a noticia edição especial ii - luiz gonzaga

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Caruaru, Pernambuco Junho 2012 Ano VI Edição EspeciaI Edição especial em homenagem ao Rei do Baião Pernambuco celebra os 100 anos de Luiz Gonzaga

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Jornal Laboratorio do Curso de Jornalismo da Faculdade do Vale do Ipojuca - FAVIP

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Page 1: A Noticia Edição Especial II - Luiz Gonzaga

Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo da Faculdade do Vale do Ipojuca - FAVIP ISSN 2238-6122

Caruaru, PernambucoJunho 2012 Ano VI Edição EspeciaI

Edição especial em homenagem ao Rei do Baião

Pernambucocelebra os 100 anos de Luiz Gonzaga

Page 2: A Noticia Edição Especial II - Luiz Gonzaga

A NOTÍCIA Caruaru, Pernambuco Junho 2012

O Rei na memóriaEx

pedi

ente

“Eu fui muito próxima do Rei do Baião. Gonzaga era meu paizão. De manhã eu estava vindo de uma dobradinha de shows e ele tam-bém. Aí ele me viu entrar e já gritou ‘Elba Ramalho’, com aquele jeitão dele, venha aqui conhecer o velhinho... Ele estava brincando! Conversamos bastante, ficamos amigos. Foi aí que eu gravei San-foninha Choradeira. Comigo ele sempre foi muito atencioso. Gon-zaga era um homem bravo. Sertanejo, forte. Nós no sertão já nas-cemos assim, fortes! Se não a gente não resiste. A seca é algo que só um povo forte e determinado consegue superar. E Gonzaga era assim, corajoso, um homem que largou tudo e foi tentar a vida em uma cidade grande. Eu fiz a mesma coisa, saí do sertão em busca do meu sonho, passei por todas as dificuldades, mas não me abati”.

[Elba Ramalho]

“Luiz me conheceu através de Dominguinhos, ele falava de mim a Gonzaga. Um dia a gente se encontrou na gravadora BMG Ariola, no Rio. Luiz disse: ‘Você é o Nando Cordel?’, respondi: ‘Sou, seu Luiz’... ‘Dominguinhos fala muito de você’! Ele disse uma coisa bem interessante sobre mim. Ele olhou para Dominguinhos e fa-lou: ‘Não deixe esse maguinho não, viu?’. Eu acho que Domin-guinhos acatou o conselho dele e não me deixou mais... Gravei com Luiz Gonzaga a música ‘A todo mundo eu dou psiu’, e foi uma experiência magnífica. Outra coisa que me recordo e agradeço demais a Luiz Gonzaga era que quando eu chegava à rádio ele já avisava antes: ‘Pessoal, vem aí um menino chamado Nando Cordel que é meu amigo, meu parceiro e amigo de Dominguinhos, eu quero que vocês toquem’. Então aonde eu chegava as por-tas das rádios já estavam abertas no começo da minha carreira”.

[Nando Cordel]

“Luiz Gonzaga é o Papa, é o gênio, é o mito, não tem como. Na ver-dade, foi ele quem popularizou o forró bem pé de serra do Araripe. E aí no Rio de Janeiro ele popularizou e trouxe o triângulo que não existia e fez o jogo de fole que também não existia.” [Jorge de Altinho]

“A importância de homenagear Luiz Gonzaga é fundamental como for-ma de agregar valores, mobilizar a imprensa e mostrar ao mundo quão forte essa influência é em nossa cultura, e isso não pode ser esquecido.”

[Targino Gondim]

“Ele foi o maior artista popular do Brasil, foi a matriz para vá-rios artistas, ele era um gênio, e como todo gênio, ele não sabia da grandiosidade dele, mas nós sabemos e estamos aqui para presti-giar essa riqueza que ele nos deixou.” [Alcymar Monteiro]

‘Falar o quê de quem já disse tudo?’ “A frase que inicia uma canção do meu amigo Pablo Patriota e que homenageia Luiz Gonzaga é uma per-gunta muito boa e que poderia ou deveria encerrar qualquer assunto relativo ao Rei do Baião. Qualquer pessoa que conheça, por pouco que seja, sua obra, sempre terá algo a falar sobre sua genialidade.”

[Valdir Santos]

É com grande satisfação que o curso de Jornalismo da Favip faz circular a edição es-pecial do Jornal A Notícia, em comemoração ao centenário de nascimento do mestre Luiz Gonzaga. Fruto de um trabalho interdisciplinar, envolvendo as disciplinas Técnicas de Reporta-gem e Entrevista e Planejamento Gráfico e Editoração Eletrônica, o jornal oportunizou aos alunos do terceiro período do curso a vi-vência prática das técnicas e teo-rias aprendidas em sala de aula e ainda os levou a conhecerem um pouco a trajetória do Rei do Baião.

Nesta edição, os leitores po-derão conferir uma reportagem especial sobre a vida do artista, narrando desde a sua infância em Exu, no Sertão, até os últimos dias de sua contribuição em vida à música nordestina. A importân-cia de Luiz Gonzaga na vida de cidadãos comuns também é des-taque na matéria que trata sobre os vários fãs que ele deixou na região.

Falando de Gonzaga, seria impossível deixar de ouvir a re-lação profissional e de amizade que ele teve com o caruaruense Onildo Almeida, autor da famo-sa música A Feira de Caruaru,

que levou o nome da cidade aos quatro cantos do mundo na voz vibrante de Gonzagão. Numa entrevista marcada pela emoção, Onildo fala sobre sua proximida-de com o artista e antecipa como será sua homenagem aos 100 anos do mestre “Lua”

Poucos retrataram tão bem a realidade do Sertão quanto Luiz Gonzaga, que, através de suas músicas, expressou os dois extremos da vida do sertanejo: a dor e o sofrimento trazidos pela seca; e a humildade e a alegria desse povo guerreiro. Sobre essa tema, A Notícia traz uma re-portagem mostrando de que for-ma as músicas de Luiz Gonzaga podem ser utilizadas como instru-mento pedagógico. Além desses assuntos, o jornal ainda registra depoimentos exclusivos de artis-tas de expressão nacional, como Elba Ramalho, Alcymar Monteiro, Jorge de Altinho e Nando Cordel.

