a missão ecocivilizatória

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  A MI SSÃO “ECOCIVI LIZATÓRI A” E AS NOVAS MORALIDADES  ECOLÓG ICAS: A EDUC AÇÃO AMBIE NTAL ENTRE A NOR MA E A  ANTINORM ATIVIDAD E ISABEL CRISTINA MOURA CARVALHO 1 , CARMEN ROSELAINE FARIAS 2 , MARCOS VILLELA PEREIRA 3 Introdução A educação ambiental (EA) é tomada, neste artigo, como uma proposta pedagógica investida de uma ética e uma estética consagradas pelo núcleo vigoroso do pensamento ecológico, por isso tributária do ideário dos movimentos sociais ecológicos. Esta prática educativa projeta como seu ideal a formação de um sujeito virtuoso que corresponda aos valores preconizados por um bem viver ecológico. O horizonte ético deste bem viver passa pela busca de simetria entre os seres humanos e os não humanos, o que implica o reconhecimento do valor não utilitário da natureza e dos direitos dos não humanos. O ambiente (humano e não humano) passa a ser, nesta perspectiva, o lugar de referência para o exercício das virtudes ecológicas. Trata-se de um entendimento que inclui a concepção de que é possível que o sujeito exerça relativamente seu livre-arbítrio frente às situações do mundo e, mediante o exercício do discernimento e da ponderação, tenha a possibilidade de decidir sobre a natureza de seus atos. A perspectiva pedagógica que aposta nesta virtude corporificada por um bem viver ecologicamente orientado ganhou entre nós o nome de educação ambiental. Nesta condição, esta prática educativa vem ocupando um lugar relevante, ao assumir a missão de cultivar, preparar e formar para uma vida virtuosa ecológica 4 . A postura metodológica adotada acolhe a máxima hermenêutica que considera a primazia das perguntas sobre as respostas no horizonte da produtividade compreensiva. Evidentemente, essa postura representa, antes de qualquer coisa, uma atitude frente 1  Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do RS, Brasil. 2  Universidade Federal Rural de Pernambuco (Departamento de Ensino de Ciências), Recife – PE, Brasil. 3  Programa de Pos-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do RS, Brasil. Autor para correspondência: Isabel Cristina Moura Carvalho E-mail: [email protected]. Faculdade de Educação – Pontifícia Universidade Católica do RS, Av. Ipiranga, 6681 Prédio 15, Porto Alegre/RS, CEP: 90619-900

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Artigo sobre a questão ambiental.

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  • A MISSO ECOCIVILIZATRIA E AS NOVAS MORALIDADESECOLGICAS: A EDUCAO AMBIENTAL ENTRE A NORMA E A

    ANTINORMATIVIDADE

    ISABEL CRISTINA MOURA CARVALHO1,

    CARMEN ROSELAINE FARIAS2,

    MARCOS VILLELA PEREIRA3

    Introduo

    A educao ambiental (EA) tomada, neste artigo, como uma propostapedaggica investida de uma tica e uma esttica consagradas pelo ncleo vigorosodo pensamento ecolgico, por isso tributria do iderio dos movimentos sociaisecolgicos. Esta prtica educativa projeta como seu ideal a formao de um sujeitovirtuoso que corresponda aos valores preconizados por um bem viver ecolgico. Ohorizonte tico deste bem viver passa pela busca de simetria entre os seres humanos eos no humanos, o que implica o reconhecimento do valor no utilitrio da natureza edos direitos dos no humanos. O ambiente (humano e no humano) passa a ser, nestaperspectiva, o lugar de referncia para o exerccio das virtudes ecolgicas. Trata-se deum entendimento que inclui a concepo de que possvel que o sujeito exerarelativamente seu livre-arbtrio frente s situaes do mundo e, mediante o exercciodo discernimento e da ponderao, tenha a possibilidade de decidir sobre a naturezade seus atos. A perspectiva pedaggica que aposta nesta virtude corporificada por umbem viver ecologicamente orientado ganhou entre ns o nome de educao ambiental.Nesta condio, esta prtica educativa vem ocupando um lugar relevante, ao assumira misso de cultivar, preparar e formar para uma vida virtuosa ecolgica4.

    A postura metodolgica adotada acolhe a mxima hermenutica que consideraa primazia das perguntas sobre as respostas no horizonte da produtividade compreensiva.Evidentemente, essa postura representa, antes de qualquer coisa, uma atitude frente

    1 Programa de Ps-Graduao em Educao da Pontifcia Universidade Catlica do RS, Brasil.2 Universidade Federal Rural de Pernambuco (Departamento de Ensino de Cincias), Recife PE, Brasil.3 Programa de Pos-Graduao em Educao da Pontifcia Universidade Catlica do RS, Brasil.

