a raça crioula lageana

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CINCIAS AGRRIAS CURSO DE AGRONOMIA

A raa Crioula Lageana: sua histria e percepes para o seu futuro.

Thiago Filipe Veiga

Monografia apresentada como requisito parcial para obteno de grau de no Engenheiro Curso de Agrnomo

Agronomia, Centro de Cincias Agrrias, Universidade Federal de Santa Catarina.

Florianpolis, 30 de Novembro de 2007.

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A raa Crioula Lageana: sua histria, e percepes para o seu futuro.

THIAGO FILIPE VEIGA

Termo de Aprovao Monografia apresentada como requisito parcial para a obteno de grau de Engenheiro Agrnomo no Curso de Agronomia, Centro de Cincias Agrrias, Universidade Federal de Santa Catarina.

_____________________________________________________ SERGIO A. FERREIRA DE QUADROS Prof. Dr., Depto. de Zootecnia e Des. Rural/ CCA/UFSC

______________________________________________________ EDISON MARTINS Md. Veterinrio. Dr., Epagri Lages/SC

______________________________________________________ CLVIS T. RABELLO IMPROTA Md. Veterinario. Msc., Cidasc Florianpolis/SC

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AGRADECIMENTOS

Agradeo a Deus por ter me concedido a oportunidade de fazer aquilo que amo. Aos meus familiares, que sempre me apoiaram e incentivaram, em especial a minha me Zenaide Salete Veiga, que sempre foi um exemplo de dignidade e coragem, e minha namorada Vanessa Tosatti, que esteve sempre ao meu lado. Ao meu orientador Prof. Dr. Srgio A. Ferreira de Quadros, pelo apoio. Ao Md. Veterinrio Dr. Edison Martins, que foi grande incentivador, e companheiro durante o perodo de estgio e com quem aprendi muito. Ao Md. Veterinrio Msc. Clvis T. Rabello Improta, pela disponibilidade e auxilio no desenvolvimento deste trabalho. A todos os funcionrios da Epagri, Estao Experimental de Lages que me receberam com muito carinho, e que foram essenciais para o desenvolvimento deste trabalho. A todos aqueles que participaram deste trabalho, cedendo tempo e conhecimento, para que ele pudesse ser realizado, em especial os criadores da ABCCL: Nelson Camargo, Assis Camargo, Mrcio Camargo, e Jairo Duarte. A todos colegas e amigos que participaram desta maravilhosa fase da minha vida.

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As raas nativas de gado de uma regio constituem uma forma de expresso do povo que a habita. Permitir seu desaparecimento seria o mesmo que permitir a destruio dos marcos fsicos de sua civilizao. Uma raa nativa de gado um monumento que to necessrio a ser preservado como qualquer monumento querida histrico, identifique, caracterize ou d relevo a uma tradio

(Otvio Domingues, 1956)

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SUMRIO Pgina Lista de Figuras ........................................................................................... vi Lista de Tabelas .......................................................................................... vi Resumo ....................................................................................................... vii 1 Delimitao do Assunto ........................................................................ 08 2 - Objetivo Geral ....................................................................................... 10 2.1 Objetivos Especficos ................................................................. 10 3 - Justificativa ........................................................................................... 11 4 Reviso Bibliogrfica ............................................................................. 13 4.1 - O Termo Crioulo e suas definies .............................................. 13 4.2 A introduo dos Bovinos nas Amricas e a formao da raa Crioula Lageana ..................................................................................... 14 4.3 -Origens das raas Ibricas e da raa Crioula Lageana ............... 22

4.4 Conservao do Germoplasma Crioulo ...................................... 23 4.5 Crioula Lageana e Turismo Rural ............................................... 26 5 - Formulao do Problema ...................................................................... 29 5.1 Hiptese ....................................................................................... 29 6 - Metodologia ........................................................................................... 31 7 - Resultados e Discusso ........................................................................ 34 8 - Concluso .............................................................................................. 63 9 - Consideraes Gerais ........................................................................... 64 10 Referncias .......................................................................................... 68 11 Anexos ................................................................................................. 74

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Lista de Figuras Pg. Figura 1: Vaca Africana Vermelha, na ExpoLages 2007....................................17 Figura 2: Touro Africano Preto, Grande Campeo ExpoLages 2007...................18 Figura 3: Touro jovem Barroso, na ExpoLages 2007...........................................18 Figura 4: Touro jovem Salino, na ExpoLages 2007............................................. 19 Figura 5: Touro Oveiro Vermelho, Fazenda Igrejinha (Lages/SC)....................... 19 Figura 6:Touro Brasino, Fazenda Canoas (Ponte Alta/SC)..................................20 Figura 7:Vaca Baia, Fazenda da Cadeia (Curitibanos/SC)...................................20 Figura 8:Grau de interesse dos turistas de hotis fazenda em relao s atraes dserra catarinenseDados globais..........................................................................60 Figura 9: Grau de interesse dos entrevistados, em relao s atraes da Serra Catarinense com idade abaixo do 50 anos............................................................60 Figura 10: Grau de interesse dos entrevistados, em relao s atraes da Serra Catarinense com idade acima dos 50 anos.......................................................... 61 Figura 11: Grau de interesse dos entrevistados, em relao s atraes da Serra Catarinense, com pais de origem rural..................................................................61 Figura 12: Grau de interesse dos entrevistados, em relao s atraes da Serra Catarinense, com pais de origem urbana............................................................. 62 Lista de Tabelas Tabela 1: Raas Ibricas, com similitudes fenotipicas ou com parentensco......23

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RESUMO Os bovinos no so nativos do continente Americano, foram trazidos pelos colonizadores no inicio do sculo XVI. Aps 400 anos de miscigenao e seleo natural, estes animais adquiriram extrema adaptabilidade s condies ambientais em que foram selecionados. A raa Crioula Lageana descende dos bovinos Ibricos chegados ao Brasil sob a tutela dos missionrios jesutas. No sculo passado, muitos desses animais foram cruzados com bovinos de raas exticas (europias), e os resultados positivos obtidos destes cruzamentos foram atribudos exclusivamente as raas europias o que estimulou a importao de reprodutores destas raas, implicando em drstica reduo na populao de bovinos crioulos. A extino dessas raas pode se constituir na perda de importantes caractersticas de interesse para a produo animal, e sua utilizao pode significar importante alternativa para pecuria moderna. O presente trabalho teve como objetivo, realizar uma reviso histrica da raa, alm de identificar as diferentes percepes de criadores desta e de outras raas quanto aceitao e possibilidades de explorao da raa no espao da Regio do Planalto Catarinense. O trabalho foi desenvolvido na regio do Planalto Catarinense, onde foram entrevistados criadores da raa Crioula Lageana, criadores de outras raas, proprietrios de hotis fazenda e turistas. A metodologia utilizada foi a do Discurso do Sujeito Coletivo (LEFVRE & LEFVRE, 2005), para todos os grupos de entrevistados, exceto os turistas, ao qual foi aplicado um questionrio estruturado (questes fechadas). Com base nos resultados obtidos conclui-se que a Associao Brasileira de Criadores da Raa Crioula Lageana (ABCCL), neste momento tem como principais metas o desenvolvimento de um mercado diferenciado dos produtos da raa, em especial a carne, a multiplicao de material gentico de qualidade com base no programa de seleo e melhoramento da associao, e a formalizao da raa junto ao Ministrio da Agricultura. J no que se refere aos criadores de outras raas, existe um bom conhecimento sobre a raa, principalmente da histria destes animais na regio, mas nota-se um certo preconceito em relao a ela. Quanto utilizao no setor turstico, a raa apresenta grande potencial, j que teve grande aceitao por parte dos proprietrios de estabelecimentos de turismo e turistas. Palavras chave: Crioula Lageana, percepes, possibilidades de explorao.

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1 - DELIMITAO

O gado bovino no nativo da Amrica, foi introduzido no Continente aps os descobrimentos. Sobre o gado crioulo pouco o que se sabe sobre sua ancestralidade, a nica certeza que estes animais chegaram juntamente com os descobridores, mais especificamente na segunda viagem de Colombo em 1493. O gado trazido pelos descobridores aportou primeiramente na ilha La Espanhola, onde hoje localiza-se o Haiti e a Repblica Dominicana (PRIMO, 1993). Os embarques oficialmente eram realizados em Sevilha, mas segundo alguns historiadores, algumas caravelas partiram para as Amricas da Galicia, regio norte da Espanha. No entanto no se tem certeza se a totalidade do gado trazido as Amricas era da regio de Sevilha, j que as Ilhas Canrias, tambm faziam parte da rota, constituindo escala habitual, para as viagens ao Novo Mundo (PRIMO, 1993). Os primeiros bovinos trazidos ao continente pelos espanhis desembarcaram no Caribe, e dali se disseminaram com sucesso, pois 40 anos depois j se encontravam em todos os pases da Amrica do Sul. No Brasil, os primeiros lotes chegaram por volta da terceira dcada do sculo XVI, acompanhando o inicio da colonizao (PRIMO, 1993). J no extremo oriental da Amrica do Sul, Coni (1979) e demais estudiosos indicam que os animais foram introduzidos pelos jesutas em suas misses do Alto Uruguai (1620) e por outras introdues realizadas pelo governador de Hernandarias (Fernando Arias de Saavedra), em 1611, em Las Vacas, perto de Colnia, na margem setentrional do Rio da Prata e em 1617, na Ilha Vizcano. O gado crioulo sul-brasileiro descende do Vicentino mesclado com descendentes da introduo Hernandariana do Uruguai, que mesclado com o Paraguaio-Vicentino. Estes animais foram com certeza origem da expanso da civilizao na Amrica Latina, sob influncia dos jesutas (PRIMO, 1993). O gado crioulo Lageano descendente dos bovinos ibricos chegados ao Brasil, pelos pases platinos sob a tutela dos missionrios jesutas. As raas bovinas trazidas a Amrica do Sul por espanhis e portugueses, emigraram para

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o Paraguai e Argentina e chegaram regio das misses por volta de 1643. Esses animais se espalharam pelas vacarias do sul (Serra Catarinense e Terceiro Planalto Paranaense), onde sofreram miscigenao e seleo natural por um perodo de quase 400 anos. As condies inspitas do planalto catarinense, com invernos rigorosos e nevascas, a baixa disponibilidade de alimento, os predadores e as condies de abandono nas vastas extenses de campo, resultaram na formao de uma raa naturalizada extremamente adaptada as condies ambientais do planalto catarinense (CAMARGO & MARTINS, 2005). O presente trabalho tem como propsito fazer uma reviso histrica da raa crioula lageana, alm de buscar informaes por meio de questionrios sobre quais so os principais gargalos da raa no que diz respeito a mercado e criao. Servindo os posteriores dados para se trabalhar com o marketing acima dos aspectos negativos e positivos da raa e auxiliar em futuros programas de melhoramento gentico deste patrimnio histrico, cultural e gentico do estado de Santa Catarina e do Brasil.

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2 - OBJETIVO GERAL Realizar uma reviso histrica sobre a raa Crioula Lageana e determinar as vrias percepes quanto aceitao e possibilidades de explorao da raa no espao da Regio do Planalto Catarinense.

