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Page 1: A PRESCRIÇÃO SOB A ÉGIDE DA NOVA LEI DE FALÊNCIAS · O jurista Julio Fabbrini Mirabete, em sua obra “Manual de Direito Penal”, d. Atlas, 1997, p. 60, ao comentar sobre a aplicação

A PRESCRIÇÃO SOB A ÉGIDE DA NOVA LEI DE FALÊNCIAS

  Com a entrada em vigor, em maio de 2005, da nova lei que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência das empresas (Lei 11.101 de 09.02.2005), abriu-se importante oportunidade para que empresários acusados de crime falimentares requeiram a extinção da punibilidade de seus supostos crimes, em razão da prescrição da pretensão punitiva estatal.

 

Isso por que, o parágrafo único do art. 199 do Decreto-Lei 7.661/45 (antiga lei de falências) prescrevia que o marco inicial para contagem do prazo prescricional nos crimes falimentares era contado a partir do transito em julgado da sentença que encerrasse a falência, determinando, ainda, em seu caput, que a prescrição da pretensão punitiva de todos os crimes operava-se em dois anos.

 

Nesse passo, ao interpretar acerca do lapso de tempo para que fosse considerado encerrado o processo de falência, o Colendo Supremo Tribunal Federal editou duas Súmulas 147 e 592, firmando a premissa de que seria considerado o tempo de 2  (dois) anos após a sua decretação. Ou seja, se firmou o entendimento de que o marco inicial para contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva seria de 2 (dois) anos após a sentença que decretasse a falência da empresa.

 

Com efeito, é importante aduzir que a nova Lei que regula a matéria, no que toca ao início do prazo prescricional, em seu art. 182, firmou marco inicial prescricional diferente do que vinha sendo estabelecido jurisprudencialmente, de forma pacífica, nos Tribunais Superiores, inclusive com a edição das aludidas Súmulas, verbis:

 

Art. 182. A prescrição dos crimes previstos nesta Lei reger-se-á pelas disposições do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de

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1940 - Código Penal, começando a correr do dia da decretação da falência, da concessão da recuperação judicial ou da homologação do plano de recuperação extrajudicial. (grifamos).

 

Ou seja, se levado em consideração que se deve aplicar a norma mais benéfica ao acusado, segundo o princípio da retroatividade da lex mitior, expressamente consagrado no parágrafo único, do art. 2º do Código Penal e, ainda, no art. 5º, inciso XL, in fine, da Constituição Federal, o marco inicial prescricional para que o MP possa oferecer a denúncia passou a ser a data da decretação da falência, e não mais dois anos após a sua decretação, como vinha sendo entendido.

 

O jurista Julio Fabbrini Mirabete, em sua obra “Manual de Direito Penal”, d. Atlas, 1997, p. 60, ao comentar sobre a aplicação do princípio da retroatividade da lex mitior leciona que, litteris:

 

“Ainda que se esteja procedendo à execução da sentença, aplica-se a lei nova, quer comine pena menos rigorosa, quer favoreça o agente de outra forma, pois, nos termos do novo texto, prevalece a lex mitior que, de qualquer modo, favorece o agente, sem qualquer limitação”

 

Do mesmo modo, o e. professor e Ministro Francisco de Assis Toledo, em sua obra “Princípios Básicos de Direito Penal”, ed. Saraiva, 2002, p. 36/37, também leciona com precisão que, verbis:

 

“Denomina-se mais benigna a lei mais favorável ao agente, no tocante ao crime e a pena, sempre que, ocorrendo sucessão de leis penais no tempo, o fato previsto como crime tenha sido praticado na vigência da lei anterior. Será mais benigna a que “de qualquer modo

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favorecer o agente”, podendo, portanto, ser a lei anterior ou a posterior. Nos termos do art. 5º, XL, da Constituição, a lei mais benigna prevalecerá sempre, em favor do agente, que seja a anterior (ultra-atividade) quer seja a posterior (retroatividade). Já vimos que a abolitio criminis – hipótese mais evidente de lei posterior mais benigna – retroage sempre em benefício do réu, vimos, igualmente, que a lex gravior só se aplica aos fatos cometidos sob sua vigência, vedada em caráter absoluto sua retroação. Fixados tais limites extremos, há uma gama variada de hipóteses intermediárias nas quais a definição da lei mais benigna só pode ser obtida em concreto, ou seja, diante da avaliação, caso a caso, do resultado a ser obtido com a aplicação de uma ou de outra lei. A lei cuja aplicação produzir resultado final mais favorável para o agente é a que deve ser aplicada.Pode-se, entretanto, afirmar que, de um modo geral, salvo excepcional demonstração em contrário, reputa-se mais benigna a lei na qual:(....)(D) SE ESTABELECEREM NOVAS CAUSAS EXTINTIVAS DE PUNIBILIDADE OU SE APLIAREM AS HIPÓTESES DE INCIDÊNCIA DAS JÁ EXISTENTES, NOTADAMENTE QUANDO SÃO REDUZIDOS PRAZOS DE DECADÊNCIA, DE PRESCRIÇÃO, OU SE ESTABELECE MODO MAIS FAVORÁVEL DE CONTAGEM DESSES PRAZOS;(...)” (grifamos)

 

Ao examinar o conteúdo, extensão e a aplicação do princípio da retroatividade da lex mitior, a Quinta Turma do egrégio Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Habeas Corpus (HC) nº 41172/RJ, de que foi relator o eminente Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, em sessão realizada em 19.04.2005, decidiu que:

 

"HABEAS CORPUS ORIGINÁRIO. PORTE ILEGAL DE ARMA. CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. COMPETÊNCIA. JUIZADO ESPECIAL. AÇÃO PENAL EM ANDAMENTO.