    Autor para correspondncia: Isabel Cristina Moura Carvalho E-mail: [email protected]. Faculdade de

    Educao Pontifcia Universidade Catlica do RS, Av. Ipiranga, 6681 Prdio 15, Porto Alegre/RS, CEP: 90619-900

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    realidade. Parafraseando Fernando Pessoa, significa que consideramos que a realidadeprovavelmente sempre mais ou menos do que podemos compreender, imaginarou esperar que ela seja5. Essa pontuao necessria como uma demarcao primriaem nossa abordagem, de modo que no se pretenda encontrar, na reflexo que sesegue, posies universais ou absolutas. Neste sentido, os achados deste trabalho seexpressam na reformulao das indagaes iniciais em novas e mais elaboradas questes,impulsionando o fluxo e o avano da reflexo. Neste debate, seguem vigentes questesde fundo da EA: em que medida se pode observar, por meio do fenmeno ecolgico, aformulao de uma nova traduo para o problema humano da infelicidade, dodescontentamento ou, ainda, do mal-estar civilizatrio? Qual o papel da educao demodo geral e da EA em particular como espaos formativos e subjetivadores? Como aEA se institui na formao de um habitus ecolgico face aos problemas sociais eexistenciais? Em que medida este habitus ecolgico pode constituir/ incorporar/performarsujeitos para uma vida mais livre das restries e da represso da civilizao, ou, aocontrrio, estaramos diante de uma pedagogia inculcadora empenhada em modelarum novo padro de comportamentos ecologicamente corretos? Estas so as questesque queremos postular para contribuir no debate sobre o estatuto da EA na sociedadecontempornea.

    A educao ambiental como agente e efeito da ambientalizao e as novasmoralidades ecolgicas

    A EA pode ser considerada ao mesmo tempo agente e efeito da ambientalizaodas prticas sociais. Estes processos de ambientalizao podem ser identificados tantona emergncia de questes e prticas ambientais como um fenmeno novo na esferasocial, quanto na reconfigurao de questes, prticas e lutas tradicionais, que setransformam ao incorporar aspectos ambientais. Observa-se, assim, o deslocamento deuma cidadania poltica em direo a uma cidadania socioambiental.

    A ambientalizao diz respeito ao processo de internalizao da questo ambientalnas esferas sociais e na conscincia dos indivduos. movida pelo crescentereconhecimento da legitimidade de um campo de preocupaes socioambientais naesfera pblica, e produz um habitus ecolgico que tende a se generalizar em diferentesmedidas, afetando outros campos sociais. Nesse sentido, a literatura sobre os movimentossociais nas ltimas dcadas tem, cada vez mais, chamado ateno para a incorporaode uma agenda ambiental por uma srie de lutas sociais. Destacamos a seguir algunsestudos que tm indicado a converso ambiental de movimentos tnicos, sindicais elutas de outros segmentos sociais, como atingidos por barragens e populaes rurais.

    No mbito dos movimentos tnico-raciais, poderamos mencionar os estudospioneiros de Bullard (1996, 1999) e os trabalhos de Pellow e Brulle (2005), que mostrama imbricao entre os movimentos por direitos civis das populaes no brancas (negros,asiticos, latinos e ndios) nos Estados Unidos da Amrica com as questes ambientais.Estas populaes se mobilizaram para que o governo parasse de mandar para suascomunidades empreendimentos poluidores, denunciando o fato de que a poluio

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    ambiental afeta diferentemente as populaes brancas e no brancas, em prejuzodestas ltimas. Tornou-se uma referncia na trajetria destes movimentos sociais orelatrio Toxic Wastes and Race in the United States: A National Report on the Racial andSocio-Economic Characteristics of Communities with Hazardous Waste Sites, lanado em1987, que denunciava a correlao entre danos ambientais e bairros habitados porpopulaes no brancas. Segundo este estudo, a composio racial de uma comunidadepode ser considerada um dos indicadores mais aptos a explicar a existncia ouinexistncia de depsitos de rejeitos perigosos em uma rea6.

    interessante observar que os movimentos por justia ambiental, ao incorporaros valores ecolgicos, tiveram o apoio da Igreja crist evanglica, e incluram em sualuta a perspectiva ecolgico-religiosa, como podemos ver na formulao dos seusprincpios: a justia ambiental afirma a sacralidade da Me Terra, a unidade ecolgica,a interdependncia de todas as espcies e o direito de ser livre da destruio ecolgica.Esse princpio foi adotado pelo First National People of Color Environmental LeadershipSummit, que aconteceu em Washington D.C., em outubro de 1991.7 Contudo, cabedestacar que a perspectiva ecolgico-religiosa adotada no corresponde a um discursotipicamente cristo-evanglico, mas muito mais a uma aproximao com um horizontede espiritualidade do tipo new age. Assim, embora o apoio poltico da Igreja institucionaltenha sido importante, politicamente o discurso religioso adotado no umatransposio da matriz evanglica para o movimento, mas, muito mais poderamosdizer, uma reinterpretao nos termos new age que caracteriza as novas espiritualidadescom sua marca pantesta e sacralizadora da natureza.

