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II CONINTER Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades Belo Horizonte, de 8 a 11 de outubro de 2013 A NECESSIDADE DA RETOMADA DO CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE: UM ELO PERDIDO ENTRE HOMEM E NATUREZA ABRAHÃO, KARLA C. F. J. (1); SOUZA, ROBERTA V. G. (2); ASSIS, ELEONORA S. (2) 1. UFMG Universidade Federal de minas Gerais. EA-MACPS (Escola de Arquitetura Mestrado em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável). [email protected] 2. Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Tecnologia da Arquitetura e do Urbanismo, LABCON-Laboratório de Conforto Ambiental e Eficiência Energética do Ambiente Construído. [email protected]; [email protected] RESUMO Centenas de milhões de anos foram necessários para se chegar a um estado de equilíbrio da biosfera tal que pudesse acomodar a vida humana. Nos primórdios de sua existência o homem utilizava-se da natureza para abrigar e prover recursos estritamente necessários à sua sobrevivência. A evolução do pensamento filosófico transformou a relação entre homem e natureza para uma situação de domínio do homem sobre esta tendo como consequência a sobre-exploração de matéria e energia. Os processos de produção industrial para manter a sobrevivência do homem contemporâneo no atual padrão de vida demanda um intenso processo de transformação de energia e matéria-prima. A tendência de crescimento populacional combinada à tendência de crescimento de áreas urbanas coloca em discussão uma nova forma de consumo já que a população não tem como buscar recursos fora do planeta. Neste âmbito as construções são grandes oportunidades para retardar as transformações. Mas será necessária a adoção de práticas sustentáveis em grande escala para que seus efeitos sejam globalmente significativos. E para isto, deverá haver empenho global e mútuo entre os setores políticos, sociais, culturais e econômicos possibilitando o exercício do conceito de sustentabilidade, a qual o homem naturalmente exercia enquanto vivia integrado à natureza. Palavras chave: Sustentabilidade. Desenvolvimento sustentável. Relação Homem x Natureza. Habitat humano. Equilíbrio sistêmico global.

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II CONINTER – Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades

Belo Horizonte, de 8 a 11 de outubro de 2013

A NECESSIDADE DA RETOMADA DO CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE: UM ELO PERDIDO ENTRE HOMEM E NATUREZA

ABRAHÃO, KARLA C. F. J. (1); SOUZA, ROBERTA V. G. (2); ASSIS, ELEONORA S. (2)

1. UFMG – Universidade Federal de minas Gerais. EA-MACPS (Escola de Arquitetura – Mestrado em

Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável). [email protected]

2. Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Tecnologia da Arquitetura e do Urbanismo,

LABCON-Laboratório de Conforto Ambiental e Eficiência Energética do Ambiente Construído. [email protected]; [email protected]

RESUMO Centenas de milhões de anos foram necessários para se chegar a um estado de equilíbrio da biosfera tal que pudesse acomodar a vida humana. Nos primórdios de sua existência o homem utilizava-se da natureza para abrigar e prover recursos estritamente necessários à sua sobrevivência. A evolução do pensamento filosófico transformou a relação entre homem e natureza para uma situação de domínio do homem sobre esta tendo como consequência a sobre-exploração de matéria e energia. Os processos de produção industrial para manter a sobrevivência do homem contemporâneo no atual padrão de vida demanda um intenso processo de transformação de energia e matéria-prima. A tendência de crescimento populacional combinada à tendência de crescimento de áreas urbanas coloca em discussão uma nova forma de consumo já que a população não tem como buscar recursos fora do planeta. Neste âmbito as construções são grandes oportunidades para retardar as transformações. Mas será necessária a adoção de práticas sustentáveis em grande escala para que seus efeitos sejam globalmente significativos. E para isto, deverá haver empenho global e mútuo entre os setores políticos, sociais, culturais e econômicos possibilitando o exercício do conceito de sustentabilidade, a qual o homem naturalmente exercia enquanto vivia integrado à natureza. Palavras chave: Sustentabilidade. Desenvolvimento sustentável. Relação Homem x Natureza. Habitat humano. Equilíbrio sistêmico global.

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1. INTRODUÇÃO

“A história da vida na Terra tem sido uma história de interação entre os seres vivos e seus

arredores” (CARLSON, 1962, p.5). Por milhões de anos a natureza terrestre foi moldada por seus

próprios mecanismos através de um constante equilíbrio sistêmico. Centenas de milhões de anos

foram necessários para se chegar a um estado de equilíbrio da biosfera tal que esta pudesse

acomodar a vida humana. A evolução da vida na Terra passou por fases hostis e a estabilização

relativamente recente da espécie humana alcançou equilíbrio a partir apenas dos últimos milênios,

situação a qual levou ao desenvolvimento e domínio desta espécie sobre todas as outras.

