi­ça 1(14 e o Ministério das Relações Exteriores. No Setor de

temente cuidada, em resguardo da cultura jurídica do País e do papel relevante e fundamental que deve e tem de represen­tar na gestão administrativa.

102 O Presidente da República pode e deve, evidentemente, valer-se do aconselhamento de qualquer funcionário altamente categorizado no Serviço Público Federal, a seu exclusivo critério e sem que isso possa suscitar melindres de quem quer que seja.

100 Não prosperou, nos trabalhos da Reforma, a antiga pre­ferência do Marechal Juarez Távora pela organização da Admi­nistração Federal na base de seis amplos setores - seis Minis­térios - que abrangeriam Secretarias de Estado em número de vinte e uma. Corresponde, em essência, à organização da administração federal da Argentina (TÁVORA, JUAREZ, Racionali­zação Administrativa do Brasil, Revista do Serviço Público, abril de 1955) . Foi considerada, desde o início, como sem aplicabilidade ao caso brasileiro.

10< Resultante da transformação do Ministério da Justiça e Negócios Interiores.

114 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Planejamento Governamental, o Ministério do Planeja­mento e Coordenação Geral. 105 No Setor Econômico, o Ministério da Fazenda, o Ministério' dos Transportes, 106

o Ministério da Agricultura, o Ministério da Indústria e Comércio, o Ministério das Minas e Energia e o Ministé­rio do Interior. 107 No Setor Social, o Ministério da Edu­cação e Cultura, o Ministério do Trabalho e Previdência Social, o Ministério da Saúde e o Ministério das Comuni­cações. lOS No Setor Militar, o Ministério da Marinha, o Ministério do Exército 109 e o Ministério da Aeronáutica.

Nota-se que o Ministério das Comunicações, a prin­cípio incluído no Setor Econômico, onde possIvelmente caberia com maior propriedade, foi afinal classificado no Setor Social, talvez para dar relêvo ao sentido social e, so­bretudo, eminentemente educativo das comunicações. O Ministério do Planejamento e Coordenação Geral foi clas­sificado em setor próprio, a fim de acentuar sua função precípua de dedicar-se ao planejamento governamental, cujo sentido social e econômico não ficou apenas implícito naquele título, pois que se acha explicitado no texto defi­nidor da área de competência daquele Ministério.

6.3 MIJ\TISTRO COORDENADOR

A Reforma Administrativa - conforme já se expli­cou em mais de uma oportunidade - deu grande impor­tância à coordenação na Administração Federal, quer ins­crevendo-a como um dos princípios a serem exercidos em todos os níveis do Govêrno (Art. 8.0, § 1.0), quer tendo-a presente ao adotar várias medidas relacionadas com o

106 Resultante da institucionalização do Ministério Extra­ordinário do Planejamento e Coordenação Econômica. A expres­são "e Coordenação Geral" foi incluída por solicitação do re­presentante do Presidente eleito.

100 Em que se transformou o Ministério da Viação e Obras Públicas, do qual foram destacadas várias funções e transfe­ridas para os novos Ministérios das Comunicações e do Interior.

107 Resultante da institucionalização do Ministério Extraor­dinário de Coordenação dos Organismos Regionais.

1Q8 Instituído pela Reforma. 109 Nova denominação dada ao Ministério da Guerra.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 115

funcionamento e a estruturação do Serviço Público Fe­deral. Dentro dêsse propósito, inovou a Reforma Adminis­trativa ao instituir a figura do Ministro Coordenador, procurando tornar o mais maleável possível a ação admi­nistrativa do Presidente da República. Valendo-se dessa flexibilidade de ação, o Presidente da República poderá cometer incumbência coordenadora especial a um de seus Ministros de Estado de determinada área de assuntos afins ou interdependentes, visando a encaminhar provi­dências coordenadoras que, no interêsse nacional, recla­mem a atenção especial do Govêrno. Essa designação re­cairá, normalmente, em um dos Ministros do Setor, ou no Ministro do Planejamento e Coordenação Geral, que tem na composição governamental missão por excelência coordenadora.

Trata-se de mais um instrumento pôsto nas mãos do Presidente da República e que poderá revelar-se, em de­terminadas circunstâncias, ou em relação a determina­dos problemas, extremamente útil.

6.4 MINISTRO EXTRAORDINÁRIO

A figura do Ministro Extraordinário, surgida em nos­so cenário administrativo por ocasião do breve regime parlamentarista de 1961, revelou-se necessária à vida ad­ministrativa do País. A Reforma Administrativa admite a designação de sete Ministros Extraordinários, pois, além de abrir caminho para a nomeação de quatro titulares pa­ra certas áreas que delineou e não considerou convenien­te institucionalizar para atribuí-las a um Ministro per­manente,110 ficou assentado, nos entendimentos havidos com o representante do Presidente eleito da República, que três outros postos seriam consignados na Lei.

Ao Ministro Extraordinário. além do desempenho de "encargos temporários de natureza relevante" (Art. 37), poderá também ser confiada a missão coordenadora de Ministro Coordenador.

liO Decreto-lei n.o 200, Arts. 147, 155, 157 e 169.

116 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

6.5 AREAS DE COMPETI:NCIA

A delimitação da área de competência de cada Minis­tério e a definição das suas atribuições principais foram amplamente debatidas na COMESTRA e nos estudos que se seguiram aos trabalhos da Comissão. Três tendências podem ser registradas em conexão com o assunto:

1. enumerar, sucintamente, as atribuições de cada Ministério, como o fizeram o Projeto da Comissão Amaral Peixoto, a fim de tornar bem clara a competência de cada Ministro de Estado;

2. indicar, apenas, as áreas de competência, sob o fundamento de que isso bastava para os efeitos legais, cabendo aos regulamentos completar a moldura delineada na Lei;

3. combinar as duas soluções, incluindo-se na Lei a indicação das áreas de competência e também a enumeração sucinta das atribuições de cada Ministério.

A terceira solução, que procurava harmonizar os pon­tos de vista de todos, acabou cedendo à segunda que, afi­nal, iria prevalecer no texto da Lei. Sua adoção exige que se expeçam, com a maior brevidade, os regulamentos dos Ministérios, a fim de explicar a competência de cada Mi­nistro de Estado, clarear sua participação coordenada na tarefa global do Govêrno, enquanto o sentido da Reforma Administrativa está bem nítido no pensamerto de todos. Essa providência cresce em prioridade quando se consi­dera a flexibilidade instrumental posta à disposição do

. Presidente da República, notadamente no que concerne aos cargos de Ministro Extraordinário e à figura nova do Ministro Coordenador.

A opção pela segunda solução veio, de certa forma -o que não teria ocorrido se a terceira solução houvesse si­do adotada - desequilibrar a Lei de Reforma Adminis­trativa, pois que não se revelou viável extendê-Ia aos Mi­nistérios Militares. 111

111 Decreto-lei n.o 200, Art. 54 (Ministério da Marinha), Art. 59 (Ministério do Exército) e Art. 63 (Ministério da Aeronáu­tica) .

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 117

Dois problemas foram objeto de estudo e discussão desde os primeiros dias de trabalho até às véspelas de pro­mulgação da Reforma.

O primeiro diz respeito aos transportes aeroviários. Como se sabe, os serviços de aeronáutica civil, localiza­dos inicialmente no Ministério da Viação e Obras Públi­cas, passaram a integrar o Ministério da Aeronáutica, quando se decidiu criar esta nova Pasta,' com o objetivo de incrementar os programas governamentais nesse setor. Mesmo quando nasceu, no Ministério da Viação, o Depar­tamento de Aeronáutica Civil sempre funcionou Em es­treita articulação com os serviços militares de aviação, onde se concentravam os técnicos e as instalações especia­lizadas utilizadas pela aeronáutica civil. Com o surgimen­to do Ministério da Aeronáutica, passou êste a justapor as atividades da Fôrça Aérea e as concernentes aos ser­viços de transportes aéreos de natureza civil. A posição dêstes últimos teria, evidentemente, de ser reexaminada diante do propósito do Govêrno, ao criar o Ministério dos Transportes, de concentrar nesta Pasta o estudo, orienta­ção, coordenação e supervisão de tôdas as modalidades de transportes. A Reforma Administrativa tinha o claro ob­jetivo de fazer do Ministro dos Transportes o responsá­vel, perante o Presidente da República. pela execução de uma política de transportes que obEdeça à dominante preocupação pelos aspectos econômicos do setor, em har­monia com a programação geral do Govêrno. O Ministé­rio da Viação e Obras Públicas, que se transformaria em Ministério dos Transportes, revelou-se, no curso dos es­tudos da Reforma Admini:::trativa, plenamente cônscio dêsse approach, relevante e predominante, mas deixou de ponderar o quadro de realidades que se configurava ao Govêrno, como resultante de uma política - desenvolvi­da após a criação do Ministério da Aeronáutica - de con­centração de tôdas as atividades relacionadas com os transportes aéreos na Pasta da Aeronáutica. Demais, des­cmara-se o Ministério da Viação de equacionar devida­mente o Conselho Nacional de Transportes, embora pres­tigiando sua ação, porque insistia em manter Conselhos Setoriais que de muito enfraqueciam a eficiente atuação daquele órgão colegiado, somente logrando-se extingui-los na Reforma Administrativa. Desenhou-se, 110 curso dos

118 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

debates, nítida tendência de prestigiar a coordenação dos transportes pelo Ministério dos Transportes - sua mais alta missão, sem dúvida - reforçando-se a autoridade do Ministério em abranger, na sua supervisão, a parte econômica e comercial relativa aos transportes aéreos, e outras da mesma índole, ligadas que se encontram às ra­zões que conduziam o Govêrno a buscar efetiva coordena­ção e produtividade crescente no setor de transportes, um dos que mais encontrara deteriorado, econômica, finan­ceira e administrativamente. Todavia, a realidade eviden­ciava que uma série de serviços, concernentes à aeronáu­tica civil, de taJ. forma se haviam integrado no sistema operacional do Ministério da Aeronáutica que seria finan­ceiramente injustificável, e administrativamente inviável, e, do ponto de vista de sua própria segurança, temerário, deslocá-los para o Ministério dos Transportes, abrupta­mente, duplicando-os. Havia ainda a considerar que os serviços afetos ao Ministério da Viação se incluíam en­tre aquêles que mais se haviam desorganizado através dos anos, apresentando rendimento bastante insatisfatório. descoordenação aguda e muito prejudicando a economia do País. Não lograva, assim, o Ministério da Viação apre­sentar-se nas discussões com a autoridade de um Minis­tério bem organizado e eficiente na coordenação dos transportes, há muitos anos sujeitos à sua jurisdição. A solução adotada pela Reforma Administrativa foi, portan­to, prudente, e bem se amolda às realidades do Serviço Público Federal, demonstrando o quanto se teve de des­pender na análise e apreciação das condições e alternati­vas, a fim de evitar cair no êrro de soluções doutrinárias ou teóricamente inquestionáveis, mas de efeitos práticos contraproducentes para a regularidade do funcionamen­to de serviços importantíssimos para a economia nacio­nal. A solução consistiu em:

1 . reforçar a função coordenadora dos transportes pelo Ministério dos Transportes, ressaltando a participação do mesmo na coordenação dos transportes aeroviários (Art. 39);

2. manter a responsabilidade do Ministério da Ae­ronáutica pêla supervisão e contrôle das ativida­des aeronáuticas civis, tanto comerciais como privadas e desportivas, obedecendo, quanto às

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 119

primeiras, à orientação estabelecida pelo Conse­lho Nacional de Transportes (Art. 63, § único, item IV);

3 . atribuir ao Ministério da Aeronáutica a funcão de estabelecer, equiparar e operar a infra-estru­tura aeronáutica, inclusive os serviços de apoio necessários à navegação aérea (Art. 63, § único, item V).

Não se limitou, porém, a Reforma Administrativa em definir, de imediato, as áreas de atuação de cada um dos Ministérios interessados, pois que, em capítulo espe­cial, traçou os rumos de integração dos transportes, dei­xando margem a que o Poder Executivo possa avançar nesse terreno com as cautelas que certamente se im­põem. 112

O segundo problema relaciona-se com as atividades de saneamento, que o Ministério da Saúde reivindicava fôssem nêle concentradas, quando o saneamento básico deveria constituir, na opinião gera], uma das importan­tes atribuições do Ministério do Interior. Entendip ·se ca­ber ao nôvo Ministério, de tão profunda ação econômico­social no meio brasileiro, a intensificação de esquemas preliminares com êxito ensaiados pelo Govêrno. Isso não significaria, de modo algum, a exclusão do Ministério da Saúde do magno problema, tanto mais quanto a Reforma Administrativa, justificadamente. enfatiwu a responsa­bilidade plena dêsse Ministério em relação à política na­cional de saúde. Parece que o saneamento básico urbano deve constituir, tranqüilamente, atribuição específica do Ministério do Interior, enquanto que o Ministério da Saú­de encontrará amplo campo de atuação no meio rural, tão necessitado e tão esquecido. Trata-se de uma área em que a função coordenadora é vital, tanto no plano federal como no estadual e municipal, para uma produtiva uti­lização dos meios disponíveis. muito escassos ainda quan­do postos em confronto, friamente, com as extraordiná­rias necessidades da coletividade brasileira.

= Decreto-lei n.O 200, Título XIV, Capítulo IV.

120 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

6.6 FôRÇAS ARMADAS

As Fôrças Armadas têm sua organização consagrada na Constituição. São compostas pela Marinha de Guerra, pelo Exército e pela Aeronáutica Militar e correspondem a instituições nacionais, permanentes e regulares, organi­zadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a auto­ridade suprema do Presidente da República e dentro dos limites da lei. 113 A organização administrativa do Poder Executivo, ou seja, a Administração Federal, concilia a or­ganização das Fôrças Armadas - instituição constitucio­nal - com a organização dos Ministérios Militares. Tra­ta-se de duas organizações que convivem, mas que, em ra­zão dessa dupla condição, emprestam características pró­prias à parte militar da Administração Federal. IH A ins­titucionalização, pelo Reforma Administrativa, do Alto Comando das Fôrças Armadas, da coerência a essa situa­ção, pois que se trata de um órgão de assessoramento do Presidente da República nas decisões relativas à política militar e à coordenação de assuntos pertinentes às Fôrças Armadas. Por isso mesmo, reúne êsse órgão, quando con­vocado pelo Presidente da República - que é o Coman­dante Supremo das Fôrças Armadas - os Ministros Mi­litares - que comandam cada uma das três Fôrças - o Chefe do Estado-Maior das Fôrças Armadas e os Chefes dos Estados-Maiores e de cada uma das Fôrças singula­res. sendo as sessões secretariadas pelo Chefe do Gabinete Militar. O Estado-Maior das Fôrças Armadas tem função relevante a representar na coordenação dos assuntos mi­litares. A Reforma Administrativa consagrou a práti­ca iniciada pelo Govêrno Revolucionário dE- preencher, mediante rodízio, entre as três Fôrças, a Chefia do EMFA, assim como deu maior projeção às atribuições do Conselho de Chefes de Estado-Maior que funciona junto ao EMFA.

113 Constituição, Art. 92. 11< Deve-se, aliás, ressaltar que mesmo entre os Ministérios

Civis há organizações dotadas de muita peculiaridade, como é o caso do Ministério das Relações Exteriores, constituído de um núcleo central no País - a Secretaria de Estado - a supervi­sionar as atividades funcionais da vastíssima rêde espraiada pelo mundo inteiro - o Serviço Diplomático e Consular.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 121

Quanto à organização dos Ministérios Militares, a Reforma Administrativa procurou ajustar as peculiari­dades de cada Pasta ao seu desdobramento em cinco itens:

I. órgãos de Direção Geral; H. órgãos de Direção Setorial;

IH. órgãos de Assessoramento; IV. Órgãos de Apoio; V. Fôrças.

Ao enumerar os órgãos de Direção Setorial, pro­curou-se conduzi-los a se organizarem em base departa­mental, em harmonia com a regra estabelecida para os Ministérios Civis. m

6.7 MEDIDAS ESPECIAIS DE COORDENAÇÃO

A não institucionalização de certos Ministérios e a relevância de certos assuntos no quadro da Administra­ção Federal obrigaram a Reforma Administrativa a de­dicar-lhes um título especifico. 11<:

Ciência e Tecnologia

Coerente com a perspectiva que se traçou, a Refor­ma Administrativa abriu ampla janela para o futuro no que taI'.ge aos assuntos científicos e tecnológicos.

A Comissão Amaral Peixoto propusera a criação do Ministério d:1 Ciência e Tecnologia, reconhecendo embo­ra que se tratava de mf.:dida controvertida, pois "uns

1!.3 Seria de interêsse que os estudiosos da organização dos serviços da Administração Civil e dos serviços da Administra­ção Militar permutassem mais assiduamente suas experiências, em busca de conhecimento mai, aprofundado das razões - por vêzes incrustadas na tradição histórica, como é o caso das Ma­rinhas - que justificam certas originalidades organizacionais e de análises dos seus méritos e de sua eficácia. A rigor, a padro­nização da terminologia organizacional deveria ser uma conse­qüência de tais estt:dos, análises e intercâmbio - e não pre­cedê-los, como propôs a Comissão Amaral Peixoto.

116 Decreto-lei n.o 200, Títulos XIV.

122 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

julgam prematura e inoportuna a idéia. Para êstes não há cientistas no Brasil, nem atividades científicas em nú­mero suficiente para justificar a criação. Acrescentam, além disso, que a existência do Ministério viria burocra­tizar a pesquisa científica, talvez até submetê-la a nor­mas rígidas, o que seria extremamente indesejável. Para outros. mais otimistas no julgamento das realidades bra­sileiras, a criação do Ministério da Ciência e Tecnologia virá proporcionar estímulo organizado no desenvolvi­mento da pesquisa científica, básica e aplicada, em tôdas as suas manifestações, inclusive as mais livres e espon­tâneas". 11.

A COMESTRA examinou atentamente essa solução, e bem assim a alternativa de incluir os problemas de ciência e tecnologia na área do Ministério da Educação e Cultura, que passaria a denominar-se Ministério da Educação, Ciência e Cultura. Inclinaram-se as preferên­cias da COMESTRA por esta alternativa, por entender que o interêsse e as atenções governamentais pelo rele­vante problema melhor seriam atendidos se se lograsse entrosar os assuntos de ciência e tecnologia na coorde­nacão da área educacional. Considerava a COMESTRA ser' notório que a organizaçãão universitária brasi­leira carecia de melhor utilização da pequisa cien­tífica, na ausência da qual difícil lhe será assegurar a formação profissional de que necessita o País. propiciar os cursos de pós-graduação que valorizam e atualizam os quadros técnicos especializados, ensejar o aprimoramen­to do magistério e, em especial, entrosar-se com o meio industrial num intercâmbio assíduo e intenso, de inte­rêsse recíproco, pelo qual tanto reclama o Brasil. Essa solução não prosperou, pois que com ela não concorda­ram os Ministros da Educação que tiveram influência mais efetiva nas decisões governamentais relacionadas com a Reforma Administrativa. Desde que não aceitava a proposta da COMESTRA, de ampliação da área do Mi­nistério da Educação e Cultura - sobretudo por enten­der que êsse Ministério estava a exigir profunda reorga­nização para melhor ajustar-se às diretrizes da Reforma Administrativa - e concordava ser inconveniente a cria-

'" Exposição de Motivos, itens 390 e 391.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 123

ção de um Ministério da Ciência e Tecnologia, por con­siderar que a institucionalização dos assuntos de ciência e tecnologia em um Ministério permanente tenderia -em relação a problemas tão carentes de formulação ino­vadora e extrema flexibilidade nos mecanismos de co­ordenação e execução - a enrijecer, prematuramente, essa relevantíssima área de ação governamental, eminen­temente flexível e criadora, passou o Govêrno a consi­perar a hipótese de atribuir a um Ministro Extraordiná­rio tão relevante tarefa. Com isso, quis o Govêrno, ao se engajar numa Reforma Administrativa de profundidade, demonstrar estar consciente da relevância da era da Ciência e Tecnologia em que vivemos, com implicação profunda na vida dos povos, ao mesmo tempo em que sublinhava dever a Reforma Administrativa situar-se num quadro de ampla perspectiva, a justificar um gran­de esfôrço coletivo no sentido de se modernizar a Admi­nistração Federal, habilitando-a, no menor prazo possí­vel, para as exigências do futuro. Essa visão deverá cons­tituir-se em argumento sempre presente a atuar no sen­tido de que se implementem as medidas reformadoras, acelerando-se ao máximo as etapas de cumprimento da Reforma Administrativa. Caberá ao Ministro Extraordi­nário para Ciência e Tecnologia coordenar iniciativas e providências que contribuam ao estímulo e intensificação das atividades nesse setor, visando ao progresso do País e à sua maior participação nos resultados alcançados no plano internacional. 11~

Política Nacional de Saúde

A R~forma f~dministrativa reitera, com muita ên­fase, a responsabilidade do Ministério da Saúde pela for­mulação e coordenação da política nacional de saúde, em âmbito nacional e regional. m Isso decorre da verifica­ção de que se trata de área que deve, tranqüilamente, inspirar-se nas diretrizes estabelecidas por aquela Pasta e está a exigir um esfôrço efetivo e permanente de co­ordenação, a fim de que os recursos disponíveis e mobi-

llS Decreto-lei n.o 200, Art. 155. li9 Decreto-lei n.o 200, Art. 156.

124 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

lizáveis, quer públicos, quer privados, sejam utilizados em condições de rendimento mais alto. Devendo, neces­sàriamente, atuar de forma descentralizada, pois que seu objetivo é proporcionar e manter a higidez humana, o Ministério da Saúde tem diante de si talvez a mais vi­sível e intensa tarefa de coordenação. Para realizá-la, terá de munir-se da técnica e de meios financeiros, e des­locar sua ação para as regiões em que se possa revelar mais profícua sua função coordenadora, trazendo para o âmbito de uma rêde de coordenação os órgãos federais, estaduais, municipais e privados participantes ou inte­ressados nos problemas de saúde. Se considerarmos ape­nas os órgãos federais, verificaremos que somente em relação a êles está em aberto ampla atividade coordena­dora, pois que, infelizmente, ela tem estado sistemàtica­mente ausente como processo de administração. Os ór­gãos da previdência social, disseminados por todo o ter­ritório nacional, jamais foram entrosados com os de outros Ministérios atuantes na mesma região, e muito menos com a rêde estadual, municipal e privada existen­te. A unificação da previdência social abriu caminho p:1ra essa coordenação. Além disso, a regra constante da Reforma Administrativa, de dar-se preferência, na pres­tação de assistência médica, à celebração de convênios com entidades públicas e privadas, existentes na comu­nidade, 120 reafirma a intenção descentralizadora do Go­vêrno no sentido de valer-se dos recursos da comunidade, criar condições para que os órgãos interessados cresçam ~ se aperfeiçoem, antes de insistir em ampliar a sua rêde de serviços próprios, com administradores sempre menos inclinados a se preocuparem com os custos opera­cionais. Também nesse particular, a unificação da previ­dência social deu um largo passo no sentido das diretri­zes da Reforma Administrativa.

l!:ste é, sem sombra de dúvida, um campo em que a Reforma Administrativa pode começar a produzir resul­tados visíveis a curto prazo, trazendo o apoio da coleti­vidade à Reforma, talo seu interêsse pela melhoria das condições de atendimento dos problemas de saúde.

1!1) Decreto-lei n.o 200, Art. 156, § 1.0

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 125

Abastecimento Nacional

A Reforma Administrativa deixou margem a que a responsabilidade pela política nacional do abastecimento e sua execução possa ser atribuída ao Ministro da Agri. cultura ou a um Ministro Extraordinário, mas determi­nou que, em qualquer caso, o Ministro contará com o assessoramento de uma Comissão para cordenação da­quela política e articulação com interessados. 121

A COMESTRA, após ampla análise da matéria, ha­via sugerido cometer-se o assunto a um Ministro Extra­ordinário, depois de examinadas outras alternativas como a de integrar, desde logo, o abastecimento no Ministério da Agricultura ou no da Indústria e Comércio. Consi­derava a COMESTRA que a solução Superintendência Nacional do Abastecimento (SUNAB) não se revelara suficiente, tanto que o Govêrno Revolucionário, ante a angústia e a complexidade do problema de abastecimen­to, sentira o imperativo de criar um mecanismo de co­ordenação, a Comissão de Coordenação Executiva do Abastecimento. 122 Bem compreendeu o Govêrno que o problema do abastecimento tem como pressupostos essen­ciais a existência de:

1. uma política de abastecimento; e 2. uma política de financiamento, devidamente en­

trosadas e atuando harmoniosamente.

Esforços foram desenvolvidos nessa direção, tendo como mecanismo de coordenação central do Govêrno a Comissão de Coordenação. Tais políticas precisam fixar diretrizes básicas para a ação global no setor, mas terão, necessàriamente, de ser constantemente atualizadas para que não percam sua sintonia com as realidades emer­gentes. À luz dessas políticas que compõem, na verdade, a política nacional de abastecimento, todos os órgãos da Administracão Federal ficam habilitados a coordenar sua participação setorial na solução e encaminhamento dos assuntos de interêsse para o abastecimento nacional. E o Govêrno e os Ministérios, em seus respectivos âmbitos de

121 Decreto-lei n.o 200, Art. 157. = Decreto-lei n.o 54.358, de 30 de setembro de 1964.

126 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

àção, podem adotar posições coerentes nos entendimentos com os governos estaduais, municipais e com o setor pri­vado, comunicando à coletividade uma política nítida, definida.

O problema do abastecimento apresenta aspectos muito interessantes no que respeita à organização da Administração Federal, em vista das inúmeras facêtas que envolve e dos múltiplos interêsses em jôgo. Sabe-se que, pelo menos, cinco setores têm participação direta nas questões de abastecimento:

1. Produção; 2. Armazenamento; 3. Transporte; 4. Comercialização; 5. Industrialização.

Desde logo se percebe o grande interêsse que, por fôrça de suas atribuições, têm no assunto o Ministério da Agricultura e o Ministério da Indústria e Comércio, bem assim como o quanto é vital a participação do Minis­tério dos Transportes. Quando falamos em comercializa­ção, fôrça é pensar na exportação de produtos agrícolas, a interessar o Ministério da Indústria e Comércio e o Ministério da Fazenda. Quando cogitamos de financia­mento, tão essencial a qualquer uma das fases de abaste­cimento, estarão em cena o Conselho Monetário Nacional, o Banco Central e a Rêde Bancária. E o Ministério do Planejamento e Coordenação terá, por certo, primordial atenção para com todos os ângulos do complexo proble­ma.

Há, por conseguinte, uma certa dose de ingenuidade ao se proclamar que o problema do abastecimento pode­ria ser resolvido mediante sua institucionalização em um Ministério do Abastecimento - solução, em boa hora, por todos repelida - ou incorporação do assunto na área de competência de um dos Ministérios existentes, o da Agricultura (se maior pêso se der à produção, e mesmo ao armazenamento) ou o da Indústria e Comércio (se mais se enfatizar a comercialização e a industrialização dos alimentos). A solução Ministro Extra0rdinário será, talvez, a mais consentânea com a evolução do problema.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 127

Realmente, será conveniente avaliar o que foi feito no sentido de fixação das políticas já referidas, para colhêr as lições da experiência e trabalhar para sedimentá-la, sem perda de flexibilidade e da constante atualização que o assunto exige. Será necessário também que se descen­tralizem as funções da SUNAB, organização que padece de vícios de origem e não logrou, sequer quando timida­mente tentou fazê-lo, descentralizar os encargos de fisca­lização, devido à resistência oposta pelos governos esta­duais que não desejavam, de forma alguma, o ônus da impopularidade de ter de responder às reclamações da coletividade, preferindo, cômodamente, que elas conti­nuassem a recair sôbre o Govêrno Federal. 123 E, final­mente, havendo manifesta tendência de reforçar a parti­cipação do Ministério da Agricultura nesse setor, con­virá, primeiramente, organizar devidamente êsse Minis­tério, antes de transferir-lhe encargos para os quais não está, de modo algum, habilitado. Parece que os horizon­tes nesta área estão bastante claros, mas os passos terão de ser dados com muita segurança, porque o problema é, de fato, extremamente complexo.

Integração dos Transportes

Referência já foi feita a êste assunto. Cabe, apenas, esclarecer que, visando a fortalecer a coordenação da política de transportes, por efeito da transformação do Ministério da Viação e Obras Públicas em Ministério dos Transportes, procurou-se recompor o Conselho Nacional de Transportes, que passou a absorver as funções até então desempenhadas pelos Conselhos Setoriais que fun­cionavam junto às principais unidades setoriais de trans­portes. Deu-se especial relêvo, outrossim, à participação no Conselho Nacional de Transportes do chefe do órgão encarregado, no Ministério da Aeronáutica, dos assuntos da aeronáutica civil, a fim de facilitar o entrosamento

= O Decreto-lei n.o 200, no Art. 160, determina, expressa­mente, em harmonia com a política de descentralização, que a SUNAB "ultimará, no mais breve prazo, a assinatura de convê­nios com os Estados, Prefeitura do Distrito Federal e Territórios, com o objetivo de transferir-lhes os encargos de fiscalização atribuídos àquela Superintendência".

128 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

dos assuntos concernentes aos transportes aéreos na co­ordenação geral da política de transportes.

Comunicações

A criação do Ministério das Comunicações levou à reformulação da composição do Conselho Nacional de Telecomunicações, que se subordinava anteriormente à Presidência da República. Excluiu-se a representação política da participação no Conselho, a fim de ressaltar o sentido técnico dos seus trabalhos, e abriu-se oportu­nidade para representação das Emprêsas Concessionárias de Serviços de Telecomunicações. 1~4

Recomendou-se, expressamente, a transformação do Departamento dos Correios e Telégrafos em entidade da Administração Indireta, por se considerar muito pouco satisfatória a organização existente, cuja modernização a curto prazo realmente se impõe. 12:,

Integração das Fôrças Armadas

A integração das Fôrças Armadas tem sido objeto da preocupação dos Governos. Se no campo estritamente militar a coordenação das três Fôrças previstas na Cons­tituição - Marinha de Guerra, Exército e Aeronáutica Militar - é um imperativo das próprias necessidades da ação militar, no terreno administrativo a coordenação dos três Ministérios - Marinha, Exército e Aeronáutica - é também um imperativo de boa organização. visando a obter o maior rendimento possível dos recursos finan­ceiros destinados à administração militar. AdemaiS, o sentido de planejamento global, a que não podem deixar de recorrer os Governos, determina que o setor militar tenha sua programação formulada em têrmos compatí­veis com as necessidades dos demais setores e o quadro geral da economia nacional.

Essas considerações têm levado vários países a ins­titucionalizar os Ministérios da Defesa, parecendo mesmo ser essa uma tendência geral. No Brasil, a mesma idéia

12-l Decreto-lei ll.o 200, Art. 165. U5 Decreto-lei ll.o 200, Art. 167.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 129

tem sido objeto de amplos e nem sempre tranqüilos de­bates, uma vez que se procurou dar grande relêvo aos aspectos políticos da questão, alimentando opiniões que se afirmavam inteiramente contrárias por parte da Marinha e da Aeronáutica. O assunto foi debatido na COMESTRA, numa atmosfera de grande objetividade, parecendo que se poderá extrair dos debates as seguintes concl usões :

1. a tendência de se caminhar para a instituciona­lização do Ministério da Defesa parece ser por todos reconhecida;

2. todavia, enquanto que alguns entendiam tratar­se de medida cuja imediata adoção seria aconse­lhável, ponderavam outros que ainda havia eta­pas preliminares a cumprir, antes de sua adoção;

3. dentre as ponderações nesse sentido apresenta­das, sobreleva a que apontava a diferença de critérios adotados pelas três Fôrças na formação de seu pessoal, nos seus métodos de trabalho, cumprindo assim acelerar os estudos que vêm sendo feitos para sua revisão, e, ainda, a abso­luta necessidade de fazer preceder a criação do Ministério da Defesa da plena utilização do me­canismo do EMFA, consoante providências que vinham sendo postas em prática. 1~t;

Essas ponderações pesaram no seio da COMESTRA, que recomendou o fortalecimento do EMFA e a institu­cionalização do Alto Comando das Fôrças Armadas, me­didas que, na opinião geral, tinham imediato cabimento e vinham orientando a ação do Govêrno nessa área.

