a maha yoga de sri ramana

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Page 1: A Maha Yoga de Sri Ramana

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A Maha Yoga de Sri RamanaParte I

Os trechos a seguir foram retirados do Capítulo XII do livro  Maha Yoga, que já foi traduzido pelo Prof. Hermógenes e publicado no Brazil na década de 1950. Fizemos

uma nova tradução do texto e há possibilidade de publicação em 2011. Os trechos abaixo são provenientes da nova tradução. Em negrito são os subtítulos colocados

pelo autor (K. Lakshmana Sarma) e, entre aspas, os ensinamentos do Maharshi.

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COMO CONCILIAR AS IDEIAS DISCORDANTES DE HOMENS DE DIFERENTES RELIGIÕES? “O objetivo real de todas as religiões é conduzir ao despertar para a

Verdade do Ser. Mas a Verdade do Ser é simples demais para a maioria das pessoas. Embora não exista ninguém que não tenha conhecimento do Ser, as pessoas não

se interessam em ouvir falar d’Ele. Julgam que o Ser é de pouco valor. Querem saber de coisas remotas – do céu e do inferno, da reencarnação, e assim por diante.

Amam o mistério, e não a verdade plena. E as religiões se adaptam a elas, para que, no final das contas, elas possam voltar ao Ser. Mas por que não procurar encontrar

o Ser e habitar Nele imediatamente, sem maiores divagações? Os céus não podem estar separados daquele que os vê ou neles pensa: sua realidade é do mesmo grau

que a do ego que deseja chegar até eles; portanto, os céus não existem separados do Ser, que é o céu verdadeiro.

“Um cristão não ficaria satisfeito a menos que lhe disséssemos que Deus está em algum céu distante, que ele não pode alcançar sem auxílio divino; que somente Cristo

conheceu Deus e apenas ele pode levar os homens até Deus. Se lhe disséssemos que “o Reino dos Céus está dentro de você”, ele não entenderia o sentido simples

dessa afirmação, mas iria buscar interpretações complexas e artificiais. Somente o espírito maduro pode compreender e aceitar a verdade simples e nua.

“A divergência entre ensinamentos é apenas aparente, e pode ser resolvida se praticarmos a autoentrega, rendendo-nos a Deus; isso conduzirá ao Ser, ao qual todos

voltarão no final, porque Ele é a Verdade. A discordância entre os credos nunca será vencida através do debate de seus méritos, já que o debate é um processo mental.

As crenças são mentais – existem apenas na mente, enquanto que a Verdade está além da mente. Portanto, a Verdade não está nos credos.” Por conseguinte não

devemos ter muito estima pelos nossos credos.

“O conhecimento sagrado é volumoso, suas diferentes partes adaptando-se às necessidades das diversas espécies de buscadores. Cada buscador sucessivamente

transcende porção após porção; aquilo que ele transcende torna-se, então, inútil e até mesmo falso para ele. Por fim, ele o transcende integralmente.”

PECADO ORIGINAL. Certa vez perguntaram ao Sábio sobre a doutrina cristã do “pecado original” – segundo a qual todo homem nasce em pecado e só se liberta pela

fé em Jesus Cristo. O Maharshi respondeu: “Diz-se que o pecado está no homem, mas não há existência humana no sono; a existência humana surge ao acordar, junto

Page 2: A Maha Yoga de Sri Ramana

com o pensamento: ‘Eu sou este corpo’. Este pensamento é o verdadeiro pecado original e deve ser removido pela morte do ego, depois da qual não mais surgirá. ” E

explicou a verdade do cristianismo da seguinte maneira: “O corpo é a cruz; o ego é Jesus, o filho do homem quando é crucificado, e que ressurge como ‘Filho de Deus’,

que é o glorioso Eu Real. Devemos perder o ego a fim de viver”. Podemos lembrar aqui que, de acordo com todos os sábios, a vida do ego não é verdadeiramente vida,

mas morte.

HÁ CONHECIMENTO DO SER NO ESTADO SEM EGO? A verdade sobre o Estado sem ego é transmitida pelo Sábio por meio de negações. “O que se chama

Conhecimento do Ser é aquele Estado em que nem pode haver conhecimento nem ignorância, pois o que é comumente considerado conhecimento não é verdadeiro

conhecimento[1]. O Ser é por si só o verdadeiro Conhecimento, porque brilha por si só – sem nada que possa se tornar objeto de Seu conhecimento ou que possa

conhecê-Lo. Devemos compreender que o Ser não é o vácuo.” [2] Como o Estado sem ego não é descrito para nós em termos positivos, muita gente está sujeita a

concluir que não passa de um simples nada ou total aniquilação. Tal erro foi cometido por muitos pretensos seguidores do Iluminado Gautama Buda. Nesse ponto, o

Sábio Ramana se acautela para que erro similar não seja feito por aqueles que venham a tornar-se seus discípulos, declarando que esse Estado não é um vácuo.

Uma vez que o Sábio está num plano onde não há ignorância nem conhecimento, ele não tem necessidade de apreender coisa alguma. Nem as escrituras sagradas lhe

interessam, embora ele as possa ler a fim de explicar seu verdadeiro significado a quem lhe perguntar sobre isso. Assim, podemos compreender a seguinte declaração:

“Até mesmo um homem culto deve curvar-se diante de um Sábio analfabeto. O homem analfabeto é simplesmente ignorante. O homem culto é um ignorante com

cultura. O Sábio também é ignorante, porque nada existe para ele aprender.”

DESTINO OU LIVRE-ARBÍTRIO: QUAL DETERMINA A NOSSA VIDA? Quem formula essa pergunta espera uma resposta categórica. Deseja saber qual dos dois é o

fator decisivo na vida – o destino ou o livre-arbítrio. Em suas obras, o Sábio responde assim: “O debate quanto a qual dos dois – destino ou vontade humana – é mais

poderoso, interessa apenas àqueles que ainda não têm iluminação sobre a verdadeira natureza do ego, do qual surgem essas duas ideias.   Aquele que tem

esclarecimento sobre isso transcendeu ambos e já não se interessa pela questão”[3].