A partir da estabilização da espécie humana na Terra, o homem veio a utilizar-se da natureza para

abrigar e prover recursos estritamente necessários à sua sobrevivência. Porém, desde que

aprendeu a cultivar plantas passou a alterar compulsivamente o ecossistema, e sua relação com a

natureza excedeu a questão de sobrevivência (LYLE,1999, p.15). Esta situação de domínio do

homem sobre a natureza resultou em transformação dos ambientes naturais e do habitat humano.

As transformações do habitat humano evoluíram de tal forma que a espécie humana passou a se

organizar em grandes núcleos ou aglomerações de habitações, o que veio mais tarde denominar-se

cidade ou centros urbanos. E foi além. O homem, com o desenvolvimento da indústria química

iniciada no século XIX, passou a desenvolver processos caracterizados pela emissão de elementos

químicos com composições diferentes das composições químicas naturais que se acumulam na

biosfera e facilmente se deslocam sobre os seus diversos canais (atmosfera, cursos d´água, lençóis

subterrâneos, etc.), afetando habitats em escala global (CARLSON, 1962, p.5). A partir de épocas

mais recentes, precisamente após o século XX, o desenvolvimento das sociedades e o aumento da

manipulação do ambiente pelo homem para manter seu estilo de vida tem levado a uma crescente

emissão de resíduos químicos. A escala de produção industrial necessária para manter a

sobrevivência do homem neste padrão de vida demanda grandes processos de transformação de

energia e matéria-prima (GUELLER, 2003). A natureza da biosfera recebendo todas estas

emissões resultantes destes processos vem sofrendo mudanças significativas (CARLSON, 1962,

p.6). Apesar do mecanismo de ajuste de equilíbrio sistemático da biosfera, a tendência de

desordem e irreversibilidade desta situação, fora do domínio humano, pode colocar em risco a

dinâmica do planeta (LOVELOCK, 1982). A alteração e contaminação química atmosférica, único

meio capaz de prover vida ao ser humano, resulta no risco de sobrevivência de sua própria espécie

(CARLSON, 1962; LOVELOCK, 1982).

A maneira como o homem ocupa o espaço é derivado da maneira como ele vive como sociedade e

como as decisões políticas, econômicas, sociais e culturais são tomadas neste âmbito. A forma

como uma sociedade lida localmente com os recursos naturais e se conecta à natureza determina

seu próprio potencial de vida. Desta forma, pode-se apreender muito de uma sociedade ao

analisar-se a maneira como esta lida com os recursos disponíveis, podendo-se inferir sobre seus

valores, seu potencial de desenvolvimento e seu nível cultural (DIAMOND, 2012).

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2. A EVOLUÇÃO DA RELAÇÃO DE DOMÍNIO HOMEM x NATUREZA

O homem desenvolveu suas capacidades corporais, manipulou objetos, criou ferramentas e passou

a alterar o ambiente a sua volta. Social por natureza, e já dispondo de ferramentas, o homem vem

constantemente evoluindo seu habitat desde os primórdios de sua existência. O local escolhido

como habitat desde sempre foi medido pela busca do conforto através da proximidade aos recursos

que pudessem garantir a sua sobrevivência. Inicialmente vivendo em ambientes naturais hostis

utilizava-se das cavernas naturais como moradia, uma questão de sobrevivência. Em ambientes

naturais menos arriscados o homem construiu cabanas, formou aldeias. Vivendo em sintonia com a

natureza, utilizava-se dela apenas para a própria sobrevivência.

A partir do momento em que o homem conseguiu cultivar as espécies vegetais ele passou a

interferir e modificar compulsivamente a natureza em sua forma original (LYLE, 1999). A

alimentação dos aglomerados populacionais sempre foi um grande desafio. Desenvolvidas as

técnicas de agricultura de subsistência, transpôs o obstáculo do abastecimento alimentar das

populações, e seus habitats puderam ser conformados por grandes áreas construídas, habitações

aglomeradas: as cidades. Inicialmente sem grandes recursos de transporte, estas áreas agrícolas

aconteciam em áreas anexas às cidades, como, por exemplo, os terraços Incas escalonados e

irrigados nos Andes, que possibilitaram a vida da civilização Inca.

De forma geral, as cidades vêm cada vez mais ampliando suas fronteiras e causando diversos

impactos ambientais. A mudança de uso do solo, a necessidade de relocação das áreas agrícolas, o

deflorestamento, a crescente demanda de água potável e de canais (solo, cursos d’água) para

despejo de resíduos, dentre outros, são aspectos ambientais relevantes resultantes do crescimento

das cidades. No mundo contemporâneo, o transporte e a logística conseguiram resolver a questão

do abastecimento alimentício das cidades. Porém, outros problemas surgiram, principalmente

associados à demanda de recursos naturais e à crescente produção e destinação de resíduos não

reutilizáveis. As cidades transformaram-se em grande aglomerados de moradias, desordenadas,

com excesso de superfícies impermeáveis, com recursos naturais degradados, afastadas de

elementos naturais saudáveis e muitas vezes desprovidas de condições mínimas de saúde. Esta

forma de ocupação do solo no espaço urbano é considerada como o grande problema ambiental da

atualidade.

