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A PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NO JORNALISMO IMPRESSO E DIÁRIO DE CURITIBA DURANTE A DITADURA MILITAR E PÓS-ABERTURA POLÍTICA Ellen Aparecida Silva de Almeida (PIBIC/Fundação Araucária/UEPG), Paula Melani Rocha (Orientadora), e-mail: [email protected] Universidade Estadual de Ponta Grossa/Departamento de Jornalismo. Comunicação Social Palavras-chave: Feminização do jornalismo, impressos, jornais regionais Resumo: O processo de feminização das redações dos jornais regionais e a contribuição das jornalistas mulheres ainda estão pouco sistematizadas e documentadas. Há registros quantitativos relacionados à inserção feminina no jornalismo nacional e ao crescimento deste segmento no mercado bem como atuações pontuais de jornalistas mulheres. O objetivo deste projeto de iniciação científica foi mapear como se deu a participação dessas profissionais em dois impressos regionais, Gazeta do Povo e O Estado do Paraná, durante o período de 1969 a 1989, e relacionar este movimento com o processo de profissionalização do jornalismo brasileiro. A metodologia adotada foi pesquisa bibliográfica e documental sobre história do jornalismo, profissão, mulheres e mercado de trabalho. A maior dificuldade foi encontrar registros sobre a participação feminina. Para isso, consultou-se os jornais de dois arquivos públicos: Biblioteca Municipal de Curitiba e Casa da Memória, em Ponta Grossa. Também foram feitas pesquisas no próprio site da Gazeta do Povo e nas redes sociais, em busca dos nomes encontrados nos jornais arquivados. Os resultados trazem um mapeamento da participação feminina, mas não é considerada a totalidade das profissionais, justamente pela dificuldade de encontrar registros. O que acentua a invisibilidade das contribuições femininas na trajetória do jornalismo regional do Paraná. O projeto foi desenvolvido sob o guarda chuva da linha de Pesquisa “Conhecimento no Jornalismo e processos de produção jornalística”, cadastrada na PROPESP e faz interface com o grupo de pesquisa Jornalismo e Gênero e também Conhecimento do Jornalismo (CNPq), o qual busca estudar o conhecimento que envolve o jornalismo. Introdução Em meio a limitações técnicas, o jornalismo começou a desenhar novos moldes a partir do século XX e adaptar-se aos momentos históricos que o circulavam. Em meio a esses processos, aos poucos, principalmente a partir da segunda metade do século XX, a mulher conseguiu garantir seu lugar e fazer história na imprensa nacional, se destacando por meio da obtenção do diploma e se profissionalizando. Surge na Era Vargas, em 1938, o primeiro Decreto-Lei em apoio a profissionalização do Jornalismo no Brasil. Após o primeiro decreto, muitos outros vieram para regulamentar a profissão. Em 1943 foi instituído o curso de Jornalismo no sistema de Ensino Superior do país, que acaba não entrando em vigor; em 1944 a remuneração mínima aos jornalistas através do Decreto Lei N˚7.037 de 10 de Novembro; em 1962 e 1963 leis aprovaram o regulamento do registro de jornalista

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A PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NO JORNALISMO IMPRESSO E DIÁRIO DE CURITIBA DURANTE A DITADURA MILITAR E PÓS-ABERTURA POLÍTICA

Ellen Aparecida Silva de Almeida (PIBIC/Fundação Araucária/UEPG), Paula Melani

Rocha (Orientadora), e-mail: [email protected]

Universidade Estadual de Ponta Grossa/Departamento de Jornalismo.