    No Brasil, a Rede de Justia Ambiental se instituiu em sintonia com o movimentonorte-americano por direitos civis ambientais, apoiada por pesquisadores, militantes eorganizaes no governamentais (ONGs). Esta Rede opera com os princpios da justiaambiental, denunciando casos de conflitos nos quais a distribuio desigual dos custosambientais atinge territrios e populaes vulnerveis. Segundo a Declarao defundao da Rede Brasileira de Justia Ambiental, entende-se por injustia ambientalo mecanismo pelo qual sociedades desiguais do ponto de vista econmico e socialdestinam a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento s populaes debaixa renda, aos grupos raciais discriminados, aos povos tnicos, aos bairros operrios,s populaes marginalizadas e vulnerveis (ACSELRAD et al., 2009).

    No mbito dos movimentos sindicais, Beynon (1999), no Reino Unido, LeiteLopes (2006, 2004a, 2004b) e Leite Lopes et al. (2000), no Brasil, vm discutindo emseus estudos a ambientalizao dos conflitos no mundo do trabalho. Leite Lopesrelaciona a ambientalizao das lutas sindicais com as transformaes no Estado ecom as mudanas de comportamento no trabalho, na vida cotidiana e no lazer. Analisaeste conjunto de mudanas como parte do fenmeno onde a emergncia da questoambiental opera como nova fonte de legitimidade social.

    Os estudos de Acselrad (2010, 2004), Zhouri (2008), Zhouri e Teixeira (2007) eZhouri et al. (2005) tm chamado a ateno para os conflitos ambientais como indutoresde novas estratgias argumentativas nos conflitos sociais relacionados aos atingidospor barragens, movimentos rurais e no operariado urbano. Neste mbito, os movimentos

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    contra a degradao do meio ambiente se articulam s reivindicaes democrticas,unificando, at certo ponto, essas lutas sociais. O meio ambiente, nesta perspectiva,aparece como suporte da vida e do trabalho das populaes, e sua destruiocorresponderia diretamente destruio de modos de vida e do direito diversidadenos usos e relaes sociais com a natureza. A luta contra a degradao ambientalteria, assim, ressonncia nas estratgias que visam a resistir contra os processos deexpropriao das condies materiais de sobrevivncia e a preservao dos direitos decidadania relacionados vida e ao trabalho.

    A EA, no contexto da ambientalizao das esferas sociais, pode ser consideradaao mesmo tempo efeito e agente de ambientalizao das prticas sociais. Como observouLeite Lopes (2004), uma educao ambiental generalizada no programa de EducaoAmbiental da Agenda 21 foi relevante na internalizao da questo ambiental pelossindicalistas, destacando-se como um dos fatores importantes de ambientalizao doconflito social em Volta Redonda (RJ). Neste mesmo artigo, Leite Lopes analisa ocarter prescritivo da EA, no sentido desta educao se caracterizar por uma largaoferta de preceitos de conduta cotidiana em relao ao ambiente. O recurso aostrabalhos de Norbert Elias (1990, 1993) e a analogia com a educao para as boasmaneiras ou etiquetas sociais na formao de uma educao da corte que instituram ascondutas distintivas deste grupo social em relao ao povo inculto, so pertinentes,visto que a EA, de certo modo, tambm instaura distines entre os sujeitos educadosambientalmente e aqueles cujos comportamentos no ecolgicos so geralmenteassociados barbrie.

    A cauo para esta fora prescritiva ou normatizadora da EA encontra umfundamento de difcil refutao, que o agravamento dos problemas ambientais e suacrescente visibilidade pblica, o que corrobora o argumento de que se os processosecolgicos degradam em uma escala planetria, o prprio futuro de humanos e nohumanos que est em jogo. Assim, a dimenso global e civilizatria atribuda criseambiental no deixa de suscitar o que se poderia chamar de uma esfera de novasmoralidades ecolgicas. Ao que tudo indica, tais moralidades tm expresso tanto napreocupao com a soluo de problemas relacionados ao desenvolvimento dassociedades industriais, quanto no surgimento de novos padres de comportamentosindividuais e coletivos, normas ticas e religiosas, regramentos nos campos poltico ejurdico, de certo modo fundados em um senso mais ou menos compartilhado sobremodos de superar a condio crtica das relaes sociais com o ambiente.

    No sentido da ambientalizao das prticas sociais, pode-se dizer que a gramticada ecologia no nosso tempo , sobretudo, moral: conhecimento que nos serve paraandar corretamente por nossa casa. Ou seja, a busca de operacionalizar um ambientesaudvel para todos entremeia processos de aprendizagem e de construo deidentidades ecolgicas que, em algum grau, remetem a aspectos normativos daformao do indivduo, gerando implicaes para as maneiras como os indivduos egrupos se conduzem ou deveriam se conduzir.