É dessa forma que espe-ramos que esse jornal contribua para o resgate da memória da história de vida do mestre Luiz Gonzaga, que, merecidamente, é o único dono do título de Rei do Baião, pois, como diz a letra da música, Luiz Gonzaga não morreu, nem sua sanfona desa-pareceu.

Reverências a Gonzaga

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Sociedade de Educação do Vale do Ipojuca S.A. (SESVALI)

Mantenedora da Faculdade do Vale do Ipojuca (FAVIP)

Mauricélia Bezerra VidalDiretora Executiva

Roberto Cavalcanti Albuquerque Filho

Diretor Financeiro

Djalma Lira SantiagoDiretor administrativo

Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo da FAVIP

Rosangela Araújo Coord. do Curso de Jornalismo

Professores orientadoresCarlos Araujo

Iraê Mota Rosângela Araujo

Supervisão de Projeto Gráfico Carlos Araujo

Impressão: Gráfica Jornal do CommercioTiragem: 3.000 exemplares

Page 3: A Noticia Edição Especial II - Luiz Gonzaga

A NOTÍCIACaruaru, Pernambuco Junho 2012 Entrevista

O senhor compôs 21 canções para Luiz Gonzaga, sendo a mais famosa “A Feira de Caruaru”, da qual Gonzaga vendeu mais de 100 mil cópias e rendeu o primeiro disco de ouro do Rei do Baião. Como é para o senhor ter ajudado Gonzaga nesse feito?É um acontecimento raro e de muita importância, tanto para mim, como compositor da música, quanto para Gonzaga, tendo em vista que Asa Branca, a música mais famosa do Rei, e é um hino brasileiro do nordestino, ainda não tinha atingido a vendagem de 100 mil cópias, quando já fazia quatro ou cinco anos que ela tinha sido lançada. E “A Feira” deu uma disparada e em um ano atingiu essa vendagem.

Como foi que o senhor conheceu Luiz Gonzaga e chegou a trabalhar com ele?Foi através da música “Feira” que eu gravei primeiro que ele. Quando eu a fiz, não tinha quem gravasse e, por insistência da fábrica, eu gravei e a música repercutiu. Comigo ela não vendeu 100 mil discos... Vendeu pouco mais de 10 mil discos em um ano. Então, Luiz, quando ouviu, disse: “De quem é isto?” Aí disseram:

“É de um rapaz que trabalha aqui na rádio”. Levaram-me até Luiz e ele disse: “É seu, caboclo?” Eu disse: “É”. Ele disse: “Como é que você tem um negócio desse e não

me mostra?”. Falei: “Está em suas mãos”. Ele disse: “Posso regravar?”. Eu respondi: “Pode. Depois a gente conversa”. Aí ele gravou e foi o estouro da boiada. Com Luiz Gonzaga, a música aconteceu no país inteiro, ele já era o Rei do Baião. Na minha voz foi só aqui no Nordeste.

Este ano, o grande homenageado do São João de Caruaru é o Rei do Baião. O que o senhor achou dessa homenagem?Eles tinham uma obrigação de prestar essa homenagem, em comemorar 100 anos do Rei do Baião. Gonzaga gravou cinco músicas falando de Caruaru, ele

tinha um carinho especial por essa cidade e se dizia filho postiço de Caruaru com muito orgulho. Então, a cultura caruaruense, que é nordestina, tinha obrigação de prestar esse tributo àquele que foi, é e continuará sendo o maior músico brasileiro, na minha opinião.

Como era Luiz Gonzaga, o cantor, e como era Luiz Gonzaga do Nas-cimento, o cidadão?Gonzaga era um homem como outro qualquer, só que ele era muito cuidadoso, não fazia amizade com todo mundo. Muita gente se aproximava dele para tirar proveito. Eu me aproximei por causa da música, nós até tivemos um

choquezinho... Eu esperei com o sucesso da Feira que ele voltasse a me pedir música e ele não me pediu... Então, eu me antecipei e mandei uma fita com seis músicas para ele... Ele levou. Um ano depois ele veio a Caruaru e eu perguntei: “Luiz, e as músicas?” Ele disse: “Que músicas?” (um atestado de que ele não ligou, não ouviu as músicas). Com isso, eu disse: “Enquanto vida tiver esse cara não grava mais músicas minha”. E mantive isso por quatro anos. Chegamos a ser grandes amigos, amigos confidentes até. Chegamos a gravar 21 ou 22 músicas.

O que você acha do São João de hoje e a diferença para o de antigamente? Nada é para sempre, a saber, na música... A música do século passado era um tipo de música. A cada década ela se modifica, surgem as novidades. Cada juventude tem seu comportamento.

Conte pra gente um caso engraça-do que aconteceu com vocês.Ele foi cantar “A Feira de Caruaru” e esqueceu a letra no show. Ele disse:

“Eu vou cantar, mas eu não decorei a música. Se eu errar, você me so-corre e se você errar, eu lhe ajudo”. Na primeira frase ele errou (risos), aí eu o socorri e está gravado. Isso foi muito engraçado. Foi no começo, em 1957, o povo caiu na risada (ri-sos), todos perceberam na hora.

Qual vai ser sua homenagem ao centenário do Rei do Baião?Aproveitando os 100 anos, eu estou lançando um disco: ELE CANTA ONILDO ALMEIDA, e fiz também uma música dos 100 anos de Gon-zaga. É um lançamento. Só com composições minha na voz de Luiz Gonzaga, em que eu canto de três a quatro músicas com ele. Domingui-nhos gravou e eu também canto a música MAIS UM ANO SEM O REI.

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Adilson Jr’s, Geovanna Aguiar e Weverton Pierry3° período

“Mais um ano sem o Rei”Compositor e amigo de Luiz Gonzaga, Onildo Almeida conta como foi ter contribuído para a trajetória de Gonzagão

Onildo exibe CD com músicas suas em homenagem ao centenário de Gonzaga

Adilson Jr’s

Page 4: A Noticia Edição Especial II - Luiz Gonzaga

A NOTÍCIA Caruaru, Pernambuco Junho 2012

Sem dúvidas, o São João de Caruaru sempre movimenta o comércio da cidade, sendo

seu maior público os turistas que vêm não só de outros Estados como também do exterior. Os moradores compram bem mais nessa época em relação às outras temporadas.

