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“A presença feminina na sociedade paranaense através de
fotografias: uma possibilidade de estudo em sala de aula – (1940-
1960)”.
Lucélia Aparecida Pereira1
Resumo
O presente trabalho nasceu das inquietações referentes à questão das minorias e a conseqüente necessidade de uma reflexão dentro da sala de aula. A construção do mesmo começa com o ensino de história e a conseqüente necessidade de debate de como ele se processa dentro da sala de aula. O tema é desenvolvido por meio de três percursos interligados. O primeiro, caracterizando o recorte histórico (1940-1960) da História do Paraná para assim situar o momento histórico, foco do estudo. O segundo, buscando a atenção para o mundo contemporâneo mergulhado em imagens e sons, fazendo uso de fotografias, instrumento que serve no registro documental e na construção do conhecimento e que, nesta situação, não deve ser ignorada pelo professor e sim desafiadoramente utilizada. Por último, considerando que a questão feminina permeou os dois primeiros caminhos, propõe-se a análise e discussão da presença feminina na sociedade local e paranaense. O projeto foi implementado com turmas de oitavas séries do Ensino Fundamental e possibilitou a construção de conhecimento conjuntamente com os alunos.
Palavras-chave: ensino de História – mulheres – fotografia – Paraná.
Abstract
The present work was born of the referring fidgets to the question of the minorities and the consequent necessity of a reflection inside of the classroom. The construction of the same starts with the education of history and the consequent necessity of debate of as it processes itself inside of the classroom. The subject is developed by means of three linked passages. The first, characterizing the historical clipping (1940-1960) of the History of the Paraná thus to point out the historical moment, focus of the study. As, searching the attention for the world contemporary dived in images and sounds, making photograph use, instrument that serves in the documentary register and the construction of the knowledge and that in this situation, do not have to be ignored by the teacher and yes challengingly used. Finally, considering that the feminine question permeou the two first ways, it is considered analysis and quarrel of the feminine presence in the local and paranaense society. The project was implemented with groups of eighth series of Basic Ensino and jointly made possible the construction of knowledge with the pupils.
1 Professora da rede estadual de ensino do Estado do Paraná, município de Assai. Participante do Programa de Desenvolvimento da Educação do Paraná, de 2007.
Introdução: Conhecimento histórico
As discussões acerca da produção do conhecimento histórico mostram
a necessidade de retomada de estudo da década de 1970 e 1980 quando o
ensino de História passa a ser questionado. Naquele momento uma
pergunta movia as discussões em torno do ensino de história: é possível
produzir conhecimento em sala de aula? A dúvida é passível de ser
entendida, pois a época era de crença na idéia de que a produção do
conhecimento só era possível na academia e que a escola era apenas
espaço para a reprodução.
Mesmo neste período, alguns historiadores como Marcos Silva e
Dea Fenelon, já teciam críticas a este tipo de pensamento afirmando que
era possível produzir conhecimento no 1º e 2º graus. Segundo Kátia Abud,
André Chervel, na década de 1980, reforça essa idéia, alegando que a sala
de aula poderia ser produtora de conhecimento, diferente daquele
produzido na academia, um saber muito importante: o saber escolar.
(ABUD, 1995: 149)
Para Kátia Maria Abud em seu artigo “Conhecimento Histórico e
Ensino de História: a produção de conhecimento histórico escolar”,
devemos levar em consideração algumas idéias impressas no currículo.
Uma delas diz respeito a sabermos que ele é produzido por um grupo com
interesses e num tempo histórico específico; ele determina regras, dita uma
linha de pensamento.
A autora ainda chama atenção para o fato de que o currículo pode
aparecer envolto numa aura de naturalidade. Porém, é preciso tomar
cuidado, pois este se mostra como agregador de interesses, de intenções,
ou seja, não é neutro.
Segundo Lana Mara C. Siman, para entender a lógica do
desenvolvimento do conhecimento histórico é preciso entender a categoria
essencial desse conhecimento: o tempo. Para autora, também não se pode
desligar memória e imaginação, uma vez que não é possível restaurarmos o
real vivido em sua integridade, pois o processo passa necessariamente pelo
imaginário.
Para Siman, também é essencial estabelecer a função dialógica
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proporcionando um diálogo com o outro, ou seja, levar o aluno a pensar a
partir do outro. Assim, ao aluno é oportunizado se colocar, imaginar-se no
lugar do outro, sendo potencializado suas capacidades, incentivando-o a
pensar, questionar, perceber conceitos, presenças de temporalidade,
permanências e resistências.
Neste sentido, professor e alunos dialogam, usam da memória e
produzem conhecimento novo. Portanto, o aluno é capaz de abstração, de
perceber tempos históricos co-existindo e com outros significados. Segundo
a autora, tal estratégia confirma as idéias presentes no pensamento de
Vygotsky que acreditava na construção e aquisição do conhecimento
mediado pela cultura e pela linguagem, transformando os fenômenos
sociais em fenômenos psicológicos.
Em suma, para Siman, nas mediações para a construção do
conhecimento além do professor, outros mediadores culturais são
necessários como os objetos da cultura material, visual ou simbólica,
tornando possível reconstruir o não-vivido diretamente.
Marlene Cainelli em seu artigo “Educação Histórica: perspectivas
de aprendizagem da História no Ensino Fundamental”, centrado na
discussão da iniciação das crianças na construção do conhecimento
histórico, afirma que o tempo cronológico é desprezado pelos alunos, o que
não se apresenta como um problema, já que ele é uma criação do homem,
uma construção humana. Na perspectiva de Cainelli, ensinar História para
crianças pressupõe despertar interesses por fatos do presente através do
passado. Deve-se proporcionar a possibilidade de diálogo com o passado
através dos vestígios existentes do mesmo, levando o aluno a perceber que
o importante em se conhecer o passado está no fato de poder relacioná-lo
com o presente.
Para Circe Bittencourt, Vygotsky, diferentemente de Piaget,
acreditava ser possível a aquisição de conceitos desde muito cedo, dando
ênfase sobre a distinção entre conceitos do senso comum e os conceitos
científicos. A crítica que se faz sobre a teoria piagetiana é sobre a extrema
importância que Piaget dá à maturação e não importando a história deste
indivíduo e sua influência no espaço a que pertence. Assim, Vygotsky
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apresenta seus estudos mostrando que a criança aprende por outros meios,
sendo, portanto, importante, aproximar aquilo que ele já sabe (senso
comum) com o senso científico.
Circe também ressalta os estudos de Paulo Freire, na década de
1970, que já utilizava desta idéia na alfabetização de jovens e adultos:
considerar o que este jovem já sabe, buscar um ponto de interesse e dele
partir para levar este aluno à aquisição dos conceitos desejados. Assim, a
autora ressalta que o pesquisador deve contextualizar os conceitos que
acredita necessário para a aprendizagem efetiva.
Ainda em se tratando de Circe, quando o assunto é o ensino de
História dois conceitos são de suma importância: tempo histórico e espaço.
Sabe-se que o conceito de temporalidade possui diferentes interpretações
principalmente quando pensada na lógica infantil, o que não descaracteriza
o conceito tempo. Cada sociedade tem seu tempo pensado e interpretado
de acordo com sua concepção de mundo. É importante utilizar do tempo
cronológico, tendo o cuidado com um trabalho por demais rígido que não
permita um trânsito livre entre outras temporalidades, como construção
social. Há um tempo vivido, um tempo biológico, marcado por anos de vida,
por marcas ritualísticas importantes que são incorporadas de diferentes
formas pelos grupos sociais. Também há o tempo concebido, que varia de
acordo com as culturas e gera relações diferentes com o tempo vivido. Todo
historiador se utiliza de várias categorias temporais, concentrando-se no
tempo métrico (cronologia e periodização) e tempo qualitativo (duração,
sucessão, simultaneidade, mudanças e permanências).
