a proporcionalidade e a razoabilidade no controle … pasqua.pdf · controle dos atos...
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Juliana Silva Pasqua
A PROPORCIONALIDADE E A RAZOABILIDADE NO
CONTROLE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS PELO STF
Monografia apresentada
Escola de Formao da
Sociedade Brasileira de
Direito Pblico SBDP, sob
a orientao da professora
Marina Cardoso de Freitas.
So Paulo
2013
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Resumo: A teoria dos atos administrativos construiu-se a partir da
premissa de que o mrito de tais atos no poderia ser avaliado pelo
Judicirio, j que seria esfera prpria do administrador. Porm, vm sendo
admitidas determinadas balizas para o controle judicial da legalidade desses
atos, dentre elas, a proporcionalidade e a razoabilidade, abrindo espao
para sua reviso judicial. Nesse contexto, a monografia analisou casos do
Supremo Tribunal Federal em que a proporcionalidade e a razoabilidade
foram suscitadas no questionamento dos atos administrativos, procurando
compreender como tais exigncias foram trabalhadas.
Como resultado, foram encontrados casos de temticas variadas e formas
de argumentao diversas. No foi identificado propriamente um padro
decisrio que corresponda anlise de proporcionalidade e razoabilidade,
mas foram percebidas e descritas algumas tendncias. Alm disso, foi
evidenciada a importncia da justificao clara e objetiva da deciso, como
meio de legitim-la.
Acrdos citados: STF: ARE 727542 AgR/RJ; ARE 717894 AgR/SC; RE
634900 AgR/PI; AI 800892 AgR/BA; RE 609184 AgR/RS; AI 781925
AgR/SP; ARE 707292 AgR/DF; RE 630380 ED/MG; MS 28720/DF; MS
28594/DF; MS 28603/DF; MS 25403/DF; MS 25116/DF; RMS 23732/DF;
Pet 3388/RR; MS 24448/DF; ADI 3731 MC/PI; AC 1657 MC/RJ; MS
26264/DF; RE 403205/RS; RE 390939/MA; RMS 24699/DF; MS 24268/MG;
MS 23512/DF; RMS 23657/DF; ADI 2151 MC/MG; ARE 727225 ED/DF; RMS
31044 AgR/ DF; ARE 699911 AgR/RJ; RMS 30455/DF; RE 595553 AgR-
segundo/RS; RE 244158/SP; RE 365368 AgR/SC; RMS 25627/DF; RMS
25039/DF; RE 283620 AgR/RN; RMS 24901/DF; RMS 24557/DF; RE
221966/DF; RE 252352/CE; RE 192568/PI
Palavras-chave: proporcionalidade; razoabilidade; ato administrativo;
controle de atos administrativos; Supremo Tribunal Federal; anlise
jurisprudencial.
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Agradecimentos
Agradeo minha me e ao meu pai, que sempre me apoiaram em
minhas escolhas, permitindo que eu caminhasse por mim mesma, mas
sempre sob a luz de seus ensinamentos e amor incondicional. Estendo essa
gratido a toda a minha famlia, que completa a minha felicidade.
Agradeo Marina, minha orientadora, sempre muito atenciosa e
disposta a gastar horas do fim de semana para me ajudar.
Agradeo coordenao e aos colegas da Escola de Formao da
sbdp, pelo maravilhoso ano de aprendizado e convivncia e por todo o apoio
com relao pesquisa.
Agradeo aos meus amigos, que suportaram todas as minhas
aflies e discusses sobre a monografia, contribuindo bastante e me
fazendo sentir o privilgio de ter companheiros to especiais.
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Lista de abreviaturas
CF Constituio Federal
CNJ Conselho Nacional de Justia
j. - julgado
Min. Ministro ou Ministra
PAD Processo Administrativo Disciplinar
r. relator ou relatora
RE Recurso Extraordinrio
RMS Recurso em Mandado de Segurana
ss. - seguintes
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal de Justia
TCU Tribunal de Contas da Unio
TJ Tribunal de Justia
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Sumrio
I. Introduo ................................................................................... 7
1. Apresentao do tema .................................................................. 7
2. Justificativa e objetivo ................................................................. 12
II. Metodologia ............................................................................... 16
1. Ressalvas terminolgicas .............................................................. 16
2. Problema de pesquisa .................................................................. 17
2.1. Problema central ................................................................... 17
2.2. Perguntas subsidirias ............................................................ 18
2.3. Universo de pesquisa ............................................................. 21
2.4. Modelo de anlise .................................................................. 25
III. Panorama geral ........................................................................ 29
IV. Em que situaes os ministros analisam a proporcionalidade e a
razoabilidade? ................................................................................ 31
1. Casos em que no houve anlise ................................................... 31
2. Casos em que houve anlise ......................................................... 39
V. A proporcionalidade influi diretamente nas decises ou apenas
um argumento lateral? ................................................................... 56
1. Casos em que o argumento central ............................................. 57
2. Casos em que o argumento lateral .............................................. 61
VI. Qual o fundamento legal citado para se analisar a
proporcionalidade ou a razoabilidade do ato? ................................. 64
VII. Qual a estrutura argumentativa das referncias
proporcionalidade? ......................................................................... 68
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1. A proporcionalidade ou razoabilidade como argumentos meramente
retricos ........................................................................................ 69
2. A proporcionalidade relacionada garantia de valores juridicamente
relevantes ...................................................................................... 72
3. A proporcionalidade como verificao da previso em lei da sano,
aps o devido processo administrativo ............................................... 75
4. A proporcionalidade como conformidade entre meios e fins .............. 76
VIII. O STF limita sua possibilidade de reviso dos atos
administrativos no que se refere proporcionalidade? ................... 81
IX. Concluses finais ...................................................................... 86
X. Referncias bibliogrficas ........................................................... 93
ANEXO 1: Lista dos acrdos analisados ............................................... 94
ANEXO 2: Lista dos acrdos excludos .............................................. 100
ANEXO 3: Fichamentos ..................................................................... 118
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I. Introduo1
1. Apresentao do tema
As noes de razoabilidade e de proporcionalidade so muito
recorrentes no Direito e utilizadas em vrios sentidos. Podemos perceber
isso quando se fala, por exemplo, sobre a razoabilidade de uma alegao,
de uma determinada interpretao ou de algum argumento. Assim tambm
acontece com a proporcionalidade, que aparece em diversos contextos,
como na relao entre culpabilidade e pena no Direito Penal; ou no Direito
Tributrio, em relao ao valor da taxa e o servio prestado ou no Direito
Administrativo, entre a finalidade dos atos e suas consequncias. 2
No direito pblico, a razoabilidade e a proporcionalidade so
empregadas, especialmente, para limitar a atuao dos agentes pblicos,
com vistas proteo dos direitos dos cidados. Embora a Constituio
brasileira no traga expressamente a exigncia de proporcionalidade ou
razoabilidade, a maioria dos doutrinadores e da jurisprudncia parece
admitir que ela estaria implcita no texto constitucional, seja tratando-a
como princpio, regra, postulado normativo ou qualquer outra denominao.
Trata-se de uma concepo associada ideia de constitucionalizao
do Direito Administrativo, segundo a qual o conceito de legalidade a que a
Administrao se vincula teria sentido amplo, devido s diretivas
constitucionais. E no apenas quanto s disposies constitucionais
especificamente destinadas Administrao, como o artigo 37, que traz
seus princpios3, mas tambm em relao a todos os princpios trazidos pela
Constituio que vinculariam todos os poderes.
1 Agradeo s sugestes da minha orientadora, Marina Cardoso de Freitas, e do professor Andr Janjcomo Rosilho, expostas na banca examinadora da monografia, realizada em 11/12/2013. Os comentrios foram objeto de reflexo e contriburam com a verso revisada do relatrio. 2 o que sintetiza o professor Humberto vila em: VILA, Humberto Bergmann, Teoria dos Princpios: da definio aplicao dos princpios jurdicos, 2 ed., So Paulo, Malheiros,
2003, pp. 94 e 104. 3 Constituio Federal: Art. 37. A administrao pblica direta e indireta de qualquer dos Poderes da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios obedecer aos princpios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficincia e, tambm, ao seguinte (...)
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o que afirma a professora Maria Sylvia Zanella di Pietro,
explicitando o alargamento do princpio da legalidade como uma das
tendncias atuais do direito administrativo brasileiro e afirmando que a
Administrao no se submete apenas lei em sentido formal, mas ao
Direito.4 E o que se pode encontrar em casos da jurisprudncia brasileira,
como no RMS 24699, em que o Min. Ayres Britto pontua que administrar
seria aplicar o Direito de ofcio, no apenas a lei5.
Alm disso, a viso de constitucionalizao do direito administrativo
tambm trazida por Celso Antnio Bandeira de Mello. Logo no segundo
captulo de seu Curso de Direito Administrativo, o autor traz os princpios
constitucionais do Direito administrativo brasileiro, explicitando seu
contedo e as exigncias que criam.
Apesar de a Constituio no enunciar expressamente as exigncias
de proporcionalidade e razoabilidade, no difcil imaginar que elas sejam
bastante evocadas no Judicirio. Afinal, basta pensar que ningum diria que
um ato estatal pode ser desproporcional ou no razovel. Desse modo,
fcil concordar que proporcionalidade e razoabilidade so importantes
parmetros para tais atos, inclusive permitindo seu controle. Essa
possibilidade foi reforada em 1999, pela Lei n 9.784, que trouxe
expressamente a proporcionalidade e a razoabilidade como princpios da
Administrao.
Entretanto, o que permite a aceitao geral de tais termos
exatamente o que causa a dificuldade na sua utilizao: a generalidade.
Podemos facilmente afirmar que os atos administrativos devem ser
proporcionais e razoveis, porm o consenso no ser atingido to
facilmente se tivermos que afirmar o que so atos proporcionais ou
4 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 25 ed. So Paulo, Atlas, 2012, p. 29. 5 STF: RMS 24699/DF, r. Min. Eros Grau, j. 30/11/2004. Do voto do Min. Britto se extrai, p.