2.1 - OBJETIVOS ESPECFICOS Realizar, baseado na bibliografia existente, uma reviso histrica sobre a raa crioula lageana, levantando os seus ancestrais, a forma de introduo no continente americano, em especial, no Brasil, a miscigenao e a seleo natural que deram origem raa.

Identificar, a partir da percepo dos criadores desta e de outras raas da regio serrana, quais so os principais gargalos relacionados criao, s caractersticas genticas dos animais e a forma de explorao mais adequada para a raa.

Levantar o grau de interesse na raa como atrao turstica devido aos seus atributos morfolgicos e sua importncia histrica, diretamente ligada Regio do Planalto Serrano.

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3 - JUSTIFICATIVA

A economia do planalto catarinense historicamente baseada na produo de bovinos de corte em sistemas extensivos. Esta regio se caracteriza por apresentar solos com pouca profundidade, cidos e pedregosos, alm de topografia acidentada. As temperaturas no perodo de outono e inverno so baixas, com grande incidncia de geadas (clima Cfb). Por apresentar estas caractersticas a produtividade dos campos nativos no perodo de primavera e vero boa, diferentemente do perodo de outono e inverno, onde a produo forrageira praticamente interrompida, causando perdas de peso dos rebanhos (QUADROS et al 1996). Devido a fatores econmicos o melhoramento de campo nativo com espcies de produo hibernal limitado (RITTER & SORRENSON, 1985). Sendo assim, a criao de raas adaptadas e seus cruzamentos se tornam importante alternativa para o aumento da produtividade nesses perodos, alm da diminuio dos custos relacionados adequao do ambiente para a manuteno de rebanhos no adaptados (QUADROS et al 1996). Atualmente, devido extino de raas bovinas e conseqente perda de material gentico, programas mundiais de preservao vem sendo incentivados. Desde 1970, mais de 40% do total das raas de animais domsticos j se perderam. Atualmente, cerca de 600 raas encontram-se ameaadas de extino, o que representa 20% do total de raas existentes no planeta (HAMMOND & LEITCH, 1995). De acordo com dados da FAO (1999), a maior parte dos recursos genticos animais em risco de extino, encontram-se nos pases em desenvolvimento. Segundo Mariante & Fernandez Baca (1998), os programas de conservao Latino-americanos so instveis, devido falta de financiamento e polticas pblicas. Dessa maneira, a falta de conhecimento acerca dessas raas se apresenta como um grande entrave para o desenvolvimento e preservao destes recursos genticos. A raa Crioula Lageana aps quase 400 anos de seleo natural nas condies do planalto catarinense, se apresenta como uma alternativa para a pecuria atual. So animais de grande rusticidade e excelente fertilidade, apresentam menor custo de produo, excelentes ganhos por heterose quando cruzados com raas exticas sendo tambm extremamente adaptados

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aos sistemas naturais de criao, j que parte integrante do ecossistema em questo (CAMARGO & MARTINS, 2005). Segundo Plasse (1973) e Bauer (1973) citado por: Ribeiro (2007), em condies naturais o gado bovino que foi trazido pelos europeus nos sculos XVI e XVII, sofreram seleo natural e adquiriram caractersticas que interessavam cadeia produtiva. Entre elas, a baixa mortalidade, o pequeno porte ao nascer, a alta longevidade, a facilidade de parto, a alta tolerncia a ecto e endoparasitas, tornando seus custos de produo menores em relao as raas europias modernas. Em condies ambientais como as que ocorrem nos campos do Planalto Catarinense, torna-se mais importante a identificao de gentipos adaptados para otimizar seu potencial produtivo do que alterar o ambiente para utilizar animais que s produzam em condies timas (RIBEIRO & KOGER, 1992). Alm das caractersticas adaptativas da raa Crioula Lageana, outro fator importante como a mansido das vacas, aliadas ao seu belo fentipo, com chifres longos e a colorida pelagem, juntamente com sua grande importncia histrica so potenciais que podem ser utilizados para a promoo do turismo rural na regio serrana e que no foram explorados em sua plenitude (RIBEIRO, 2007). Juntamente com a promoo da raa Crioula Lageana, deve-se levar em considerao todo o ambiente do qual faz parte raa, j que a promovendo tambm se estar auxiliando na preservao de um ecossistema (Campos de Araucria) que quase o mesmo a 200 milhes de anos e que est ameaado de extino (RIBEIRO, 2007). Sendo assim, todos os estudos que visem promover e preservar este rico ecossistema do qual faz parte o gado Crioulo Lageano e que busque alternativas que possam valorizar este patrimnio gentico e histrico de Santa Catarina, alm de melhor-la nos aspectos produtivos em que deficiente, e que tragam ao criador menores custos de produo so importantes para a preservao da raa e do ambiente em que est inserida.

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4 - REVISO BIBLIOGRFICA 4.1 O TERMO CRIOULO E SUAS DEFINIES O termo Crioulo tem grande importncia histrica para as Amricas e foi importante na organizao social do Brasil Colnia, sendo utilizado tanto para definir a procedncia dos indivduos, como na determinao racial dos mesmos. Por muitos anos, e at nos dias de hoje, ele foi, e, utilizado no sentido pejorativo, o que pode de alguma forma explicar o preconceito em relao aqueles chamados de crioulos, inclusive as raas bovinas. Segundo Soares(2000), em Devotos da Cor o termo crioulo era uma designao exclusiva da primeira gerao de descendentes de africanas nascidos no Brasil. Sugerindo assim que ser crioulo uma condio provisria, e que afeta apenas uma gerao de cada vez.

A denominao Crioulo provem do timo criar. Historicamente , o termo Crioulo , designa todo o individuo negro nascido de pais africanos na Amrica, seja escravo ou no, bem como o branco nascido nas colnias europias, e o dialeto falado por estes. De acordo com o Padre Raphael Bluteau, em seu Vocabulrio Portuguez e Latino publicado em Coimbra e Lisboa entre os anos de 1712 e 1727, Crioulo significa, Escravo que nasceu na casa de seu Senhor. J no Diccionario Manual Etymologico da Lingua Portugueza, (1899) de F. Adolpho Coelho, define-se o termo como Que natural das colnias Europias e tem cor branca. O dialeto usado nestas colnias. Lima & Barroso (1939), definem Crioulo, como primitivamente, o negro nascido na Amrica. Em Novo Dicionrio Aurlio da Lngua Portuguesa (1986), est escrito: Diz-se de individuo de raa branca nascido nas colnias europias de alm-mar, particularmente da Amrica; Diz-se do dialeto falado por essas pessoas. Dizia-se o negro nascido na Amrica. Laudelino Freire, em Grande e Novssimo Dicionrio da Lngua Portuguesa (1954), descreve Crioulo como Individuo nascido na Amrica e procedente de europeus; Negro nascido na Amrica, por oposio ao originrio

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da frica; Dialeto colonial; Originrio do pas onde vive; aborgine, autctone; Pertencente ou relativo aos habitantes duma regio. Conforme Celso Pedro Luft (1991), em Mini Dicionrio Luft, Crioulo o negro nascido na Amrica; O natural de uma regio; Nativo de uma regio; Nascido no pas, no importado (gado); Sem raa definida; Dialeto portugus falado em Cabo Verde e outras ex-possesses portuguesas da frica. O Termo Crioulo, designa diversos adjetivos e substantivos, e pode ser compreendido e utilizado de diversas maneiras dependo do contexto em que aplicado. De maneira geral o termo faz referncia a algo que local e que foi criado ali, alm de que denota mestiagem, ou seja mistura de raas, culturas, linguagens e costumes. 4.2 - A INTRODUO DOS BOVINOS NAS AMRICAS E A FORMAO DA RAA CRIOULA LAGEANA. No perodo do descobrimento, no existia nenhum gado bovino no Brasil sendo que nos meados do sculo XVI que estes foram trazidos pelos portugueses e espanhis nas expedies a Amrica do Sul (ATHANASSOF, 1956). Pouco se sabe sobre a ancestralidade dos bovinos crioulos. Estes chegaram ao continente Americano por volta de 1493 na segunda viagem de Colombo. Esses animais chegaram primeiramente na ilha La Espaola, onde hoje localizam-se a Repblica Dominicana e o Haiti. A cidade que possua exclusividade para os embarques Amrica era Sevilha, mas alguns autores afirmam que tambm ocorriam embarques na Galicia (Norte da Espanha). No entanto no se tem certeza se a totalidade do gado trazido s Amricas era da regio de Sevilha, j que as Ilhas Canrias, tambm fazia parte da rota (escala habitual), para as viagens ao Novo Mundo. Os primeiros bovinos trazidos ao continente, pelos espanhis desembarcaram no Caribe. Dali se disseminaram com sucesso, sendo que 40 anos depois j se encontravam em todos os pases da Amrica do Sul. No Brasil os primeiros lotes chegaram por volta da terceira dcada do sculo XVI, acompanhando o inicio da colonizao (PRIMO, 1993). Segundo Lima et

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al.,(1990), os primeiros bovinos chegaram com os colonizadores no ano de 1534, e aportaram em So Vicente. Algum tempo depois outros rebanhos aportaram na costa Pernambucana e posteriormente na Bahia (MARIANTE & CAVALCANTE, 2000). A quase totalidade das raas bovinas crioulas tem como ancestrais as raas autctones de Portugal, a Mirandesa, a Alantejana, a Minhota, a Barros e a Arouquesa (MARIANTE & CAVALCANTE, 2000). O gado trazido s Amricas possivelmente descende dos antigos bovinos Hamticos, que foram domesticados no Egito, por volta de 4000 anos a C, e que foram introduzidos mais tarde no sul da Espanha. Sendo sua procedncia do Norte da frica, estes animais so possuidores de chifres longos, sua caracterstica mais marcante (INCHAUSTI & TAGLE, 1964). Coni (1979) e demais estudiosos indicam que no extremo oriental da Amrica do Sul os animais foram introduzidos pelos jesutas em suas misses do Alto Uruguai (1620), e por outras introdues realizadas pelo governador de Hernanderias. O jesuta Cristvo de Mendoza foi quem introduziu o primeiro gado na capitnia Del Rei no ano de 1634, e assim foi fundada a primeira estncia missioneira sul-rio-grandense (SPALDING, 1953 citado por: PRIMO, 1993). Segundo Arajo (1990), o gado bovino foi introduzido pelos missionrios jesutas na campanha riograndense, tendo como objetivo principal alimentar os povos das Misses. O gado crioulo sul-brasileiro descende do Vicentino mesclado com descendentes da introduo hernandaria do Uruguai, que mesclado com o Paraguaio-Vicentino. Estes animais foram com certeza origem da expanso da civilizao na Amrica Latina, sob influncia dos jesutas (PRIMO, 1993). Com a invaso das Misses jesuticas pelos Bandeirantes (LusosBrasileiros), grande parte do rebanho foi levado para a regio de Franca no estado de So Paulo, e assim surgiu a denominao do gado Franqueiro. Acredita-se que muitos desses animais se perderam das tropas e muitos deles se embrenharam nas matas do Planalto Catarinense e formaram rebanhos. Quando se iniciou a colonizao dos campos da Serra Catarinense, os colonizadores