E este ano, o período junino homenageia o centenário do Rei do Baião, nestes 28 dias de forró está garantida uma boa renda para todos os comerciantes e ambulantes, que, apesar das dificuldades que a região tem enfrentado com a seca, os co-merciantes não deixam de investir nas comidas típicas como milho co-zido, canjica, pamonha, pé de mole-

que, bolos, etc. Feirantes e lojistas também in-

vestem em vestuário, calçados, cor-déis, materiais de decoração, entre outros objetos que remetem ao Rei Luiz Gonzaga. De acordo com os comerciantes do Pátio do Forró, há uma estimativa de 20% no aumen-to das vendas das peças de Luiz Gonzaga, que vão desde camisas com a sua imagem estampada até CDs com músicas do artista. “A pro-cura está aumentando, e estamos aguardando o recebimento de todos os álbuns de Luiz Gonzaga nesses próximos dias”, afirma o vendedor Luiz Francisco, que ainda reforça que devido ao índice de visitantes ter aumentado consideravelmente na cidade de Exu, a maior parte das vendas está sendo direcionada ao Museu Luiz Gonzaga que fica situa-do no Parque Asa Branca da cidade, terra natal do Rei do Baião.

A Feira de Caruaru, um dos polos econômicos da cidade, teve a contribuição de Luiz Gonzaga atra-vés da música “A Feira de Caruaru”,

de autoria de Onildo Almeida. O local desperta a curiosidade e o interesse das pessoas de fora em conhecer as representações citadas por Luiz Gonzaga.

Desde a década de 1950,

Itanieta Silva, Levi Emanuel e Wedson Beudini3° período

quando a música foi composta, até os dias de hoje, continua sendo um grande incentivo à visitação turísti-ca, e contribui significativamente na divulgação da cultura e do comércio interiorano.

Economia

Peças de Luiz Gonzaga têm aumento de 20% nas vendas

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Itanieta Silva

Centenário do Rei movimenta a economia da região

Esculturas do Rei do Baião vendidas na Feira de Artesanato em Caruaru

Em ano de centenário, Luiz Gonzaga é o homenageado no São João de Caruaru, que tem trazido a participação de mais de 300 artistas dispostos em cinco polos da cidade, passando pelos festejos da Capital do Forró nomes como Dominguinhos, Elba Ramalho, Jorge de Altinho, Aviões do Forró,

Santanna e Petrúcio Amorim. Desde o início de junho, os

festejos têm atraído turistas de todas as regiões e proporcionado às cidades de Caruaru e Gravatá não só destaque em seu São João, mas tem movimentado a economia das duas cidades do Agreste pernambucano. Segundo a economista Angélica Trindade, professora da Faculdade do Vale do Ipojuca (Favip), durante esse período junino, há um estímulo no

comércio local, o qual resulta no aumento da produção de bens de consumo, influenciando na renda da região e aumentando as vagas de empregos temporários. Para os 30 dias de forró, são esperadas mais de um milhão de pessoas que contarão ainda com apresentações de quadrilhas tradicionais e estilizadas entre outras animações que poderão ser encontradas durante os dias de festa.

O centenário do Rei do Baião

é tema ainda do São João de Gravatá, que conta com atrações como Maciel Melo, Geraldinho Lins, Santanna, Dominguinhos, Luiz e Davi, Guilherme e Santiago e artistas da região. Os shows estão previsto para iniciarem às 20h, sendo esperado um público de 150 mil pessoas durante o período junino que, além dessas atrações, poderão contemplar o Polo da Sanfona, trios pé de serra, apresentação de quadrilhas e dança.

Luiz Gonzaga é homenageado no São João de Caruaru e Gravatá

Cintia Barros e Rayanne Santos3° período

Page 5: A Noticia Edição Especial II - Luiz Gonzaga

A NOTÍCIACaruaru, Pernambuco Junho 2012

Luiz Gonzaga: o professor multidisciplinar

Educação 5

Elizama Freitas, Fernanda Beatriz, Paula Beatriz e Thayna Chaves 3° período

As músicas do artista como método de ensino

Tire da cabeça a ideia de que Luiz Gonzaga foi apenas o “Rei do Baião”. Historiador, biólogo,

linguista, matemático, geógrafo – esse é o Luiz Gonzaga que iremos lhe apresentar. Suas canções abor-dam conhecimentos das diversas áreas do saber. Seja através do con-texto histórico da época em que as músicas foram escritas, do tema ou do vocabulário escolhido, o acervo musical de Gonzagão é uma boa pedida para professores e alunos in-teressados em aprender ou ensinar de uma forma nada convencional: cantando.

A interpretação do sofrimento e das alegrias do povo nordestino ainda hoje faz de Luiz Gonzaga um artista reconhecido além da sua música. “O mais importante é o que ele deixou registrado da nossa cul-tura, que não é só a música e sim a identidade e a história”, afirma a professora de Língua Portuguesa e mestre em Teoria da Literatura, Heleniza Saldanha. “O ideal é mos-trar o que as canções representam, enfatizando que a linguagem é pro-duzida dentro de um contexto social, econômico e histórico”, destaca. A professora acredita que o preconcei-to é combatido quando se vai além do estudo clássico das variações linguísticas apresentando o idioma como uma entidade rica de transfor-mações.

Além de representar a realida-de, as palavras usadas pelo artista expressam sentimentos à frente de seu tempo. Nada é mais atual que a preocupação com o meio ambiente, já expressa na letra “Xote Ecológi-co”, escrita por ele e por Aguinaldo Batista em 1989. O xote é dedica-do ao defensor da Amazônia Chico

Mendes e descreve uma realidade onde até as flores “a poluição co-meu”. E poluição foi um dos temas da disciplina de Educação Ambiental dos alunos do ensino fundamental do Colégio de Nossa Senhora de Lourdes (CNSL), em Palmares. A bióloga Cristiane Eulália contextua-lizou o “Xote Ecológico” aos impac-tos ambientais estudados em sala.