242: "Esse lapidar conceito de Miguel Seabra Fagundes, segundo o qual administrar aplicar a lei de ofcio, talvez esteja a exigir uma atualizao. (...) Esse artigo [37, da
Constituio] tornou o Direito maior do que a lei ao fazer da legalidade apenas um elo, o primeiro elo de uma corrente de juridicidade que ainda incorpora a publicidade, a impessoalidade, a moralidade, a eficincia. (...) Ento, se tivssemos que atualizar o conceito de Seabra Fagundes, adaptando-o nova sistemtica constitucional, diramos o seguinte: administrar aplicar o Direito de ofcio, no s a lei."
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razoveis ou ento decidir sobre a proporcionalidade ou razoabilidade de
um ato especfico.
Para exemplificar, podemos imaginar um concurso pblico em que
haja um erro na contabilizao dos pontos, devido anulao de algumas
questes e, por causa disso, sejam chamados para a segunda fase mais
candidatos do que permitiria o critrio inicial de seleo previsto pelo
edital.6 Enquanto no se descobria o erro, foi amplamente divulgada a lista
de aprovados e eles, provavelmente, continuaram se dedicando aos
estudos, adquirindo livros, frequentando cursos preparatrios, talvez at
tenham deixado seus empregos para melhor se dedicarem.
E, ento, o erro descoberto. O que deve fazer a Administrao,
especialmente considerando que no h previso legal expressa para tais
casos: anular o concurso ou deixar que ele prossiga, embora nem todos os
candidatos aprovados tivessem a nota prevista como mnima?
Naturalmente, a Administrao deve adotar um ato proporcional. Mas qual
seria ele?
Uma pessoa pode acreditar que o mais proporcional seria manter os
candidatos no concurso, argumentando, por exemplo, que foi criada a
expectativa da aprovao por um erro no imputvel a eles. Ao mesmo
tempo, outra pessoa pode defender que o mais proporcional seria no
permitir a aprovao de tais pessoas, j que a expectativa posterior no se
sobreporia regra do edital.
Inicialmente, quem tem a competncia para dizer quais atos
administrativos so proporcionais a prpria Administrao. Os
administradores, respaldados por seu conhecimento tcnico ou por sua
legitimao via eleio, definiro as finalidades a ser perseguidas e, de
acordo com a convenincia e oportunidade, realizaro os atos que
entenderem necessrios, observando a legislao aplicvel. Assim, no
exemplo do concurso, o administrador deve ponderar as opes e suas
consequncias e decidir motivadamente.
6 Trata-se do caso discutido no Mandado de Segurana 28594/DF, r. Min. Crmen Lcia, j. 06/10/2011.
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No entanto, aps uma atuao por parte da Administrao ou
mesmo enquanto ela delibera sobre qual atitude tomar, possvel que o
Judicirio seja chamado a se pronunciar, afinal ele deve controlar a
legalidade da atuao administrativa, alm de sempre lhe ser reservada a
apreciao de ameaas ou leses a direitos.
No tocante ao controle da atuao administrativa, particularmente
importante a Lei n 9.784/1999, que, em seu artigo 2, traz a seguinte
disposio: A Administrao Pblica obedecer, dentre outros, aos
princpios da legalidade, finalidade, motivao, razoabilidade,
proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditrio, segurana
jurdica, interesse pblico e eficincia. Portanto, a razoabilidade e a
proporcionalidade se firmam como critrios de legalidade do ato, como mais
uma tentativa de limitao Administrao, permitindo o controle
jurisdicional.7
Assim, haver um rgo jurisdicional legitimado para controlar o ato
administrativo, que poder, para tanto, valer-se das exigncias de
proporcionalidade ou razoabilidade. Dessa forma, no exemplo do concurso,
poder o magistrado manter ou no a escolha administrativa, isto , manter
ou no os candidatos concorrendo, de forma que sua deciso tem grandes
impactos para os envolvidos.
No entanto, tratando-se de exigncias to genricas, de que forma
tal anlise ser realizada? Quais fatores so considerados pelo magistrado?
Quais os fundamentos legais e constitucionais invocados? Qual o tipo de
argumentao empregada? investigao desses questionamentos que se
prope a presente pesquisa.
Nesse contexto de discusses acerca da razoabilidade e da
proporcionalidade dos atos administrativos, a pesquisa procurou mostrar
como o STF tem lidado com o tema em suas decises. E, assim, analisar se
essas exigncias tm mesmo sido utilizadas, na prtica, como controle dos
7 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, idem nota 3, p. 80.
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atos administrativos e quais os limites que o prprio tribunal impe sua
atuao nesse mbito e, consequentemente, atuao da Administrao.
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2. Justificativa e objetivo
Percebendo a existncia dessas discusses acerca da
proporcionalidade e da razoabilidade, cada vez mais presentes na doutrina e
na jurisprudncia, o tema me chamou a ateno, especialmente em relao
ao controle judicial dos atos administrativos, tambm campo de vrias
discusses. Assim, pareceu interessante e importante compreender como o
STF, como corte constitucional e ltima instncia recursal, vem controlando
os atos administrativos quanto sua razoabilidade e proporcionalidade, que
so to amplos e permitem diversas argumentaes. 8
Na leitura de vrios julgados, realizada ao longo de todo o perodo
da faculdade, percebi que os magistrados decidem sobre a
proporcionalidade e a razoabilidade das mais variadas formas. Com a
inteno de compreender melhor como tais argumentos so desenvolvidos
na prtica para o controle dos atos administrativos pelo STF, me dediquei
presente pesquisa.
Nessas leituras de casos esparsos e de variados temas, percebia
que, em algumas vezes, os ministros apenas invocavam os princpios e
concluam ser proporcional ou no. Em outros casos, tentavam esmiuar o
que seria o contedo desse princpio ou o que ele exigiria do ato e, assim,
concluam pela razoabilidade ou no. Mesmo quando havia o esforo de
maior exposio do raciocnio, a impresso de que, ao fim, a deciso no
decorria do que estava ali exposto e, sim, talvez, de um bom senso.
Naturalmente, no podemos exigir que os ministros realizem um
exerccio plenamente objetivo de subsuno do fato norma, como se
mquinas fossem ou, ento, como simples boca da lei. Tambm no me
parece adequado exigir que os ministros se vinculem sempre a um mtodo
pr-definido de decidir, embora mtodos possam tornar suas decises mais
inteligveis. A prpria natureza genrica da exigncia de proporcionalidade
permite a variabilidade das decises, conferindo ao julgador certa liberdade
8 A partir daqui, utilizarei os dois termos, razoabilidade e proporcionalidade, como sinnimos. A razo para tal uso est exposta no item Ressalvas terminolgicas, no captulo dedicado Metodologia.
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de conformao da exigncia com o fato sob julgamento, o que no
necessariamente um problema.
Porm, preocupante a possibilidade de as decises judiciais no
serem claras, isto , no exporem os pressupostos e o raciocnio lgico
desenvolvido para concluir acerca da proporcionalidade. O problema que
isso dificulta o entendimento das decises, o controle de sua legitimidade e
no oferece previsibilidade, porque no possvel identificar a razo da
deciso, que poderia ser aplicada em outros casos. Nesse sentido, que
hoje se pode ver, em geral, a proporcionalidade como um argumento-
curinga, frequentemente empregado pelos julgadores em suas decises e
suscitado por todas as partes.
Considerando essas questes quanto ao emprego da
proporcionalidade, pareceu-me relevante estudar como o STF vem
conformando esta ideia, afinal trata-se da corte constitucional e ltima
instncia das discusses judiciais, que vem ganhando muito relevo nos
ltimos anos.9 Assim, foi possvel compreender um pouco mais sobre o
exerccio jurisdicional no tocante a essa matria to debatida pela doutrina
e to empregada pelos operadores do Direito.
Quanto ao recorte material da pesquisa, a atuao administrativa
pareceu muito adequada, exatamente pela relevncia da Administrao
Pblica e das discusses acerca do controle judicial de seus atos. Como foi
exposto acima, esse controle levanta questionamentos, especialmente
quando envolve conceitos abertos, como a proporcionalidade e a
razoabilidade. Desse modo, compreender as decises do STF nesse mbito
relevante, a fim de tentar entender que sentido vem sendo dado a temas
to presentes nos debates jurdicos.
Valendo-me de uma explicao introdutria, da professora Maria
Sylvia di Pietro, ressalto que considerei a Administrao, para os fins deste
9 Sobre a posio de destaque do STF nos ltimos anos, ver: VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremocracia, in Revista Direito GV 8 O futuro da Constituio de 1988: perspectivas para os prximos 20 anos. So Paulo, julho-dezembro 2008, pgs. 441 a 463. Disponvel em < http://www.direitogv.com.br/subportais/publica%c3%a7%c3%b5e/RD-08_6_441_464_Supremocracia_Oscar%20Vilhena%20Vieira.pdf >.
http://www.direitogv.com.br/subportais/publica%c3%a7%c3%b5e/RD-08_6_441_464_Supremocracia_Oscar%20Vilhena%20Vieira.pdfhttp://www.direitogv.com.br/subportais/publica%c3%a7%c3%b5e/RD-08_6_441_464_Supremocracia_Oscar%20Vilhena%20Vieira.pdf
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trabalho, como aquilo que a professora chama de Administrao Pblica em
sentido objetivo. Isto , busquei os casos do STF que tratam das atividades
exercidas pelas pessoas jurdicas, rgos e agentes incumbidos de atender
concretamente s necessidades coletivas (...).10 Destaco ainda que tal
atividade, atribuda preferencialmente ao Executivo, tambm exercida por
rgos de outros poderes, embora no seja sua funo primordial. Tais atos
tambm foram estudados neste trabalho.
Tais funes administrativas so reguladas por diversas leis, dentre
elas a Lei n 9.784/1999, que regula os processos administrativos federais.
No artigo 2 dessa lei, a proporcionalidade e a razoabilidade, alm de outros
critrios, so trazidas como parmetros para a atuao administrativa.
Assim, os administradores esto expressamente sujeitos a tais parmetros
e, em caso de descumprimento, podem ter seu ato reformado pelo
Judicirio, j que a proporcionalidade e a razoabilidade passaram a ser
balizas da prpria legalidade do ato.
Portanto, considerei importante compreender melhor como o STF
tem analisado a atuao da Administrao, frente relevncia, diversidade
e quantidade das funes que exerce na sociedade. E tambm frente s
consequncias prticas que a reviso jurisdicional desses atos pode ter,
como a anulao de concursos pblicos, revogao de aposentadorias,
anulao de sanes administrativas, de demisses, etc.