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trouxeram consigo o gado Franqueiro, que cruzou-se com os bovinos da regio e deu origem a raa Crioula Lageana (MARIANTE & CAVALCANTE, 2000). Os bovinos crioulos do Sul, que tem sua descendncia nos rebanhos remanescentes dos jesutas foram por um longo perodo de tempo o esteio da bovinocultura das regies dos Campos de Cima da Serra do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina (MARIANTE & CAVALCANTE, 2000). O gado Crioulo Lageano descendente dos bovinos ibricos chegados ao Brasil, pelos pases platinos sob a tutela dos missionrios jesutas (PIAZZA, 1983). As raas bovinas trazidas Amrica do Sul por espanhis e portugueses, emigraram para o Paraguai e Argentina e chegaram a regio das misses por volta de 1643 (RUCHEL, 2000). Esses animais se espalharam pelas vacarias do sul (Serra Catarinense e Terceiro Planalto Paranaense), onde sofreram miscigenao e seleo natural por um perodo de quase 400 anos. As condies inspitas do planalto catarinense, com invernos rigorosos e nevascas, a baixa disponibilidade de alimento, os predadores e as condies de abandono nas vastas extenses de campo, resultaram na formao de uma raa naturalizada extremamente adaptada as condies ambientais da regio. No sculo passado, muitos desses animais foram cruzados com bovinos de raas exticas (europias), e os resultados positivos obtidos destes cruzamentos foram atribudos exclusivamente as raas europias o que estimulou a importao de reprodutores destas raas, implicando em drstica reduo na populao de bovinos crioulos (MARIANTE & CAVALCANTE, 2000). O grupamento racial hoje conhecido como Crioulo Lageano, surgiu por meio de um trabalho de resgate e preservao de alguns animais ainda existentes na regio de Lages-SC. Estes eram conhecidos pela populao como franqueiros, raa velha ou plo duro e em sua maioria foram encontrados na Serra em locais longnquos e de difcil acesso. A populao do gado Crioulo Lageano atualmente constituda por aproximadamente 500 animais, isso fez com que a FAO os colocasse na lista de animais em estado crtico, em risco de extino (CAMARGO & MARTINS, 2005). Devido percepo dos criadores das fazendas Igrejinha, Canoas e Cabaais que se localizam no Planalto Catarinense, do grande valor gentico

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desses animais que se tornou possvel manuteno do acervo, que hoje a base da ABCCL (Associao Brasileira de Criadores da Raa Crioula Lageana) criada no ano de 2003, que hoje conta com mais de vinte scios nos estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, So Paulo e Mato Grosso do Sul (CAMARGO & MARTINS, 2005). Os animais da raa Crioula Lageana apresentam uma grande variedade de pelagens: a africana (vermelha, baio ou preto); a jaguan; oveiro vermelho, baio, osco; vermelha; brasino; e churriada salina (CAMARGO, 1984). Ainda assim h predominncia de animais africano vermelho, com focinho e orelhas da mesma cor, e africano preto, com orelhas e focinho preto (CAMARGO & MARTINS, 2005).

Figura 1- Vaca Africana Vermelha, em exposio na ExpoLages 2007.

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Figura 2- Touro Africano Preto. Grande Campeo da raa na ExpoLages 2007.

Figura 3- Touro jovem Barroso, em apresentao na ExpoLages 2007.

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Figura 4- Touro jovem Salino, em apresentao na ExpoLages 2007.

Figura 5- Touro Oveiro Vermelho, Fazenda Igrejinha (Lages/SC).

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Figura 6- direita, Touro Brasino, Fazenda Canoas (Ponte Alta/SC).

Figura 7- direita vaca Baia, Fazenda da Cadeia (Curitibanos/SC).

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A raa apresenta duas variedades, aspada e mocha. Os animais aspados possuem chifres longos, que se prolongam no sentido horizontal para as laterais, at se curvarem para frente e para cima, como uma espcie de gancho nos machos. J as fmeas possuem os chifres mais delicados com a poro distal elevada e pontas para trs. Apresentam corpo cilndrico de tamanho mdio, tendo as espduas inclinadas, com boa conformao de garupa, esqueleto forte e massa muscular pouco desenvolvida, devido ao meio e a falta de seleo artificial. A insero da cauda alta e expe a regio plvica, facilitando o parto. Os animais desta raa apresentam grande longevidade, no sendo raro encontrar fmeas com mais de quinze anos produzindo. Os bezerros so pequenos ao nascer o que facilita o trabalho de parto, mas apresentam bom desenvolvimento ponderal at o perodo da desmama. Alm disso as fmeas so muito dceis e possuem excelente habilidade materna (CAMARGO & MARTINS, 2005). De acordo com Ribeiro (1993), em condies ambientais semelhantes as do Planalto Catarinense, estes animais apresentam excelente produo leiteira e comportamento materno, no apresentando dificuldades de parto, e terneiros com grande adaptao ao meio. Mas so deficientes em rendimento e conformao de carcaa, apresentando pouco msculo e grande proporo de costilhar. Tambm segundo Ribeiro (1993), mesmo sem ter sofrido seleo artificial o crescimento dos Crioulos Lageanos, se compara a da raa Charoles em velocidade e em relao ao Nelore superior, sendo melhor que ambas no que se refere habilidade materna, quando em condies de campos naturais do Planalto Catarinense. Segundo Spritze (2001), devido ao processo de seleo natural ocorrido durante vrias geraes os bovinos crioulos se tornaram adaptados s condies locais e com isso desenvolveram caractersticas que permitem sua sobrevivncia mesmo em condies de escassez de alimento, condies extremas de temperatura, amplas variaes de temperatura e de umidade, alm de resistncia aos endo e ectoparasitos e a determinadas enfermidades.

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4.3 - ORIGENS DAS RAAS IBRICAS E DA RAA CRIOULA LAGEANA Concretamente, no se sabe as origens do gado bovino trazido s Amricas pelos conquistadores. De acordo com Rouse (1977) apud Primo (1993), estes descendem diretamente do Bos taurus primigenius, domesticado na zona pirenaica, a partir do paleoltico. Estes possuam ampla distribuio geogrfica, e so segundo os zootecnistas ancestral nico de todos os bovinos domsticos. At o ano de 1178, Espanha e Portugal constituam um territrio nico, a Pennsula Ibrica. Posteriormente, nos anos de 1580 a 1640, Espanha e Portugal novamente formavam um nico reino, comandado por Felipe II, assim supem-se que os bovinos Ibricos existentes, formavam um ancestral comum com os bovinos Crioulos das Amricas (PRIMO, 1993). De acordo com Goulart (1965), o gado Crioulo do Sul do Brasil, tem como origem provvel o tronco Ibrico, mesclado com o gado do tronco Aquitnico, mas com predominncia do primeiro. J segundo Primo (2000), a raa Crioula Lageana, tem grande semelhana com a raa Berrenda da Andaluzia. E que tem grande similitude com a raa Mertolenga de Portugal que do tronco Bos taurus aquitanicus (SANCHEZ BELDA, 1984). Segundo Athanassof (1957), e Goulart (1965), as raas naturalizadas brasileiras descendem das raas portuguesas, Minhota, Barros, Arouquesa, Mirandesa, e Alentejana. Todas estas raas possuem similitudes fenotipicas ou de parentesco com os bovinos da Espanha (SANCHEZ BELDA, 1984 apud PRIMO 1993).

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TABELA 1. Raas Ibricas, com similitudes fenotipicas ou com parentensco. Portugal Barros = Minhota = Arouquesa = Espanha Cachena ou Pisca Rbia Gallega Cachena ou Pisca Alistana-Sanabresa Caldelana Mirandesa = Frieiresa Verinesa Vianesa Brava = Aracena = Alentejana = Retinta Algarvia = Berrenda em Colorado Mertolenga = Salineira Andaluzia Adaptado de SANCHEZ BELDA (1984), apud PRIMO (1993). 4.4 - CONSERVAO DO GERMOPLASMA CRIOULO A partir do desenvolvimento de raas bovinas altamente especializadas em produo de carne ou leite, houve a divulgao intensiva da utilizao destes animais com os atributos produtivos superiores. Desta maneira, e com o uso de Bos taurus aquitanicus Bos taurus turdetanus Ldia Berrenda em Negro Bos taurus Ibericus Bos taurus Ibericus Bos taurus Ibericus Tronco Bos taurus mauritanus Bos taurus aquitanicus Bos taurus aquitanicus

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biotcnicas da reproduo, em especial a inseminao artificial, tem ocorrido eroso gnica, com o desaparecimento de diversas raas (MARTINS & VEIGA, 2007). Devido perda de material gentico de raas crioulas, como conseqncia dos cruzamentos indiscriminados com raas europias e zebunas a partir do final do sculo passado, programas de preservao de raas ameaadas de extino vm sendo incentivados, j que estes animais se constituem em uma rica fonte de material gentico (CAMARGO & MARTINS, 2005). Desde 1970, mais de 40% do total das raas de animais domsticos j se perderam. Atualmente, cerca de 600 raas encontram-se ameaadas de extino, o que representa 20% do total de raas existentes no planeta (HAMMOND & LEITCH, 1995 apud McMANUS, 2005 ). Essa perda de material gentico ocorreu justamente no perodo onde as atividades de conservao foram mais intensas (ALDERSON, 1990 apud McMANUS, 2005). De acordo com Cunningham (1987) isso pode estar relacionado falta de conhecimentos sobre os mtodos de melhoramento animal modernos por parte dos responsveis pelos programas de preservao destes materiais. Segundo a FAO (1999), a maior parte dos recursos genticos animais em risco de extino, encontram-se nos pases em desenvolvimento. De acordo com Mariante & Fernandez Baca (1998), os programas de conservao Latinoamericanos apresentam grande instabilidade, devido a falta de financiamento e polticas pblicas. Apenas 55% das raas Latino-americanas possuem dados sobre suas populaes, sendo que 37% delas correm risco de extino. A falta de informaes sobre as populaes est entre os principais entraves no desenvolvimento de programas de melhoramento e conservao destes recursos. Desta forma as caracterizaes gentica e fenotpica oferecem informaes valiosas para tomada de decises adequadas para a melhoria e desenvolvimento de programas de melhoramento e seleo (McMANUS et al., 2005). A extino dessas raas pode se constituir na perda de importantes caractersticas de interesse para a produo animal como as citadas por Plasse & Bauer, (1973), que demonstraram que, em condies, naturais os bovinos trazidos pelos conquistadores espanhis e portugueses e que sofreram seleo natural no ambiente Americano apresentavam, baixa mortalidade, alta

