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Mar Português Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de Portugal! Por te cruzarmos, quantas mães choraram, Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena Se a alma não é pequena. Quem quer passar além do Bojador Tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa, in Mensagem
O poema "Mar Português" revela-nos que apesar do sofrimento, resultante do
empreendimento dos Descobrimentos, este "valeu a
pena", pois ficou na memória da humanidade como sendo algo
grandioso e glorioso.
Análise do Poema
O poema é constituído por duas sextilhas.
A escansão é irregular, predominando versos octossilábicos (oito sílabas métricas).
Esquema Rimático: Emparelhadas : aabbcc
Ó mar salgado, quanto do teu sal aSão lágrimas de Portugal! a
Por te cruzarmos, quantas mães choraram, bQuantos filhos em vão rezaram! b
Quantas noivas ficaram por casar c
Para que fosses nosso, ó mar! c
Assunto do poema
As descobertas marítimas constituem um assunto muito recorrente na nossa literatura e na arte em geral.
O mar, a saudade, a desgraça, o perigo, a coragem, a fama e a glória resultantes dos Descobrimentos servem frequentemente de inspiração a muitos escritores. O poema de Fernando Pessoa reflete os medos e os perigos presentes nas estrofes de Os Lusíadas.
1.“Mar Português” é um poema marcadamente épico-lírico. Justifica esta classificação:
1.1 Indica o assunto de cada uma das estrofes
1ª parte: Dois primeiros versosÉ uma exclamação do poeta sintetizando as desgraças que o mar nos causou:"Ó mar salgado, quanto do teu sal/São lágrimas de Portugal!"Muitas vidas se perderam. Muitos marinheiros foram vítimas de naufrágio ou morreram trespassados pelas flechas dos índios.2ª parte: Restantes quatro versos da 1ª estrofeJustifica as contrapartidas negativas que o mar nos trouxe. Para que o mar fosse nosso, mães choraram, filhos rezaram em vão e noivas ficaram por casar.
2ª estrofeO poeta pergunta se valeu a pena suportar tais
desgraças, respondendo ele próprio que tudo vale a pena ao ser humano dotado de uma alma de aspirações infinitas. Toda a vitória implica passar além da dor e, se Deus fez do mar o local de todos os perigos e medos, a verdade, é que, conquistado, é ele o espelho do esplendor do céu. As grandes dores são o preço das grandes glórias:
Deus pôs o perigo e o abismo no mar, mas nele é que espelhou o céu (a glória).
1.2 Identifica elementos épicos e elementos líricos no discurso poético.
Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de Portugal! Por te cruzarmos, quantas mães choraram, Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena Se a alma não é pequena. Quem quer passar além do Bojador Tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu.
Elementos épicos- exaltação do poeta, através de frases exclamativas, pretendendo intensificar a sua palavra.Elementos Líricos- Reflexão do poeta sobre algo dito anteriormente.
2. O “mar” é o espaço das provas que o herói tem de superar e da recompensa que depois alcança.
Transcreve as expressões textuais que comprovam esta afirmação.
“Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu.”
No mar concentra-se o perigo, os quais, os
navegadores ultrapassaram.
O mar comporta-se como uma antítese Por um lado é negativo devido aos perigos nele presentes, e positivo porque nele se encontra a
recompensa dos navegadores.
3. Comenta o sentido de “Bojador”
“Quem quer passar além do Bojador Tem que passar além da dor.”
O Cabo Bojador localizado na costa africana, era considerado o limite do mar navegável devido aos ventos e às correntes que impossibilitariam o regresso de quem o dobrasse. Quando Gil Eanes finalmente navegou para além do Bojador e voltou, foi ultrapassada uma barreira psicológica capital. No poema, o Bojador simboliza todos os desafios a vencer no esforço das Descobertas, independentemente do custo humano.
4. Identifica, no poema os seguintes recursos estilísticos e comenta o seu valor expressivo:
ApóstrofeHipérboleAnáfora Interrogação retóricaMetáforaPontuação expressiva
Apóstrofe
“Ó mar salgado”
Chamamento do mar.