O distanciamento das atividades físicas do homem com a natureza no mundo contemporâneo pode

ser um elo para o entendimento de uma parte dos problemas ambientais que cercam o ambiente

construído da atualidade.

A relação “Homem x Natureza” é intrínseca às correntes do pensamento econômico sendo

necessária uma visão de sua evolução para a compreensão da atual problemática do ambiente

construído.

No período Greco (2000 a.C - 146 a.C) a natureza dominava o homem em um estado

filosoficamente passivo. Para o homem grego a natureza era eterna, parte da criação do etéreo e

por isso o homem não a questionava e nem tentava modificá-la. A explicação dos fenômenos

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naturais se explicava através das ações dos deuses da mitologia grega. A filosofia clássica grega

buscou determinar princípios que regiam o mundo material e diferentemente da ciência, não

procurou explicar os fenômenos naturais (LENOBLE, 1969).

A filosofia cristã (século II até os dias de hoje) justificou a relação “Homem x Natureza” através da fé

divina, considerando ser Deus o criador da natureza e o único Ser eterno. Entre o século II e VIII, na

filosofia Cristã, dominou o movimento Patrístico que defendia exclusivamente a fé. Mas a relação

“Natureza e criação Divina” aparentemente harmoniosa levantou muitas contradições e fez-se

evoluir para a Escolástica.

A Escolástica, movimento dominante do século IX até o fim da Idade Média (século XVI) foi o

método de pensamento crítico que conciliava a fé com o pensamento racional. Aqui o racionalismo

humano iniciou a busca para a explicação dos fenômenos naturais. Mas somente na Era das Luzes,

ou Iluminismo, a partir do século XVII, solidifica-se o conceito de subjetividade e a filosofia rompe

com a doutrina Escolástica surgindo a então denominada Filosofia Moderna.

A partir da Filosofia Moderna são construídos grandes sistemas filosóficos unificadores de vários

campos ligando as ciências naturais às ciências políticas, ética, lógica, metafísica e outras. O

homem não só compreende a natureza como também passa a entendê-la e a experimentar o

comportamento de seus fenômenos. Desde então um novo entendimento baseado nos métodos

experimental e hipotético passaram a orientar o pensamento Iluminista à respeito da natureza. Os

fundamentos da concepção da natureza e sociedade moderna sustentavam-se na capacidade de

racionalidade do indivíduo em justificar a existência das coisas que o cercavam. Tudo deixou de ser

uma mera criação divina. A natureza, portanto, não pertencia à Deus mas ao próprio homem.

A época da Filosofia Moderna é coincidente com o período político Imperialista ou Colonialismo

(século XV ao XIX) marcado pela política de domínio territorial, cultural e econômico de uma nação

sobre as outras. Somente com a compreensão de alguns fenômenos naturais e de posse de teorias

existenciais foi possível ao homem europeu partir em busca de novos territórios, novas conquistas.

O período econômico entre os séculos XVI e XVIII denominado como Capitalismo Comercial foi

marcado pela busca de novos mercados e por novas colônias. A Europa, desprovida de riquezas

minerais e solos abundantes e férteis em seu território, necessitava ampliar suas atividades

comerciais para manter seus níveis de riqueza, principalmente através do acúmulo de metais, das

pedras preciosas e do comércio agrícola. No final do século XIX e início do século XX os países

Imperialistas se lançaram numa corrida por matéria-prima, por mercados consumidores e por

países com fragilidade política, com o intuito de colonizar para explorar recursos naturais. A

exploração da natureza era uma questão de sobrevivência dos grandes impérios. Ásia, África e a

recém-descoberta América abasteceram a sociedade européia por longos anos de ouro, prata,

especiarias, mão-de-obra escrava e outras matérias-primas não encontradas em solo europeu

(DAVIS, 2002). A busca por recursos naturais em territórios adjacentes colocou a relação “Homem x

Natureza” em uma situação de completo domínio e usufruto potencial do homem sobre a natureza,

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de maneira muito além da questão da sua sobrevivência, ou seja, o domínio da natureza tinha como

objetivo principal o acúmulo de riqueza e poder.

Com um grande acúmulo de riqueza e de territórios abastecedores em situação de domínio os

grandes impérios mantinham em alta seus estoques de matéria-prima e energia, o que contribuiu

com uma mudança significativa no processo de produção ocorrida a partir do século XVIII que deu

inicio ao Capitalismo Industrial, principalmente na Europa. Conforme Davis (2002) o

Neocolonialismo, domínio econômico europeu, foi financiado pela exploração maciça dos recursos

dos países periféricos, principalmente Ásia e África, que sofreram epidemias de fome e mortes em

massa. As colônias pagavam a conta do bem estar social e riqueza dos grandes impérios (DAVIS,

2002).