Além do tempo, outro conceito fundamental discutido por Circe
Bittencourt é o espaço, uma vez que todo acontecimento deve ser situado
num espaço específico. O historiador trabalha e percebe o espaço
diferentemente de outros cientistas, pois pensa o mesmo não apenas como
espaço geográfico, mas como espaço social, podendo ser delimitado de
outra forma. O espaço é mais que apreensão do espaço, mas por situações
que possibilitem o conhecimento de pessoas, de lugares; as diferenças
culturais, o espaço político, são formas diferentes de delimitar espaços que
não necessariamente por medições geográficas.
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Não basta delimitar o espaço é fundamental conhecer o que torna
aquele espaço como algo vivido e percebido pelos diferentes grupos sociais.
Segundo Circe “o sentimento de pertença a determinados espaços
nacionais, regionais ou locais faz parte de uma história”. (BITTENCOURT,
2004: 187)
Ernesta Zamboni trabalha com a temática da multiplicidade de
linguagens e categorias: tempo, cultura, documento, ideologia,
representação e diferentes formas de registro. Para ela novas abordagens
exigem que o historiador recorra a variadas formas de representação,
buscando assim ampliar e aprofundar o objeto de investigação.
Para a autora, sabe-se que não é possível restaurar o real já vivido
em sua integridade, uma vez que o imaginário, as emoções, as
contradições, fazem parte desta reconstrução, anulando qualquer pretensão
de uma ciência livre das paixões, completamente neutra, pois as
representações históricas estão carregadas de valores, traços culturais,
ideologias.
Em seu artigo “Leitura e escrita na História”, Fernando Seffner
ocupa-se em discutir a questão da memória que necessariamente precisa
do recurso da leitura e escrita; para que esta memória se eternize é
imprescindível exercitar a arte de pensar, reter os pensamentos e
comunicar.
O desejo de todo professor é formar um aluno capaz de realizar
uma leitura histórica, percebendo a realidade como construção histórica da
humanidade, fazer uma leitura complexa do mundo. Seffner alega que a
leitura e a escrita possibilitam um meio de retirar os indivíduos da exclusão
a que muito estão relegados: se apoderar da linguagem como instrumento
de pensamento, teorizar uma outra experiência social a partir de suas
próprias raízes, trabalhando a memória como forma de impedir o
esquecimento, de perceber-se pertencente a um grupo, a um espaço, a uma
história.
Seffner coloca que espera-se que um aluno leia em História,
diferentes documentos históricos, que o professor proporcione momentos
de leitura individual e silenciosa, que essa vá além dos livros didáticos, que
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passe pela narração, bem como pela prática da contação de histórias.
E o que se espera que um aluno escreva em História? Seffner nos
coloca esta questão e argumenta que “ler é compreender o mundo e
escrever é buscar intervir na sua modificação”. O ato de escrever deve ser
exercitado de diferentes maneiras, partindo, por exemplo, da descrição de
situações e cenários históricos, reflexões de cenas cotidianas, organização
de linhas do tempo, discutir e solicitar uma produção escrita; para que o
trabalho não seja esquecido, consumido pelo tempo, é preciso registrar
nossas conclusões, nossas idéias, até mesmo para que possamos retornar,
retificar, reconhecer conquistas, reconhecer retrocessos, perceber
mudanças, permanências, resistências, ou seja, ampliar nosso
conhecimento do mundo.
Marcos Napolitano chama a atenção para o mundo contemporâneo
mergulhado em imagens e sons, situação esta, que não deve ser ignorada
pelos historiadores e sim desafiadoramente utilizada. Estas fontes devem
ser analisadas em suas estruturas internas de linguagem a partir de seus
códigos internos, atentando-se à impressão de uma adesão imediata da
realidade e o registro em si, que não é neutro, ela é uma construção social.
Esta tensão entre subjetividade e objetividade no registro documental
marca as fontes históricas de natureza audiovisual e musical.
DEFINIÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO
A disciplina de História deve buscar possibilidades de novos
questionamentos sobre o passado, valorizando a trajetória de luta e
transformação social. Valorizando os conteúdos estruturantes como uma
organização, jamais pretensamente neutra; como saberes historicamente
construídos e considerados fundamentais para a compreensão de uma
disciplina escolar, é que se coloca a importância da discussão referente à
questão da mulher, vista como parte de experiências cotidianas comuns,
que leva a representações de comportamentos, valores, condutas,
costumes que irão constituir nossa concepção histórica da realidade que
nos cerca. (DIRETRIZES CURRICULARES, 2006: 32)
Analisando a questão feminina pelo enfoque das dimensões
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econômico-social e cultura, o recorte feito, não é fechado em si, mas
articulado a movimentos de inter-relações, rompendo com o ensino
centrado nos “grandes homens”. Ressalta-se a necessidade de inserir o
sujeito comum, buscando um novo olhar sobre o presente.
Dos conteúdos estruturantes derivam os conteúdos específicos que
formam o trabalho pedagógico e a relação ensino-aprendizagem no
cotidiano escolar, e o tema sobre a presença feminina tem pleno campo de
intervenção em todas as séries do ensino fundamental, mas neste projeto
de trabalho, privilegiou-se a 8ª. Série: “Repensando a nacionalidade: do
século XX ao século XXI – elementos constitutivos da contemporaneidade”,
sublinhando a importância de discorrer acerca de problemas
contemporâneos, daqueles que representam demandas sociais e que
merecem ser desconstruídos atribuindo significado ao que se aprende,
constituindo numa aprendizagem significativa. (DIRETRIZES CURRICULARES,
2006: 39)
Alicerçando os estudos na concepção de uma história das
experiências ligadas ao cotidiano e ao (in) visível a ser debatido “os direitos
de cidadania das mulheres e as condições para o exercício são questões
centrais da democracia, e não apenas questões das mulheres”
(www.mulheresnobrasil.org.br acesso em 26/06/207); verifica-se aqui que a
história das minorias é a possibilidade de introduzir no ambiente escolar os
preceitos legais e humanos que ainda hoje permanecem no papel ou no
discurso vago daqueles que pretensamente consideram-se além dos
preconceitos existentes nos espaços públicos e privados.
Assim, nas últimas décadas, o mundo passou a discutir a cidadania
feminina e as relações de gênero como uma concepção dos direitos
humanos.
As desigualdades de gênero e os preconceitos são muitos e para uma
sociedade que pretenda levar em consideração um conceito plural de
sujeitos de direitos, vê-se a extrema importância do conteúdo especificado
neste trabalho. Ao aluno em sala de aula projeta-se a desconstrução e o
diálogo sobre algo latente, sobre idéias e conceitos preconceituosos e
discriminatórios, onde as mulheres partem para a luta política pelos direitos
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e transformação de realidades como estas, as péssimas condições de vida e
de acesso a políticas públicas; a violência, geradora de insegurança e medo;
a dupla jornada de trabalho; o mercado de trabalho; a ótica sexista e
discriminatória. (www.mulheresnobrasil.org.br acesso em 26/06/2007)
Situar historicamente o aluno é uma necessidade quando se pretende
fazer uma intervenção em sala se aula, portanto, o questionamento repousa
em conhecer o cotidiano feminino num período específico da história do
Paraná, num recorte temporal necessário que se faz entre os anos de 1940
e 1960, uma vez que os documentos históricos (as fotografias) utilizadas
neste trabalho nos permitem utilizar este período de estudo, ou seja, dão
conta de discutir a temática feminina através de imagens.
O Paraná e o recorte temporal de 1940 a 1960:
Para melhor compreensão do recorte temporal do projeto faz-se
necessário situar historicamente o Paraná dentro do período de 1940 a
1960, para isso foi realizado um estudo panorâmico da Coleção Histórica do
Paraná, elaborada por professores doutores da Universidade Federal do
Paraná, em específico os volumes 4 e 5 elaborados, respectivamente, por
Marion Brephol de Magalhães e Dennison de Oliveira.
Segundo Magalhães, a conjuntura que se apresenta no Paraná nas
décadas de 1950 e 1960 subordina-se ao modelo político adotado pelo
governo central, conhecido como “era desenvolvimentista”, uma
experiência de prosperidade aliada à democracia e ampliação da
participação popular.