    Esta conjuntura cria as condies para o que Leite Lopes (2004) chama deinculcao do novo domnio do meio ambiente. Aqui, a ideia de inculcao, uma

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    tarefa clssica da pedagogia corretiva, no parece deslocada. Contudo, ao lado daao inculcadora tambm se pode descrever este processo atravs de outro conceito,como tambm o faz Leite Lopes, que o da formao de um habitus ambiental, nosentido de Bourdieu (1996).

    O interessante, neste caso, evidenciar os entrelaamentos de uma EAperformativa, produtora de uma cultura ambiental, que tem sua referncia no ideriolibertrio e na resistncia ao projeto civilizatrio hegemnico, e uma EA inculcadoraem sua nfase normativa. Sabemos o quanto estes dois horizontes o formativo e onormativo so intercambiveis na ao prtica, bem como na formao dos gostos epreferncias ticas e estticas na esfera cultural. Em outras palavras, mais que umatenso, percebe-se existir um processo de sustentao mtua entre a formao de umhabitus ecolgico e os processos de subjetivao ecolgica (escolares, miditicos,militantes e de governo), que articulam discursos normativos e moralizantes.

    Deste modo, as prticas pedaggicas associadas aos processos de ambientalizaodas esferas sociais parecem ser importantes operadores de legitimidade social, de crenae de identidade cultural. A preocupao ambiental, como um valor reivindicado nestasprticas, traz consigo a pretenso de expandir-se como um argumento ou idioma vlidode orientao moral, tica e esttica para o conjunto da sociedade.

    neste horizonte dos processos de ambientalizao das esferas sociais quesituamos o problema da EA como prtica educativa na contemporaneidade, uma prticasituada entre a atitude antinormativa frente a um projeto civilizatrio em crise e ainstaurao de novas normatividades, agora fundadas no horizonte de uma missoecocivilizatria. Para alm de uma tenso insolvel, esta condio da EA tem conduzidoprocessos pedaggicos que a inserem e a legitimam em diferentes esferas sociais, deum modo que podemos j considerar perene.

    A aposta ecolgica na reconciliao com a natureza e a educao ambientalcomo porta voz da boa nova

    Expectativas de felicidade, bem estar e sade tm sido cada vez mais associadas natureza, vinculando-se a elementos da natureza, qualidades naturais ou mesmo auma paisagem natural. O poeta Manoel de Barros escreve: Quando meus olhos estosujos de civilizao/cresce por dentro deles/um desejo de rvores e aves, e estesentimento social que transborda de sua poesia. A infelicidade, o mal-estar e osofrimento, por sua vez, aparecem frequentemente relacionados vida urbana e acivilizao. Na superao do mal-estar civilizatrio, cujos sucedneos vo encontrarexpresso na poluio urbana, mudanas climticas, entre outros desconfortos e ameaasambientais, pode-se pensar o lugar da EA , que referida como uma prtica educativaque tem como misso a tarefa nada modesta de construir um novo horizontecivilizatrio, desta vez, ecologicamente orientado.

    A oposio entre civilizao e felicidade no exclusiva do iderio ecolgico.A relao do pensamento ecolgico com a psicanlise mostra convergncias noreconhecimento do mal-estar social e no contraste entre as solues encontradas por

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    estas duas interpretaes da civilizao contempornea (CARVALHO, 2010). Apsicanlise reconheceu na ordem social e nas prprias relaes sociais importantesfontes de sofrimento. Tanto para o iderio ecolgico quanto para a psicanlise, o bemestar, a felicidade e a cura dos males da civilizao sero arduamente buscados nummundo visto como corrompido e insatisfatrio. Neste sentido, poderamos dizer que osujeito ecolgico e o sujeito psicanaltico seriam ambos investidos de uma visoromntica sobre a condio humana e seus dilemas. A hiptese defendida aqui quetanto o ecologismo quanto a psicanlise, mesmo sendo legtimos herdeiros damodernidade, inspirados pela tradio romntica e pela viso do mundo pautada naoposio entre natureza e cultura, tomam caminhos opostos, embora contra-hegemnicosdentro da modernidade. A psicanlise postula a oposio entre natureza e culturacomo constitutiva do humano e o conflito da derivado como insolvel. Atribui natureza e, sobretudo, poro de natureza que nos constitui como humanos a fonteda infelicidade. Toma a via trgica, portanto, ao postular a infelicidade, o mal-estar ea incompletude como motores da condio humana e de suas realizaes.