“Pedi que os alunos identificassem na letra o que está acontecendo hoje em dia e eles gostaram muito da di-dática”, explicou.

E quem quiser entender Mate-mática pode recorrer à letra “Dezes-sete e Setecentos”, composta por Gonzagão e Miguel Lima, em 1947. A música apresenta um personagem frenquentador da academia, que sabe “até multiplicar”, envolvido em uma discussão na hora de receber o troco. Ao ser apresentada à can-

ção, a professora de Matemática do CNSL, em Palmares, Luiza Arcanjo, disse ter adorado. “Estou traba-lhando as quatro operações funda-mentais (adição, subtração, multi-plicação e divisão) e aproveitarei a música para trabalhar com meus alunos”, contou.

Valor histórico é o que não fal-ta na obra de Luiz Gonzaga. Sua música representa a resistência às modernizações e à vida urbana que emergiu durante o desenvolvimen-to do sudeste brasileiro na década de 1950. Na época, os nordestinos deixaram sua terra natal e migraram para os grandes centros em busca de condições de sobrevivência. De acordo com o historiador Veridiano Santos, a música era uma narrativa de suas trajetórias e serviu como uma espécie de reencontro com as tradições deixadas. Ela inventava e

Dezessete e SetecentosLuiz Gonzaga e Miguel Lima

Eu lhe dei vinte mil réisPra pagar três e trezentosVocê tem que me voltarDezesseis e setecentosDezessete e setecentos.

Sou diplomadoFreqüentei a academia

Conheço geografia, sei até multiplicarDei vinte mangos pra pagar

Três trezentosDezessete setecentos

Você tem me voltar.Mas eu lhe dei vinte mil réis

Pra pagar três trezentosVocê tem que me voltarDezesseis setecentos

Dezessete e setecentos.Eu acho bom você tirar os noves fora

Evitar que vá emboraE deixe a conta sem pagar

Eu já lhe disse que essa droga está errada

Vou buscar a tabuadaE volto aqui pra lhe provar.

cristalizava no imaginário social bra-sileiro o perfil de homem forte, mo-ralista, rústico, matuto, não civilizado, nem contaminado pelas novidades dos tempos modernos. Das décadas de 1940 a 1980, suas canções abor-dam temas do cotidiano do homem do Nordeste. “Qualquer música dele pode ser trabalhada e explorada para elucidar um ou outro período da história ou da própria vida do artista”, afirma o historiador.

A utilização das músicas do Rei do Baião na sala de aula exige a apresentação do contexto e das con-dições em que a obra foi produzida. O professor Veridiano exemplifica: “Para utilizar a música ‘Asa Branca’ é necessário destacar que o rádio foi o veículo utilizado para atingir os nordestinos espalhados no Centro-

-Sul e enfatizar que a música tem um caráter comercial e está num momento em que a ideia de nação e região está em discussão no país. A linguagem, apesar de rústica, era inovadora, assim como a sonorida-de, que era moderna, embora falas-se de tradição”, conclui.

Divulgação: Museu Luiz Lua Gonzaga

Page 6: A Noticia Edição Especial II - Luiz Gonzaga

A NOTÍCIA Caruaru, Pernambuco Junho 20126 Especial

1912

“Luiz Gonzaga não morreu nem a sanfona dele desapa-receu...” diz a canção escrita

por Zé Gonzaga, irmão do mestre Lua, em parceria com Zé Amâncio. No ano em que o Rei do Baião com-pletaria 100 anos, é possível, mais do que nunca, perceber como sua voz ainda ecoa junto do toque da sua sanfona nos corações não só do povo nordestino, mas do Brasil inteiro.

Luiz Gonzaga do Nascimento nasceu no dia 13 de dezembro de 1912, na Fazenda Caiçara, a 12 km de Exu. Desde a infância, o pequeno Gonzaga se interessava pelo fole de oito baixos, instrumento executado por “Pai Januário”, no qual come-çou seus primeiros acordes. Antes de Gonzaga completar 16 anos já era conhecido no Araripe e em toda redondeza. Em 1930, revoltado com

decepções amorosas, Luiz Gonzaga foge de casa e ingressa no exército de Crato (Ceará). O mestre começa-va a caminhar para se tornar o Rei do Baião a partir do momento que deu baixa das Forças Armadas, em 1939. Apesar de anteriormente já se apresentar em pequenas festas como sanfoneiro, foi somente neste ano, quando viajou para o Rio de Janeiro e levou sua sanfona nova, que Luiz Gonzaga deu início ao que seria uma das histórias mais promis-soras do mundo da música.

Em 1940, conhece o guitarrista português Xavier Pinheiros, tocando juntos nas casas noturnas, do Rio de Janeiro. Estava decidido a se dedi-car à música. Em 1945, uma cantora de coro, ao qual Luiz mantinha um caso há meses, deu à luz um meni-no, no Rio. Odaléia Guedes já esta-va grávida antes mesmo de conhe-

cer o sanfoneiro. Mesmo assim, ele assumiu a paternidade da criança, adotando-a e dando-lhe seu nome: Luiz Gonzaga do Nascimento Júnior. Após o nascimento do menino, as di-versas brigas fizeram com que eles resolvessem se separar, com menos de dois anos de convivência. Léia fi-cou criando o filho, e Luiz, às vezes, ia visitá-los.

Mais um “artista de rua” a divul-gar seu trabalho e esperar algum re-torno financeiro para o sustento, Luiz Gonzaga usava o chapéu de couro para recolher dinheiro, em meio às vias da então capital federal do país.

Pensando em dar mais espaço à música tradicionalmente nordesti-na, compôs dois chamegos: “Pés de Serra” e “Vira e Mexe” que iriam ren-der as primeiras conquistas da car-reira. Chegando aos famosos shows de calouros, ele não teve muito êxito

1926

Adquiriu sua primeira sanfona, um 8 Baixos, aos 13 anos

1939

Luiz Gonzaga dá baixa nas Forças Armadas e muda-se para o RJ

1940

Vence o show de calouros de Ary Barroso na Rádio Tupi com a música “Vira e Mexe”

1941

Grava assinando pela primeira vez como artista principal e exclusivo de uma emissora nacional

1944

O apelido “Lua”, invenção de Dino 7 Cordas pelo rosto arredondado

inicialmente. Sem desistir, em 1941 resolveu participar do programa de Ary Barbosa, na Rádio Tupi, onde solou sua “Vira e Mexe” e conseguiu o primeiro lugar. Com o prêmio, co-meçou então a participar de vários programas de rádio e gravar discos como sanfoneiro para outros artistas. Nesse mesmo ano, foi convidado para gravar como solista por uma emissora nacional.