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longevidade, pequeno porte ao nascer, facilidade de parto, alta tolerncia a endo e ectoparasitos, alm de superar algumas raas em desenvolvimento ponderal. As raas crioulas, locais ou naturalizadas brasileiras, entre elas a Crioula Lageana, foram submetidas ao processo de seleo natural por aproximadamente 500 anos. Isto permitiu a expresso de caractersticas especificas de adaptao s condies ambientais nestes ambientes onde sofreram seleo (MARTINS & VEIGA, 2007). Segundo Mezzadra, (1993), as raas Crioulas so as nicas de Bos taurus que se adaptam as condies ambientais dos trpicos e subtrpicos, e que possuem um bom potencial de produo, sem as limitaes de manejo e qualidade de carne impostas pelos zebunos. E mesmo assim, nos tempos atuais chegamos a um ponto que a diminuio das populaes to grande que exige que sejam tomadas medidas para conservao destes germoplasmas, evitando que se extingam estas raas ou ocorra eroso de seus genomas. A conservao da diversidade gentica crioula se torna de extrema importncia para que se promova o acesso a genes desejveis e complexos gnicos que possam contribuir para o estoque futuro de alimentos. Sendo que os produtos de origem animal continuaro a ser importante parcela na alimentao da populao humana em constante crescimento (MARIANTE, 2003). As caractersticas da raa Crioula Lageana, citadas por Camargo & Martins (2005), como longevidade, facilidade de parto, bezerros pequenos ao nascer, mas com bom desenvolvimento ponderal at desmama, fmeas com temperamento dcil e excelente habilidade materna, que antes j haviam sido confirmadas em experimentos realizados no Planalto Catarinense por Ribeiro (1993), podem ser de fundamental importncia em programas de melhoramento gentico intraraciais e inter-raciais, visando a sustentabilidade em sistemas de pastoreio como o empregado na regio serrana de Santa Catarina. De acordo com Quadros et al.,(1996), o germoplasma do Crioulo Lageano demonstrou que merece ser preservado pelo carter histrico, gentico e produtivo pois apresentou caractersticas maternas pelo menos semelhantes s da raa Charols. Diante da importncia destes animais, e pela caracterizao da FAO, onde a raa Crioula Lageana foi listada como uma das raas em perigo de extino,

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diversas instituies de pesquisa esto trabalhando para conservar estes ricos materiais, incluindo a EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria), Universidades, produtores privados com a coordenao a nvel nacional do CENARGEM (Centro nacional de Pesquisa de Recursos Genticos e Biotecnologia) (MARIANTE, 2003). 4.5 CRIOULA LAGEANA E TURISMO RURAL Um dos principais objetivos da ABCCL justamente promover e divulgar a raa, ressaltando suas qualidades genunas, procurando torn-la mais conhecida e difundida (CAMARGO & MARTINS, 2005). Sendo assim o turismo rural, seja ele de conhecimento, alimentos tpicos, dentre outros, se torna importante na promoo do Crioulo Lageano e seus produtos, e tambm pode ser uma fonte de renda alternativa aos criadores da raa, estimulando outros criadores da regio a explorarem a gentica crioula e seus produtos, visando um mercado restrito como o do turismo rural. De acordo com Ribeiro (2007), para que outros criadores possam ser estimulados necessrio que estes novos scios visualizem vantagens econmicas para que se incorporem com vigor na empreitada. Uma das concluses da ABCCL a de que, juntamente, com o estmulo manuteno da raa, necessrio sejam feitos esforos tambm no sentido de preservao do ecossistema onde a raa se forjou, resgate histrico, e qualidade dos produtos oferecidos (RIBEIRO, 2007). Isto pode impulsionar o setor do turismo rural, j que os turistas buscam lugares preservados, alimentos de qualidade e diferenciados, como so os da serra catarinense, devido s condies ambientais existentes na regio, que do sabor diferenciado aos queijos, leite ou carne. Para isso, deve-se levar em considerao um planejamento adequado, quando se pensa em atividades tursticas, j que estas, quando realizadas de maneira desordenada, podem provocar graves desequilbrios ambientais. No entanto, se adequadamente implantadas e conduzidas podem auxiliar a preservao de ecossistemas importantes (LAGE & MILONE, 1999 apud MARTORANO BATHKE, 2002). Desta maneira a atividade turstica em ambientes

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naturais surge como uma proposta de explorao racional dos recursos em reas protegidas. Porm, ela deve ser precedida de planejamento e controle adequados, a fim de minimizar os efeitos negativos e maximizar os positivos, representando uma alternativa de desenvolvimento sustentvel (SILVA, A. M da. 2001). Outras potencialidades do Crioulo Lageano e que podem ser exploradas, foram citadas por Camargo & Martins (2005), como animais de chifres longos que possuem potencialidade para a explorao da manuteno da cultura e tradies locais, podendo ser utilizado no turismo em hotis fazenda, alm de poderem, estes animais servirem para filmagens de poca. Segundo o instituto CEPA (2002), as experincias relacionadas com o turismo rural so mais bem sucedidas quando esto fortemente condicionadas a articulaes de circuitos de turismo trabalhados, sejam estes apoiados em tradies culturais, condies naturais nicas ou dinmicas regionais/ locais especficas o que se encaixa perfeitamente as condies associadas ao Planalto Catarinense, e a histria do gado crioulo de Lages fortemente ligado aos missionrios jesutas e a colonizao da regio. O resgate a valorizao e a atribuio de caractersticas que diferenciem os produtos e servios oferecidos, atravs de certificao de origem de base territorial e formas de produo especficas e com responsabilidade ambiental, podem se constituir em importante estmulo a este tipo de servio (CEPA, 2002). O estmulo s atividades, como estas, estar auxiliando na proteo da paisagem natural, buscando extrair dela o seu potencial, sem degrad-la, alm de estimular as culturas e tradies locais, trazendo consumidores e renda de outros locais sem ocasionar fluxos migratrios em demasia (RIBEIRO, 2007). Mas para que isso ocorra, tambm, se torna necessrio empenho poltico, e planos adequados de turismo rural. Assim como em Portugal, que em 1986, regulamentou o setor de Turismo, criando um plano nacional que definiu as modalidades de turismo no espao rural (MARTORANO BATHKE, 2002). Ou como cita a mesma autora, o caso da Frana onde os estabelecimentos credenciados apresentam um logotipo que os caracteriza desde que estes sigam as regras das organizaes credenciadoras.

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Sendo assim para que o turismo rural possa se desenvolver e oferecer produtos de qualidade e ambientes preservados, aqueles que o fazem devem ser estimulados e beneficiados com polticas pblicas adequadas e que valorizem o seu trabalho. Dessa maneira outros investidores buscaro atividades que sejam ecologicamente corretas, que preservem as tradies e culturas locais e os recursos genticos nicos de cada regio, desde que sejam, ao mesmo tempo, lucrativos.

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5 - FORMULAO DO PROBLEMA 1 Quais so os principais pontos positivos e negativos na criao de bovinos Crioulo Lageano, e como estes podem ser utilizados em futuros programas de melhoramento gentico e fomento da raa? 2 Existe interesse de criadores, turistas e proprietrios de hotis fazenda na utilizao destes animais no ramo do turismo rural e como isso pode ser feito? 3 Qual a motivao dos criadores e quais so suas expectativas em relao raa e como os no criadores podem ser estimulados a investir nela?

5.1 - HIPTESE 1 - Os bovinos da raa Crioula Lageana apresentam caractersticas como boa produo leiteira e excelente comportamento materno, partos sem dificuldade, terneiros pequenos ao nascer, alm de grande adaptao as condies ecolgicas da regio do Planalto Catarinense. Mesmo sem ter sofrido seleo artificial se compara a raa Charols em velocidade de crescimento e superior a Nelore, sendo ainda melhor que ambas em habilidade materna, em condies de campo nativo do Planalto Catarinense. Apresenta algumas caractersticas deficientes como conformao e rendimento de carcaa, apresentando pouco msculo e grande proporo de costilhar. Quando cruzados com animais Charols e Nelore apresentam desempenho superior que os animais puros em desenvolvimento ponderal, podendo vir a ser estes cruzamentos de grande importncia para criadores da regio serrana. Sendo assim a manuteno destes animais com alta capacidade adaptativa s condies ecolgicas do Planalto Catarinense e os bons desempenhos dos hbridos podem ser importantes estmulos para os criadores e possveis investidores na gentica Crioula.

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2 - O turismo rural, seja ele de conhecimento, alimentos tpicos, etc..., torna-se importante na promoo do Crioulo Lageano e seus produtos, e tambm pode ser uma fonte de renda alternativa aos criadores da raa, estimulando outros criadores da regio a explorarem a gentica crioula e seus produtos, visando um mercado restrito. Os animais da raa Crioula Lageana possuem caractersticas fenotpicas bastante atrativas como chifres longos, grande variedade de pelagens, assemelhando-se muito aos seus ancestrais ibricos, alm de estarem fortemente associados a histria da colonizao do Sul do Pas e dos jesutas o que pode ser explorado no turismo rural de conhecimento, alm de servirem para filmagens de poca. Por isso importante o desenvolvimento de campanhas de marketing que os associem a histria da colonizao e expanso da civilizao do Sul do Brasil, e tambm sejam seus produtos associados a qualidade dos alimentos produzidos na Serra Catarinense devido as suas condies ambientais peculiares.

3 Provavelmente a motivao dos criadores da raa a sua capacidade adaptativa as condies ecolgicas do Planalto Catarinense, seu excelente desempenho nos cruzamentos com raas europias e zebunas e o potencial turstico que pode ser associado a esses animais devido sua histria. J os no criadores podem ser estimulados a investirem nestes animais, buscando atravs de estudos identificar os mitos negativos relacionados raa e trabalhando-se assim, em campanhas que possam revelar o que realmente verdade e mentira, alm de buscar mercados restritos e lucrativos como o do turismo de conhecimento e alimentao, bem como sanar as caractersticas deficientes da raa por meio de programas de melhoramento gentico.