Ademais, importante compreender melhor em que medida o
Judicirio vem interferindo na anlise de mrito do ato administrativo, antes
tido como totalmente discricionrio e no passvel de controle judicial. Essa
questo relaciona-se com a prpria ideia da separao de poderes, j que o
Judicirio pode acabar controlando a noo de convenincia e de
oportunidade do administrador.
Alm da relevncia acadmica do tema, a pesquisa pode trazer
resultados relevantes tambm para os atores envolvidos nesse ambiente.
medida que o Judicirio exige que o administrador seja proporcional e
10 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, ibidem nota 3, p. 55.
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razovel, podendo rever seus atos, preciso que ele tenha parmetros para
conformar a sua atuao. Assim como para os advogados que atuam na
rea do Direito Administrativo, interessante entender quando e como o
STF utiliza esses argumentos. Bem como os demais atores que se
relacionam com a Administrao, os administrados e os servidores pblicos,
devem compreender quais limites vm sendo traados nesse campo.
Em suma, o objetivo da pesquisa foi analisar como o STF emprega a
proporcionalidade ou razoabilidade no controle de atos administrativos.
Assim, busquei identificar nos casos concretos levados ao STF como tem
sido feita pelo Tribunal a reviso dos atos administrativos a partir das
exigncias de proporcionalidade e razoabilidade. Busquei, ainda, verificar
como os ministros expem suas razes de decidir, de modo que seja
possvel acompanhar o raciocnio que levou deciso, o que lhe conferiria
maior legitimidade. A partir de tal anlise, este trabalho tentou avaliar e, de
algum modo, sistematizar como o STF tem dado contedo s exigncias de
razoabilidade e proporcionalidade dos atos administrativos.
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II. Metodologia
1. Ressalvas terminolgicas
Neste momento, cabe tecer algumas breves consideraes acerca
dos termos envolvidos na monografia, especialmente considerando-se as
diversas teorias que norteiam o pensamento jurdico acerca de princpios e
regras e em relao proporcionalidade e razoabilidade.
Com frequncia, as ideias de proporcionalidade e razoabilidade vm
enunciadas nos votos dos ministros como princpios ou ento como regras.
No que diz respeito dicotomia princpios e regras, muito se tem escrito
e ressalvo que a presente pesquisa no tratou desta diferenciao.11 A
anlise recaiu sobre a jurisprudncia do STF e os termos foram abordados
da forma como os ministros os utilizaram, pois no pretendi verificar a
aplicao de uma ou outra teoria que, a despeito de seu valor acadmico,
no so vinculantes para os operadores do Direito.
O objetivo da pesquisa foi compreender e mapear a aplicao dessa
exigncia, desse parmetro de controle, independentemente do termo
utilizado para sua referncia. Assim, utilizei princpio ou regra como
sinnimos, alm de falar em outros termos como exigncia, critrio,
parmetro, apenas com a finalidade de me referir s prescries de
proporcionalidade e razoabilidade, sem distino na terminologia. Essa
escolha no parece ser problemtica, porque os prprios ministros, em
geral, no possuem um padro no uso dos termos. Tal ponto poderia,
inclusive, ser pesquisado futuramente e analisado com maior detalhe,
porm a presente pesquisa no teve como finalidade estudar tal tipo de
classificao.
A denominao dada no voto para a proporcionalidade ou
razoabilidade s foi ressaltada quando os prprios votos lhe dedicaram
ateno, e apenas por fidelidade, j que no se trata do foco da anlise. o
11 Sobre a distino, por exemplo, ver o artigo do professor Virglio Afonso da Silva (Princpios e regras: mitos e equvocos acerca de uma distino. Revista Latino-Americana de Estudos Constitucionais, v. 1, p. 607-630, 2003) ou a obra acima de Humberto vila citada na nota 1.
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que ressaltei, por exemplo, no RMS 24.699, em que o relator Ministro Eros
Grau destaca que proporcionalidade e razoabilidade no seriam princpios e,
sim, critrios de aplicao do direito.12
Com relao aos termos proporcionalidade e razoabilidade,
tambm cabe um esclarecimento. A doutrina trabalha muito com tais ideias,
por exemplo, ora procurando diferenci-las13 ou, ento, associando-as.
Sem desconsiderar a existncia de tais discusses, inclusive relevantes para
se compreender a origem dos termos e diferentes mtodos de aplic-los,
esclareo que diferenci-los no foi o foco da pesquisa. Aqui, procurei
entender como o STF controla os atos administrativos quando se refere a
essas exigncias chamadas de proporcionalidade ou de razoabilidade.
Por isso, utilizei proporcionalidade ou razoabilidade como
sinnimos, pois os prprios ministros parecem utilizar os termos
indistintamente e, frequentemente, em conjunto, buscando se referir ao
mesmo tipo de exigncia relacionada atuao da Administrao Pblica.
2. Problema de pesquisa
2.1. Problema central
O problema central da pesquisa como o STF controla a
proporcionalidade e a razoabilidade dos atos administrativos?.
Partindo desta pergunta central, procurei traar um panorama sobre
o controle dos atos administrativos no STF em relao proporcionalidade e
razoabilidade, a partir da leitura de acrdos que tratam do tema.
Minha hiptese para essa pergunta central era a de que a
proporcionalidade trabalhada pelos ministros de forma diferente, de
acordo com o caso em anlise. Acreditava que, em alguns casos, a
12 STF: RMS 24699/DF, r. Min. Eros Grau, j. 30/11/2004, p.232: Nesse sentido, o Poder
Judicirio vai anlise do mrito do ato administrativo, inclusive fazendo atuar as pautas da proporcionalidade e da razoabilidade, que no so princpios, mas sim critrios de aplicao do direito, ponderados no momento das normas de deciso. (...) 13 SILVA, Virglio Afonso da. O proporcional e o razovel. Revista dos Tribunais (So Paulo. Impresso), v. 798, p. 23-50, 2002.
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proporcionalidade era apenas citada, sem que fosse desenvolvida uma
argumentao em torno de tal requisito. Em outros casos, seria possvel
que os ministros buscassem algum mtodo de anlise da razoabilidade do
ato administrativo em questo, talvez at mesmo em referncia Lei de
Processo Administrativo que, em seu artigo 2, pargrafo nico, impe o
critrio de adequao entre meios e fins, muito citado pela doutrina como
uma baliza da atuao administrativa.
A hiptese de que a anlise variaria conforme o caso decorreu da
prpria leitura inicial de alguns acrdos do STF, em que j havia podido
notar as diferentes formas de empregar as ideias. Alm disso, a hiptese foi
formada pela prpria ideia de a razoabilidade ser uma noo abstrata, um
princpio, um enunciado genrico o que, naturalmente, possibilita sua
adaptabilidade a cada caso. Ressaltando que tal adaptabilidade no um
problema, pelo contrrio, , por vezes, necessria, desde que o julgador
cumpra o nus de explicitar as razes de sua deciso e por que ela se
assemelha ou difere de casos anteriores.
Assim, observando as decises que procurei identificar a forma de
utilizao desses parmetros de controle e se possvel compreender as
razes de decidir envolvidas.
2.2. Perguntas subsidirias
Para possibilitar traar um quadro de como o STF controla os atos
administrativos segundo a proporcionalidade ou razoabilidade, elaborei
algumas perguntas a serem respondidas com a anlise dos acrdos.
Assim, elas forneceram subsdios para tentar responder pergunta central.
Essas questes foram fundamentais para a elaborao do modelo de anlise
dos acrdos, que ser apresentado mais frente.
As perguntas e suas respectivas hipteses eram as seguintes:
A) Os ministros realizaram expressamente um juzo de
proporcionalidade?
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Aplicando esta pergunta a cada caso, a inteno era descobrir to
somente se os ministros afirmaram expressamente que o ato discutido era
proporcional/desproporcional ou razovel/no razovel, argumentando de
qualquer forma ou mesmo apenas afirmando. Essa pergunta se justifica
porque, em alguns casos, embora questionada a proporcionalidade do ato,
os ministros no a analisam, resolvendo o caso por outros argumentos.
A hiptese era de que, em alguns casos, os ministros referem-se
proporcionalidade, porm julgam que no devem analis-la; ou ento se
referem a ela, mas decidem com base em algum outro elemento do caso; e
haveria tambm aqueles casos em que realmente se faz um juzo de
proporcionalidade, ou seja, aqueles em que se diz se o ato ou no
proporcional (independentemente da argumentao em que se baseie tal
juzo).
Tal hiptese, como se ver ao longo do relatrio, foi confirmada,
porque as formas de deciso acerca da proporcionalidade so mesmo
variadas. E, alm da hiptese, foi possvel identificar algumas tendncias de
argumentao dentre aqueles casos em que se realiza mesmo o juzo de
proporcionalidade.
Com base nessas informaes, tentei realizar alguma sistematizao
das decises, conforme fosse possvel observar algum padro quanto ao
juzo de proporcionalidade. Analisei, por exemplo, se seria possvel
relacionar a realizao ou no de juzo de proporcionalidade a algum
aspecto comum das decises, o que levou a certa sistematizao por temas,
embora limitada, j que os casos estudados eram bastante diversos entre si
e compunham um universo relativamente pequeno de decises.
B) Nos casos em que o STF analisa a proporcionalidade, essa
proporcionalidade influi diretamente na deciso ou apenas um argumento
lateral?
A hiptese, informada pela leitura de alguns acrdos, era de que,
na maioria das vezes, a proporcionalidade aparece como argumento lateral,
-
20
subsidirio. Como se poder ver mais frente, essa ideia no foi
confirmada, porque, na maioria dos casos, a proporcionalidade foi relevante
para a deciso, embora apenas em poucos casos tenha sido o nico
argumento a fundamentar o voto.
C) Que fundamento os ministros do para a exigncia de
proporcionalidade na atuao administrativa? Eles citam o artigo 2 da Lei
9.784?
Pelos casos j conhecidos, a hiptese era de que os ministros no
enunciam nenhum fundamento jurdico para a exigncia de atuao
proporcional. Essa hiptese foi, em parte, confirmada, j que, na grande
maioria dos casos, realmente no citado o fundamento que permitiria o
controle da proporcionalidade. Por outro lado, alguns casos trouxeram
referncias que podem ser consideradas o fundamento para tal controle
judicial.