Comunicação Social Palavras-chave: Feminização do jornalismo, impressos, jornais regionais Resumo: O processo de feminização das redações dos jornais regionais e a contribuição das jornalistas mulheres ainda estão pouco sistematizadas e documentadas. Há registros quantitativos relacionados à inserção feminina no jornalismo nacional e ao crescimento deste segmento no mercado bem como atuações pontuais de jornalistas mulheres. O objetivo deste projeto de iniciação científica foi mapear como se deu a participação dessas profissionais em dois impressos regionais, Gazeta do Povo e O Estado do Paraná, durante o período de 1969 a 1989, e relacionar este movimento com o processo de profissionalização do jornalismo brasileiro. A metodologia adotada foi pesquisa bibliográfica e documental sobre história do jornalismo, profissão, mulheres e mercado de trabalho. A maior dificuldade foi encontrar registros sobre a participação feminina. Para isso, consultou-se os jornais de dois arquivos públicos: Biblioteca Municipal de Curitiba e Casa da Memória, em Ponta Grossa. Também foram feitas pesquisas no próprio site da Gazeta do Povo e nas redes sociais, em busca dos nomes encontrados nos jornais arquivados. Os resultados trazem um mapeamento da participação feminina, mas não é considerada a totalidade das profissionais, justamente pela dificuldade de encontrar registros. O que acentua a invisibilidade das contribuições femininas na trajetória do jornalismo regional do Paraná. O projeto foi desenvolvido sob o guarda chuva da linha de Pesquisa “Conhecimento no Jornalismo e processos de produção jornalística”, cadastrada na PROPESP e faz interface com o grupo de pesquisa Jornalismo e Gênero e também Conhecimento do Jornalismo (CNPq), o qual busca estudar o conhecimento que envolve o jornalismo. Introdução

Em meio a limitações técnicas, o jornalismo começou a desenhar novos moldes a partir do século XX e adaptar-se aos momentos históricos que o circulavam. Em meio a esses processos, aos poucos, principalmente a partir da segunda metade do século XX, a mulher conseguiu garantir seu lugar e fazer história na imprensa nacional, se destacando por meio da obtenção do diploma e se profissionalizando.

Surge na Era Vargas, em 1938, o primeiro Decreto-Lei em apoio a profissionalização do Jornalismo no Brasil. Após o primeiro decreto, muitos outros vieram para regulamentar a profissão. Em 1943 foi instituído o curso de Jornalismo no sistema de Ensino Superior do país, que acaba não entrando em vigor; em 1944 a remuneração mínima aos jornalistas através do Decreto Lei N˚7.037 de 10 de Novembro; em 1962 e 1963 leis aprovaram o regulamento do registro de jornalista

profissional; em 1967 a Lei 5.250, a Lei da Imprensa, limitou a divulgação de conteúdos pelos meios de comunicação, além de punições como apreensão e recolhimento de veículos que ferissem a moral e os bons costumes e, por fim, em 1969 o Decreto-Lei 972 de 17 de outubro, que dispõe sobre o exercício da profissão de jornalista. “Na tentativa de evitar manifestações dos jornalistas contra o Estado Novo, Vargas buscou meios para satisfazer essa categoria, com concessões de benefícios trabalhistas, previdenciários e da legalização da atividade profissional” (SILVA, 2009, ). Dentre as conquistas profissionais estava o estabelecimento da carga horária máxima de cinco horas de trabalho diários que, se excedida em até duas horas adicionais seria devidamente remunerado de forma correspondente. Contudo, a determinação não contempla as funções de secretário, subsecretário, redator-chefe, chefe e subchefe de revisão, chefe de oficina de ilustração e chefe de portaria dentre outras funções que segundo Silva (2009) eram compostas por pessoas de confiança dos proprietários das empresas de jornalismo.

Em Curitiba apenas duas instituições de ensino superior ministravam o curso de Jornalismo durante o período estudado nessa pesquisa, a Universidade Federal do Paraná (UFPR) e a Pontifica Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). A PUC iniciou as atividades do curso de Jornalismo em 1956, mas em 1983 desativou o curso durante 5 anos, retomando-as em 1988. Já a UFPR criou o curso em 1963, atuando até hoje. Ao ser caracterizado como chave de entrada para o mercado de trabalho, o diploma em Jornalismo serviu para que as redações dessem maior espaço para jornalistas mulheres na cidade de Curitiba.

Em 2001, a Juíza Federal Substituta Carla Abrantkoski Rister, tornou não obrigatório o diploma em jornalismo para o exercício da profissão, argumentando que infringia a liberdade de expressão garantida pela Constituição. Já em 2005 o juiz federal do Tribunal Regional Federal – 3a Região, foi contrário à juíza, contudo em 2009 o então ministro Gilmar Mendes derrubou novamente a obrigatoriedade do diploma em Jornalismo.