A Reforma Administrativa acolheu essa formulação. mas determinou, de maneira bem clara, ao Poder Exe­cutivo, que promova "estudos visando à criação do Minis­tério das Fôrças Armadas para oportuno encaminha­mento de projeto de lei ao Congresso Nacional". l~j Pre-

_'" o rodízio na Chefia do EMFA, adotado pelo Govêmo e consagrado na Reforma Administrativa, a dinamização do Con­selho de Chefes do Estado-Maior e outras providências de mui­to reforçaram a posição do EMFA, como considerado geralmente indispensável.

= Decreto-lei n.o 200, Art. 168.

130 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

tendeu, com isso, não deixar esmorecer o interêsse pelo prosseguimento de medidas que contribuam para a inte­gração buscada, filiando-se, assim, à tendência univer­salmente observada. Admitiu, ainda, como medida pre­paratória, que a coordenação das atividades do Setor Militar possa ser assegurada através da designação de Ministro Coordenador, inclusive mediante designação de um Ministro Extraordinário, hipótese na qual o EMFA passará a ser órgão de assessoramento do referido Mi­nistro. l~,'

Tôdas essas medidas devem ser analisadas sob a luz do propósito que as ditou: integração cada vez mais es­treita das Fôrças Armadas e coordenação das atividades dos Ministérios Militares, esta última medida da mais alta relevância quando se estabelecem os níveis das des­pesas militares e as prioridades dos programas de inves­timento em que, no interêsse da segurança nacional, de­vam empenhar-se.

"., Decreto-lei n.O 200, Art. 169, e, especialmente, Art. 50, Parágrafo único.

7. ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA, CONTABI­LIDADE, AUDITORIA w

7. 1 SENTIDO DAS NORMAS

A inclusão das Normas de Administração Financei­ra e de Contabilidade na Reforma Administrativa teve o sentido de complementar, na esfera federal, as Normas Gerais de Direito Financeiro consagradas pela Lei n.o 4.320, de 17 de março de 1964, visando à expedição de regulamentação que supere e remova em definitivo o obsoletismo do Código de Contabilidade da União l:lO e do Regulamento Geral de Contabilidade Pública t::l ambos de 1922. Completar-se-á, por essa forma, o intuito renova­dor da Lei n. U 4.320, que consubstancia regras amadureci­das em tantos anos de tortura à sombra do Código de Contabilidade e do seu Regulamento, pois que - ressal­vada a área orçamentária, sob a coordenação do Minis­tério do Planejamento - os efeitos da Lei n.o 4.320 não se fizeram sentir em sua plenitude, como se reconhece ser indispensável, nas operações da Administração Fe­deral.

A reg~lamentação - cuja expedição é altamente prioritária - corrigirá a teimosa tradição de insistir-se

1.."'>; Decreto-lei n.o 200. Título X. Decreto-lei n.o 199, Títulos.IlI e IV. Decreto-legislativo n.o 4.536, de 28 de janeiro de 1922.

"', Decreto-n.o 15.783, de 8 de novembro de 1922.

132 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

em dar o sentido de código à organização da contabili­dade pública e ao sistema de administração financelra do Serviço Público Federal. Trata-se de resquício do es­pírito jurisdicista de nossa tradição administrativa, que a Reforma Administrativa, dando um passo adiante no caminho encetado pela Lei n.U 4.320, de 1964, quer ver eliminado daquela área tão predominantemente técnica e t.ão acentuadamente operacional.

Na verdade, o sistema de administração financeira, de contabilidade e de auditoria, constitui-se, essencial­mente, de normas técnicas, apóia-se no plano de contas, opera segundo as instruções consagradas em manuais de serviço. Os t.extos legais consubstanciam os princípios fundamentais e as regras básicas do sistema, que se torna operativo mediante normas técnicas expedidas pelo órgão especializado por êle responsável. Não tem mais sentido um regulamento de 926 artigos, como o Re­gulamento Geral de Contabilidade Pública, porque as re­gras de operação do sistema somente poderão atingir os resultados colimados dentro da técnica moderna de ma­nuais de serviço, fàcilmente adaptáveis a novas condi­ções de trabalho e a novas facilidades proporcionadas pela tecnologia, por iniciativa de um órgão tecnicamente preparado para agir no momento oportuno. Precisamos, afinal, ter sempre em vista que, em 1922, não se podia lançar mão sequer de máquinas de calcular, enquanto que, em nossos dias, tendo passado pelo sistema de car­tões perfurados, alcançamos a etapa do processamento de dados, cada dia mais aperfeiçoado por fôrça dos pro­gressos da eletrônica.

As normas preocupam-se em dar maior soma de res­ponsabilidades aos administradores, em consonância com a política de descentralização em que se inspira a Re­forma Administrativa, mas submete-os a um sistema de contrôle efetivo e racional, inexistente até agora no Ser­viço Público Federal. Seu sentido não é simplesmente re­novador, mas essencialmente o de introduzir na vida ad­ministrativa do Serviço Público Federal a idéia de um contrôle com o qual, presentemente, não se conta. O que se quer é compor o Sistema de Contrôle Interno para todos os órgãos do Serviço Público Federal, compreen­dendo a disciplina da gestão financeira, a organização

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 133

da contabilidade e a criação da auditoria, segundo o es­pírito realista e renovador que, conforme se acentuou anteriormente, logrou ser acolhido pela Constituição.

7.2 PONTOS ESSENCIAIS PARA UTILIZAÇÃO DE RECURSOS

A Reforma Administrativa simplificou e racionalizou os procedimentos relativos à utilização dos recursos Gr~ çamentários. Depois que o Poder Legislativo vota o Orça­mento, nenhum obstáculo de natureza burocrática deve subsistir a interpor-se no cumprimento da lei que o apro­va. Publicada a lei orçamentária, todos os órgãos inte­ressados ficam habilitados, pela sua publicação, a adotar as providências cabíveis para o desempenho de suas respectivas tarefas, tanto no âmbito do Poder Executivo - que tem a missão de realizar os programas contem­plados no orçamento - como no Tribunal de Contas - que auxilia o Congresso Nacional a exercer a fiscaliza­ção externa determinada pela Constituição. Acabaram-se os tradicionais registros cujo único mérito consistia em sustar, a rigor, a vigência da lei orçamentária, até que o Tribunal de Contas os efetuasse. Em outrllS pala­vras, a promulgação da lei orçamentária não lhe dava eficácia imediata, pois que a execução do orçamento fi­cava na dependência de que o Tribunal de Contas deci­disse registrá-lo. 1:{~

A Reforma Administrativa, sôbre pôr côbro a esse intolerável vício burocrático, racionalizou a utilização dos

"" No que respeita aos créditos adicionais. tomara-se pra­xe incluir nas leis autorizativas de sua abertura um artigo determinando o registro automático do crédito. para eliminar o embaraço burocrático. Subsistia, porém, um demorado proces­samento burocrático antes da expedição do decreto de abertura do crédito, pois o Ministério interessado tinha de formular con­sulta ao Ministério da Fazenda sôbre se os recursos do Tesouro o permitiam, e ao Tribunal de Contas sôbre se era legal a abertura do crédito. Curioso procedimento, realmente, sobretudo quando se confronta todo êsse maneirismo jurídico com a fa­cilidade com que o Govêrno podia autorizar. sob qualquer pre­texto, a realização de despesas sem dotação orçamentária pró­pria. E o fazia estribado na lei (Código e Regulamento de Con­tabilidade) .

134 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

recursos indispensáveis à realização dos programas apro­vados no orçamento através da programação financeira de desembôlso. que o órgão central competente (a Ins­petoria-Geral de Finanças do Ministério da Fazenda), considerado o fluxo da receita e a programação geral do govêrno. vier a fixar. A programação financeira geral, a cargo do Ministério da Fazenda, tomará por base as programações setoriais. a cargo das Inspetorias-Gerais de Finanças dos Ministérios. Os quantitativos globais fi­xados para cada Ministério é que vão determinar o ritmo de desembôlso que êstes poderão seguir e, conseqüente­mente, o ritmo de execução de seus programas. Cada Ministério. a seu turno, em face dos quantitativos globais fixados pelo Ministério da Fazenda, aprovará sua pro­gramação financeira setorial, ficando. em conseqüência. cada unidade administrativa autorizada a movimentar os recursos. Conjuga-se, assim, a autorização programática. que decorre do orçamento, com a autorização para des­pender os recursos financeiros, que decorre da progra­mação financeira aprovada.

A questão situa-se. portanto, em três níveis. No ní­vel do Ministério da Fazenda, conjugam-se os recursos globais da receita com os da despesa, cabendo-lhe deter­minar o ritmo global de desembôlso do Govêrno. No nível de cada Ministério, coordena-se a aplicação setorial dos montantes globais que lhe couberem na programação geral do Ministério da Fazenda: é a programação seto­rial de desembôlso. No nível das unidades administra­tivas, seus responsáveis contam, em tempo. com os re­cursos financeiros indispensáveis à realização de seus programas. que vão implementar em harmonia com as possibilidades constantes da programação financeira aprovada.

Então sim. descentraliza-se efetivamente a execucão. Visa-se a que o chefe de serviço responsável pela unidade administrativa a que cabe a execução do programa conte com os recursos financeiros a êsse fim destinados. 1;::1

,,<, Põe-se têrmo também ao antigo sistema de distribuição de crédito que consistia de expedientes burocráticos da unidade administrativa ao Ministério, do Ministério ao Ministério da Fa­~enda e ao Tribunal de Contas, sem nenhuma organicidade ou programação eficaz.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 135

~OVlMENTAÇAO DOS RECURSOS

A movimentação dos recursos se faz por via bancá­ria, a exemplo, aliás, do que ocorre com a receita.

A Reforma Administrativa consagra a prática que vinha sendo adotada pelo Ministério da Fazenda nos últimos anos. Deve-se assinalar o quanto se tardou em tomar conhecimento da expansão da rêde bancária bra­sileira. tanto no que tange ao Banco do Brasil, como no que respeita à rêde bancária privada. Insistia-se em querer trabalhar com apoio em tesourarias, com eleva­dos custos para a administração, ineficiência no atendi­mento da clientela e duplicação de serviços. A intensa utilização da rêde bancária para o recolhimento das re­ceitas e a desconcentração dos pagamentos. especialmen­te os de pessoal, para a rêde bancária. representam duas medidas de efetiva descentralização administrativa, com plena utilização das facilidades do setor privado. A po­lítica descentralizadora afinal adotada pelo Ministério da Fazenda representou valiosa fase de experimentação que de muito facilitou sua consagração na Reforma Admi­nistrativa, tal a evidência dos bons resultados dessa me­dida racionalizadora, acolhida com pleno apoio pelos administradores e pelos interessados. 1:«

O responsável pela unidade administrativa tem um programa a cumprir, como parte do Orçamento-Progra­ma anual do Govêrno; dispõe de autorização para sacar fundos nos limites dos recursos constantes da progra­mação financeira de desembôlso; executa o seu progra­ma. efetuando os saques sôbre a conta bancária própria.

As filas de pessoal aguardando a vez de seu pagamento no5' guichês do Ministério da Fazenda pareciam problema in­soluvel até que a Comissão de Reforma do Ministério da Fazenda empenhou-se em estudá-lo e buscar a solução racionalizadora que. por sua proposta. o Govêrno adotou. Filas também se formavam, nos dias de pagamento, nos setores de trabalho para onde se deslocavam os pagadores do Ministério da Fazenda. Seria interessante calcular a perda de horas de trabalho resultante de t.antos anos de práticas burocráticas dêsse gênero. Também as instituições de Previdência Social começaram a adotar a medida. inclusive para o pagamento de benefícios, sendo essa uma das providências mais úteis que resultará da unificação da Previdência Social. A arrecadação da receita passou, também, a processar-se com a colaboração da rêde bancária.

136 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

segundo as autorizações financeiras constantes da pro­gramação. Os saques são efetuados mediante assinatura conjunta do ordenador (isto é, do responsável pela uni­dade administrativa), e do encarregado do setor finan­ceiro, procedendo-se à competente contabilização. O orde­nador, quer dizer, o chefe de serviço responsável pela unidade administrativa, pode, assim, executar os seus programas de trabalho, sujeitando-se, porém, ao duplo contrôle representado pela contabilização obrigatória das despesas e pela participação do agente financeiro na assi­natura de cheque nominativo ou da ordem bancária.

Recapitulando, verifica-se que o Ministério da Fa­zenda movimenta os recursos globais, na sua função pre­cípua de Tesouraria-Geral do Serviço Público Federal. 135

Cada Ministério setorial movimenta os recursos destina­dos ao setor governamental pelo qual é responsável. Cada unidade administrativa movimenta os recursos concedi­dos para a execução do programa de trabalho pelo qual é responsável. Descentraliza-se, portanto. de maneira orgânica e racional, a movimentação dos recursos finan­ceiros de que dispõe o Govêrno, disciplinando-se a parti­cipação de cada um, segundo a posição que ocupa no sis­tema e as responsabilidades que lhe cabem no Serviço Público Federal, e confere-se ao responsável pela uni­dade administrativa todos os meios essenciais à realiza­ção dos programas de trabalho, de modo a poder cobrar­lhe os resultados finais. Procura-se, enfim, trabalhar num regime de responsabilidades definidas.

A racionalização do sistema, com a introdução de real flexibilidade - flexibilidade controlada, seria mais próprio dizer - impunha que se estabelecessem restri­ções ao uso do regime de adiantamentos, uma das práti­cas mais deformadoras e nocivas enquistada nos hábitos

13.> A criação da conta Receita e Despesas da União no Banco do Brasil (Decreto n.o 20.393, de 10 de setembro de 1931) resultou de sugestões apresentadas ao Govêrno da Revolução de 1930 por um especialista do Tesouro britânico, Sir Otto Niemeyer. o qual se inspirou no sistema que vigora na Inglaterra e intro­duzido por William Pitt em 1787 (Cf. Central Administration in Britain. MACKENZIE, W. J. M. e GROVE, J. WJ. Através dêsse pro­cesso, tomou-se possível conhecer, diàriamente, a posição da receita e da despesa do Tesouro, a rigor a única contabilidade eficiente, proporcionada pelo Banco do Brasil ao Govêrno Fe­deral.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 137

burocráticos do Serviço Público Federal. A Reforma Ad­ministrativa elimina, pràticamente, o regime de adian­tamentos, por considerá-lo incompatível com as medidas orgânicas e racionais introduzidas na administração fi­nanceira e, em especial, com a responsabilidade que se quer, deliberadamente, atribuir aos chefes de unidades administrativas e às facilidades proporcionadas à utili­zação da rêde bancária. Reconhecendo, porém, a reali­dade de que há circunstâncias - despesas chamadas de caixa pequena, despesas realizadas em lugares inteira­mente desprovidos de facilidades bancárias, por exemplo - em que não será praticável seguir os métodos que consagra, a Reforma Administrativa admitiu que se fa­çam suprimentos. Isso só poderá ocorrer em casos excepcionais, quando houver despesa não atendível pela via bancária e mediante ato da autoridade ordenadora (isto é, dos responsáveis pelas unidades administrativas), procedendo-se aos lançamentos contábeis cabíveis e fi­xando-se prazo para comprovação dos gastos. A respon­sabilidade dos que recebem suprimentos é adjetiva à de ordenação, cuja posição de principal responsável fica exatamente definida, resguardando-se a autoridade do chefe da unidade administrativa, na condição de princi­pal responsável pela administração da repartição entre­gue à sua direção.

Outro ponto de grande significação administrativa, financeira e econômica foi a eliminação total, por fôrça de disposição constitucional, da realização de despesa sem crédito próprio. As normas inscritas na Reforma Admi­nistrativa, completando as regras consubstanciadas na Lei n.O 4.320, de 1964, pràticamente punham têrmo àquela prática absurda e, em última análise, inconstitu­cional, já que invalidava todo o processo de orçamentação e tornava inoperante o Orçamento aprovado pelos podê­res competentes - o Legislativo e o Executivo - de acôrdo com os mandamentos da Lei Magna. A providên­cia encontrava acolhida no Código de Contabilidade e no Regulamento Geral de Contabilidade Pública; l:1t; as auto-

'06 Lei n.O 4.536, de 1922, Arts. 46 e 48; Regulamento apro­vado pelo Decreto n.O 15.783, de 1922, Arts. 240 e 241. Curioso é observar a contradição de acolher essa legislação, de caráter tão restritivo e tão preocupada em penalizar os autores de irregu-

138 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

ridades administrativas - e bem assim o Tribunal de Contas - passaram a considerá-la como procedimento normal, de rotina, no Serviço Público Federal. Seu uso ultrapassava os limites do comedimento, como se pode in­ferir dos seguintes dados: I;;,

ANO DESPESAS ALÉM DEFICITS DE CAl-DOS CRÉDITOS XA DO TESOURO

(em milhões de cruzeiros novos') 1959 ' 76 41 1960 135 77 1961 138 137 1962 206 281 1963 197 505 1964 273 728 1965 716 588

Desnecessário será laborar sôbre o pêso que tão de­savisada providência terá significado para agravar a posição negativa da Caixa do Tesouro, tal a evidência dos números acima arrolados.

Os efeitos negativos de preceitos legais por tal for­ma inconsistentes, mas que perduraram em vigor por tão largo período, criaram, finalmente, um clima de reconhe­cimento da impossibildade de mantê-los diante do pro­pósito governamental de racionalizar os instrumentos bá­sicos de gestão administrativa, e, em especial, o Orça­mento e a Programação Financeira de Desembôlso. Daí a formulação consagrada na Reforma Administrativa I:;' e a inscrição, no texto constitucional, de expressa dispo­sição vedando, na lei orçamentária ou na sua execução, "a realização, por qualquer dos Podêres, de despesas que excedam as verbas votadas pelo Legislativo, salvo as au­torizadas em crédito extraordinário". I:;n Sem essa me-

laridades, disposições sumamente incompatíveis com a norma­lidade da vida financeira e orçamentária da Administração Pública Federal.

"lO Fontes: Quanto às Despesas. Pareceres Prévios do Tri­bunal de Contas sôbre as Contas Governamentais de 1963 (p. 130). de 1964 (p. 68) e de 1965. Diário Oficial, Suplemento, de 23 de maio de 1966 (p. 13). Quanto aos Deficits, Documento de trabalho n.O 1/67, do Ministério do Planejamento e Coordenação Econômica.

"'" Decreto-lei n.o 200, Art. 73. '." Constituição, Art. 64, § 1.0, item c.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 139 ------djda radical, de caráter moralizador e coerente com a verdade orçamentária, a programação orçamentária con­tinuaria a processar-se em bases irrealistas, do mesmo modo que a programação de Caixa do Tesouro continua­ria sujeita à irrealidade, impedindo a racionalização do comportamento programático e financeiro do Serviço Público Federal, com insidiosos reflexos na economia do País. 1W

CONT ABILIZAÇÃO

A Reforma Administrativa deseja que a contabili­dade seja realmente introduzida, com sentido operativo, no Serviço Público Federal, atendendo à finalidade de contrôle que lhe é própria e fornecendo os informes de que necessitam os administradores para acompanhar, tempestivamente, a vida financeira e orçamentária das organizações pelas quais são responsáveis. Por isso mes­mo. a Reforma empresta grande relêvo à racionalização das operações de contabilidade.

O Plano de Contas é uma das suas peças essen­ciais. 141 É através dêle que o órgão central do sistema,

lU Eis ai um dos tópicos a justificar ampla pesquisa: os efeitos da realização de despesas sem crédito ou além dos crédi­t.os autorizados sôbre a economia nacional e, de modo parti­cular. sôbre as emissões governamentais e o desregramento in­flacionário. Afigura-se-nos que a sem-cerimônia com que se lançava mão dêsse recurso irracional terá contribuído. em pro­porção nada desprezível, para o endividamento do Tesouro, para alimentar as emissões e para acentuar restrições ao cumpri­mento de programas de trabalho para os quais havia autoriza­ção orçamentária normal.

" "A uniformidade é essencial ao contrôle financeiro, visto como, sem êle. as comparações são difíceis, senão impossíveis. Uma das necessidades imediatas. portanto, era dar fôrça à orga­nização da contabilidade, não só a central, mas dentro de cada Divisão, instituindo-se práticas padronizadas de contabilidade através de tôda a organização. A classificação das contas através de tôda a Companhia foi padronizada a 1.0 de janeiro de 1921. Um manual-padrão de contabilidade. espeCificando uma série uniforme de procedimentos. tornou-se efetivo para a Compa­nhia inteira a 1.0 de janeiro de 1923" (p. 172). "O contrôle fi­nanceiro. conforme instituído pela General Motors, forneceu à Companhia um retrospecto das operações que reduziu a neces­sidade de administrá-las a partir da cúpula. A direção do escri­tório central ficou em condições de saber se a administração

140 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

para a contabilização geral que lhe compete, os órgãos setoriais do sistema, para a contabilidade sintética que lhes incumbe, e as unidades administrativas, para a con­tabilidade analítica que lhes cumpre, ajustam os regis­tros e as operações segundo uma esquematização geral capaz de produzir, com rapidez, as demonstrações reque­ridas para os trabalhos contábeis aos vários níveis, para as análises que cabe aos órgãos superiores do sistema realizar, e, de modo especial, para os administradores serem mantidos informados e ficarem habilitados a, com base nos dados frios e fidedignos que somente a conta­bilidade está apta a oferecer, poder adotar as medidas que cabe à direção, nos seus vários escalões, formular ou adotar. Daí ser importante que o Plano de Contas seja elaborado com a colaboração dos administradores, ou daqueles que têm o encargo de assessorá-los, pois a êstes cabe dizer, no momento oportuno - que é o do preparo do Plano de Contas - quanto à natureza d~s informes que, para o exercício eficiente das funções de direção e supervisão, precisam receber, com regularidade e precisão, da contabilidade. O Plano de Contas não é, portanto, um documento de exclusiva técnica contábil, mas um es­quema concebido para disciplinar as operações contábeis em todos os setores e níveis em que se realiza - sendo, assim, essencial para a uniformidade dos procedimentos contábeis - e capacitado a fornecer as informações ne­cessárias ao desempenho das funções de contrôle a cargo dos próprios órgãos do sistema de contabilidade e tam­bém aquêles informes essenciais imprescindíveis aos ad­ministradores. Entre os informes que, de modo geral, se pode indicar como devendo ser proporcionados através da implantação do Plano de Contas, incluem-se os refe­rentes à execução orçamentária, pois sendo o orçament{) o documento de balizamento da ação administrativa, o documento de trabalho do Govêrno, a contabilidade pre­cisará informar sôbre a posição das contas de sua exe­cução, quer quanto à despesa, quer quanto à receita. No

descentralizada estava funcionando bem ou mal, tendo à dispo­sição base concreta para julgar do futuro de qualquer parte de­terminada do negócio" (p. 177). É o depoimento do dirigente de uma das maiores organizações do mundo <SLOAN JR., A Mi­nha Vida na General Motors, 1963).

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 141

concernente à despesa, os dados referentes à execução dos programas são fundamentais. Outra preocupação impor­tante do Plano de Contas consiste em permitir que se co­nheçam as despesas segundo as unidades administrativas que as administram (o que se traduz na inclusão dos centros de custo que se reputaram indispensáveis) e segundo os principais elementos de composição dos custos (pessoal, material, encargos diversos, etc.). No primeiro caso, tem-se a posição das despesas de cada órgãú, permi­tindo acompanhar-se o desenrolar de sua ação adminis­trativa tal como a revelam os números. No segundo caso, dá-se destaque àqueles itens de maior significação na despesa, dentre os quais sobressai o de pessoal, pois a mão-de-obra constitui-se sempre num dos mais relevan­tes elementos merecedores de atenta análise e acompa­nhamento pelos administradores e órgãos especializados nos assuntos de administração de pessoal. O item rela­tivo a material também se reveste de grande impor­tància sobretudo quando se considera que material em estoque representa imobilização financeira, cumprindo, portanto, aos administradores e aos órgãos especializados em suprimento dispor de dados que lhes facultem, não apenas verificar o que se está aplicando em novas aqui­sições, mas também do que se dispõe nos almoxarifados, para adoção de medidas - inclusive de redistribuição de material ou de fixação de novos índices para os níveis de suprimento - que reduzam as imobilizações financeiras no setor, de modo a emprestar maior produtividade àquilo que, no setor privado, se denominaria com propriedade de capital de giro, mas a que, no setor público, tão des­preocupado com a administração financeira, se dá tão pouca importância, com imenso desperdício. 14~

H2 Tudo indica que a primeira preocupação da contabili­dade deverá concentrar-se na apuração dos custos primários, para servirem aos fins imediatos de contrôle, fiscalização e acompanhamento. O desenvolvimento do SIstema de contabi­lidade conduzirá, em etapas seguintes, a apurações mais labo­radas dos custos dos serviços, em sintonia com o estabelecimento de certas unidades de custo-padrão. :ltsse aprimoramento só po­derá ser alcançado depois das primeiras fases de organização e terá, certamente, sentido parcial, na medida em que deter­minado setor estiver em condições de valer-se, efetivamente, dêsses refinamentos administrativos, que exigem nova mentali­dade e formação técnica mais aprimorada dos Administradores.

142 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

De grande importância é também a contabilização das responsabilidades. Os ordenadores de despesa devem; na forma da lei, ter suas responsabilidades devidamente registradas, a fim de que se tomem, no momento opor.:. tuno, as contas de suas gestões. :g:sse contrôle representa uma das tarefas primordiais da contabilidade, pois que dos seus registros depende o exercício efetivo de uma fiscalização que se quer ver realizada em tempo, com objetividade, precisão e rigor.

As principais funções dos órgãos integrantes do sis­tema de contabilidade podem ser assim resumidas:

A. Inspetoria-Geral de Finanças do Ministério da Fazenda Em geral (âmbito da Administração Direta) • Administração do Plano de Contas e das

Normas Gerais de Contabilidade e Auditoria aprovados pelo Govêrno

• A contabilidade geral Em relação ao Ministério da Fazenda • Funções análogas às dos demais Ministérios

B. Inspetorias-Gerais de Finanças dos Ministérios A contabilidade sintética do Ministério (segun­do as instruções gerais)

C. Unidades administrativas A contabilidade analítica (segundo as instru­ções gerais)

Ressalte-se, por oportuno, que as normas acima di­zem respeito, especificamente, à contabilidade dos servi~ ços da Administração Direta. Trataremos, adiante, da parte referente à Administração Indireta. Queremos, to­davia, acentuar que a Reforma Administrativa acolheu a regra de que "quem quer que utilize dinheiro público terá que justificar seu bom e regular emprêgo na confor­midade das leis, regulamentos e normas emanadas das autoridades administrativas competentes". H:! Parece evi­dente que as contabilidades devem estar atentas a tais si­tuações, pois que certamente lhes caberá adotar os proce­dimentos contábeis indispensáveis a que se exerça o con~

,<> Decreto-lei n.o 200, Art. 93.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 143

trôle e fiscalização que a lei determina, organizando-se, inclusive, para poder prestar assistência especializada aos órgãos de administração específica que supervisionam programas especiais e através dos quais se exerça a fisca­lização em aprêço.

Impende, igualmente, ponderar que a contabiliza­ção não poderá, de forma alguma, restringir-se aos dis­pêndios orçamentários. Deverá abranger todos e quais­quer recursos postos à disposição da unidade administra­tiva, seja qual fôr sua origem e finalidade. A contabilida­de de que cogita a Reforma Administrativa não tem aquê­le sentido tradicional de atender, exclusivamente, às dis­posições de um Código de Contabilidade, mas sim a de ser­vir de instrumento de contrôle e informação a se fazer sentir sôbre tôda a vida financeira das unidades admi­nistrativas e dos Ministérios, de modo que as contas ge­rais reflitam, de maneira exata e completa, a posição das contas do Govêrno.

Fiscalização da Aplicação

A fiscalização deve preocupar-se em saber se as des­pesas estão sendo realizadas de acôrdo com as autori­zações constantes do Orçamento. em harmonia com a Pro­gramação Financeira de Desembôlso, e segundo os pro­gramas de trabalho aprovados. Os balancetes e demons­trações financeiras que cabe à contabilidade preparar e fornecer devem facilitar o contrôle orçamentário, o con­trôle financeiro, o contrôle programático e os contrôles administrativos especializados (pessoal, suprimentos, etc). Fornecem elementos para que as Secretarias-Ge­rais possam desempenhar as funções de acompanhamen­to e de assessoramento na ação administrativa que se contêm nas atribuições de supervisão ministerial. Do pon­to de vista do sistema de administração financeira e de contabilidade. as Auditorias criadas pela Reforma Ad­ministrativa têm um grande papel a representar. A Au­ditoria da Inspetoria-Geral de Finanças do Ministério da Fazenda compete duas importantes missões:

1. de âmbito geral, verificando se as Inspetorias­Gerais de Finanças dos Ministérios estão cum. prindo as normas gerais e o plano de cOIitas

144 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

aprovados, orientando-as no que se fizer neces­sário e colhendo, no curso das auditagens, não somente os elementos indispensáveis à sua fun­ção fiscalizadora, como observações que, devida­mente reunidas e tiradas, conduzam ao aperfei­çoamento contínuo do sistema;

2. no âmbito do Ministério da Fazenda, efetuar os serviços de auditagens cabíveis.

Às Auditorias das Inspetorias-Gerais de Finanças de cada Ministério cabe o encargo principal de verificar se as contabilidades departamentais estão funcionando de acôrdo com as instruções e normas emanadas do órgão de cúpula do sistema, e, bem assim, executar os serviços de auditagem no âmbito dp- cada Ministério. Nas grandes unidades administrativas, sobretudo naquelas que atuem em todo o território nacional, haverá, certamente, neces­sidade de contar-se com auditores, aos quais incumbirá, no âmbito departamental, executar os serviços que, no âmbito ministerial, incumbem às Inspetorias-Gerais de Finanças.

A Auditoria é uma inovação introduzida pela Refor­ma Administrativa na Administração Direta. Como todo serviço nôvo, terá de ser bem planejado, esquematizado em sua realização e atribuído a pessoal devidamente trei­nado, sob a orientação centralizada dos órgãos de cúpula do sistema, pois, do contrário, não terá condições de exe­qüibilidade. Trata-se de providência que, de há muito, de­veria ter sido introduzida, IH sendo, assim, necessário conjugar a urgência de sua implantação - que agora de­corre de mandamento constitucional e legal- com o im­perativo de agir planejada e coordenadamente.

Tomada de Contas

A Reforma Administrativa determina que todo orde­nador de despesa - isto é, todo chefe de unidade admi-

'H Encontramos, aqui, mais um exemplo a demonstrar a de­fasagem da Administração Direta em relação à Administração Indireta, pois que nesta, sobretudo nas emprêsas que convivem e adotam métodos de gestão privada, encontram-se serviços de auditoria em funcionamento.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 145

nistrativa - ficará sujeito a tomada de contas, que ca­be ao órgão de contabilidade realizar, e sofrerá a verifi­cação do órgão de auditoria, antes de ser encaminhada ao Tribunal de Contas. Isso importa dizer que os servi­ços de contrôle interno tomam as contas dos responsá­veis. pois o Govêrno tem interêsse em que a gestão dos dinheiros públicos se faça com absoluta correção. Com­plementa o contrôle interno, assim exercido, o contrôle externo, de atribuição do Tribunal de Contas.

Para bem caracterizar que os administradores devem ter sua responsabilidade apreciada no próprio âmbito do Poder Executivo, a Reforma Administrativa obriga a que os Ministros de Estado se pronunciem sôbre as tomadas de contas antes de seu encaminhamento ao Tribunal de Contas, para os fins constitucionais e legais, quer dizer, para os contrôle externo. H~ A medida, realmente, se im­punha. O administrador, enquanto aguarda a decisão do órgão de contrôle externo, precisa saber se, no julgamen­to do Ministro de Estado. em cujo nome agiu para apli­car os dinheiros públicos nos programas ministeriais, sua gestão obedeceu aos critérios administrativos em vigor. Não mais ficará, portanto, à espera de um julgamento fi­nal do Tribunal de Contas, para o qual a lei não estabe­lece prazo, sem ter conhecimento do julgamento prelimi­nar, de caráter final no âmbito do Poder Executivo, sô­bre sua gestão. A medida tem, ainda, a virtude de colo­car nas mãos dos Ministros de Estado um relatório de fis­calização que lhes dÁ oportunidade de ponderar a condu­ta dos responsáveis pelas unidades administrativas.