Hipérbole
“Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de Portugal! (…)”
Muito do sal que o mar contém, foi resultante do sofrimento (das lágrimas) dos navegadores
portugueses torna-se um exagero, ao relacionar o sal das
lágrimas com o sal do mar.
Anáfora
“Quanto(…)/Quantas(…)/Quantos(…)”
Repetição da palavra “Quanto” para intensificar a expressão ou sentimento do
poeta.
Interrogação retórica
“Valeu a pena?”
No início da segunda estrofe, Fernando Pessoa questiona se todo esse sofrimento, todo esse sacrifício
por parte dos Portugueses teria valido a pena. Logo de seguida, reflete que
tudo vale a pena, para que mais tarde sejam relembrados os feitos dos
navegadores.
Metáfora
“(…)quanto do teu sal são lágrimas de Portugal”
Nesta metáfora o poeta compara o sal das lágrimas ao sal do mar. Não chega a ser uma comparação real porque não apresenta uma palavra ou expressão comparativa. O povo português está intimamente ligado ao mar.
Pontuação expressiva
“(…)São lágrimas de Portugal!(…)Quantos filhos em vão rezaram! (…)Para que fosses nosso, ó mar!”
O poeta utiliza uma pontuação expressiva para intensificar a tese que apresenta. Neste caso, para refortalecer a ideia de que o mar salgado devido às lágrimas nele choradas.
Os Lusíadas (Canto IV, est.88-92) “Despedidas de Belém”
A gente da cidade, aquele dia,(Uns por amigos, outros por parentes,Outros por ver somente) concorria,Saudosos na vista e descontentes.E nós, co a virtuosa companhiaDe mil Religiosos diligentes,Em procissão solene, a Deus orando,Pera os batéis viemos caminhando.
Em tão longo caminho e duvidoso,Por perdidos as gentes nos julgavam,As mulheres cum choro piadoso,Os homens com suspiros que arrancavam;Mães, Esposas, Irmãs, que o temerosoAmor mais desconfia, acrecentavamA desesperação e frio medoDe já nos não tornar a ver tão cedo.
Qual vai dizendo: – «Ó filho, a quem eu tinhaSó pera refrigério e doce emparoDesta cansada já velhice minha,Que em choro acabará, penoso e amaro,Porque me deixas, mísera e mesquinha?Porque de mi te vás, ó filho caro,A fazer o funéreo encerramentoOnde sejas de peixe mantimento?»
Qual em cabelo: – «Ó doce e amado esposo,Sem quem não quis Amor que viver possa,Porque is aventurar ao mar irosoEssa vida que é minha e não é vossa?Como, por um caminho duvidoso,Vos esquece a afeição tão doce nossa?Nosso amor, nosso vão contentamento,Quereis que com as velas leve o vento?»
Nestas e outras palavras que diziam,De amor e de piadosa humanidade,Os velhos e os mininos se seguiam,Em quem menos esforço põe a idade.Os montes de mais perto respondiam,Quási movidos de alta piedade;A branca areia as lágrimas banhavam,Que em multidão com elas se igualavam.
O poema “Mar Português” compara-se com o episódio “Despedida de Belém” de Os Lusíadas pois as lágrimas de Portugal que tornaram salgado o mar, são as mesmas que os familiares choraram perante a partida dos marinheiros para a aventura marítima.
Luís de Camões e Fernando Pessoa enalteceram os Descobrimentos portugueses e a dor, o sofrimento e o sacrifício das pessoas envolvidas direta (marinheiros) ou indiretamente (familiares, amigos) nesse feito.
Os dois textos evidenciam o grande sofrimento e dor dos portugueses no momento da
partida das naus:
Luís de Camões refere o doloroso sacrifício e desespero das mães, esposas
e irmãs.
"Mães, Esposas, Irmãs, que o temeroso Amor mais desconfia, acrescentavam A desesperação e frio medoDe já nos não tornar a ver tão cedo"
Fernando Pessoa realça a dor das mães, dos filhos e das noivas que perderam a sua oportunidade de
constituir família.
"Por te cruzarmos, quantas mães choraram Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar"
Fim