Com o rápido enriquecimento de grandes grupos industriais a partir de meados do século XIX e ao

longo do século XX surge o era do Capitalismo Monopolista-financeiro, fundamentado nas molas

mestras dos sistemas bancários, nas grandes corporações financeiras e no mundo globalizado. O

capitalismo foi uma síntese da transformação das grandes nações imperialistas e seu potencial de

riqueza acumulada em uma nova ordem política global estruturada em grandes corporações

financeiras. E nesta fase a qual nos encontramos no momento, a perspectiva ambiental ainda

encontra-se vinculada e determinada pela evolução dos processos político-econômicos.

3. ECOSSISTEMAS HUMANOS EM DESEQUILÍBRIO SISTÊMICO

A Teoria Geral dos Sistemas (TGS) proposta em 1968 por Ludwig Von Bertalanffy considera que

toda a relação entre duas ou mais partes ao se inter-relacionar determina e compõe um sistema

aberto ou fechado. Bertalanfy definiu os sistemas abertos como aqueles que interagem com o meio

ambiente, adaptando-se e reajustando-se constantemente para a manutenção de sua capacidade

reprodutiva ou de continuidade. Contrariamente, os sistemas fechados, são independentes ao meio

e não apresentam intercâmbio com o meio ambiente que os circunda, portanto não podem

influenciar ou serem influenciados por outros ambientes (BUCKLEY, 1971).

Conforme Rifkin (1981) a Terra pode ser considerada como um sistema fechado em relação ao

Universo porque apesar de trocar energia com o Universo não troca matéria. O autor ainda, em sua

visão de mundo, considera que a Terra nada mais é que um grande sistema regido pela 2ª lei da

termodinâmica, onde matéria e energia só podem ser transformadas em uma única direção.

A primeira lei da termodinâmica é a lei da conservação e estabelece que, embora a energia não

possa ser criada nem destruída, pode ser transformada de uma forma para outra. A segunda lei da

termodinâmica, que complementa a primeira, fundamenta-se na impossibilidade de se usar a

mesma energia repetidas vezes. A segunda lei estabelece que, a cada vez que a energia é

transformada de um estado para outro, ela se dissipa, reduz e degrada-se para a transformação

futura. Esta degradação energética a cada transformação chama-se entropia, medida da

quantidade de energia não mais capaz de ser convertida em trabalho. A medida que a entropia

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aumenta, a energia disponível decresce. E conforme Rifkin (1981), esta energia não mais disponível

nada mais é que a poluição, que o lixo, um produto indisponível para um trabalho futuro.

A entropia é muitas vezes explorada por autores sob uma perspectiva catastrófica partindo da

análise de riscos e associadas às consequências das mudanças climáticas derivadas das

atividades humanas, principalmente para os ambientes hostis projetados para anos à frente. Rifkin

(1981) propõe a mudança para uma situação de baixa entropia, desmaterialista, o que impacta

diretamente sobre o estilo de vida ocidental contemporâneo, cujo valor humano e diferenciação

social é conferido à medida de sua capacidade de consumo material. Atrasar o processo de

mudança, reduzir o fluxo de energia e de consumo de matérias-primas, segundo Rifkin (1981)

poderiam retardar suas transformações.

Os grandes processos de transformação de energia e matéria-prima movidas pelas atividades

antrópicas vem aumentando a desordem do universo. Este processo pode ser claramente

compreendido ao se conhecer a trágica história da Ilha de Páscoa cuja população desapareceu

devido à sobre-exploração de seus recursos ambientais. A conjuntura na Ilha de Páscoa,

caracterizada por um sistema fechado, ou seja, uma ilha isolada sem contato com outras áreas e

populações, teve seu declínio a partir de decisões políticas inadequadas ao meio ambiente e aos

recursos naturais de que se provinham, resultando em um desenvolvimento desequilibrado, uma

típica situação de Entropia. A escassez de recursos colocou em risco as crenças que eram a

estrutura da sociedade colocando a população em conflito até seu completo colapso. O exemplo da

Ilha de Páscoa é comumentemente comparado ao planeta Terra. Como a população não tem como

buscar recursos fora do planeta, uma nova forma de consumo deverá ser implementada para que a

biosfera possa se manter em um estado no qual possa sustentar a vida humana em uma situação

de conforto por milhões de anos à frente (UNDP, 2008).

A partir da segunda metade do século XX observa-se uma aceleração do processo de urbanização.

“Cerca de metade da humanidade vive hoje em cidades” (UNITED NATIONS, 2012). Passamos por

um momento caracterizado pela ruptura do habitat humano com os ambientes naturais onde o

homem passa a eleger o território urbano como seu habitat. O Brasil também segue esta tendência

com a marca de 83% da população instalada em ambientes urbanos (TUCCI, 2008). O estilo de vida

contemporâneo elegendo o ambiente artificial como habitat humano impede a conexão regular com

a natureza, apesar de muitos projetos buscarem o conceito de biofilia, abordagem que “enfatiza a

necessidade de manter, melhorar e restaurar a experiência benéfica da natureza no ambiente

construído” (KELLERT et al apud KEELER e BURKE, 2010, p.104).