Responsáveis

O quadro de responsabilidade está perfeitamente de­lineado. O Presidente da República presta, anualmente, nos têrmos da Constituição e da lei, suas contas ao Po­der Legislativo, cabendo ao Tribunal de Contas :::;ôbre elas se pronunciar antes de que sejam julgadas pelo Con­gresso NacionaL Todo ordenador de despesa tem sua res­ponsabilidade devidamente inscrita e terá suas contas to­madas e apreciadas, administrativamente, pelo Ministro

:.. Decreto-lei n.O 200, Art. 82.

146 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

de Estado, após o pronunciamento do órgão de auditoria, e, em definitivo, pelo Tribunal de Contas. Sua respon­sabilidade somente será cancelada após a decisão do Tri­bunal de Contas. Os responsáveis secundários, isto é aquêles que, complementarmente aos chefes de serviço. te­nham, em razão de suas atribuições, suas responsabili­dades também inscritas, terão, do mesmo modo, julgadas suas contas. E, de modo geral, quem quer que utilize di­nheiros públicos terá de justificar sua boa aplicação. se­gundo os critérios fixados em lei ou aprovados pelos ór­gãos competentes.

Organização e Funções

A visualização, em conjunto, do sistema permite es­boçar a seguinte esquematização:

Unidade Administrativa

Executa seu programa de trabalho (entrosado com o programa setorial do Ministério e a pro­gramação geral do Govêrno), de acôrdo com o Orçamento-Programa aprovado e com as autori­zações de desembôlso previstas na Programação Financeira estabelecida. Realiza despesas, sacando contra a conta bancá­ria competente. Contabiliza as despesas realizadas. Envia à Inspetoria-Geral de Finanças do seu Mi­nistério os balancetes e demonstrações previstos.

- É auditada pelo órgão ministerial de Auditoria.

Inspetoria-Geral de Finanças do Ministério

Fornece à Secretaria-Geral todos os informes or­çamentários e financeiros de que esta necessitar. Prepara, em coordenação com a Secretaria-Ge­ral, a Programação Financeira Setorial de De­senoolso. Controla as contas bancárias sob a jurisdição do Ministério.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 147

Cumpre as normas ·e instruções do órgão 'Cen­tral do sistema (Inspetoria-Geral de Finanças do Ministério da Fazenda) e orienta sua aplica­ção nas unidades administrativas do Ministério. Executa os serviços de contabilidade sintética do Ministério Audita os serviços de contabilidade das unida­des administrativas.

- Envia ao órgão Central do sistema (Inspetoria­Geral de Finanças do Ministério da Fazenda) os balancetes e demonstrações que forem determi­nados.

Inspetoria-Geral de Finanças do Ministério da Fazenda (na Qualidade de órgão Central do Sistema)

Orienta e supervisiona a aplicação das normas gerais e do plano de contas. Fornece ao Ministério do Planejamento todos os informes de que necessitar para a elaboração da proposta orçamentária. Prepara, em coordel1ação com o Ministério do Pla­nejamento, a Programação Financeira de De­sembôlso. Controla as contas bancárias dos Ministérios. Executa os serviços de contabilidade geral. Audita os serviços das Inspetorias-Gerais de Fi­nanças dos Ministérios. Prepara o Balanço da União e o Relatório res­pectivo.

7.3 ADMINISTRAÇAO INDIRETA

As entidades de Administração Indireta devem orga­nizar seus próprios serviços de administração financeira, de contabilidade e de auditoria, que funcionam em regi­me de completa descentralização. Enviam balancetes e de­monstrações ao Ministro de Estado para efeito da super­visão ministerial prevista em lei. Cada uma dessas enti­dades tem seu plano de contas, muitas vêzes em obediên­cia a critérios que são comuns a tôdas as emprêsas - pú-

14:8 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

blicas OU privadas - que atuam em determinado setor. Os Bancos da União, por exemplo, obedecem aos crité­rios fixados pelo Conselho Monetário Nacional; a PETRO­BRÁS, às normas fixadas pelo Conselho Nacional de Pe­tróleo; a ELETROBRÁS, aos critérios fixados pelo Ministé­rio das Minas e Energia para as Emprêsas de Energia Elétrica; o Instituto Nacional de Previdência Social, às regras aprovadas pelo Conselho de Administração da Previdência Social. Não teria sentido pretender que o Plano de Contas único da Administração Direta se esten­desse àquelas entidades. Quando aquêle Plano tiver sido implantado e contar com algum tempo de experimenta­ção. é possível que se colham ensinamentos que venham a facilitar um certo entrosamento entre êle e os diversos planos de contas que comandam determinados setores. como os acima indicados. Mas aí ter-se-á de recolher as lições da experiência também de todos aquêles setores, de modo a extrair a melhor solução possível. Nada im­pede, no entanto, que se exerça certa influência no sen­tido de que os planos de contas específicos acolham certas medidas tendentes a evidenciar certos custos que o Go­vêrno tenha especial interêsse em conhecer, e que, por certo. os órgãos que supervisionam as entidades que se utilizam dos planos específicos tenham igualmente, ne­cessidade ou conveniência de ver evidenciados. A êsse propósito, pode-se, por exemplo, mencionar os custos de mão-de-obra e, ainda, os gastos de publicidade ou de as­sistência patronal.

7.4 ARTICULAÇAO COM O TRIBUNAL DE CONTAS

Para o desempenho de suas elevadas atribuições de órgão de contrôle externo, da administração financeira e orçamentária da União, o Tribunal de Contas precisa­rá manter-se informado, receber as tomadas de contas e realizar as auditorias financeiras e contábeis que repu­tar indispensáveis. l~'; O Tribunal de Contas, como os de-

.", o Decreto-lei n.o 199. cujas disposições se articulam com os preceitos da Reforma Administrativa, consigna, no Título IH. as normas mediante as quais poderá o Tribunal de Contas cum­prir suas funções de auditoria financeira e orçamentária.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 149

mais órgãos do três Podêres da União, toma conhecimen­to da lei orçamentária pela sua publicação no órgão ofi­cial. O mesmo ocorre em relação aos orçamentos pluri­anuais de investimentos, à abertura de créditos adicio­nais e correspondentes atos complementares. Acompa­nhará a programação financeira de desembôlso mediante recebimento de uma via da programação. Conhecerá, por essa forma, de que maneira as autorizações constantes do orçamento se convertem em permissão para realizar os dispêndios. Receberá, também, o Tribunal de Contas uma via dos balancetes de receita e despesa e dos relató­rios dos órgãos administrativos encarregados do contrô­le financeiro e orçamentário interno.

Importante função diz respeito ao rol dos responsá­veis, que as Inspetorias-Gerais de Finanças são obriga­das a organizar, e dos quais o Tribunal de Contas recebe uma via. Conforme já foi acentuado, somente após o jul­gamento de suas contas pelo Tribunal poderá o ordena­dor de despesa ou outro responsável ter sua respectiva responsabilidade cancelada no competente-rol. A decisão do Tribunal terá por base a tomada de contas que com­pete às Inspetorias-Gerais de Finanças dos Ministérios organizar. O Tribunal de Contas poderá proceder às ins­peções que considerar necessárias, realizando-as por ele­mentos do seu próprio corpo de funcionários ou median­te contrato com firmas especializadas ou especialistas em auditoria financeira.

No que respeita às contas dos administradores de entidades da Administração Indireta e das que, por firça de lei, devam prestar contas, o julgamento do Tribu­nal será feito à base do relatório anual e dos balanços da entidade, do parecer dos órgãos internos que devem dar seu pronunciamento sôbre as contas e do certificado de auditoria externa à entidade sôbre a exatidão do balan­ço. 147 Procura-se habilitar o Tribunal de Contas com do­cumentação válida e sôbre cuja correção recebe êle o de­poimento de competente auditoria externa à entidade. Todavia, se e quando considerar necessário, o Tribunal de Contas poderá mandar proceder a nova auditagem.

", Decreto-lei n.O 199, Art. 42.

lliO CAI)ERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

, " , Como se vê, a simplificação e racionalização do siste­ma de cóntrôle defip.iram as condições em que êle se exer­cerá, 'interna e externamente, preenchendo uma grande laCUna administnitiva no que respeita ao contrôle interno e fot-tale,cendo, de' muito, o contrôle externo, já que o Tri­buna1'de Contas ficou armado de autoridade e de instru­mentá'! que jamais possuiu. Poderá, agora, o Tribunal de Contas - beneficiando-se dos efeitos da Reforma Admi­nistrativa - exercer legítima pressão no sentido de que se organize e seja -atuante o sistema de contrôle interno, do mesmo' modo em que facultado lhe.será fazer sentir sua, ação fiscalizadora externa onde e quando se faça, ne­cessário, liberado que ficou de uma massa inoperante de papéis desprovidos de maior significado para a fiscaliza­ção d,os dinheiros públicos.

7,5 OUTRAS CONSIDERAçõES

, 'O impacto da Constituição e da Reforma Adminis­t,ra~iYa é ,profundo. Acabou-se com a mímica de contrõle, desprezou-se o formalismo. Cada medida tem sua razão de ser, cada' órgão tem sua participação definida; cada res­pcinsàbilidade c:- seja pela aplicação dos recursos, seja pe­la fisé~lizaçãó de 'seu emprêgo - ficou explicitada, a au~ toridade administrativa 'superior não mais poderá refu­gia;r-~e na omissão, o Tribunal de Contas acha-se' afIna-do p'ara uma ação atuante. '

O que se quer é que haja contrôle de fato, real;' que o formal ceda 'lugar ao substancial.

" ,"A. simplifi,çaçãq e à racionalização empreendidas pa­r,eç~in ter sido ,bem aceitas por todos, pois em verdade, t'dQôs_'à$ desejavam.:'Más é preciso implantar as normas çQm ;muito dis<::etç.ir;nento e entrosamep.to, treinando-se atiy.~iliente o pes~oal e criando-se entre os administrado­r~{á'fuentàlidade~e ejt.Ie'p'recisam pensar e cuidar da ad­riírnis1,raçáo fiI:ia:t:lçeÍt:a, dado 'que â Reforma Administra­t~va ,'erigiu-a em, um,a ,de stias peças fundamentais, o que até ágora não ocorria.",}" ' ,. 'fi necessár~o: dar. seqüênchl'orderiada às providências, articulá-las cuidadosamente entre si, ter a coragem dé fugir às improvisações, poi~ há, tôda uma dinâm~ca, intei-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 151

ramente nova, a regular, e ela só poderá produzir os re­sultados colimados se as peças essenciais forem devida e competentemente ajustadas.

Uma das realidades a ter permanentemente em vis­ta é de que o Serviço Público Federal desconhece, a rigor, êsses mecanismos e essas técnicas. 11' O fato de serem simples e racionais não significa que deixem de requerer a presença de pessoas dotadas de alta competência e segu­ro conhecimento da matéria.

Impõe-se evitar que se desvirtue um sistema - que a Constituição consagra - pela incompetência em apli­cá-lo .

•. - A evolução do problema na Administração Federal dos Estados Unidos da América acha-se relatada, com grande obje­tividade, no livro de BARTLET, E. F., Accounting Procedures of the United States Government, editado em 1940 pelo Public Adminis­tration Service. Dois aspectos são de particular interêsse: 1. a descrição dos métodos contábeis, desde as fases iniciais até à do advento do cartão perfurado; 2. os impactos da Lei de Orça­mento e Contabilidade, de 1921, e da intervenção do Govêmo na economia, na iestão do Presidente Roosevelt.

8. ADMINISTRAÇÃO DO PESSOAL CIVIL H~

8.1 OBSERVAÇÃO PRELIMINAR

Na apreciação geral da Reforma Administrativa, ti­vemos ocasião de apontar, com base na Justificativa. a orientação adotada para os problemas de Administração do Pessoal Civil. 1:\(1 Cabe, agora, comentar as principais disposições consagradas na parte da lei especialmente de­dicada ao Pessoal Civil, no sentido de verificar de que mo­do a orientação geral a que nos referimos procurou abrir caminho para que o Govêrno possa superar o clima de perplexidade que se instalou nesta importantíssima área.

Cabe, de início, uma indagação. Por que a Reforma Administrativa não necessitou tratar da Administracão do Pessoal Militar? Qual a causa de não haver, em rêla­ção a êsse setor do Serviço Público Federal, igual atmos­fera de perplexidade? A resposta é simples. Não se pode­rá dizer que os Ministérios Militares não tenham tido, através dos anos, complexos e até tumultuosos problemas de pessoal. Mas os assuntos dessa área vieram sendo ob­jeto de permanente estudo e atualização, com a finalida­de de aperfeiçoar a política de pessoal, escoimando-a in­clusive de anomalias que por causarem desestímulo se re­velaram onerosas para o Tesouro. A direção superior dos Ministérios Militares sempre se preocupou com os proble-

H' Decreto-lei n.a 200, Capítulo XI. ''''' Capítulo 2. item 2.6 - Moldura da Reforma. Pessoal.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 153

mas de pessoal, assessorada pelos órgão de estado-maior, o que igualmente aconteceu com a Presidência da Repú­blica, assessorada pelo EMFA, cuja função coordenadora é atuante e permanente. Disso resultou o aprimoramento crescente dos padrões de aperfeiçoamento, a utilização efetiva de critérios seletivos aos acessos e, portanto, a va­lorização técnica do pessoal. Como se acentua na Justifi­cativa da Reforma, "os Ministérios Militares vêm, há lar­gos anos, preparando seus quadros dirigentes com o maior desvêlo e sentido de continuidade. Por isso, podem hoje apresentar os resultados concretos dêsse esfôrço sis­temático, enquanto que os Ministérios Civis - exceção feita do Itamarati - descuraram do problema, vivendo da improvisação do dia-a-dia". l5l

Não pretendemos, em absoluto, afirmar que todos os problemas nessa área estejam solucionados, pois que êles existem e continuarão a existir. l,,~ Mas isso é normal nas relações humanas no trabalho, não havendo porque consi­derar o setor militar imune a tais preocupações. O que se quer ressaltar é que os problemas são objeto de constante atenção, são estudados à luz de suas diferentes implica­ções e limitações, e, de modo especial, estão permanente­mente sob a atenção dos dirigentes, nos mais altos esca­lões, aos quais não cabe transferir suas responsabilidades pelas questões de pessoal a outros órgãos, como se alguém pudesse - ante as regras fundamentais de organização - exercer direção sem dedicar-se também aos problemas de pessoal. tste foi, como veremos adiante, um dos graves equívocos em que se incorreu no setor civil.

Cabe, ainda preliminarmente, tentar fazer, em gran­des pinceladas, o diagnóstico das causas que conduziram a Administração do Pessoal Civil ao mencionado clima de perplexidade, procurando extrair ensinamentos dos fatos e da experiência vividos. Cremos ser geral o pecado, que todos cometemos, de examinar os problemas de Pessoal

1." Justificativa, Item V. "., Para dar alguns exemplos: a perda do valor real da retri­

buição, por efeito da inflação; a defasagem da remuneração do pessoal técnico, tão essencial às Fôrças Armadas modernas, em confronto com o mercado de trabalho especializado; o pêso das inatividades nas despesas militares, comprometendo prematu­ramente recursos que poderiam ser aplicados em programas destinados a aumentar a eficiência das organizações militares.

154 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Civil em função de posições preconcebidas, defendidas ou atacadas ao sabor das emoções, de impressões superfi­ciais. de opiniões sedimentadas em face de circunstâncias e fatôres que depois sofreram modificações até profundas. O sentido de pesquisa inexiste na Administração Direta, a parca experiência da Administração Indireta não chega até aquela, e as pesquisas a que tão auspiciosamente se vêm dedicando, embora ainda em caráter limitado, as Es­colas de Administração não tiveram tempo de proporcio­nar nova visão para os assuntos, inclusive porque a co­municação entre elas e os órgãos responsáveis pela polí­tica de pessoal do Serviço Público Federal é precária ou inexistente.

É mister contemplar o panorama com mentalidade aberta; mas é preciso, em especial, partir em busca dos fatos, proceder a sondagens no terreno para, ao menos, poder examinar amostras válidas e realmente orientado­ras dos caminhos a seguir.

8.2 o PROBLEMA DO PESSOAL CIVIL: UMA TENTATIVA DE DIAGNóSTICO

Ao lançar os olhos retrospectivamente, desde 1936, quando se iniciou o movimento de reforma do Pessoal Ci­vil no Serviço Público Federal, a impressão que nos fica é de que temos vivido em clima de cultivo de aspectos ju­rídicos e de bem intencionadas improvisações, sem jamaís havermos logrado dispor de condições reais para poder sedimentar, em bases técnicas - e na medida em que estas foram caindo sob nosso domínio - uma Política de Pessoal que permanece, conseqüentemente, indefinida, apesar de inumeras leis e normas expedidas com a finali­dade de discipliná-la.

Política de Pessoal

Não temos motivo para modificar os conceitos que emitimos em 1949,1:;;; e nos parecem inteiramente atuais,

153 PINTO PESSOA SoBRINHO e DIAS, J. DE N AZARÉ T. Princípios de Administração de Pessoal. 1949.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 155

sôbre "a necessidade de uma política definida, mas flexí­vel, de Administração de Pessoal". Defendíamos então a tese de que o problema de pessoal deve ser objeto de lima definição de princípios por parte da administração, pois, senão fôr, inicialmente, traçada uma orientação, as ques­tões suscitadas dia a dia, nas relações entre a administra­ção e os empregados, não encontram diretivas à luz da qual possam ser consideradas. Surge, então, o período das decisões tomadas em cada caso, obedecendo muitas vêzes a fortes razões do momento, inconciliáveis, em certos ca~ sos. com a política geral que preside os assuntos de pes­soal. Gera-se, assim, a incerteza no espírito dos emprega­dos, impedindo que o moral se mantenha elevado. Nasor­ganizaçõesde maior vulto, acentuávamos, o órgão de pes­soaI e os chefes de serviço sentem dificuldades em orien­tar~se em matéria de pessoal uma ve:?; que, não podendo estar sempre em contacto com a administração superior, deixam de atuar, na ausência de orientação preestabe­lecida.· com a necessária firmeza e unidade. E finali­závamos:

"A política de Administração de Pessoal, pre­cisando ser bem definida, deve possuir flexibili­dade bastante para não entravar ou restringir desnecessàriamente a ação do administrador. Ao traçá-la, é mister assegurar-lhe condições de maior adaptabilidade às necessidades. inerentes ao desenvolvimento dos serviços, dando-lhe ca­ráter dinâmico."

Como se depreenderá da avaliação do que resultou da aplicação dos principais componentes de uma política de pessoal, as condições que, de forma tão singela, enumerá­v.amosem 1949, não conseguiram fincar alicerces no ter­reno .. Ficaram.a ilustrar a nossa literatura jurídica e ad­ministrativa, pairando no plano das teorizações.

Recrutamento e Seleção

A aplicação destas técnicas,. naséidas sob tãci bons àuspícios, já que a reforma de 1936 criava um órgão cen~ traI incumbido" de implementá-las, cedopassoú a sofrer a influência da direção do setor de seleção que muito se comprazia em ressaltar que o sistema educacional do País

156 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

não funcionava, pois o número de reprovações de candi­datos nos concursos chegava, às vêzes, a abranger a quase totalidade dos inscritos. Sob essa preocupação de destacar o negativo, não se atentava para o fato de que, quando is­so ocorre em Administração de Pessoal, a primeira con­clusão a extrair é de que o recrutamento não se fêz em bases satisfatórias, pois que a seleção repousa nos resul­tados das operações de recrutamento, e êste não pode fu­gir às realidades do mercado de trabalho; ou, ainda, que o processo seletivo não se identificou com as realidades do mercado de trabalho. Sabe-se, aliás, que quando o mer­cado de trabalho não oferece condições propícias a um bom trabalho de recrutamento - no pressuposto da ade­quação dos métodos seletivos - tem-se de apelar para o treinamento em serviço como corretivo imediato para as deficiências naquele encontradas. Mas o treinamento em serviço nunca foi um dos tópicos de nossa predileção. Al­gumas das deficiências do sistema de recrutamento e de seleção adotado:

1. jamais se conseguiu abastecer, a tempo e a hora, as repartições que precisavam de pessoal;

2. com isso, incentivava-se o prolongamento das in­terinidades, que acabava convidando às efetiva­ções sem concurso;

3. apelava-se para as áreas de menor resistência a exigência de seleção (diaristas, tarefeiros, pes­soal de obras, os quais, com o tempo, passavam também a perseguir a efetividade). A própria técnica de seleção insistiu em não modernizar-se, pois o receio de utilização de certos tipos de pro,. vas de julgamento, considerado menos objetivo, desincentivou o aprimoramento de técnicas es­senciais a certos tipos de seleção, como é o caso das entrevistas.

Somos, provàvelmente, o único país importante no qual o órgão central de pessoal não possui especialistas para realizar entrevistas, instrumento corriqueiro em qualquer agência de emprêgo, há muitos anos.

Resultado: é mínima a influência que o funciona­mento do sistema de recrutamento e seleção exerceu, be­neficamente, no Serviço Público Federal, dado o reduzido

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 157 ------número de funcionários que ingressou através dêsse me­canismo. Sabe-se que, somente após 1960, foram aprovei­tados mais de 100.000 servidores sem o menor critério seletivo. As listas de candidatos habilitados em concurso envelheciam, a frustrar as esperanças dos que acredita­ram no Sistema do Mérito, amparado pela Constituição, enquanto interinos e adventícios logravam transformar­se em funcionários efetivos com a maior facilidade. 1~4

Treinamento

Os Cursos do DASP exerceram notável papel na com­plementação da rêde educacional para a formação e espe­cialização de pessoal para o Serviço Público Federal. De­pois, porém, que a rêde educacional foi se habilitando pa­ra realizar essas tarefas, teimou-se em manter um para­lelismo de funções, transformando-se até os Cursos em Escola, sob a hábil pressão de funcionários que deseja­vam estabilizar sua condição de professôres, até então pa­gos na base de honorários por hora de aula, e licitamente acumular. lC,C. Perdeu, assim, o órgão central de pessoal a capacidade de liderar - como lhe incumbia - programas de treinamento e aperfeiçoamento para o Serviço Público Federal, que dêles carece cada vez mais intensa e urgente­mente. Outras circunstâncias e fatôres, evidentemente,

:.;, Os seguintes dados. colhidos junto ao DASP, ilustram o argüidO quanto ao sistema de recrutamento e seleção:

Periodo de 1938 a 1945 1938 a 1965

Número de Concursos ....... . 158 609 Candidatos inscritos .......... . 95.789 916,382 Candidatos que compareceram

às provas................... 65.784 392.774 Candidatos aprovados ......... 9.772 83.835 Candida tos reprovados ........ 56. 012 308.909 "" A pressão já se fizera sentir no final do Govêrno do

Presidente Dutra. no chamado episódio das Tabelas únicas. mas a direção geral do DASP. ao iniciar-se o períOdO presiden­cial seguinte. anulou a efetivação dos professôres! Consideramos que. tanto no Rio de Janeiro como em Brasília, devem caber à organização universitária os encargos que, indevidamente, sub­sistiram no DASP, desfigurando sua missão primordial no pro­cesso de aperfeiçoamento.

158 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

também contribuíram para que o treinamento fôsse sem­pre relegado a plano secundaríssimo.

Resultado: inteiramente negativo o interêsse pelo treinamento funcional, tanto mais quanto jamais se con­seguiu estabelecer relação entre as necessidades prioritá­rias da Administração Federal e os programas de aper~ feiçoamento.

Avaliação do Mérito

Tornou-se inviável, diante da multiplicidade de che­fes de serviço a emitir, descoordenada e rotineiramente, um julgamento distante dos órgãos ministeriais de pes­soal encarregados de proceder às apurações.

Resultado: inteiramente negativo no que se refere à documentação útil da atuação do funcionário e como instrumento de ação das chefias para premiar ou não seus colaboradores. Subsiste, residualmente, como rotina inú­til e onerosa.

Classificação de Cargos

A técnica de classificação de cargos era desconheci­da entre nós quando improvisamos a chamada Lei do Reajustamento, em 1936. O esquema adotado por essa Lei baseava-se na adoção de uma escala de vencimentos, com a classificação, nessa base, de todos os cargos existentes estruturados naquilo a que se denominou de carreiras. Na verdade, o esquema girou, essencialmente, em tôrno do problema salarial: os padrões de vencimentos, então instituídos, foram a chave de tôda a reforma. A reforma não teve em vista as funções exercidas senão secundària­mente. I.-.ti Conforme salientávamos em 1943, tinha-se em vista o indivíduo ou o salário, e não a função. I~,' As car­reiras não significavam acesso funcional, mas meros degraus na escala de vencimentos. Os cargos de chefia fo­ram, em sua maioria, incorporados às carreiras ou passa­ram a corresponder a comissões. Somente em 1938, com a criação de gratificações para os chefes de seção dos Sel;­viços de Pessoal, então constituídos, teve início o movi­mento que conduziria à institucionalização do regime de

'''' Revista do Serviço Público, maio 1938, p. 166. 1;.' Tese (não publicada) sôbre Classificação de Cargos.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 159

funções gratificadas e à consolidação da tendência de temporariedade dos postos de chefia, desde os primeiros escalões. 1~,~ Surgiu, também a figura do extranumerário, que ficou à margem do sistema instituído e, gradativa­mente, foi tendo sua situação artificiosamente regulada por legislação paralela para, afinal, integrar-se no regi­me legal do funcionário, por efeito do Estatuto de 1952. e ser incorporado aos quadros funcionais em 1960, com a Lei de Classificação de Cargos.1r.!l O esquema de 1936 procurava criar Quadros únicos de pessoal em cada Mi­nistério, anunciando-se mesmo, em 1942, a provável "constituição de um quadro único para o funcionalis­mo". 160 O Estatuto dos Funcionários, promulgado em

,''' A temporariedade das chefias nasceu das circunstâncias e do desejo de quebrar a estagnação que a efetividade dos che­fes acarretara a vários setores. Impunha-se, talvez, numa fase de transição, mas cumpria substituí-la, no mais curto prazo, por critérios capazes de conjugar o acesso funcional com o aper­feiçoamento de processos seletivos para os postos de direção, e. ainda, por um sistema de retribuição condizente. Nada disso foi feito. A Comissão de Classificação de Cargos, em seu relatório de 1954, afirmava que "decorridos, agora, dezesseis anos da Lei n.O 284, e, conseqüentemente, da introdução do sistema do méri­to no Serviço Público Federal, j á é tempo de se estabelecerem quadros regUlares de chefia, para os quais não faltarão elemen­tos capazes, de comprovada eficiência". Em relatório de 1952, já dizia o DASP: "Do exposto ressalta, claramente, que os qua­dros de comando e direção dos órgãos civis do Poder Executivo não têm retribuição conveniente às pesadas responsabilidades que lhes são atribuídas." (Exposição de Motivos n.O 1.427, de 5 de agôsto de 1952.) A questão se eterniza, configurando um imenso vazio na política de pessoal.

,,~ A Comissão Provisória constituída, em 1952, por determi­nação do Presidente da República, para encarregar-se dos tra­balhos preparatórios da Classificação de Cargos (Exposição de Motivos n.o 1.986, de 4 de novembro de 1952, do DASP) , conside­rou indispensável estender-se a área de estudo não somente aos cargos criados por lei, como, ainda, às funções atribuídas aos extranumerários, de modo que "a classificação de uns e outros obedeça aos mesmos princípios técnicos e, conseqüentemente, o plano geral elaborado espelhe, realmente, a situação do serviço civil federal". Ao aprovar o relatório da Comissão Provisória. por despacho de 8 de dezembro de 1952 (proferido na Exposição de Motivos n.O 2.155, de 2 de dezembro de 1952. do DASP) , o Presidente Getúlio Vargas concordava em que cumpria corrigir o artificialismo que vinha caracterizando a situação dos extra­numerários.

..... Relatório do DASP de 1940, p. 44/45.

160 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1939, nada inovou em relação ao assunto, contentando-se em consolidar o esquema de 1936. O esquema de 1936 te­ria sido um excelente instrumento para um período de transição. Reconheceram-no claramente o Poder Executi­vo e o Poder Legislativo em pronunciamentos bastante expressivos, do Presidente Getúlio Vargas, na Mensagem Presidencial referente a 1951, e do Deputado Samuel Duarte, no Relatório em que justificou a inclusão, no Projeto afinal convertido no nôvo Estatuto dos Funcio­nários de 1952, de uma disposição mandando proceder-se ao estudo do plano de classificação de cargos. lIH Enviado em 1954 ao Congresso Nacional, o Plano de Classificação de Cargos, elaborado por uma Comissão de Técnicos como determinava a Lei, teve tumultuada tramitação, havendo novas colocações e acomodações também pelo Poder Exe­cutivo, resultando na promulgação da Lei n.O 3.860, de 1960.

Do ponto de vista técnico, tem-se como pacífico que é da essência de um plano de classificação de cargos a apro­vação de especificações de classe, em que se discrimi­nam os elementos informativos capazes de esclarecer o conteúdo da classe, isto é, os deveres, funções e respon­sabilidades que a caracterizam. A Comissão de Técnicos cuidou de mandar elaborar especificações preliminares, depois de ampla consulta aos servidores públicos e aos chefes de serviço. Volumosos dossiês contendo essas es­pecificações preliminares fvram enviados, a título infor­mativo, ao Congresso Nacional. pois pela primeira vez se empreendia tarefa tão complexa no Serviço Público Fe­deral. Como não podia deixar de ocorrer, a Lei de Clas­sificação previa a aprovação, por via regulamentar, das especificações, condições, sem dúvida, essencial à aplica­ção do Sistema de Classificação. Verificou, porém. a CO­MESTRA, que tais especificações jamais foram aprova­das na forma recomendada pela Lei de Classificação de Cargos, o que não impediria, no entanto, que se realizas­sem, irregularm€nte, inúmeras readaptações sob o funda­mento de desvio da função.

Resultado: o esquema de 1936 foi reconhecido, em­bora tardiamente, de caráter transitório: cedeu lugar a

,,, Decreto-lei n.O 1.713, de 28 de outubro de 1952, Art. 259.

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um plano de classificação de cargos, também tardiamente aprovado, mas que não foi jamais aplicado no sentido téc­nico que justificou sua elaboração e aprovação. Criou-se uma situação indefinida, para não dizer caótica, ao inver­so da constituição de um sistema tecnicamente razoável que servisse - como é de sua finalidade - de instru­mento básico para a política de Administração de Pessoal. Regrediu-se em vez de progredir.

Retribuição

É axiomático que a política de retribuição terá de basear-se em adequado plano de classificação de car­gos. l';~ Como vimos, êste último inexiste. Inexistente, por­tanto, é também uma política de salários. Ademais, não poderia o Serviço Público Federal ficar imune à deterio­ração geral que se operou na política salarial. A crescente crise inflacionária, a desvalorização, os salários nominal­mente atribuídos aos cargos, a orientação de conceder, nos reajustamentos, percentagens sempre maiores aos níveis iniciais,ln:\ tendo como conseqüência o pêso cada vez maior do total dos aumentos, e o desestímulo aos pro-

".',2 o Conselho Federal do Serviço Público Civil, ao referir­-se ao esquema de 1936, afirmou que "um oficial administrativo, que é designado para chefiar uma seção, um engenheiro, a uma oficina, não têm. por isso, maior remuneração, embora seus antecessores exercessem as mesmas atividades com maiores vencimentos" (Exposição de Motivos n.O 3.530. de 7 junho de 1938. Revista do Serviço Público, julho 1938). Quando se perce­beu o absurdo dessa tese, caminhou-se, açodadamente, para as gratificações de função, sem corrigir-se, porém, o desestímulo à retribuição das chefias, que continua a ser uma constante da nossa política de pessoal.