O período que se estende de 1946 a 1960 foi uma longa experiência
democrática da República Brasileira, onde os partidos tendiam a preparar
quadros para o Executivo e não a de organizar as vontades coletivas e o
Paraná neste período não apresentou profundas mudanças no quadro da
administração pública. (MAGALHÃES, 2001:55)
Moysés Lupion (1947 - primeiro governador eleito), portador de um
discurso popular, representava a renovação, contudo mostrou-se um político
inescrupuloso, acusado de estar cercado de corruptos.
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Em 1950 é eleito Bento Munhoz da Rocha Neto, que implanta uma
época de produção de idéias, conferindo ao Paraná sua primeira identidade
e inserindo-o no contexto nacional, porém foi considerado elitista devido a
sua dedicação excessiva à capital – Curitiba.
O surto de progresso dos anos de 1940 e 1950 é definido por Bento
como um “espetáculo de prosperidade”, oportunidade de o Paraná sair de
seu confinamento provinciano. A participação paranaense na economia
brasileira era assegurada pela condição de grande produtor de café.
(MAGALHÃES, 2001:57)
Embora o Estado passasse por momentos de agitações sociais, os
políticos procuravam veicular uma imagem de tranqüilidade e progresso,
buscando assim atrair capital e mão-de-obra. O ritmo de produção leva à
necessidade de mão-de-obra, o que leva à estruturação do processo de
imigração.
Ainda citando Magalhães, outras preocupações se colocam como
imperativo para a modernização do Estado: a saúde pública, a segurança
pública (moralização dos costumes), malha viária, espaço de poder (Centro
Cívico de Curitiba). Essas medidas se apóiam na noção de um governo
científico e racional, governo que se pretende moderno e democrático.
Segundo Dennison de Oliveira, por volta de 1860, fazendeiros
paulistas e mineiros começam a ocupar a região do Norte pioneiro, que
acabou tendo o escoamento de sua produção e abastecimento vinculado a
São Paulo até 1924, quando o Porto de Paranaguá começa a funcionar.
A colonização da região do Norte Novo esteve a cargo da Companhia
de Terras do Norte do Paraná (inglesa) com venda de lotes a pequenos e
médios fazendeiros interessados no cultivo do café. Esta iniciativa fez a
população paranaense quase dobrar de tamanho entre 1940 e 1950 e entre
1950 e 1960 dobra de novo. Em 1960, estimulado pela cafeicultura, a
região do Norte Novíssimo é ocupado. (OLIVEIRA, 2001:34)
O auge do ciclo cafeeiro acontece em 1952 e diversas atividades de
suporte a cafeicultura se ampliam.
O projeto de democratização do acesso a terra (pequenas e médias
propriedades) deixa de existir entre as décadas de 1970 e 1980 com a
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concentração fundiária.
Entre 1950 e 1990, Dennison coloca que o número de núcleo que
foram alçados à condição de municípios no Paraná cresce espantosamente.
Claro que estas novas municipalidades estão ligadas a interesses políticos
em geral e eleitorais em particular.
No início da década de 1960 o ciclo cafeeiro começa a dar sinais de
esgotamento, motivado pelo excesso de oferta do produto, o confisco
cambial dos lucros dos cafeicultores (governo de J.K), as geadas. Como
alternativa ao café, a maioria dos grandes proprietários rurais adotou a
cultura da soja, o que irá marcar a década de 1970. (OLIVEIRA, 2001:36)
Documento histórico: a fotografia.
O trabalho de documentação histórica é de suma importância quando
este pretende dar visualidade a uma categoria que foi excluída da história
local e esquecida pela memória hegemônica, pois a mulher foi excluída,
primeiramente, ao nível do relato, que privilegiou os acontecimentos
políticos e econômicos, a partir da tematização da ação transformadora e
dos poderes masculinos e depois esta “memória feminina é sempre
reconstituída como flashes e lembradas como mãe, esposas, filhas e netas”
(CASTRO, 1994: 50), objetivando este estudo a fotografia é uma (re)
construção da realidade que se projeta sobre o passado e também sobre o
futuro.
A fotografia carrega em si uma intencionalidade, aquilo que se
pretende mostrar, o que deseja esconder, é um tempo de exposição, mas
também tempo social onde o indivíduo representa o seu papel num
determinado cenário, onde a composição desse espaço, desse momento,
são atributos do fotógrafo que muitas vezes escolhe o que quer que seja
visto (TURAZZI,1995: 309). Jamais se pode, portanto, acreditar que a
fotografia é cópia fiel da realidade, pois sendo uma construção, a imagem
segue uma orientação, uma ideologia. Hoje nos obrigamos a olhar para o
que não queremos ver, pois o ato fotográfico é antes de tudo um ato de
interpretação, são escolhas e olhares.
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Em seus trabalhos, Maria Ciavatta indica que a renovação na visão
dos fatos proporcionou a História se utilizar de fontes alternativas ao
documento escrito, como é o caso da fotografia, esta fonte que detém uma
fração mínima do continuum do tempo e altera a percepção do movimento
no ato de sua produção.
A autora trabalha em seu texto “O mundo do trabalho em imagens”
fazendo seus escritos através dos diferentes olhares sob a imagem
fotográfica como representação, como construção da memória.
Maria Ciavatta, em seu propósito de trabalho com a fotografia e o
mundo do trabalho, propõe um estudo das fotografias que atenda a quatro
aspectos importantes: a) fotografia enquanto produção de determinado
grupo de sujeitos sociais; b) fotografia enquanto prática sociocultural
decorrente de transformações tecnológicas e ideológicas de um período
histórico; c) fotografia enquanto representação sujeita a certa ordem de
uso, funções, multiplicação e circulação; d) fotografia enquanto prática de
construção de memória e identidade.
Segundo Ciavatta, a fotografia também pode servir como canal de
legitimação do poder, sendo preciso então, conceitos fundamentais para a
análise: cultura, ideologia, hegemonia e poder.
Quando o estudo se volta para a questão da memória Ciavatta
reconhece o significado da memória fotográfica enquanto forma de
transmissão e manutenção da memória de uma família ou de uma
coletividade. Na memória coletiva, principalmente dos marginalizados, a
fotografia serve ao princípio de consolidação de uma história, na
preservação ou no esquecimento.
Falando sobre as mulheres.
Em seu artigo “Por que pesquisar-ensino História sob a perspectiva
das relações de gênero”, Andréa F. Delgado coloca a problemática feminina
confinada na esfera do privado e busca em seu trabalho delinear questões
como gênero e poder, gênero e cotidiano.
Segundo Delgado, o conteúdo do que é “ser homem”, “ser mulher” é
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resultado de conflitos e confrontos que atingem todos os domínios da vida
em sociedade, o que irá determinar práticas diferenciadas entre os gêneros
e relações de poder baseadas nas diferenças entre os sexos.
Na experiência com alunos do Ensino Médio (Goiás) as relações de
gênero serviram de pano de fundo para as discussões em sala de aula e
Andréa Delgado não pôde escapar da percepção dos preconceitos e
estereótipos, algumas vezes, verbalizados e outras percebidas nos “sorrisos
e caras marotas” (DELGADO, 1997:43) e agradavelmente nos
questionamentos das permanências e mudanças observadas na construção
do gênero que os alunos vivem ou observam no presente.
Outra historiadora, Maria de Fátima da Cunha, também dá sua
contribuição na questão do estudo do gênero quando em seu artigo “Mulher
e historiografia: da visibilidade à diferença” a autora trata do resgate do
feminino preso à representação do ser despossuído de identidade, reflexo
do homem.
Segundo Cunha, a tradição narrativa sempre mostrou a mulher como
tentadora, ser ligado à carne, ao prazer, à luxúria, demônio, força do mal,
pecadora e sempre relegada a segundo plano na História. E isto começa a
se modificar, especialmente com a História das Mentalidades, com
preocupações voltadas para o popular o que permitiu uma abertura para a
história da mulher, tomando o devido cuidado em não fazer uma história
que faz da mulher uma vítima.