De acordo com o Relatório 2010 da United Nations (2011) a projeção média de crescimento

populacional para 2050 ultrapassa 9 bilhões de pessoas e excederá 10 bilhões em 2100. A

população atual é de 5,7 bilhões de pessoas (UNITED NATIONS, 2011, p.xv-xvi). O relatório ainda

estima que mais de 3 bilhões de pessoas, até 2100, alargará os números apenas dos países

não-desenvolvidos e dos em-desenvolvimento ou seja, o crescimento populacional será muito mais

representativo na África e América Latina, hoje com alto índice de população jovem, baixo índice

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educacional e manutenção da alta taxa de fertilidade projetada para o futuro (UNITED NATIONS,

2011, p.1). Transpondo o cenário de grande crescimento para estes países, e somando-se ao

processo migratório crescente de áreas rurais para áreas urbanas é possível projetar um cenário de

ampliação caótica nos centros urbanos: ocupação territorial irregular, crescimento vertical e

horizontal desordenado, altas taxas de adensamento urbano, elevação do número de habitações

inadequadas à saúde, agravamento dos problemas de deslocamento e transportes, elevação da

produção e má disposição de resíduos, agravamento da poluição atmosférica, competição social,

violência e degradação de recursos ambientais.

Conforme Lovelock (1979) um indicador fundamental da continuidade do processo de vida humana

na Terra é a redução da entropia local, ou seja, reduzir as transformações de matéria e energia para

reduzir a degradação ambiental. Seria então o reverso da Entropia uma condição de vida

sustentável?

“Desde os anos 70 a atenção dada à problemática ambiental levou a uma reconceitualização do

desenvolvimento, em termos de ecodesenvolvimento, recentemente renomeado desenvolvimento

sustentável” (SACHS, 2005, p.36). O conceito de desenvolvimento sustentável foi definido em 1987

pela ONU com a publicação do relatório Our Commom Future (Nosso Futuro Comum) conhecido

como Relatório de Brundtland pela WCED (Word Comission on Environment and Development):

“Um desenvolvimento que responda às necessidades do presente sem

comprometer a capacidade das gerações futuras de responder às suas

próprias necessidades“ (ONU, COMISSÃO BRUNDTLAND, 1987 apud

COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO,

1991, p.9).

Segundo o relatório, o desenvolvimento sustentável tem limitações impostas pelas atuais

conjunturas das sociedades e tecnologias relacionadas aos recursos naturais e às capacidades de

carga e de transformações da biosfera. O relatório considera que as sociedades e as tecnologias

podem ser geridas e aprimoradas para permitir que o crescimento econômico sustentável esteja

equilibrado ao potencial produtivo cambiante do planeta. E ainda, impera que o desenvolvimento

sustentável depende do empenho político (COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E

DESENVOLVIMENTO, 1991, p.9-10).

Só há desenvolvimento quando os benefícios do crescimento servem à ampliação das capacidades

humanas. (DA VEIGA, 2006).

Dentro da visão sistêmica, as leis de termodinâmica controlam a ascensão e a queda dos sistemas

políticos, a liberdade ou a sujeição das nações, os movimentos do comércio e da indústria, a origem

da riqueza e da pobreza e o bem estar físico geral da raça humana. A visão do capitalismo é

mantido pela extrema exploração de recursos naturais e humanos (DAVIS, 2002). É um sistema

econômico progressivo que sobrevive ao custo de uma grande parcela de populações vivendo em

situação de extrema pobreza, sendo assim insustentável uma vez que depende de outras áreas

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para se manter (DAVIS, 2002). É insustentável porque explora a natureza além da sua capacidade

de reprodução natural, portanto altera, degrada e extingue.

4. O EXERCÍCIO DO CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE PARA A

RETOMADA DE EQUILÍBRIO

A sociedade contemporânea desenvolve-se em ambientes edificados que são incapazes de suprir

todos os recursos necessários ao desenvolvimento das necessidades básicas e atividades do

homem. Passam a ser um “ecossistema artificial e incompleto” com dependência de outras áreas

para fornecimento de seus suprimentos e também para o descarte de seus resíduos e rejeitos,

através de um processo ininterrupto. A pressão sobre as áreas de contorno dos grandes núcleos

urbanos, as áreas rurais, e sobre os recursos naturais será crescente e gradativa de acordo com as

projeções de crescimento populacional global da UNITED NATIONS (2011).