:<33 O mal é antigo. Veja-se o que se afirmava, muito tranqüi­lamente. em relatório de 1943: "Verifica-se, portanto, que o critério é um só. para todos os servidores civis. Na sua determina­ção, procurou êste Departamento conceder benefício maior às classes mais necessitadas, comprimindo o aumento que poderia ser concedido aos servidores de remuneração mais alta. Assim, aos que percebem atualmente Cr$ 100,00 mensais o projeto ga­rante um aumento de 150%, ao passo que, para os vencímentos elevados, a partir de Cr$ 3.500,00, o aumento é de Cr$ 500,00, e que representa 5,5% para os vencimentos de Cr$ 9.000,00. Não há discutir a justiça e o irrecusável acêrto dessa orientação, dado que os servidores menos aquinhoados da fortuna, percebendo já vencimento ou salário demasiadamente exíguo para a satisfa­ção das necessidades essenciais da vida, sofrem mais acentua-

162 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

fissionais, ao pessoal técnico e ao pessoal de direção; 1»4 a incapacidade de relacionar regime horário de trabalho e rendimento ao salário abonado. A fixação pelo Govêrno de uma política salarial para o País, cujos balizamentos vieram influir nos salários do funcionalismo, tornou mais evidente a inconsistência dos esquemas salariais adotados pela Administração Federal.

Resultado: não se aperfeiçoou, nem se logrou conso­lidar, um esquema de retribuição apropriado para as ne­cessidades do Serviço Público Federal, notadamente para os postos de chefia e direção e os cargos técnicos ou es­pecializados.

Jurisdicismo versus Técnica

A Reforma de 1936 despertou o interêsse para os pro­blemas de pessoal, até então sob o domínio dos estudio­sos de Direito Administrativo. O conhecimento que pos­teriormente passamos a adquirir das Técnicas de Admi­nistração de Pessoal levaram-nos, gradativamente, a as­similar essa espeoialização administrativa, em nossos dias amplamente divulgada e conhecida no País. Do em­bate da norma jurídica, enrustida nos nossos hábitos. e da norma técnica, cujas lições apreendemos, resultou continuar a predominar a primeira. Bastam alguns exem­plos para prová-lo. Em seleção, continua a ser muito mais

damente os efeitos da alta dos preços das utilidades. A êles. con­seqüentemente, mais do que aos outros. cabe maior alll.paro. já que se trata de um restabelecimento parcial do poder aquisi­tivo. Nesse ponto. a proposta dêste Departamento difere substan­cialmente do projeto do Ministério da Fazenda. Ao passo que a nossa escala percentual varia entre 150% e 5.5°~. a que foi apresentada pelo Ministério oferece uma amplitude bem me­nor: começa em 50% e termina em 13,3<;;;;. Isso significa que o projeto dêste Departamento beneficia, de preferência. as clasges inferiores" (Exposição de Motivos do DASP. n.o 3.474, de 8 de novembro de 1943) .

'''' Em 1952, declarava o DASP: "Há uma verdadeira sub­versão de princípios hierárquicos quando os postos de Chefia., inclusive os de Ministros de Estado, são remunerados em bases inferiores às de meros titulares de funções de rotina. As chefias se constituem, assim, em pesado ônus que as autoridades admi­nistrativas, visando ao interêsse público, se vêem compelidas a impor na base de amizades pessoais, sem que possam oferecer aos que se dispõem a aceitá-la uma remuneração conveniente" (Exposição de Motivos n.O 1.427, de 5 de agôsto de 195?).

A HEFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 163

importante recrutar candidatos em massa do que aplicar as técnicas de entrevista. Em classificação de cargos, continua a ser mais importante a regra de que o cargo é criado em lei. do que a sua classificação técnica por um órgão responsável pela administração do sistema que a lei sancione. Em matéria de retribuição, continua a ser mais importante dizer qual o padrão salarial aprovado em lei do que conhecer a posição dos salários no mercado de trabalho. Em Administração de Pessoal - após todo um esfôrço de anos para contar com um Plano de Classifi­cação de Cargos - considerou-se mais importante com­por o órgão Central de Pessoal com Assistentes Jurídicos e Assessôres Parlamentares do que com Técnicos de Admi­nistração.

Resultado: os problemas de pessoal são ainda exa­minados com a predominância do ângulo jurídico sôbre os aspectos técnicos que lhe formam a essência.

orçamento de Pessoal

A orçamentação dos dispêndios de pessoal constitui uma das mais importantes tarefas dos orçamentos públi­cos, desde que mais de cinqüenta por cento das despesas orçamentáveis correspondem, normalmente. a gastos com pessoal, e êste representa o elemento essencial para o fun­cionamento e a eficiência das unidades administrativas. Com o crescimento da Administração Pública, por fôrça do crescente volume de responsabilidade e encargos assu­midos pelo Estado, tornou-se impraticável decidir, na apreciação das estimativas orçamentárias. a justeza ou não da posição de cada cargo e dos salários que lhe são atribuídos. Daí o papel fundamental que, para a política orçamentária, representam os planos de classificação de cargos e de retribuição. Havendo tais planos. tanto o Po­der Executivo como o Poder Legislativo podem estar cer­tos de que os chefes de serviço vão exprimir suas necessi­dades de pessoal em têrmos mais exatos e reais; e que os órgãos de orçamento estarão habilitados a sugerir, com maior confiança e acêrto, os quantita Uvos destinados ao pessoal. A elaboração orçamentária encontra, assim, ba­se sólida em que se apoiar, e a aplicação e o contrôle das despesas de pessoal passam, igualmente, a dispor de ins­trumentos de suma valia. O orçamento não pode impedir,

164 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

na ausência daqueles planos, práticas abusivas quanto à justeza das classificações ou das retribuições dos cargos, e muito menos impedir que floresçam soluções inequí­vocas. 1":;

Temos. neste particular, agido com extrema irracio­nalidade. Diante do esquema de 1936, com a artificial se­paração entre funcionários e extranumerários, as dota­ções de funcionários eram incluídas no orçamento sem nenhuma análise, porque os quadros funcionais só pode­riam ser alterados por lei específica, e os extranumerá­rios, no que tange à categoria de mensalistas, gradativa­mente passaram também a ter a mesma rigidez, pois as tabelas só poderiam ser modificadas por decreto anterior ao processo orçamentário. Inexistindo critérios para sa­ber-se quando optar por uma ou outra categoria, as ver­bas destinadas a funcionários e extranumerários passa­ram a ser consideradas segundo as posições de quadros e tabelas na época da formulação orçamentária, restando apenas com flexibilidade as dotações para contratados, diaristas e tarefeiros. Daí o terem as últimas, notadamen­te a de diaristas, servido de escoadouro para as novas ne­cessidades das repartições. 1"" Isso para não referir ao

J<lO Tudo isso foi ponderado pela Comissão do Plano de Classificação de Cargos em seu Relatório de 1954. De nossa parte, já salientáramos a importância dessa questão na Tese (não publicada) que escrevemos em 1943, sôbre Classificação de Car­gos, e no compêndio Princípios de Administração de Pessoal, da autoria de PINTO PESSOA e nossa, publicado em 1949, onde ousa­mos dedicar um capítulo (n.O XVII) à matéria.

10>; Número de servidores (funcionários e extranumerários) : Discriminação .......... 1943 % 1952 % Funcionários ............ 54.164 37,7 79.rW7 36,4 Extranumerários ........ 91.827 62,9 138.491 63,6

145.991 100 217.898 100

Extranumerários: Contratados ...... 685 0,7 572 0,4 Mensalistas . . . . . . . . . . . . . . 40.277 43,9 53.186 38,5 Diaristas ................ 44.959 48,9 81.957 59,1 Tarefeiros ............... 5.906 6,5 2.776 2,0

91. 827 100 138.491 100 Dados colhidos dos seguintes Relatórios do DASP: Exposição

de Motivos n.O 3.474, de 8 de novembro de 1943, e Exposição de Motivos n.O 1.427, de 5 de agõsto de 1952.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 165

pessoal de serviços e encargos e ao pessoal de obras que, freqüentemente, funcionava lado a lado com os de­mais servidores, mercê das tradicionais facilidades de utilização das verbas globais.

Em resumo: não se discutia no processo orçamentá­rio o quantitativo global destinado a dispêndios de pes­soal em relacão a uma unidade administrativa, a uma ati­vidade ou a um projeto. Considerava-se uma dotação glo­bal para os funcionários, correspondente ao quadro do Ministério, do qual a unidade administrativa obtinha um quinhão através da lotação; e consideravam-se, separada­mente, uma de cada turno, dotações para contratados, mensalistas. diaristas e tarefeiros; além disso, considera­vam-se dotações globais para serviço e encargos, e para obras.

Diante dêsse panorama, tínhamos bastante funda­mento para afirmar em 1949: "Nota-se, essencialmente, na fixação das dotações de pessoal, a sensível falta de normas capazes de fazê-las corresponder precisament~ aos encargos dos órgãos do serviço, daí decorrendo ex­cesso de pessoal no serviço público e, em conseqüência, aplicação excessiva do produto da arrecadação de taxas e impostos em despesas improdutivas de pessoal." 1';;

A promulgação da Lei de Classificação de Carg'os, em 1960, se contribuiu para bem caracterizar funcioná­rios, pessoal temporário e pessoal de obras, remetendo as duas últimas categorias para a área da legislação traba­lhista, I,;, em nada resolveu o problema ora focalizado, pois o Plano de Classificação de Cargos, além de desvir­tuado em seus propósitos. não chegou a ser implantado. Além disso, foi ainda tumultuado com o aproveitamento de enorme contingente de pessoal adventício nos quadros funcionais.

1<" Princípios de Administração de Pessoal, p. 200. 'o' Já em 1952, o Presidente Getúlio Vargas, acolhendo su­

gestão do DASP no sentido de superar-se as hesitações ante­riOl'es (Exposição de Motivos n.O 1.427, de 5 de agõsto de 1952), recomendava ao Congresso Nacional a aplicação da legislação trabalhista ao pessoal de serviços e encargos e de obras (Proje­to n.O 2.603-1952, da Câmara dos Deputados). Apesar de plena­mente esclarecido pelo DASP da necessidade dessa medida, o relator - significativamente filiado ao Partido Trabalhista Bra­sileiro - modificou o texto proposto, tornando infrutífera a iniciativa do Poder Executivo.

166 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Sem planos de classificação e de retrihuição, o orça­mento de pessoal não poderia ter a validade desejada. Acrescente-se absurda prática de realizar despesas sem crédito ou além dos créditos votados, com fundamento no Código de Contabilidade - procedimento, finalmente, proibido pela Constituição - aduza-se o suprimento in­controlado de dotações para os Serviços Industriais defi­citários e não será difícil identificar as eausas da indis­ciplina orçamentária a que chegamos.

Resultado: as despesas de pessoal aumentam e a eficiência administrativa diminui. A Administração não pode estar satisfeita, como satisfeitos não podem estar os funcionários. E muito menos satisfeito - se tivesse consciência dêsse quadro - estaria o contribuinte.

Resumo de um Balanço Negativo

Nestes trinta anos, perseguimos, no terreno jurídico, belas construções - como os Estatutos dos Funcionários, de 1939 e de 1952 - que, estranhamente, sàmente se apli­cavam, por inteiro, a pequena percentagem de servidores públicos federais e, apesar disso, não lograram, sequer. consolidar no limitado setor de sua atuação o Sistema do Mérito, consagrado pelas Constituições. No terreno técni­co. a improvisação de 1936 foi pràticamente mantida até os nossos dias. pois a técnica de classificação de cargos, para exemplificar, embora acolhida teàricamente pela lei de 1960. não logrou transformar-se em instrumento bá­sico operativo. como é seu papel em Administração de Pessoal. O recrutamento e a seleção, o treinamento, a ava­liação do mérito, a classificação de cargos, o sistema de retribuição e o orçamento de pessoal não lograram, con­forme apontamos, pL'ovar sua eficácia. As teorias que ali­mentam a técnica de Administracão de Pessoal conti­nuam, obstinadamente. a não conseguir aperfeiçoar o ins­trumental de que tanto carecemos. No entanto, estudos e análises têm sido feitos, no curso désses trinta anos, a apontar com coragem e objetividade as deficiências. \.;"

.. Indicam-se os mais expressivos: - Relatório do DASP sôbre o Reajustamento de 1943 (Ex­

posição de motivos n.O 3.474, de 8 de novembro de 1943) ;

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 167

o que se verifica, em síntese, é que a Administração de Pessoal no Serviço Público Federal revela falta de or­ganização, falta de quadros, falta de instrumentos e imen­so vazio no que concerne à composição das chefias.

8.3 EM BUSCA DE UMA POLÍTICA DE PESSOAL

Do que ficou exposto parece ser possível concluir-se, quaisquer que sejam as opiniões pessoais sôbre causas, métodos e efeitos, haver concordância geral no sentido de que precisamos, com a maior brevidade, de uma política de pessoal.

Precisa-se de uma política de pessoal porque o pro­blema de pessoal se apresenta como um dos mais, senão o mais relevante, entre os que preocupam todos os Admi­nistradores do Serviço Público Federal, levando em conta:

1. o vulto dos encargos orçamentários referentes ao pessoal;

2. a consciência de que da qualidade do pessoal depende a qualidade do serviço público;

3. o fato de que o Govêrno Federal é o maior em­pregador do País.

É necessário abrir caminho para o estudo de ques­tôes que cada vez se tornam maior pesadelo para os go­vernos e motivos de crescente perplexidade para todos. O problema de pessoal chegou, realmente, a um tal estado de confusão e ansiedade que, embora nem os administra­dores nem os administrados possam considerar-se satis­feitos com a situação, não se encontram duas cabeças con­cordantes quanto aos meios e métodos capazes de modifi­cá-lo. Impõe-se, ao menos, visualizar o problema em seu conjunto e buscar uma certa unidade de pensamento quanto a medidas de possível adoção. Se o Serviço Público Federal não possui, no consenso geral, uma política de

- Relatório do DASP sôbre o Reajustamento de 1952 (Ex­posição de Motivos n.O 1.427, de 5 de agôsto de 1952) :

- Relatório da Comissão do Plano de Classificação de Car­gos, de 1954:

- Relatório da Comissão de Reajustamento do Funcionalis­mo Civil, de 11 de outubro de 1965.

168 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

pessoal adequada, a necessidade desta, além de evidente, cada dia está a requerer mais urgente definição de seus delineamentos, abandonando-se o estado de perplexidade que se criou há vários anos e que se prolonga em demasia; e para pôr côbro ao jurisdicismo, às improvisações e às medidas de emergência a que se vem recorrendo - em clima de permanente incompreensão entre a Administra­ção e os funcionários - para assegurar algum dinamis­mo à Administração Federal. Além disso, a introdução de uma política salarial, como um dos pontos relevantes da programação econômica do Govêrno, torna imperativo buscar-se saída racional para o problema de pessoal do setor público. Impõe-se aclarar os horizontes do futuro, embora, por contingência do momento, continue-se a lan­çar mão de medidas temporárias impostas pelas circuns­tâncias, mas coerentes com os objetivos globais. Defi­na-se, em suma, uma política de pessoal que, sopesando devidamente as realidades e dificuldades de hoje, lance as perspectivas do futuro. O maior empregador do País - o Govêrno Federal- não mais pode tardar em contar com uma política de pessoal que possa ser explicada aos seus empregados, que seja exeqüível e funcional.

Administração Direta e Administração Indireta

Preliminarmente, cumpre considerar, em separado, os problemas da Administração Direta e da Administra­ção Indireta, pois que apresentam configuração diferente. É preciso ter a visão do problema do pessoal no seu sen­tido global, para poder compreender que as duas áreas, embora devendo aplicar técnicas que não diferem quanto à substância, têm contornos diferentes que, porisso mes­mo, justificam tratamento específico. Demais. a Adminis­tração Direta está, por origem, condição e tradição, ata­da a legislação específica, até de caráter constitucional; prende-se ao orçamento geral; e é administrada, imedia­tamente, pelos representantes do Poder Executivo. En­quanto que a Administração Indireta precisa gozar da máxima flexibilidade, pois que seu enfoque principal é o da legislação privada. Essa distinção preliminar é essen­cial ao enfoque globalista da política de administração do pessoal. Não conseguimos, através dos anos. livrar-nos dos aspectos particularistas, pois o DASP, mesmo nos

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 169

momentos em que possuía bons quadros técnicos, jamais teve as mãos livres de fatôres condicionantes de sua atua­ção para formular aquela política com uma visão ampla do Serviço Público Federal, de suas realidades, de suas tendências, de sua evolução e, sobretudo, de suas perspec­tivas. Preocupou-se sempre em estender à Administração Indireta, ainda incipiente sob forma autárquica, um sis­tema de transição que já se revelara claramente deficien­te para a Administração Direta e como tal era entendi­do pelos seus técnicos mais esclarecidos. E quando o cres­cimento do País fêz surgir instituições até então desco­nhecidas no nosso panorama administrativo (v. g., Ban­co Nacional do Desenvolvimento Econômico, PETROBRÁS), a experiência da Administração Direta de nada valeu pa­ra equacionamento de suas políticas de pessoal. Os técni­cos do DASP muito ajudaram essas novas entidades, on­de lograram até mesmo introduzir sistemas de pessoal modernos e liberados de jurisdicismo e das improvisações bem intencionadas vigorantes na Administração Direta; mas o DASP, como instituição. jamais logrou interpretar corretamente a nova realidade. De fato, aquêle Departa­mento sempre pugnou por trazer as entidades da Admi­nistração Indireta para o âmbito restrito, cheio de li­mitações, do sistema de pessoal da Administração Di­reta. Pairou sempre no ar a ameaça de se estender um sistema deficiente a tôda a área de atuação governamen­tal, sob a invocação do falso slogan de que se pagava de­mais ao pessoal dos órgãos de gestão descentralizada. 1.u

Em suma, postergava-se a análise e correção das defici­ências do sistema da Administração Direta. e, além de não se visualizar, corretamente, as peculiaridades do pro­blema na Administração Indireta, para esta se procurava transportar soluções sabidamente não satisfatórias ado­tadas naquela.

lO" Na verdade. pagava-se de menos ao pessoal mais quali­ficado e de chefia da Adminiztração Direta, devido ao trata­mento de massa que sempre foi sua característica. Em lugar de pugnar no sentido de que a Administração Indireta ajustasse sua política salarial às condições do mercado de trabalho -podando-se, inclusive, os critérios benevolentes e improdutivos vigorantes em vários setores - insistia-se em trazer a Admi­nistração Indireta para os balizamentos da Administração Di­reta.

170 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

o de que se precisa, a rigor, é inverter o processo: fazer com que a Administração Indireta equacione seus problemas, tendo presente o mercado de trabalho e o se­tor privado em que atuam suas entidades componentes, considerada a possibilidade econômico-financeira de ca­da uma; e que a Administração Direta inicie, sob bons auspícios, o caminho da recuperação, valendo-se da ex­periência da Administração Indireta onde ela se tenha re­velado proveitosa. Essa a sensibilidade que nos tem fal­tado na consideração da matéria.

Administração Direta

A política de pessoal tem sido submetida até agora a um tratamento de massa, que só faz agravar suas deficiências e impede encontrar-se uma saída racional e viável para o estado de crise que se instalou. O direito de acumular, inscrito na Constituição, e que encontra ch­ma permanente propício para estender-se, representa ní­tida tendência para a "consagração do regime de tem­po parcial" no Serviço Público Federal. Tem havido uma inclinação muito acentuada para a redução da jornada de trabalho, sem atentar para a correlação que, obvia­mente, deve existir entre horas de trabalho e remunera­ção, e entre ambas e os salários correntes no mercado de trabalho. O regime de remuneração com participação nas multas é considerado um mal necessário devido ao des­preparo técnico do aparelhamento de arrecadação; gra­ças a isso, considera-se como privilégio a retribuição -na maioria dos casos razoável - dos agentes fiscais, mas não se diz qual seria a paga justa que, em uma política criteriosa de retribuição, lhes deveria caber. Reconhece­se, ao mesmo passo, que não é razoável o vencimento de outras importantes categorias funcionais. a começar pelo teto impôsto tendo por referência a retribuição dos Minis­tros de Estado, manifestamente irreal. 171 O Congresso

::-1 A Comissão que estudou o Reajustamento de 1966 veri­ficou a existência, naquela época. de Dirigentes da Administra­ção Indireta percebendo três vêzes mais do que um Ministro de Estado, o mesmo ocorrendo no confronto da retribuição dêstes com a de Membros do Congresso Nacional. Entendemos que irreal era a remuneração de Ministros de Estado e certa a dos demais.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 171

Nacional sempre demonstrou, no curso do processo legis­lativo, quando isso lhe era facultado pela Constituição, notória tendência para perder de vista o conjunto quan­do legislava para o particular, procedimento que impedia a normal constituição dos quadros funcionais. Tem havi­do acentuada timidez em considerar o regime de tempo integral e dedicação exclusiva como essencial em vários setores e posições-chaves e, também, em retribuÍ-lo ade­quadamente e fiscalizar sua operação. SOmente com o reajustamento de vencimentos de 1965 abriu-se uma ja­nela nesse sentido. Existe um vácuo na orientacão e coor­denação da política de pessoal, não sàmente pela ausência de informacões válidas e atualizadas sôbre mercado de trabalho _J e até mesmo a respeito de pessoal e dos salá­rios pagos pelo Govêrno - como também e precipuamen­te pelo enfraquecimento técnico do órgão central.

Entendemos que o problema do estabelecimento de uma política de pessoal para a Administração Direta terá de considerar. simultâneamente, três pontos básicos: 17:':

1. classificação, isto é, esquematização dos cargos, não só em função de suas atribuições e responsa­bilidades, da formação e especialização educa­cional que requerem e de sua hierarquização profissional, como também de sua posição na estrutura organizacional;

2. retribuição, isto é, esquematização dos salários em harmonia com o sistema de classificação, a política de salários adotada pelo Govêrno e as condições do mercado de trabalho;

3. orçamento, isto é, ênfase na concepção de que as provisões orçamentárias das unidades adminis­tI'ativas estabelecem o balizamento, entre outras, das despesas de pessoal, devendo a elas se ajusta-

17' Deixamos. deliberadamente, de pôr em destaque o Sis­tema do Mérito porque não podemos presumir que se continue. a esta altura. a descumprir a Constituição da República, que o consagra de maneira incisiva. Preferimos circunscrever o proble­ma aos três pontos básicos sem os quais não se introduzirá racio­nalidade no processo. Não desmerecemos, igualmente. a rele­vância de outros aspectos da Administração de Pessoal. Mas te­mos plena convicção de que sem o ataque aos três itens enun­ciados será inviável qualquer processo de efetiva recuperação.

172 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

rem as quantidades de cargos admissíveis na Unidade Administrativa (obviamente classifica­dos segundo o esquema de classificação, e remu­nerados de acôrdo com o esquema de remunera­ção) para execução do seu programa de trabalho.

Sem essas três colocações fundamentais, não há co­mo encaminhar a definição de uma política de pessoal adequada para a Administração Direta.

Temos também como pacífico que o problema só ad­mite uma solução gradativa, que poderia ser assim esbo­çada:

1.

2.

reconhecer que o problema da massa do funcio­nalismo existe, e para êle não há solução imedia­ta enquanto não se dispuser dos dados essenciais que permitam, pelo menos, saber com segurança quantos servidores há, sua distribuição por ca­tegoria, salários, qualificação, localização, etc. É também essencial esclarecer, no mais curto pra­zo, o regime horário de trabalho de cada uma dessas categorias, a fim de saber-se, objetivamen­te, a significação real dos salários atuais, quando confrontados entre si e com os do setor privado. Definido o regime horário de trabalho, é possível que se pudesse lançar mão do pagamento de ho­ras suplementares de trabalho, onde realmente se configurar necessário, dosando-se o recurso a êsse regime pelas dotações concedidas às unida­des administrativas; ou, ainda, adotar o regime de dois turnos de trabalho, aproveitando-se. sem novos ônus. a mão-de-obra ociosa. Essas medidas. associadas a outras visando a estimular a pro­dutividade, poderiam permitir o ajuste do fun­cionamento de unidades administrativas (ou de alguns de seus setores) ao regime de trabalho prevalecente no setor privado - como parece ser de todo aconselhável - justificando-se, então. que ganhe mais o empregado que trabalhar e produzir mais, noção que precisa ser urgente­mente incutida no funcionalismo civil; destacar o pessoal de Assessoramento da Admi­nistração Superior para tratamento específico:

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 173

3. caracterizar o pessoal de Direção Superior, para dar-lhe tratamento específico;

4. caracterizar o pessoal de Chefia (técnica ou Ad­ministrativa de relêvo) para dar-lhe tratamento à parte;

5. destacar o pessoal Técnico e Científico para as­segurar-lhe tratamento especial (examinando-se, em conexão com esta medida, a posição do pes­soal semitécnico);

6. o exame dêsses grupos de tão fácil caracteriza­ção e menos numerosos, segundo prioridade a es­tabelecer, permitiria destacá-los da massa do funcionalismo e acelerar, em relação a êles, a aplicação de soluções racionais. Essa orientação poderia tornar orçamentàriamente exeqüíveis as soluções que fôssem encontradas e factível, por­tanto, sua implementação;

7. quanto ao problema da mão-de-obra ociosa, con­viria considerá-lo sob tríplice aspecto: a. identificação da mão-de-obra ociosa; b. flexibilidade em reajustá-la e reabsorvê-la

em trabalho útil; c. instituição de centros de retreinamento.

Sabe-se, por experiências feitas no próprio Serviço Público Federal, que o simples afastamento de pessoal desnecessário dos locais de trabalho tende a aumentar a produtividade dos que continuam a prestar serviço ao órgão.

Administração Indireta

As entidades da Administração Indireta, embora res­pondam por interêsses específicos do Estado, precisam e devem comportar-se como entidades privadas, pois so­mente o clima do setor privado condiz com a realização dos seus objetivos e a produtividade que delas se espera. É no setor privado que atuam e é no mercado de trabalho -disputado pelo setor privado - que recrutam o pessoal especializado de que carecem, assim como é na Consolida­ção das Leis do Trabalho que buscam a disciplina para os seus problemas de pessoal, sendo, ainda na área restrita

174 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

em que atuam (v. g., indústria de petróleo, indústria de energia elétrica, indústria siderúrgica) que vão buscar os confrontos capazes de balizar o comportamento adminis­trativo da entidade, notadamente no que respeita aos quadros técnicos. Assim, as Sociedades de Economia Mis­ta, as Emprêsas Públicas e as Fundações instituídas pelo Poder Público devem ter seu pessoal sujeito à Legislação Trabalhista e aos métodos vigentes na área do setor pri­vado em que atuam. Quanto às Autarquias, não há razão para excluÍ-las também dessa regra, embora se deva re­conhecer que algumas delas poderiam, perfeitamente. permanecer como órgão da Administração Direta se esta dispusesse de boa organização. Como isso não ocorre, as Autarquias se situam em uma zona cinzenta, convindo tratá-las segundo os critérios gerais aplicáveis à Adminis­tração Indireta até que, em estágio mais avançado da reorganização administrativa do Serviço Público Federal, se possa chegar a uma solução mais definitiva. Deve-se acentuar, desde logo, que se distorções houver na apli­cação dêsses princípios, cumpre, evidentemente, corrigi­-los, nunca porém - e isso é muito importante - pela apUéação do falso remédio de trazer as entidades da Ad­ministração Indireta para o regime que prevalece na Ad­ministração Direta. Impende sublinhar que, no caso das Autarquias, a dualidade de situações (Autarquias sujeitas à legislação trabalhista e Autarquias sob o regime dos servidores públicos) terá, por vêzes, de ser admitida até que se examine, mais rietidamente, a posição de cada entidade e sua mais adequada classificação como Em­prêsa Pública, Sociedade de Economia Mista, Fundação ou como repartição comum. Parece-nos que a política de pessoal para a Administração Indireta poderia ter por fundamento os seguintes pontos:

1. exigência de um esquema de classificação que hierarquize os empregos segundo sua posição na estrutura organizacional e seu conteúdo ocupa­cional;

2. exigência de um esquema de salário que levasse em conta: a . o esquema de classificação da entidade; b. as condições do mercado de trabalho, iden­

tificadas segundo as técnicas modernas e

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relacionadas com a especificidade setorial da entidade;

c. as condicões econômico-financeiras da enti­dade; >

3. aplicação intensiva e extensiva da Legislação Trabalhista, de modo a afinar cada vez mais a Administração Indireta Com as práticas vigentes no setor privado.

É óbvio que as entidades da Administração Indireta observariam as diretrizes da Política Salarial do Govêrno para o setor privado. Preconizamos, portanto, que a po­lítica de pessoal na Administração Indireta obedeça a regras setoriais, compatíveis com a área em que atua cada entidade.

Orientação. Coordenação e Supervisão da Política de Pessoal

A Política Salarial Geral, embutida na programação econômica do Govêrno, coordena os aumentos gerais, mas não interfere, senão nesse plano geral e amplo, ou por via indireta, na política de pessoal das entidades. A referida Política Salarial, dirigida, na forma da lei, para o setor privado e entidades públicas de semelhante característica, influencia também, coerentemente, a orientação salarial do Govêrno para com o funcionalismo.

Cremos que interessa ao Govêrno conhecer e acom­panhar as políticas de pessoal vigente em tôda a Admi­nistração Federal sob três aspectos: 1. no que respeita à Administração Direta, formular a

política a seguir e, uma vez aprovada pelo Govêrno, supervisionar, coordenar e fiscalizar sua execução. É o que caracteriza o sistema de pessoal;

2. no que respeita à Administração Indireta, manter­-se informado sôbre seus têrmos. É tarefa que se inclui na missão de supervisionamento de compe­tência dos Ministros de Estado;

3. no que respeita às duas áreas, dispor de dados que lhe permitam conhecer a posição do problema de mão-de-obra no Servico Público Federal. Entende­mos que cada setor competente deve dispor dêsses dados naquilo que é de seu interêsse.

176 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Mas o Govêrno precisa ter uma visão global dos pro­blemas de pessoal, sem centralismos desnecessários e sem interferências que diminuam ou elidam a responsabilida­de dos administradores. Entendemos que isso configura a necessidade de órgão colegiado que atenda, entre outros, aos seguintes pontos:

a. reúna a contribuição de elementos credenciados do Serviço Público Federal, tanto da Adminis­tração Direta como da Indireta. e também do se­tor privado;

b. seja sensível às necessidades de mudança e de aprimoramento por todos sentida;

c. possa aconselhar o Govêrno, assistir o Congresso Nacional e manter comunicação efetiva com os administradores, as associações técnicas ou de representação do pessoal e com as Universidades e Centros de Pesquisa;

d. possa constituir-se em instrumento útil no estu­do e apreciação dos problemas de mão-de-obra no setor público, funcionando como instrumento de comunicação entre o Govêrno, como empre­gador direto ou indireto, e a coletividade.

8.4 ORIENTAÇAO ADOTADA NA REFORMA ADMINISTRATIVA

A Reforma Administrativa, como já foi visto, incli­nou-se pela seguinte orientação que se traduz no Título XI da Lei:

1) fixar diretrizes para revisão da política de pes­soal;

2) adotar providências de aplicação imediata; 3) configurar um órgão, na Presidência da Repú­

blica, dedicado exclusivamente aos assuntos de pessoal;

4) cuidar do Assessoramento Superior da Adminis­tração Civil.

Examinemos cada um dêsses pontos.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 177

Revisão da Política de Pessoal

Os princípios enunciados para a revisão da política de pessoal guardam harmonia com os ensinamentos da Administração de Pessoal e podem servir de motivação útil para a grande reforma que se impõe. Nota-se que, em certos tópicos, dão relêvo a aspectos de grande signifi­cação para a modernização do Serviço Civil, e foram des­curados até agora. Assim é que, enquanto o primeiro prin­cípio dá justo e correto destaque à "valorização e digni­ficação da função pública e do servidor público", meta essencial de uma política saudável de administração de pessoal no Serviço Público Federal, segue-se, imediata­mente, o princípio de "aumento da produtividade" cuja significação para a Administração Pública, para os servi­dores e para a coletividade é, em nossos dias, tão acerta­damente enfatizada. No que tange à profissionalização e aperfeiçoamento do serviço público, procurou-se acentuar a importância do acesso e a "escolha de ocupante de fun­ções de direção e assessoramento", capítulo esquecido na política de pessoal vigente.