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A competência dos Juizados Especiais Criminais é absoluta, pois delimitada em razão da matéria, a teor do art. 98, I, da Constituição da República.

Assim, não há como negar a possibilidade de se aplicar as disposições contidas na Lei 10259/01 a fatos anteriores a sua vigência, dada à retroatividade da lex mitior, mesmo que estejam sendo processados pela Justiça Comum."

Ordem concedida para declarar a competência dos Juizados Especiais de Campos dos Goytacazes, anulados os atos decisórios eventualmente prolatados pelo outro Juízo.

(grifamos) (DJ 16.05.2005 p. 376.) 

Também ao examinar o conteúdo, extensão e a aplicação do princípio da retroatividade da lex mitior sob o prisma constitucional, a Primeira Turma do egrégio Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Habeas Corpus (HC) nº 85452/SP, de que foi relator o eminente Ministro EROS GRAU, em sessão realizada em 17.05.2005, decidiu que:

 

"HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO O R D I N Á R I O . A P R O P R I A Ç Ã O I N D É B I T A D E CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS DESCONTADAS DOS EMPREGADOS. PARCELAMENTO E QUITAÇÃO APÓS O R E C E B I M E N TO D A D E N Ú N C I A . E X T I N Ç Ã O D A PUNIBILIDADE, POR FORÇA DA RETROAÇÃO DE LEI BENÉFICA. As regras referentes ao parcelamento são dirigidas à autoridade tributária. Se esta defere a faculdade de parcelar e quitar as contribuições descontadas dos empregados, e não repassadas ao INSS, e o paciente cumpre a respectiva obrigação, deve ser beneficiado pelo que dispõe o artigo 9º, § 2º, da citada Lei n. 10.684/03. Este preceito, que não faz distinção entre as contribuições previdenciárias descontadas dos empregados e as patronais, limita-se a autorizar a extinção da punibilidade referente aos crimes ali relacionados. Nada importa se o parcelamento foi deferido antes ou depois da vigência das leis que o proíbe: se de qualquer forma ocorreu, deve incidir o mencionado artigo 9º. O paciente obteve o parcelamento e cumpriu a obrigação. Podia fazê-lo, à época,

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antes do recebimento da denúncia, mas assim não procedeu. A lei nova permite que o faça depois, sendo portanto, lex mitior, cuja retroação deve operar-se por força do artigo 5º, XL da Constituição do Brasil. Ordem deferida. Extensão a paciente que se encontra em situação idêntica. (grifamos)

 

No mesmo sentido, a Segunda Turma do C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 80542/MG, cujo relator foi o eminente Ministro CELSO MELLO, firmou o seguinte entendimento acerca da matéria:

 HABEAS CORPUS - ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A PERSECUÇÃO PENAL - INOCORRÊNCIA - PRETENDIDA APLICAÇÃO DO SURSIS PROCESSUAL AO PROCESSO PENAL MILITAR - FATO ANTERIOR À EDIÇÃO DA LEI Nº 9.839/99 - POSSIBILIDADE - PEDIDO DEFERIDO, EM PARTE. O ABUSO DO PODER DE ACUSAR E A POSSIBILIDADE DE SEU CONTROLE JURISDICIONAL. - A imputação penal não pode ser a expressão arbitrária da vontade pessoal do órgão acusador. A válida formulação de denúncia penal supõe a existência de base empírica idônea, apoiada em prova lícita, sob pena de o exercício do poder de acusar - consideradas as graves implicações de ordem ético-jurídica que dele decorrem - converter-se em instrumento de abuso estatal. Precedentes. A discussão em torno da ausência de justa causa para a persecução penal depende, essencialmente, quando suscitada em sede de habeas corpus, da incontestabilidade dos fatos subjacentes à acusação criminal. Esse debate, no âmbito processual do remédio heróico, não se viabiliza, sempre que se registre dúvida fundada a propósito dos fatos alegados. É que a liquidez dos fatos constitui requisito inafastável na apreciação da justa causa penal, pois o remédio processual do "habeas corpus" não admite dilação probatória, não permite o exame aprofundado de matéria fática e nem comporta a análise va lo ra t i va de e lementos de p rova . Precedentes . APLICABILIDADE, AO PROCESSO PENAL MILITAR, DO INSTITUTO DO SURSIS PROCESSUAL (LEI Nº 9.099/95, ART. 89), NOS CRIMES MILITARES PRATICADOS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.839/99 - ULTRATIVIDADE DA LEI

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PENAL BENÉFICA - IMPOSIÇÃO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 5º, XL). - A Lei nº 9.839/99 (lex gravior) - que torna inaplicável à Justiça Militar a Lei nº 9.099/95 (lex mitior) - não alcança, no que se refere aos institutos de direito material (como o do sursis processual, p. ex.), os crimes militares praticados antes de sua vigência, ainda que o inquérito policial militar ou o processo penal militar sejam iniciados posteriormente. Precedentes do STF. (grifamos) (DJ 29-06-2001 PP-0034)

  

Logo, é inevitável a conclusão, levando-se em consideração o princípio da retroatividade da lex mitior expressamente consagrado no parágrafo único, do art. 2º do Código Penal e, ainda, no art. 5º, inciso XL, in fine, da Constituição Federal, de que os acusados de crimes falimentares beneficiaram-se do novo dispositivo esculpido no art. 182 da Lei 11.101/2005, que na prática lhes garante uma redução de dois anos no marco inicial para contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva estatal, o que em muitos casos redundará na inequívoca extinção da punibilidade dos supostos crimes que lhes foram imputados.

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