    O ecologismo, por sua vez, significa as relaes entre natureza e cultura em seusprprios termos e, diferentemente da psicanlise, no atribui natureza a fonte dosofrimento humano e do mal estar civilizatrio. O sofrimento, na narrativa ecolgica,estaria justamente no afastamento da ordem natural e no desrespeito aos limites danatureza. Assim, a origem do sofrimento que a psicanlise deposita na natureza, opensamento ecolgico redireciona para os obstculos culturais que resistem ordemnatural. Esta crtica civilizatria tem conferido aos movimentos ecolgicos um lugarprotagnico na denncia do descontentamento com a civilizao e consequentementedo mal-estar civilizatrio. Consequentemente, os males sociais ecologicamenteformulados tornam-se uma problemtica reconhecida como parte importante na agendade decises sobre os rumos da vida em comum e os pactos societrios intra eintergeneracionais.

    Interessante observar, no entanto, que, diferentemente da metapsicologiafreudiana, o iderio ecolgico diferencia-se da via trgica e toma a via utpica dasoluo conciliadora do conflito entre natureza e cultura. A crena que subjaz a umvasto espectro do iderio ecolgico a de que a degradao do ambiente e as doenasdo corpo e da alma advm de uma situao originria de afastamento de uma ordemou harmonia imaginada como um ponto de equilbrio existencial e ecolgico,inviabilizado pela civilizao ocidental (antropocntrica, industrial, consumista,materialista). Segundo a viso ecolgica, a ferida planetria que representa nossacivilizao poderia ser curada ou pelo menos mitigada em seus efeitos letais, em umcontexto de relaes sustentveis entre sociedade e ambiente baseadas no equilbrioecoenergtico entre humanos e no humanos. Isto aponta, por exemplo, para a buscade terapias e prticas cuja concepo de sade baseia-se na harmonizao, bemcomo de espiritualidades Nova Era em que a mstica e o sagrado remetem sintoniacom a natureza.

    Considerando as noes de equilbrio e harmonia, que prevalecem como ideaisno campo ambiental a despeito destes atributos da natureza raramente encontrarem

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    cauo nas teorias biolgicas sobre natureza , pode-se dizer que o sujeito ecolgicopartilha da crena na possibilidade de curar o conflito entre a natureza e a cultura.Este propsito tem sido associado a uma noo de bem viver ecolgico. Com isso, oque chamamos de um idioma ambiental torna plausvel no apenas um discurso polticosobre novos pactos planetrios e modos de regulao das relaes sociedade e natureza,mas tambm inaugura um estilo de vida internalizado atravs da instituio de umhabitus ecolgico, como j mencionamos anteriormente. No plano individual, istosignifica a incorporao de hbitos e atitudes em vrias esferas da vida que refletemmodos ecologicamente orientados de se alimentar, morar, vestir, cuidar a sade, consumire comercializar. possvel observar no mundo das prticas ecolgicas, por exemplo,como a sade e a espiritualidade convergem no sentido da ascese para uma vidavirtuosa, saudvel e em consonncia com um ambiente igualmente so8.

    Normatividade e antinormatividade na educao ambiental

    No campo educativo propriamente dito, enquanto faz a crtica sociedade ps-industrial e de consumo, a EA tambm anuncia um caminho para se alcanar asociedade ecolgica por meio de prticas pedaggicas que se por um lado aliam-se utopia compartilhada pelos movimentos sociais ecolgicos, por outro desdobram novasnormatividades no espao do currculo escolar9.

    A educao, desde Rousseau, no sculo XVIII, passando por Durkheim e Dewey,no final do sculo XIX e incio do sculo XX, compreendida dentro das prticas dereproduo da vida social. Especialmente Durkheim e Dewey traam as bases filosficasde uma moral racional que procura garantir o vnculo social face aos desafios colocadospelas transformaes advindas com o avano da tcnica, da tecnologia, daindustrializao e da formao das cidades.

    No mais a religio, mas a cincia, o mtodo racional e a democracia figuramcomo novo horizonte para a cidadania, e desenharo o pensamento educacionalpredominante durante o sculo XX. preciso considerar que a educao foi construdaat nossos dias como mecanismo imprescindvel de transmisso cultural e das formasde organizao societria. A transmisso foi o maior instrumento da educao moderna:transmisso de conhecimentos, hbitos, fazeres, pensamentos e sentimentos. A educaofoi entendida, neste contexto, como transmisso cultural de uma gerao a outra,com objetivos de adaptar a gerao mais nova ao meio social constitudo (DILL, 2007).

    H, evidentemente, diferenas marcantes entre os autores que ajudaram adelinear o projeto sociocultural da modernidade, como entre Durkheim e Dewey.Enquanto para o primeiro a validade do ator moral encontra-se externa aos indivduos,na conscincia coletiva, para Dewey, ela est nas experincias dos indivduos. Deweyinterpe entre indivduo e sociedade uma conscincia individual, como instnciaonde a validade do ato moral testada e descoberta por meio da experincia. Amisso da educao para a o pensador norte-americano seria combater o individualismohobbesiano, ou seja, a natureza selvagem e competitiva que estaria na base da desordemmoral dos processos de desenvolvimento urbano e industrial. A escola, assim, seria o

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    instrumento privilegiado para a educao humana, na formao moral para ademocracia, em vista da constituio e consolidao do Estado de Bem Estar Social(Wellfare State).