Cremos que, pela primeira vez em nossa legislação - apesar de contarmos, sob a influência do jurisdicismo, com dois Estatutos dos Funcionários - se faz menção a normas éticas, problema de transcendental importância na Administração Pública, ao consagrar-se como princí­pio da política de pessoal a "conduta pautada por normas éticas cuja infração incompatibilize o servidor para a fun­ção". A preocupação com a "constituição de quadros diri­gentes, mediante formação e aperfeiçoamento de admi­nistradores capacitados a garantir a qualidade, produti­vidade e continuidade da ação governamental, em conso­nância com critérios éticos especialmente estabelecidos", harmoniza-se com a preocupação da Reforma Adminis­trativa ao propiciar meios que sirvam de base segura pa­ra sua efetiva implementação, nas sucessivas fases de sua aplicação, retirando-a do jurisdicismo inconseqüente e do teoricismo vazio para situá-lo no plano das realizações que não podem prescindir de agentes capacitados para a consciente e qualificada utilização dos instrumentos em que se apóia. A classificação é também mencionada, dan­do-se ênfase ao nível educacional exigido pelos deveres e responsabilidades do cargo, à experiência que seu exer-

178 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

cício requer e às condições do mercado de trabalho. Quanto à organização dos quadros funcionais, procura-se relacioná-la aos interêsses de recrutamento nacional para certas funções, e ao mercado de trabalho regional ou lo­cal, em relação a outras, visando a bloquear a tendência centralista e a constituição de quadros únicos, distan­tes das necessidades das repartições e das condições reais do mercado de trabalho. Erigiu-se em princípio, em con­sonância com a política geral de descentralização e de refôrço à autoridade dos chefes de serviço, a "concessão de maior autonomia aos dirigentes e chefes na adminis­tração de pessoal, visando a fortalecer a autoridade de comando, em seus diferentes graus, e a dar-lhes efetiva responsabilidade pela supervisão e rendimento dos ser­viços sob sua jurisdição". Sàmente êste princípio repre­senta tal inversão nos procedimentos que, em matéria de Administração de Pessoal, vínhamos adotando há perto de trinta anos, a caracterizar profunda modificação na política de pessoal e a exigir atitude totalmente diversa daquela a que se acostumara da parte do órgão Central do Sistema de Pessoal, levando a Reforma Administrativa a reformulá-lo por ter consciência de que os padrões de trabalho em vigor não permitirão atingir-se os novos objetivos. O princípio de que "a fixação da quantidade de servidores, de acôrdo com as reais necessidades de funcio­namento de cada órgão, efetivamente comprovadas e avaliadas na oportunidade da elaboração do orçamento­programa, e estreita observância dos quantitativos que foram considerados adequados pelo Poder Executivo no que se refere aos dispêndios de pessoal", corrige o descaso até agora manifestado pela relação entre efetivo de servi­dores e provisões orçamentárias, conduzindo, conforme já foi exposto, ao descalabro orçamentário no que diz res­peito às despesas de pessoal, principal item do Orçamen­to da União. Essa norma terá, já agora, de ser objeto de atenção muito especial do Poder Executivo, diante da proibição constitucional de serem autorizadas despesas sem crédito ou além dos créditos votados, e limitação dos gastos de pessoal, com prazo de efetividade desta última medida fixado para 1970. O quadro está, assim, armado para que o problema de pessoal passe a ser tratado com a objetividade que somente as preocupações financeiras

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 179 ------logram impor. A situação do pessoal ocioso é expressa­mente mencionada, tomando-se consciência de que se trata de difícil, complexo e importante problema numa política de pessoal para o Serviço Público Federal, nos próximos anos. E, finalmente, além do incentivo à apre­sentação de sugestões pelos servidores e do estímulo ao associativismo, cumpre assinalar a determinação do "es­tabelecimento de mecanismos adequados à apresentação por parte dos servidores, nos vários níveis organizacionais, de suas reclamações e reivindicações, bem como a rápida apreciação, pelos órgãos administrativos competentes, dos assuntos nelas contidos", por se tratar de medida que de­verá cobrir a verdadeira terra de ninguém atualmente existente. Tais mecanismos inexistem no Serviço Civil brasileiro, embora sua presença seja recomendada por to­dos quantos hajam estudado os problemas de pessoal e, em todos os países desenvolvidos, tenha-se encontrado a fórmula mais condizente com a sua evolução administra­tiva. Predomina ainda entre nós o formalismo do re­querimento e do recurso, por via hierárquica normal, quando é sabido que muitos dos problemas de relações humanas no trabalho simplesmente não encontram so­lução quando sujeitos a tramitação e apreciação tão rí­gida. A inovação, incluída sob a forma de princípio na Reforma Administrativa, é extremamente auspiciosa, e empresta sentido atualizado às diretrizes aprovadas com o objetivo de obter-se uma política de pessoal moderna. realista e operacional.

Duas medidas da maior significação para a melho­ria do Serviço Público Federal foram acolhidas neste Ca­pítulo da Reforma Administrativa. A primeira permite contratar, nos têrmos da legislação trabalhista, especialis­tas para atender às exigências de trabalho técnicos em institutos, órgãos de pesquisa e outras entidades especia­lizadas da Administração Direta ou Autarquia, segundo critérios que, para êsse fim, serão estabelecidos em regu­lamento. Flexibiliza-se. por essa forma, o emprêgo de pes­soal especializado em órgãos que dispõem, normalmente, de pessoal sujeito ao regime do funcionalismo público, com vistas a permitir que possam acompanhar as neces­sidades do mercado de trabalho e, em relação a pessoal difícil de recrutar pela alta qualificação, pela escassez no

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mercado de trabalho e pela sua grande valorização pro­fissional, possam aquelas unidades administrativas com­portar-se razoàvelmente em relação a outras agências de recrutamento, inclusive as de natureza governamental que disponham, institucionalmente, de flexibilidade de ação. A segunda medida consiste em permitir que, nas mesmas condições anteriores, os Ministros de Estado pos­sam contratar os serviços de consultores técnicos e espe­cialistas por determinado período, dando-se margem, as­sim, a que o Govêrno possa convocar elementos de alta qualificação para prestar-lhe colaboração temporária, pa­gando-os também razoàvelmente. Nas condições em que tem hoje em dia de atuar, não pode a cúpula governa­mental prescindir de certos consultores que não têm interêsse em empregar-se definitivamente na Administra­ção Pública ou, em vista de outros compromissos, não podem a ela vincular-se inteiramente, mas de cuja con­tribuição técnica não podem os governos prescindir, in­clusive para obter ângulos de apreciação estranhos à sistemática administrativa e, assim, cap3.citar-se a olhar os problemas sob dimensões mais amplas e profundas. Trata-se de duas providências destinadas a habilitar o Govêrno a agir com a flexibilidade de que não pode nem deve prescindir, sem lançar mão de subterfúgios. Do­ta-se o Poder Executivo de meios de ação, no que res­peita a pessoal especializado. de que nunca dispôs sob a curta visão da política de pessoal em vigor.

Medidas de Aplicação Imediata

Não fôssem as circunstâncias e fatôres presentes no quadro da Administração de Pessoal existente e por nós já analisados e, por certo, êste Capítulo deixaria de com­por a Lei de Reforma Administrativa. Acumulavam-se problemas sem que o órgão Central de Pessoal ofereces­se soluções e alternativas aceitáveis pelo Govêrno, vendo­se êste, na fase final de estudo da Reforma, face a face com várias proposições oriundas da COMESTRA, dos Mi­nistérios e de outros órgãos de assessoramento governa­mental. Na verdade, quando a COMESTRA organizou um primeiro rol de medidas cuja adoção imediata se im­punha, cabia ao DASP, representado na Comissão Espe­cial, chamar o assunto para a sua área de estudo, apro-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 181

fundar o exame dos itens arrolados e propor ao Govêrno as soluções cabíveis. Tendo optado por uma atitude de inércia, o que se constatou na fase final da primeira fase da Reforma foi avolumarem-se os tópicos e aumentarem as recomendações ao Govêrno no sentido de transformá­las em textos legais. Vamos, porisso, nos limitar a co­mentar os principais pontos dêste Capítulo da Lei.

O problema de pessoal ocioso, o mais agudo, sem dú­vida, com que se confrontava o Govêrno, foi objeto de dis­posições especiais visando:

1. a identificar êsse pessoal, permitindo que se dis­pusesse de informes essenciais à sua caracteriza­ção;

2. à redistribuição dêsse pessoal, conforme as ne­cessidades dos serviços;

3. à fixação de normas orçamentárias transitórias que permitissem o imediato aproveitamento do servidor e oportuna regularização da classifica­ção de seu pagamento;

4. à exoneração, disponibilidade ou dispensa dos que não puderem ser aproveitados;

5 . à proibição da admissão de novos servidores en­quanto houver pessoal ocioso a aproveitar, pos­suidor da devida qualificação;

6. à criação de centros de redistribuição e aprovei­tamento de pessoal.

É a primeira vez que, em caráter geral. se tomam medidas objetivas para conhecer a quantidade e as qua­lificações do pessoal ocioso e redistribuí-Io segundo as ne­cessidades dos serviços e as qualificações do pessoal. As perguntas que ocorrem correspondem a testes fortemen­te negativos da política de pessoal em vigor: por que o ór­gão Central de Pessoal não cuidou disso antes? Por que não possuía informes quanto a êsse problema? Por que não dispunha de mecanismos operacionais para executar as medidas cabíveis?

Outra providência de grande importância é a deter­minação de que, "ressalvados os cargos em comissão de­finidos em ato do Poder Executivo como de livre esco­lha do Presidente da República, o provimento em cargos

182 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

em comissão e funções gratificadas obedecerá a critérios" que levem em conta, entre outros:

1 . possuir o funcionário a condição de funcionário efetivo, ocupando cargo que guarde relação com a comissão;

2. comprovação de possuir o funcionário experiên­cia adequada e curso de especialização (ou, caso contrário, comprometer-se a fazê-lo);

3. obrigar-se o funcionário, interessando ao serviço ao regime de tempo integral, com 40 horas sema­nais de trabalho.

Deseja a Reforma Administrativa que as chefias se­jam preenchidas por quem possua experiência e quali­ficação que passam, de imediato, a representar um incen­tivo aos que os fizeram ou se dispõem a fazê-lo. A provi­dência em tudo se entrosa com o princípio de aperfei­çoamento dos quadros dirigentes, inscrito na Reforma, mas esta quer vê-lo aplicado imediatamente no caso das funçõe5 de direção e chefia, que não podem aguardar os estudos recomendados.

Importante contribuição para bem definir a nature­za da prestação de serviços à Administração Federal, com as características ou não de servidor público, deve ser en­contrada na norma inscrita na Reforma Administrativa de que "a colaboração de natureza eventual à Administra­ção Pública Federal sob a forma de prestação de serviços, retribuída mediante recibo, não caracteriza, em hipótese alguma, vínculo empregatício com o Serviço Público Civil, e sàmente poderá ser atendida por dotação não classifi­cada na rubrica PESSOAL e nos limites estabelecidos nos respectivos programas de trabalho". Conceitua-se, por essa forma, a prestação de serviços eventuais que pessoas rendam ao Estado, sem o menor sentido de estabelecer­se qualquer vínculo com a Administração Federal. Um artífice que é chamado para realizar reparos, um mensa­geiro que é incumbido de entregar uma encomenda, um motorista que faz um transporte, têm os serviços ocasio­nais que prestam à Administração Pública retribuídos segundo as praxes habituais, sem que adquiram a condi­ção de servidores públicos. Soluciona-se uma questão que tantos equívocos de interpretação provocou no passado e

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 183

põe-se um paradeiro na pretensão, que se renova de tem­pos em tempos com imenso prejuízo para a eficiente or­ganização do Serviço Civil, de inclusão daqueles que pres­tam serviços eventuais nos quadros do funcionalismo.

Departamento Administrativo do· Pessoal Civil

o Departamento Administrativo do Pessoal Civil, criado pela Reforma Administrativa para substituir o Departamento Administrativo do Serviço Público - ex­tinto pela Lei - 1,3 e como êste situado na Presidência da República, é o órgão central do sistema de pessoal, e, nessa condição, responsável pelo estudo, formulação de diretrizes, orientação, coordenação, supervisão e contrô­le dos assuntos concernentes à administração do pessoal civil da União. A Reforma Administrativa inclinou-se pela atribuição das funções de cúpula do sistema de pessoal a um único órgão, que passasse a cuidar, exclusivamente, dos assuntos relativos ao pessoal civil. Desembaraçava­se. assim, a Administração Federal, da idéia de ser im­prescindível, para o bom funcionamento do Serviço Pú­blico Federal, contar-se com um Departamento de Admi­nistração Geral no nível da Presidência da República, se­gundo concepções rígidas decorrentes da aplicação da teoria de Administração Geral. Essa rigidez conduzira, pa­radoxalmente, a resultado inteiramente contrário ao que visava aquela teoria, ou seja, o gradativo enfraquecimen­to do órgão central de Pessoal, quer internamente, quer em relação à Administração Federal. O exame das razões que conduziram a isolar-se em um único órgão as fun­ções de pessoal merecem análise a ten ta, pois permitem verificar, objetivamente, os méritos e os deméritos da concepção que, em 1938, deu origem à criação do DASP.

A COMESTRA estudou, pormenorizadamente, os sis­temas de serviços auxiliares, dela partindo a recomenda­ção de incluir-se junto à Presidência da República um órgão de cúpula, exclusivo para o sistema de pessoal, ao invés de um órgão de cúpula abrange dor de vários siste­mas, compreendendo Pessoal, Orçamento, Organização, Material e Edifícios Públicos. Preocupava-se a COMES-

:"" Decreto-lei n.o 200, Art. 212.

184 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

TRA em modernizar certas concepções referentes às ati­vidades auxiliares da administração, ajustando-se a loca­lização dos órgãos de cúpula dos respectivos sistemas à recomendação presidencial de desconcentração dos servi­ços da Presidência da República, e de se encontrarem meios de superar o atraso e o agudo estado de ineficiên­cia atingido pelos chamados órgãos de Administração Ge­ral e sua inadaptação às necessidades de uma Adminis­tração Federal moderna, como a que objetiva a Reforma Administrativa.

As idéias de Administração Geral que serviram de apoio e fundamento à criação do Departamento Adminis­trativo do Serviço Público - o DASP - ganharam cor­po entre nós com o funcionamento do Conselho Federal do Serviço Público Civil, criado pela Lei n.O 284, de 1936, e se reforçaram com a Constituição de 1937 que determi­nou, em seu Artigo 67, a organização junto à Presidên­cia da República de um Departamento Administrativo. com as atribuições então especificadas, envolvendo, em essência, os assuntos orçamentários e de organização dos serviços. Disso resultou a criação, pelo Decreto-Lei n.o 579, de 30 de julho de 1938, do DASP com as atribui­ções previstas na Constituição de 1937 e mais as de admi­nistração de p~ssoal - até então exercidas pelo Conselho Federal do Serviço Público Civil - e de administração de ma!erial. A parte referente a E_<!ifícios Públicos só mais tarde, em 1943, passaria a compor a estrutura funcional do DASP. O regime unitário que pràticamente então vi­gorava no País encontrou, na concepção do DASP, ins­trumento válido para as necessidades da época, quando o Chefe do Poder Executivo exercia suas funções através de três elementos principais:

1) o DASP, para as atividades-meio; 2) os Ministérios, para as atividades-fim; 3) a Comissão de Estudos de Negócios Estaduais

(que funcionava junto ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores), para os assuntos de Ad­ministração Estadual.

Interessante é observar que, no campo da adminis­tração orçamentária, precisamente aquêle que levou o Govêrno a introduzir no texto constitucional o dispositi-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 185

vo análogo ao da Lei norte-americana de 1921 (Budget and Accounting Act), jamais foram tranqüilas as relações entre o DASP e o Ministério da Fazenda, ambos dirigidos por homens públicos experimentados e que gozavam de enorme prestígio junto ao Chefe do Govêrno. A concilia­ção foi possível pelo adiamento da criação de uma Di­visão de Orçamento no DASP, o que só viria a ocorrer em 1945. Nesse ínterim, a tarefa orçamentária ficou a cargo de uma Comissão de Orçamento, presidida pelo Ministro da Fazenda e coordenada pelo Presidente do DASP. A determinação expressa da Constituição de 1937 seria sà­mente implementada, quanto ao Orçamento - razão pre­cípua do texto constitucional - oito anos após. O histo­riador dêsse período da vida brasileira há de assinalar aquela anomalia e esta curiosidade: ao mesmo passo em que assim agia em relação ao Orçamento, a Constituição de 1937 contentava-se, a rigor, em reproduzir, quanto a p'essoal, o texto da Constituição de 1934, o qual, como se sabe, deixou raízes até os nossos dias e trata de Estatuto dos Funcionários, e não de conceituar a Função Pública. Acrescente-se que nem a Constituição de 1937 nem o Estatuto dos Funcionários, promulgado em 1939, usaram a expressão Administrativa de Pessoal, numa demons­tração inequívoca da preponderância, nessa área, do ân­gulo jurídico sôbre o ângulo técnico-administrativo. O que deve ser destacado é que andamos, realmente, a trans­plantar para a nossa Administração Pública certos órgãos e mecanismos sem suficiente conhecimento das técnicas que deviam acioná-los. Conseqüentemente, instituciona­lizamos um sistema de pessoal extremamente rígido e uma classificação orçamentária que insistia em dar relê­vo aos elementos secundários, aos itens de composição dos custos (pessoal, material, serviços e encargos, obras), es­maecendo a idéia de função, de unidade administrativa operacional. Centralizamos de tal modo, nos órgãos de administração geral dos Ministérios, a movimentação de recursos orçamentários de pessoal, de material, etc., que nenhum tempo lhes restou, pràticamente, para cuidarem de seus problemas específicos, no nível ministerial. O grande e meritório esfôrço feito pelo DASP para especia­lizar pessoal administrativo produziu frutos limitados, pois que se reduziu, em essência, aos próprios quadros do

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DASP, em virtude da criação dos cargos de Técnico de Administração, privativos daquele Departamento. Nem mesmo com assistentes de administração - também selecionados e aperfeiçoados para servir exclusivamente ao DASP - podiam contar os Ministérios. Isso impediu a consolidação de uma equipe administrativa habilitada a atender ao Serviço Público Federal, ao nível do Presidente da República e dos Ministros de Estado. Essa orientação se ajustava perfeitamente à idéia então predominante -e em inteira sintonia com o pensamento governamental da época - de tudo centralizar, e não apenas em relação à parte normativa, de diretrizes. Não se confiava nos ór­gãos de periferia, alegando-se que não estavam habilitados a realizar certas funcões ou tomar certas decisões; mas nenhuma providência foi adotada, em profundidade, para levá-los a efetivamente se habilitarem. O resultado é que os Ministros de Estado e os principais chefes de serviço passaram a atribuir ao DASP tudo quanto se relacionava com Administração Geral. Estabeleceu-se e consolidou-se no tempo uma dicotomia ortodoxa, criando-se duas áreas estanques: atividades-fim e atividades-meio. Enfraque­ceu-se a autoridade e a responsabilidade dos administra­dores. Alcançaram-se, em resumo, resultados opostos aos visados nas lições de WILLOUGHBY. A concepção produziu frutos enquanto a autoridade centralizadora era inques­tionável e o estilo do Govêrno era o da centralização. A mudança de 1945 fêz-se, de pronto, sentir no mecanismo instalado: Ministros de Estado passaram a reivindicar autoridade também em relação às atividades-meio. E, co­mo era de esperar, mal assessorados em seus Ministérios e encontrando um Presidente da República de emergên­cia, pouco afeito às questões administrativas, encontra­ram campo propício para a aprovação de medidas assis­temáticas, descoordenadas. 174 Como sempre ocorre em tais momentos, o nepotismo e os interêsses pessoais en­contraram campo fácil para florescer. Sobreveio a crise e, em conseq~ência, podaram-se os podêres do DASP, que-

171 "Realmente, eleva-se a 80 o número de decretos-leis expedidos sôbre reestruturações parciais de carreiras e cargos. Daí a seqüência dos despautérios que se observam, em matéria de remuneração, nos quadros do funcionalismo civil, conforme ficou anteriormente documentado" (Exposição de Motivos n.o 1.427, de 5 de agôsto de 1952, do DASP) .

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brando-se a mística de sua organização. A função do Ma­terial foi deslocada para o Ministério da Fazenda. O DASP passou a viver uma vida anêmica, da qual procurou libertar-se patrocinando o Plano SALTE, improvisa­ção de programação geral cedo fenecida por não possuir lastro financeiro viável, mas que contribuiu para desen­cadear a idéia de planejamento. Ao retornar à chefia do Poder Executivo, em 1951, o Presidente Getúlio Vargas não mais pensou em recompor o DASP em sua primitiva organização de 1938, preferindo apoiar as medidas de recuperação da política de pessoal. Haveria alguma nova razão ou algum nôvo fato que justificasse fazê-lo em 1965? A COMESTRA respondeu negativamente a esta indagação, por entender que tínhámos condições de dar às atividades auxiliares organização mais conveniente pa­ra a Administração Federal, sem regredir-se a uma es­quematização que apenas teàricamente seria lícito admi­tir pudesse vir a responder, na prática, às necessidades atuais. Ponderou a Comissão Especial que ninguém, àquela altura. cogitaria da absorção, pelo Banco do Bra­sil. das funcões do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico, 'do Banco do Nordeste, do Banco da Ama­zônia ou mesmo do Banco Central e do Banco Nacional de Habitação, sob o fundamento de que a justaposição em um só órgão dessas funções de natureza bancária ensejaria maior eficiência ao funcionamento do siste­ma. Por que, então, justapor funções tão distantes como as de Pessoal e Material? Abandonado o argumento da centralização a todo preço, perde a concepção original do DASP sua consistência e sua razão preponderante de exis­tir. Na verdade, não haveria como harmonizar a concep­ção de um Departamento de Administração Geral junto à Presidência da República com os princípios de descen­tralização administrativa e de desconcentração da Pre­sidência da República que a COMESTRA advogava, e que contavam com o decidido apoio do Govêrno. Impunha-se, por tudo isso, encontrar solução mais racional e que me­lhor se ajustasse ao sentido de modernização adminis­trativa e aos princípios considerados básicos para a Re­forma Administrativa, levando-se, também, em conta:

1. que não se conhece país bem organizado que se inspire na mesma fonte para adotar a solução

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Departamento de Administração Geral. Nos Es­tados Unidos da América tal solução não é ado­tada no plano federal;

2. a atuação do DASP, que a COMESTRA obser­vara, não justificava poder-se confiar, sem apre­ensões, na eficiência de seus métodos e das técni­cas que vinha adotando, notando-se, nitidamen­te, pouco rendimento naquele órgão, em todos os seus setores.

Demais, ficara assentado que as funções de Orçamen­to passariam ao Ministério do Planejamento, o qual, na posição de Ministério Extraordinário, delas já se vinha desincumbindo. As funções de Material não mais se en­contravam localizadas no DASP, desde 1946, parecendo à COMESTRA que, diante da conveniência de instituir-se um Sistema de Serviços Gerais, aconselhável seria mantê­las no Ministério da Fazenda juntamente com as de Ad­ministração Patrimonial - carentes de profunda refor­mulação - com absorção também da pequena parcela de encargos ainda conferidos ao DASP no que respeita aos edifícios públicos. Mas o que preponderou no julgamento da Comissão Especial foi a preocupação de se isolar a fun­ção Pessoal, a fim de que seja objeto de um grande esfôr­ço concentrado de reformulação e organização. Daí a re­comendação que apresentou ao Govêrno no sentido da manutenção junto à Presidência da República tão-sàmen­te de um Departamento que cuidasse, com exclusividade. dos problemas de Administração de Pessoal.

As recomendações da COMESTRA foram reexami­nadas, meticulosamente, no curso final dos trabalhos de Reforma Administrativa, decidindo-se, finalmente, a cria­ção do Departamento Administrativo do Pessoal Civil.

As atribuições do Departamento, como órgão Cen­tral do Sistema de Pessoal, foram devidamente especifica­das na Lei para fortalecer a sua atuação. Criou-se junto ao mesmo o Conselho Federal de Administração do Pes­soal, como órgão de consulta e colaboração no concernen­te à política de pessoal do Govêrno e que opinará na esfe­ra administrativa, quando solicitado pelo Presidente da República ou pelo Diretor-Geral do Departamento, nos assuntos relativos à administração do pessoal civil, inclu-

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sive quando couber recurso de decisão dos Ministérios, conforme se estabelecer em regulamento. Abre-se, assim, uma j anela para a Administração de Pessoal no Serviço Público Federal fora das limitações estruturais do siste­ma de pessoal. O Colegiado terá uma composição que lhe garante visão abrangedora dos problemas de pessoal, pois compõem-no, além do Diretor-Geral do Departamento, dois funcionários, um da Administração Direta e outro da Indireta, ambos com mais de vinte anos de Serviço Pú­blico da União, com experiência em administração e rele­vante fôlha de serviços; um especialista em Direito Admi­nistrativo; e um elemento de reconhecida experiência no setor privado. Trata-se de inovação que, se fôr cuidado­samente implementada, no momento em que se procura fixar uma adequada política de pessoal, poderá abrir no­vas perspectivas numa área que se burocratizou e não lo­grou apartar-se de jurisdicismo divorciado dos ensina­mentos da Administração de Pessoal e das necessidades do Serviço Público Federal.

A Reforma Administrativa instituiu um Centro de Aperfeiçoamento para cuidar das medidas relacionadas com o recrutamento, seleção, aperfeiçoamento e adminis­tração do Assessoramento Superior da Administração Ci­vil, do aperfeiçoamento de pessoal para o desempenho dos cargos em comissão, das funções gratificadas e de outras funções de supervisão ou especializadas. Assegurou-lhe a condição de órgão Autônomo e conferiu-lhe ampla mar­gem para a celebração de convênios, acôrdos ou contratos para a execução de suas funções. Trata-se de organismo inteiramente nôvo, cuja função principal está ligada ao assessoramento superior, a seguir apreciado.

Assessoramento Superior da Administração Civil

Ao reconhecimento da indispensabilidade de órgãos centrais, adequadamente estruturados e ajustados às no­vas diretrizes e princípios aprovados pela Reforma Admi­nistrativa, teria de corresponder o reconhecimento de não se poder prescindir de pessoal qualificado para compor os mesmos órgãos na parte de direção e no que concerne a técnicos especializados. Reconheceu-o a Reforma Admi­nistrativa: "A missão confiada aos órgãos Centrais terá

190 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

de ser cumprida com a colaboração de staff plenamente capacitado que assessore os Ministros de Estado e os au­xilie na direção dos Ministérios. Sem essas equipes, de nada valeria a idéia, realmente nova, de instituir órgãos centrais, ou melhor, seria o mesmo que contar com um barco sem se dispor de tripulação apta para movimentá­lo." 17.-, Em conseqüência, estabeleceu a Lei o delineamen­to do assessoramento superior da Administração Civil e determinou que o Ministro responsável pela Reforma Ad­ministrativa estudasse sua composição definitiva. Insti­tuiu, ao mesmo tempo, um Centro de Aperfeiçoamento para cuidar, precipuamente, dêsse pessoal.

No delineamento preliminar, previu a Lei que os car­gos em comissão relacionados com os órgãos centrais se­jam preenchidos por pessoas da Administração Direta ou Indireta ou do setor privado, abrindo as portas do recru­tamento em busca da colaboração dos elementos o mais qualificados possível, onde quer que sejam encontrados. No que respeita ao pessoal técnico especializado, admitiu­se sua contratação, mediante recrutamento no setor pú­blico ou no setor privado - ainda com o objetivo de am­pliar a área de recrutamento - nos têrmos da legislação trabalhista. O funcionário, enquanto no desempenho dês­ses encargos, ficará afastado do cargo que ocupar. Abriu­se, portanto, margem para o atendimento imediato das necessidades de implantação dos órgãos centrais, sem prejuízo de ser também imediatamente estudada a com­posição, em têrmos definitivos, do corpo de assessoramen­to superior.

Não será demais insistir na imprescindibilidade dês­se pessoal especializado para alcançar-se a implantação da Reforma Administrativa em suas diversas fases de execução. A Justificativa da Reforma deixa bem claro que o Serviço Público Federal não dispõe, presentemente, de quadros realmente preparados para essa missão; que sem elementos tecnicamente qualificados e experientes, qualquer reforma provará, no tempo, sua inocuidade, re­duzindo-se - como tantas outras iniciativas - a re­forma no papel; que sem êsses elementos não haverá co­mo garantir eficácia e continuidade aos propósitos gover-

,,; Justificativa, item V.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 191

namentais de reformulação da Administração Federal; que, na Administração Direta, somente os Ministérios Mi­litares e o Itamarati dispõem de staff dessa natureza; que de nad~ valerá conceber uma esquematização estrutural moderna para os Ministérios se não fôr possível equipá-la com elemento humano profissionalmente exprimentado e que possa ser submetido a processo de intenso e contínuo preparo e aperfeiçoamento para a missão de assessorar a direção superior da Administração Civil.

Entendemos ser êste um dos pontos cruciais da Re­forma Administrativa, parecendo-nos que houve até certa timidez do Govêrno ao preferir a linha de ação enuncia­da, em lugar de determinar, desde logo, na Lei de Refor­ma, a composição do assessoramento superior. Não dese­jou, por certo, o Govêrno, impor uma solução definitiva à Administração que lhe sucederia, preferindo dar-lhe meios de agir enquanto estudasse a melhor solução. Re­ceamos, porém, que isso importe em novas protelações, agravando um quadro inteiramente insatisfatório e inca­paz de apoiar eficiente, orgânica e coordenadamente a cúpula do Poder Executivo. O problema permaneceu por tantos anos abandonado que cada dia que passa repre­senta maior perda de substância no trabalho governa­mental, sobretudo em construir-se as novas bases em que se deverá apoiar a política de pessoal e a própria imple­mentação da Reforma Administrativa. Ademais, o Centro de Aperfeiçoamento tem missão tão complexa e ampla a cumprir que, se não se cuidar imediatamente do assesso­ramento superior, poderá verificar-se um subdimensiona­mento na estruturação de um organismo que se julga vi­tal para que os membros do assessoramento superior não se desvinculem da obrigação de submeter-se a contínuo aperfeiçoamento. condição indispensável para que pos­sam exercer suas funções em bases técnicas satisfatórias, com um conhecimento aprofundado e sempre atualizado das realidades brasileiras, e comportar-se em harmonia com os ditames de uma administração democrática. 17í;

17. o corpo de assessoramento superior assessora o Govêrno (Presidente da República e Ministros de Estado) em relação aos problemas administrativos - em sentido amplo - que preocupam o Poder Executivo ou exigem uma ação administra­tiva dêste, coordenada, coerente, dinâmica e eficaz, não na base de idéias e teorias preconcebidas ou improvisadas, mas em

192 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ----------------

8.5 VIABILIDADE DA REABILITAÇAO DA POLíTICA DE ADMINISTRAÇAO DE PESSOAL CIVIL

A Reforma Administrativa abriu caminhos que po­derão contribuir para a reabilitação da Administração do Pessoal Civil. Formularam-se diretrizes construtivas, re­organizou-se o órgão central de pessoal, instituíram-se medidas que permitem recrutar pessoal especializado, criou-se um Centro de Aperfeiçoamento. Ao lado disso, traçaram-se normas para o levantamento e redistribuição ordenada do pessoal ocioso e deu-se a indispensável ên­fase ao tratamento orçamentário dos dispêndios de peso soaI.

Que embaraços podem surgir a que as trilhas sejam percorridas?

Em primeiro lugar, não se pode desconhecer o pe­rigo de sub dimensionamento pelo Departamento Admi­nistrativo do Pessoal Civil, se não lograr libertar-se das atitudes de precondicionamento a que se acostumara e se não se reequipar tecnicamente para as importantes e enormes tarefas que tem a desempenhar. O Ministro res­ponsável pela Reforma Administrativa encontrará, neste particular, uma área extremamente carente de sua lide­rança, inspiração e coordenação, circunstância que colo­ca no primeiro plano das providências imediatas, mais uma vez, a constituição do Escritório de Implantação da Reforma.