D) Qual a estrutura argumentativa das referncias
proporcionalidade? So criados parmetros, critrios? Se sim, os critrios
so seguidos ao longo da deciso?
Com a leitura dos primeiros acrdos, foi possvel identificar alguns
padres de referncia: (i) apenas se afirma a conformidade com o princpio;
(ii) afirma-se a conformidade com o princpio pela existncia do devido
processo administrativo; (iii) afirma-se a conformidade pela aplicao da
previso legal (no caso de sanes).
A hiptese ento era de que no h parmetros; as decises seriam,
em geral, genricas e referir-se-iam apenas subsidiariamente
proporcionalidade. Isso foi parcialmente confirmado, porque muitas
decises so, sim, genricas, mas foi possvel sistematiz-las de algum
modo, como se ver adiante.
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21
E) O STF limita sua possibilidade de reviso dos atos administrativos
no tocante proporcionalidade?
A hiptese para essa pergunta era de que o STF enuncia alguns
limites para a sua atuao, procurando respeitar as decises
administrativas, mas que nem sempre esses limites so muito claros. Aps
a coleta dos dados, a hiptese confirmou-se de certa forma, como descrevo
mais frente, em captulo prprio. O STF procura afirmar que h limites
para sua cognio, mas h dificuldade em defini-los objetivamente e, por
vezes, no h concordncia entre os prprios ministros sobre qual deciso
seria de sua competncia ou no.
2.3. Universo de pesquisa
O material utilizado para a pesquisa foram os julgados encontrados
no site do STF, pelo mecanismo de busca de jurisprudncia. A ideia foi
trabalhar com aqueles casos em que se invoca a ideia de proporcionalidade
ou de razoabilidade para aferir a validade dos atos administrativos. Isso
incluiu os casos em que a proporcionalidade suscitada pelo demandante e
foi, ou no, analisada pelos ministros, alm dos casos em que os prprios
ministros trazem tal tipo de argumento.
Com esse intuito, iniciei as buscas pelos julgados com a utilizao
do mecanismo de pesquisa livre de jurisprudncia do site14. Aqui, cabe
ressaltar que o universo de pesquisa sofre restries pelas prprias
informaes que so disponibilizadas no site, j que nem todos os acrdos
produzidos so disponibilizados, alm da limitao temporal, pois as
decises antigas vo sendo digitalizadas e disponibilizadas aos poucos.
Apesar dessas limitaes, os acrdos encontrados me parecem adequados
para a anlise proposta, fornecendo decises variadas e concernentes a
vrios tipos de atos administrativos.
14 http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp
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22
Quanto ao tipo de deciso, cabe ressaltar que optei por analisar
apenas os acrdos, deixando de lado outros documentos trazidos pela
pesquisa livre do site questes de ordem, decises monocrticas e da
presidncia e informativos do site do STF. A escolha pelos acrdos
combina dois fatores. Primeiro, neles que se tem mais chance de haver
discusses e divergncias sobre os pontos, ressaltando questes
interessantes, j que as outras decises cabem em casos mais especficos e
restritos15.
Segundo, tambm influiu em tal restrio o curto tempo disponvel
para a realizao da pesquisa, j que, em regra, os acrdos podem ser
mais produtivos para a pesquisa, mas isso no impede que uma nova
pesquisa se dedique a verificar o que se tem feito nos outros tipos de
deciso, de modo a se complementar a anlise do universo de decises
proferidas pelo STF. A escolha pelos acrdos, naturalmente, impe um
limite s concluses da pesquisa, que no tem a pretenso de esgotar a
jurisprudncia do STF sobre o tema.
Uma primeira busca foi realizada com a seguinte palavra-chave:
(princpio$ ou regra$) adj2 (proporcionalidade ou razoabilidade) e
administra$16. A denominao princpio ou regra foi inserida porque,
naquele momento, eu imaginava ser relevante que houvesse tal referncia,
15 O Regimento interno do STF traz, em seu artigo 21, 1 e 2, as hipteses de decises
monocrticas: (...) 1 Poder o(a) Relator(a) negar seguimento a pedido ou recurso manifestamente inadmissvel, improcedente ou contrrio jurisprudncia dominante ou a Smula do Tribunal, deles no conhecer em caso de incompetncia manifesta, encaminhando os autos ao rgo que repute competente, bem como cassar ou reformar, liminarmente, acrdo contrrio orientao firmada nos termos do art. 543-B do Cdigo de Processo Civil. 2 Poder ainda o Relator, em caso de manifesta divergncia com a Smula, prover, desde logo, o recurso extraordinrio. 16 A palavra-chave foi montada considerando as seguintes caractersticas da busca no site: (i) O operador $ substitui qualquer parte da palavra, assim possvel encontrar os casos em que haja referncia no plural ou no singular (ex: regras ou regra) ou diferentes sufixos (ex: administrao, administrativo). (ii) O operador adj busca palavras adjacentes, com a distncia indicada pelo nmero. No
caso, adj2 permite encontrar os casos em que haja expresses como princpio da proporcionalidade ou regra de proporcionalidade, independentemente da palavra que venha
entre os termos-chave. (iii) O operador ou traz os casos que contenham um dos dois termos indicados ou os dois. E os parnteses permitem a combinao destes pares de termos com outros termos de busca. Assim, sero encontrados casos que contenham (i) uma referncia a princpio ou regra, (ii) referncia proporcionalidade ou razoabilidade e (iii) alguma relao com a Administrao.
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23
mas depois conclu que era desnecessrio utilizar tais termos para o alcance
do fim a que se prope esta pesquisa.
Considerei que seria mais produtivo se o universo de casos no se
limitasse queles em que os ministros enunciam necessariamente a
proporcionalidade como regra ou princpio. Isso porque no importa se eles
afirmam existir uma regra, um princpio, um postulado, uma exigncia ou
se, simplesmente, dizem que proporcional ou desproporcional. Se existe
algum tipo de exame de proporcionalidade ou razoabilidade, trata-se da
hiptese de reviso judicial que quis estudar e compreender melhor,
independentemente da forma com que seja enunciada. Inclusive, com o
estudo dos casos, foi possvel perceber que, em geral, os prprios ministros
no usam os termos com muito rigor, referindo-se a eles de diversas
formas.
Por isso, realizei uma segunda busca com a palavra-chave: ato$
adj administrativo$ e (proporcional$ ou razoa$). Nesta palavra-chave, usei
ato$ administrativo$ ao invs de administra$, porque mais adequada a
filtrar o foco da pesquisa apenas nos atos administrativos e a trazer os
casos que tratam das ideias de proporcionalidade/razoabilidade ou com as
palavras proporcional ou razovel, sem a restrio de se referir a princpio
ou regra.
Realizando tal pesquisa no dia 23/08/2013, foram encontrados 74
acrdos. Com a leitura das ementas e, eventualmente, do inteiro teor (j
que algumas ementas no ofereciam informaes suficientes), separei os 26
casos realmente pertinentes pesquisa17. Tais casos podem ser
encontrados listados com seus respectivos temas na tabela do Anexo 1, ao
fim da monografia.
Alm desses casos, outros, embora contivessem as palavras de
busca, no eram pertinentes, por diversos motivos, como porque tratavam
de controle de legislao ou ento da atividade judiciria ou mesmo porque
17 Os casos separados como pertinentes so aqueles em que se questiona ou se analisa a proporcionalidade ou a razoabilidade de atos administrativos, tanto gerais e abstratos, quanto individuais e concretos.
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24
a palavra-chave vinha apenas em algum livro da bibliografia indicada na
indexao do site. Esses casos tambm se encontram listados ao fim da
monografia, no Anexo 2, com seus respectivos motivos de excluso do
universo.
Embora a primeira palavra-chave de busca no fosse a mais
adequada, porque exigia que se falasse em princpio ou regra, alguns casos
trazidos por ela no constavam na segunda busca. Assim, foram tambm
includos na anlise para fornecer mais subsdios pesquisa.
Com a primeira palavra-chave, pesquisada no dia 28 de junho de
2013, foram encontrados 173 acrdos, dos quais apenas 26 casos se
mostraram pertinentes, diante do recorte estabelecido para a pesquisa.
Destes 26, 11 se repetiram na outra forma de busca. Portanto, foram
acrescentados 15 acrdos provenientes de tal busca. As tabelas referentes
aos acrdos includos e excludos tambm se encontram ao fim da
monografia, respectivamente nos Anexos 1 e 2.
Assim, o universo final da pesquisa foi composto por 41 acrdos
em que o STF tratava da proporcionalidade e razoabilidade de atos
administrativos. Trata-se de um nmero reduzido, frente expectativa da
quantidade de vezes em que o STF enfrentaria tais questes. Isso pode se
dever excluso das decises monocrticas e escolha das palavras-
chave, que, embora bem genricas, podem ter excludo casos em que o
tema foi tratado, porm com outras palavras, o que os colocaria fora do
alcance da pesquisa.
Ademais, importante ressaltar que a pesquisa tratou de atos
administrativos em sentido amplo, no se restringindo apenas queles
individuais e concretos, embora estes at sejam a maioria, mas tambm
incluindo atos gerais e abstratos18.
Alm disso, a pesquisa tambm no adotou a concepo restrita de
Administrao em relao aos rgos emissores de tais atos, considerando
18 Como a portaria emitida pelo Secretrio de Segurana Pblica do Piau, na ADI 3731 MC (STF: ADI 3731 MC/PI, r. Min. Cezar Peluso, j. 29/08/2007).
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25
no apenas aqueles que exercem precipuamente atividades administrativas,
mas tambm atos de outros rgos que, embora tenham outras funes
principais, tambm realizam atividades administrativas19.
A concepo mais ampla pareceu adequada porque abrange a
reviso de todos aqueles atos que expressem uma atuao administrativa
reservada a algum rgo e passvel de controle jurisdicional quanto sua
proporcionalidade ou razoabilidade. Assim, interessante para a pesquisa
entender como o STF atua em todos esses casos.
2.4. Modelo de anlise
Para a sistematizao dos dados dos acrdos, montei um modelo
de anlise com perguntas simples, para serem respondidas objetivamente e
facilitarem a posterior verificao dos dados obtidos.
Nesse modelo, foram includos a identificao do acrdo e das
partes, a classificao temtica, um breve relato do caso e as questes
relativas proporcionalidade. Para a formulao dessas questes, pensei
nas perguntas subsidirias que norteiam o trabalho e tambm nas prprias
informaes que os acrdos ofereciam, de acordo com os tipos de
argumentao notados.