    A misso civilizatria e progressista da educao esteve ligada ReformaProtestante e aos preceitos de salvao puritana, que encontraram nos ideaisdemocrticos e na valorizao da cincia e da tecnologia um novo cdigo. Da decorrea incorporao da ideia de cincia como modo de ordenao da vida individual e doplanejamento da sociedade.

    Essas ideias, provenientes do pragmatismo norte-americano de Dewey e doracionalismo francs de Durkheim, ajudam-nos a explorar o terreno em que se ergueramas ideias de educao e de escola com as quais se depara a EA na virada do sculo XXpara o sculo XXI. bem verdade que as condies histricas e socioculturais sooutras na poca da EA. As convices vigentes no sculo XIX em uma educaoracional e baseada na cincia como instncia moral confrontam-se hoje com a chamadacrise de f no mtodo racional e na autoridade moral da sociedade, o que resulta porquestionar o papel da educao na coeso dos laos sociais. Ademais, no sculo XIX,podemos assim dizer, estava em jogo a consolidao do Estado-Nao; no incio dosculo XX, temos a nossa frente tambm a crise desta instncia e a emergncia de umnovo conjunto de desafios numa sociedade globalizada. No contexto global, o debateecolgico, que emblemtico das atuais configuraes culturais, aposta numa educaopara a cidadania ambiental, a qual transcenderia as fronteiras nacionais, incorporandoa moral a partir do registro planetrio.

    No por acaso que, nas ltimas dcadas do sculo XX, os atuais cdigos decidadania levaram vrias comunidades do mundo a reformularem seus sistemaseducacionais. Chegou-se a tanto que alguns fruns da poltica internacional assumiramcomo alta prioridade o desenvolvimento de uma educao para a cidadania democrticafundada nos direitos e responsabilidades dos cidados.

    Santos (2005) reconhece trs tradies principais no mbito da construohistrica da ideia de cidadania: a cidadania clssica, que remete tradioaristotlica, que enfatiza a participao poltica na vida pblica; a cidadania moderna,a qual remonta articulao de direitos civis e individuais; e a cidadania ps-moderna,que tem como valor-guia a solidariedade e se pauta nos direitos chamados de terceiragerao. Essas tradies podem ser vistas sincronicamente, ou seja, coexistem nos diasde hoje e se estendem desde entendimentos mais restritos, que identificam cidadaniaa um estatuto excessivamente legalista, at concepes mais abrangentes e prticasde uma cidadania menos homognea e que respeita a identidade cultural de gruposdiferenciados.

    No Brasil, vivemos uma poca em que a cidadania est inserida entre os objetivoseducacionais explicitados nos principais documentos e polticas de educao. Desdel at os contextos prticos da vida escolar, a educao assume compromissos com osnovos cdigos de cidadania que se pautam em direitos ambientais e em suas implicaeslocais/globais, tornando-se agente nas atuais reconfiguraes culturais, institucionaise subjetivas.

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    Consideraes finais

    Retomando a hiptese que apresentamos ao longo deste artigo, o fenmeno daambientalizao das esferas sociais, incluindo a educativa, nos faz pensar na EA comouma prtica educacional cuja fora de convocao e aceitao social est relacionadaao seu papel de portadora da boa nova ecolgica. Em outras palavras, parece-nosplausvel pensar que esta educao forte candidata a partcipe de uma instncia decauo moral para uma sociedade ecolgica pautada pela busca da reconciliao coma natureza e a cura do mal estar civilizatrio. Evidentemente, no pretendemosaderir a uma concepo redentora ou messinica da educao, mas to-somentesinalizar a potncia da experincia educacional no sentido de proporcionar condiesde possibilidade para que o sujeito se aproprie reflexiva e criticamente de suasexperincias na projeo de prticas ecologicamente virtuosas.