Em segundo lugar, o perigo da falta de celeridade e de sentido prioritário em cuidar do assessoramento supe-

atenção ao processo administrativo, aos objetivos da Administra­ção, levando em conta os aspectos sociais e econômicos, assim como os políticos e os administrativos. Terá, por isso mesmo, de estar afinado com a ecologia brasileira. saber como se aciona o instrumental administrativo, aprender a valer-se da coordena­ção. perseguir resultados, ajustando-se aos objetivos sócio-econô­micos que o País escolher como objetivos nacionais. Caberá a êsse núcleo bem constituído e permanentemente aperfeiçoado liderar e conduzir no tempo o impulso renovador da Reforma Administrativa, até que se consolidem suas bases, impedindo sua desagregação no fundamental. Sua luta, tenaz e decidida, contra o jurisdicismo e o formalismo será vitoriosa na medida em que conseguir empunhar a técnica melhor e mais atualizada.

A REFOR~A AD~INISTRATIVA DE 1967 193

rior da Administração Civil e do Centro de Aperfeiçoa­mento, segundo os padrões e com a finalidade com que fo­ram concebidos e não são geralmente conhecidos. Há o permanente perigo de invocar-se razões de economia pa­ra protelar o ataque a providências sem as quais o vácuo existente na área de pessoal não será preenchido. Será preciso ter a visão exata do problema, pois que aqui se trata de investir agora para colhêr resultados adiante e de criar condições que permitam administrar o Serviço Público Federal em bases racionais e produtivas, capa­zes, portanto, de trazer economia para os cofres públicos. Não será possível esquecer esta verdade fundamental: pa­ra melhorar a Administracão Federal será necessário fa­zer dispêndios, somente em parte compensáveis, de ime­diato, pela compressão de outros gastos.

Em terceiro lugar, existe o perigo da perda de con­trôle das despesas orçamentárias de pessoal ou o temor e tibieza em equacionar e pôr em execução uma política austera e realista no que concerne ao orçamento de pes­soal. Êste ponto exige maior desenvolvimento. A Consti­tuição prescreve que "a despesa de pessoal da União, Es­tados ou Municípios não poderá exceder de cinqüenta por cento das respectivas receitas correntes", E7 determinan­do que a redução deverá efetivar-se "até 31 de dezembro de 1970".17S OS encargos atuais com pessoal devem si­tuar-se pouco acima de sessenta por cento. Os dez por cento de excesso atuais corresponderão, provàvelmente, à faixa de NCrS 700,800 milhões, o que evidencia as dificul­dades que terá de enfrentar o Govêrno em dar cumpri­mento ao preceito constitucional, aspecto que, por certo, estará sendo objeto de estudo pelos órgãos competentes. Sabe-se que a remuneração atual dos funcionários é bas­tante insatisfatória, sobretudo para as categorias de di­reção, chefia, especializadas e, de modo mais amplo, para aquelas que exigem de seus titulares horas de trabalho idênticas às que prevalecem no setor privado. Melhorar a retribuição dessas categorias constitui necessidade geral­mente reconhecida, e que exigirá maiores dispêndios por parte do Govêrno. A obtenção dos recursos requeridos po-

17i Constituição, Art. 66, § 4.°. 178 Constituição, Art. 180.

194 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

derá fazer-se mediante compressão das despesas de pes­soal, medida a ser tentada por três vias principais:

1 . não preenchimento de vagas. Isto é possível, especial­mente mediante aproveitamento das vagas existen­tes ou que ocorrerem de pessoal ocioso. Mas há, de qualquer modo, lugares que não podem deixar de ser preenchidos para atender a serviços inadiáveis ou es­pecializados;

2. contratação de serviços, em lugar da criação de no­vos cargos. Trata-se de medida recomendada pela Re­forma Administrativa e que poderá, em muitos casos, ser aplicada quando se tratar de novos serviços. Mas que se torna de pronto impraticável, em grande par­te, quando há servidores disponíveis e que não po­dem ser desligados do serviço público. O aproveita­mento dêsse pessoal exige boa organização do siste­ma de pessoal e uma flexibilidade operacional que não é a tônica da gestão do pessoal. Se enveredarmos, às cegas, na descentralização pela contratação de ser­viços com terceiros podemos correr o risco de estar a duplicar os gastos governamentais, ao invés de fazer economia e evitar maiores ônus, como é inspiração da política de descentralização;

3 . colocação de pessoal em disponibilidade. Esta seria a solução normal para o problema. Uma vez carac­terizada a desnecessidade do cargo, cumpriria extin­güi-Io e colocar em disponibilidade o funcionário es­tável que o ocupa. O afastamento do funcionário do serviço ativo, por fôrça de disponibilidade, encer­ra em si uma economia, pois que deixa êle de ocupar uma área de aluguel ou de valor locativo poten­cial elevado, não mais utiliza material, não mais ocupa mesa e cadeira, etc. Mas a economia visa, es­sencialmente, à redução dos gastos de pessoal. Se a disponibilidade determina a continuação da percep­ção de vencimentos integrais, conforme estabelece, incompreensivelmente, a Constituição, 1.9 a medida perde sua eficácia como geradora de economias e, portanto, deixa de contribuir para a redução dos

". Constituição, Art. 98, § 2.°.

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gastos com pessoal. D2Ye-Se assinalar que o Govêrno, ao enviar o Projeto de Constituição ao Congresso Na­cional, recomendou que a disponibilidade se fizesse na base de vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. I,,, Na fase final da votação da Constituição - como seria de esperar - articulou-se forte movi­mento entre os congressistas no sentido de se confe­rir aos disponíveis vencimentos integrais, como se trabalhando estivessem, não logrando as lideqmças governamentais enfrentar a pressão em favor dêsse preceito paternalista, afinal inscrito no texto cons­titucional. A irracionalidade dessa solução e a injus­tiça que socialmente encerra ganham relêvo quando se considera que o funcionário que se aposenta por invalidez, em que não se caracterize doença especial­mente designada na legislação, tem direito, como aposentado, a proventos proporcionais aos seus ven­cimentos da atividade, em função do número de anos de serviço. O amparo que se deixou de dar a um in­válido é aquêle que se garantiu ao funcionário válido que se tornou desnecessário ao serviço público, tem o direito de nêle reintegrar na primeira vaga compa­tível e pode buscar no mercado de trabalho outra ocupação, enquanto em disponibilidade. A solução dada pelo Congresso Nacional, em momento de ma­nifestação de seu espírito paternalista e de olvido dos princípios de Justiça Social, acolhe fator fortemente impeditivo do encaminhamento de solução para os problemas de pessoal do Serviço Público Federal.

Tivemos em vista êsse quadro de dificuldades ao dar tanto destaque - quando esboçamos algumas idéias quanto a uma nova Política de Pessoal - aos proble­mas orcamentá;rios. Reafirmamos nossa conviccão de que é p"reciso restabelecer relação direta entre os pro­gramas das unidades administrativas. pelos quais res­pondem seus chefes, com os orçamentos de pessoal que são autorizados a executar. É indispensável fazer sentir aos chefes de serviço que há um limite considerado ra-

,,,,, Projeto de Constituição, Art. 97, § 2.0 - "Extinto o cargo, o funcionário estável ficará em disponibilidade remunerada com proventos proporcionais ao tempo de serviço até o seu obriga­tório aproveitamento em cargo eqüivalente."

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zoável para as suas despesas de pessoal, e que é de sua responsabilidade exercer a administração de pes­soal, em suas unidades administrativas, dentro daqueles limites. Se seus gastos de pessoal, por motivos incoerCÍ­veis, decorrentes do período de transição, forem superio­res aos considerados aceitáveis, tal fato deve ficar bem claro ao serem discutidos seus orçamentos. a fim de que tenham bem vivo o balizamento a que se terão de ajustar, no mais breve prazo. Sem o restabelecimento dessa rela­ção, quer dizer, sem que se dê aos orçamentos das unida­des administrativas êsse sentido de objetividade, inverten­do-se procedimentos plenos de equívocos, mas que se con­solidaram através dos anos, difícil, se não impossível, se­rá atingir a normalidade que se deseja na fixação de pa­drões de custos razoáveis para os órgãos e atividades go­vernamentais.

O pêso que as despesas de pessoal representam no Or­çamento da União configura o mais grave problema ad­ministrativo do Govêrno. Terá de ser preocupação instan­te do Ministro do Planejamento, em cuja área de compe­tência se inclui a coordenação orçamentária da União, e do Ministro da Fazenda, responsável pelo ritmo dos de­sembolsos à conta da Caixa Geral do Tesouro; terá de constituir-se em preocupação prioritária do Ministro res­ponsável pela Reforma Administrativa, pelos motivos ex­postos; terá de preocupar, imediata e constantemente, o Diretor do Departamento Administrativo do Pessoal Civil. O Ministro do Planejamento terá sempre diante de si o impulso de aumentar a fatia de despesas reprodutivas do orçamento e a realidade do impacto das despesas de custeio, dentre as quais a parcela mais significativa com­preende o pessoal, e, ainda, o desejo de manter em equi­líbrio - e mesmo reduzir - a carga fiscal, como estímu­lo às inversões e dinamização do setor privado, segundo as características da conjuntura da economia nacional. Seu ângulo de visão é o mais amplo possível dentro do Govêrno, principal justificativa da institucionalização do Ministério do Planejamento, mas não poderá, apesar dis­so, deixar de considerar sob enfoque especial os compro­missos orçamentários de pessoal. O Ministro da Fazenda se verá compelido a assegurar a normalidade dos supri­mentos financeiros para custeio (com predominância das

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despesas de pessoal) e procurará assegurar igual trata­mento para os investimentos e outras dotações dinâmicas ou socialmente prioritárias, dentro do desejável equilíbrio da Caixa do Tesouro. O Ministro da Reforma Administra­tiva terá consciência de que produtividade exige aplica­ções financeiras, e estas não poderão ser lastreadas pela imposição de novos ônus à coletividade. Não poderá dei­xar de estar atento aos problemas de pessoal, esforçan­do-se por alargar as veredas abertas pela Lei de Refor­ma Administrativa. O Diretor-Geral do Departamento Administrativo do Pessoal Civil precisará passar a ter uma visão globalizada do problema de pessoal e das rea­lidades orçamentárias, para tomar a consciência que per­dera o órgão Central de Pessoal da situação de fato exis­tente, e poder, assim, ajudar no encontro de meios que facilitem as soluções desejadas, no interêsse da Adminis­tração Federal e dos funcionários. Terá de contemplar o panorama de muito maior altura, de horizontes mais am­plos. sob pena de perder-se no emaranhado das meias so­luções, de conformar-se com a posição de remendão, em lugar de colocar-se na de sapateiro, como pretende a Re­forma Administrativa.

Todos êsses principais responsáveis, de uma forma ou de outra, pelo balizamento dos gastos orçamentários de pessoal. não poderão perder de vista as cifras alarman­tes que dimensionam o grave problema.

A previsão orçamentária de Pessoal para 1966, clas­sificada em Despesas Correntes (abrangendo, portan­to Despesas de Custeio e Transferências Correntes) era de NCrS 2.088 milhões, sendo NCr$ 626 milhões para o Pessoal Militar e NCrS 1.462 milhões para o Pessoal Ci­vil. O reajustamento concedido para 1966 foi estimado em NCrS 750 milhões, elevando-se, assim, aquêle montante a NCrS 2.838 milhões. 181 A Comissão que estudou o Rea­justamento 1~~ destacou que os NCr$ 1.462 milhões para o Pessoal Civil se desdobravam:

1. Administração Direta, NCr$ 915 milhões; 2. Administração Indireta, NCrS 547 milhões.

1'1 Relatório de 11 de outubro de 1965. "" Com o reajustamento de vencimentos para 1967, êste

mon tan te deve elevar-se a perto de NCr$ 3. BOO milhões, caso se consiga limitar, aos níveis desejados, os suprimentos às enti-

198 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Demonstrou a Comissão que "não fôra a situação das entidades da Administração Indireta e, certamente, como ocorre agora, o funcionalismo civil e militar se veria di­ante da possibilidade de conseguir reajustamento mais condizente com suas necessidades presentes. O fenômeno já é antigo, nem por isso menos grave: A Administração Direta está sendo esmagada porque o Govêrno se vê com­pelido a atender ao enorme aumento das despesas de pes­soal da Administração Indireta, sobretudo das Emprêsas Públicas deficitárias." No conjunto da Administração In­direta, acentuou a Comissão o impacto representado pela desorganização administrativa da Rêde Ferroviária Fe­deral, aduzindo: "A inexistência de uma política de pes­soal digna dêsse nome e o ônus orçamentário que a situa­ção do pessoal de algumas entidades da Administração Indireta impõe ao Erário são dois fatôres que conspiram contra qualquer medida construtiva em matéria de pes­soal na Administração Direta, que vise a eliminar o ver­dadeiro vácuo nesta existente. Tôda nova medida constru­tiva encontra, de pronto, um óbice inicial na deficiência de recursos financeiros, ocasionada pela posição deficitá­ria de autarquias e sociedades de economia mista. Demais, a situação do funcionalismo civil da Administração Di­reta - onde inexiste sistema consistente de pessoal - é posta em confronto com o pessoal militar, que possui sis­tema, hierarquia, direção, quadros bem constituídos, pes­soal de Estado-Maior, aperfeiçoamento e treinamento ade­quados, sem que se estabeleçam as premissas dessas com­parações para torná-la válida. O fato é que. quando consi­derada isoladamente, a Administração Direta sofre tôda sorte de restrições, quer para concessão de reajustamen­tos gerais, quer para a adoção de medidas de reconstru­ção do sistema, por fôrça do impacto que, como resultado dos fatôres acima descritos, a Administração Indireta exerce sôbre a Caixa do Tesouro." 183 Essas observações

dades deficitárias da Administração Indireta. É provável que, em 1968, por fôrça de nôvo reajustamento salarial, os encar!;os de pessoal alcancem nível não inferior a NCr$ 4.700 milhões, representando perto de 60% da Receita Geral.

ll>3 A Comissão que estudou o Reajustamento de 1966 deu merecido destaque a essa situação anômala, que vinha corroendo a política orçamentária da União. O problema é antigo; mas os administradores, os estudiosos de Administração e a coletivi-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 199

continuam a ter grande oportunidade, embora medidas tenham sido adotadas na área do antigo Ministério da Viação para enfrentar o problema. Nota-se, porém, uma tendência comum a tais medidas: descarregar para a res­ponsabilidade definitiva e única da Administração Direta os encargos relativos a pessoal excedente. Em outras pa­lavras, balanceados os lucros e as perdas de cada entida­de deficitária, as perdas são debitadas ao Orçamento da União. Os reflexos dessa orientação pouco imaginosa, sim­plista mesmo, na política de pessoal do Govêrno, não po­de ser menosprezada, especialmente depois da rejeição pe­lo Congresso Nacional da proposição do Poder Executivo da disponibilidade com vencimentos proporcionais. A Re-

dade não demonstraram, até data bem recente, compreendê-lo em tôda sua gravidade. No entanto, em trabalho publicado pelo DASP, em 1955, procurávamos demonstrar a absurda situação que se configurava. Dizíamos então: "A proposta orçamentária para 1956 contém, pela primeira vez nos últimos anos, elemen­tos informativos sôbre a contribuição da União para atender aos deficits das autarquias industriais e, particularmente, para fazer face a despesas de pessoal dessas mesmas entidades. A praxe anterior era fornecer a essas entidades recursos especiais, mediante adiantamentos do Banco do Brasil, sem que o Orça­mento da República registrasse tais fatos." Salientávamos que a proposta orçamentária previa, na parte da Receita, uma re­ceita da ordem de Cr$ 984 milhões, proveniente dos Serviços Industriais, e, na parte da despesa, gastos da ordem de Cr$ 9.131 milhões, sendo a diferença de Cr$ 8.147 milhões. Os dispêndios de Pessoal atendidos pela União somavam Cr$ 7.055 milhões, dos quais Cr$ 4.126 milhões referiam-se às Estradas de Ferro. Destacávamos que êsses Cr$ 7.055 milhões representavam 11 % em confronto com a Receita Geral; 12,5% da Renda Tributária; 35,8% da Renda do Impôsto de Consumo; mais de duas vêzes o Orçamento do Ministério da Agricultura; quase duas vêzes o Orçamento do Ministério da Educação e Cultura; duas vêzes e meia o Orçamento do Ministério da Saúde. Alertávamos naquela oportunidade: "A questão é sobremodo importante e para solu­cioná-la urge traçar orientação firme e decisiva, pois como se disse, os males apontados acima têm prejudicado enormemente o pessoal de administração centralizada, cujos salários cada vez mais vão tornando-se desvalorizados pelo vulto das despesas de pessoal, quando se pretende, em relação a êles, adotar medidas apropriadas. Mais se acentua a grande importância dêste proble­ma quando se considera que estamos desviando recursos orça­mentários substanciais de programas essenciais à coletividade e ao desenvolvimento econômico do País" (DIAS, J. DE NAzARÉ. Administração de Pessoal - Algumas sugestões para o aperfei­çoamento do serviço Civil, 1955) .

200 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

forma Administrativa admitiu o deslocamento de pessoal ocioso com grande flexibilidade, inclusive na direção das Autarquias. Todavia, o desejo de conduzir estas últi­mas ao regime da legislação trabalhista dificultará os des­locamentos. Talvez se tivesse de, paralelamente às provi­dências de retreinamento do pessoal ocioso e de sua colo­cação nas vagas que ocorrerem, cogitar de pô-lo em dis­ponibilidade (ainda que com vencimentos integrais, na ferma da Constituição) para obtenção de economias se­cundárias decorrentes do afastamento do exercício 184 e imaginar uma modalidade de a União compensar-se pelos gastos com o pessoal excedente, que provém, ao que tudo indica, predominantemente dos órgãos da Administração Indireta. Destacar-se-iam, por exemplo, os gastos com pessoal excedente no Orçamento da União, de modo a to­mar-se consciência da gravidade do problema, e buscar­se-ia uma fórmula mediante a qual as entidades da Ad­ministração Indireta de onde proveio parte daquele pes­soal também contribuíssem para o atendimento dêsse en­cargo. Em se tratando, aliás, de um encargo nitidamente de natureza social, justificar-se-iam outras soluções que o estudo da matéria lograria, por certo. indicar. Com isso, aliviar-se-ia a carga sôbre o Orçamento da União, tanto mais quanto parece evidente que sem uma providência inovadora, além do contrôle permanente e austero das despesas de pessoal, impossível será à União atender ao mandamento constitucional que limita em 507(· das recei­tas correntes a despesa de pessoal e difícil será liberar os recursos requeridos pela implantação de uma nova polí­tica de pessoal.

1M o problema do pessoal ocioso é um problema social de­licado e extremamente complexo. Desde que se parta, porém, para a: utilização de uma política flexível, confia-se que surgirão soluções alternativas úteis. O deslocamento do pessoal para no­vas frentes de trabalho facilitaria o encaminhamento do assunto, e poderia até contribuir para despletorlzar os grandes redutos burocráticos. Para tudo isso, é preciso, porém, antes de mais nada, identificar o pessoal ocioso, dispor de dados informativos sôbre o mesmo e contar com uma nova atitude por parte dos órgãos de pessoal.

9. LICITAÇÕES m

9.1 OBJETIVO DAS NORMAS

o problema das licitações havia mergulhado num ci­poal de normas burocráticas sob as mais variadas origens e inspirações. A legislação fundamental, ainda vinculada ao Código de Contabilidade e ao Regulamento Geral de Contabilidade Pública, foi-se deslocando, gradativamen­te, não se sabe bem com que finalidade, para a área de influência da legislação específica do Tribunal de Con­tas. 1'1; Estabelecia-se, por essa forma, intensa confusão entre procedimentos, instrumentos de ação administrati­va e mecanismos de contrôle cujo resultado - bem o sa­bemos - é o cultivo ao processo e o abandono do objetivo. Quando o legislador se deparava com a instituição de no­vas normas legais que precisassem ter seu cumprimento fiscalizado, ao invés de criar mecanismos próprios para contrôle e fiscalização da aplicação da lei, procurava o ca­minho aparentemente mais fácil de passar a exigir mais uma certidão, mais um documento, mais um papel - de obtenção, convém realçar, nem sempre facilitada pela bu­rocracia - para inscrição nas concorrências. Como conse­qüência dêsse procedimento irracional, ano após ano, pas-

185 Decreto-lei n.O 200, Título XII. '''' Lei n.O 830, de 23 de setembro de 1949, Lei Orgânica do

Tribunal de Contas, revogada pelo Art. 63 do Decreto-lei n,o 199, de 25 de fevereiro de 1967.

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saram as licitações e abrigar extenso rol de exigências que nenhuma relação guardavam com a finalidade principal. Com isso, afastava-se muito concorrente qualificado que não se conformasse com a massa de papéis exigidos; au­mentava-se o encargo de concorrer, com reflexos eviden­tes nos preços dos serviços; e desviava-se, indevidamente, o órgão responsável pela licitação para preocupações de nenhuma significação para a competição ..

Analisando êsse e outros aspectos, o grupo de tra­balho especialmente instituído no Ministério do Planeja­mento recomendou que se partisse para medidas de gran­de simplificação, havendo o Govêrno resolvido incorporá­las à Lei de Reforma Administrativa: são as Normas re­lativas a Licitações para Compras, Obras, Serviços e Alienações.

Procurou-se alcançar tríplice objetivo:

1. assegurar a mais ampla competição; 2. proporcionar a obtenção de produtos, obras

e serviços de comprovada qualidade; 3. obter os menores preços possíveis no mo­

mento. li:sse o núcleo de premissas em tôrno do qual as Normas foram concebidas, e deve servir de inspiração às disposições comple­mentares a serem aprovadas em decreto, e, ainda, à aplicação das providências acolhi­das pela Lei.

Os estudos que precederam à aprovação das Normas em lei destacaram, entre os que estavam a prejudicar a consecução daqueles objetivos, os seguintes fatôres:

1. entraves de ordem legal; 2. embaraços de natureza burocrática; 3. insegurança na realização pontual dos pa­

gamentos pelas unidades administrativas; 4. diversidade de critérios seletivos para habi­

litação preliminar dos concorrentes, espe­cialmente no que concerne a projetos de vul­to, quando se impõe garantir a participação exclusiva de licitantes que atendam plena­mente às qualificações exigidas pela Admi­nistração;

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 203

5. ausência de divulgação adequada para pro­piciar, como convém, a colaboração das en­tidades de classe interessadas. 1",

Convém acentuar que sempre se teve como pacífico que somente teria sentido a reformulação inovadora no que tange às Normas de Licitação se pudessem ser inse­ridas no cont:::xto de um elenco de medidas destinadas a racionalizar o funcionamento da Administração Federal, especialmente quanto a dois pontos. Primeiro, a elimina­ção da interferência prévia do Tribunal de Contas, consi­derada como "um freio à pronta ação das autoridades ad­ministrativas nos assuntos relacionados com as licita­ções". Segundo, a eliminação de outras dificuldades que "impedem as unidades administrativas de programarem os desembolsos financeiros relacionados com a execução de seus programas de trabalho, provocando atrasos, às vêzes irrecuperáveis, e a não satisfação de compromissos com fornecedores e contratantes de obras e serviços". 188

É interessante observar o quanto se entrelaçam as medidas racionalizadoras quando se abandona a preo­cupação eminentemente estrutural e se passa a pensar na reformulação da Administração Federal em têrmos de funcionalidade, de operacionalidade e instrumentação. A finalidade da Administração Federal, os objetivos que ca­be ao Serviço Público Federal atender adquirem forma bem mais nítida e criam um clima propício a que se pen­se e aja sob nova perspectiva.

9.2 PRECEITOS PRINCIPAIS

Procurou-se incluir na Lei de Reforma Administra­tiva uma série de preceitos essenciais, cobrindo tôda a área de licitações, de modo a compor um quadro de matri­zes legais a serem desenvolvidas em disposições de cará­ter regulamentar.

Consagrou-se o princípio da licitação para os forneci­mentos, obras e serviços, cuja dispensa somente pode de­correr de expressa disposição legal, apressando-se a lei em

1-' Relatório do Grupo de Trabalho, item IU_ '" Relatório do Grupo de Trabalho, item 1.

204 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

estabelecer, com a maior clareza e exatidão, os casos de dispensa de licitação. 1&9 Como isso, pôs-se fim a um dos mais ridículos procedimentos da nossa administração, se­dimentado nas raízes do burocratismo do Serviço Público Federal, qual seja o de se colocar à margem, com a maior simplicidade, o processo de competição com o mero arrolar improvisado de tênues razões e a obtenção de um despacho autorizativo do Presidente da República dispen­sando a realização de concorrência. Êsse volumoso expe­diente dos Ministérios, periodicamente renovado, conges­tionava a circulação de importantes papéis administrati­vos, sem que ninguém, em nenhum escalão, examinasse o mérito dos pedidos de concorrência, assim rotineiramente aprovados. A invocação de urgência, "incompatível com a delonga dos processos de concorrência", tornou-se ingre­diente habitual, de que viciosamente se lançava mão sob o argumento ostensivo de que os serviços não podiam pa­rar quando na verdade se buscava, muitas vêzes, a fuga à licitação, arranjos menos claros e cobertura para a ausência de programação administrativa e financeira. Lançava-se mão, com muita freqüência, do argumento decisivo de que era preciso "salvar a verba" no encerra­mento do exercício financeiro. As causas de tudo isso dei­xavam de ser examinadas, pois se tornara mais cômodo apelar para a dispensa de competição. Mais grave, porém, é que, ao ocorrer um caso de real urgência, uma calami­dade pública, quando os serviços têm de ser realizados na­quele instante, sem protelações, obrigava-se os chefes de serviço a ir buscar, a posteríori, a ratificação de medidas que haviam adotado no mais legítimo ato de cumpri­mento de um imperativo administrativo e funcional.

A Reforma Administrativa fixa, com nitidez, os ca­sos de dispensa de licitação, que obedecerá, assim, a cri­térios legalmente estatuídos. Desconcentra-se o problema do Presidente da República, o qual só será chamado a conceder autorização quando se invocar a segurança na­cional. Dispôs-se, inclusive, quanto aos casos de emergên­cia, reconhecendo-se a ocorrência de circunstâncias em que se caracteriza a "urgência de atendimento de situa­ção que possa ocasionar prejuízos ou comprometer a se-

"" Decreto-lei n.o 200, Art. 126, § 2.°.

A REFOR~A AD~INISTRATIVA DE 1967 205

gurança de pessoas, obras, bens ou equipamentos", mas obriga-se quem quer que se valha dessa faculdade a apre­sentar, imediatamente, justificativa "perante a autori­dade superior, que julgará da medida e, se fôr o caso, promoverá a responsabilidade do funcionário".lfJ() Con­cilia-se a urgência com a responsabilidade funcional e a supervisão da autoridade imediata.

9.3 MODALIDADES DE LICITAÇAO

Três são as modalidades de licitação consagradas na Lei:

1. Concorrência; 2. Tomada de preços; 3. Convite.

A concorrência aplica-se aos casos de compras, obras ou serviços de vulto, admitindo-se a participação de qual­quer licitante através de convocação da maior amplitude. Será obrigatória uma fase preliminar de pré-habilitação, destinada a comprovar a plena qualificação dos interes­sados para a realização do fornecimento ou execução da obra ou serviço programados. Acolheu-se a prática já em uso, sobretudo pelas entidades da Administração Indireta. Tomada de preços é a modalidade de licitação entre inte­ressados previamente registrados, observada a necessária habilitação. Convite é a licitação entre interessados, em número mínimo de três, escolhidos pela unidade adminis­trativa, registrados ou não, e convocados por escrito com antecedência mínima de três dias.

Para definição de serviços de vulto, caso em que se fará concorrência, e das faixas dentro das quais caberá realizar tomada de preços ou convite, a Reforma Admi­nistrativa estabeleceu uma graduação com base no valor do maior salário mínimo mensal. Fixou, outrossim, faixas diferentes para os casos de obras, de um lado, e os casos de compras ou serviços, de outro.

100 Decreto-lei n.o 200, Art. 126, § 2.0, item h e § 3.0.

206 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Concorrência

Tomada de preços

Convite

Obras Serviços

igualou superior a Igualou superior a 15.000 vêzes o maior 10.000 vêzes o maior SM SM. (salário mínimo)

Inferior ao acima e Inferior ao acima e Igual ou superior a igualou superior a 100 5UO vêzes o maior SM vêzes o maior SM

Inferior a 500 vêzes o Inferior a 100 vêzes o maior SM maior SM

Dispensada a Inferior a 50 vêzes o Inferior a 5 vêzes o licitação maior SM maior SM

Grande importância foi emprestada aos registros ca­dastrais de habilitação das firmas, considerados básicos para a realização das tomadas de preços, e cuja atuali­zação expressamente se determina. A situação dos lici­tantes no cumprimento das obrigações assumidas será obrigatoriamente anotada no registro cadastral. Diante das faixas aprovadas, a concorrência ficará, realmente, reservada para os grandes empreendimentos, lançando-se mão em grande escala da tomada de preços para atender às necessidades da Administração, de forma mais orgâ­nica e expedita.

Quanto à publicidade das licitações, entendeu-se con­veniente adotar como critério o uso moderado do Diário Oficial como veículo de divulgação, pela sua manifesta inoperância como tal, dando-se decididamente preferên­cia às comunicações, às entidades de classe, diretamente interessadas em assistir seus associados e em assegurar a sua participação nas oportunidades que ocorrem, mo­bilizando-se ainda outros veículos modernos de comuni­cação. Em outras palavras. cumpria introduzir no proces­samento das licitações a técnica moderna de divulgação, que não pode conformar-se com a simples publicação de editais no Diário Oficial. As regras inscritas na Refor­ma Administrativa consistem:

1 . no caso de concorrência, publicação no órgão oficial e na imprensa diária, com antecedência mínima de trinta dias, de notícia resumida de sua abertura, com indicação do local em que os interessados poderão obter o edital e tõdas as indicações necessárias;

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 207

2. no caso de tomada de preços, afixação de edi­tal, com antecedência mínima de quinze dias, em local acessível aos interessados e comunicação às entidades de classe que os representem.

Ficará a critério da Administração, conforme as cir­cunstâncias de cada caso, lançar mão de outros meios de divulgação, com o fim de ampliar a área de competição.

Para habilitação às licitações, traçou a Reforma rJl­mos definitivos ao estabelecer que se exigirá, exclusiva­mente, documentação relativa:

1. à personalidade jurídica; 2. à capacidade técnica; 3. à idoneidade financeira.

Os regimes de execução dos serviços obedecem a três modalidades:

1. empreitada por preço global; 2. empreitada por preço unitário; 3. administração contratada.

A Reforma procurou tornar flexível os critérios pa­ra julgamento das licitações, mandando levar em conta, no interêsse do serviço público, as condições de qualida­de, rendimento. preços, condições de pagamento, prazos e outras pertinentes, estabelecidas no edital. Fugiu-se, portanto, deliberadamente, à rigidez de critérios auto­máticos de julgamento fixados em lei ou regulamento, os quais preponderantemente conduzem, como o demonstra a experiência, à escolha do que fôr de menor preço, as mais das vêzes em detrimento dos interêsses do serviço.

Outros pontos de destaque são a ampliação dos ins­trumentos através dos quais as obrigações podem ser as­sumidÇl.s (admitindo-se, além do contrato - obrigatório nos casos de concorrência - cartas-contratos, empenho de despesas, autorizações de compras e ordens de exe­cução de serviços); a flexibilização da prestação de ga­rantias; a imposição de penalidades; os recursos admiSSÍ­veis; a exigência de que se definam previamente os ser­viços ou as obras a executar.

Duas outras providências, finalmente, devem ser pos­tas em realce. A primeira refere-se às licitações de âm-

208 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

bito internacional que devem ajustar-se às diretrizes esta­belecidas pelos órgãos responsáveis pela política monetá­ria e pela política de comércio exterior, 191 dando-se mar­gem a que os interêsses da política exterior do País se­jam devidamente atendidos em todos seus aspectos, in­clusive de natureza conjuntural. O segundo, representan­do a contrapartida à diretriz de deferir tôda a responsabi­lidade aos chefes de serviço na realização de licitações, traduz-se na regra de que "é facultado à autoridade ime­diatamente superior àquela que proceder à licitação anu­lá-la por sua própria iniciativa", ll'~ armando-se, por es­sa forma, a autoridade supervisora para agir prestamen­te nos casos em que o interêsse público o requeira.

llll Decreto-lei n.o 200, Art. 142. "'-, Decreto-lei n.o 200, Art. 138.