Assim, foram elaboradas fichas referentes a todos os acrdos, de
acordo com o modelo abaixo. Na primeira coluna esto os tpicos de anlise
e, na segunda, a forma das respostas a ser inseridas.
1. Identificao do acrdo
Nmero do acrdo na pesquisa (1 a 41)
1.1. Dados gerais Nmero do acrdo, relatoria, rgo julgador e data de julgamento
19 o caso, por exemplo, dos atos referentes a concurso pblico do Tribunal de Justia do Piau, questionado em sede do RE 192568/PI (STF: RE 192568/PI, r. Min. Marco Aurlio, j. 23/04/1996.
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26
1.2. Partes Nomes das partes (importante para saber em quais polos se encontram
Administrao e particulares)
2. Contedo do acrdo
2.1. Tema geral Demisso, sano, concurso pblico etc.
2.2. Resumo Breve relato do caso e da deciso.
2.3. Julgamento No conhecido, procedente/concedido/provido,
improcedente/no concedido/desprovido.
3. Onde aparece proporcionalidade ou
razoabilidade?
Votos vencedores ou vencidos/relator/ questionamento do requerente/acrdo
recorrido etc.
4. analisada? Sim/no (segundo a perspectiva dos ministros)
5. Se no, por qu? Ausncia de pr-questionamento/ necessidade de rever provas etc.
6. Se sim, como?
6.1. Importncia do
argumento
Central ( o que determina a deciso ou
relevante junto com algum outro argumento) lateral (subsidirio, pouco tratado, apenas como reforo).
6.2. Fundamento para a exigncia
No cita o fundamento/ lei/ doutrina etc.
6.3. Estrutura argumentativa das
referncias
Apenas afirma a conformidade/conformidade porque
houve processo administrativo etc.
7. O ato administrativo
foi reformado?
Sim/no. Em instncias inferiores/ no
STF.
8. Observaes Citaes interessantes, observaes pessoais.
Neste momento, cabem breves consideraes sobre alguns tpicos
do modelo, para melhor compreenso dos dados que aparecem nos
fichamentos completos, ao fim da monografia (Anexo 3).
O tpico 2.1 traz o tema geral do acrdo, que foi classificado
conforme as matrias de que tratavam os casos, como demisso, concurso
pblico ou concesso de aposentadoria.
A questo 3 traz a indicao de onde aparecem as referncias
proporcionalidade ou razoabilidade, podendo ser em votos de ministros
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27
especficos (o relator ou outro ministro que discorde ou acrescente algum
fundamento) e, quando a votao no unnime, ressaltando-se se o voto
ficou entre os vencidos ou vencedores.
Alm disso, indiquei se a proporcionalidade aparece no
questionamento do demandante e tambm se vista no acrdo recorrido,
porm apenas com as informaes do acrdo analisado. Isto significa que
os termos de proporcionalidade podem ter sido questionados ou decididos
por outro rgo, mas sem que isso tenha ficado consignado no acrdo do
STF, portanto no aparecer no fichamento.
A pergunta 4 esclarece se o STF analisou a proporcionalidade ou
no. Entre os acrdos pesquisados, h casos em que se questiona se o ato
proporcional, porm o tribunal afirma que no far tal anlise, enquanto
que, em outros casos, ele analisa.
Ressalte-se que a resposta deste tpico dada exclusivamente com
base no que os ministros expem. Ento, se o voto afirma que no
analisar a proporcionalidade ou simplesmente no menciona tal ponto
questionado, a resposta pergunta 4 no; e se ele faz qualquer tipo de
afirmao sobre o ato ser proporcional ou desproporcional, a resposta
sim. A pergunta 5 elenca os motivos pelos quais o STF no analisa a
razoabilidade, embora ela aparea no caso.
J o tpico 6 trata dos casos em que ela analisada, por meio de
trs outras perguntas. No ponto 6.1, registrei se o argumento era central ao
voto, ou seja, se ele determinava diretamente a deciso, ou mesmo se era
complementar, posto que trabalhado junto a algum outro fundamento; ou
ento se era lateral, pouco trabalhado, no sendo relevante para a deciso,
porque j havia outros argumentos que a determinavam.
No tpico 6.2 registrei os fundamentos jurdicos dados pelos
ministros quanto exigncia de proporcionalidade ou de razoabilidade, a
fim de sistematizar a que se recorre para afirmar a possibilidade do controle
dos atos administrativos sob tais aspectos.
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28
No tpico 6.7 procurei descrever o modo como os ministros se
referiram s exigncias estudadas, buscando compreender sua razo de
decidir, quais os elementos considerados e qual a forma de exposio de tal
raciocnio.
Ao fim, anotei no tpico 7 se o ato administrativo havia sido
reformado. Aqui inclu tambm a reforma por outros rgos jurisdicionais,
apesar de o foco da pesquisa ser o STF, apenas para registrar se, ao fim, o
ato administrativo subsistiu ou foi reformado. E, no ltimo campo do
fichamento, anotei observaes gerais, como trechos dos votos e indicaes
de anlise e comparaes.
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29
III. Panorama geral
O universo de pesquisa foi composto por 41 acrdos, referentes ao
controle de diversos atos administrativos e tambm diversos tipos de ao
por meio das quais as questes chegam ao STF.
Com relao aos temas encontrados, h casos que tratam de
exonerao e demisso de servidores pblicos, discutindo se tais
punies haviam sido proporcionais. Tambm em relao aos servidores, h
casos de controle de critrios para promoo na carreira, criao de
cargos em comisso, concesso e cassao de aposentadorias, alm
de um caso referente fixao de penso e alguns casos diversos
referentes a concursos pblicos.
Em matria tributria, h casos referentes razoabilidade de
multas, de sano tributria (no renovao de registro da empresa20) e
de uma negativa de concesso de benefcio tributrio.
Ainda, h casos de atos variados, como um referente proteo e
defesa do consumidor, outro de demarcao de terra indgena e um
terceiro de exerccio do poder de polcia. Ademais, h cinco casos de
anulao de aposentadoria ou penso pelo TCU21.
Como j referido anteriormente, no Anexo 1 encontram-se listados
todos os casos com sua completa identificao e referncia ao tema,
conforme a classificao acima.
Expostos os temas dos atos administrativos controlados pelo STF e
presentes na pesquisa, cabe ressaltar quais tipos de aes foram
analisadas.
20 Nesse caso (STF: AC 1657 MC/RJ, r. Min. Joaquim Barbosa, r. para acrdo Min. Cezar Peluso, j. 27/06/2007), registre-se que o Min. Eros Grau discorda dos outros ministros, afirmando que a no renovao do registro no seria uma sano, mas mera decorrncia da falta de uma exigncia para o funcionamento da empresa. 21 Tais casos do Tribunal de Contas da Unio (TCU) referem-se a atos em que ele exerce o
controle externo a rgos administrativos que concedem penses e aposentadorias. Trata-se de uma srie de casos, que foram considerados na pesquisa, j que os prprios ministros
afirmam que tais atos possuem natureza administrativa e, ao longo do tempo, vo construindo um entendimento sobre o prazo razovel para que tal ato seja realizado, de modo a chegar, no MS 24448/DF, na interessante concluso sobre uma espcie de tempo mdio que resuma em si, objetivamente, o desejado critrio da razoabilidade (STF: MS 24448/DF, r. Min. Ayres Britto, j. 27/09/2007, p.160).
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30
Com relao s aes de competncia originria do STF, foram
estudados: nove mandados de segurana, seis recursos extraordinrios e
uma petio22.
J com relao aos recursos, h diversos agravos regimentais, cujas
decises so, em geral, simples, apenas confirmando a anterior23, bem
como oito recursos em mandado de segurana.
Por fim, com relao s cautelares, foram estudadas duas medidas
cautelares em ao direta de inconstitucionalidade e uma em ao cautelar.
Portanto, somam-se os quarenta e um casos estudados. A partir do
prximo captulo, comeo a expor as concluses da pesquisa, organizadas
em tpicos destinados a responder s principais questes levantadas.
Primeiro h a exposio das situaes em que os ministros no analisaram
a proporcionalidade e daquelas em que analisaram. Logo aps, descrevo a
importncia dos argumentos de proporcionalidade e razoabilidade dentro de
cada deciso.
No tpico seguinte, procurei relacionar os fundamentos jurdicos
encontrados nos votos para a anlise de razoabilidade. Depois, expus a
estrutura argumentativa dessas referncias, procurando entender a razo
de decidir presente nos variados casos. Ao fim de tais relatos, expus como o
STF conformou sua atividade nos casos, em relao aos limites de sua
cognio frente s competncias administrativas. Depois de colhidas tais
informaes, busquei, no ltimo captulo, trazer concluses gerais acerca do
controle realizado pelo STF sobre a proporcionalidade e a razoabilidade dos
atos administrativos.
22 A petio refere-se classificao dada pelo STF para a ao popular de impugnao da demarcao da reserva indgena Raposa Serra do Sol, segundo o artigo 56 do Regimento Interno do STF: Art. 56. O Presidente resolver, mediante instruo normativa, as dvidas que se suscitarem na classificao dos feitos, observando-se as seguintes normas: (...) IX os expedientes que no tenham classificao especfica nem que sejam acessrios ou
incidentes sero includos na classe Petio, se contiverem requerimento, ou na classe Comunicao, em qualquer outro caso; 23 Foram estudados: quatro agravos regimentais no recurso extraordinrio com agravo, cinco agravos regimentais no recurso extraordinrio, dois agravos regimentais no agravo de instrumento, um agravo regimental no recurso ordinrio em mandado de segurana, alm de um embargo de declarao no recurso extraordinrio com agravo e um embargo de declarao no recurso extraordinrio (ambos recebidos como agravos regimentais).
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31
IV. Em que situaes os ministros analisam a
proporcionalidade e a razoabilidade?
Como visto, a pesquisa dedicou-se ao estudo de quarenta e um
casos. Deste total, houve anlise da proporcionalidade ou razoabilidade em
25 casos, sendo que nos outros 16 a questo era levantada, porm no
analisada.
Neste tpico, exponho primeiro os casos em que no houve anlise
e os respectivos motivos para tanto. Posteriormente, relato em quais casos
se analisou a proporcionalidade dos atos administrativos discutidos, a fim
de que se tenha um panorama de como os ministros articulam esses dois
aspectos no controle dos atos.