Assim, Maria de Fátima da Cunha, atenta para uma narrativa que
geralmente privilegia a política e a guerra, que são historicamente locais
masculinos. Quando a narrativa feminina aparece é principalmente nos
arquivos privados (correspondências e diários), já que os arquivos públicos,
organizados por homens, acabam realizando uma seleção que exclui o
feminino. Quando as mulheres ultrapassam o espaço privado são para
aparecerem pelo sucesso de suas profissões, casamento ou pelo caminho
da prostituição, criminalidade ou loucura.
Para Cunha, na visão marxista (de esquerda) havia uma expectativa
de que as mulheres “se libertariam da opressão quando, juntas com os
homens, na condição de trabalhadoras assalariadas rompessem suas
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amarras ao se incorporarem ao mercado de trabalho” (CUNHA, 2000: 148) o
que não ocorreu e a mulher acabou sendo duplamente útil ao capital:
trabalhadora e mãe/esposa.
É importante colocar a idéia de Hobsbawm e Hill, citado por Cunha,
onde os historiadores propõem a História vista de baixo que rompe a idéia
de se estudar a historiografia apenas pelo pólo opressor-oprimido e passar a
pensar os sujeitos da história enquanto sujeitos políticos. A História das
mulheres apreciou esta vertente de estudo.
No final do século XX toda uma gama de assuntos sobre o universo
feminino permite uma abrangência maior no estudo da História da mulher.
Esta colocação feita por Beatriz Nader em seu artigo “Reclusão biológica e
transgressão feminina: a mulher entre dois destinos”, apresenta um
contexto que procura situar o papel da mulher na sociedade patriarcal e na
sociedade contemporânea.
Pensando assim, os estudos de Nader, apresentados no artigo
dividem-se em dois tempos. Primeiramente a mulher na sociedade
patriarcal, considerada como um ser dependente do homem, o que acaba
acarretando a restrição de seu papel e a prática de subordinação ideológica
ao poder masculino. Em segundo, o destino transgredido, ou seja, mulheres
pobres que são obrigadas a trabalhar recebendo menores salários e menos
chances de trabalho, principalmente graças aos preconceitos por parte dos
homens.
O espaço público para as mulheres passa a ser visto como amoral,
mas por força da necessidade econômica, as mulheres permanecem no
mercado de trabalho e começam a se unir em grupos e associações e a
reivindicar seus direitos, dando início aos movimentos feministas.
As grandes guerras mundiais ocorridas no século XX mobilizaram
milhões de mulheres para o trabalho e após as guerras muitas questões
femininas defendidas se ampliam, agora as reivindicações são sexistas e
raciais. Até mesmo as relações de marido e esposa também se modificam.
A leitura do trabalho de Maurício Roberto da Silva sobre as meninas-
mulheres e mulheres-meninas da zona da mata canavieira pernambucana é
de grande valia, pois busca dar visibilidade às suas trajetórias de vida no
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trabalho e no lúdico. O autor coloca que são mulheres trabalhadoras, pobres
e analfabetas que não constam nos inventários ou livros de memórias, não
havendo registro que testemunhe sua relevância social, suas histórias de
luta pela sobrevivência.
Ao finalizar seus estudos, o autor coloca uma construção importante:
“(...) pensar políticas públicas que tenham como epicentro o tecido familiar,
as superações das opressões de classe e gênero, visando a revisão e
construção de outros caminhos e trajetórias (...)” (SILVA, 2002: 46)
OS ALUNOS E O ENSINO DE HISTÓRIA
Peter Lee apresenta em seus escritos sobre a “progressão da
compreensão dos alunos em História” na Inglaterra e no Reino Unido, um
receio surgido nos anos sessenta quanto aos alunos deixarem de estudar
História, o que acabou ocorrendo.
Buscando reverter esta situação, procura-se então ensinar História em
termos históricos, o que acarretou mudanças na disciplina e novas idéias
sobre o ensino de História.
Foi preciso falar de situações específicas do passado e sua devida
interpretação, não apenas fornecer informação, mas investigar diferentes
fatos e considerações até chegarem a algumas conclusões, compreendendo
que a “História” não pára nos testemunhos (LEE, 2001: p)
O Projeto Chata (Concepts of History and Teaching Aprroaches) serviu
como estudo investigativo em cognição histórica onde foram apresentadas
diferentes histórias sobre um mesmo acontecimento sobre o estudo
proposto. As respostas obtidas permitiram perceber que há alunos que já
sabem que as histórias são construções, fruto de seleção, separando-se da
postura de relativismo global.
Em um outro artigo intitulado “Em direção a um conceito de literacia
história”, Peter Lee expressa duas preocupações referentes a educação
histórica: como desenvolver a compreensão dos alunos no ensino de
História e o que os alunos deveriam saber sobre o passado. De acordo com
Peter Lee o conhecimento histórico não é um acumulado de eventos
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descontínuos, portanto, para se ter uma idéia dos tipos de idéia sobre
história que os alunos conseguem reter é necessário termos uma noção de
literacia histórica. Para tanto, o mesmo autor se volta para as noção de
Riisen e a consciência histórica, marcadamente ressaltando que a “tarefa da
história é nos fornecer um senso da nossa própria identidade”. Esta
consideração de Riisen sugere a construção de um conceito de literacia
histórica, (que se constituiria na habilidade de compreensão do passado
pelo aluno) considerando que o aluno deva entender que a história deve ser
sempre uma indagação, entendendo que o conhecimento histórico é
possível, que a explicação de ações requer a reconstrução das crenças e por
fim, que as considerações históricas não são cópias do passado.
Numa história como contra-intuitiva é preciso conhecer quais as
idéias, pré-noções, pré-conceitos que nossos alunos já trazem sobre como
funciona o mundo. Para tanto, Lee realiza uma pesquisa com alunos de 10 a
14 anos da Inglaterra e algumas idéias básicas foram possíveis serem
demarcadas. Primeiramente, que muitos alunos vêem o passado como
permanente, a segunda idéia é de que só poderíamos saber sobre o
passado se estivéssemos lá quando aconteceu, ou seja, conhecimento pela
experiência. Em terceiro, está a idéia de que os fatos são constituídos de
evento ou ações localizadas no tempo e no espaço. E finalmente, os alunos
apresentaram a idéia de que aquilo que os historiadores dizem é “testável”.
Segundo Peter Lee, este conjunto de idéias tornam a história
impossível, embora funcionem na vida diária. Portanto, estas idéias levam
os alunos a tratarem a história como cópia de um passado fixo, não
percebendo que o passado muda com a ocorrência de novos eventos e
processos.
Novamente, o autor se volta para a pesquisa com alunos e agora as
respostas oferecem alguns apontamentos para discussão: os entrevistados
acreditam que a história ajuda-os a tomar decisões no presente, por
acreditar que compreender direções e tempo estendido são necessárias
para ajudar nas decisões atuais, e outros, que a história não ajudaria na
tomada de decisões diárias, pois, as coisas mudam.
Para o autor, os alunos podem e devem fazer suas próprias perguntas,
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o que leva a fazer conexões mais complexas, gerando um trabalho com
novas indagações.
Percorrendo o caminho de Peter Lee, Izabel Barca analisa o caráter
provisório do conhecimento histórico em seu artigo “Concepções de
adolescentes sobre múltiplas explicações em História”. Visões diferentes
apresentadas por teóricos possibilitam algumas considerações: as
conclusões históricas são apenas interpretações, não sendo possível serem
confirmadas ou rejeitadas; as explicações históricas são sempre
construções a partir de um ponto de vista particular, ou seja, revelam juízos
de valor; no realismo crítico as explicações históricas são provisórias porque
estão em constante mudança; no realismo céptico os teóricos negam a
possibilidade de conhecimento do real para lá do discurso, sendo a História
apenas uma narrativa.