A ocupação populacional concentrada nos ambientes urbanos, o crescimento populacional, a

pressão sobre os ambientes e recursos naturais, o estilo de vida urbano contemporâneo, a

tendência de crescimento global da demanda de energia, a poluição atmosférica e dos recursos

hídricos, a crescente geração de resíduos, o aquecimento global, a destruição das matas nativas, a

mudança do uso do solo e a busca da qualidade ambiental do ambiente construído são aspectos

relevantes na tomada de consciência global para a adoção de práticas sustentáveis como meio de

retomada do equilíbrio (GELLER, 2003, p.18).

Após afastar seu habitat da natureza, o homem veio perceber que necessita restabelecer o

equilíbrio com o meio ambiente para que a biosfera continue provendo todos os benefícios

produtivos e principalmente garantindo condições de vida e de conforto condizentes com a

sobrevivência da espécie.

O crescimento populacional e a manutenção dos níveis de conforto do atual estilo de vida das

sociedades afetam a produção energética (GELLER, 2003). A demanda por maior produtividade de

energia contribui para a destruição de habitats naturais, para o desmatamento e para a degradação

da qualidade do ar e da água; bem como para a necessidade de ampliação de usinas geradoras de

grande escala (hidrelétricas, termelétricas) e da extração de gás natural e petróleo (KEELER e

BURKE, 2010, p.110). Daí a necessidade de se buscar fontes renováveis de energia.

A grande concentração populacional nos núcleos urbanos com ocupações irregulares sobre o solo

ocasiona alterações no microclima. As alterações do microclima, associadas à rugosidade das

superfícies impermeáveis, às características de condutibilidade térmica dos materiais de construção

e à exposição da radiação solar, exigem a reprodução artificial de níveis de conforto térmico nos

ambientes internos (GIVONI, 1989, p.2). A qualidade do ar nas cidades com grande concentração

de material particulado na atmosfera, resultante das atividades construtivas, industriais e queima de

combustíveis fósseis, agrava as condições de microclima, dificultando o escoamento e a dispersão

do calor, para situações de perda de qualidade de conforto higrotérmico e do ar. A dificuldade de

dispersão do calor e da poluição atmosférica por meio dos ventos dominantes (ventos de superfície)

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e a redução do tempo de evaporação, devido à grande massa impermeável urbana, são os fatores

que mais associam a perda de qualidade de conforto ambiental no ambiente urbano. (GIVONI,

1989, p.1-2; LOMBARDO, 1985).

Trocas e interações complexas existem entre os edifícios e seus ambientes de entorno. As

interações entre natureza e habitat humano (ambiente construído) bem como suas influências

permanecem, porém em centros urbanos, passamos a lidar com a natureza modificada e suas

interações com o interior das edificações. As condições de conforto interno das edificações

dependem das condições de clima do seu entorno e a perda da qualidade do conforto ambiental

externo influencia negativamente o conforto interno (CHANDLER, 1976 apud GIVONI, 1989;

GIVONI, 1989, p.12).

A percepção da ocorrência de mudanças climáticas foi o grande marco para se buscar o

desenvolvimento sustentável. A Organização Meteorológica Mundial junto ao Programa Ambiental

da ONU publicaram em 1990 o FAR (First Assessment Report) que consistiu em uma avaliação

científica das mudanças climáticas. Os resultados deste relatório estabeleceram de forma

extremamente autoritária a necessidade da abertura de negociações e debates para o

estabelecimento de estratégias que pudessem resultar na implementação imediata e global de

políticas e programas para reverter o quadro das mudanças climáticas e suas consequências

apresentadas. A mudança de uso do solo, ou seja, a transformação do ambiente natural em um

ambiente modificado, foi considerada como a maior contribuição para as mudanças climáticas. As

mudanças climáticas, resultado da emissão de gases de efeito estufa estão portanto associadas

com atividades econômicas tais como energia, indústria, transporte e má utilização do solo.

O desenvolvimento sustentável busca, portanto, restabelecer as relações do homem com a

natureza, o elo perdido. A proposta deste modelo de desenvolvimento propõe mudanças

principalmente nas questões relacionadas com a forma de consumo dos recursos naturais para

abastecimento das populações e do mundo industrializado e com as fontes de energia que compõe

a matriz energética das nações. Planos e políticas governamentais, sistemas empresariais

baseados na acreditação do novo modelo de desenvolvimento, certificações “verdes” e programas

de avaliação de desempenho ambiental das edificações e de processos produtivos são alguns dos

meios atualmente utilizados como compromisso com o meio ambiente e como forma de

proporcionar a vida humana uma qualidade coerente com as disponibilidades do planeta.