    Como podemos observar nesta reflexo, a misso ecocivilizatria a que se atribuia EA aproxima-se da estrutura de uma crena moral. A aposta em uma vida plena,virtuosamente ecolgica, aciona, ao mesmo tempo, no plano das ideias, uma utopiasocietria; no nvel de sua ao prtica, um conjunto de prescries a serem inculcadasem vrias esferas da vida; e no plano das atitudes e comportamentos, a internalizaode um habitus ecolgico como caminho para uma vida bela e boa, que se obtm pelaascese e pelo cultivo de si e das relaes com o ambiente. Deste modo, as tensessocietrias da EA se convertem em exigncias para os sujeitos, que uma vezecologicamente orientados, so constitudos a partir da dupla articulao dosprincpios do cuidar e do conhecer. Tomamos aqui o cuidar-se e o conhecer-se comoestratgias de subjetivao, alcanando a bvia sintonia com as diversas esferas quecircunscrevem ou que esto em adjacncia s nossas prticas.

    interessante pensar ainda como o advento ecolgico evoca e atualiza, em termoscontemporneos, uma tenso constitutiva da modernidade ocidental, marcada pelaspercepes antagnicas de uma natureza selvagem como fora a ser domada e de umanatureza boa, bela e virtuosa10. A natureza como fora selvagem, lugar do inculto, dorude e do feio, que exige ser domesticada, recalcada e controlada para que a civilizaose imponha, prevaleceu na constituio da modernidade, como Elias (1990) constata.J no que Ferry (2009) chamou de uma nova ordem ecolgica, a ordem natural sereapresenta transformada num valor moral, e se pe a servio de outro ideal societrio,em continuidade com a tradio romntica de uma natureza boa e bela, reforando avia contra-hegemnica do processo civilizatrio moderno. Desta forma, o iderioecolgico se constitui como denncia antinormativa da racionalidade iluminista/desenvolvimentista/ industrial, e ao mesmo tempo como afirmao de umanormatividade, ainda que seja esta a de uma nova ordem ecolgica.

    Estaria, ento, a EA na vanguarda de um novo ideal civilizatrio? Ter o idealecolgico a fora de ocupar o lugar de uma nova moral num mundo secular e ps-religioso? certamente temerrio tentar responder a estas perguntas, contudo,acreditamos na importncia de enunci-las e abrirmos possibilidades de compreensodo tempo em que vivemos e suas tendncias culturais. Do mesmo modo, remeter aos

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    percursos histricos e culturais das ideias nos ajuda a compreender, por exemplo, comouma prtica educativa como a EA opera ao mesmo tempo como inculcadora deetiquetas ecolgicas no combate contra uma nova barbrie (antiecolgica). Aoatualizar uma posio contra-hegemnica moderna, o pensamento ecolgico em gerale a EA em particular legitima-se com a fora renovadora, transgressora, antinormativa.Reivindica em seu favor um ideal societrio formulado desde a crtica da razoiluminista. A EA, desta forma, capitaliza um poder de convocao, situando-se, emcontinuidade com os movimentos ecolgicos, como porta voz dos descontentes com acivilizao, e desde esta nova ordem ecolgica que, nos parece, vem sua legitimidadepara o exerccio normativo e prescritivo dos comportamentos, pois opera em nome detica e esttica do bem viver ecolgico.

    Situada entre um fazer prtico frequentemente normativo e a instaurao deuma nova ordem civilizatria, a EA abre-se a inmeras possibilidades de criar-se erecriar-se a partir da experincia, no sentido de Gadamer (1997). Para o autor, averdade da experincia sempre contm referncia abertura para novas experincias.A pessoa a que chamamos experimentada ou experiente algum que no apenas se fezatravs de experincias, mas, sobretudo, algum que est aberto a novas experincias.O sujeito experimentado sempre o mais radicalmente no-dogmtico, j que,justamente por ter aprendido tanto, est aberto para realizar novas experincias eaprender com elas. A experincia sempre experincia fundamental da finitudehumana (GADAMER, 1997: 527), por isso o experimentado aquele que est conscientedessa limitao e que, assim, sabe que no senhor do tempo nem do futuro.

    Desse modo, o que se apresentou para ns em um primeiro momento como umasituao contraditria a EA entre a simplificao do dever prescritivo e a complexidadede uma nova misso civilizatria parece agora revestir-se de um novo sentido. Atenso entre a radicalidade da inculcao (a qual opera uma forma de prescrio) e asutileza do habitus (que atua como uma forma de racionalidade e padro tico-esttico)pode ser justamente o que coloca a EA no no dilema dogmtico de optar por umcaminho ou por outro, mas na condio de assumir-se como uma prtica atravessadapelo inevitvel entrecruzamento destes dois caminhos, o que teria por consequncia aconscincia da provisoriedade das certezas e a precariedade da deciso.

    Em outras palavras, o que estamos contrapondo ao caminho que poderia levar aposies dogmticas seja pela reduo da EA apenas ao seu carter prescritivo ouapenas a suas formulaes antinormativas a conscincia de uma dialtica danorma e da antinormatividade que no se soluciona em uma sntese que a resolvaplenamente, visto que seu efeito produtivo reside justamente em abrir um horizontede compreenso das foras constitutivas do plano tensional de uma determinada ordemde racionalidade, evitando sua dogmatizao.