A um visitante que lhe formulou essa pergunta, o Sábio respondeu: “A resposta a essa pergunta, se eu a desse, seria um tanto difícil de ser compreendida. Contudo,

quase todos fazem essa pergunta em algum momento na sua vida. Devemos conhecer a verdade daquele que parece ser afetado, ou não, pelo destino.”  Nesse ponto o

Sábio evidentemente quis dizer o ego. Como a distinção entre o destino e o livre-arbítrio existe somente para o ego-mente, a verdade da questão é inseparável da

verdade sobre o ego, a qual só pode ser compreendida através da Busca. Tendo dito isso, o Sábio continuou explicando o significado real do destino: “ O destino tem um

começo – uma causa – e essa é a ação, a qual não existe sem livre-arbítrio. Portanto, como o livre-arbítrio é a causa primeira, ele é o fator predominante, e educando o

livre-arbítrio podemos conquistar o destino.” Educar o livre-arbítrio significa tomar o processo de autoinvestigação – a Busca ensinada pelo Sábio – ou,

alternativamente, entregar-se a Deus enquanto Realidade Única. “O que normalmente se denota por autoconfiança nada mais é do que a confiança no ego, o que

fortalece a prisão. Apenas a confiança em Deus é a verdadeira Autoconfiança, porque Deus é o Ser [Eu Real].”

É NECESSÁRIO TER UM GURU? É uma crença comum entre aqueles que tem tendências espirituais que todos que aspiram ao estado de libertação devem no tempo

devido encontrar um Guru e apegar-se a ele. Alguém perguntou ao Sábio quanto à validade desta crença. A resposta foi a seguinte: “Enquanto alguém se julgar

pequeno – laghu – deve apegar-se ao grande – o Guru. Ele não deve, no entanto, considerar o Guru como uma pessoa. O Sábio é apenas o Eu Real do discípulo. Quando

esse Eu Real é alcançado não existe nem Guru nem discípulo.” Essa pergunta surgiu porque o próprio Sábio não teve Guru – pelo menos nenhum Guru exterior. Em

outra ocasião o Sábio disse: “Seria necessário um mestre, se alguém precisasse aprender algo novo; mas o caso aqui é desaprender.”

COMO SUPERAR AS PREOCUPAÇÕES DA VIDA? Um visitante disse: “Estou sujeito a preocupações sem fim. Para mim não existe paz, embora nada me falte para ser

feliz.” O Sábio perguntou: “Essas preocupações o afetam quando você está dormindo?” O visitante admitiu que não. O Sábio lhe fez outra pergunta: “Você é o mesmo

homem, ou é diferente daquele que dormiu sem preocupações?” “Sim, eu sou a mesma pessoa.” O Sábio disse: “Então, certamente, essas preocupações não lhe são

inerentes. A culpa é sua se você supõe que elas são suas.”

[1] O conhecimento obtido pela mente e pelos sentidos implica a distinção entre sujeito e objeto, distinção esta que a experiência dos Sábios prova que é ilusória.

[2] Ulladu Narpadu, verso 12.

[3] Ulladu Narpadu, verso 19.

A Maha Yoga de Sri RamanaParte II

Page 3: A Maha Yoga de Sri Ramana

Os trechos a seguir foram retirados do Capítulo XII do livro  Maha Yoga, que já foi traduzido pelo Prof. Hermógenes e publicado no Brazil na década de 1950. Fizemos

uma nova tradução do texto e há possibilidade de publicação em 2011. Os trechos abaixo são provenientes da nova tradução. Em negrito são os subtítulos colocados

pelo autor (K. Lakshmana Sarma) e, entre aspas, os ensinamentos do Maharshi.

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MEDITAÇÃO E CONTROLE MENTAL. “A meditação (dhyana) é uma batalha, pois constitui o esforço de manter-se em um pensamento, excluindo todos os demais.

Outros pensamentos surgem e tentam afundar aquele pensamento objeto da meditação; quando este ganha força os outros desaparecem. O controle da respiração

(pranayama) é para aquele que não consegue controlar diretamente seus pensamentos; tem a mesma utilidade que um freio tem para um carro. Contudo, não

devemos parar com o controle da respiração. Após atingir o objetivo – acalmar a mente inquieta – devemos empreender a prática da concentração. Com o tempo, será

possível deixar de lado o controle da respiração; a mente então se aquietará tão logo se tente a meditação. Quando a meditação está bem sedimentada, não mais

podemos desistir dela. Continuará automaticamente durante o trabalho, lazer e outras atividades. Continuará até mesmo durante o sono. O meio de se estabelecer na

meditação é a própria meditação. Nem o japa (repetição mental de palavras ou frases) nem um voto de silêncio se fazem necessários. Se a pessoa se envolve em

atividades mundanas de cunho egoísta, de nada adianta um voto de silêncio. A meditação extingue todos os pensamentos e então só resta a Verdade.”

Noutra oportunidade, o Sábio disse: “Quando a cânfora queima, não resta nenhum resíduo. A mente deve ser como a cânfora: deve derreter-se e ser totalmente

consumida pela decisão determinada de encontrar e ser o Eu Real. Mediante tal determinação, a Busca ‘Quem Sou Eu?’ se torna eficaz. Quando a mente for assim

consumida – quando não restar nenhum vestígio da mente –ter-se-á dissolvido no Ser.”

Sendo-lhe perguntado como pode alguém encontrar seu Guru, o Sábio respondeu: “Através de intensa meditação.”