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6 - METODOLOGIA O presente trabalho foi desenvolvido durante o perodo de 17/08/2007 22/10/2007, na regio do Planalto Catarinense, mais especificamente nos municpios de Lages, Painel, Ponte Alta e Curitibanos. Com o acompanhamento do supervisor do estgio, pesquisador da EEL (Estao experimental da Epagri Lages), e Secretrio Executivo da ABCCL (Associao Brasileira de Criadores da Raa Crioula Lageana) Mdico veterinrio Dr. Edison Martins, foram realizadas visitas a propriedades de criadores da raa Crioula Lageana, alm de pecuaristas criadores de outras raas e estabelecimentos de turismo rural. Nestas visitas utilizou-se do mtodo de pesquisa quali-quantitativa com base em entrevistas semi-estruturadas, na forma de questionrios (vide anexo 1), com questes abertas, que foram analisadas segundo a metodologia do Discurso do Sujeito Coletivo (LEFVRE & LEFVRE, 2005). A todos os grupos de entrevistados acima citados, exceto o dos turistas, ao qual foi aplicado um questionrio estruturado, com questes fechadas (vide anexo 3). Todos os entrevistados que receberam os questionrios semi-estruturados tiveram suas entrevistas gravadas em sistema MP3, sendo que os mesmos receberam um termo de consentimento (vide anexo 2) e autorizaram as gravaes e transcries de seus discursos conforme exige a regulamentao tica desta Universidade. Estas entrevistas tiveram como objetivo identificar informaes relevantes acerca da raa Crioula Lageana e que pudessem vir a contribuir em futuros programas de melhoramento e seleo da raa, verificar o conhecimento dos no criadores e sua percepo sobre a raa, alm de identificar a potencialidade de insero destes animais no ramo do turismo rural da regio. A metodologia de anlise de Discurso utilizada para avaliao dos questionrios semi-estruturados tem como proposta a organizao e tabulao dos dados qualitativos de natureza verbal, que foram obtidos dos depoimentos. Desta maneira aps a transcrio das entrevistas, estas so analisadas e nelas so definidas as Idias Centrais (IA) dos depoimentos. A idia central um nome ou expresso lingstica, que descreve de maneira sinttica, precisa e fidedigna, o sentido de cada discurso analisado. A partir da definio das IAs seleciona-se as expresses chave (ECH) dentro de cada discurso. As ECHs so trechos ou

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transcries literais dos discursos, e que revelam a essncia do depoimento, e que posteriormente formaram o Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) (em itlico dentro das entrevistas). A partir da, as idias centrais so agrupadas de acordo com o seu contedo, sendo que as de sentido complementar ou similar formaram uma idia central nica (neste trabalho as idias centrais foram agrupadas em letras A, B, e C). Aps a anlise inicial (IAD 1), onde se definiram as Idias Centrais e Expresses chave, estes dados so transferidos para um segundo quadro, onde feita a seleo das expresses chave segundo as idias centrais similares ou complementares e posteriormente se realiza a montagem dos discursos (IAD 2). Os discursos (DSC) so formados pelas expresses chave, partindo das idias centrais. Ou seja um discurso-sntese redigido na primeira pessoa do singular que composto pelas expresses chave que tm a mesma Idia Central. Questionrio destinado aos criadores da raa Crioula Lageana Foram entrevistados cinco criadores, sendo eles, os proprietrios das fazendas Igrejinha (Lages/SC), Canoas (Ponte Alta/SC), Fazenda Grande (Painel/SC), Bom Jesus do Herval (Ponte Alta/SC), e Fazenda da Cadeia (Curitibanos/SC). Todos so associados ABCCL (Associao Brasileira de Criadores da Raa Crioula Lageana), e foram indicados para entrevista pela Diretoria da associao. O questionrio (vide anexo 1) era composto de cinco questes semi-estruturadas (abertas) e foi analisado segundo a metodologia acima descrita. Questionrio destinado aos pecuaristas no criadores da raa Crioula Lageana Foram entrevistados seis criadores. Todos so proprietrios de fazendas localizadas no municpio de Lages/SC, e foram selecionados segundo a indicao do Presidente do Sindicato Rural do municpio, Suenon Lisba. Entre eles criadores das raas Charols, Simental, Angus e Hereford. O questionrio (vide anexo 1) era composto por cinco questes semi-estruturadas (abertas) e foi analisado segundo a metodologia acima descrita.

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Questionrio

destinado

a

proprietrios

e

administradores

de

estabelecimentos de turismo rural Foram realizadas quatro entrevistas todas em estabelecimentos situados no municpio de Lages/SC. A saber: Hotis Fazenda Boqueiro; Pedras Brancas; Sesc e Fazenda da Ferradura. Este questionrio (vide anexo 1) foi composto com quatro questes semi-estruturadas (abertas), e foi analisado segundo a metodologia acima descrita.

Questionrio destinado aos turistas de hotis fazenda Foram entrevistados onze turistas em dois hotis: Sesc e Pedras Brancas. O questionrio (vide anexo 3 e 4) era composto por nove questes estruturadas (fechadas), e tinha como objetivo identificar o grau de interesse dos turistas em diferentes atraes encontradas na Serra Catarinense, entre elas o gado Crioulo Lageano, e conhec-los quanto origem e atividade exercida. Todos os turistas entrevistados foram abordados de forma aleatria e receberam o questionrio para preencherem

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7 - RESULTADOS E DISCUSSO Neste item so apresentados os Discursos dos Sujeitos Coletivos (DSCs) com suas respectivas discusses individualizadas. Bem como, as demonstraes grficas da entrevista estruturada, realizada com turistas e sua discusso. As entrevistas na integra, e todos os demais passos para o desenvolvimento dos DSCs encontram-se nos anexos.

DESENVOLVIMENTO DOS DISCURSOS DO SUJEITO COLETIVO. QUESTIONRIO LAGEANA. DESTINADO AOS CRIADORES DA RAA CRIOULA

Questo nmero 1- Quais os motivos que levaram o Sr (a) optar pela criao do gado Crioulo Lageano? Idia Central A Preservao do material gentico e por fazer parte da histria da regio.DSC Bom os motivos foram vrios mas o principal a preservao do material gentico, e como eu sou proprietrio de uma fazenda histrica, naquele momento a principal atrao foi o fato de que eles so animais ligados histria de toda a regio, a histria do Brasil e a histria das Amricas. E tambm porque so animais exticos de pelagem bonita, alm de serem um material gentico bom e que merece ser preservado.

Idia Central B - Pela tradio familiar, beleza e histria associada raa, rusticidade e adaptao as condies ambientais da regio, que reduz o custo de produo, alm da necessidade de preservao.DSC Esse um trabalho de preservao, meu pai j criava esta raa, eu achava o gado bonito, gostava da sua histria. Da, aprendi muito sobre a sua rusticidade e capacidade reprodutiva, uma raa bem adaptada aqui ao nosso clima e pastagem. Eu percebia que as outras raas que vinham de fora no primeiro ano elas passavam, no segundo ano dava um problema como tuberculose ou coisa parecida elas acabavam desaparecendo. Ento eu crio a Crioula Lageana pra no extinguir, pela beleza, pela histria, e pela adaptao ao nosso clima e pastagem, e pelo baixo custo de produo e a relao custo beneficio que eu considero muito boa.

Idia Central C - Por ser um produto genuinamente nacional, por ser uma raa adaptada s condies de criao da regio e pelo potencial de participao de um mercado diferenciado de carnes.

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DSC Bom a Crioula Lageana uma das cinco ou seis raas naturalizadas que ns temos, e o motivo que me levou a cri-la foi o de ver nela o potencial de desenvolvimento de um produto genuinamente nacional, pela longa histria que ela tem aqui, pela adaptao que ela tem. Esse potencial se manifesta, principalmente, pelos novos dispositivos de mercado, que so os mercados de produtos diferenciados, produtos certificados com denominao de origem. Ento isso a, me faz apostar em um trabalho de desenvolvimento de uma cadeia diferenciada de carnes principalmente.

Quando perguntados sobre porque criam a raa, entre os cinco entrevistados nitidamente pode-se distinguir trs idias centrais bem marcantes. Um grupo demonstrou um sentimento romntico, onde disseram que tem como principal motivo preservao deste recurso gentico animal, por ela se confundir com a histria das Amricas, do Brasil e mais especificamente da regio onde estes possuem suas propriedades. O outro grupo, tambm associa o motivo de cri-la com a necessidade de preservao, e sua rica histria, mas j apresenta uma viso mais produtivista, j que v uma grande vantagem em relao s demais raas criadas na regio, devido sua adaptao s condies ambientais regionais, rusticidade e resistncia, e desta forma acredita numa explorao econmica mais rentvel. No que diz respeito ao terceiro discurso, nota-se uma viso mais acurada em relao s novas tendncias de mercado, e na possibilidade de desenvolver um produto nacional, e com grande potencial de agregar valor aos seus produtos, mas no deixando de associar raa a histria da regio. O primeiro discurso, representa de certa maneira um grupo de criadores romnticos, j que optaram por criar a raa por motivos preservacionistas, mas alm disto, e principalmente, por fascinao pela histria da raa, que foi sem dvida quem formou os primeiros rebanhos bovinos na Regio Sul do Brasil. O que est de acordo com Mariante & Cavalcante (2000), que afirmam, que aps a invaso das Misses Jesuticas pelos Bandeirantes, grande parte do rebanho foi levado para Franca/SP, e que durante a viagem, muitos desses animais se perderam nas matas do Planalto Catarinense e formaram rebanhos, e quando iniciou-se a colonizao da regio Serrana de Santa Catarina, o gado dos

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colonizadores se cruzou com estes bovinos e deram origem a raa Crioula Lageana. Quando analisamos o segundo discurso, podemos notar uma tendncia em cri-los, mais por ela apresentar a caracterstica zootcnica de grande adaptao regio e por isso nos leva a crer na possibilidade de um discurso mais tradicionalista, e que demonstra grande experincia no convvio com esses animais. No terceiro discurso nota-se uma percepo moderna, especialmente por associ-la aos novos dispositivos mercadolgicos, que valorizam um produto diferenciado, explorado de maneira sustentvel e, acima de tudo, com enfoque territorial. Estes conceitos h muito j vem sendo desenvolvidos na Europa, onde se privilegia o produto autctone, com certificao de origem e de qualidade superior. E apresentam a longo prazo um grande potencial de mercado para as raas naturalizadas ou crioulas Brasileiras.

Questo nmero 2 Quais as caractersticas que o Sr (a) acredita possuir o gado Crioulo Lageano que o diferencia das demais raas criadas na regio? Idia Central A Caractersticas fenotpicas e produtivas bem prprias. Grande variedade de pelagens, extremamente rstica e resistente. Capacidade de acumular energia para perodos de escassez de alimento no necessitando de suplementao nos perodos crticos.

DSC As caractersticas da Crioula Lageana so bem prprias n, tanto as produtivas como as fenotipicas. Mas a diferenciao primeira a rusticidade do animal, que j ta ambientando aqui a mais de trezentos anos na regio, que pouco exigente, mas nem por isso deixa de produzir, produz com qualidade, produz, se multiplica rpido n, no exige cuidados especiais. As vacas so longevas e parem sem problemas. Eu tenho vacas aqui de mais de vinte anos criando, repetindo cria a cada doze meses, treze meses, quinze, no mximo dezoito meses to repetindo cria em condies naturais, sem suporte, sem suplementao nutricional praticamente o sal mineral e uma pastagenzinha de inverno mas s pra ajuda, ento campo nativo aqui, mato, e eles sabem o que comer, escolhem a dieta e assim vo se procriando.Essa capacidade de se manter em parte pela espessura do couro no pescoo e que da no resfria o sangue, e ele sente menos frio no inverno, uma das razes da rusticidade dele. E no vero ele acumula muita gordura nos ossos n, da no inverno ele tem aquela reserva pra se protege, na entressafra de pasto n. J com as outras raas dependendo da raa, tinha problema n, morria boi, boi que no era resistente a parasitas tambm, e o Crioulo Lageano a gente nota a diferena nesse aspecto principalmente. Alm disso um gado que tem uma pelagem bem diversificada , mas h um padro dentro desta variao de plos. Mas estas pelagens, principalmente o africano, tanto o preto como o vermelho e o jaguan so prprias do Crioulo Lageano, no existem em outras

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raas n, e as caractersticas de aspa, com longos chifres e com desenho prprio. Ento a conformao geral dele e a rusticidade chamam bastante ateno e os diferencia das demais raas.