10. EXECUÇÃO DA REFORMA 193

A Lei estatuiu, de forma explícita, que a Reforma Ad­ministrativa terá sentido de profundidade e deverá ajus­tar-se a suas disposições, especialmente no que concer­ne às diretrizes e princípios de caráter fundamental enun­ciados no seu Título lI, que consagra a orientação geral da Reforma quanto ao pensamento em que se inspira e aos instrumentos de que se utiliza. À proporção que forem sendo expedidos os atos de concretização da Reforma, revogam-se as disposições anteriores que com ela colidam ou sejam incompatíveis.

Preocupa-se a Lei com a continuidade das operações, em que os serviços continuem a funcionar normalmtnte, sem interrupções ou descompassos que prejudiquem a co­letividade. A Reforma tem por objetivo racionalizar, sim­plificar e aperfeiçoar, e não tumultuar o Serviço Público Federal.

A execução da Reforma far-se-á por etapas que Sé

sucederão orgânicamente, por decisões do Poder Executi­vo, o qual, à medida em que as fôr cumprindo, solicitará do Poder Legislativo as leis que, complementarmente, vier a considerar necessárias para a solução de certos proble­mas carentes de providências de natureza legislativa. A primeira etapa compreende o período de estudos e expe­rimentação, concluindo-se com a promulgação da Lei de-

ll<l Decreto-lei n.o 200, Título XIII.

210 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

flagadora do processo de Reforma da Administração Fe­deral.

A responsabilidade pela execução da Reforma foi con­fiada ao Ministério do Planejamento e Coordenação Ge­ral, podendo também, se assim o preferir o Govêrno, ser cometida a um Ministro Extraordinário para a Reforma Administrativa, ao qual ficariam também afetos os assun­tos de organização administrativa. Considera-se essen­cial que o responsável pela Reforma Administrativa pos­sua o status de Ministro de Estado, a fim de que seus p<-ntos de vista tenham o devido pêso no seio do Govêr­no. 194

O Ministro responsável pela Reforma Administrativa deverá administrar os recursos reservados para a imen­sa tarefa através de um órgão temporário de implanta­ção da Reforma, sob a imediata direção do Ministro. ~sse verdadeiro Escritório de Implantação da Reforma Admi­nistrativa deverá funcionar segundo o modêlo dos escri­tórios de organização que existem no setor privado, cons­tituindo-se no órgão central de sustentação e coordena­ção das medidas indispensáveis à implantação gradativa da Reforma. O Ministro responsável contará com a cola­boração do Departamento Administrativo do Pessoal Ci­vil, que a Reforma Administrativa quer ver renovado. di­namizado e atuando na área exclusiva da Administracão de Pessoal. .

As prioridades de ação, segundo a Lei, concentram­-se no funcionamento dos novos Ministérios e dos órgãos Centrais, a começar pelas Secretarias-Gerais e pelas Ins­petorias-Gerais de Finanças. Levando em conta as difi-

1.41 A experiência de Ministro Extraordinário para a Re­forma Administrativa talvez viesse dar forma a uma tendência no sentido da adoção dessa fórmula para conciliar a necessidade de entregar a pessoa altamente qualificada tal responsabilidade, com a conveniência de que esta possua o status ministerial.

A França adotou esta solução, que se tem revelado renova­dora e profícua para a Administração francesa. Nos Estados Unidos da América, a posição do Bureau of the Budget tem se fortalecido substancialmente, gozando seu Diretor de gran­de prestígio no Govêrno. No Brasil, a experiência da fórmula Ministro Extraordinário permitiria atender à manifesta ne­cessidade de dedicar-se um Ministro de Estado exclusivamen­te, às tarefas da Reforma e revelaria, adiante, 'a solução defi­nitiva mais conveniente, sem precipitações teóricas.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 211

culdades de contar-se com pessoal qualificado suficien­te para as necessidades e o imperativo de se realizar, a curto prazo, tarefas de envergadura e altamente espe­cializadas, admitiu a Lei o ajuste de estudos e trabalhos técnicos com pessoas físicas ou jurídicas, segundo as nor­mas que forem estabelecidas.

Entendemos a designação de um Ministro Extraor­dinário para a Reforma Administrativa - no caso e nas condições atuais do Serviço Público Federal - como pro­vidência essencial para o êxito da difícil tarefa de tradu­zir em ação e tornar operacionais as diretrizes e princí­pios que inspiram a Reforma. Pensamos também ser es­sencial que êsse Ministro conte, de imediato, com o apoio do Escritório de Implantação da Reforma Administrati­va, funcionando nos moldes acima indicados, a fim de que haja organicidade, continuidade, coordenação técnica e altos padrões nos trabalhos de Reforma. Não será demais repetir que tão grandes e profundas são as inovações. e tão modernos e especializados os instrumentos básicos, que não será possível prescindir da dedicação, por intei­ro, de um Ministro de Estado a êsses assuntos e a concen­tração de especialistas e coordenadores de elevada quali­ficação no Escritório, se quisermos, como se impõe, tra­balhar com eficiência e produtividade, fixando no funcio­namento dêsse órgão central a imagem do que se pre­tenda venha a ser a organização da Administração Fe­deral. A Comissão de Estudos da Reforma Administra­tiva, depois de muito ponderar sôbre outras alternativas, fixou-se nessas recomendações que reputamos muito bem fundamentadas e conviria seguir, já que outra alterna­tiva mais convincente não foi, até agora, oferecida.

11. VIABILIDADE DA REFORMA

11.1 DEMONSTRAÇÃO DA VIABILIDADE

É viável a Reforma Administrativa? Antes de ten­tar responder a esta tão relevante quanto provocadora in­dagaçao, jUlgamos oportuno desenvolver algumas consi­deraçoes gefais sóbre a posição do Administrador em re­laça0 ao assunto.

Ao nos empenharmos em organizar um nôvo órgão ou em reorganizar um órgão já existente, somos mo~'iuos, preliminarmente, pela mesma motivação: a melhor utili­zação dos meios ao nosso alcance em busca de resultados satisfatórios, a obtenção, em suma, de produtividade. A identidade de objetivos não deve, todavia, obscurecer a diferença entre as duas situações. No primeiro caso, em­bora submetendo-nos a condições e regras de caráter ge­ral. temos as mãos livres para adotar muitas providências consideradas essenciais para que se consiga o rendimento esperado. No segundo caso, não podemos escapar à influ­ência de fatôres e circunstâncias de notória presença, abrindo-se diante de nós amplo campo a exigir decisões debaixo de tensões tendentes, de um lado, a preservar o status quo, as tradições, os interêsses consolidados, e, de outro, a pressão das solicitações dos que vão valer-se ou beneficiar-se dos serviços do órgão. a impor-nos o cami­nho árduo, mas o único eficaz, da racionalização operacio­nal e da produtividade.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 213

Ora, é sabido que a produtividade - quando trans­plantada do campo teórico para o das realizações opera­cionais - é o resultado da aplicação de um elenco de medidas adequadamente planejadas, paciente e persisten­temente executadas, e sujeitas a contrôle eficaz. Por isso mesmo, ao reorganizar, rever, consolidar ou reformar um órgão, devemos nos apoiar nos instrumentos essenciais à obtenção da produtividade, mas dedicar também perma­nente atenção aos fatôres que animam as resistências à renovação. E nada mais eficaz como antídoto ao culto do obsoletismo do que colocar-se os instrumentos de re­novação, racionalmente concebidos, em mãos competen­tes, confiá-los a pessoal capacitado e imbuído de espírito renovador.

Por tudo isso, as reformas de órgãos ou serviços exis­tentes só devem ser empreendidas quando o administra­dor esteja plenamente convencido de que é preciso refor­mar, aprove e se interesse pelas medidas e pelo instru­mental a serem utilizados para a reforma. acompanhe a implementação dessas medidas e o funcionamento dos instrumentos, vigie os resultados e combata, convicta­mente, as resistências decorrentes de manifestações do espírito conservador. 195

Mas não basta o convencimento do administrador e sua deliberação de reforma. Urge ter bem presente a no­ção de que renovação e reforma exigem o emprêgo de re­cursos financeiros, seja para utilização de pessoal espe­cializado competente, seja para aquisição de novos equi-

1" o Professor NELSON DE MELLO E SOUZA conseguiu sinteti­zar, com grande lucidez, o panorama estratégico da Reforma Administrativa no Brasil. Rebela-se êle contra a "concepção for­malista de reforma", critica veementemente a "reforma estru­tural" ou "reforma de organogramas", como querem os críticos mais entusiasmados. Considera-a "muito distante da verdadeira reforma administrativa, cujo objetivo teria de ser a busca sis­temática de um sentido operacional profundo, capaz de dar outro ritmo funcional a todo sistema administrativo". O caráter eminentemente instrumental emprestado à Reforma Admi­nistrativa certamente atende a tais preocupações. As obser­vacões do Prof. NELSON DE MELLO E SOUZA sôbre as "fontes de reshtência à mudança" são inteiramente atuais no caso brasi­leiro (MELLO E SoUZA, NELSON, Notas Introdutórias ao Problema da Estratégia da Reforma Administrativa no Brasil, Desenvol­vimento e Conjuntura, agõsto de 1963) .

214 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

pamentos, seja para contratação de serviços técnicos, an­tes que se possam colhêr os resultados, e como condição mesma para que êstes se produzam. 191;

A Reforma do Serviço Público Federal não escapa a êsse imperativo.

Ao aprovar a Reforma Administrativa, após longo período de estudo, análise e reflexão, manifestou o Go­vêrno Revolucionário estar plenamente consciente de que é preciso reformar, correspondendo, assim, ao que está no consenso geral. A decisão de reformar a Administração Federal foi tomada, dando-se início ao processo de mu­dança. Os fatos sociais, econômicos e políticos criaram o clima e impeliram, inelutàvelmente, o Govêrno no ca­minho das soluções. Medindo suas responsabilidaodes de administrador, tomou o Govêrno as decisões cabíveis. Essas decisões não mais correspondem ao desejo ou à intenção de reformar - fase que deve ser considerada vencida - mas à convicção e à determinação do que se deve fazer para reformar.

Diante dessas considerações, e levando em conta os pontos fundamentais que lhe servem de inspiração e fun­damento, não hesitamos em afirmar que a Reforma Ad­ministrativa se apresenta como viável. Pois que a moldu­ra de sua concepção e o instrumento básico que a alicerça permitem a concentração de esforços, energias, capaci­dades e meios naquilo que é, indubitàvelmente, essencial ao funcionamento da Administração Federal, à conse­cução dos fins do Estado. 1fI7

1"" Felizmente, existem hoje condições bem mais propícias à compreensão dessa colocação realista. Veja-se, por exemplo, o progresso que fizemos ao reconhecer a necessidade de estu­dos de viabilidade e da elaboração de projetos antes de nos lançarmos, irracionalmente, às realizações, cujo dinamismo ope­racional se esgotava muitas vêzes com a simples instalação da placa comemorativa das inaugurações. A Reforma Administra­tiva bem traduz essa nova mentalidade, que nasceu pràtica­mente com a criação do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e, mais recentemente, se consolidou através do FINEP (Fundo de Financiamento de Estudos e Projetos), ao autorizar a constituição de uma emprêsa pública para incor­porar "as funções de financiamento de estudo e elaboração de projetos e de programas do desenvolvimento econômico" (De­creto-lei n.O 200, Art. 191).

1ST V. Capítulo 2.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 215

Que resta então fazer? De que depende, afinal, o êxi­to de uma reforma concebida em têrmos extensos e reno­vadores? Como acelerar as etapas de sua implantação? Como manter um clima de contínuo aperfeiçoamento da Administração Federal e uma atitude realista para efe­tivá-lo? Como, de fato, interessar o contribuinte, a coleti­vidade, na Reforma?

11.2 ROTEIRO PARA IMPLANTAÇÃO DA REFORMA

Todos êsses aspectos, embora não divulgados - no aguardo de que o Govêrno se decidisse sôbre a Reforma Administrativa - foram objeto de estudo por parte da assessoria governamental. Nada mais oportuno, portanto, do que procurar resumir seus pontos mais significativos.

Eis o roteiro de providências que, como resultado dos estudos preliminares, se esboçara para orientar a progra­mação da SEGUNDA FASE da Reforma Administrati­va, dando seguimento e continuidade à PRIMEIRA FASE que se completou com a promulgação da Lei.

A. Instalar o órgão de Implantação da Reforma

A implantação da Reforma Administrativa não pode prescindir de um órgão que se incumba de orientar e co­ordenar a adoção das medidas indispensáveis, atuando em harmonia com os princípios, diretrizes e propósitos consa­grados na Reforma. Terá, assim, de valer-se de processos flexíveis de ação que lhe assegurem, de um lado, o dina­mismo de um escritório privado e, de outro, a utilização intensiva de contratação de serviços especializados com pessoas físicas ou jurídicas, descentralizando-se a exe­cução dos trabalhos que forem ajustados. ~sse órgão de­verá, portanto, contar com um núcleo mínimo de pessoal especializado para articular e coordenar os estudos e tra­balhos que, sob a orientação superior do Ministro de Es­tado responsável pela Reforma Administrativa, e a super­visão imediata do responsável pela coordenação geral do órgão, terão de ser realizados. ~sse núcleo será o fiador inicial do pensamento e da mensagem de reforma do Ser­viço Público Federal. Daí o relêvo que a Lei lhe empres-

216 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

tou. na convicção de que sem a liderança de um Ministro de Estado que se dedique com afinco ao assunto, sem a coordenação geral do responsável pelo órgão, sem que êste funcione na forma ágil indicada - única compatível com o sentido da Lei - a Segunda Fase não terá condi­ções de ser levada avante de forma ordenada e produtiva.

B. Explicar e Divulgar a Reforma e as Medidas de sua Implantação

As condições em que se processou a Primeira Fase não enseJaram a intensiva divulgação das medidas con­cebidas. Impõe-se, por isso mesmo, que, logo após a de­cisão do Govêrno em aprovar a Reforma Administrativa, isto é, encerrada a Primeira Fase, se inicie um processo de ampla divulgação e explicação do contexto, dos mé­todos e dos objetivos a alcançar. Os dispositivos legais -sobretudo quando envolvem profundas alterações nos metodos de trabalho até então vigentes e se propõem a aumentar o grau de responsabilidade dos administradores - precisam ser minuciosamente explicados aos que vão participar do processo de mudança e aos que vão assistir e beneficiar-se de sua implantação, os contribuintes. Isso é tão mais importante quando se sabe que o pensamento administrativo brasileiro - na falta daquilo que denomi­namos de espírito universitário - é influenciado por tan­tos fatôres e por tantas teorias e concepções enraizadas, cuja influência na execução da reforma custa a todo pre­ço evitar, para não deformá-la. A criação de um clima de entendimento e compreensão para os objetivos da Refor­ma é absolutamente essencial ao desdobramento de suas etapas, sendo necessário buscar o interêsse da opinião pú­blica na sua execução, mantendo-a informada sôbre os passos que venham sendo dados para implantá-la. Êste é, outrossim, o único procedimento capaz de eliminar o cul­to das miragens, tão tenazmente incorporado aos hábitos dos nossos administradores, de evitar improvisações in­compatíveis com os propósitos da Reforma e impedir os retardamentos decorrentes da ineficiência ou incapacida­de dos agentes utilizados para as tarefas de implantação.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 217

C. Promover a Regulamentação e Implantação das Normas de Administração Financeira, de Contabilidade e Auditoria

Cremos haver deixado bem evidente no curso dês te trabalho o quanto é importante e prioritário, nesta Se­gunda Fase, a aprovação de regulamento que, baseado na Lei n.O 4.320, de 1964, e nas disposições inscritas nos Decretos-leis ns. 200 e 199, passe a disciplinar êstes im­portante assuntos, dando-se por definitivamente encer­rada a fase do Código e do Regulamento de Contabilidade Pública. Eis uma das tarefas precípuas a cuja coordena­ção se deverá entregar o órgão de implantação da Refor­ma. Paralelamente, cumprirá estudar a implantação do nôvo sistema (plano de contas, manuais de trabalho, es­quemas de funcionamento), matéria de igual importância e prioridade e que deverá ser confiada a especialistas, me­diante ajuste contratual.

D. Promover a Regulamentação das Partes Gerais da Lei de Reforma

Há na Lei assuntos que estão a exigir, na Segunda Fase, atenção urgente dos responsáveis pela implantação da Reforma, com vistas à expedição de regulamentos que permitam a pronta utilização dos métodos simplificados de trabalho previstos na Lei. Dentre êles, podem ser ci­tadas as Normas para Licitações, as Normas para Revisão da Política de Administração de Pessoal, as Normas de Material, Administração Patrimonial e Administração de Edifícios (Sistema de Serviços Gerais).

Em tôdas essas missões, a função de orientação e coordenadora cabe ao órgão de Implantação da Reforma, que agirá de acôrdo com os métodos antes referidos.

E. Coordenar a Regulamentação das Partes Específicas da Lei de Reforma

Em face da orientação consagrada na Lei, o órgão de implantação da Reforma terá, como uma de suas mais urgentes preocupações, a do estudo do Regulamento de cada Ministério. Isso se torna indispensável para explici-

218 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

tar a área de competência de cada Ministério, apenas enunciada na Lei, e definir as atribuições de cada Minis­tro de Estado, a fim de consolidar a fixação dos limites de ação de cada setor e determinar sua participação em áreas que se interliguem e entrosem mais intimamente. Nessa oportunidade será também fixada a posição dos órgãos centrais de direção superior, cuja presença, de­vidamente ajustada ao espírito e à orientação da Reforma Administrativa, vai determinar a desconcentração das cúpulas ministeriais e reforçar a autoridade e responsa­bilidade dos órgãos operativos. O que a Lei fêz com rela­ção à Presidência da República, isto é, quanto à cúpula governamental, precisa com a maior urgência também ser realizado em relação às cúpulas ministeriais. O objetivo é assegurar ao Ministro de Estado o pleno exercício de suas responsabilidades como principal autoridade admi­nistrativa do Ministério. As resistências serão imensas, a viciosa argumentação para manter o status quo estará sempre presente, o jôgo de pressões e de prestígio pessoal será intenso, fatôres que estão a indicar, claramente, a importância de contar-se com uma liderança firme na condução da Segunda Fase, através da presença de um Ministro de Estado atuante e de um responsável à frente do órgão de implantação da reforma, capaz e empreen­dedor. Demais, os estudos dos regulamentos dos Minis­térios vão revelar a conveniência de reorganizações inter­nas e de outras medidas tendentes a racionalizar sua or­ganização e funcionamento, harmonizando-os com as prescrições da Reforma Administrativa. O trabalho, como se vê, estender-se-á por outras fases de implementação da Reforma.

F. Promover a Implantação dos órgãos Centrais de Plane­jamento, Coordenação e Finanças, do Centro de Aper­feiçoamento e do Assessoramento Superior

As Secretarias-Gerais e as Inspetorias-Gerais de Fi­nanças, peças essenciais do mecanismo destinado a sus­tentar o funcionamento dos instrumentos básicos - Pla­nejamento, Orçamento-Programa e Programação Finan­ceira de Desembôlso - e indispensáveis à organização do Contrôle Interno da Administração Federal, precisam ser imediatamente implantadas, como condição mesmo de

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 219

exeqüibilidade da Reforma Administrativa. A mlSsao dêsses órgãos centrais só poderá ser atendida com a co­laboração do staff de assessoramento superior. O pessoal de assessoramento superior só poderá atuar nas condi­ções inovadoras exigidas pela Reforma Administrativa se o Centro de Aperfeiçoamento cumprir a finalidade para que foi criado na Lei. Todos êsses elementos se combinam e se completam para tornar operante a Reforma Adminis­trativa. Sem êles, não haverá possibilidade de transformar princípios, diretrizes, normas, critérios, políticas e con­trôle em mecanismos operacionais. Sem êles, a Reforma Administrativa ficará no papel. Nada mais se precisará acrescentar a êsse respeito, inclusive porque essa parte da Reforma foi exaustivamente explicada em tôdas as opor­tunidades, interna e externamente. Precisa-se tão-so­mente de ação, e esta só poderá decorrer da atuação do Ministro de Estado responsável pela Reforma Administra­tiva e do órgão incumbido da implantação.

G. Implementar as Medidas Visando ao Aperfeiçoamento do Sistema Nacional de Estatistica

A implementação dessas medidas, com apoio em pre­ceito constitucional Hl8 e na legislação específica expedi­da 199 deverá constituir-se também em área de grande in­terêsse para a Reforma Administrativa, pois os responsá­veis pela sua implantação terão de buscar a maneira de corrigir a terrível deficiência dos dados estatísticos dis­poníveis, criadora de tão grandes dificuldades para a ação administrativa.

H. Promover a Execução de Projetos Especiais Relaciona­dos com a Produtividade e a Melhoria dos Serviços

A opinião pública dificilmente deixará de impacien­tar-se enquanto aguardar as providências orgânicas que a Segunda Fase da Reforma Administrativa deve com­pletar, sendo de esperar que reclame, até com certa

i'" Constituição, Art. 8.0, XVII, ou: Compete à União legis­lar sôbre sistema estatístico e cartográfico nacionais.

'''' Decretos-leis ns. 161 e 284, de 13 e 28 de fevereiro de 1967.

220 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

impaciência - procedimento assaz justificável depois de quatorze anos de elocubrações - a presença de resultados concretos da aprovação da Reforma.

Afigura-se, pois, aconselhável que o órgão de im­plantação da Reforma, paralelamente ao cumprimento de seu cronograma normal de trabalho, deflagre algumas operações que se revelem capazes de proporcionar melho­rias imediatas ao funcionamento do Serviço Público Fede­ral. Isso teria a virtude de interessar, objetivamente, che­fes de serviço e funcionários em certos projetos e, bem assim, de convidar o público a participar da dinamiza­ção e simplificação dos serviços, como é de seu particular interêsse.

O rol de assuntos e providências a justificar sua in­clusão em projetos dessa natureza pode adquirir propor­ções inimagináveis, especialmente se a idéia se desdobras­se em outros tantos projetos de interêsse particular de de­terminado setor de trabalho ou de determinada área de atividade. Mencionaremos alguns itens, em relação aos quais parece haver maior concordância:

Diário Oficial - A simplificação da publicação, a re­dução dos custos industriais de fabricação e a distribui­ção eficiente constituem aspectos bastante importantes para justificar um projeto que se proponha a melhorar o Diário Oficial, sabendo-se que a Direção da Imprensa Na­cional estará muito interessada no assunto. A influência dos resultados dêsse projeto junto aos administradores e na opinião pública não seria desprezível. O simples fato de se obter racionalização e rapidez na distribuição do Diário Oficial por todo o território nacional e de tornar possível ser êle compulsado pelas bibliotecas espalhadas por todo o País favoreceria, sem dúvida, a imagem da Administração Federal e ajudaria a fazer sentir a pre­sença das medidas de reforma.

Cadastro das Organizações Federais - Êste projeto permitiria atender às necessidades imediatas dos traba­lhos de Reforma Administrativa e poderia traduzir-se em publicação informativa despretensiosa mas útil, a ser Imediatamente divulgada, constituindo-se no núcleo de retomada regular de uma publicação do gênero do Indi­cador da Administração Federal, tão bem recebido por todos mas que não se logrou manter atualizado. Não se

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 221

compreende que a Administração Federal deixe de con­tar com uma publicação de tanta utilidade e de interês­se geral, tanto mais quanto já existiu e feneceu pela in­capacidade dos órgãos responsáveis por sua edição.

Regime de Trabalho - Constitui tarefa de grande urgência e necessidade proceder-se ao levantamento dos diversos regimes de trabalho prevalecentes na Adminis­tração FederaL de modo a poder se relacionar horas de trabalho, catee-orias funcionais e salários atribuídos, fa­cilitando confrontos válidos com regimes equivalentes do setor privado. Tais levantamentos poderiam ser acompa­nhados de verificação, por amostragem, da maneira pela qual os horários regulamentares são, efetivamente, cum­pridos. As amostras deveriam incidir, inclusive, sôbre as unidades sujeitas a regime de tempo integral, pois há in­dícios veementes de que o sistema vem sendo desvirtua­do em suas finalidades.

Redistribuição de material e de equipamento - É notório haver no Serviço Público Federal equipamentos instalados e não utilizados, equipamentos sem utilização no aguardo de reparos e de outras simples medidas ad­ministrativas, de estoques não utilizáveis em uma unida­de administrativa, embora aproveitáveis em outras. Tais fatos poderiam conduzir a um projeto através do qual se revelasse o sentido renovador da Reforma Administrati­va, numa ação que, embora de caráter limitado, tenderia a estender-se, no decurso do tempo, com imenso proveito para acentuar-se o espírito de economia e pôr em relêvo as regras de boa administração no Serviço Público Fe­deral.

Unidades administrativas inoperantes - Os meios administrativos têm notícia da existência de unidades ad­ministrativas inoperantes e até mesmo de algumas cuja sobrevivência as modificações introduzidas na Adminis­tração não mais justificam. Através de um projeto bem concebido, seria possível coletar, sumàriamente, certos dados informativos capazes de habilitar o Govêrno a deli­berar em harmonia com os propósitos da Reforma Ad­ministrativa.

Subvew.;ões e Auxílios - Éste setor sempre favore­ceu a má aplicação dos dinheiros públicos, inclusive pela

222 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

proliferação de intermediários, em parte decorrente dos procedimentos burocráticos existentes. Sabe-se que o Mi­nistério da Saúde logrou operar verdadeira limpeza nessa área, o mesmo não acontecendo, porém, com o Ministério da Educação e Cultura. A reformulação das medidas de fiscalização e contrôle das subvenções e auxílios já en­contraria estudos preliminares indicativos das ações a serem adotadas, e produziria, certamente, sensível econo­mia para os cofres públicos e maior produtividade dos re­cursos financeiros alocados para finalidade de tanta im­portância para a coletividade. Esta é outra área que, en­frentada com vigor, beneficiaria a imagem da Adminis­tração Federal em todo o território nacional e ajudaria a obter-se da coletividade apoio para as medidas de re­forma.

Contacto do público com as repartições - O melhor atendimento do público nos guichês e em outros pontos de contacto, o exame das relações entre o público e os ór­gãos da Administração, com o objetivo de estabelecer nor­mas tendentes a dar solução ao problema de atritos en­tre a clientela das repartições e os funcionários que man­têm contactos diretos com esta, justificam um projeto que se propusesse a demonstrar, em alguns setores mais importantes, como é viável dar melhor tratamento ao as­sunto.

Assistência médico-social ao funcionalismo civil -O levantamento do custo da que é prestada pelo Hospital dos Servidores do Estado e a estimativa da clientela que poderia ser atendida se os custos e métodos fôssem os adotados nas organizações eficientes do setor privado ten­deriam a constituir motivo de grande interêsse para os funcionários e para a Administração, ensejando, provà­velmente, o encontro de soluções mais adequadas para o problema da assistência médico-social que o Govêrno deve proporcionar aos que lhe prestam colaboração.

Simplificação das decisões administrativas - Projeto de grande utilidade e interêsse seria aquêle que se propu­sesse a contribuir para a eliminação da mentalidade do processo. O processo é uma das mais arraigadas tra­dições da burocracia nacional, resultando, no caso da Ad-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 223

ministração Federal, essencialmente dos seguintes fa­rores:

1 . falta de clara definição das atribuições dos ór­gãos;

2. ausência de precisão na definição de responsa­bilidade, especialmente da responsabilidade de decidir;

3. inexistência de diretrizes e de políticas que per­mitam aos responsáveis pelos escalões inferiores agir em consonância com o pensamento das cúpulas administrativas;

4. falta de documentação junto ao órgão que lhe permita contar, prontamente, com os elementos e dados de que carece para resolver os casos que lhe são propostos;

5. receio de decidir e conseqüente tendência de empurrar o caso para a decisão de outrem.

O projeto deveria ter em vista: 1. encorajar a tomada de decisões, em todos os ní­

veis; 2. encorajar a realização de contactos, formais ou

informais, entre as chefias para fins de coorde­nação;

3. utilizar todos os meios disponíveis para a reu­nião tempestiva de dados que facilitem e sejam essenciais para que se profiram as decisões;

4. uso de formulários que permitam a reunião dos dados e das informações indispensáveis, elimi­nando-se pareceres, informações, despachos de encaminhamento, enfim, todo aquêle arsenal herdado pelo burocratismo.

O projeto poderia escolher determinado Ministério, ou, preferentemente, determinado setor para demonstra­ção de sua exeqüibilidade. Entendimentos haviam sido iniciados com a Escola de Administração Pública da Fun­dação Getúlio Vargas que vem, há tempos, estudando e realizando cursos sôbre o problema de Tomada de Deci­sões, sendo, assim, sua experiência de muita valia para êste projeto, como, aliás, para os demais de interêsse da

226 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

tos outros aspectos tendentes a modernizar a Administra­ção Federal, tudo isso vai permitir que se possa, afinal, definir melhor uma cúpula administrativa qualificada, simplificada e atuante, armada dos instrumentos de ação indispensáveis, desburocratizada em seu funcionamento. Cria-se, assim, a condição fundamental para definir a posição dos órgãos da Administração Federal, com a sua localização na Capital da República ou em outras cidades de importância na vida econômica e financeira do País, ou em outras mais de perto relacionados com os proble­m'1S afetos aos diversos órgãos integrantes do Serviço Público Federal. 202

A esquematização organizacional, instrumental e funcional definida na Reforma Administrativa permitirá, enfim, que se possa planejar em bases realísticas o des­locamento dos órgãos que, necessàriamente, ali devam funcionar; e dos demais, para Brasília ou outras cidades - permanecendo, inclusive no Rio de Janeiro, quando fôr o caso - conforme indicarem as conveniências admi­nistrativas de uma programação que também se preocupe com a adequada instalação dos serviços públicos federais em todo o território nacional, aspecto êste que, apesar de sua importância, vinha sendo descurado e foi deixado ao abandono por insistir-se em somente focalizar o ân­gulo Brasília.

,." o irrealismo e a irracionalidade da intenção manifesta­da, no passado, por certos administradores de mudar todos os órgãos de seus Ministérios para Brasília certamente perderá sentido diante da esquematização adotada pela Reforma Ad­ministrativa. Recordamo-nos, por exemplo, de que muito se anunciou como importante realização do Ministério da Viação e Obras Públicas no campo administrativo a mudança do De­partamento Nacional de Obras Contra as Sêcas para Brasília. Ao nosso entender, tal providência não encontra a menor jus­tificativa.

ANEXO~

BIBLIOGRAFIA *

1 Anteprojeto de Constituição elaborado pela Comissão Espe­cial de Juristas (Correio da Manhã de 25 de agôsto de 1966, Caderno da Constituição) .

2 Projeto de Constituição elaborado pelo Poder Executivo (1966) .

3 Constituição do Brasil (1967). 4 Decreto-lei n.O 199, de 25 de fevereiro de 1967 (Lei Orgâ­

nica do Tribunal de Contas) . Justificativa. In: Diário Oficial de 27 de fevereiro de 1967 (Suplemento).

5 Decreto-lei n.O 200, de 25 de fevereiro de 1967 (Organização da Administração Federal e Diretrizes para a Reforma Ad­ministrativa). Justificativa. In: Diário Oficial de 27 de fe­vereiro de 1966 (Suplemento) .

6 Projeto do Presidente Getúlio Vargas (Projeto n.O 3.563/1953, da Câmara dos Deputados). Justificativa.

7 Estudos da Comissão de Estudos e Projetos Administrativos (CEPA): Relatórios, em quatro volumes, sôbre A Reforma Administra ti va Brasileira.

8 Estudos da Comissão Amaral Peixoto: Projeto n.O 1.482/63, da Câmara dos Deputados, sôbre a Lei Orgânica do Sistema Administrativo Federal (e Projetos ns. 1.483-A, 1.484-A e 1.486-A, todos de 1963, referentes a Sistema de Material, Conselho de Defesa do Sistema do Mérito e Organização do Distrito Federal). Justificativa.