As pessoas que procuram resultados específicos da meditação não os conseguem, desencorajam-se, e concluem que a meditação não lhes trouxe proveito. A essas

pessoas o Sábio diz: “Não importa nada se esses resultados foram obtidos ou não. A obtenção da constância é o principal. É o grande proveito. De qualquer modo,

devem confiar em Deus e esperar sem impaciência por sua Graça. A mesma regra se aplica ao  japa também; japa feito mesmo uma vez traz proveito, quer a pessoa

esteja consciente disso quer não.”

Alguns pensam que se deve continuar praticando a meditação, mesmo após a Iluminação. Essa questão é esclarecida da seguinte maneira: “ Quando a mente se

extingue no Estado sem ego, então nem há concentração nem não-concentração”. Referindo-se à mesma questão, o Sábio disse em outra ocasião: “Quando o Ser é

realizado, não é possível nem tentar o samadhi nem abandoná-lo”.

O êxito na meditação vem rapidamente a poucos, e depois de longa prática para os outros. Sobre tal questão o Sábio diz: “As vasanas (propensões ou tendências

mentais) impedem a meditação, portanto esta só se torna eficaz através do enfraquecimento progressivo das  vasanas. Certas mentes são como a pólvora que pega

fogo e se consome imediatamente: outras se assemelham ao carvão, e outras ainda são iguais ao combustível molhado.”

O segredo do controle mental é esclarecido na seguinte resposta: “A mente não pode ser controlada por alguém que julga que ela seja algo que realmente existe;

nesse caso, a mente se comporta como um ladrão que finge ser um policial perseguindo o ladrão. Esforços feitos dessa maneira servem apenas para dar um novo

alento de vida ao ego e à mente”.  O método adequado é investigar a verdade da mente e do ego, o que leva à Busca.

Em outra ocasião, o Sábio disse: “Pessoas me perguntam como controlar a mente. Eu respondo: ‘Mostre-me a mente’. A mente nada mais é do que uma série de

pensamentos. Como pode a mente ser controlada por um daqueles pensamentos, isto é, pelo desejo de controlar a mente? É tolice tentar acabar com a mente através

da própria mente; a única maneira é encontrar a Fonte da mente e segurá-La. Então a mente desaparecerá por si só. O Yoga prescreve o  chitta-vritti-nirodha(supressão

dos pensamentos); eu recomendo Atmanveshana (Busca do Eu), a qual é praticável. A mente é contida [em algumas ocasiões], como no desmaio, ou como resultado do

jejum. Mas logo que a causa é removida, a mente revive, isto é, os pensamentos começam a fluir como antes. Há apenas dois modos de controlar a mente: ou buscar a

Page 4: A Maha Yoga de Sri Ramana

sua Fonte, ou renunciar a mente, deixando que o Poder Supremo a destrua. A entrega é o reconhecimento da existência de um Poder Supremo. Se a mente se recusa a

auxiliar na busca da Fonte, deixe-a ir e espere que retorne: então a dirija para o íntimo. Ninguém obtém êxito sem paciente perseverança.”

A meditação com os olhos fixos no espaço entre as sobrancelhas, o Sábio nos adverte, pode resultar em medo. A maneira certa é fixar a mente somente no Ser. Não

conduz ao medo.

Outra coisa que aprendemos é que não pode haver meditação – no sentido usual do termo – no Ser. Meditação é normalmente concebida como pensar em um objeto;

isso implica em distinção entre sujeito e objeto e, portanto, não é possível meditação sobre o Ser. O que é chamado meditação nada mais é do que afastar os

pensamentos, pelos quais o Ser fica oculto. Quando todos os pensamentos são dissipados, o Ser brilha em Sua Natureza real: permanecer nesse estado é a única

meditação do Ser que pode haver. O Sábio, pois, está sempre em meditação, embora possa parecer estar frequentemente envolvido com outras atividades.

COMO LIDAR COM O SOFRIMENTO. “Voltando a mente para dentro, vencer a pior das mágoas. O sofrimento só é possível quando consideramos que somos o corpo.

Se a forma é transcendida, saberemos que o Ser é eterno – que para ele não existe nem nascimento nem morte. É apenas o corpo que nasce e morre, não o Ser. O

corpo é uma criação do ego, que, contudo, nunca é percebido independente do corpo – na verdade, o ego é inseparável do corpo. Devemos considerar que no sono não

temos consciência da existência de um corpo; assim, percebemos que o corpo não é real. Ao despertarmos do sono, surge o ego e, depois, os pensamentos. Descubra a

quem os pensamentos pertencem. Pergunte de onde se originam. Devem surgir do Ser, que é a Consciência. Compreender essa Verdade, mesmo vagamente, ajuda na

extinção do ego; com ela, a Existência infinita é alcançada. Nesse Estado não há indivíduos – apenas o Ser único. Portanto, não há espaço nem mesmo para o

pensamento da morte.

“Se alguém julga que nasceu, não pode deixar de pensar na morte. Portanto, que ele se questione se realmente nasceu. Então, descobrirá que o Eu Real tem existência

eterna, e que o corpo é apenas um pensamento – o primeiro de todos os pensamentos, a raiz de todas as perturbações.”

OS TRÊS ESTADOS DA MENTE. A mente é alternadamente sujeita a três estados: o estado de sonolência ou inércia, chamado tamas, é o mais baixo; o seguinte, mais

elevado, é o de atividade inquieta, chamado rajas; o superior é o de clareza e paz, chamado sattva. O Sábio nos diz que o discípulo não deve lamentar ou lastimar o

predomínio dos dois primeiros, mas esperar até que surja o estado de clareza e, então, tirar o maior proveito dele.