Idia Central B - Raa extremamente adaptada ao meio ambiente da regio. Grande potencial mercadolgico e no melhoramento animal. Alm de apresentar grande beleza.DSC O que mais diferencia a Crioula Lageana, a adaptao ao meio, uma raa que se caracteriza pela histria em um ambiente agreste do Planalto Catarinense. Esse gado consegue sobreviver no inverno, inclusive com vacas parindo no perodo mais frio do ano e levando a sua cria at a desmama. J do ponto de vista mercadolgico e de melhoramento animal, o gado Crioulo Lageano ele se mostra diferente geneticamente das outras raas, mesmo das raas europias, e essa diferena pode contribuir significativamente ou consideravelmente, em programas de seleo e de melhoramento animal. E claro que no podemos esquecer da beleza que este animal expressa, num ambiente onde ele foi selecionado naturalmente.

Quando apresentaram-se

perguntados duas Idias

sobre

quais

eram

as

caractersticas

que

diferenciavam a Crioula Lageana das demais raas criadas na regio, Centrais distintas. A primeira exaltou as caractersticas j confirmadas da raa, de adaptao e rusticidade, alm da capacidade de acumular energia nos perodos de alimentao farta, para a poca critica de outono e inverno nos campos nativos. Essa idia est intimamente ligada a uma reduo nos custos, com melhorias ambientais, para receber estes animais, o que leva a crer que se obtero vantagens econmicas. J que a raa no necessita de grandes modificaes ambientais para produzir adequadamente. O que , com certeza, muito interessante no s do ponto de vista econmico mas tambm energtico/ambiental. E est de acordo com Quadros et al., (1996), que salienta que nas condies do Planalto Catarinense, a criao de animais adaptados e seus cruzamentos, so importante alternativa, para o aumento da produtividade nesses perodos, alm da diminuio dos custos relacionados adequao do ambiente para a manuteno de rebanhos no adaptados. Mas cita-se, neste primeiro discurso, tambm, grande variedade de pelagens encontrada na raa e sua beleza caracterstica que, com certeza, um

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importante diferencial. Mas salienta-se, tambm, que, mesmo dentro desta grande variao, existe um padro, que caracteriza estes animais. No segundo discurso, nota-se uma tica que vai alm da primeira e que percebe o potencial inerente raa, o de utilizar as caractersticas citadas na primeira idia central, para desenvolver um hbrido que supere a raa pura. Isto mostra-se vivel pois a Crioula Lageana apresenta-se geneticamente distinta at mesmo das raas taurinas, o que traz a possibilidade de excelentes ganhos por heterose nos cruzamentos com outras raas. Percebe-se tambm a possibilidade de desenvolver produtos de qualidade e diferenciados, associados raa, sua histria e ao ambiente onde ela evoluiu e criada e, claro, no esquece de sua beleza, que outro importante diferencial, que traz outro interessante mercado em potencial: o do turismo rural.

Questo nmero 3 - Como criador, que dificuldades o Sr (a) encontra na criao do gado Crioulo Lageano? Idia Central A Pouca disponibilidade de material gentico de boa estirpe, tanto de machos como de fmeas. Reduzido nmero de criadores e rebanho pequeno o que dificulta a seleo de famlias distintas, alm de dificuldade na manuteno dos recursos genticos.DSC Existem diversas dificuldades entre elas a disponibilidade de material gentico de boa estirpe pra voc comprar, j que o tamanho do rebanho pequeno e no h disponibilidade de matrizes e reprodutores. A maioria dos criadores que se inicia , acaba buscando um touro de boa qualidade e acaba colocando no rebanho geral ou num rebanho mestiado, ou num rebanho cruzado pra que possa, duas, trs, quatro geraes depois ter um material de boa qualidade. Tambm se tem dificuldade na seleo de famlias distintas, j hoje ns temos um rebanho fechado, pequeno, e por isso ns precisamos trabalhar fortemente na caracterizao gentica deste material a partir da ento direcionar um trabalho de formao de famlias distintas. Nos parece que o programa de melhoramento gentico da associao e o regulamento do registro genealgico, vai abrir um espao muito bom pra que se incorpore esses genes naqueles animais sem raa definida e que tem caractersticas da raa mas que no esto dentro dos rebanhos de fundao da associao.E daqui trs, cinco, seis, sete geraes, ns tenhamos uma variabilidade gentica considervel. Outro aspecto que se tem dificuldade, diz respeito a manuteno dos recursos genticos, de germoplasma por exemplo, ns gostaramos de instituir um banco de germoplasma aqui em Santa Catarina. Com o livro de registro oficial do Ministrio da Agricultura ns vamos poder por touros nas centrais de inseminao e da poderemos ter bons bancos de smen e de embries e ovcitos e assim por diante.Mas mesmo com todas essas dificuldades, hoje o maior problema e o risco que ns enfrentamos com a raa Crioula Lageana, com o aspecto sanitrio, imagina um foco de febre aftosa, num dos rebanhos de fundao, esse rebanho ter que ser eliminado integralmente, e ns no temos Back-up, ns deveramos ter Back-up deste material, ento esta preocupao que ns precisamos desenvolver, ns deveramos ter Back-up em diversos lugares.

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Hoje, os riscos que ns corremos so srios, j que no pode vacinar, e se surgir um foco de febre aftosa sacrifcio sanitrio, liquidar o rebanho.

Idia Central B - As dificuldades de criao e de mercado so mnimas, ou nulas.DSC A dificuldade mnima porque o terneiro em geral nasce pequeno, no d problema de parto n, e as vacas so boas mes n, protegem bem a cria, so boas leiteiras.No que diz respeito ao mercado no tenho dificuldade, quando a vaca que se destaca na raa a gente deixa at parar de parir n, da vai pro aougue n, descarte. O que eu quero que essa raa cresa em todos os aspectos n, no aspecto comercial tambm porque atravs da lucratividade que a gente sobrevive e mantm essa raa viva, livre da ameaa de extino.

Assim como na questo anterior, na questo onde os criadores so inquiridos cerca das dificuldades encontradas na criao destes animais, apresentam-se duas Idias Centrais muito distintas. Uma apresenta uma percepo mais focada no manejo, produtividade relativa da raa, e se restringe ao mercado frigorfico comum, sem vislumbrar a possibilidade de diferenciao de seus produtos, e, por isso, no percebe dificuldades quanto criao destes animais, possivelmente, por visualizar apenas os aspectos pontuais da criao. A outra vai muito alm e consegue perceber questes de aspecto mais global, entre elas a manuteno da raa e os riscos que esta corre, por se encontrar em rea livre de febre aftosa sem vacinao, e se preocupa j que o rebanho limitado e qualquer foco da doena prximo aos rebanhos de fundao da Associao, pode levar a quase extino da raa. Da mesma forma, e associada a esta idia, outra dificuldade citada e importante do ponto de vista de preservao deste Recurso Gentico, a falta de bancos de germoplasma, o que traz grande preocupao, mas ao mesmo tempo se entusiasma com a possibilidade de colocarem animais em Centrais de Inseminao, aps a formalizao da raa, pelo Ministrio da Agricultura. Ao mesmo tempo nota-se um certo descontentamento com a falta de apoio e interesse do Estado, em preservar um patrimnio catarinense. Tambm no primeiro discurso, se percebe, uma preocupao quanto qualidade do material gentico disponvel, e a dificuldade de adquirir reprodutores caractersticos da raa, e lembra da necessidade de se trabalhar com a caracterizao gentica destes animais. Isso provavelmente est

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relacionado, necessidade de informaes desta natureza para que se possa trabalhar, adequada e efetivamente, no desenvolvimento gentico da raa, e dar diretrizes aos programas de seleo e melhoramento da Associao.

Questo nmero 4 Como o Sr (a) v o mercado atual em relao raa Crioula Lageana? E como desenvolv-lo? Idia Central A Sempre existiu mercado principalmente para reprodutor. Em geral, o mercado bom mas no existe um mercado especifico.DSC O mercado de carne, ele bem receptivo, voc consegue colocar facilmente o produto no mercado. Com relao venda de terneiros pra engorda e tal, tambm, tem excelente receptividade.J para matrizes e reprodutores se tem um mercado razovel , eu acho que deve ser mais ou menos, equivalente as outras raas. Eu sempre vendi pra Gois, Tocantins pra So Paulo n, pro Paran vendi muito lote de novilha, vaca e reprodutor principalmente. Ns no temos assim, um mercado especifico, mas seria praticamente um boi verde, porque ns s temos o campo nativo e o sal branco, sem nada de agrotxico. Em geral o mercado pro gado Crioulo, pelo menos por enquanto ele muito bom. A gente tem sempre mercado pra vender.

Idia Central B Mercado de futuro, principalmente para o melhoramento de outras raas, devido seus atributos produtivos e sua rusticidade. E para produo de rebanhos F1 para abate.DSC O principal mercado eu acho que pra cruzamentos n, pra melhorar certas raas. Eu vejo pro futuro, pra mdio e principalmente a longo prazo, um grande valor econmico pra essa raa n, e muita procura, tambm, por esse gado, no s pela rusticidade, pela produtividade, pelo baixo custo de produo, pela beleza natural dele, mas tambm porque uma gentica bastante antiga, uma gentica exclusiva selecionada pela natureza e que com certeza vai contribuir muito pra formao de rebanhos de animais F1 pra abate, com carcaa de qualidade, com carne de qualidade, no s o rendimento de carcaa mas principalmente a qualidade dessa carne. um mercado que eu acho que tem futuro.

Idia Central C - necessrio construir um mercado diferenciado de carnes, direcionando-a para pontos de excelncia e agregar valor ao nosso produto. No momento estamos na vala comum.DSC O mercado atual hoje, ele no tem mercado diferenciado, isso que a gente tem que construir, ns pensamos em desenvolver uma cadeia de carnes, especificamente da Crioula Lageana. O objetivo dar um direcionamento carne, para pontos de excelncia de carne, de consumo de carne. Achamos que, para que isso ocorra, ns temos que tirar a indstria da carne, o frigorfico, tirar o frigorfico como comprador de bois, ns gostaramos de chegar a ter o frigorfico como um

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prestador de servio, e a carne ser direcionada pra nichos de mercado que valorizem produtos naturais e produtos diferenciados, que valorizem recursos genticos, que valorizem o trabalho que a associao vem fazendo, que valorizem o trabalho que a cincia vem fazendo acima dos recursos genticos a nvel mundial. Ns s vamos ter uma valorizao se a sociedade se conscientizar da importncia desses recursos genticos. Ento o trabalho grande que a associao tem que fazer depois de ter a carne consolidada um bom trabalho de mdia pra informar a sociedade como um todo da importncia de se consumir uma carne diferenciada, no s pelo ambiente, pelo animal ou pela carne, propriamente dita, pela qualidade da carne. No momento eu acho que ns estamos na vala comum como qualquer outro, mas vislumbramos este mercado diferenciado.