A retomada do equilíbrio exige mudanças nas transformações da matéria prima, nas formas de

consumo e nas fontes de energia. A energia é hoje o motor de propulsão a favor do

desenvolvimento econômico de qualquer sociedade. Sem a produção e previsão de produção

energética não há crescimento econômico. É forte a correlação entre o IDH (índice de

Desenvolvimento Humano) e o consumo per capita de eletricidade, ou seja, para se alcançar o

desenvolvimento econômico e social deverá haver uma maior oferta de eletricidade em um país. O

início do século XXI iniciou-se em crise com o sistema político-econômico global e uma tendência

de crescimento de outros grupos periféricos, por exemplo, a China desestabilizando o núcleo

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capitalista europeu e norte-americano (DAVIS, 2002). Os blocos econômicos com alta capacidade

de geração de energia podem criar novas situações de estrutura econômica global no século XXI.

Com a aplicação de conceito de desenvolvimento sustentável as nações buscam diversificar suas

matrizes energéticas e principalmente buscar plantas geradoras de energia baseadas nos conceitos

de energias renováveis: energia gerada a partir de fontes naturais renováveis e sem queima de

combustíveis fósseis.

“A tendência em relação à urbanização tem enormes implicações nos esforços para reduzir a

pobreza, gerir recursos naturais, proteger o meio ambiente e enfrentar as mudanças climáticas.

Enquanto cidades ocupam 2% da massa de terra no mundo, elas produzem até 70% da emissão de

dióxido de carbono. No entanto, cidades também podem ter a chave para as soluções para muito

dos desafios mundiais. Elas estão numa posição única para liderar o esverdeamento da economia

global ao melhorar a eficiência do uso da energia para transporte e construção, assim como para

água e sistemas de resíduos.” (UNITED NATIONS, 2012, p.1).

A sustentabilidade vem sendo buscada como ciência para o desenvolvimento de novas tecnologias

e representando um novo conceito na área da construção do ambiente construído com finalidade de

reduzir a pressão sobre o meio ambiente. Para enfrentar o desafio de atender a uma crescente

demanda de energia com redução de impactos negativos derivados de emissões de gases na

atmosfera, a indústria da construção civil, incluindo os projetos de edificações, deverão adotar

medidas para promover o consumo de energias renováveis, através de soluções energéticas e

gestão de processos para redução do consumo dos combustíveis fósseis. O princípio de projetos

para a produção de edificações sustentáveis baseia-se na tentativa de minimizar todos os impactos

isolados da edificação em relação ao seu meio (social e paisagem), aos insumos e à sua produção

de resíduos, bem como ampliar seu desempenho ambiental e energético e atenuar os impactos

globais proporcionados ao longo de toda a vida útil da edificação. Ou seja, atuar com melhor

desempenho atrasando os processos de mudança, reduzindo a exploração e consumo de

matérias-primas e reduzindo o fluxo de energia para retardar as transformações.

O conceito de sustentabilidade aplicado a edifícios envolve a noção deste inserido no universo

devendo o edifício ser visto como parte de um sistema holístico e interdisciplinar (EDWARDS,

2008). A atribuição do termo “eficiência” na concepção de uma edificação exige um pensamento

visionário e independentemente do papel de cada profissional ou de sua especialização, todos

aqueles envolvidos em edifícios que buscam alto desempenho devem utilizar o pensamento

triple-bottom criando decisões equilibradas, levando em conta igualitariamente os três fatores:

econômico, social e ambiental (ELKINGTON, 1998 apud HERDENSEN e CORTESE (2012). A área

de interceptação comum aos três fatores é a sustentabilidade. A construção sustentável desafia os

profissionais do setor de edificações a evoluir para uma visão sistêmica dos empreendimentos

integrando várias especialidades e áreas de conhecimento.

A geometria do espaço urbano através de sua forma, altura, dimensões, orientações, são fatores

que impactam no clima urbano. Um número de detalhes de um dado projeto de edificação deve ser

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projetado para reduzir impactos negativos e influenciar positivamente as condições climáticas

urbanas. Estas decisões de projeto afetam diretamente as condições climáticas do interior da

edificação como daqueles que circulam nas ruas e certamente podem colaborar para a criação de

ambientes urbanos mais confortáveis (GIVONI, 1989, p.2).

Os programas de certificação de desempenho ambiental e energético de edifícios atuam sobre um

dado projeto de edificação através da análise de diversas características do edifício, desde a sua

relação de implantação e áreas vegetadas, a restauração e conservação de áreas verde e habitats,

as condições existentes de transporte coletivo do entorno, o controle de rejeitos emitidos nas redes

públicas de água pluvial, controle de produção de resíduos, incentivos ao uso de materiais e

recursos recicláveis, incentivo à eficiência energética e geração independente de energia até o

controle ambiental da qualidade do ar e das condições térmicas internas. Ou seja, estes programas

buscam analisar e contabilizar as relações diretas e indiretas da edificação com a natureza e seus

recursos. As análises são feitas em fase de projeto e fase de construção atuando como redutoras de

impactos ambientais ao longo da vida útil da edificação.