A MORTE. “Na verdade os mortos são felizes, tendo se livrado do pesadelo que é o corpo. Os mortos não sofrem. Os homens temem o sono? Não, procuram-no e

preparam-se para ele. O sono é a morte temporária, e a morte nada mais é do que um sono prolongado. Se o homem, enquanto vivo, morrer a morte que não é morte,

através da extinção do ego, ele não mais sofrerá pela morte de ninguém. Uma vez que sabemos que existimos continuamente através de todos os três estados – com o

corpo e sem o corpo – por que deveríamos desejar a continuação dos grilhões físicos para nós mesmos ou para os outros?”

“Quando alguém está nos começando a morrer, a respiração se torna difícil. Isso significa que a pessoa se tornou inconsciente do corpo moribundo; a mente logo toma

posse de outro corpo e oscila entre os dois, até que o apego se transfira totalmente para o novo corpo. Nesse ínterim, há violentas respirações ocasionais, indicando

que a mente hesitantemente retornou ao corpo moribundo. Esse estado de transição da mente é semelhante a um sonho.”

OS ANIMAIS POSSUEM ALMA? O Sábio trata os animais da mesma forma com que trata os seres humanos. Ao falar de um animal usa sempre os termos que usaria

para referir-se a um ser humano, “ele” e “ela”[1]. Uma vez perguntaram-lhe se os animais não eram inferiores aos homens, e ele respondeu: “Os Upanishads dizem que

os homens, enquanto ficarem sujeitos ao ego – ou seja, até se conscientizarem do puro Ser –, não passam de animais. Pode até ser que os homens sejam piores do que

os animais.”

Bhagavan também disse que almas muito avançadas podem ter ocupado corpos de animais a fim de viver no ambiente de seu eremitério. Havia, certa vez, quatro cães

que viviam lá, e demonstravam muitos sinais de devoção. Por exemplo, quando se lhes oferecia alimento, eles não o tocavam até que o próprio Sábio tivesse sido

servido e iniciasse sua refeição. Logo que o Sábio começava a comer, eles também o faziam, mostrando a sua peculiaridade quanto a esse aspecto.

PRÁTICAS DEVOCIONAIS. “Práticas como o japa e outras semelhantes são preferidas por muitos, por serem mais concretas. Mas o que é mais concreto do que o Ser?

Ele está dentro da experiência direta de cada um e de todos, e é experienciado em cada momento. Portanto, o Ser é a única coisa que é incontestavelmente conhecida.

Assim sendo, devemos procurá-Lo e achá-Lo, em vez de buscar algo desconhecido – Deus ou o mundo.”

SAMADHI E SUA INTERPRETAÇÃO. “A experiência que São Paulo obteve e que o converteu à fé em Cristo foi realmente uma experiência transcendente ao mundo

das formas. Mas, posteriormente, ele a identificou como a visão do Cristo.” Respondendo à objeção de que Paulo tinha sido anteriormente um perseguidor de Cristo, o

Sábio disse: “É irrelevante se o predominante tenha sido amor ou ódio; o que importa é que o pensamento de Cristo estava lá. O caso foi semelhante ao de Ravana e

outros demônios.”

COMO DEVEMOS AGIR NO MUNDO? “Devemos agir no mundo como um ator no palco. Em todas as ações há no fundo o Eu Real como princípio sustentador. Lembre-

se disso e aja.”

Page 5: A Maha Yoga de Sri Ramana

[1] Enquanto que no Tâmil normalmente se usa o pronome relativo a “coisa” [it, em inglês, N.T.] para se referir a um animal.

A Maha Yoga de Sri RamanaParte III

Os trechos a seguir foram retirados do Capítulo XII do livro  Maha Yoga, que já foi traduzido pelo Prof. Hermógenes e publicado no Brazil na década de 1950. Fizemos

uma nova tradução do texto e há possibilidade de publicação neste ano (2011). Os trechos abaixo são provenientes da nova tradução. Em negrito são os subtítulos

colocados pelo autor (K. Lakshmana Sarma) e, entre aspas (e em itálico), os ensinamentos do Maharshi.

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O CORAÇÃO. “Não há necessidade de saber onde o Coração está e o que Ele é. Ele desempenhará seu papel se você se empenhar na Busca do Ser.”

INTELECTO. “O intelecto não pode deixar de imaginar o Ser como tendo o tamanho e a forma do corpo.”

MENTE. “A mente é como a lua, e a luz de sua consciência provém do Ser, que, assim, se assemelha ao Sol. Portanto, quando o Ser começa a brilhar, a mente torna-se

inútil, tal como a lua durante o dia.”

AUXÍLIO AOS OUTROS. “O Sábio auxilia o mundo simplesmente por ser o Ser Real. O melhor meio de servir ao mundo é alcançar o Estado sem ego. ” Em outra

ocasião disse: “Se você está ansioso por auxiliar o mundo, mas pensa que não poderá fazê-lo alcançando o Estado sem ego, então entregue a Deus todos os problemas

do mundo, junto com os seus.”

VISÃO DA FORMA CÓSMICA DE DEUS TIDA POR ARJUNA.[1] “Sri Krishna disse a Arjuna: ‘Não tenho forma e transcendo todos os mundos.’ Contudo, mostrou a

Arjuna sua ‘forma cósmica’. Arjuna vê a si mesmo, os deuses e todos os mundos dentro dela. Krishna também disse: ‘Nem os deuses nem os homens podem Me ver’. E,

apesar disso, Arjuna vê Sua forma. Krishna diz: ‘Eu sou o Tempo’. O Tempo tem forma? Novamente, se o universo fosse realmente Sua forma, deveria ser uno e

imutável. Por que diz ele a Arjuna: ‘Veja em Mim tudo que você quiser ver’? A resposta é que a visão era mental – de acordo com os desejos do contemplador. Portanto,

não deve ser interpretada literalmente. Não era uma visão de acordo com a Verdade de Deus. Chamam-na ‘visão divina’. Contudo, cada um a pinta de acordo com seus

próprios pontos de vista. E também há um observador na visão! Se um hipnotizador lhe mostra algo, você diz que é truque, mas isso você diz que é divino! Por que

essa diferença? Krishna deu a Arjuna o olho divino (divya chakshus) e não o Olho da Sabedoria (janana chaksus), o Olho que é Pura Consciência e que não tem visões.