A referida autora realizou uma pesquisa para responder à seguinte
pergunta de investigação: “Que idéias apresentam os alunos adolescentes
sobre a existência de diversas respostas históricas a uma questão concreta
sobre o passado?”
Neste estudo foram apresentadas quatro versões históricas sobre
uma questão e o que se pôde concluir é que alguns alunos raciocinaram
dentro de um modo descritivo mais ou menos coerente ou dentro de um
modo explicativo restrito. Nas idéias mais elaboradas a multiplicidade de
perspectivas é visto como meio de enriquecimento do saber.
Na construção de um modelo de idéias dos alunos sobre a
provisoriedade da explicação histórica percebe-se que nas séries iniciais a
preocupação está centrada na quantidade de fatores, sendo que alguns
alunos das séries finais demonstraram idéias de aceitação da perspectiva
em História.
Izabel Barca expõe em suas conclusões, a necessidade de
argumentação em torno de versões e fontes históricas diversificadas, uma
que “a História dá respostas provisórias porque pode haver pontos de vistas
diferentes, utilizando as mesmas fontes, e porque vamos descobrindo novas
relações sobre o passado, novas perspectivas”. (BARCA, 2001: 39). É uma
excelente forma de estimular o raciocínio, de desenvolver competências de
16
seleção e organização da informação.
No artigo proposto por Maria do Céu de Melo, a mesma, faz uma
investigação sobre o conhecimento tácito dos alunos que funciona como
uma fonte de hipóteses explicativas para compreender o passado. A autora
discute em seus escritos algumas características do conhecimento tácito
como sendo baseadas nas experiências e vivências pessoais; muitas destas
idéias estão no campo das crenças, enraizadas e de permanência de longa
duração, o que explica a dificuldade de mudança de auto-crítica; são idéias
de fácil recordação e possuidoras de mecanismo de auto-alimentação e
legitimação/reprodução.
Maria do Céu de Melo discute o conhecimento tácito dos alunos sobre
escravatura utilizando alguns instrumentos: entrevista sobre o
Conhecimento Tácito Substantivo Histórico, exercícios de empatia e
entrevista pós-exercício empático. Isto irá permitir a construção de um
padrão de idéias substantivas sobre a escravatura, como a mesma ser vista
como uma situação individual, marcada pela ausência de liberdade de
expressão e ação; também estabelecem relações entre a escravatura e as
necessidades econômicas de desenvolvimento das sociedades
escravagistas; foram também detectadas idéias em que a escravatura é
definida em termos econômicos na base da discussão trabalho x salário e
na ausência de direitos humanos.
Rüsen apresenta em seu artigo “El desarrollo de la competencia
narrativa en el aprendizaje histórico. Uma hipótesis ontogenética relativa a
la conciencia moral” uma discussão, em que o mesmo, coloca que o curso
das ações depende dos valores morais que o indivíduo possui como
princípios determinantes, sendo a consciência histórica considerada um pré-
requisito necessário, pois serve como orientação e ajuda-nos a
compreender a realidade presente.
A referência que temos do tempo futuro está imbuída de nossa
interpretação histórica do presente, o que nos leva a ações baseadas nestas
referências.
De acordo com Rüsen, a consciência histórica tem uma função na vida
prática: ela serve como elemento orientativo, dando a vida uma matriz
17
temporal, uma concepção do curso do tempo que flui na vida cotidiana,
dando a esta um curso de ações. A história seria um espelho da realidade
passada, na qual o presente se volta para aprender algo, criando
expectativas de acontecimentos futuros.
Segundo o mesmo autor, a consciência histórica é marcada pela
competência da experiência, quando o indivíduo aprende a olhar o passado
e resgatar sua qualidade temporal, caracterizada também pela competência
da interpretação, onde o indivíduo percebe diferenças de tempo entre o
passado, presente e futuro através de um todo temporal significante; e
finalmente a competência para a orientação histórica, onde se supõe que o
indivíduo seja capaz de utilizar este todo temporal, seu conteúdo histórico
para orientar sua vida.
Rüsen explicita que o desenvolvimento da consciência histórica
apresenta quatro tipos: a) tradicional: as tradições são indispensáveis
dentro da vida prática, uma vez que apresente uma totalidade temporal,
uma continuidade dos modelos de vida e modelos culturais, definindo a
moral como uma estabilidade inquestionada; b) exemplar: implica na
aplicação de regras prováveis que advém do passado a situações atuais,
revelando um sistema de valores culturalmente materializados na vida
social; c) crítico: desacreditar da realidade passada e apresentar uma nova
interpretação usando da razão histórica, oferecendo uma contra-narração
que desacredite a anterior, sendo desses pontos de vista históricos que se
pode orientar temporalmente as ações, constituindo a identidade do
indivíduo; d) genético: não há negação da história, porém, é preciso
interpretar os acontecimentos de uma forma moderna de moral,
percebendo que as formas de vida e cultura evoluem.
Na tipologia proposta por Rüsen o autor expõe que é possível
perceber que os modos exemplar e tradicional ocorrem com mais
freqüência, ou seja, estamos mais dispostos a basear nossas ações na
continuidade de modelos culturais já existentes ou em valores que se
cristalizaram na vida social. Isto acontece devido ao grau de conhecimento
que pode determinar a vigência de um tipo de consciência história.
As formas tradicionais de pensamento são mais fáceis de aprender, as
18
de forma exemplar dominam o currículo de ensino de história, já que as
formas críticas e genéticas requerem esforço maior.
A aprendizagem histórica, na concepção de Rüsen seria um processo
de digestão de experiências do tempo em forma de competências
narrativas, ou seja, a habilidade de narrar uma história da vida real que
segue uma orientação temporal.
As competências, segundo o autor, se adquirem progressivamente
passando das formas tradicionais ao pensamento genético.
Em um outro texto de Rüsen “Didática da História: passado, presente
e perspectivas a partir do caso alemão”, o autor expõe a trajetória histórica
da didática da história na Alemanha, iniciando sua escrita com a idéia
errônea que se tem da didática da história, onde se acredita que a mesma é
uma abordagem formalizada para ensinar história em escolas primárias e
secundárias, acreditando-se que ela faz uma mediação entre o que é
pesquisado nas academias e o que é ensinado nas escolas.
Rüsen destaca que até os anos 1950, a didática na Alemanha
Ocidental era considerada uma disciplina independente, constituída por
forças mentais que o historiador pode repensar ou apropriar. Sendo que, “a
história formal não se dirigia à essência do saber histórico escolar,
diretamente”, (RÜSEN, 2006: 7) havendo, portanto, uma recusa em aceitar
que a história possuía um uso prático, servir como meio de identidade
coletiva.
Os currículos primários, nos estudos de Rüsen, passaram a ser
resumos simplificados dos estudos em História, uma reprodução do que a
academia produzia. Porém, a partir dos anos 1960 e 1970 muitas idéias se
modificam e a história passa a ser concebida como uma ciência que possui
muita proximidade com outras.
Nos anos 1970, Rüsen percebe que floresceu na Alemanha uma
didática da história que acabou se aproximando a pedagogia. Se
contrapondo a essa idéia surge uma nova concepção que busca transformar
a história numa ciência social histórica, que anseia todas as formas e
funções do raciocínio e conhecimento histórico na vida cotidiana.
Na década de 1980, Rüsen aborda quatro pontos que permeiam as
19
discussões na Alemanha: primeiro na metodologia de instrução, segundo
nas funções e os usos da história na vida pública, terceiro, no
estabelecimento de metas para a educação histórica nas escolas e a
verificação se estas têm sido atingidas, e o quarto ponto seria a análise
geral da natureza, função e importância da consciência história.
No primeiro ponto percebe-se que o próprio professor não tem
consciência do que está realmente realizando em todo o processo, o que
ocorre é um distanciamento no treinamento formal que este professor
recebe na prática do ensino de história.