O mercado mundial atualmente oferece inúmeros sistemas tecnológicos capazes de auxiliar e

controlar as demandas de recursos de uma edificação ou até regular por dispositivos autômatos os

níveis e condições de conforto dos ambientes internos. Dada a complexidade da gestão sobre estes

sistemas tecnológicos é necessário um profissional permanente como gestor do sistema ao longo

da operação do edifício e bastante treinamento aos usuários. Outras vezes os dispositivos

tecnológicos são tão específicos que na ausência do tradutor de sistema passam a ser mal

utilizados quando não, desligados. Todos estes processos (programas de desempenho ambiental e

energético de edificações, gestão de sistemas tecnológicos e treinamento de usuários) devem

ganhar escala para que sejam uma solução efetiva para a sociedade global e somente nesta escala

poderiam colaborar na reversão de fato da entropia.

Através de um levantamento quantitativo da inserção de processos de rotulagem ambiental e

energético de edifícios no Brasil elaborado pelas autoras1 percebe-se que apesar de haver um

crescimento expressivo na procura dos programas de certificações de edifícios no Brasil, conforme

apresentam as figuras 1 e 2 a seguir, apenas 5% conseguem concluir os processos de certificação.

Várias questões estão envolvidas com esta dificuldade de se concluir processos de certificação no

Brasil: altos custos primários; escassez de incentivos políticos; desafios para equalizar os

investimentos necessários junto às economias operacionais; ausência da demanda do mercado;

acessibilidade a um item de status tecnológico; ausência de consciência do consumidor; escassez

de profissionais treinados para o mercado; desorganização das normas e regulamentações

brasileiras; dificuldade no atendimento de alguns parâmetros das normas internacionais, além da

inexistência de um Código de Boas Práticas voltado para este mercado.

1 Levantamento quantitativo realizado pelas autoras durante a disciplina do Mestrado do MACPS-UFMG em 2012.

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561

60

1477

?

2

79

3

16

6

0

LEED (2004)

Processo AQUA (2008)

Etiqueta Edifícios PBE-EDIFICA (2009)

Selo CASA AZUL (2009)

BREEAM (2011)

CERTIFICAÇÕES no BrasilCenário até 25/02/2013

Processo Concluído Em processo

Figura 1 – Cenário quantitativo global das certificações no Brasil, em processo e com processo concluído.

Figura 2 – Cenário quantitativo das certificações no Brasil, em processo e com processo concluído.

Lyle (1999) adverte que ao projetar sobre um pedaço de terra, independente da escala do projeto,

estamos alterando algum ecossistema. Ignorar as interações pré-existentes de um ecossistema,

suas trocas de energia e materiais, tem causado muitos desastres não intencionais de

ecossistemas em ambientes projetados. E a criação destes ecossistemas deveria ser intencional,

ou seja, deveriam ser analisadas as máximas interações pré-existentes para que a nova unidade

edificada pudesse participar criativamente destes processos (LYLE, 1999, p.16).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise da evolução da relação “Homem x Natureza” apresentada mostrou que a partir do

desenvolvimento das habilidades intelectuais humanas auxiliadas por ferramentas e mais tarde por

tecnologia resultou em uma grande transformação do habitat humano e das relações do homem

com os recursos da natureza. O distanciamento das atividades físicas do homem com a natureza no

mundo contemporâneo pode ser um elo para o entendimento de uma parte dos problemas

ambientais que cercam o ambiente construído da atualidade. A projeção do crescimento

populacional à longo prazo coloca em discussão os caminhos a serem tomados nos processos de

transformação necessários para suprir o ambiente urbano e para manter o estilo de vida

contemporâneo. A ocupação populacional concentrada nos ambientes urbanos, a crescente

demanda de consumo dos recursos naturais e a grande demanda por transformação de energia e

matéria-prima, de acordo com a lei da entropia, aumenta a desordem do universo colocando em

risco a dinâmica do equilíbrio sistêmico do planeta. Como a população não tem como buscar

recursos fora do planeta, uma nova forma de consumo deverá ser implementada. E para isto

acontecer deverá ser retomado como ponto de partida o conceito de sustentabilidade, o qual o

homem exercia enquanto vivia integrado à natureza. Na atualidade, vivendo cada vez mais em

ambientes urbanos, as novas construções e grandes reformas passam a ser uma grande

oportunidade para exercitar o conceito de sustentabilidade. Porém, para que os resultados sejam de

baixa entropia é necessário que a adoção dos programas e conceitos de edifícios sustentáveis seja

em uma escala tal que tornem os resultados significativos globalmente. O exercício do conceito de

sustentabilidade é necessário para que o ambiente construído daqui para frente possa se

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fundamentar sobre um alto desempenho de interações junto ao meio o qual está inserido à longo

prazo. E para isto, as decisões políticas deveriam influenciar as decisões sociais, culturais e

econômicas em direção a um empenho consciente colocando cada um, cada Homem, frente às

questões ambientais, recuperando o elo perdido “Homem x Natureza” através da compreensão,

respeito, ética e compromisso global.

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