Foram nos programas de rádio que o nome do Rei do Baião co-meçou a se construir. Nos anos 40, os artistas eram contratados pelas emissoras e assim Luiz Gonzaga chegou até a Rádio Clube do Brasil e Rádio Tamoio, locais onde gravou mais de 50 solos de sanfona. Em 1943, as roupas de vaqueiros co-meçaram a compor o vestuário do novo artista de rádio, nessa mesma época se iniciou a parceria de seis

Os acordes do No centenário de Luiz Gonzaga, A Notícia percorre sua trajetória, mostrando o porquê de sua consagração como o maior sanfoneiro nordestino de todos os tempos

Nasce Luiz Gonzaga do Nascimento em Exu, no dia 13 de Dezembro

Fernanda Marúsia, Yngridy Pires,

Rebecca Moura, Sabrina Padilha e

Wanessa Galvão 3° período

Wanessa Galvão

Page 7: A Noticia Edição Especial II - Luiz Gonzaga

A NOTÍCIACaruaru, Pernambuco Junho 2012

1944

O apelido “Lua”, invenção de Dino 7 Cordas pelo rosto arredondado

Os acordes do No centenário de Luiz Gonzaga, A Notícia percorre sua trajetória, mostrando o porquê de sua consagração como o maior sanfoneiro nordestino de todos os tempos

7

1945

Reconhece Gonzaguinha como seu filho

1947

Grava a toada “Asa Branca”, clássico nordestino, em parceria com Humberto Teixeira

1951

É reconhecido como Rei do Baião

1980

Luiz Gonzaga canta para o Papa João Paulo II na capital cearense

1984

Gonzaga recebe o primeiro disco de ouro com o LP Danado de Bom

02 de agosto de 1989

Morre Luiz Gonzaga, aos 76 anos de idade

anos com Miguel Lima, que rendeu a letra da música “Vira e Mexe”, um de seus primeiros grandes suces-sos. A fama de “maior sanfoneiro do Nordeste” estava se espalhando aos poucos pelo Brasil.

O apelido de “Lua” veio em 1944, por invenção de Dino 7 cor-das e divulgação do radialista Paulo Gracindo, na Rádio Nacional. O mo-tivo seria o seu rosto arredondado. Um ano depois, grava seu 25º disco como sanfoneiro e o primeiro como cantor, porém o reconhecimento como intérprete somente se deu com o 31º disco da carreira com a mazurca “Cortando o Pano”, em parceria com Miguel Lima e Jeová Portella. Ainda com Miguel Lima criou “Dança, Mariquinha” “Penerô Xerém” e “Dezessete e Setecentos”. Um ano depois, Gonzaga conheceu outro nome de destaque entre suas

Rei

Especial

Com o falecimento de Odaléia devido a uma tuberculose, Luiz ten-tou levar Gonzaguinha para morar com ele e Helena, mas esta não aceitou. Assim, entregou a crian-ça para os padrinhos, Leopoldina e Henrique Xavier Pinheiro. O pai sempre o visitava e dava assistência financeira.

A década de 1950 marcou a fase áurea da música nordestina. Luiz Gonzaga ganhava o codinome

“Rei do Baião”. Em 1950, gravou “Cintura Fina” e “A Volta da Asa Bran-ca” e somou diversas apresentações pelo interior do país.

A partir dos anos 80, vieram os grandes encontros com Elba Rama-lho, Milton Nascimento, Raimundo Fagner e Dominguinhos, este último, conhecido atualmente como um de seus maiores seguidores. Neste mesmo período, fez dupla com seu filho de criação Gonzaguinha, freali-zando shows com a “Vida de Viajan-te” e passou a ser chamado também de Gonzagão. O primeiro disco de ouro em 1984 com “Danado de Bom” foi um marco em sua trajetória e em seguida vieram duas apresentações pela Europa.

Pouco conhecida para o públi-co em geral é a participação de Luiz Gonzaga no cinema. Por volta do fim da década de 1940 e início da de 1950, os filmes mais populares abriam espaço para os músicos de sucesso da época e encontravam grande empatia e aceitação entre os espectadores. No cenário que mar-ca o apogeu do baião, o Rei garante seu espaço na memória cinemato-gráfica brasileira.

Entre os filmes com participa-ção do mestre, estão “É com esse que eu vou” (1948), “Sem essa ara-nha” (1970), “O comprador de fazen-das” (1951) e “Hoje o galo sou eu” (1958). No ano de seu centenário, Gonzaga reaparece nos cinemas,

parcerias: o advogado e poeta ce-arense Humberto Teixeira. Assim, a cultura nordestina ganhou mais força nas criações do mestre Lua. Canções como “Baião” e “Meu Pé de Serra” (1946), “Asa Branca” (1947), “Juazeiro” e “Mangaratiba” (1948) e “Paraíba” e “Baião de Dois” (1950) levavam a assinatura dos companheiros de música e sedi-mentaram o ritmo do Baião.

Em 1946, Luiz voltou pela primeira vez a Exu, e teve um dos mais emocionantes reencontros com seus pais, Januário e Santana, que há anos não sabiam nada so-bre o filho. Em 1948, casou-se com sua noiva, a pernambucana Helena Cavalcanti, professora que tinha se tornado sua secretária particular. Eles não tiveram filhos biológicos, mas adotaram uma menina, a quem batizaram de Rosa.

Fernanda Marúsia, Yngridy Pires,

Rebecca Moura, Sabrina Padilha e

Wanessa Galvão 3° período

mas agora apenas sendo represen-tado. O fato se deve ao lançamento do filme “Gonzagas: de pai para fi-lho”, com direção de Breno Silveira e estreia marcada para 26 de outubro. Contando a história não apenas do músico, mas também do homem, o foco é na relação entre Luiz Gonza-ga e seu filho, Gonzaguinha.