Ao final de seu texto o autor propõe uma definição clara e concisa do
objeto de pesquisa da didática da história que é investigar o aprendizado
histórico, pressupondo que o ensino de história está intimamente ligado ao
aprendizado e que este é meio para que o indivíduo se oriente na vida e
forma sua identidade histórica, sendo importantíssimo que a disciplina de
história busque a experiência e a interpretação com conexões com a vida
cotidiana.
CONHECIMENTO PRÉVIO... CONHECENDO
É importante destacar neste momento a discussão feita por Marco
Antônio Moreira em seu artigo “Aprendizagem significativa crítica” que
expressa a relevância de aprender levando em consideração aquilo que o
aluno já sabe, argumentando que a educação deva objetivar um novo tipo
de pessoa: flexível, criativa, inovadora, tolerante.
Segundo o autor, deve haver uma interação entre o novo
conhecimento e o conhecimento prévio, já que este influencia na
aprendizagem. O aluno identifica semelhanças e diferenças e reorganiza
seu conhecimento na medida em que alguns princípios como a
diferenciação progressiva, a organização seqüencial, a reconciliação
integradora, a consolidação e os organizadores prévios servem como
facilitadores da aprendizagem significativa.
Tomando o conhecimento como uma criação humana que facilita a
aprendizagem significativa crítica, segundo Moreira, quando: a) professor e
20
aluno compartilham significados e aprendem a fazer perguntas, a
questionar “verdades”; b) o ensino se apóia em outros materiais e não
apenas e unicamente no livro; c) o aluno é visto como um perceptor que
decide como representar em sua mente o que lhe foi ensinado e toma essa
decisão baseado em seu conhecimento prévio; d) a chave da compreensão
de um conhecimento é conhecer sua linguagem, uma nova maneira de
perceber o mundo; e) tomar consciência de que o significado está nas
pessoas que dão às palavras significados que se relacionam com suas
experiências; f) o conhecimento individual é construído superando erros,
percebendo que o conhecimento é provisório; g) o novo conhecimento
interage com o conhecimento prévio; h) a visão de mundo é construída
principalmente com as definições que criamos, com as perguntas que
formulamos e com as metáforas que utilizamos; i) diversidade de
estratégias instrucionais que impliquem participação ativa do estudante.
Moreira conclui reafirmando que o fator mais importante para a
aprendizagem significativa é o conhecimento prévio e foi seguindo este
pensamento que o trabalho de implementação em sala de aula do projeto
“A presença feminina na sociedade paranaense” buscou argumento para a
construção do conhecimento a partir do que o aluno já trazia de visão de
mundo, de conhecimento prévio e que desta maneira poderia interagir com
o novo conhecimento.
A intervenção deu-se no Colégio Estadual Conselheiro Carrão na
cidade de Assai, norte do Paraná, com três turmas da oitava série do ensino
fundamental, sendo duas do período matutino e uma do período vespertino,
num total de 81 alunos.
Com relação ao perfil destes alunos, alguns dados se fazem
necessário serem colocados: a maioria são meninas, na faixa etária entre 13
a 15 anos, moradores de diversas áreas da cidade, incluindo a zona rural,
sendo esta última numa porcentagem de 23%.
No questionamento sobre o entendimento sobre História, os alunos
(72,5%) acreditam que a mesma estuda o passado, havendo alguns alunos
que fizeram a conexão com o presente e perspectivas para o futuro.
Quando foram questionados sobre gostarem ou não de História os
21
mesmos deixaram claro que gostam (33,3%), justificando novamente
porque ela fala do passado, pessoas, conhecimentos, sendo interessante.
Consequentemente acham a disciplina de história fácil, com várias
justificativas, sendo a mais alegada a de que a professora as faz gostar da
disciplina, ensinando com competência e de modo divertido.
No item “Dê uma sugestão de como a História poderia ser mais
interessante”, 21,62% acreditam que aulas práticas com visitas a museus,
observatórios e outros locais onde também se aprende história, além dos
livros e sala de aula. Alguns alunos deixaram claro, sua dificuldade com
“palavras difíceis”.
O interesse maior dos alunos em questão de conteúdo, 28,20% está
na escravidão, 23,07% nas guerras e 15,38% na Revolução Industrial.
A aquisição de conhecimento está entre a maioria das justificativas da
importância de se estudar história. Uma porcentagem considerável
(54,76%) acredita que a história afeta o cotidiano dos mesmos e que
gostam de entender os por quês do hoje, que só podem ser entendidos a
partir da compreensão do passado.
Ainda neste bloco, os estudantes foram questionados no seu
conhecimento sobre história do Paraná e a constatação de que nossos
alunos apresentam uma grande deficiência no que se refere a história de
seu estado. Como o conteúdo fica a critério do professor fazer sua
introdução integrada, evidencia-se uma lacuna no que se refere a história
do Paraná.
A importância de se estudar a história do Paraná é expressa na
necessidade de se obter conhecimento e por morar aqui (82,92%).
A maioria dos alunos apresentou uma preocupação em conhecer todo
o processo de formação da Paraná e consequentemente sua colonização
inicial.
Quando estimulados a escreverem conteúdos considerados
importantes, uma porcentagem razoável (35,89%) não conseguiu listar, o
restante elencou conteúdos como: imigração, escravidão, história local,
tropeirismo, rios, localização geográfica, entre outros. E muitos desses
conteúdos foram repetidos na última questão “Liste 5 acontecimentos da
22
história do Paraná que você acha mais importante” , sendo que alguns não
conseguiram listar nada, outros listaram palavras soltas, sem nexo. Entre os
cinco mais listados temos: História local (17,18%), ciclos econômicos
(10,93%), fundações (10,15%), escravidão (8,96%) e índios (8,96%)
No segundo bloco de conhecimento prévio, o assunto abordado foi a
fotografia. O questionamento iniciou-se com a seguinte pergunta: “Você
acha possível aprender história através da fotografia? Como?”, a maioria
dos alunos acredita ser possível sim, alegando que ela pode explicar,
mostrar muitas coisas, acontecimentos. Interessante mostrar que houve
alunos que não vêem na fotografia um instrumento para aprender história,
os mesmos vêem apenas a escrita como forma de estudar história. Ao
mesmo tempo, na pergunta seguinte os alunos colocam que a fotografia
conta histórias de suas vidas, lembranças, momentos e acontecimentos.
Devido a aulas de Artes que tiveram recentemente, os alunos tinham
um conhecimento mais ou menos preciso sobre o período de surgimento da
fotografia.
Todos têm noção da mudança que a fotografia apresenta no aspecto
tecnológico (cor, tipo de máquina, tamanho), porém não citaram outras
modificações a não ser as óbvias.
Ao pedir que listassem cinco fotos da história de sua vida, os
estudantes citaram fotos de formatura, com os pais, melhor amigo,
aniversário, passeio, infância. Neste item foi possível conhecer melhor as
turmas, uma vez que os mesmos não apenas citaram as fotos, mas
justificaram, podendo assim, ser possível perceber dramas pessoais como a
morte, saudades, prisões, alunas casadas, famílias extensas, alguns já
viveram fora do país (interessantes para uma cidade pequena como Assaí),
seus passeios. Dois alunos fizeram referência à foto da carteira de
Identidade, o RG, como meio de independência, autonomia, maioridade,
sentir-ser “dono do próprio nariz”.
No terceiro bloco de questionamentos de conhecimento prévio o alvo
foi o conteúdo sobre as mulheres e assim algumas considerações foram
percebidas. Interessante foi perceber que os estudantes, embora tivessem
consciência da discriminação que as mulheres sofreram e sofrem, a grande
23
maioria alegou que as mulheres, nos bastidores, fizeram história,
participando dos eventos, principalmente locais e em períodos em que os
homens são obrigados a sair de cena e às mulheres coube tomar uma
atitude, como nas guerras, revoluções, pioneiras.
A discriminação é principalmente percebida pelos alunos no mercado
de trabalho (51,42%), fazendo também referência ao agravante da cor,
etnia, classe social.