Nota-se, nesta questo, trs percepes diferenciadas em relao ao mercado para a raa e seu desenvolvimento. O primeiro discurso demonstra claramente, uma certa acomodao, e novamente por no vislumbrar um aspecto mais global e se restringir situao atual, no percebe a possibilidade de desenvolvimento de mercados diferenciados dos produtos da raa. E, desta maneira, acredita que o mercado no apresenta restries raa e de maneira geral, satisfatrio. No segundo discurso, observam-se boas perspectivas, quanto utilizao da raa em cruzamentos devido suas caractersticas produtivas. Desta forma, pode ser importante no melhoramento de raas especializadas, associando, a estas as caractersticas de rusticidade , de resistncia e de adaptao s condies regionais, o que pode trazer sustentabilidade pecuria regional e reduo de custos relacionados modificao ambiental. Assim, acredita-se no desenvolvimento de um mercado futuro interessante, especialmente na produo de gentica, para suprir a demanda na formao de rebanhos F1 para abate, com carne de qualidade. E mesmo no deixando claro no discurso, demonstra que vislumbra um mercado diferenciado, onde a raa possa ser inserida, partindo do principio de utilizao como raa melhoradora. O terceiro discurso, deixa claro a inteno de desenvolver uma cadeia produtiva especifica da raa, onde sejam valorizados todos os aspectos relacionados ao ambiente onde se produz, e onde se apresentam aspectos de histria, tradio e territorialidade, no desenvolvimento dos produtos. Tambm acredita que, aps a consolidao da cadeia produtiva, se torna fundamental um grande trabalho de marketing, focando, principalmente, a qualidade dos produtos oferecidos e do seu papel de preservao de um ecossistema (Campos de Araucria), do qual a Crioula Lageana faz parte.

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Ao analisar mais detalhadamente, percebe-se a possibilidade de unio dos dois ltimos discursos no desenvolvimento de um mercado diferenciado, onde se poderia desenvolver um hbrido, com a utilizao de vacas Crioulas com outra raa especializada, dando desta forma sustentabilidade a explorao nas condies de campo nativo, valorizando e estimulando a gentica Crioula, em especial, a vaca. Isto possibilitaria formar um rebanho caracterstico da regio, criado em condies de pastagens naturais e estimulando a preservao da raa, e tambm agregando valor a estes produtos, devido s condies em que so produzidos.

Questo nmero 5 Quais as aes o Sr (a) acredita que devam ser tomadas pela ABCCL para facilitar a insero da raa no ramo do turismo rural? Idia Central A - Existe grande receptividade dos empresrios do turismo rural raa. Mas necessrio desenvolver o material gentico existente, para oferecer animais caractersticos da raa aos hotis fazenda.DSC Primeiro ns temos que resolver um problema interno que a disponibilidade de material gentico de boa qualidade pra que se possa colocar junto rea de turismo rural. De maneira geral todos os empresrios gostariam de ter exemplares, mas ns temos que ter uns exemplares muito bons pra colocar, no adianta a gente colocar algo que no seja representativo da raa l, mas o mercado de turismo rural regional ele bem receptivo a utilizar a raa, at pra divulgao j que ela est ligada histria da regio. O que a ABCCL precisa fazer o que ela j est fazendo, talvez ns tenhamos que intensificar a produo de material gentico a inseminao deste material gentico pra que a gente tenha produto pra ser ofertado pra esse mercado.

Idia Central B No depende apenas da ABCCL, mas tambm do interesse dos proprietrios de hotis fazenda. Por isso, necessrio conscientiz-los sobre o valor histrico da raa, j que com a Crioula Lageana aumenta a mo de obra. Deve-se atingir um pblico interessado em pecuria de corte.DSC Isso a depende mais dos proprietrios dos hotis de turismo. No depende s da ABCCL, e sim dos empresrios da rea turstica. O turismo rural j tem que prestar servio de cavalgadas e outras coisas mais, e da eles tem o espao deles muito restrito, ento pra ter Crioula Lageana, eles teriam que racionar, a comea a encarecer, e tem mais mo de obra. Ento o que ns podemos fazer conscientizar as pessoas desse setor n, a respeito do valor histrico da raa e tambm do diferencial fenotpico desses animais. Ns teriamos que atingir um pblico alvo, esse pblico mais restrito que um turista mais interessado realmente nas coisas da natureza, nos animais e especialmente na pecuria de corte.

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Idia Central C Necessidade de se implementar parcerias, onde os criadores disponibilizem animais de primeira linha aos hotis. Mas a ao esbarra em impedimentos legais. Talvez a ABCCL precise ser mais agressiva mas necessrio o engajamento dos associados.DSC A associao atravs dos seus associados, deveria implementar parcerias com esse pessoal do turismo rural n, atravs dos criadores da associao, os produtores que tem animais disponveis. Ela precisaria talvez incrementar um pouco mais a ao de disponibilizar animais para as fazendas de turismo rural. Eu acho que esse tipo de trabalho, a associao ainda no desencadeou plenamente, tem algumas iniciativas mas ta esbarrando em alguns aspectos legais n, do ponto de vista de fiscalizao profissional ento tem empresas de turismo rural que tem interesse, mas ns no podemos colocar ainda animais l, porque existe restrio ainda sobre a responsabilidade tcnica dos animais dentro dos estabelecimentos.Outro ponto importante que pra mandar uma vaca para um hotel fazenda, o animal tem que ser um exemplar muito bom, no pode mandar um exemplar de segunda ou terceira linha, tem que mandar animais de primeira linha, pra pode dar o destaque que merece n. Outro aspecto que talvez dificulte um pouco, que como tem poucos animais, eu acho que talvez os produtores queiram segurar os animais na prpria fazenda, o que talvez iniba um pouco. Talvez a associao precise ser mais agressiva, mas ela no pode assumir compromisso desta ordem, sem a efetiva colaborao dos associados, porque a associao em si ela no tem animais.

Quando se questionou quais as aes que deveriam ser tomadas pela ABCCL, para facilitar a insero da raa no ramo do turismo rural, apresentaramse trs Idias Centrais com abordagens bem diferentes, e que demonstrou, por parte de alguns criadores, um certo desconhecimento sobre a atividade da associao neste sentido, mais por questo de desinteresse destes associados no desenvolvimento desta atividade. Diferentemente da idia acima, o primeiro e especialmente o terceiro discurso demonstram, um grande interesse na utilizao dos animais neste ramo de atividade, e tambm demonstra estar par dos impedimentos, inclusive de ordem legal, para que a atividade se desenvolva. No primeiro discurso nota-se, uma grande preocupao por parte deste criador, em primeiramente, multiplicar animais caractersticos da raa para ofertar ao mercado do turismo rural. possvel perceber um certo conhecimento sobre o assunto j que ele diz que os estabelecimentos de turismo rural da regio, de maneira geral, so bem receptivos e todos tem interesse em ter animais, inclusive para divulgao do hotel, j que estes animais so animais ligados histria da regio. Sendo assim, pode-se levantar a hiptese de que existe primeiramente um interesse de desenvolver um material gentico de qualidade, ou seja que

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represente de maneira adequada raa, e em quantidade suficiente,

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fornecer constantemente animais aos hotis. Ou seja, neste discurso existe uma especial preocupao em disponibilizar aos estabelecimentos de turismo animais com selo racial, e que representem bem a raa. No segundo discurso, pode-se dizer que h um certo desinteresse e desconhecimento sobre as aspiraes dos proprietrios de hotis rurais cerca da raa como atrao, visto que, durante as entrevistas com empresrios do ramo, pode-se observar grande interesse em ter animais da raa em seus hotis. Demonstra tambm um certo negativismo, e chega a dizer que os hotis fazenda j prestam muitos servios e que a Crioula Lageana s traria mais mo de obra e despesas, no apresentando boas expectativas. Mas ao mesmo tempo, v como forma de desenvolver este mercado a necessidade de estimular um pblico alvo (que goste de gado de corte) e conscientizar os empresrios do ramo da importncia histrica da raa. Ou seja, acredita no potencial da raa como atrao turstica, mas no tem boas expectativas quanto a esta atividade, o que pode estar relacionado ao desconhecimento do interesse existente por parte dos proprietrios de hotis em ter estes animais como atrao. O discurso trs demonstra um interesse maior na atividade, mas ressalta as dificuldades encontradas pela associao e criadores. Entre elas, encontramse os aspectos legais de responsabilidade tcnica dos animais, o nmero reduzido de animais, o que, segundo ele, pode inibir o criador de disponibilizar animais e tambm lembra, assim como no primeiro discurso, da necessidade de desenvolver material gentico de qualidade e que seja representativo da raa. Neste discurso possvel perceber um interesse e conhecimento maior sobre os assuntos relacionados ao setor, alm de demonstrar grandes e boas expectativas sobre a atividade.

DESENVOLVIMENTO DOS DISCURSOS DO SUJEITO COLETIVO. QUESTIONRIO DESTINADO AOS PECUARISTAS, NO CRIADORES DA RAA CRIOULA LAGEANA.

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Questo nmero 1- O que o Sr (a) conhece sobre a raa Crioula Lageana? Idia Central A Raa autctone local, participou da formao dos primeiros rebanhos da regio, muito utilizada antigamente antes das importaes das raas europias. Rstica e muito adaptada s condies da Serra. Patrimnio gentico.

DSC A raa Crioula Lageana, a raa autctone da regio n, remonta a origem da nossa civilizao na nossa terra n. Quando os primeiros Bandeirantes subiram a Serra como desbravadores procurando um novo caminho para So Paulo, j encontraram inseridos na ecologia da regio, o gado bovino e eqino chamado gado chucro. Ela participou da formao dos rebanhos aqui da nossa regio serrana, havia antigamente um nmero bastante expressivo destes animais. Era o gado nativo de uma seleo natural, e desenvolvido de uma forma emprica. Os rebanhos que formavam as nossas fazendas e sofreram uma seleo emprica pela pelagem, pelo tamanho do chifre, e por outros atributos. Assim perduram por mais de 150 anos, at que ento, comearam a entrar raas europias com maior produtividade para tornar nas condies mais atuais, animais mais produtivos, e o Crioulo no deixou de existir. Eu conheo h muitos anos, naquele tempo se chamava gado africano, porque era uma pelagem. Meu av antigamente usava alguns touros dessa raa para cruzamentos entendeu, porque na poca era o que tinha, antes das importaes que vieram da Europa. Sempre achei uma raa interessante, uma raa muito rstica, uma raa que se adapta muito bem as nossas condies aqui da Serra. Acredito que se fizerem um trabalho de melhoramento gentico, tentando fixar nos descendentes essas caractersticas mais produtivas, que o que falta pra mim nela mais produtividade em termos de maior quantidade de carne, um animal com uma carcaa um pouco dbil, mas levam muita vantagem sobre as demais raas taurinas devido a sua rusticidade, e a sua capacidade de adaptao ao nosso clima, as intempries, pastagens de baixa qualidade. Eu o vejo como alternativa bem vivel, usando ele com as raas que de repente sejam as raas mais produtivas. um patrimnio gentico importante, que est at hoje na nossa regio e est sendo desenvolvido pela ABCCL..