Nada que é visto é real.”

A AÇÃO DO YOGA E A RENÚNCIA DA AÇÃO. (Karma-Yoga e Karma-Sannyasa). Quando certa vez perguntado a respeito, o Maharshi não respondeu imediatamente,

mas dirigiu-se à floresta da montanha[2], seguido pelo interlocutor, e tirou dois galhos de uma árvore. Talhou-os, transformando-os em bengalas, e deu uma ao

interlocutor e a outra a alguém mais. Depois disse: “A confecção das bengalas é Karma-Yoga e a doação delas é Karma-Sannyasa”. O Sábio não as fez para si mesmo.

O CENTRO ESPIRITUAL não é geográfico. Inclui todos os homens. Tanto as forças destrutivas como construtivas pertencem a Ele.

CONCILIAÇÃO DAS DOUTRINAS DE SANKARA E RAMANUJA.[3] Ramanuja diz que o mundo é real, e que Maya não existe. Shankara nos exorta a descobrir a

Realidade que sustenta o mundo sempre mutável. O que Ramanuja chama de mutabilidade, Shankara classifica como ilusão [ maya]. “A diferença é apenas verbal.

Ambas levam ao mesmo objetivo.”

Page 6: A Maha Yoga de Sri Ramana

O SÁBIO MEDITA SOBRE DEUS? “Meditar é pensar, e pensar é relativo ao esquecer. Aquele que esquece Deus deve pensar em Deus. O Sábio nunca esquece Deus,

assim como nós nunca esquecemos nós mesmos. Portanto, ele não medita sobre Deus. Mas, como ele nunca esquece Deus, pode-se dizer verdadeiramente que ele

está sempre meditando em Deus.”

VISÕES DE DEUS. Alguém que não tenha estudado os ensinamentos do Sábio, nem as escrituras, formulou uma série de perguntas, uma das quais é a seguinte: “Você

já viu Deus?” O Sábio respondeu, rindo suavemente: “Se alguém tivesse aparecido para mim dizendo: ‘Eu sou Siva’, ou ‘Sou Rama’ ou ‘Sou Krishna’, eu poderia saber

que tinha visto tal pessoa. Mas ninguém apareceu para mim, dizendo quem era.” A resposta estava de acordo com a ignorância do inquiridor. Deus, que é o Eu Real,

não tem forma, e não pode ser visto como um objeto. Em outra ocasião, quando perguntaram ao Sábio sobre “ver Deus em todas as coisas” – que é uma prática

prescrita na sabedoria sagrada –, ele respondeu: “Ver objetos e conceber Deus neles são processos mentais. Mas isso não é ver Deus, porque Ele está dentro”.  A

expressão “ver Deus em todas as coisas” significa a compreensão de que Deus é a Realidade na qual a manifestação do mundo é sobreposta. Isso se chama  pravilapa

drishti – lembrando a Verdade que subjaz à variedade – e é recomendado pelo Sábio como meio de purificar e fortalecer a mente.

POR QUE AS ESCRITURAS NÃO NOS DIZEM O QUE É O SER?  “Tudo que precisamos fazer para encontrarmos o Ser é remover os não eu, os revestimentos. Um

homem em dúvida quanto ao que ele é dirige-se a alguém e lhe pergunta. Este lhe diz que ele não é uma árvore, nem uma vaca, e assim por diante, deixando evidente

que ele não é outra coisa senão um homem. Se o sujeito não ficar satisfeito e perguntar: “Você não me disse o que sou”, a resposta será: “Eu não lhe disse que você

não era um homem.” Se até mesmo assim ele não puder entender que é um homem, será inútil dizer-lhe. Dessa forma, [as escrituras] também nos dizem o que nós

não somos, de modo que pela eliminação de tudo isso, encontraremos o Remanescente, o Eu Real.”

COMO EMPREENDER A BUSCA “QUEM SOU EU?” “A forma é subjetiva, não objetiva, de modo que não pode e nem precisa ser mostrada por outrem. Alguém

precisa lhe mostrar o interior de sua própria casa? Se o buscador conservar sua mente imóvel, isso será suficiente.”

RESPOSTA À PERGUNTA “QUEM SOU EU?” “Uma resposta que surge na mente e através dela, não é resposta, em absoluto.” A resposta é o Estado sem ego.

O QUE É CONHECIMENTO DIRETO? “As pessoas supõem que não existe Consciência separada dos pensamentos da mente. Portanto, pensam que só a percepção dos

sentidos é conhecimento direto. Mas os objetos dos sentidos não se manifestam por si sós. Logo, a percepção sensorial não é conhecimento direto. O Ser existe por si

mesmo e, por isso, o conhecimento do Ser é direto. Mas se perguntarmos às pessoas ‘Por acaso o Ser não é visto diretamente sem o intermédio de qualquer agente?’

elas não entendem, porque o puro Eu não lhes aparece com uma forma.”

A VIDA ETERNA. “Esquecer o Ser é morte; lembrá-Lo é Vida. Você deseja a vida eterna. Por quê? Porque a vida presente (na relatividade) é insuportável. Por que é

assim? Porque ela não é a sua Natureza real. Na verdade, você é o Espírito puro; mas você o identifica com um corpo, que é uma projeção da mente, um pensamento

transformado em objeto. E a mente, por sua vez, originou-se do puro Espírito. A simples mudança de corpo não adianta, porque simplesmente há uma transferência do

ego para o novo corpo. Além disso, o que é Vida? É Existência (como Consciência), e isso é Você mesmo. Isso é verdadeira vida, e Ela é eterna (além do tempo). A vida

no corpo é vida condicionada. Mas você é Vida Incondicional. Você recuperará sua verdadeira natureza como Vida não condicionada quando a ideia ‘eu sou o corpo’

cessar.”