Quando o assunto são os livros didáticos, 30,30% dos entrevistados
acreditam que os mesmos fazem referência às mulheres. Numa memória
muito recente, a primeira guerra mundial serviu como referência, sabendo
que o professor tem um papel importante no trabalho com as minorias
daqueles que estão à margem da História.
A indagação “quais mulheres você conhece e acha que deveriam
entrar na história e por quê”, a pesquisa mostrou que as mulheres do seu
cotidiano (mães, avós, professoras) deveriam entrar para a história devido à
suas batalhas diárias e por não serem valorizadas.
Os nomes de Maria Bonita (esposa do cangaceiro Lampião), Princesa
Izabel e Duvinha (também do cangaço), foram as mais citadas,
respectivamente 57,89%, 44,73% e 42,18%, quando lhes foi pedido que
listassem cinco nomes de mulheres importantes na História. Novamente,
fazendo referência a uma memória recente, percebe-se que o estudo sobre
a Primeira República, especificamente a questão do cangaço na história
brasileira os alunos citaram Maria Bonita e Duvinha.
Encerrando a etapa de investigação sobre o conhecimento prévio
sobre as mulheres, a última questão foi sobre a importância de se estudar a
história das mulheres, 98% afirmaram ser importante, porque as mesmas
fazem parte da história e merecem ser estudadas. A porcentagem restante,
numericamente 2 alunos (L . S, 14 anos e J. M. O, 16 anos) não acham
importante, por um motivo hoje tão desafiadoramente imposto a todo
professor: não gostar de ler. A fotografia poderá servir de instrumento de
leitura que foge da forma tradicional.
A implementação
24
Conhecer o passado nos permite compreender melhor a realidade,
descobrir os limites, as potencialidades e as conseqüências dos atos
humanos. Pensando assim e tendo a sala como um espaço privilegiado de
transmissão, de discutir certezas e preocupações, os desafios cotidianos, é
que o trabalho de intervenção intitulado “A presença feminina na sociedade
paranaense através de fotografias (1940-1960)” se desenvolveu nas turmas
de 8ª. séries do Colégio Estadual Conselheiro Carrão, na cidade de Assaí,
norte do Paraná.
Foram aproximadamente 64 horas onde o trabalho foi didaticamente
dividido em três blocos: História do Paraná, fotografia e presença feminina.
É importante salientar que o saber que o aluno já possui sobre o conteúdo é
passo essencial para todo o trabalho e foi pensando assim, que os alunos
inicialmente preencheram em duplas um questionário de conhecimento
prévio.
Para início sobre História do Paraná foi utilizado as lâminas de
projeção confeccionados no período de comemoração do Sesquicentenário
de Emancipação Política do Paraná, juntamente com outras que retratavam
momentos marcantes da História do Paraná, desde sua formação até a
década de 1960. O debate sobre os principais acontecimentos ocorreu
paralelo à atividade com a linha do tempo. Percebe-se que o conteúdo
caminhou com a fonte documental imagética.
Neste bloco foi possível perceber um interesse em conhecer a história
que lhe é mais próxima, pois a todo momento, era realizado um ir e vir, um
transitar entre a história do estado e a local. Nesta oportunidade os alunos
já foram capazes de perceber que a fotografia é apenas um olhar sobre o
fato, que a mesma é uma construção.
Quando o conteúdo sobre fotografia foi inserido os alunos já tinham
um arcabouço de dúvidas e questionamentos que puderam ser melhor
trabalhados com a introdução de um roteiro de análise de fotografia:
Roteiro Básico para leitura de uma imagem:
1. Localizar:
- Onde se passa a imagem?
25
- Quem aparece na foto escolhida?
- Por quê? Qual teria sido a intenção da fotografia?
- Como? Quem é o autor?
- De quem? (Propriedade)
- Quando?
- Qual espaço está sendo mostrado?
- Quais aspectos de hoje aparecem na fotografia?
2. Apreciação da fotografia:
Conduzir a conversa ou propor escrita em grupo sobre:
- O que você está vendo?
- O que mais chama sua atenção?
- Como são as pessoas? Que idade parecem ter? Como se vestem?
- Existe algum personagem que se destaque? Há alguma pessoa escondida?
- O que os personagens estão fazendo?
- Que profissão é essa?
- Que habilidades demonstram ter? Parece ser um trabalho cansativo?
- Como é o lugar?
- Há detalhes na fotografia? Quais?
- Quais personagens estão em primeiro plano na imagem?
(Os questionamentos feitos devem ser adaptados à fotografia em análise).
Como forma de expansão e discussão um breve histórico sobre a
história da fotografia foi apresentado e trabalhado com o intuito de alcançar
referenciais históricos para uma melhor compreensão do trabalho.
Inicialmente foi utilizado uma fotografia dos anos 1950 e questionamentos
foram feitos a seu respeito: semelhanças, diferenças, permanências,
mudanças e inúmeras dúvidas suscitadas a partir da fotografia.
Tanto no trabalho com a história do Paraná, e agora com a fonte
documental fotografia, o foco sempre foi a presença feminina, portanto,
voltando ao assunto “mulheres” mas, as imagens passaram a ser
analisadas mediante o roteiro já apresentado,. Partindo da história local, as
fotografias retratam um casal de trabalhadores capinando e a outra uma
mulher com vestimenta do trabalho na roça realizando tarefas domésticas.
Também aqui as lâminas de projeção comemorativas do Sesquicentenário
26
de Emancipação Política do Paraná foram usadas, porém com um olhar mais
apurado.
Deve-se salientar neste momento que a fotografia possui uma
intencionalidade, sendo uma construção humana e que os alunos foram
levados a repensar suas idéias cristalizadas sobre a fotografia ser uma
cópia fiel da realidade.
O Colégio Estadual Conselheiro Carrão está presente no município
desde a década de 1940 e o mesmo possui em seus empoeirados armários
antigas lembranças de formatura com fotografias, com um formato estético
bastante incomum para a época atual, confeccionados no período de 1940 a
1970. Este material foi também explorado, o que despertou a curiosidade
dos alunos, percepções e questionamentos: maior número de homens em
cursos considerados masculinos para a época; maior número de mulheres
nos cursos de magistério; poucos alunos formandos; maioria de origem
japonesa, pessoas conhecidas; motivo para se fazer aquele tipo de
lembrança...
O último bloco de estudos e trabalho passou a ser a questão feminina,
que a todo o momento permeou o trabalho. Como forma de provocação, foi
distribuído no corredor de acesso de todos os alunos frases retiradas de
revistas femininas das décadas de 1940 e 1960, tais como: “Não se deve
irritar o homem com ciúmes e dúvidas". (Jornal das Moças, 1957), "Se
desconfiar da infidelidade do marido, a esposa deve redobrar seu carinho e
provas de afeto, sem questioná-lo". (Revista Claudia, 1962) e "O lugar de
mulher é no lar. O trabalho fora de casa masculiniza". (Revista Querida,
1955).
Então, o trabalho antes restrito às três salas destinadas à
implementação do projeto, passou a ser também alvo de debate em toda a
escola e estes questionamentos foram transportados para as salas de aula
de 8ª. séries através de lâminas de projeção que serviram de meio para a
desconstrução de algumas idéias, para a exposição de conhecimentos
prévios, para levantar permanências e mudanças e produções escritas.
Novamente foi utilizada a linha do tempo para a discussão das
conquistas femininas percebidas no recorte temporal; análise de fotografia
27
tendo como base o roteiro já visto anteriormente; estudos de casos como as
guerrilheiras do regime militar (Iara Iavelberg, Áurea Pereira Valadão, Aurora
Maria nascimento Furtado); das mulheres pobres e obrigadas a entrarem no
mercado de trabalho; a educação feminina. Um dos objetivos essenciais foi
desnaturalizar idéias, conceitos, que de tão repetidos parecem ser
verdadeiros, mas que precisam ser questionados, analisados como
construções humanas e que, portanto, servem aos interesses de alguém.