A influência de Luiz Gonzaga na música é de tanta importância que o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a lei nº 11.176, em 6 de setembro de 2005, que institui 13 de dezembro de cada ano o Dia Nacional do Forró, em homenagem à data natalícia do sanfoneiro. O Rei disse em entre-vista à Revista Veja, em 1972, que

“inventara o som do Nordeste”, o que não deixa de ser verdade diante da riqueza de gêneros e ritmos musi-cais que tocou e cantou e de sua larga contribuição e influência na cultura regional e brasileira. Além do forró, palavra de origem etimoló-gica incerta, Luiz Gonzaga tocou e cantou dezenas de outros gêneros e ritmos. Entre eles baião, bumbá, chamego, choro, maracatu, marcha, polca, rancheira, toada, samba, val-sado, xote, entre diversos outros.

Para o artista caruaruense Erisson Porto, Gonzaga é o maior representante da música nordestina.“ A realidade do Sertão, a situação social e política eram expostas em seu trabalho de forma muito natu-ral, tornando-se assim elementos essenciais de suas composições. Suas canções contam a história de um povo alegre, trabalhador e sofri-do”, afirma. Seriam 100 anos de vida e, embora Gonzagão já não esteja entre nós desde 1989, ainda é o maior nome da identidade musical nordestina. A voz forte e a persona-lidade simples fizeram do artista de 56 discos e 500 canções a maior re-ferência do forró de todos os tempos.

Fonte: Memorial Luiz Gonzaga – Prefeitura do Recife

Page 8: A Noticia Edição Especial II - Luiz Gonzaga

A NOTÍCIA Caruaru, Pernambuco Junho 2012

Um bom forró e um par de dançarinos já fazem um São João mais animado, mas

quando o assunto é dança, as qua-drilhas juninas dão show. Com o mo-tivo da grande festa que acontece após o casamento matuto, as qua-drilhas surgem com força total até os tempos de hoje. De uma maneira diferenciada em 2012, algumas ho-menagearam Luiz Gonzaga. Uma das responsáveis, e que vem se pre-parando desde o ano passado, é a Quadrilha Arrastapé Dom Vital, per-tencente à escola de mesmo nome, situada em Caruaru, que aproveita e

Cultura

Caruaru é bastante conhecida por sua feira, pela arte de Mestre Vitalino, pelo forró e

pelo São João, considerado o maior e melhor do mundo. A cidade conta com um Pátio de Eventos, nomeado de Luiz “Lua” Gonzaga, em home-nagem ao nordestino de Exu que considerava Caruaru como sua se-gunda casa. Foi assim que, no dia 29 de maio de 1999, Caruaru decidiu homenageá-lo mais uma vez. Tal ho-menagem ocorreu através da criação do Museu do Forró Luiz Gonzaga.

O museu conta um pouco da história de Luiz, desde sua paixão pela música até sua vida pessoal, possuindo um acervo admirável com peças doadas pela família do cantor.

A estátua de Gonzagão tem oito metros de altura e recepciona quem visita o Pátio de Eventos

Na entrada do pátio onde foi constru-ído o museu, também foi inaugurada uma estátua, que fica bem em frente para recepcionar os visitantes e o povo caruaruense. A estátua de Luiz Gonzaga tem oito metros de altura e foi construída em concreto pelo ar-tista plástico paraibano Caxiado. O monumento passou por reparos no final de 2011 para acolher os turistas que vieram visitar a cidade no cente-nário do Velho Lua.

No dia 17 de dezembro de 2008, o hall de acesso ao museu e as salas passaram por uma revita-lização, apresentando um novo es-paço para o estudo, preservação e divulgação dos festejos juninos.

O pátio de eventos está loca-lizado em uma área de 40 mil m², onde funcionava a antiga Fábrica Caroá, que foi construída nos anos 1930. Na década de 1970, a fábrica

passou por uma grave crise financei-ra e acabou decretando falência. O prefeito José Queiroz, no final da dé-cada de 1980 conseguiu através do então Ministro da Justiça, Fernando Lyra, que o terreno fosse doado ao município.

Neste ano de 2012, “Lua” com-pletaria 100 anos. E é por esse mo-tivo que ele é o principal homenage-ado do São João da cidade. Afinal, Luiz Gonzaga contribuiu bastante para o crescimento da música popu-lar brasileira e desejava ser lembra-do da seguinte maneira: “Gostaria que lembrassem que sou filho de Ja-nuário e dona Santana. Gostaria que lembrassem muito de mim, que esse sanfoneiro amou muito seu povo, o Sertão. Decantou as aves, os ani-mais, os padres, os cangaceiros, os retirantes. Decantou os valentes, os covardes e também o amor.”

Helder Quaresma e Joalline Nascimento3° período

faz do Rei do Baião o seu tema. “O bom é que podemos homenagear o homem que saiu do nosso Estado e só nos dá orgulho até hoje. Acaba se tornando uma forma de agradeci-mento pela herança que ele nos dei-xou”, explica Wagner Rafael, um dos integrantes da Arrastapé Dom Vital.

A quadrilha campeã no concur-so de Arcoverde 2011 vem em 2012 com a sua homenagem a Luiz Gon-zaga. Além de apresentações na ci-dade, o grupo participa de concursos em outras regiões e aproveita pra divulgar o São João. É o que diz um dos fundadores da Arrastapé, Walter Reis: “Essa é uma forma de sair de Caruaru e mostrar o que o nosso São João tem de bom” .

André Vinicius e Marina Castro3° período

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Homenagem a um sanfoneiro que amou seu povo

Estátua de Luiz “Lua” Gonzaga

Fotos: Taciana Patricia

Luiz Gonzaga é tema de quadrilhas

Figurino, coreografias e músicas em tributo ao Rei Luiz “Lua” Gonzaga.