HÁ GRAUS DE REALIDADE? “Pode haver graus de experiência da Realidade – decorrentes do quanto nos libertamos de pensamentos – mas não há graus de

Realidade.”

PODEMOS PERDER O SER? Disse alguém: “A Bíblia declara que a alma pode ser perdida”. O Sábio então observou: “ O ego pode (e deve) ser perdido, mas o Ser

nunca.” “O sofrimento é devido ao grande número de pensamentos discordantes que reinam na mente. Se todos os pensamentos forem substituídos por um único

pensamento, não haverá infortúnios. Então o sentimento de ser o agente das ações e a consequente expectativa dos resultados dessas ações cessarão.”

A GÊNESE DO PRAZER. “Quando um pensamento ocupa toda a mente, ele exclui todos os outros pensamentos. Então, esse pensamento único também desaparece

no Ser, e a Bem-Aventurança se manifesta como prazer. Mas essa manifestação está no anandamaya [4]. A perfeita Bem-Aventurança só é alcançada quando todos os

revestimentos são retirados.”

IDENTIDADE ENTRE DEUS E O SER. “Se Deus fosse diferente do Ser, então Ele não possuiria um Ser, o que é absurdo.”

O VERDADEIRO ESTADO. “Seu dever é simplesmente SER, e não ser isso ou ser aquilo. Quando o eu sai pela tangente, dizendo ‘eu sou isto’, é egoísmo, ignorância.

Quando brilha como o puro ‘EU’ é o Ser.”

[1] O episódio aqui se refere a um relato muito conhecido no livro Bhagavad Gita. [N.T.]

[2] Montanha de Arunachala [N.T.]

[3] Shankara foi o codificador do Advaita Vedanta, doutrina hindu da não dualidade, baseada nosUpanishads; já Ramanuja advoga a doutrina da “Não Dualidade

Qualificada”. [N.T.]

[4] O revestimento mais sutil que oculta o Ser. [N.T.]

 Maha Yoga de Sri RamanaParte IV

Page 7: A Maha Yoga de Sri Ramana

Os trechos a seguir foram retirados do Capítulo XII do livro  Maha Yoga, que já foi traduzido pelo Prof. Hermógenes e publicado no Brazil na década de 1950. Fizemos

uma nova tradução do texto e há possibilidade de publicação neste ano (2011). Os trechos abaixo são provenientes da nova tradução. Em negrito são os subtítulos

colocados pelo autor (K. Lakshmana Sarma) e, entre aspas (e em itálico), os ensinamentos do Maharshi.

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DEVEMOS CONDENAR O DVAITA? “Dvaita[1] consiste em (erroneamente) identificar o Ser como o não ser. Advaita é deixar de fazer isso.”

 

HEROÍSMO. “Quando o eu surge, torna-se ele mesmo o sujeito e o objeto. Quando o eu não surge (enquanto ego) não há sujeito nem objeto. Para o discípulo maduro,

nada mais precisa ser dito. Sabendo isso, ele volta sua mente para o interior, afastando-a de tudo que é externo. Para poder fazê-lo, deve-se ser um herói (Dhira). Mas,

que heroísmo é necessário para encontrar a Si mesmo? ‘Dhi’ significa mente e ‘ra’ quer dizer evitar que as energias mentais se desgastem em correntes de

pensamentos. Quem pode deter o fluxo dos pensamentos e voltar a mente para o seu íntimo é um Dhira.”

 

AUMENTO DE CONHECIMENTO RELATIVO. Quando alguém quis saber sobre suas vidas passadas, o Sábio disse: “Mesmo com o conhecimento da vida presente você

não é feliz. O conhecimento de suas vidas passadas só aumentará sua infelicidade. Todo esse conhecimento é apenas uma carga para a mente.”

 

O SER É A TESTEMUNHA? “A ideia do Ser como uma Testemunha está na mente. Pode ser útil para auxiliar a aquietar a agitação mental, mas não é a Verdade

absoluta do Ser. A testemunha está relacionada à coisa testemunhada, Tanto a testemunha como a coisa testemunhada são criações mentais.”

“Ausência de Ego, Amor, o Espírito Santo e o Espírito, são todos os nomes de uma única coisa: o Ser.”

 

FELICIDADE. “Buscar a felicidade enquanto identificando o Ser com o corpo é como tentar atravessar um rio nas costas de um crocodilo. Quando o ego surge, a mente

se separa da Fonte, o Ser, e fica inquieta, como uma pedra atirada no ar, ou como as águas de um rio. Quando a pedra ou o rio atingem o seu lugar de origem – o chão

ou o oceano, respectivamente – elas cessam o movimento. Assim, também a mente descansa e é feliz quando retorna à Fonte e Nela repousa. Como a pedra e o rio

voltam infalivelmente ao ponto de partida, assim também a mente inevitavelmente retornará – algum dia – à sua Fonte.” Dessa forma, existe a promessa de que todos

alcançarão a Meta.

“Felicidade é a sua própria Natureza. Portanto, não é errado desejá-la. O que é errado é procurá-la externamente, porque ela está dentro de você.”

 

SAMADHI E ÊXTASE. “No Samadhi em si há apenas a Paz perfeita. O êxtase advém quando a mente revive com o término do Samadhi, com a lembrança da Paz

do Samadhi. Na devoção o êxtase é anterior. Manifesta-se por meio de lágrimas de alegria, pelos cabelos ficarem em pé, e pela voz vacilante. Quando o ego finalmente

morre e se alcança o Sahaja, esses sintomas e os êxtases cessam. Não há êxtase ao despertar do sono, porque Samadhi é sono no estado de vigília.”