1. Casos em que no houve anlise
1.1. Necessidade de reviso do conjunto ftico-probatrio
Na maioria dos casos em que no se analisa a proporcionalidade do
ato administrativo discutido, isso ocorre porque os ministros afirmam que
tal anlise exigiria a verificao do conjunto ftico-probatrio e isso no
seria permitido pela via escolhida. Ou seja, trata-se daquelas aes
destinadas apenas a discusses de direito e no de fato, portanto os
ministros afirmam que no podem rever os atos no tocante sua
proporcionalidade.
Isso ocorre em nove casos, sendo seis deles referentes
proporcionalidade das sanes administrativas de exonerao e demisso24,
um referente razoabilidade da excluso de um concorrente em concurso
pblico25 e dois relacionados valorao de multa em autuao fiscal26.
24 So eles: STF: ARE 727542 AgR/RJ, r. Min. Crmen Lcia, j. 21/05/2013; ARE 717894
AgR/SC, r. Min. Dias Toffoli, j. 23/04/2013; STF: RE 609184 AgR/RS, r. Min. Dias Toffoli, j. 05/03/2013; STF: AI 781925 AgR/SP, r. Min. Rosa Weber, j. 20/11/2012; STF: ARE 707292
AgR/DF, r. Min. Crmen Lcia, j. 02/10/2012; ARE 727225 ED/DF, r. Min. Gilmar Mendes, j. 05/03/2013. 25 Trata-se do caso STF: ARE 699911 AgR/RJ, r. Min. Crmen Lcia, j. 11/09/2012. 26 Eles so: STF: RE 630380 ED/MG, r. Min. Joaquim Barbosa, j. 28/08/2012 e o RE 595553 AgR-segundo/RS , r. Min. Joaquim Barbosa, j. 08/05/2012.
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32
O que se poderia concluir desses casos que o STF respeita a
deciso judicial inferior, posto que ela analisa as provas do caso.
Importante notar que as decises inferiores recorridas decidiam tanto pela
reforma27 quanto pela manuteno do ato administrativo28.
Nos casos em que havia reforma, a Administrao recorria alegando
falta de proporcionalidade da prpria deciso judicial, porque violaria a
separao de poderes. A tal questionamento se respondeu que o Judicirio
pode, sim, rever atos administrativos, inclusive quanto sua
proporcionalidade e razoabilidade, como se ver mais adiante.
Dois outros casos tiveram resoluo semelhante29, embora a
proporcionalidade sequer aparecesse como questo e viesse apenas na
afirmao de que o Judicirio pode, sim, rever atos administrativos sob tal
aspecto. Neste sentido, os ministros frequentemente citaram o voto do Min.
Eros Grau no RMS 2469930, que ser analisado mais frente. Assim, as
decises ressaltam que a deciso recorrida analisara as provas para concluir
sobre a sua desproporcionalidade e que isso permitido ao Judicirio.
Nos casos em que o ato no era reformado, o servidor alegava a
falta de proporcionalidade de sua sano ou o administrado contestava a
razoabilidade de sua multa. Nestes, o argumento do STF era semelhante,
pois a deciso judicial inferior avaliara as provas e decidira
fundamentadamente, no sendo possvel para o STF modific-la sem rever
os fatos.
27 Houve reforma em instncia inferior dos atos discutidos nos seguintes casos: STF: ARE 717894 AgR/SC, r. Min. Dias Toffoli, j. 23/04/2013; STF: RE 609184 AgR/RS, r. Min. Dias Toffoli, j. 05/03/2013; STF: AI 781925 AgR/SP, r. Min. Rosa Weber, j. 20/11/2012; ARE 707292 AgR/DF, r. Min. Crmen Lcia, j. 02/10/2012; ARE 699911 AgR/RJ, r. Min. Crmen Lcia, j. 11/09/2012. 28 No houve reforma em instncia inferior dos atos discutidos nos casos: STF: ARE 727542 AgR/RJ, r. Min. Crmen Lcia, j. 21/05/2013; ARE 727225 ED/DF, r. Min. Gilmar Mendes, j.
05/03/2013. ; STF: RE 630380 ED/MG, r. Min. Joaquim Barbosa, j. 28/08/2012. 29 So eles: STF: RE 634900 AgR/PI, r. Min. Dias Toffoli, j. 02/04/2013; STF: AI 800892 AgR/BA, r. Min. Dias Toffoli, j. 12/03/2013. 30 STF: RMS 24699/DF, r. Min Eros Grau, j. 30/11/2004.
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33
Ressalte-se que, no caso da multa do RE 630380 ED31, no podemos
concluir que o STF considera sempre necessrio rever as provas para a
anlise da proporcionalidade, porque a justificativa do voto do relator Min.
Joaquim Barbosa afirma que no foram levados argumentos que
demonstrassem de plano a desproporcionalidade. Assim, em algum caso,
talvez seja possvel apontar argumentos que demonstrem j de pronto a
desproporcionalidade.
O outro caso referente multa tributria, o RE 595553 AgR32, traz
questo diferente, porque a multa j havia sido alterada pelo Judicirio e o
STF apenas mantm tal deciso. Aqui, ele no analisa a proporcionalidade
porque a deciso inferior considerara os fatos para dizer que a multa de
100% no fora motivada pela Administrao, assim, seria desproporcional.
E o relator Min. Joaquim Barbosa afirma que se pode rever a
proporcionalidade e razoabilidade de multas, para garantir que no tenham
efeito confiscatrio e que ele respeitaria a valorao feita pela deciso
judicial inferior, porque no podia rever os fatos.
1.2. Deciso baseada em outros fundamentos
Alm da no anlise por necessidade de se rever as provas, h um
caso em que a proporcionalidade questionada, mas no analisada,
porque o caso decidido com base em outros questionamentos33. Neste
caso, uma portaria do Secretrio de Segurana Pblica do Piau definia
horrio de funcionamento de estabelecimentos, com o objetivo de diminuir
a violncia.
Nessa ao, a requerente levantou vrios argumentos, relacionados
competncia para realizao de tal ato, ofensa livre iniciativa, legalidade
e, por fim, ofensa ao devido processo legal e razoabilidade. Nota-se que a
razoabilidade aparece apenas como ltimo argumento, talvez com a funo
de reforo de toda a argumentao precedente. A deciso pode at
31 STF: RE 630380 ED/MG, r. Min. Joaquim Barbosa, j. 28/08/2012. 32 STF: RE 595553 AgR-segundo/RS , r. Min. Joaquim Barbosa, j. 08/05/2012. 33 o caso da ADI 3731 MC/PI, r. Min. Cezar Peluso, j. 29/08/2007.
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34
confirmar esta ideia da razoabilidade como argumento de reforo, j que ela
se pauta em outros fundamentos, nem utilizando a razoabilidade.
claro que o magistrado no precisa abordar todos os fundamentos
dos demandantes, se apenas alguns j forem suficientes para motivar a
deciso. Porm, interessante notar como a razoabilidade pode se tornar
um argumento dispensvel, no confronto com outros mais especficos, que
seriam talvez considerados mais fortes, pelo seu prprio contedo mais
explcito para a conduo da deciso.
Por exemplo, no caso em questo se afirma que o ato da autoridade
administrativa municipal teria usurpado competncias de outros entes
federativos. E decidir com base nisso parece muito mais objetivo e simples
do que discorrer sobre a razoabilidade de tal ato. O que nos faz lembrar at
das afirmaes doutrinrias de que, na existncia de regras (dispositivos
com contedo mais definido), se afasta a incidncia dos princpios
(dispositivos com contedo mais genrico).
Por ltimo, impossvel no destacar que houve um voto divergente
nesse caso. O voto do Ministro Ayres Britto, que consta da pgina 53 do
acrdo, traz apenas a seguinte afirmao: Senhora Presidente, entendo
que no inconstitucional. Julgo improcedente.. Trata-se de uma situao
interessante, porque, mesmo com tantos argumentos levantados pela
requerente, o Ministro discorda do relator sem fundamentao alguma,
sendo difcil compreender o que formou sua convico no caso.
1.3. Proporcionalidade no era fundamento do pedido
O RE 24415834 um caso interessante, pois o STF reforma uma
deciso do TJ/SP que anulara, com base na proporcionalidade, uma
exonerao de servidor de corporao militar. Afirma-se que a deciso
recorrida teria ultrapassado suas competncias, atingindo o mrito do ato
administrativo.
34 STF: RE 244158/SP, r. Min. Menezes Direito, j. 02/09/2008.
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35
O Min. Menezes Direito, relator do caso, d provimento, porque a
deciso recorrida reconhecera no haver vcio no processo administrativo
que apurou as faltas cometidas. Por isso, e considerando que a sano
aplicada era prevista em lei, no haveria possibilidade de revog-la. O TJ
dissera que a exonerao era desproporcional, j que a participao do
servidor na infrao teria sido indireta e no teria havido obteno de
vantagem econmica. Porm, o relator afirma que no se pode discutir o
tema da proporcionalidade porque no se tratava de fundamento do pedido
inicial.
Sobre esse fundamento, o relator afirma que, no RMS 25.627/DF, j
se teria afastado a possibilidade de anlise da proporcionalidade sem a
provocao do autor. Mas, nesse caso, que tambm foi estudado na
pesquisa, se tratava apenas de uma opinio expressada pelo Min. Marco
Aurlio, sobre a qual houve discordncias e no se chegou a uma concluso
clara, sendo o caso decidido por outros pontos. Ou seja, nota-se aqui um
problema na citao de precedentes, pois se cita uma afirmao em debate
como se fosse uma razo de decidir em um caso anterior da Corte, a fim de
conferir maior legitimidade deciso que ora se pretendia dar.
primeira vista, tal caso parece destoar dos acima referidos,
aqueles em que o STF respeitava a deciso judicial anterior. Porm, a
deciso at guarda coerncia com outras decises relativas a sanes e que
sero comentadas mais frente, em que o STF preza pela aplicao da
sano prevista em lei e respeita o juzo do administrador.
Apenas cabe ressaltar um detalhe interessante do voto do Min.