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A NOTÍCIACaruaru, Pernambuco Junho 2012

Caruaru tem o privilégio de ser uma das cidades mais cantadas do Brasil e uma das mais do mundo! Em diversos ritmos, sua história, sua gente, sua produção artística, vários dos seus elementos são cantados, ajudando Caruaru a ser bastante co-nhecida em diversos lugares. Musa inspiradora, canções a seu respeito foram interpretadas nas vozes de forrozeiros, cantores de frevo, de rock, de MPB, etc. A música, neste sentido, termina por se constituir de um lugar de discurso, de narrativa, de criação de um cenário identitário. São João, forró, feira livre, Vitalino, Alto do Moura, tudo isso é ouvido nas letras que falam da nossa glorio-sa terrinha.

Podemos dizer que Luiz Gonza-ga é, em grande parte, responsável por isto, pois, com seu nome, sua influência e, principalmente, com seu legado, ele abriu caminho para que diversos artistas decantassem Caru-aru, mesmo não tendo sido Gonzaga o primeiro a criar uma música de re-percussão nacional da cidade

A primeira música nacional-mente conhecida, segundo nossas pesquisas, foi “Caruaru”, de Belmiro Barrela, gravada inicialmente, em 1953, por Cauby Peixoto: “Foi num belo dia de verão / Que eu perdi meu coração / Foi numa cidade do Sertão / Que guardo na recordação / Caru-aru, Caruaru / A princesinha do norte és tu.” Evidentemente que Caruaru já era tema para artistas locais, já era mote para repentistas, mas, com esta canção, começou a abrir espa-ços e ser visualizada fora da região.

Em 1957, veio o reconheci-mento maior com “Feira de Caru-aru” (Onildo Almeida) e “Caruaru

- Capital do Agreste” (O. Almeida/Nelson Barbalho), ambas gravadas por Luiz Gonzaga. Dois anos antes, Luiz Gonzaga e Jackson do Pandei-ro já haviam gravado músicas com a temática “festas” em Caruaru (“O Sanfoneiro Zé Tatu” e “Forró em Ca-ruaru”, respectivamente).

Na década seguinte, Ludugero foi um grande divulgador de Carua-ru. Entretanto, a massificação de Ca-ruaru como tema musical se deu nos anos 70 e 80, em grande medida li-gada à vinda de diversos forrozeiros para a cidade e pela divulgação de suas obras nas rádios caruaruenses (Cultura, Difusora e Liberdade). Vale salientar que Luiz Gonzaga “vivia” por aqui, para divulgar seus traba-lhos, sendo, isto, mais uma forma de abertura de espaço para outros forrozeiros. Nos anos 70, o “Velho Lua” gravou “Cidadão de Caruaru”, composta por Janduhy Finizola, com participação de Onildo Almeida.

Todo mundo passava, então, a cantar Caruaru: Azulão, Jacinto Sil-va, Jorge de Altinho, Petrúcio Amo-rim, Alceu Valença, Elba Ramalho, Geraldo Azevedo, bandas de pífa-nos (dos Bianos, Biu do Pife, João do Pife), Elifas Jr., Lulica dos Palma-res, Ezequias, Pedro Sertanejo, Se-

bastião do Rojão, Três do Nordeste, Mestre Zinho, etc. Lembra-se deles? Lembra de suas músicas? Qual ou-tra cidade tem tanta coisa dita e can-tada sobre si? O forró passou a ser o rosto musical de Caruaru, ainda hoje sendo famoso o seu período junino e suas manifestações artístico-cultu-rais. E, sendo um de seus maiores expoentes, a música caruaruense tem ultrapassado fronteiras, sejam nacionais ou internacionais.

A música mais famosa sobre Caruaru é “Capital do Forró”, de composição de Lindu e Jorge de Al-tinho, gravada pelo Trio Nordestino em 1980. Desde então, ela é o hino da festa junina caruaruense, sendo obrigação no repertório de qualquer forrozeiro que se preze. Para se ter ideia da proporção da fama de Caru-aru, em 1995, foi gravado um cd de forró, em Paris, na França, e o título era: “Caruaru, Capital do Forró”. No encarte deste cd, um aviso: quem quiser encontrar uma das raízes da música brasileira, o endereço é fácil: vá a Caruaru.

Nossa cidade tem orgulho des-ta história e, com certeza, Luiz Gon-zaga do Nascimento foi um dos seus grandes artífices.

José Daniel da Silva Mestre em História pela UFPE

Professor e pesquisador

9Opinião

PaPo sem Pauta

O legado de Luiz Gonzaga para Caruaru e o Brasil

Caruaru é uma das cidades mais

cantadas do Brasil e do mundo. Qual outra cidade tem tanta coisa dita e cantada sobre si?

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A NOTÍCIA Caruaru, Pernambuco Junho 2012Comportamento10

Um Agreste de fãs para o velho Lua

Em três cidades da região residem verdadeiros apaixonados por Luiz Gonzaga

Yanna Letícia, Fillipe Rodollfoe André Luiz Melo3° período

Josa Leite há anos celebra o aniversário do rei

Aurelina recorda seu passado ouvindo Gonzagão

Pai e filho guardam relíquias do saudoso Luiz Gonzaga Ernestina se emociana ao ouvir a música Asa

Branca

Fã que é fã nunca esquece, assim são os admiradores do cantor e compositor Luiz “Lua”

Gonzaga. Diferentemente dos apai-xonados pelos ritmos do momento, os seguidores do Rei do Baião ja-mais apagam da memória as can-ções que de uma forma ou de outra marcaram suas vidas.

Ao chegar a qualquer cidade da região, não é difícil encontrar alguém que saiba cantar uma de suas com-posições. A exemplo disso descobri-mos, no Agreste pernambucano, um verdadeiro quarteto de apaixonados pelo Gonzagão.

Passando pela capital do Agreste conhecemos a assistente de finanças Aurelina Leite, 47 anos. Para ela, ouvir uma música de Luiz Gonzaga é sinônimo de emoção. “Quando ouço a música Asa Branca

lembro-me da época em que vivia com meus pais”, recorda. Ela conta que ainda enquanto criança foi leva-da por várias vezes para apresenta-ções do compositor pernambucano e compara: “No tempo dos shows de Luiz Gonzaga o São João era mais tranquilo, as pessoas iam para brincar”, afirma Aurelina.