Page 8: A Maha Yoga de Sri Ramana

“Buda estava interessado apenas em instruir seus discípulos em como alcançar a Felicidade permanente. Recusava-se a responder a perguntas – que se baseavam na

ignorância dos interlocutores – sobre Deus e outros assuntos. Por isso foi depreciado como niilista, sunyavadi.”

 

O SÁBIO QUE DIRIGIA UM REINO. Pergunta: “Como pôde Janaka dirigir seu Reino, sendo um Iluminado?” Resposta: “Janaka fez essa pergunta? Ela não surge no

Estado do Conhecimento Correto. Só surge na ignorância.” O interlocutor: “Provavelmente ele considerava suas atividades como um sonho.” O Sábio: “Essa explicação

também está na ignorância.”

 

PURIFICAÇÃO DA MENTE. “A Experiência do Ser (Jnana) por si só purificará a mente.”

 

ANIQUILAÇÃO DO KARMA. “Quanto mais se poda uma planta, mais ela cresce. Igualmente, quanto mais se procura aniquilar o Karma, mais ele aumenta. Você deve

procurar a raiz do Karma, o ego, e destruí-la.”

 

SOBRE BRAHMACHARYA. “Brahmacharya (abstinência sexual) não pode ser estabelecida por simples força de vontade. O verdadeiro Brahmacharya não é externo. É

viver em Brahman, a Realidade. Alcançada esta, o outro virá por si só.”

 

MENTE SÃ, EM CORPO SÃO. “Se você continuar com a ideia de que a saúde do corpo é necessária à saúde da mente, não haverá fim para o cuidado com o corpo.”

A ideia dos Hatha-Yogis de preparar o corpo para a prática dos métodos para alcançar a Libertação, fazendo-o durar por tempo incrivelmente longo, é ridícula.

Justificam-na comparando o corpo a uma tela, que tem de ser preparada para ser pintada. O Sábio Ramana disse: “O que é a tela e o que é a pintura? O Ser é a tela, e o

corpo e o mundo são a pintura. E o que precisamos para conscientizarmo-nos do Ser é apagar a pintura.[2]” Dessa forma, o Hatha Yoga não é necessário ao

discípulo maduro.

 

CONTROLE DA MENTE. “Para acalmar os incessantes movimentos da tromba do elefante, o condutor lhe dá uma corrente pesada para segurar. Assim também, para

controlar a divagação da mente, devemos ocupá-la da melhor forma possível; caso contrário ela se envolverá em alguma tarefa inconveniente. A melhor de todas as

ocupações a dar à mente é engajá-la na busca de sua própria Fonte. A segunda melhor é a meditação ou o japa.”

 

JEJUM PARA O PROGRESSO ESPIRITUAL. “O jejum deve ser essencialmente mental. A simples abstinência de alimentos não trará proveitos – isso até mesmo

transtornará a mente. O progresso espiritual vem mais pelo controle da alimentação. Mas, se durante um mês de jejum, a perspectiva espiritual for mantida, então em

cerca de dez dias após o jejum ser quebrado (se corretamente quebrado e seguido de alimentação criteriosa) a mente tornar-se-á pura e uniforme, e assim

permanecerá.”

 

[1] Filosofia de interpretação do Vedanta (a parte final dos Vedas, onde se encontram os Upanishads) que postula uma dualidade essencial.

[2] Ou seja, voltar a mente para dentro, para o Ser (Pura Consciência), quando então não mais será percebida a existência de um corpo ou mundo como algo real,

exterior, com existência própria. [N.T.]

A Maha Yoga de Sri RamanaParte V

Page 9: A Maha Yoga de Sri Ramana

Os trechos a seguir foram retirados do Capítulo XII do livro  Maha Yoga, que já foi traduzido pelo Prof. Hermógenes e publicado no Brazil na década de 1950. Fizemos

uma nova tradução do texto e há possibilidade de publicação neste ano (2011). Os trechos abaixo são provenientes da nova tradução. Em negrito são os subtítulos

colocados pelo autor (K. Lakshmana Sarma) e, entre aspas (e em itálico), os ensinamentos do Maharshi. Esta é a parte final da série “A Maha Yoga de Sri Ramana”.

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RESPOSTA A UM PRAGMATISTA: Pergunta: “Se todos os homens renunciarem o mundo, quem lavrará a terra e fará a colheita?” Resposta: “ Realize o Ser Verdadeiro

e então verá por si mesmo.” Essa é uma resposta geral para todas as questões semelhantes a esta.

SENSAÇÃO DE DIFICULDADE. “Um método nos parecerá fácil ou difícil, conforme o tenhamos praticado antes ou não.”

AOS NIVELADORES. “A forma mais segura de se atingir a perfeita igualdade é ir dormir!”[1]

CONTROLE DE NASCIMENTO VERSUS MORALIDADE. Pergunta: “O controle de nascimento é nocivo à moralidade?[2]” Resposta: “O Maha Bharata diz que quanto

mais se cede ao desejo, mais insaciável ele se tornará.”

SOBRE PROGREDIR OU RETROCEDER. Alguns observaram que é fácil ir para frente, mas impossível retroceder. O Sábio diz: “Não importa quão longe vamos,

estamos sempre onde sempre estamos. Onde está o ir para frente ou ir para trás? O Isa Upanishad (verso 5) diz: ‘Ele está longe e também está perto’.”

UTILIZAÇÃO DE PODER DIVINO PARA CURAR DOENÇAS, ETC. “Não há necessidade de ‘ingerir’ poder divino para qualquer finalidade. Já está dentro de você. Ele é

você.”

COMPARAÇÃO ENTRE A VIGÍLIA E O SONHO. “O mundo dos sonhos interessa ao sonhador porque ele julga que é uma realidade objetiva, fora de si mesmo e

diferente de si. O homem desperto se interessa pelo seu mundo de vigília pela mesma razão. Se, pela experiência do Eu Real, ele chegar a saber que o mundo não

passa de uma formação mental, deixara de interessar-se por ele.”