Idia Central B - Raa que apresenta grande capacidade em cruzamentos, especialmente com o Nelore. Muito importante na pecuria baseada em campo nativo, pela excelente adaptao a esse ambiente.DSC Eu tenho acompanhado a raa Crioula Lageana desde o tempo do seu Antoninho Camargo, que, na verdade, um dos pioneiros da raa. Essa raa extremamente importante principalmente quando se trata de explorao de campo nativo, pela adaptabilidade que esses animais tem ao nosso ambiente n, que a grande virtude da raa. Os trabalhos de acasalamento da Crioula Lageana com Nelore, apresentaram resultados muito satisfatrios e que realmente para esse tipo de cruzamento os resultados foram muito bons.

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Idia Central C - Se conhece a seleo feita h muito tempo pelos pioneiros na criao da raa, e o trabalho realizado atualmente pela associao.DSC O Crioulo Lageano a gente conhece basicamente a seleo que feita aqui na regio n, h muito tempo, desde o tempo do seu Antoninho Camargo. E tambm que alguns pecuaristas preservam estes animais. E que hoje eles esto fundando uma associao, e esto procurando alavancar um pouco mais a seleo da raa n.

Nesta questo, nota-se no primeiro discurso uma viso mais saudosista da raa, j que fala da sua importncia histrica, e de sua participao na formao dos rebanhos da regio. Ao mesmo tempo, salienta as suas caractersticas produtivas, como rusticidade e adaptao, e percebe o potencial de cruzamentos industriais, onde a raa possa inserir estas caractersticas prprias, em outras raas, que sofreram seleo artificial direcionada. Mas acredita que se torna necessrio um trabalho de melhoramento, em especial, no quesito de massa muscular, j que ele diz que a raa, possui uma carcaa um pouco dbil. O segundo discurso, ressalta a importncia da raa para sustentabilidade de sistemas exploratrios em campo nativo, devido a adaptao da raa para estas condies ecolgicas. E acredita, assim como no primeiro discurso, na viabilidade de utilizao da raa em cruzamentos industriais, e levanta os resultados obtidos por Ribeiro (1993), onde os animais das raas Nelore e Charols, cruzados com a Crioula Lageana, obtiveram desempenho superior em desenvolvimento ponderal em condies de campos naturais da Serra Catarinense, em relao s raas puras. J o terceiro discurso, aparentemente no demonstra conhecimento sobre as potencialidades da raa, e sobre a histria destes animais, apenas cita um dos pioneiros da raa Sr. Antoninho Camargo, e que existe um trabalho que est sendo desenvolvido por alguns preservacionistas, e que estes se reuniro em uma associao. A partir destes trs discursos pode-se inferir que por parte de alguns pecuaristas, existe um certo respeito a estes animais, devido a sua histria. Notase tambm, a percepo quanto as potencialidades da raa especialmente em

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cruzamentos, mesmo que, em nenhum momento, se refiram a outras potencialidades da raa. Isso pode de alguma forma, estar relacionado ao fato de que a maioria dos entrevistados, alm de pecuaristas, so tambm profissionais da rea de Cincias Agrrias.

Questo nmero 2- Quais as caractersticas que o Sr (a) acredita serem importantes nestes animais? Idia Central A Raa rstica e extremamente adaptada s condies ambientais da regio, mas sem padro racial e com baixa produtividade. Pode ser importante no cruzamento com raas mais produtivas.DSC As mais importantes so a rusticidade, e adaptao ao clima. Sem dvida uma raa que se adapta a qualquer tipo de campo, um animal que agenta bem as intempries. No me parece ser uma raa de muito rendimento. Deveria existir nela um trabalho melhor em cima, que ela tivesse uma precocidade de terminao, no digo igual s raas inglesas mas perto das raas inglesas, e levando a grande qualidade dela que a adaptabilidade e a rusticidade. Acho que falta muito em termos de seleo e melhoramento para produo de carne, de produo de leite, de padronizao racial tambm n.

Idia Central B Raa rstica e extremamente adaptada ecologia da regio. Com grande potencial para o desenvolvimento de mercados de carne diferenciadas. Bons resultados nos cruzamentos com outras raas. Grande valor histrico e cultural.DSC De todas, a mais importante, inegavelmente, a sua adaptao as condies mesolgicas, esta caracterstica insupervel por qualquer uma outra das raas. Isso ocorreu porque a seleo natural se encarregou de fazer todo este processo de seleo pela fora do ambiente. A Crioula um animal que exige pouco e pras condies de criao de uma grande parte dos criadores. Aqui da regio e mesmo de outras regies do estado e de outros estados um animal que tem essa virtude de uma adaptabilidade muito grande.Ela se apresenta como um verdadeiro banco de smen, e acho que sendo melhorada, ela tendo condies prprias adquiridas ao meio eu acho que ela poder comercialmente tambm oferecer uma mercadoria ao comrcio de carnes especiais, como temos em vrias partes do mundo. Ela pode trazer uma contribuio para a explorao de animais com rusticidade alta, e associando a produtividade de outras raas n, sendo que dentro de um programa de engenharia gentica, pode trazer uma contribuio fantstica, pelo fornecimento destes genes de importncia na adaptabilidade dos animais. At porque um animal que tem mostrado resultados positivos nos cruzamentos. Alm disso um animal que potencialmente tem um grande valor histrico, valor turstico e valor de conhecimento.

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Aqui novamente a raa lembrada pela sua rusticidade, e adaptao as condies ambientais da regio, mas no primeiro discurso nota-se um certo preconceito e desconhecimento quanto s aptides da raa, em especial quando citada como uma raa com pouca produo de leite e sem padro racial. De acordo com Ribeiro (1993), a Crioula Lageana, tem como uma de suas caractersticas de destaque, boa produo leiteira, em comparao s raas Nelore e Charols, em condies ambientais do Planalto Catarinense. E quanto ao padro racial, provavelmente, a suposio se baseia na grande variedade de pelagens encontradas na raa, o que, no, necessariamente indique que a raa no tenha padro gentico. Isto vai contra os dados obtidos por Nunes (1985), onde as vacas Crioulas Lageana de diferentes pelagens e contrastantes quanto feminilidade e peso adulto apresentaram-se muito semelhantes em desempenho. No segundo discurso, a percepo se mostra totalmente contrria ao primeiro, mesmo que, mais uma vez, se refira adaptao como a principal caracterstica da raa. O discurso consegue fazer uma anlise mais global e percebe as demais potencialidades da raa, como a de desenvolvimento de um mercado de carnes especiais, associadas ao ambiente em que sofreram seleo natural, alm de observar o valor histrico, cultural, e gentico da raa, e sua importncia em programas de engenharia gentica. Desta maneira, percebe-se uma diviso em linhas de pensamento no que diz respeito raa, uma produtivista e desinformada sobre suas potencialidades produtivas e mercadolgicas, e outra, que consegue vislumbrar as importantes aptides produtivas destes animais, seu valor histrico e cultural, bem como seu potencial, no desenvolvimento de um mercado diferenciado e na utilizao em programas de melhoramento gentico animal.

Questo nmero 3 - Quais os motivos que levariam o Sr (a) a criar os animais da raa Crioula Lageana?

Idia Central A Preservao da gentica Crioula para utilizao em cruzamentos industriais. Pelo potencial turstico, devido sua beleza extica.

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DSC No propriamente animais de puro sangue, usaria ele como animal extico, e como um banco gentico para um resgate de alguma caracterstica que eu precisar usar num futuro cruzamento, podendo estar inserindo genes de rusticidade e de adaptao a esse clima, seria bastante interessante. A Crioula Lageana passa hoje na nossa regio quase como um banco gentico, que tem aqui e que a gente deve preservar, justamente, pra usar algumas caractersticas desse banco gentico em termos de melhoramento gentico de outras raas. Quem sabe nesses melhoramentos que a gente sempre faz de cruzamentos industriais, de cruzamentos entre taurinos e zebunos, usar dela as caractersticas que eu acho que so as principais.Desta maneira ela poderia dar a sua contribuio. Ento o principal aspecto que me levaria a cri-la seria o de preservar essas virtudes que o animal tem, da sua gentica para a adaptabilidade, e tambm por esse aspecto turstico, pela beleza que eles tem, tanto na sua conformao corporal quanto nos seus enormes chifres. Se a minha fazenda estivesse numa rota turstica, sem dvida nenhuma eu teria animais da raa Crioula que um patrimnio da regio, e que estaria ali como atrao para os visitantes observ-los n.

Idia Central B Por saudosismo, e pela tradio da raa. Tambm pela sua grande beleza e por serem excelentes mes e boas produtoras de leite.

DSC Eu acredito que at por um certo saudosismo hoje eu viesse a ser criador, porque eram animais muito bonitos. O Crioulo Lageano muito tradicional, eu acho que desperta muita curiosidade, talvez seja pela atrao do chifre enorme. Tambm sei que as vacas so muito boas produtoras de leite, e que criam os bezerros muito bem. Ento sobre esse aspecto interessante o Crioulo Lageano.

Idia Central C - Por mercado, questo comercial. Hoje no criaria, falta muito em termos de melhoramento.DSC Talvez por mercado, por questo comercial mesmo n. Hoje no criaria, porque eu acho que hoje, em termos de seleo ainda ela est muito atrasada, em termos de agregar alguma coisa a pecuria, eu acho que falta muito, falta muito em termos de seleo da prpria raa, em termos de precocidade, em termos de cobertura muscular n, de padronizao de carcaa. A raa hoje no tem padro definido, um padro de tipo, um padro de pelagem n. Ento, eu acho que hoje, ainda no um momento de pegar uma raa dessa, e dizer que ela uma raa melhoradora.

Nos dois primeiros discursos, os pecuaristas demonstram um certo interesse na utilizao da raa. O primeiro se refere a ela como um importante material gentico que possivelmente poderia ser utilizado em cruzamentos industriais, mas parece ver raa mais como uma atrao turstica, j que no final do discurso fala que se estivesse numa rota turstica com certeza a criaria. O

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segundo discurso, declara que criaria mais por saudosismo, e lembra da beleza caracterstica destes animais, mas, ao final, cita algumas caractersticas importantes e j comprovadas por Ribeiro (1993), como a boa produo leiteira, facilidade de parto e excelente habilidade materna, e acredita que neste sentido a raa seria importante para a pecuria. O terceiro discurso demonstra uma certa antipatia pela raa, j que no percebe nela nenhum atributo produtivo positivo, e acredita que ainda falta muito em termos de melhoramento intra-racial, e no cogita a possibilidade de cri-la nas condies atuais. Mesmo nos primeiros dois discursos, aparentemente nota-se um certo descredulo no potencial produtivo da raa, j que os motivos que os levariam a cri-la seriam mais pela beleza, e por saudosismo. Observa-se tambm que mesmo sabendo dos resultados cientficos obtidos com a Crioula Lageana, ainda existe um certo preconceito a criao destes animais, que poderia estar relacionado aparncia do animal e talvez na dificuldade de manejo associada aos grandes chifres.

Questo nmero 4 - Que tipo de caractersticas o Sr (a) busca quando seleciona um reprodutor? Idia Central A Animais com boa produtividade, fertilidade, conformao, estrutura, r