O mesmo questionário aplicado no início da implementação foi
novamente apresentado aos alunos para desta forma, possibilitar a
observância de mudanças, percepções, permanências, ou seja, se
realmente o trabalho desenvolvido surtiu o efeito desejado.
Pós- implementação: discutindo resultados
Sabe-se que estudar história, interpretá-la, ensiná-la não é uma tarefa
fácil e o trabalho de intervenção em sala de aula partiu do pressuposto de
que o passado deve ser interrogado a partir de questões que nos inquietam
no presente, portanto, a história das mulheres é um compromisso com o
hoje, em se colocar no lugar do outro, perceber rupturas e permanências,
diferenças e semelhanças, temporalidades.
Após o trabalho em sala de aula, espaço privilegiado de transmissão
de idéias, de discussão, novo questionário agora pós-intervenção foi
aplicado com os mesmos alunos, objetivando perceber, analisar, mesmo de
forma limitada e primária, o que os alunos puderam apreender e construir,
se modificações ocorreram ou não.
Com base comparativa nos questionários de conhecimento prévio, os
questionários pós-implementação em sala de aula, os alunos apresentaram
algumas mudanças significativas e outras permaneceram.
No tocante, a história do Paraná, houve uma grande abertura e
diversidade de conteúdos que os alunos gostariam de aprender mais. Bem
diferente da constatação antes da implementação, os estudantes citaram
mais de vinte conteúdos, sendo o tropeirismo (19,35%), atuação feminina
(11,82%) e o cultivo do café (9,67%). Como o trabalho com imagens
28
permeou todo o trabalho pode-se constatar que os conteúdos onde a
fotografia foi trabalhada como um olhar, um dos fragmentos do que se
poderia estudar, os alunos demonstraram interesse em aprender mais,
despertando-se para questionamentos e dúvidas.
A maioria vê no conhecimento e no sentimento de pertencimento a
importância de se aprender a história do Paraná. Um dos alunos alegou que
sendo paranaense, seria “uma vergonha não conhecer a história do meu
estado” (M. I , 13 anos). Interessante ressaltar que alguns alunos citaram
que a importância estaria no conhecer a evolução histórica, analisando
permanências, mudanças, usando uma linguagem mais elaborada.
Comparativamente e agradavelmente foi a constatação de que
horizontes foram ampliados quando do questionamento a respeito do que
os alunos aprenderam sobre história do Paraná, pois, o que anteriormente
no questionário de conhecimento prévio alguns alunos nada citaram ou
muito pouco, neste fim de implementação chega-se a conclusão de que no
mínimo o projeto serviu para levantar algumas abordagens interessantes,
sendo agora citados vinte e dois conteúdos, com maior índice (17,57%)
para o tropeirismo. A mesma constatação foi possível ao pedir que os
mesmos citassem cinco acontecimentos da história do Paraná, salientando
que a presença feminina foi agora citada como parte essencial desta
história.
Ao analisar as respostas apresentadas no questionário pós-
implementação sobre o trabalho sobre fotografia, todos os alunos foram
unânimes em afirmar positivamente a possibilidade de se aprender história
através de fotografia num total de 37,83% dos mesmos acreditam que esta
possibilidade repousa na forma de como analisamos os detalhes de
mobiliário, vestimenta, período, poses e comparando-as com situações
atuais. É importante salientar que alguns alunos colocaram que através da
fotografia podemos levantar “suspeitas” (palavras deles) sobre os
acontecimentos.
A pergunta “A fotografia conta histórias? Quais?” foi unânime em
afirmar que a fotografia conta histórias das mais diversas, da história local
ao âmbito mundial e suas conseqüentes ligações. Com histórias das cidades
29
(12,5%), das mulheres (10,71%), do cotidiano (10,71%) e história das
famílias (10,71%)
Com uma percepção maior, os alunos conseguiram datar com maior
precisão (século XIX) o surgimento da fotografia e que a mesma sofreu
modificações no decorrer do tempo seja em tamanho, forma, cores
(46,66%) já que as fotos analisadas eram em preto e branco, poses,
manipulação.
No bloco que investigou sobre a questão feminina foi fácil a percepção
numérica da tarefa de desnaturalizar antigas afirmações, uma vez que após
a intervenção a porcentagem de 36,36% que afirma que as mulheres
aparecem, (quando aparecem) são sempre discriminadas, porém lutando
por seus direitos, seja na surdina, nos bastidores da história oficial, seja na
luta armada, seja em pequenas batalhas diárias. E estes alunos também
expuseram questões como a dupla jornada de trabalho e a discriminação
acrescida à condição étnico-racial.
Um item abordado por um grupo foi a problemática da submissão
feminina presente não só num passado remoto, mas forma corriqueira
observada em dias atuais.
Mais do que antes, os alunos são categóricos em afirmar que os livros
têm privilegiado a história dos homens em detrimento da história feminina,
que na sua maioria aparece com caráter ilustrativo, como curiosidade.
Sobre a importância de se estudar a história das mulheres todos estão
seguros em afirmar esta necessidade, justificando (62,88%) que se deve
aprender mais sobre as mulheres, pois só o conhecimento, só retirando-as
da obscuridade histórica a que foram lançadas, será possível reconhecer
sua atuação, “driblar” a discriminação.
É importante destacar que foi realizado com o questionário um
trabalho de categorização, ou seja, um a um os mesmo foram lidos,
quantificados e em seguida foram organizados em categorias o que facilitou
a escrita, além disso, durante as atividades de implementação em sala o
professor sempre fez ao final de algumas atividades relatórios e anotações
à respeito de percepções, comentários e insights .
30
Conclusão:
Atuar em sala de aula numa sociedade como a atual, onde as
informações vêem como tsunâmes, onde tudo é muito rápido, não é uma
tarefa fácil. Discutir temáticas relacionadas às minorias tão em moda
parece simples, porém, um trabalho sério deixa transparecer que a batalha
diária de fazer da disciplina de História, uma área necessária e de suma
importância para a atitude de parar e repensar antigas convicções é tarefa
que todo professor deve encarar desafiadoramente.
O projeto PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional – Paraná)
foi um meio eficaz de capacitação dos professores e que repercutiu no chão
da escola, quando alunos foram beneficiados com professores mais
atualizados, embasados teoricamente, com novas formas de ver seu
trabalho e transportando para a sala de aula esta discussão peculiar a um
conteúdo.
“A presença feminina na sociedade paranaense, através de fotografias
(1940-1960)” nos remete a questionar, deixando claro que não há respostas
prontas, acabadas, com afirmações ditas como verdades inquestionáveis,
mas possibilidade de debate para temas carentes na disciplina de História
do Paraná: valorizar e conhecer a história local e de seu estado; ter na
fotografia uma interessante fonte documental de trabalho e as mulheres
como foco na produção histórica.
A leitura dos questionários de conhecimento prévio, pós-
implementação e análise de conteúdo passou pelo cuidado de realizar a
categorização dos dados, o que possibilitou um estudo mais dinâmico das
informações adquiridas.
A semente que se planta hoje precisa ser regada diariamente para
que cresça e frutifique, portanto, o trabalho iniciado com este projeto
continua sendo ampliado cotidianamente em sala de aula.
Referências:
ABUD, Kátia. “Conhecimento histórico e ensino de História: a produção de
conhecimento histórico escolar”. In: SCHMIDT, Maria Auxiliadora e CAINELLI,
31
M. R. (orgs.) II Encontro Perspectivas do Ensino de História. Curitiba, Aos
Quatro Ventos: 1995.
BITTENCOURT, Circe F. “Aprendizagens em História”. In: Ensino de História:
fundamentos e métodos. São Paulo, Cortez: 2004.
CAINELLI, Marlene. “Educação Histórica: perspectivas de aprendizagem da
história no ensino fundamental”. In: Educar em Revista. Curitiba, Editora
UFPR: 2006. (Dossiê Educação Histórica).
CAMARGO, Anna Cristina Figueiredo Morais. Liberdade é uma calça velha,
azul e desbotada. São Paulo: Hucitec, 1998
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