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    Notas

    4 H inmeros e valiosos autores no campo da EA, tanto no cenrio brasileiro quanto internacional, que tem

    reiterado em seus trabalhos este ncleo comum de valores que chamamos de virtudes ecolgicas independentemente

    das diferentes abordagens terico-metodolgicas s quais se filiam. Foge ao escopo deste artigo uma reviso de

    literatura sobre este tpico que conta com extensa literatura disponvel. Para o leitor interessado neste tema

    remetemos aos trabalhos de Brhuns ( 2009), Layrargues (2004), Carvalho (2010), Gaudiano (2005), Guimares

    (2011), Grun (2001), Loureiro(2009), Mackenzie (2009), Payne (2000), Sato & Carvalho (2005), Sauv (2005),

    Sorrentino (2008 e 2005),Tristo & JACOBI (2010), Trajber (2010), Unger 2011.5 A realidade/ Sempre mais ou menos /Do que ns queremos/ S ns somos sempre/ Iguais a ns-prprios Versos

    do poema Segue o teu destino de Fernando Pessoa, de 01/06/1916, publicado em Odes de Ricardo Reis. Lisboa: Ed.

    Presena, 1999 (pgina no numerada).6 Estes argumentos tm sido apresentados de forma mais elaborada em Steil, Carvalho e Pastori (2010), Carvalho e

    Steil (2008, 2009).7 O relatrio foi elaborado com o apoio da Igreja, atravs da Comisso para Justia Racial da Igreja de Cristo

    (Commission for Racial Justice, United Church of Christ) e das pesquisas do prprio Robert Bullard, na Universidade de

    Atlanta. No site do Centro de Pesquisa em Justia Ambiental da Universidade de Atlanta (), alm de diversos artigos sobre o tema, so indicadas algumas pginas na internet onde possvel

    comprovar os resultados de sua pesquisa sobre a localizao e os danos ambientais a diversas populaes negras que

    passaram a se mobilizar.8A ntegra do documento est disponvel em http://www.ejrc.cau.edu/princej.html. Acesso em: ago/2010.9 Estes argumentos tm sido apresentados de forma mais elaborada em Steil, Carvalho e Pastori (2010), Carvalho e

    Steil (2008, 2009).10 O impedimento de que a EA seja uma disciplina na educao bsica um bom exemplo de uma medida ao mesmo

    tempo normatizadora e movida por um ideal utpico de educadores ambientais preocupados com a reduo da EA

    lgica disciplinar dos currculos escolares organizados por rea do conhecimento. Este impedimento est expresso na

    Lei no 9.795 de 27 de abril de 1999, que dispe sobre a educao ambiental, institui a Poltica Nacional de Educao

    Ambiental e d outras providncias, define no artigo 10, pargrafo 1o, que a educao ambiental no deve ser

    implantada como disciplina especfica no currculo de ensino.

  • 48 Carvalho, Farias e Pereira

    Ambiente & Sociedade Campinas v. XIV, n. 2 p. 35 -49 jul.-dez. 2011

    11 Esta tradio no pensamento ocidental pode ser identificada desde a histria das mentalidades como estando

    associada a grandes movimentos da cultura ocidental moderna tais como a virada para as novas sensibilidades do

    sculo XVIII, o romantismos ingls e o alemo do sculo XIX e os movimentos de contracultura do sculo XX, apenas

    para citar os cones desta tradio. Para uma discusso desta tradio de longa durao e de sua atualizao no

    pensamento ecolgico contemporneo ver Carvalho (2009).

  • A MISSO ECOCIVILIZATRIA E AS NOVAS MORALIDADESECOLGICAS: A EDUCAO AMBIENTAL ENTRE A NORMA E A

    ANTINORMATIVIDADE

    ISABEL CRISTINA MOURA CARVALHO1,

    CARMEN ROSELAINE FARIAS2,

    MARCOS VILLELA PEREIRA3

    Resumo: Este ensaio trata da aparente tenso entre os padres da normatividade e daantinormatividade implicados nas expectativas da educao ambiental (EA).Discutimos os sentidos que vm se produzindo sobre e desde a prtica da EA e queenvolvem a socializao para uma cidadania ambiental, imbuda de um carternormatizador e, ao mesmo tempo, de uma ideologia emancipatria. Optamos por umavia interpretativa, em que a educao ambiental se constitui no registro das novasmoralidades ecolgicas.

    Palavras-chave: Educao ambiental. Norma e antinormatividade. Hermenutica.

    Abstract: This essay deals with the apparent tension between the normative standards and expectations

    of anti-normativity standards involved in environmental education (EE). We discuss the meanings

    that are being produced on and from the practice of EA and involve the socialization of an environmental

    citizenship, imbued with a normative character and, at the same time, an emancipatory ideology. We

    opted for an interpretative route, where environmental education constitutes itself as one of the new

    ecological moralities.

    Keywords: Environmental education. Normative education. Anti-normativity. Hermeneutics.