• Além da Constituição de 1967 e respectivos anteprojetos, arrolam-se, exclusivamente, os documentos diretamente rela­cionados com os Projetos de Reforma Administrativa, no período de 1952 a 1967.

Os demais documentos e livros citados nos diversos capítulos dizem respeito, mais diretamente, a pontos de esclarecimento ou de debate focalizados em cada capítulo, encontrando-se as res­pectivas indicações em rOdapé.

CONSTITUIÇÃO DO BRASIL

TRECHOS REFERIDOS NA PRESENTE MONOGRAFIA

CAPITULO VI

Do Poder Legislativo

SEÇÃO VI

Do Orçamento

Art. 63 - A despesa pública obedecerá à lei orça­mentária anual, que não conterá dispositivo estranho à fixação da despesa e à previsão da receita. Não se incluem na proibição:

I - a autorização para abertura de créditos suple­mentares e operações de crédito por antecipação da re­ceita;

II - a aplicação do saldo e o modo de cobrir o deficit, se houver.

Parágrafo único. As despesas de capital obedecerão ainda a orçamentos plurianuais de investimento, na for­ma prevista em lei complementar.

Art. 64 - A lei federal disporá sôbre o exercício fi­nanceiro, a elaboração e a organização dos orçamentos públicos.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 231

§ 1.0 São vedados, nas leis orçamentárias ou na sua execução:

a. . o estôrno de verbas; b. a concessão de créditos ilimitados; c. a abertura de crédito especial ou suplemen­

tar sem prévia autorização legislativa e sem indicação da receita correspondente;

d. a realização, por qualquer dos Podêres, de despesas que excedam as verbas votadas pelo Legislativo, salvo as autorizadas em crédito extraordinário.

§ 2.0 A abertura de crédito extraordinário somente será admitida em casos de necessidade imprevista, como guerra, subversão interna ou calamidade pública.

Art. 65 - O orçamento anual dividir-se-á em cor­rente e de capital e compreenderá obrigatoriamente as despesas e receitas relativas a todos os POdêres, órgãos e fundos, tanto da administração direta quanto da indire­ta, excluídas apenas as entidades que não recebam sub­venções ou transferências à conta do orçamento.

§ 1.0 A inclusão, no orçamento anual, da despesa e receita dos órgãos da administração indireta será feita em dotações globais e não lhes prejudicará a autonomia na gestão dos seus recursos, nos têrmos da legislação es­pecífica.

§ 2.° A previsão da receita abrangerá tõdas as ren­das e suprimentos de fundos, inclusive o produto de ope­rações de crédito.

§ 3.0 Ressalvados os impostos únicos e as disposições desta Constituição e de leis complementares, nenhum tri­buto terá a sua arrecadacão vinculada a determinado ór­gão, fundo ou despesa. A 'lei poderá, todavia, instituir tri­butos cuja arrecadação constitua receita do orçamento de capital, vedada sua aplicação no custeio de despesas correntes.

§ 4.0 Nenhum projeto, programa, obra ou despesa, cuja execução se prolongue além de um exercício finan­ceiro, poderá ter verba consignada no orçamento ~nual, nem ser iniciado ou contratado, sem prévia inclusao no orçamento plurianual de investimento, ou sem prévia lei

232 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

que O autorize e fixe o montante das verbas que anual­mente constarão do orçamento, durante todo o prazo de sua execução.

§ 5.° Os créditos especiais e extraordinários não po­derão ter vigência além do exercício financeiro em que foram autorizados, salvo se o ato de autorização fôr pro­mulgado nos últimos quatro meses do exercício financei­ro, quando poderão viger até o término do exercício sub­seqüente.

§ 6.0 O orçamento consignará dotações plurianuais para a execução dos planos de valorização das regiões menos desenvolvidas do País.

Art. 66 - O montante da despesa autorizada em ca­da exercício financeiro não poderá ser superior ao total das receitas estimadas para o mesmo período.

§ 1.0 O disposto neste artigo não se aplica: a. nos limites e pelo prazo fixado em resolução do

Senado Federal, por proposta do Presidente da Repúbli­ca, em execução de política corretiva de recessão econô­mica;

b. às despesas que, nos têrmos desta Constituição, podem correr à conta de créditos extraordinários.

§ 2.° Juntamente com a proposta de orçamento anual ou de lei que crie ou aumente despesa, o Poder Exe­cutivo submeterá ao Poder Legislativo as modificações na legislação da receita, necessárias para que o total da despesa autorizada não exceda à prevista.

§ 3.° Se no curso do exercício financeiro a execução orçamentária demonstrar a probabilidade de deficit su­perior a dez por cento do total da receita estimada, o Po­der Executivo deverá propor ao Poder Legislativo as me­didas necessárias para restabelecer o equilíbrio orçamen­tário.

§ 4.° A despesa de pessoal da União, Estados ou Mu­nicípios não poderá exceder de cinqüenta por cento das respectivas receitas correntes.

Art. 67 - É da competência do Poder Executivo a iniciativa das lei orçamentárias e das que abram créditos, fixem vencimentos e vantagens dos servidores públicos, concedam subvenção ou auxílio, ou de qualquer modo au­torizem, criem ou aumentem a despesa pública.

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 233

§ 1.0 Não serão objeto de deliberação as emendas de que decorra aumento da despesa global ou de cada órgão, projeto ou programa, ou as que visem a modificar o seu montante, natureza e objetivo.

§ 2.° Os projetos de lei referidos neste artigo somen­te sofrerão emendas nas comissões do Poder Legislativo. Será final o pronunciamento das comissões sôbre emen­das, salvo se um têrço dos membros da Câmara respec­tiva pedir ao seu Presidente a votação em plenário, sem discussão, de emenda aprovada ou rejeitada nas comis­sões.

§ 3.° Ao Poder Executivo será facultado enviar men­sagem a qualquer das Casas do Legislativo, em que es­teja tramitando o Projeto do Orçamento, propondo a sua retificação, desde que não esteja concluída a votação do subanexo a ser alterado.

Art. 68 - O projeto de lei orçamentária anual será enviado pelo Presidente da República à Câmara dos Depu­tados até cinco meses antes do início do exercício finan­ceiro seguinte: se dentro do prazo de quatro meses, a con­tar de seu recebimento, o Poder Legislativo não o devol­ver para sanção, será promulgado como lei.

§ 1.0 A Câmara dos Deputados deverá concluir a vo­tação do projeto de lei orçamentária dentro de sessenta dias. Findo êsse prazo, se não concluída a votação, o pro­jeto será imediatamente remetido ao Senado Federal, em sua redação primitiva e com as emendas aprovadas.

§ 2.° O Senado Federal se pronunciará sôbre o proje­to de lei orçamentária dentro de trinta dias. Findo êsse prazo, não concluída a revisão, voltará o projeto à Câ­mara dos Deputados com as emendas aprovadas e, se não as houver, irá a sanção.

§ 3.° Dentro do prazo de vinte dias, a Câmara dos Deputados deliberará sôbre as emendas oferecidas pelo Senado Federal. Findo êsse prazo, sem deliberação, as emendas serão tidas como aprovadas e o projeto enviado a sanção.

§ 4.° Aplicam-se ao projeto de lei orçamentária, no que não contrarie o disposto nesta Seção, as demais re­gras constitucionais da elaboração legislativa.

234 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Art. 69 - As operações de crédito para antecipação da receita autorizada no orçamento anual não poderão exceder a quarta parte da receita total estimada para o exercício financeiro, e serão obrigatóriamente liquidadas até trinta dias depois do encerramento dêste.

§ 1.0 A lei que autorizar operação de crédito, a ser li­quidada em exercício financeiro subseqüente, fixará des­de logo as dotações a serem incluídas no orçamento anual, para os respectivos serviços de juros, amortização e res­gate.

§ 2.0 Por proposta do Presidente da República, o Se­nado Federal, mediante resolução, poderá:

a. fixar limites globais para o montante da dívida consolidada dos Estados e Municípios;

b. estabelecer e alterar limites de prazos, mínimos e máxímos, taxas de juros e demais condições das obriga­ções emitidas pelos Estados e Municípios;

c. proibir ou limitar temporàriamente a emissão e o lançamento de obrigações, de qualquer natureza, dos Estados e Municípios.

Art. 70 - O numerário correspondente às dotações constantes dos subanexos orçamentários da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e dos Tribunais Federais, com jurisdição em todo o território nacional será entre­gue no início de cada trimestre, em cotas correspondentes a três duodécimos.

Parágrafo único. Os créditos adicionais autorizados por lei, em favor dos órgãos aludidos neste artigo, terão o mesmo processamento, devendo a entrega do numerá­rio efetivar-se, no máximo, quinze dias após a sanção ou promulgação.

SEÇÃO VII

Da Fiscalização Financeira e Orçamentária

Art. 71 - A fiscalização financeira e orçamentária da União será exercida pelo Congresso Nacional através de contrôle externo, e dos sistemas de contrôle interno do Poder Executivo, instituído por lei.

§ 1.0 O contrôle externo do Congresso Nacional será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas e compre-

A REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1967 235

enderá a apreciação das contas do Presidente da Repú­blica, o desempenho das funções de auditoria financeira e orçamentária, e o julgamento das contas dos adminis­tradores e demais responsáveis por bens e valôres públi­cos.

§ 2.0 O Tribunal de Contas dará parecer prévio, em sessenta dias, sôbre as contas que o Presidente da Repú­blica prestar anualmente. Não sendo estas enviadas den­tro do prazo, o fato será comunicado ao Congresso Nacio­nal, para os fins de direito, devendo o Tribunal, em qual­quer caso, apresentar minucioso relatório do exercício fi­nanceiro encerrado.

§ 3.° A auditoria financeira e orçamentária será exercida sôbre as contas das unidades administrativas dos três Podêres da União, que, para êsse fim, deverão remeter demonstrações contábeis ao Tribunal de Contas, a quem caberá realizar as inspeções que considerar necessárias.

§ 4.° O julgamento da regularidade das contas dos administradores e demais responsáveis será baseado em levantamentos contábeis, certificados de auditoria e pro­nunciamentos das autoridades administrativas, sem pre­juízo das inspeções referidas no parágrafo anterior.

§ 5.° As normas de fiscalização financeira e orça­mentária estabelecidas nesta seção aplicam-se às autar­quias.

Art. 72 - O Poder Executivo manterá sistema de contrôle interno, visando a:

I - criar condições indispensáveis para eficácia do contrôle externo e para assegurar regularidade à realiza­ção da receita e da despesa;

n - acompanhar a execução de programas de tra­balho e do orçamento;

In - avaliar os resultados alcançados pelos admi­nistradores e verificar a execução dos contratos.

Art. 73 - O Tribunal de Contas tem sede na Capi­tal da União e jurisdição em todo o território nacional.

§ 1.0 O Tribunal exercerá, no que couber, as atribui­ções previstas no Art. 110, e terá quadro próprio para o seu pessoal.

§ 2.0 A lei disporá sôbre a organização do Tribunal, podendo dividi-lo em Câmaras e criar delegações ou ór-

236 CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

gãos destinados a auxiliá-lo no exercício das suas funções e na descentralização dos seus trabalhos.

§ 3.0 Os Ministros do Tribunal de Contas serão no­meados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, dentre brasileiros, maiores de trinta e cinco anos, de idoneidade moral e notórios conhecimentos jurídicos, econômicos, financeiros ou de administração pública, e terão as mesmas garantias, prerrogativas, vencimentos e impedimentos dos Minis­tros do Tribunal Federal de Recursos.

§ 4.° No exercício de suas atribuições de contrôle da administração financeira e orçamentária, o Tribunal re­presentará ao Poder Executivo e ao Congresso Nacional sôbre irregularidades e abusos por êle verificados.

§ 5.0 O Tribunal de Contas, de ofício ou mediante provocação do Mitiistério Público ou das Auditorias Fi­nanceiras e Orçamentárias e demais órgãos auxiliares, se verificar a ilegalidade de qualquer despesa, inclusive as decorrentes de contratos, aposentadorias, reformas e pen­sões,deverá:

a. assinalar prazo razoável para que o órgão da ad­mistração pública adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei;

b. no caso do não atendimento, sustar a execução do ato, exceto em relação aos contratos;

c. na hipótese de contrato, solicitar ao Congresso Nacional que determine a medida prevista na alínea ante­rior, ou outras que julgar necessárias ao resguardo dos objetivos legais.

§ 6.° O Congresso Nacional deliberará sôbre a solici­tação de que cogita a alínea c do parágrafo anterior, no prazo de trinta dias, findo o qual, sem pronunciamento do Poder Legislativo, será considerada insubsistente a impugnação.

§ 7.° O Presidente da República poderá ordenar a exe­cução do ato a que se refere a alínea b do § 5.0, ad refe­rendum do Congresso Nacional.

§ 8.0 O Tribunal de Contas julgará da legalidade das concessões iniciais de aposentadorias, reformas e pen­sões, independendo de sua decisão as melhorias poste­riores.

CADERNOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

ADMINISTRAÇAO GERAL

2 - Planejamento do Desenvolvimento Economico de Países Subdesenvol-vidos - ROBERTO DE OLIVEIRA

8 - Confronto entre a Administração Pública e a Administração Parti-

CAMPOS

cular - BENEDICTO SILVA 9 - Relações Humanas na Indústria - E. DAYA

11 - As Corporações Públicas na Grã-Bretanha - GUSTAVO LESSA

15 - A Justiça Administrativa na Fran-ça - FRANÇQIS GAZIER

16 - O Estudo da Administração - WOODROW WILSON 19 - A Era do Administrador Profissio-

nal - BENEDICTO SILVA 21 - Assistência Técnica em Adminis-

tração Pública - BENEDICTO SILVA 23 - Introdução à Teoria Geral de Ad-

ministração Pública - PEDRO MUNOZ AMATO 25 - A Justiça Administrativa no Brasil - J. GUILHERME DE

ARAGAO 29 - O Conceito de Estado Francês - FRANÇOIS GAZIER 30 - A Profissiografia do Administrador - MIRA Y LOPEZ 31 - O Ambiente na Administração PÚ-

blica - ROSCOE MARTIN 33 - Planejamento - PEDRO MUNOZ AMATO 34 - Execução Planej ada - HAELOW S. PERSON 35 - Como Dirigir Reuniões - EUGENE RAUDSEPP 37 - Contrôle dos Gastos Eleitorais - GERALDO WILSON

NUNAN 38 - Procedimento para "Forçar" Acôr-

do - IRVING J. LEE 39 - Relações Humanas nas Atividades

Modernas - ROBERT WOOD JOHNSON

40 - O Govêrno Estadual nos Estados Unidos - GEORGE W. BEMIS

43 - O Assessoramento da Presidência da República - CLEANTHO P. LEITE

44 - Taylor e Fayol - BENEDICTO SILVA 45 - A Administração Civil na Mobiliza-

ção Bélica - BENEDICTO SILVA 49 - Gênesis do Ensino de Administra-

ção Pública no Brasil - BENEDICTO SILVA 50 - Uma Teoria Geral de Planejamen-

to - BENEDICTO SILVA

51 - Introdução ao Planejamento Re-gional - JOHN R. P. FRIEDMANN

58 - Processo Decisório - Curso Pilôto - MARIA PIA DUARTE naEBAP GOMES

61 - O Aumento do Preço do Aço da C.S.N. - Estudo de um Caso - FRANK F. SHERWOOD

65 - Uma Crise de Autoridade - EURICO MADEIRA 66 - Condições de Vida e Planejamento

Físico - FRANCISCO WHITAKER

68 - Um Litígio Administrativo

72 - O Assessoramento Legislativo

73 - A Reforma Administrativa de 1967

FERREIRA - CLOVIS ZOBARAN MON­

TEIRO - ANA MARIA BRASILEI­

RO - J. DE NAZARÉ T. DIAS

AD~STRAÇAO DE PESSOAL

5 - Alguns Aspectos do Treinamento - A. FONSECA PIMENTEL 7 - Pequena Bibliografia sôbre Treina-

mento - A. FONSECA PIMENTEL 12 - As Funções do Administrador de

Pessoal no Serviço Público - HENRY REINING JR. 13 - Dois Programas de Administração

de Pessoal 27 - Classificação de Cargos - J. DE NAZARÉ T. DIAS 36 - Em Busca de Executivos para Car-

gos de Direção Geral - ROBERT N. MACMUR-RAY

48 - Introdução aos Testes Psicológicos - RUTH SCHEEFFER 56 - Formação para a Administração

Pública - RIVA BAUZER 59 - Laboratório de Sensibilidade - Um

Estudo Exploratório - FELA MOSCOVICI 60 - Política e Administracão de Pes-

soai: "Estudo de dois cásos" - CARLOS VERíSSIMO DO

63 - Formação para a Administração

AMARAL e KLEBER TA­TINGE DO NASCIMEN­TO

Pública - II - RIVA BAUZER 70 - A Administração de Pessoal Vista

pelos Chefes de Serviço - ASTÉRIO DARDEAU VIEIRA

71 - O Processo Decisório no Serviço do Pessoal - ASTÉRIO DARDEAU

VIEIRA

ADMINISTRAÇAO DE MATERIAL

14 - Centralização de Compras para o Serviço Público - JOHN R. SIMPSON

ADMINISTRAÇAO MUNICIPAL

17 - Teoria das Funções Municipais - BENEDICTO SILVA 18 - Curso de Administração Municipal

- Programa e Justificação - DIOGO LORDELLO DE MELLO

26 - Panorama da Administração Mu-nicipal Brasileira - DIOGO LORDELLO DE

MELLO 46 - A Moderna Administração Muni-

cipal - moGO LORDELLO DE

57 - Organização do Município MELLO

- moGO LORDELLO DE MELLO

ORGANIZAÇAO E ~TODOS

4 - Teoria dos Departamentos de Cli-entela - BENEDICTO SILVA

10 - A Departamentalização no Nível Ministerial - GUSTAVO LESSA

20 - O & M na Administração Inglêsa - JOHN R. SIMPSON 22 - O & M na Administração Sueca - TARAS SALLFORS 28 - Principais Processos de Organiza-

ção e Direção - CATHERYN SECKLER HUDSON

42 - Uma Análise das Teorias de Orga-nização - BEATRIZ M. DE SOUZA

WAHRLICH 53 - Introdução ao PERT Básico - BRENO GENARI 54 - Estudos de Organização: Dois casos - LUIZ CARLOS DE DANIN

LÔBO 67 - Uma Análise de Sistemas Adminis-

trativos - BRENO GENARI

RELAÇÕES PÚBLICAS

1 - Relações Públicas, Divulgação e Propaganda - BENEDICTO SILVA

3 - Publicidade Administrativa - BENEDICTO SILVA 24 - Relações Públicas no Govêrno Mu-

nicipal - L. C. HILL

ORÇAMENTO E FINANÇAS PúBLICAS

6 - Os Princípios Orçamentários - SEBASTIAO SANT'ANNA E SILVA

32 - Instituições Orçamentárias Funda-mentais - NEWTON CORRÊA

RAMALHO 41 - Orçamentos - PEDRO MU&OZ AMATO 47 - Teoria e Prática de Orçamento Mu-

nicipal - J. TEIXEmA MACHADO JÚNIOR

52 - Estrutura do Orçamento e Classifi-cação das Contas Públicas - NAçõES UNIDAS

55 - Administração Orçamentária Com-parada - J. TEIXEIRA MACHADO

JÚNIOR 62 - A Adoção do Orçamento-Programa

pelo Estado da Guanabara - FRANK P. SHERWOOD 64 - O Caso da Barrilha - ALUYSIO GUIMARAES 69 - Aprovação das Contas do Executivo

da Guanabara em 1962 - EVALDO MACEDO DE OLIVEmA

ARQUIVOS BRASILEIROS DE PSICOTÉCNICA (A. B. P.)

Expediente

Diretor: M. B. Lourenço Filho Redator-Chefe: Wedher Modenezi Wanderley Secretário: Athayde Ribeiro da Silva . Corpo Redatorial: Aroldo Rodrigues, Elso AlTuda, Fran­cisco Campos, Franco Seminério, Henrique Baez, Isabel Adrados, Monique Augras, Leonilda D' Annibale Braga. Maria Helena Novaes e Ruth Scheeffer.

Trimestral.

Publicação do Instituto de Seleção e Orientação Profis­sional (ISOP) da Fundação Getúlio Vargas, iniciada em setembro de 1949, e na qual o leitor encontrará artigos e comentários atuais sôbre temas psicológicos. além de seleta informação bibliográfica.

CONJUNTURA ECONÔMICA (C. E. P. e C. E. I.)

Expediente

Diretor: José Garrido Tôrns Redator-Chefe: Dênio Nogueira Secretário: Newton Luiz do Rêgo

Corpo Redatorial: Edison Cezar de Carvalho, Augusto Cesar Cardoso, Basílio Martins, Ernst Muhr, Geoffrey A. Langlands, Hélio M. Escobar, Herbert Friedmann, Jayr Dezolt, John O. Schroy, Jorge Kingston, Lúcia Marinho Pirajá, Mário Henrique Simonsen, Orlando de Souza, Oswaldo R. Franco, Pedro Paulo Barbosa da Costa, Tupy C. Pôrto e Ivan C. Duarte.

Mensal.

Publicada a partir de novembro ae 1947. Revista mensal, do Instituto Brasileiro de Economia da. F. G. C., circula em duas edições, portuguêsa e inglêsa, apresentando aná­lise da situação e dos problemas econômicos e financeiro." nacionais e estrangeiros, além dos índices econômico­financeiros do País.

CURRICULUM (CUR.)

Expediente Diretor: Irene Estevão de Oliveira Redator-chefe: Amaury Pereira Muniz Secretário: Jayder Teixeira

Trimestral.

Redatores: Adolfo Riedel Ratisbona, Gastão Jacinto Go­mes, Jorge José Abib, Maria Zely de Souza Muniz, Paulo Pereira Muniz. Salomão Santana Daniel e Teresinha M. Teixeira. Publicação iniciada em 1962 sob a responsabilidade do Colégio Nova Friburgo; dedica-se a questões relativas ao ensino médio, incluindo em suas páginas trabalhos sôbre didática, auxílios audiovisuais, práticas educativas e de­mais assuntos que se relacionem com o problema da edu­cação.

REVISTA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRÊSAS (R. A. E.)

Expediente Diretor: Ary Bouzan Redator-Chefe: Esdras Borges da Costa Secretária: Nilza Manro do Prado Corpo Redatorial: Heinrich Rattner, Ivan Pinto Dias, Kurt E. Weil. Laerte Leite Cordeiro, Luiz Carlos Bresser Pereira, Luiz Felippe Valle da Silva, Mauro Brandão Lo­pes, Milton Huppert Monte Carmello. Orlando Figueiredo, Pólia Lerner Hamburger e Ruy Vianna Braga.

Trimestral.

Publicada a partir de maio de 1961 sob a responsabilidade do Centro de Pesquisas e Publicações da Escola de Admi­nistração de Emprêsas de São Paulo, da Fundação Ge­túlio Vargas. destina-se a:

a - Fornecer elementos e critérios mais atualizados da moderna administração de emprêsas.

b - Focalizar ângulos de interpretação dos fatos e problemas.

c - Abrir novas perspectivas para uma atuação mais produtiva e relevante.

REVISTA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (R. A. P.)

Expediente Diretor: Diogo Lordello de Mello Redatora: Mara Biasi Ferrari Pinto Conselho de Direção: Eutacílio da Silva Leal, Isaac Kerstenetzky, Fernando Bessa de Almeida, Kleber Ta­tinge do Nascimento e Antônio Lúcio Furtado. Semestral. Publicação iniciada em 1967, reflete o alto nível atin­gido pela pesquisa e o ensino da Administração públíca no Brasil. Revista do Centro de Pesquisas Administrativas da Escola Brasileira de Administração Pública (EBAP) conta, em seu corpo de colaboradores efetivos, com os mais respeitados especialistas brasileiros.

REVISTA BRASILEIRA DE ECONOMIA (R. B. E.)

Expediente Diretor: Isaac Kerstenetzky Redator-Chefe: José Maria Gouvêa Vieira Principais Colaboradores: Jorge Kingston, Octávio Gou­vêa de Bulhões, Eugênio Gudin, Mário Henrique Simon­sen, Ruy Miller Paiva e Julian Magalhães Chacel Trimestral. Publicada a partir de setembro de 1947 sob a orientação do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) da F. G. V., divulga trabalhos de economia teórica e aplicada de eco­nomistas brasileiros e estrangeiros. Além de um número inteiramente dedicado, todos os anos, às contas nacionais do Brasil, a revista tem reproduzido conferências de professôres visitantes, algumas das quais são hoje famo­sas na literatura econômica.

REVISTA DE CIENCIA POLÍTICA (R. C. P.)

Expediente Diretor: Themístocles Brandão Cavalcanti Secretário: Armando de Oliveira Marinho Conselho Diretor: Alfredo Lamy F.o, Flávio Novelli, Bar­bosa Lima Sobrinho, Bilac Pinto, Caio Tácito, Carlos Me-

deiros Silva. Hermes Lima, Oswaldo Trigueiro, Se abra Fagundes e Victor Nunes Leal.

Trimestral.

Publicada a partir do primeiro semestre de 1958, como órgão do Instituto de Direito Público e Ciência Política. Inicialmente denominada Revista de Direito Público e Ciência Política, teve seu título modificado para Re­vista de Ciência Política, em 1967, por decisão do Con­selho do IDPCP. Publica artigos doutrinários, bibliografia e informes em geral, de preferência sôbre problemas de sociologia política, análise das instituições do Estado e da maneira como se comportam.

REVISTA DE DIREITO ADMINISTRATIVO (R. D. A.)

Expediente Diretor: Carlos Medeiros Silva Redatores-Secretários: Alfredo de Almeida Paiva e L. C. Miranda Lima Redatores: A. Goncalves de Oliveira, Victor Nunes Leal e Caio Tácito. . '

Trimestral.

Publicada a partir de março de 1946, de início sob a res­ponsabilidade do DASP constituindo a 2.a seção da "Re­vista do Serviço Público. A partir de julho de 1946 pas­sou à responsabilidade da Fundação Getúlio Vargas que a pública trimestralmente. Destina-se a todos quantos, no serviço público ou fora dêle, se dedicam ao estudo e à aplicação do Direito.

índices: Periàdicamente, de 30 em 30 números, a re­vista edita o índice Remissivo de suas edições. Êsse índice, de rara utilidade prática. contém: além de completa in­dicação das matérias e autores, revisão integral da le­gislação do período e resumo da jurisprudência publica­da. constituindo-se, assim, em roteiro seguro para pes­quisas e consultas. Já à venda os dois primeiros volumes, correspondentes ao números de 1 a 30 e 31 a 60. respec­tivamente.

Nas principais livrarias do País ou pelo Reembôlso Postal: Praia de Botafogo 186 - Caixa Postal 29 - ZC-02 Rio de Janeiro - G B

FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS

Entidade de caráter técnico-educativo, instituída em 20 de de­zembro de 1944. como pessoa jurídica de direito privado, visando ao estudo dos problemas da organização racional do trabalho. especialmente nos seus aspectos administrativo e social. e à conformidade de seus métodos às condições do meio brasileiro.

CONSELHO DIRETOR

Presidente: - LUIZ SIMõES LOPES

Vice-Presidente: - EUGÊNIO GUDIN

MEMBROS: Alberto Sá de Souza Brito Pereira. Carlos Medeiros Silva. João Carlos Vital. Jorge Oscar de Mello Flôres, José Joaquim de Sá Freire Alvim e Rubens d'Almada Horta Pôrto

CONSELHO CURADOR

Presidente: - MAURíCIO NABUCO

Vice-Presidente: - ALBERTO PIRES AMAR ANTE

ME1ffiROS: Antônio Garcia de Miranda Netto, Antônio Ribeiro França Filho. Apolônio Jorge de Faria Salles, Ary Frederico Tórres. Brasílio Machado Neto. Carlos Alberto de Carvalho Pinto, Cezar Reis de Cantanhede e Almeida. Celso Timponi. Francisco Monto,ios. Heitor Campello Duarte, Alzira Vargas do Amaral Peixoto. Henrique Domingos Ribeiro Barbosa, Joaquim Bertino • de Moraes Carvalho, José de Nazaré Teixeira Dias, Jurandir Lodi. Mário Paulo de Brito. Moacyr Velloso Cardoso de Oliveira,

Astério Dardeau Vieira e Paulo de Tarso Leal

Presidente da Fundação: LUIZ SIMõES LOPES Diretor Executivo: ALIM PEDRO

INSTITUTO DE DOCUMENTAÇÃO Diretor: BENEDICTO SILVA

SERVIÇO DE PUBLICAÇõES Diretor: RAUL LIMA

FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS

Praia de Botafogo 186

Caixa Postal 29 - ZC-02

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INFORMAÇÃO E ATUALIZAÇÃO Um dos aspectos marcantes da evolução polí­

tica, econômica e social de nosso tempo é a impor­tância crescente das comunicações, com o relêvo da função informativa. Tão marcante é êsse destaque que já se fala no surgimento de uma nova ciência, a informática, cujo escopo seria a análise e aperfei­çoamento dos métodos de transmissão de conheci­mentos e dados.

De qualquer maneira, a todos será pacífica a certeza de que um jovem universitário moderno manipula com uma soma de dados inúmeras vêzes superior ao da maioria dos "gênios" da antiguidade.

Não apenas a computarização de dados sofreu verdadeira revolução, como, também, a vida útil das informações recebeu impacto irremediável. Em nossos dias as verdades científicas têm vida curta. Assim, urge informar o maior número de dados no menor período de tempo.

A Fundação Getúlio Vargas, tendo surgido para atender a necessidades decorrentes dessa evo­lução, defrontou-se com a acentuada escassez, em nossa língua, de literatura especializada. Daí o re­lêvo natural logo adquirido, no conjunto de suas atividades, pelo setor editorial.

Os diversos Institutos componentes da Funda­ção Getúlio Vargas, Instituto Brasileiro de Admi­nistração, Instituto Brasileiro de Economia, Insti­tuto de Direito Público e Ciência Política, Instituto de Documentação, Instituto de Seleção e Orienta­ção Profissional, e o seu Departamento de Ensino, cada um em sua especialidade, contam-se entre os principais centros brasileiros e latino-americanos de pesquisa e ensino.

Constituindo suas edições a cristalização das pesquisas e estudos dos diversos Institutos, o Ser­viço de Publicações vem realizando trabalho o mais profícuo no alargamento e aprofundamento do pa­norama cultural e editorial brasileiro.

Seu catálogo de publicações é distlibuído gra-tuitamente.

Os interessados deverão escrever para: FUNDAÇÃO GETúLIO VARGAS Serviço de Publicações Praia de Botafogo 186 C. P. 29 - ZC-02 - Rio de Janeiro, GB.

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São Paulo ~ SP. EM UM DE SEUS AGENTES Belém - PA Livraria Martins - Av. Campos Sales 171 Fortaleza - CE Ciência e Cultura Ltda. - Rua Floriano Peixoto 735 -s 306 Sr. Anibal Bonavides Natal- RN Livraria Universitária - Av. Rio Branco 590 Sr. Walter Duarte Pereira Recife - PE Almir Viggiano Antunes Ed. Seguradora - 4.° andar - s 402 Curitiba - PR Livraria Ghignone - Rua Quinze de Novembro 423 '426 Põrto Alegre - RS Organização Sulina de Representações Ltda. -Av. Borges de Medeiros 10301036 - tel. 9-1087 Pelotas - RS Livraria Princesa do Sul - Irmãos R. Duarte e Cia. Ltda. Rua Sete de Setembro 299 Belo Horizonte - MG Livraria e Papelaria Itamarati - Rua Carijós 589 Lisboa - Portugal Eduardo R. Ferreira - Rua dos Soeiros (A Luz) 335 -tel. 70-0675 - CLB - Centro do Livro Brasileiro -Rua Rodrigues Sampaio 30-B PELO REEMBôLSO POSTAL FUNDAÇAO GETÚLIO VARGAS SERVIÇO DE PUBLICAÇÕES Praia de Botafogo 186 - Caixa Postal 29 - ZC-02 tel. 26-9713 Rio de Janeiro - GB.