Menezes Direito, porque, como visto, ele afirma a impossibilidade de
verificar a proporcionalidade da sano discutida. Entretanto, ele afirma
que, se fosse possvel examin-la, deveria ser considerado o quadro de
generalizada agresso aos padres de moralidade no servio pblico, o que
impe exigncia de comportamento absolutamente liso quanto conduta
dos servidores pblicos, particularmente dos servios policiais. Ou seja, o
Ministro parece demonstrar certa concordncia com o mrito do ato
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36
administrativo, embora use apenas questes formais para retomar sua
validade.
1.4. Ausncia de pr-questionamento
No recurso extraordinrio 252352/SP35, o princpio da razoabilidade
invocado, relacionado ao princpio da moralidade, em relao falta de
paralelismo na fixao da penso de ex-governador. Segundo o recorrente,
no se poderia fixar penso de ex-chefe do Executivo no valor de
vencimentos de chefe de outro Poder, no caso, do Judicirio.
A razoabilidade no foi analisada pelo relator porque ele afirma no
ter havido seu pr-questionamento, aplicando assim as smulas 282 e
35636. O RE acaba no sendo conhecido, porque, embora o relator desse
provimento alegao de ofensa ao direito ao contraditrio, os outros
ministros consideraram que nenhum ponto havia sido pr-questionado.
1.5. Aparece apenas na ementa
No Recurso Extraordinrio 192568/PI37, a razoabilidade aparece na
ementa da seguinte forma:
"CONCURSO PBLICO - EDITAL - PARMETROS - OBSERVAO. As
clusulas constantes do edital de concurso obrigam candidatos e
Administrao Pblica. Na feliz dico de Hely Lopes Meirelles, o edital
lei interna da concorrncia. CONCURSO PBLICO - VAGAS -
NOMEAO. O princpio da razoabilidade conducente a
presumir-se, como objeto do concurso, o preenchimento das
vagas existentes. Exsurge configurador de desvio de poder, ato da
35 STF: RE 252352/SP, r. Min. Seplveda Pertence, j. 17/08/1999. 36 STF Smula n 282 - 13/12/1963 - Admissibilidade - Recurso Extraordinrio -
Questo Federal Suscitada. inadmissvel o recurso extraordinrio, quando no ventilada, na deciso recorrida, a questo federal suscitada.
STF Smula n 356 - 13/12/1963 - Ponto Omisso da Deciso - Embargos Declaratrios - Objeto de Recurso Extraordinrio - Requisito do Prequestionamento. O ponto omisso da deciso, sobre o qual no foram opostos embargos declaratrios, no pode ser objeto de recurso extraordinrio, por faltar o requisito do prequestionamento. 37 STF: RE 192568/PI, r. Min. Marco Aurlio, j. 23/04/1996.
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37
Administrao Pblica que implique nomeao parcial de candidatos,
indeferimento da prorrogao do prazo do concurso sem justificativa
socialmente aceitvel e publicao de novo edital com idntica
finalidade. "Como o inciso IV (do artigo 37 da Constituio Federal)
tem o objetivo manifesto de resguardar precedncias na seqncia dos
concursos, segue-se que a Administrao no poder, sem burlar o
dispositivo e sem incorrer em desvio de poder, deixar escoar
deliberadamente o perodo de validade de concurso anterior para
nomear os aprovados em certames subseqentes. Fora isto possvel e
o inciso IV tornar-se-ia letra morta, constituindo-se na mais rptil das
garantias" (Celso Antonio Bandeira de Mello, "Regime Constitucional
dos Servidores da Administrao Direta e Indireta", pgina 56)."
(grifos meus)
Lida apenas a ementa, poderia se imaginar que o acrdo tratasse
expressamente da ideia do princpio da razoabilidade como o indicador do
preenchimento de todas as vagas anunciadas no concurso. Porm, no se
trata de um ponto expresso no texto do acrdo.
O caso at possui vrios votos com seus fundamentos prprios, mas
todos desenvolvem sua argumentao com o ponto das vagas do edital
implcito. Ou seja, os ministros concordam, sim, que o objeto do concurso
so todas as vagas anunciadas e que a Administrao no poderia, sem
justificativa, deixar de chamar os aprovados a preench-las. O Min. relator
at diz que no preencher todas as vagas no seria um campo de
discricionariedade administrativa e sim uma arbitrariedade.
Entretanto, os ministros no tratam o tema nos termos dispostos na
ementa, nem mesmo o relator, que quem, geralmente, redige a ementa.
Assim, a ementa indica uma anlise da razoabilidade do ato que, de fato, foi
reformado, mas no com a argumentao em torno da razoabilidade.
O relator fundamenta tal ponto referindo-se ao fato de que, aps o
resultado do concurso, no seria legtimo escolher quantos candidatos
convocar, porque j se conhece a lista dos aprovados, o que feriria o
princpio da impessoalidade. Alm de afirmar que os concursos
frequentemente so prorrogados sem sequer haver vagas disponveis, por
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38
economia de recursos e para evitar reiterado desgaste aos candidatos que
j se habilitaram. Assim, parece que fica implcito na argumentao que a
Administrao deve sempre convocar o nmero de candidatos equivalente
s vagas anunciadas.
No possvel concluir categoricamente a razo de constar na
ementa o princpio da razoabilidade a explicar determinada concluso,
enquanto esta mesma concluso, no acrdo, fundamentada por outros
argumentos e tal princpio sequer citado. Pelo estudo dos acrdos e de
suas ementas, percebe-se que algumas ementas possuem falhas em sua
elaborao, nem sempre expressando de forma adequada o que foi
decidido.
Neste caso, naturalmente pode se tratar de um erro ou confuso na
redao, mas tambm pode indicar a prpria viso que se tem sobre o
chamado princpio da razoabilidade. Afinal, trata-se de uma expresso de
contedo muito genrico, indefinido. Assim, ela pode ter sido escolhida
como se fosse capaz de resumir os vrios outros fundamentos contidos da
deciso. Ou ento, como uma expresso capaz de indicar facilmente a
veracidade ou confiabilidade de uma afirmao de que o objeto do
concurso o preenchimento das vagas existentes , embora na deciso se
busque comprovar isso com outros argumentos.
1.6. A ao no era cabvel contra os atos administrativos
O caso da ADI 2151 MC peculiar38. Tratava-se de uma medida
cautelar em ao direta de inconstitucionalidade contra uma lei, uma
resoluo nela baseada e dois editais de concurso, que tambm seguiam as
disposies legais. O relator no conhece da ao contra os atos
administrativos, a resoluo e os editais, porque seu defeito seria de
legalidade e no de constitucionalidade, j que retiravam sua validade da
prpria lei.
38 STF: ADI 2151 MC/MG, r. Min. Marco Aurlio, j. 10/05/2000.
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39
Porm, deve ter havido algum debate que no consta do acrdo,
porque os votos seguintes trazem no cabealho a indicao de que se
referiam ao 2 do artigo 8 da Lei n 12.919. E o Ministro Nelson Jobim
afirma em seu voto que divergia do Min. relator e concedia a liminar, na
linha sugerida pelo Min. Seplveda Pertence, em relao Resoluo.
Porm, o voto do prprio Min. Seplveda Pertence no trata da Resoluo.
Pelo extrato de ata, percebe-se que a deciso se restringe ao dispositivo da
Lei, porm no possvel saber o que foi decidido em relao aos atos
administrativos, j que as informaes no constam do acrdo.
2. Casos em que houve anlise
Aps expor em que casos e por quais motivos o STF no analisou a
proporcionalidade ou a razoabilidade, encontram-se neste tpico os casos
em que tal anlise foi realizada. Cada parte do texto traz um breve relato
do caso e da forma como a proporcionalidade ou a razoabilidade foram
utilizadas na deciso.
Por se tratar de casos variados e para facilitar a exposio, eles
foram organizados por temas, trazidos primeiro aqueles relacionados a
servidores, depois aqueles referentes a questes tributrias, seguidos de
dois casos peculiares, de defesa do consumidor e de demarcao de terra
indgena e, por ltimo, os casos envolvendo o TCU.
2.1. Demisso
H seis casos relativos a sanes de demisso que foram analisados
pelo STF em relao sua proporcionalidade39. Em todos eles, os ministros
relacionam a proporcionalidade com a legalidade, afirmando a regularidade
das sanes quando previstas em lei. Em geral, trata-se das disposies
39 So eles: STF: RMS 30455/DF, r. Min. Luiz Fux, j. 15/05/2012; STF: RMS 25627/DF, r. Min. Ayres Britto, j. 15/05/2007; STF: RMS 24901/DF, r. Min. Ayres Britto, j. 26/10/2004; MS 23512/DF, r. Min. Gilmar Mendes, j. 21/11/2002; RMS 24699/DF, r. Min Eros Grau, j. 30/11/2004; RMS 31044 AgR/ DF, r. Min. Dias Toffoli, j. 18/12/2012.
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sobre sanes previstas na Lei 8.112/1990 (Estatuto dos servidores
pblicos civis da Unio).
Aqui, nota-se uma deferncia do STF s decises administrativas,
pois, por mais que se argumente com os bons antecedentes do servidor,
com o pequeno dano causado ao errio ou com a indicao de pena menos
grave pela comisso administrativa processante (que no foi acolhida pela
autoridade responsvel pela aplicao da sano), as decises respeitam a
penalidade imposta pelo administrador.
importante destacar que o STF preza pela higidez do processo
administrativo que levou demisso e considera essencial que se respeite a
ampla defesa e o contraditrio. Assim, quando o processo administrativo
no questionado no Judicirio, o STF ressalva que isso possvel por meio
das aes adequadas.
o que se fez, por exemplo, no RMS 2490140 e no RMS 3045541,
cuja deciso afirmou a proporcionalidade da pena por ser aquela prevista
em lei para os fatos apurados, mas ressalvou a possibilidade de se discutir o
processo administrativo na ao adequada, em que se possam produzir
provas.
Apenas em um dos seis casos o STF modificou a sano aplicada,
mas ainda respeitando a lgica de equivalncia entre o exame de
proporcionalidade e o de legalidade, isto , afirmando que, por cumprir
prescries legais, o ato proporcional. Ocorre que, no RMS 25699,
decidiu-se que no havia sido respeitada a ampla defesa e que o
administrador no poderia aplicar sanes previstas na Lei 8.429/199242,
pois essas seriam aplicveis apenas pelo Judicirio. Alm disso, o Min.
relator Eros Grau afirmou que a motivao da demisso no correspondia
s provas colhidas no processo, porque elas demonstravam no ter havido
40 STF: RMS 24901/DF, r. Min. Ayres Britto, j. 26/10/2004. 41 STF: RMS 30455/DF, r. Min. Luiz Fux, j. 15/05/2012. 42 A Lei 8.429/1992 dispe sobre as sanes aplicveis aos agentes pblicos nos casos de enriquecimento ilcito no exerccio de mandato, cargo, emprego ou funo na administrao pblica direta, indireta ou fundacional e d outras providncias.