Através da Proposta de Emenda Constitucional (PEC)368-A/2009, uma nova lei foi apresentada ao Conselho de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJC) que, em cumprimento ao disposto no Art. 202, caput, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, manifestou-se no sentido da admissibilidade da PEC (ALVES, 2015, pág. 9). Em resposta à proposta de alterar o artigo 2206 e tornar obrigatória a necessidade do diploma de Jornalismo, o Deputado Paulo Pimenta propôs a PEC 386-A, que em 27 de Maio de 2010 foi admitida. Materiais e métodos Optou-se pela análise das transformações históricas e da profissionalização do jornalismo procurando identificar a relação entre as transformações históricas no contexto regional da profissão de jornalismo e o processo de feminização da carreira de jornalismo nos impressos diários de Curitiba, Gazeta do Povo e O Estado do Paraná. A escolha dos impressos não se deu de forma aleatória, mas porque este setor do mercado é o mais tradicional e é justamente onde ainda há uma predominância masculina, diferente dos setores “fora da mídia” e veículos segmentados.

Nesse sentido trabalhou-se com pesquisa bibliográfica e documental para levantar a participação das mulheres nos jornais impressos com circulação diária em Curitiba durante o período de 1969 a 1989. A amostra restringiu-se a olhar para a

imprensa hegemônica e tradicional, por isso limitou-se aos dois impressos mencionados. Os jornais são fontes documentais consideráveis para indicar a participação das mulheres na produção de conteúdo e o lugar de autoria que elas ocuparam, para isso consultou-se edições junto ao Arquivo Público do Paraná e de Ponta Grossa. Foi feita uma análise qualitativa com o propósito de observar as editorias que as mulheres ocuparam nesses veículos ao longo do período observado bem como os postos que elas ocuparam nas redações (editoras, repórteres, colaboradoras). Para realizar a consulta determinou-se períodos fixos, coletando nomes dos meses de julho de 1969 a 1983 da Gazeta do Povo, e dos meses de setembro de 1973, dezembro de 1977, e julho de 1978 a 1982, além de março de 1983 e 1984 de O Estado do Paraná. Contudo é válido ressaltar que há vácuos temporais de material disponível nos respectivos arquivos, por exemplo não encontrou edições nos anos 1969 a 1972, 1974 a 1976 e 1985 a 1989 do jornal O Estado do Paraná e dos últimos 5 anos de pesquisa da Gazeta do Povo; sendo assim, buscou-se contato a partir do depoimento de jornalistas ainda vivas em relação a colegas de trabalho.

Outra dificuldade enfrentada pela pesquisa foi a falta de dados quantitativos sistematizados sobre a participação feminina na imprensa do Paraná pelo Sindicato dos Jornalistas do Paraná, RAIS (Relação Anual de Informações Sociais) e Ministério do Trabalho. Resultados e Discussão

No período de 1969 a 1973 foram encontradas 23 assinaturas nos dois impressos de Curitiba, sendo que algumas delas, geralmente jornalistas de fato contratadas, se repetem durante alguns anos, outras aparecem apenas uma vez – como colunistas, colaboradoras ou correspondentes nacionais e internacionais. Sob as mesmas condições foram encontradas 18 assinaturas entre 1974 e 1978; 24 assinaturas entre 1979 e 1983 e 3 assinaturas de 1984 a 1989. Contudo, os últimos 5 anos das edições da Gazeta do Povo e O Estado do Paraná não foram coletados, isso pela falta de material. Nereide Michel e Rosy de Sá Cardoso, ambas da Gazeta do Povo, trabalhavam no diário desde esses últimos anos da pesquisa até os dias de hoje, portanto foram contabilizadas.