Page 10: A Maha Yoga de Sri Ramana

EXISTE O MUNDO? “Há uma diferença entre a declaração de que o mundo existe e a declaração de que ele é real”, afirma o Sábio. A segunda declaração não

contradiz a afirmação aparentemente contrária, de que o mundo é irreal, enquanto que a primeira o faz. O homem completamente ignorante confunde a Substância – a

Realidade que sustenta a aparência do mundo – e a aparência, e toma essa mistura como sendo real. Os discípulos do Sábio sabem que têm de separar a aparência da

Substância, e compreender que apenas a Substância é real, e o resto é ilusão.

NOMES DE DEUS. “Assim como você responde pelo seu nome, embora não houvesse nome algum escrito na sua testa ao nascer, da mesma forma Deus responde

quando Seu nome é pronunciado pelo devoto, apesar de Ele realmente ser sem nome.”

RENÚNCIA AOS LAÇOS FAMILIARES: “No sono você não estava consciente da sua família. E você é o mesmo ser agora. Mas agora você tem consciência da família,

sente que ela o prende, e deseja renunciar os laços. Por acaso os membros da ‘sua’ família o prendem a eles, ou é você que se prende a eles? Basta que você renuncie

ao pensamento ‘Esta é minha família’. Os pensamentos mudam, mas você não. Mantenha-se no Eu que não muda. Para isso, não precisa fazer com que a mente deixe

de pensar. Simplesmente lembre-se apenas da Fonte dos pensamentos e seriamente se empenhe em encontrá-La.”

AUTOENTREGA: “Quanto mais nos entregamos, mais o nosso ambiente melhora e maior também é a nossa força para trabalhar. ” Isso Bhagavan disse a alguém

engajado em atividades de independência nacional [da Índia].

“As escrituras têm valor apenas enquanto a pessoa não se volta para o interior, na Busca do Ser. Logo que isso é feito, tudo o que aprendeu é esquecido e perdido.”

APODERAR-SE DO MUNDO. “Sendo o mundo uma simples sombra do Ser, é impossível conhecê-lo corretamente ou apoderar-se dele. Uma criança tenta tocar a

cabeça de sua própria sombra, mas não o consegue, porque quando se move a cabeça da sua sombra também se movimenta. A mãe, então, coloca a mão da criança

na cabeça desta, assim lhe mostrando que a cabeça da sombra foi tocada. Igualmente, só poderemos nos apoderar do mundo ou conhecê-lo corretamente se

mergulharmos no Ser.”

SOBRE SER FIRME E NÃO AFETADO POR NADA. Criticando o ponto de vista que diz “Sou como uma espuma no Oceano da Consciência”, Ramana Maharshi disse:

“Tal pensamento é a raiz de todas as preocupações, devendo ser abandonado. O Ser é o Oceano; o mundo e as almas são as espumas nele. Se você souber disso e se

lembrar disso constantemente, então será firme e estará isento de dúvidas e preocupações. Esta verdade é confirmada quando se mergulha no Coração através da

Busca [Quem sou eu?]. Mas, mesmo sem esse mergulho, somos Aquilo e nada mais do que Aquilo. As ideias de interior e exterior só podem surgir enquanto o ver

correto não for aceito e a ele não aderirmos. Diz-se ao amante da Libertação que mergulhe no seu interior, porque ele confunde a alma individual, que não existe, com

o Ser, que é infinito e inclui tudo que se vê. Aquele que compreende isso não desejará nada, mas estará sempre satisfeito. Mesmo antes que se mergulhe dentro de si,

o Ser É experienciado. Ninguém pede negar que existe; aquela Existência é a Consciência do Ser. Você não pode fazer perguntas a menos que exista. Portanto,

você temconsciência de si mesmo. O fruto de seus esforços para alcançar a Verdade do Ser é exatamente livrar-se dos seus erros atuais. Não haverá uma ‘Realização’

nova.”

O SER É LUZ. “Para se conhecer um objeto é preciso uma luz comum que vença a escuridão. Para se conhecer o Ser é preciso uma Luz que ilumine tanto a luz quanto

a escuridão, mas que em si não é nem luz nem escuridão. Chama-se isto de Luz porque por Seu intermédio é que a claridade e a escuridão são conhecidas. Esta Luz é o

próprio Ser, a Consciência Infinita, da qual ninguém está inconsciente. Ninguém é um  Ajnani, um não-conhecedor do Ser; mas como não sabem disso, os homens

desejam se tornar um Jnani [Iluminado].”

 

[1] Essa frase enigmática aparece na versão original do livro, sem que se tenha conseguido compreender sua inserção. Possivelmente ela faz sentido em certo

contexto, como resposta (possivelmente brincalhona) do Bhagavan a alguma pergunta incomum. Tal contexto, contudo, não foi apresentado pelo autor “WHO”. De

qualquer forma, está relacionada ao ensinamento geral do Maharshi de que no estado de sono, quando não há mente, não há quaisquer diferenças. [N.T.]

[2] Essa pergunta deve ser compreendida dentro do contexto dos ideais morais e espirituais da religião indiana, entre os quais se encontram a moderação e, mais

elevadamente, o abandono dos desejos [nirasa, vairagya]. Ou seja, por trás dessa pergunta há possivelmente a presunção de que o “controle da natalidade” (questão

social relevante na Índia) – ou seja, a utilização de métodos anticoncepcionais – pode ser uma forma de contornar uma “fraqueza moral”, qual seja, a falta de

comedimento nas relações sexuais. Bhagavan em sua resposta parece reforçar o ideal espiritual da necessidade de ir além dos desejos, o que pode ser interpretado

como uma confirmação de que se tal verdade for compreendida e vivida, não haverá necessidade de controle de natalidade. [N.T.]