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41
dano ao errio, sendo incabvel a pena de demisso, pelas prprias
hipteses da Lei 8.112/199043, tambm indicada no ato de demisso.
Outro caso que vale ser destacado o MS 2351244, em que o STF
entendeu cabveis as ponderaes previstas nos artigos 128 e 130 da Lei
8.112/199045. Assim, ressaltou-se que o processo administrativo
considerara tais caractersticas ao aplicar a sano, portanto, ela era
proporcional.
Uma ltima observao interessante no tocante a esses casos
relacionada tcnica decisria. Percebe-se que o Agravo regimental no RMS
3104446 muito semelhante queles casos anteriormente referidos em que
no se analisa a proporcionalidade porque seria necessrio rever as provas.
Porm, enquanto naqueles se dizia que era impossvel verificar a
proporcionalidade da sano, aqui se diz que no h que se falar em
violao proporcionalidade. Ou seja, afirma-se que a proporcionalidade
equivale aplicao da previso legal aps o processo administrativo e
ressalvando que se pode question-lo em sede de outra ao em que se
revejam as provas.
claro que, comparando este com os outros casos, so situaes
com suas peculiaridades, porm interessante notar como no h um
padro ou uma concepo bem definida sobre a proporcionalidade
equivaler, de fato, legalidade, ou equivaler a outra anlise que exija
verificao de fatos. Ou talvez isso dependa dos prprios termos em que os
43 A Lei 8.112/1990 dispe sobre o regime jurdico dos servidores pblicos civis da Unio, das autarquias e das fundaes pblicas federais. 44 STF: MS 23512/DF, r. Min. Gilmar Mendes, j. 21/11/2002. 45 Lei 8.112/1990: Art. 128. Na aplicao das penalidades sero consideradas a natureza e
a gravidade da infrao cometida, os danos que dela provierem para o servio pblico, as circunstncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais. Art. 130. A suspenso ser aplicada em caso de reincidncia das faltas punidas com advertncia e de violao das demais proibies que no tipifiquem infrao sujeita penalidade de demisso, no podendo exceder de 90 (noventa) dias.
1o Ser punido com suspenso de at 15 (quinze) dias o servidor que, injustificadamente, recusar-se a ser submetido inspeo mdica determinada pela autoridade competente,
cessando os efeitos da penalidade uma vez cumprida a determinao. 2o Quando houver convenincia para o servio, a penalidade de suspenso poder ser convertida em multa, na base de 50% (cinquenta por cento) por dia de vencimento ou remunerao, ficando o servidor obrigado a permanecer em servio. 46 STF: RMS 31044 AgR/ DF, r. Min. Dias Toffoli, j. 18/12/2012.
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42
demandantes questionem a proporcionalidade, porm apenas uma
hiptese, j que as peties no foram estudadas.
2.2. Concursos pblicos
Em relao a concursos pblicos, foram estudados seis casos.
Alguns deles envolviam a razoabilidade para considerao do edital,
mitigando a ideia do edital como lei do concurso; outro caso trazia a
razoabilidade em relao prorrogao do prazo do concurso e outro em
relao manuteno de servidora contratada sem concurso.
Nesses casos, as ideias que, geralmente, preenchem as
consideraes sobre a proporcionalidade so as de proteo das
expectativas dos candidatos e de economia de recursos pblicos.
Os mandados de segurana 2859447 e 2860348 foram julgados
conjuntamente e traziam o questionamento a um ato do Conselho Nacional
de Justia (CNJ) que reformara ato do Tribunal de Justia de Minas Gerais
relativo a concurso pblico para juiz. Nesse caso, por um erro da instituio
organizadora do concurso, que no considerara as questes anuladas, a
nota de corte divulgada era menor do que aquela adequada para selecionar
o nmero de candidatos previstos no edital. Assim, um nmero superior foi
aprovado.
O Tribunal de Justia, no exerccio da funo administrativa,
deliberou pela manuteno dos candidatos no certame, que continuou a ser
realizado normalmente. Entretanto, o CNJ, em sua funo de controle,
anulou tal ato do TJ/MG, afirmando que feria o edital. Assim, alguns
candidatos aprovados recorreram ao STF e recorreu tambm o prprio
TJ/MG, para preservar o seu ato.
47 STF: MS 28594/DF, r. Min. Crmen Lcia, r. para acrdo Min. Marco Aurlio, j. 06/10/2011. 48 STF: MS 28603/DF, r. Min. Crmen Lcia, r. para acrdo Min. Marco Aurlio, j. 06/10/2011.
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Na deciso, a relatora Min. Crmen Lcia vota pela anulao do ato
do CNJ, pois ele no teria garantido o direito ao contraditrio dos
envolvidos. Porm, considerando se tratar apenas de questo de direito, j
resolve o mrito, afirmando que o CNJ tinha razo e que os candidatos que
no estavam no nmero previsto no deveriam ter sido aprovados,
invocando a ideia do edital como a lei do concurso.
No entanto, o voto da relatora resta vencido, porque os outros
ministros entendem aplicvel o dispositivo do Cdigo de Processo Civil
segundo o qual no se declara a nulidade de um ato se, no mrito, se puder
decidir a favor da parte a quem aproveitaria a nulidade. Assim, no se anula
o ato do CNJ, e, no mrito, j se decide que ele estava equivocado.
O Min. Luiz Fux quem acrescenta o fundamento da razoabilidade,
apenas afirmando que aceitar os candidatos equivocadamente convocados
para a segunda fase era a nica deciso cabvel, norteada pelo princpio
da razoabilidade. Isso porque se protegeriam suas legtimas expectativas.
Tambm no sentido de proteo boa-f dos candidatos, vota o Min.
Lewandowski, afirmando a consonncia do ato com o princpio
constitucional implcito da razoabilidade.
Outro caso relativo aos termos do edital o RE 22196649, em que a
recorrente questiona um concurso, em que no fora aprovada para a
segunda fase. O problema seria os ttulos a que o edital conferia pontuao,
porque o concurso seria de provas e ttulos, devendo os ltimos ter
carter subsidirio para determinar a aprovao. Alm disso, faltara
isonomia, porque era valorizado apenas o tempo de advocacia junto a entes
pblicos e no a entes privados.
Nesse caso, o relator Min. Marco Aurlio disse que, interpretando
luz do princpio da razoabilidade, no concurso de provas e ttulos, estes no
poderiam ter carter eliminatrio. Nesse ponto ele restou vencido, porque
os outros ministros consideraram se tratar de uma deciso de acordo com a
convenincia da Administrao.
49 STF: RE 221966/DF, r. Min. Marco Aurlio, j. 25/05/1999.
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44
Quanto considerao do tempo trabalhado junto a entes pblicos,
o relator afirmou que o critrio de discriminao no seria proporcional e
razovel. Isso porque discriminar pelo tomador do servio (ente pblico ou
privado) no se coadunava com os objetivos da Carta da Repblica e com
a prpria experincia buscada ao concederem-se pontos advocacia,
porque para isso no importa onde se presta o servio. Os demais ministros
concordaram com tal argumentao, com exceo de Nri da Silveira, que
tambm acreditou se tratar de matria de livre disposio pela
Administrao.
Portanto, pode-se ver que h algumas discordncias entre os
ministros sobre o que estaria de fato dentro das possibilidades de deciso
conforme a convenincia administrativa e o que, por outro lado, seriam
decises inconstitucionais, violadoras da isonomia. Com relao primeira
opinio, encontra-se o argumento de competncia prpria da Administrao
para escolher que tipo de profissionais busca. Do outro lado, tm-se os
argumentos no sentido de que a Administrao no poderia instituir
critrios no razoveis e no proporcionais, considerando neste exame os
prprios objetivos do ato administrativo e, genericamente, os objetivos da
Carta da Repblica.
O terceiro caso relativo aos concursos pblicos o RE 39093950, em
que o Estado do Maranho questiona uma deciso do TJ/MA que provia
mandado de segurana impetrado por candidata de concurso. A candidata
impetrara o mandado porque, dez dias antes da prova, fora alterada a
descrio de um dos exerccios fsicos exigidos. O TJ/MA considerou que a
publicao de alterao no edital apenas em Dirio Oficial e no tambm
em jornais de grande circulao feria princpios constitucionais
elementares, como publicidade e razoabilidade.
J no RE, a relatora Min. Ellen Gracie afirma que a publicao da
alterao apenas no Dirio Oficial j era suficiente para dar publicidade ao
ato administrativo. E adiciona que a Administrao pode rever seus atos a
50 STF: RE 390939/MA, r. Min. Ellen Gracie , j. 16/08/2005.
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45
qualquer momento e que o prazo de dez dias de antecedncia era prazo
razovel.
interessante notar como o TJ/MA afirma a violao de ambos os
princpios, da publicidade e da razoabilidade, mas como se o segundo
fosse usado para modular o primeiro. Ou seja, embora a construo do
argumento no seja esta, parece que a razoabilidade indicaria que a
publicidade no seria satisfeita apenas com a publicao no Dirio Oficial.
Talvez isso seja at confirmado pela deciso do RE, j que reforma a
deciso judicial inferior sem mencionar expressamente a razoabilidade, mas
considerando que a publicidade estaria suficientemente cumprida.
O quarto caso nesse tema o RMS 2365751, que traz o
questionamento de um candidato que ficara no lugar imediatamente
posterior ao ltimo convocado no concurso. Ele argumenta que o edital
previa a possibilidade de prorrogao do concurso, que no havia sido
utilizada, embora j fosse anunciada a realizao de novo concurso em
breve, indicando, portanto, a existncia de vagas.
O relator Min. Marco Aurlio d provimento ao recurso, pois
deveriam, segundo ele, ser respeitadas as expectativas do candidato e no
se poderia deixar ao arbtrio de uma das partes a prorrogao ou no do
concurso. Assim