Já no município de Belo Jardim, são muitos os anos que sintetizam a admiração que o radialista Josa Lei-te, 53 anos, tem pelo velho Lua. “Há 15 anos que vou com amigos para o aniversário de Luiz Gonzaga em Exu [no Sertão]”, destaca.

Josa ainda conta que nunca se esquece do show que o Rei do Baião fez na cidade Belo Jardim.

“Lembro-me como se fosse hoje, eu tinha uns 17 anos quando ele fez um show em cima de um caminhão lá na Praça da Conceição”, relem-bra.

Na cidade de Toritama, o jo-vem Everton Silva, 24 anos, passou

a gostar desde criança das músicas de Luiz Gonzaga através de seu pai. “Luiz Gonzaga tinha um dom de transformar a poesia em música, em suas composições ele retratava a realidade de sua época como, por exemplo: a vida do nordestino, a seca no Sertão e ele trazia todo o reflexo da realidade”, disse Everton. Duas de suas músicas preferidas são a famosa “A Hora do Adeus” e a

“Volta da Asa Branca”.Já sua avó Ernestina Maria da

Silva, 84 anos, contou algo marcante em sua vida: “Quando minha primei-ra filha Maria Lúcia tinha completado 4 meses de idade, passou um carro perto da minha casa tocando a músi-ca Asa Branca, de Luiz Gonzaga. Na-quela época ela estava muito doente e dias depois Lúcia veio a falecer”, la-menta. Há mais de 60 anos da morte de sua filha, Ernestina se emociona sempre que escuta a canção e afir-ma que vai levar esta recordação até o fim da vida.

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A NOTÍCIACaruaru, Pernambuco Junho 2012

O São João de Caruaru, que este ano homenageia o centenário do mestre Luiz

Gonzaga, assim como tantos outros pelo Nordeste, atrai milhares de pes-soas e forrozeiros de todas as regi-ões do país, inclusive, com grande movimentação de estrangeiros nos polos de animação espalhados por várias cidades do Litoral ao Sertão. Como consequência dessa época festiva, há toda uma preparação da mídia regional (às vezes até nacio-nal) para destacar a importância e grandiosidade desta data para os amantes da cultura nordestina.

Muitos são os desafios em fa-zer uma cobertura especial sobre os 100 anos do saudoso e eterno Gon-zagão, visto que é preciso abordar o tema sem cair na mesmice de repetir o que já foi publicado anteriormente pelo próprio veículo ou seu concor-rente, bem como montar uma boa estrutura de produção, filmagens, fotos, áudios, entrevistas, análises econômico-culturais, equipe sufi-ciente e, claro, fazer um grande in-vestimento financeiro.

O trabalho se dá desde a produ-ção de pauta até o balanço final para avaliar os resultados da cobertura. Para a jornalista e coordenadora do curso de Jornalismo da Faculdade do Vale do Ipojuca (Favip), Rosan-gela Araújo, a comemoração do cen-

Comportamento 11

Transmissão e cobertura do centenário do Rei do Baião

A mídia mobiliza equipes de jornalismo para veicular as festividades juninas que homenageiam Luiz Gonzaga

Cicero Ismael

tenário de Luiz Gonzaga representa, para a mídia regional, um grande de-safio e ao mesmo tempo uma opor-tunidade de crescimento profissional. Primeiro porque demanda um bom investimento técnico, uma equipe preparada e uma estrutura que dê conta de cobrir todos os polos fes-tivos e, segundo, por mostrar que a imprensa interiorana também tem organização, conteúdo e qualidade para oferecer. “Como prova da com-petência de nossos jornalistas temos, por exemplo, o caso do Portal Terra (um dos mais bem estruturados do país) que há pouco contratou alguns ex-alunos e hoje profissionais para trabalhar na cobertura do São João 2012 em Caruaru, sendo essa a pri-meira vez que isso acontece. Tal fato só reflete o quanto nossa mídia está preparada para cobrir grandes even-tos como esse”, afirma Rosângela.

Grande parte da mídia pernam-bucana já publicou e/ou citou algu-ma matéria sobre o São João 2012

e a comemoração do centenário do inesquecível Rei do Baião em Caru-aru e diversas outras cidades do Es-tado. O jornalista Diógenes Barbosa, repórter do Jornal Extra, diz que o veículo tem abordado a temática do centenário em várias edições no decorrer deste ano e especialmente agora com o São João acontecendo na prática. “Assim como os grandes veículos do Estado, temos destina-do um espaço interessante do peri-ódico para conteúdos relacionados ao centenário de Luiz Gonzaga. Essa já foi a temática de, ao menos, três capas da editoria de Cultura”, lembra.

Como a concentração de meios midiáticos nesse período junino, em Caruaru, é bastante significativa, o desafio dos veículos é trazer um dado novo, um detalhe que faça a diferença na hora de apurar a notí-cia. Diógenes é enfático ao afirmar que um mês inteiro de festividades representa muito no “descobrir” de

detalhes. “Isso nos faz construir um conteúdo interessante, afinal de contas, o leitor é crítico e é o diferen-cial que chama a atenção dele. No entanto, é preciso lembrar que os fatos continuam acontecendo a todo instante e não podemos, de forma alguma, deixar que as festividades nos façam abster-se de mostrá-los, e, principalmente, reivindicar melho-rias”.

Diógenes também destaca que a cobertura do São João de Caruaru em 2012 traz uma sensibilidade jor-nalística muito peculiar, isso porque Luiz Gonzaga é um dos artistas que levaram um dos ritmos mais popu-lares do Nordeste, o forró, aos qua-tro cantos do país. “A importância disso está no fato de que estamos inseridos na região onde os feste-jos juninos significam muito, seja nos aspectos culturais, turísticos ou mesmo econômicos. Mais ainda: na ‘Capital do Forró’, na terra do Mestre Vitalino”.

Cícero Roberto, Izaias Néu, Karliane Silva e Renê Gomes3° período

O jornalista Diógenes Barbosa entrevistando a integrante da banda Calypso Joelma no centenário de Luiz Gonzaga

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A NOTÍCIA Caruaru, Pernambuco Junho 201212