Com um número menor de jornalistas e colaboradoras, em relação à Gazeta do Povo, O Estado contou com poucas matérias assinadas por jornalistas de fato contratadas. Vânia Mara Welte, que trabalhou nas páginas de O Estadinho, além da diagramação do jornal de 1967 até o fim de 1970, conta que “As mulheres, embora amigas, trabalhavam em horários diferentes e ficavam pouco tempo na redação. Fui a primeira jornalista a ser contratada e ficar mais tempo na redação, e no período da noite – somente nos sábados e feriados trabalhava de dia - nem WC existia para mulheres”. Dayse Regina Ferreira foi editora de turismo desde 1973, além do suplemento semanal “Jornal da Família”, datado em 1979, de acordo com a edição coletada para esta pesquisa e do Jornal da Mulher, com dicas de moda, ginástica e receitas; além de Iberê de Mattos, que aparece no jornal desde 1977 e deixa de colaborar a partir de 1983, assinando artigos sobre política e fugindo do padrão, já que este assunto era tradicionalmente dominado por homens, por se tratar de um tema considerado sério.

Entre as estratégias adotadas para contornar os percalcos econômicos, alguns jornais reduziram a quantidade de páginas das

edições, diminuíram o tamanho do espaco publicitário e até jornalístico, outros veículos aumentaram o preço de venda, o que levou à redução do consumo, e algumas empresas chegaram a fechar suas portas. (LOPES, 2011, p.62 e 63)

Conclusões

Poucas foram as jornalistas contratadas durante o período de 1969 a 1989; a maior parte das mulheres que tiveram participação no jornalismo diário de Curitiba eram colaboradoras de tempos em tempos, ou apareciam apenas uma vez - assinando textos e matérias sem influência ou com lugares de pouco prestígio, comparando àquelas de política, economia e cidades, sempre assinadas por homens. As mulheres apontadas deixaram marcas ha história do jornalismo regional do Paraná, elas foram responsáveis pelo implemento de alguns cadernos, segmentos e colunas, elas seguem em concordância com os movimentos da participação feminina em nível nacional. Agradecimentos Agradeço a bolsa que me foi concedida pela Fundação Araucária, possibilitando a coleta de dados fora da minha cidade e me dando maior confiança para a realização dessa pesquisa. Agradeço também a oportunidade que o curso de Jornalismo da UEPG me deu de realizar minha primeira pesquisa de iniciação científica, além do tempo e informações fornecidas pela família Benatto, por Vania Mara Welte, além da Biblioteca Municipal de Curitiba e da Casa da Memória, em Ponta Grossa. Referências ALVES, Marcelo. O Diploma de Jornalismo em Debate na Câmara dos Deputados. Artigo apresentado no XX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste – Uberlândia – MG – 19 a 21/06/2015. Disponível em: < http://www.portalintercom.org.br/anais/sudeste2015/resumos/R48-1060-1.pdf >. Acesso em 31 ago 2016. LEITE, A. T. B.. Profissionais da mídia em São Paulo: Um estudo sobre profissionalismo, diferença e gênero no jornalismo. São Carlos: UFSCar, 2015. 232p. Tese (Doutorado) - Programa de Pós Graduação em Ciências Sociais, Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2015. MICK, J.. Perfil do Jornalista Brasileiro: Características demográficas, políticas e do trabalho. UFSC, Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política.; Núcleo de Estudos sobre Transformações no Mundo do Trabalho em convênio com a Federação Nacional dos Jornalistas -FENAJ, 2012. RIBEIRO, J. H. Jornalistas: 1937 a 1997: história da imprensa de São Paulo vista pelos que batalham laudas (terminais) câmeras e microfones, São Paulo, Imprensa Oficial do Estado, 1998. MELO, José Marques de. (1985). A opinião no jornalismo brasileiro. Petrópolis: Vozes. MACHADO, BLANK, SANTOS. Liberdade de Imprensa e a Lei de Imprensa de 1967. Artigo apresentado no Seminário Interinstitucional de Ensino, Pesquisa e Extensão, realizado pela UNICRUZ em 6,7 e 8 de novembro de 2012. Disponível em:< http://www.unicruz.edu.br/seminario/downloads/anais/cchc/liberdade%20de%20imprensa%20e%20a%20lei%20de%20imprensa%20de%201967.pdf>. Acesso em 19 abr.2016.